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CINEMA, EDUCAÇÃO E DEMOCRACIA EM JOHN GRIERSON: UMA ANÁLISE SOCIOLÓGICA DO FILME DRIFTERS (1929)

CINEMA, EDUCATION, AND DEMOCRACY IN JOHN GRIERSON: A SOCIOLOGICAL ANALYSIS OF THE DRIFTERS (1929) FILM

Resumo

Este artigo propõe uma análise sociológica do filme Drifters (1929), de John Grierson (1898-1972), obra que se tornou a pedra angular do Movimento do Cinema Documental Britânico. No filme, pessoas comuns aparecem em atividades laborais - no caso, pescadores de arenque no Mar do Norte. A análise visual, orientada pela metodologia de Pierre Francastel e Pierre Sorlin, em contraposição aos textos de Grierson, permitiu levantar algumas questões acerca das noções de educação e democracia que parecem orientar o diretor. Isso possibilitou a conclusão de que Drifters é uma ode ao progresso, uma propaganda da nação, de sua unidade e do sentimento de coletividade.

Palavras-chave:
John Grierson (1898-1972); Drifters (1929); Sociologia do cinema; Democracia; Documentário; Educação

Abstract

This article proposes a sociological analysis of the film Drifters (1929), by John Grierson (1898-1972), a work that became the cornerstone of the British Documentary Film Movement. In the film, ordinary people appear in work activities - in this case, herring fishermen in the North Sea. The visual analysis, guided by the methodology of Pierre Francastel and Pierre Sorlin, in counterpoint with Grierson’s texts, allowed to raise some questions about the notions of education and democracy that seem to guide the director. This allowed the conclusion that Drifters is an ode to progress, an advertisement of the nation, of its unity and the feeling of collectivity.

Keywords:
John Grierson (1898-1972); Drifters (1929); Sociology of cinema; Democracy; Documentary; Education

INTRODUÇÃO

A relação da humanidade com as artes visuais, como sugere o sociólogo e historiador da arte Pierre Francastel (1993Francastel, Pierre. (1993). A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva/EDUSP.: 3), não é limitada ao domínio das satisfações fáceis, mas revela atividades fundamentais da civilização. Em relação à educação, já em 1630 Comenius exortava, em sua Didática Magna, que educadores utilizassem imagens em suas aulas (Narodowski, 2004Narodowski, Mariano. (2004). Comenius & a educação. Belo Horizonte: Autêntica.: 71-72). Nas primeiras décadas do século XX, o cinema passaria a ocupar um espaço privilegiado como ferramenta pedagógica, e não tardou para que governantes, realizadores e intelectuais começassem a explorar institucionalmente os filmes como a ferramenta educativa ideal para ser utilizada em larga escala, dando origem ao chamado “cinema educativo” (Low, 1979Low, Rachel . (1979). The history of the British film 1929-1939: documentary and educational films of the 1930s. Londres: George Allen & Unwin.: 171). Tratava-se, no caso, de relacionar arte, educação, moral e civismo, o que não era uma novidade do século XX - pensemos, por exemplo, na pintura neoclássica francesa do século XVIII, que com seu retorno à Antiguidade Clássica redescobria valores éticos e modelos de “magnanimidade, espírito elevado, equilíbrio, retidão, dignidade humana e auto-sacrifício […]” que colaboram para o desenrolar da Revolução Francesa (Friedlaender, 2001Friedlaender, Walter. (2001). De David a Delacroix. São Paulo: Cosac & Naify.: 19).

Na Europa do século XX nos anos entreguerras, vemos despontar uma série de iniciativas no sentido de construir um sentimento republicano e cívico a partir da educação, como pode ser visto no livro póstumo L’éducation morale, de Émile Durkheim, publicado pela primeira vez em 1925, na França, a partir de cursos de sociologia proferidos na Sorbonne entre 1902 e 1903. Para o sociólogo francês, o ensino histórico teria a função de promover a formação moral dos alunos, através do cultivo do amor pela pátria (Durkheim, 1963Durkheim, Émile. (1963). L’éducation morale. Paris: Presses Universitaire de France (PUF) .: 234), cabendo ao ensino artístico ser “um meio de preservação contra certas influências nocivas ao temperamento moral uma vez constituído” (Durkheim, 1963Durkheim, Émile. (1963). L’éducation morale. Paris: Presses Universitaire de France (PUF) .: 233). Aspectos desse pensamento sociológico podiam ser percebidos também em relação ao cinema, que despontava como ferramenta potencialmente forjadora de um sentimento nacional, necessário para promover a unidade dos cidadãos no período. Isso abria ao menos duas possibilidades extremas em suas finalidades: ele poderia, por um lado, fomentar regimes totalitários, e, por outro, promover a democracia e a mudança social, assuntos característicos de anos marcados por duas grandes guerras, como pode ser visto em exemplos europeus da época. Após a Primeira Guerra Mundial, Itália, Alemanha, França e Inglaterra investiram pesado na produção e distribuição de filmes que exaltassem questões nacionais, promovessem um sentimento de pertencimento, ao mesmo tempo em que difundissem o conhecimento considerado o mais adequado.

Em 1924, na França, foi criado o Instituto Internacional de Cooperação Intelectual (IICI), uma ramificação da Sociedade das Nações1 1 A Sociedade das Nações ou Liga das Nações foi criada ao final da Primeira Guerra Mundial, tendo em vista fornecer um novo órgão diplomático para as seis maiores potências mundiais, a saber, Rússia, Áustria, Alemanha, Itália, França e Grã-Bretanha. Em seu primeiro encontro, acontecido em 1919, criou-se um comitê técnico para desenvolver questões culturais, além de econômicas e sociais, tais como: desenvolvimento infantil; uso de drogas e prostituição; trabalho (Organização Internacional do Trabalho); trânsito e comunicação; e saúde e higiene (Druick, 2007: 82). , tendo como primeiro presidente o filósofo Henri Bergson e como diretor o francês Julien Luchaire. No IICI, o cinema educativo era pensado como parte fundamental em um projeto transnacional de modernização após a Primeira Guerra, tendo sido criado um comitê específico sobre filmes: “Intimamente associado à educação formal e não-formal, o cinema [no IICI] também foi logo absorvido pelos debates sobre o desenvolvimento infantil, o bem-estar e o florescente campo da educação continuada ou de adultos” (Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 82, tradução nossa).

Em 1928, surgiu o Instituto Internacional de Cinema Educativo (IICE), com sede em Roma e sob a égide de Mussolini, contando com nomes célebres, como o diretor Louis Lumière. Tendo um viés nitidamente conservador, o IICE existiu até 1937 e, paradoxalmente, sua influência se estendeu a nações não fascistas, como a Grã-Bretanha, não apenas em termos de criação de acervos, mas no desenvolvimento dos estudos fílmicos2 2 Nessa época, havia não apenas o interesse em se educar pelos filmes, mas também em educar para o cinema (Druick, 2007: 88). Um dos pioneiros nesse sentido seria John Grierson, como será explicado adiante neste artigo. Raymond Williams, já nos anos de 1950, elaboraria a proposta de uma crítica fílmica capaz de ser aplicada na educação de adultos, em aulas tutoriais, no sentido de se pensar a mudança social a partir dessa formação (Paixão & Trevisan, 2019), algo que estava no horizonte de Grierson, como também será discutido adiante. . É inegável que o instituto acumulou filmes educativos e publicações direcionadas ao assunto, tornando-se rapidamente a maior coleção internacional da época (Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 84). Mais um exemplo dos paradoxos envolvendo o IICE é que um dos grandes responsáveis pelo desenvolvimento dos estudos cinematográficos no instituto foi o crítico Rudolph Arnheim, um judeu refugiado do Nazismo (Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 87). Ou seja: o que se entende por “ideologia fascista” pode incluir certa diversidade cultural, muitas vezes de cunho liberal (Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 88), o que nos permite pensar sobre esse movimento em outros países. Como aponta Zoë Druick, ainda que haja uma profusão de estudos sobre o cinema educativo de cunho fascista, há muito o que fazer em termos de pesquisa sobre esse tipo de projeto no período entreguerras (Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 94), sobretudo em países não fascistas. E, nesse caso, a Grã-Bretanha merece destaque, pois foi oriundo dela o grande impulso e o modelo para o cinema educativo de cunho mais liberal e vinculado a valores democráticos, tanto em termos teóricos quanto práticos.

Segundo Druick, o modo de organização e sistematização dos filmes educativos na Inglaterra acabou, de certa forma, sendo influenciado pelo que se fazia no IICI (Druick & Williams, 2014Druick, Zoë & Williams, Deane. (2014). The Grierson Effect: tracing documentary’s international movement. Londres: Palgrave Macmillan.: 93), e, nesse caso, é preciso falar de John Grierson. Trata-se de uma figura de inegável importância na construção da concepção do cinema documental como uma ferramenta para a educação, de tal forma que é impossível discutir esse gênero cinematográfico sem citar seu nome. Isso se dá, sobretudo, porque a ele é atribuído o uso pioneiro do termo “documentário”, ao publicar uma resenha sobre o filme Moana, de Robert Flaherty, no jornal New York Sun, em 1926, em que fez alusão ao termo “documentaire”, utilizado até então pelos franceses para falar de seus filmes de viagem (Grierson, 1926Grierson, John. (1926). Moana. New York Sun, 8 fev.).

Podemos pensar em Grierson como uma “personalidade singular”3 3 A concepção de Grierson como personalidade singular foi inspirada naquilo que teorizou Paixão (2017: 35) acerca de Alexandre Dumas, como um escritor que foi ponto de cruzamento de círculos sociais de uma determinada época. Lendo Simmel (e também Kracauer), Paixão nos fornece elementos para uma sociologia dos círculos sociais através de determinadas personalidades e suas obras. O mesmo raciocínio aparece em um dos trabalhos realizados sob sua orientação, que tratava do crítico literário e sociólogo Antonio Candido (Antunes, 2017). Waizbort (2000: 234) explica que, para Simmel, “a personalidade exprime uma individualidade distinta da individualidade social, assim como há uma individualidade qualitativa que se diferencia de uma individualidade quantitativa”, o que possibilitou que o autor, Simmel, se dedicasse ao estudo de personalidades consideradas grandes, como Goethe, Michelangelo, Botticelli ou Beethoven. Sousa (2014: 15) esclarece que, num mundo de quantificações, Simmel defende que apenas o singular estabelece qualidades: “A figura do artista e do pensador tornam-se, assim, repositórios da reação contra o espírito moderno do cálculo e da redução de qualidade a quantidade”. Para Simmel (2006: 28), a vida social deve ser pensada na “tessitura da natureza com a criatividade dos indivíduos”, uma vez que “[…] o absoluto só vive na forma do individual, [e a] a individualidade não é uma limitação do infinito, e sim sua expressão e seu reflexo […]” (Simmel, 2006: 114). Grierson é pensado, aqui, como figura central no cinema documental britânico, tanto pela produção de uma obra singular (Drifters), quanto por sua posição como eixo e fundador de um movimento maior, o British Documentary Movement, que influenciou o cinema documental em diversas partes do mundo, incluindo o Brasil (Druick & Williams, 2014: 230), sendo, dessa forma, uma personalidade singular para a compreensão desse processo. que aglutinava em torno de seu nome todo um projeto que foi levado adiante por diretores como Paul Rotha e o brasileiro Alberto Cavalcanti. Na juventude, Grierson foi telegrafista voluntário da Royal Naval Reserve, e em 1924 mudou-se para Chicago para estudar na School of Political Science sob a orientação de Charles E. Merriam e Robert E. Park. Seus interesses de pesquisa passavam pela psicologia social e a opinião pública a partir da imprensa escrita, encontrando em Walter Lippman, autor de Public opinion (1922), uma de suas grandes referências (Grierson, 1990Grierson, John. (1990). Eyes of democracy. Introdução e notas de Ian Lockerbie. Stirling: University of Stirling.: 15). Chegou a trabalhar como colunista no Evening Post, de Chicago, escrevendo sobre pintura (Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.: 35), atividade que o aproximou do cinema, que aos poucos se convertia para ele como um caminho de formação da opinião pública e da construção da democracia. Crítico do cinema hollywoodiano, Grierson reconhecia o valor de personalidades como Charles Chaplin e outros comediantes, mas foi especialmente no produtor cinematográfico Walter Wanger que começou a ver a possibilidade de se realizar um cinema relacionado à mudança social, algo que estaria no seu horizonte quando dirigiu seu único filme4 4 Segundo Barnouw, o sucesso de Drifters significou uma nova carreira para Grierson: ao invés de dirigir novas produções, tornou-se um organizador criativo de projetos do gênero no Empire Marketing Board (Barnouw, 1993: 89). Para uma problematização acerca do conceito de “obra” de Grierson, ver Menezes (2008). , Drifters, de 1929 (John Grierson…, 1929John Grierson Drifters 1929 VHSrip. (2018). [S. l.: s. n.]. 1 vídeo (49 min). Publicado pelo canal jaime lara. Disponível em <Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=RUOiTNnNFvI >. Acesso em 20 set. 2022.
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). Este documentário tornou-se a pedra angular do movimento britânico que adentrou os anos de 1930, e expandiu suas asas pelo mundo (incluindo o Brasil) (Druick & Williams, 2014Druick, Zoë & Williams, Deane. (2014). The Grierson Effect: tracing documentary’s international movement. Londres: Palgrave Macmillan.: 230). Para Grierson, o documentário, considerado um tratamento criativo da realidade5 5 Para Grierson, o documentário não poderia se prender à descrição superficial do assunto, mas deveria revelar a sua realidade de forma explosiva, exagerada. Nesse sentido, ele fazia uma distinção entre o documentário romântico e o documentário realista, que era aquele que ele realizava e defendia (Hardy, 1979: 66). , era uma possibilidade de educar as massas, conscientizar as pessoas de seu lugar na sociedade e construir um sentimento de civismo, sendo, dessa forma, um caminho “visual” para a democracia.

Grierson ocupa, portanto, espaço primordial para se refletir acerca do cinema educativo, especialmente o cinema de caráter documental. Figura basilar de toda uma escola cinematográfica, muitos são os estudos que se dedicaram e ainda se dedicam a sua vida e obra e a seu lugar como pioneiro no movimento do filme documental britânico (Aufderheide, 2007Aufderheide, Patricia. (2007). Documentary film: a very short introduction. Oxford: Oxford University Press.; Barnouw, 1993Barnouw, Erik. (1993). Documentary: a history of the non-fiction film. 2. ed. Oxford: Oxford University Press .; Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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; Druick & Williams, 2014Druick, Zoë & Williams, Deane. (2014). The Grierson Effect: tracing documentary’s international movement. Londres: Palgrave Macmillan.; Hardy, 1946Hardy, Forsyth. (1946). Introduction. In: Grierson, John. Grierson on documentary. Londres: Collins , p. 11-25.; Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.; Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.; Menezes, 2008Menezes, Paulo. (2008). Documentário social inglês: problematizando a “obra” de Grierson. In: Hamburger et al. (orgs.). Estudos de Cinema Socine. São Paulo: Annablume, v. 9, p. 183-190.; Sexton, 2002Sexton, Jamie. (2002). Grierson’s machines: “Drifters”, the Documentary Film Movement and the negotiation of modernity. Canadian Journal of Film Studies , 11/1, p. 40-59. Disponível em <Disponível em https://www.jstor.org/stable/24408181 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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). A proposta, neste artigo, é avançar na problematização sociológica de seu filme Drifters, compreendido, aqui, como um bastião em favor da democratização do conhecimento e da mudança social através de um processo educativo e cultural.

Para isso, nossa abordagem passa por uma bibliografia interdisciplinar que transita entre as Ciências Sociais, a História e os Estudos de Cinema, mas que se assenta particularmente na Sociologia da Arte de Pierre Francastel e na Sociologia do Cinema de Pierre Sorlin. Do primeiro, é recuperado aqui o conceito de pensamento visual, que concebe a obra de arte (seja ela um quadro, um filme ou uma fotografia) como caminho de compreensão da realidade, pensada em sua complexidade não como um dado a ser observado, mas como um processo cujas forças ou energias sociais podem ser percebidas através das imagens criadas pelo artista. Nesse sentido

[u]ma obra de arte não é jamais o substituto de outra coisa; ela é em si a coisa simultaneamente significante e significada. […] a obra de arte não é o duplo de qualquer outra forma, seja ela qual for, mas, realmente o produto de um dos sistemas através dos quais a humanidade conquista e comunica sua sabedoria ao mesmo tempo que realiza suas obras (Francastel, 1993Francastel, Pierre. (1993). A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva/EDUSP.: 5, grifo do autor).

Já para o segundo autor, Pìerre Sorlin, um filme não deve ser pensando como reflexo de uma suposta realidade objetiva; antes disso, ele também cria novas imagens e concepções de realidade:

[o] cinema é tanto repertório como produção de imagem. Ele não mostra “o real”, mas fragmentos da realidade que o público aceita e reconhece. Num outro sentido, contribui para alargar o domínio do visível, para impor novas imagens: parte da nossa investigação consistirá em identificar as manifestações destes dois códigos (Sorlin, 1977Sorlin, Pierre. (1977). Sociologie du cinéma: ouverture pour l’histoire de demain. Paris: Aubier Montaigne.: 69-70, tradução nossa).

Deste autor, é resgatado aqui especialmente seu método de análise via decupagem plano-a-plano, de modo a travar um diálogo direto com as imagens, buscando, dentro da construção fílmica, compreender como a sociedade é (re)organizada - o que é possível graças ao seu conceito de “sistemas relacionais”, do qual será feito uso ao longo da análise6 6 A seção “Metodologia” trará mais elementos para essa discussão. .

Outro elemento que pode ser considerado uma contribuição na abordagem aqui realizada é a recuperação feita de textos de John Grierson, uma vez que antes de ser cineasta era cientista social, e produziu relevante material escrito sobre suas ideias acerca de cinema, democracia, opinião pública e mudança social. Tais textos, no caso, não são considerados como um complemento na análise visual, mas um elemento de tensionamento entre as ideais do autor e suas realizações fílmicas.

Por fim, a pesquisa também é resultado de um trabalho de revisão bibliográfica sobre o tema, sobretudo acerca de Grierson, revisão essa realizada em acervos brasileiros e britânicos. Desse modo, o presente trabalho apresenta não apenas uma pesquisa histórica, mas também mobiliza material atualizado sobre as discussões acadêmicas acerca desse importante diretor e do movimento do filme documental que liderou a partir dos anos 20 do século XX. Vivemos em um período em que a discussão sobre as relações entre educação e democracia voltam a fazer parte da ordem do dia, sendo, portanto, particularmente relevante retomar essa questão a partir do cinema educativo da primeira metade do século XX.

Portanto, este artigo discutirá algumas ideias desse autor sobre a questão da educação e da democracia a partir de seus textos, para em seguida investigar se é possível perceber tais proposições no filme Drifters.

METODOLOGIA

As proposições (visuais e textuais) colocadas por Grierson são atuais e nos permitem refletir sobre o lugar do audiovisual na construção do saber. Afinal, como nos lembra o sociólogo e historiador da arte Pierre Francastel (1993Francastel, Pierre. (1993). A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva/EDUSP.: 3), assim como as literaturas, as artes visuais podem servir “como instrumento aos senhores das sociedades para divulgar e impor crenças”. Para escapar das armadilhas colocadas pelas imagens e, ao mesmo tempo, aproveitá-las da melhor forma como instrumentos de construção de um saber, é preciso que estejamos atentos aos caminhos metodológicos que devemos trilhar no processo.

Pode-se dizer que, de maneira geral, quando se pretende estudar as relações entre artes visuais e sociedade, é possível trilhar caminhos variados, que vão desde a análise da linguagem dos seus objetos até a sua recepção ou circulação; mas há dois posicionamentos teórico-metodológicos limites que ajudam a localizar o debate de maneira mais precisa.

A primeira abordagem, que poderíamos chamar de externa, dá mais atenção ao contexto social em que surgem os objetos visuais, ressaltando as características comuns a todos eles - em casos assim, o material visual é muitas vezes colocado em segundo plano em prol de uma abordagem que considera apenas aspectos externos a eles, que explicariam seus sentidos (Menezes, 1997Menezes, Paulo. (1997). A trama das imagens. São Paulo: Edusp .: 16). Essa abordagem nasce já no surgimento da utilização dos objetos artísticos como material de análise historiográfica, com os estudos de Jacob Burckhardt (1818-1897) e Johan Huizinga (1872-1945), para quem as imagens eram pensadas como testemunhas do passado e do desenvolvimento do espírito humano, de modo que toda arte seria um “retrato” de sua época (Burke, 2008Burke, Peter. (2008). O que é história cultural? Rio de Janeiro: Zahar.: 16-20). Esse debate, que foi essencial para o desenvolvimento epistemológico do uso das imagens como material de pesquisa, adentrou o século XX e se ampliou, ora concebendo as imagens como esse reflexo da sociedade, ora se contrapondo a essa concepção7 7 Sobre esse assunto, ver Gombrich (1999), Ginzburg (2003) e Trevisan (2019). . Um dos aspectos desse tipo de abordagem é enfatizar a produção, a distribuição e o consumo da arte, que acaba sendo reduzida a valores culturais ou de classe e, como alerta Raymond Williams, faz com que tanto a sua forma quanto o seu conteúdo sejam apresentados como dependentes de fatos já conhecidos (Williams, 2000Williams, Raymond. (2000). Com vistas a uma sociologia da cultura. In: Williams, Raymond. Cultura. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p. 9-32.: 23). A proposta de Williams (2000Williams, Raymond. (2000). Com vistas a uma sociologia da cultura. In: Williams, Raymond. Cultura. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p. 9-32.: 120) é fazer o oposto, partindo das “obras de arte em si mesmas”, o que nos conduz à segunda possibilidade metodológica aqui discutida, de caráter mais interno.

A segunda metodologia coloca as imagens em primeiro plano, buscando a significação das obras a partir da sua análise e interpretação como imagens (Menezes, 1997Menezes, Paulo. (1997). A trama das imagens. São Paulo: Edusp .: 17). Dessa forma, compreende a arte como “expressão de algo que é visual e que, portanto, só pode expressar-se por meio dela” (Menezes, 1997Menezes, Paulo. (1997). A trama das imagens. São Paulo: Edusp .: 19, grifo do autor), considerando que ela revela informações que seriam inacessíveis de outro modo. O objeto visual torna-se, nessa perspectiva, um caminho privilegiado para a compreensão do mundo social8 8 Não se trata, porém, de limitar-se ao registro formalista, que concebe os produtos da arte como autônomos em relação à sociedade - algo que estaria próximo ao que faz Heinrich Wölfflin (1989), que pensa as formas artísticas em si mesmas, trabalhando apenas no registro da evolução dos estilos, sem se preocupar com as relações dessas mudanças com a sociedade. Segundo Holly (1985: 85), a perspectiva de Wölfflin pode ser considerada positivista, por conta da plena autonomia que ela dá às formas em suas análises, ignorando a existência do mundo social. . Autores como T. J. Clark, Raymond Williams, Pierre Francastel, John Berger, Peter Burke, Fredric Jameson e outros se alinham com essa perspectiva, concebendo a relação entre arte e sociedade de forma dinâmica, valorizando as obras para tentar compreender as lutas simbólicas que são travadas através delas. Essa perspectiva foi levada às últimas consequências por Pierre Francastel, que a partir dos anos de 1950 começa a sistematizar um projeto teórico de grande envergadura visando construir uma Sociologia da Arte que desse especial atenção aos objetos figurativos. Segundo Francastel, essa análise deveria acontecer “ao nível de uma análise aprofundada das obras […]” (Francastel, 1970Francastel, Pierre. (1970). Études de sociologie de l’art. Paris: Denoël/Gonthier.: 15), de modo que a arte não seja pensada como um duplo ou reflexo imediato da sociedade, mas como parte de um sistema através do qual a humanidade comunica seu conhecimento (Francastel, 1993Francastel, Pierre. (1993). A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva/EDUSP.: 5). A partir de tais princípios, a arte pode informar “mais sobre os modos de pensamento de um grupo social que sobre os acontecimentos e sobre o quadro material da vida de um artista e seu ambiente” (Francastel, 1993Francastel, Pierre. (1993). A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva/EDUSP.: 17).

Ainda que Francastel (1983Francastel, Pierre. (1983). Imagem, visão e imaginação. Lisboa: Edições 70.: 157) tenha navegado também pelos mares do cinema, através da chamada “ciência filmológica”, seria com outro francês que veríamos o surgimento de uma Sociologia do Cinema em moldes similares, mas com um método mais elaborado: Pierre Sorlin (1977Sorlin, Pierre. (1977). Sociologie du cinéma: ouverture pour l’histoire de demain. Paris: Aubier Montaigne.)9 9 Como aponta Paulo Menezes (2017: 25), trata-se de uma herança teórica não citada, mas perceptível em suas proposições. . De forma semelhante, Sorlin se esquiva de analisar as obras puramente para se comprovar forças ou jogos sociais que se julga conhecer de antemão, e sugere que um filme não deve ser pensado como uma correspondência direta das estruturas sociais:

[…] o filme não se limita a um jogo de forças sociais, não é apenas a transposição dos confrontos ou trocas que ocorrem entre grupos e indivíduos. Mesmo que consigamos identificar os sistemas relacionais que ele desenvolve, não estamos em posição de afirmar ou traduzir as concepções daqueles que o realizaram, nem mesmo se correspondem às estruturas da sociedade na qual foi produzido (Sorlin, 1977Sorlin, Pierre. (1977). Sociologie du cinéma: ouverture pour l’histoire de demain. Paris: Aubier Montaigne.: 157, tradução nossa).

Neste artigo, ao analisar o filme Drifters, orientamo-nos pelos pressupostos trilhados por esses autores, buscando nas imagens criadas por Grierson os sentidos de educação, organização social e democracia que podem ser lidos em algumas de suas proposições textuais. Segundo Francastel (1993Francastel, Pierre. (1993). A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva/EDUSP.: 30), em toda obra há um programa e uma realização, e o estudo de ambos em conjunto pode ajudar a colocar em evidência o sentido simbólico e social da arte. Annateresa Fabris (2003Fabris, Annateresa. (2003). O pensamento visual. In: Catani, Afrânio Mendes et al. (orgs.). Estudos Socine de cinema: ano IV. São Paulo: Panorama, p. 17-25.), partindo desse princípio, dirá que um artista jamais tem plena consciência de sua própria obra, havendo, assim, uma distância entre seu projeto e a realização final do trabalho, uma diferença entre o que se quer dizer e o realizado. O estudo dessa diferença, segundo a autora, seria o terreno de ação da Sociologia da Arte (Fabris, 2003Fabris, Annateresa. (2003). O pensamento visual. In: Catani, Afrânio Mendes et al. (orgs.). Estudos Socine de cinema: ano IV. São Paulo: Panorama, p. 17-25.: 24). É nesse sentido que os textos de Grierson serão mobilizados neste artigo: como eixos problematizadores de sua produção visual, mas não como reveladores desta. O desafio será, a partir disso, ampliar o debate centrado na dicotomia Estado/cinema, patrono/artista etc.10 10 Nesse caso, a principal referência é Haskell (1997). , para perceber que lutas simbólicas são travadas pelo filme, já que o diretor contou com apoio institucional pesado para sua realização, o Empire Marketing Board (EMB). A presente pesquisa segue, dessa forma, na linha do que diz Antonio Candido, sobre o vínculo de um artista com o poder público não significar, necessariamente, sua identificação com as ideologias e interesses dominantes, e que sua obra pode, inclusive, fazer oposição ao regime (Candido, 2003Candido, Antonio. (2003). A Revolução de 1930 e a cultura. In: A educação pela noite & outros ensaios. São Paulo: Ática, p. 181-198.: 195-196). De toda forma, apenas travando um diálogo com as imagens é que essa discussão pode render bons frutos.

“PALAVRAS”: CINEMA, PROPAGANDA E DEMOCRACIA

O cinema, para Grierson, era a única instituição genuinamente democrática em escala mundial (Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.: 36), e, nesse sentido, seria algo a ser realizado não apenas para o povo, mas pelo povo. Após seu período de estudos nos Estados Unidos, de volta à Inglaterra, em 1927, chegava convicto das possibilidades educativas e persuasivas do cinema, mas precisava de apoio institucional para colocar suas ideias em movimento, o que ele encontrou no Empire Marketing Board (EMB)11 11 Para produzir esse filme, Grierson conseguiu £ 2500 do EMB, que teve seu lançamento no London Film Society em 1929 (Barnouw, 1993: 87). , que já trabalhava na publicidade acerca da nação britânica a partir de cartazes, jornais, exposições, paredes de salas de aula e começava a arriscar-se em suas primeiras experiências com filmes (Hardy, 1946Hardy, Forsyth. (1946). Introduction. In: Grierson, John. Grierson on documentary. Londres: Collins , p. 11-25.: 13). Para convencer o EMB a produzir Drifters, Grierson enfatizou a importância de mostrar aos britânicos seus trabalhadores em atividade, que isso seria uma interessante oportunidade de filmar pessoas comuns e sua dignidade (Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.: 70). O objetivo era apresentar aqueles que estariam na base da nação, forjando-a através do seu trabalho, sua dedicação e esforço. A ideia de filme educativo, assim, se associava à noção de propaganda, no sentido de mostrar ao povo sua própria imagem como parte constituinte da nação e do seu progresso - isso era especialmente importante na Grã-Bretanha dos anos 1920-30, com o desenvolvimento da Commonwealth of Nations e a necessidade de popularização do Império Britânico12 12 O EMB foi peça importante na consolidação do Império Britânico, e com Grierson a instituição começou a investir também em produções fílmicas (Menezes, 2004: 41). O órgão foi extinto em 1933 e a produção de filmes passou a ficar a cargo do General Post Office (GPO). .

“Eu vejo o cinema como um púlpito, do qual faço uso como um propagandista […]”, dizia Grierson (1946Grierson, John. (1946). Grierson on documentary. Editado por Forsyth Hardy. Londres: Collins.: 13). Suas proposições teóricas nesse sentido aparecem em vários escritos, especialmente no livro póstumo Eyes of democracy, publicado em 1990 a partir de textos originais de um projeto nascido em 1939. Segundo Ian Lockerbie (1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 7), embora esse livro trate do documentário, ele pode ser visto, antes, como uma obra de filosofia política, onde o crucial é discutir a noção de democracia e, dentro disso, o papel dos filmes. Ainda que Eyes of democracy permita compreender de forma mais detalhada e refinada suas ideais sobre educação, documentário e democracia do que em outros escritos ou falas públicas (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 20), não se pode dizer que revele algum tipo de concepção mais geral planejada pelo autor - “é um primeiro esboço, escrito por um homem com pressa” (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 6). As ideias expostas nesse livro, no entanto, são coerentes com inúmeras outras publicizações de Grierson da mesma época sobre o assunto, como programas de rádio e textos diversos. O exemplo mais evidente é “Searchlight of democracy”, escrito originalmente para uma conferência sobre a educação de adultos em 1939 e publicado em uma coletânea posteriormente (Grierson, 1946Grierson, John. (1946). Grierson on documentary. Editado por Forsyth Hardy. Londres: Collins.), onde o tema do papel da propaganda numa sociedade democrática é desenvolvido (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 6). Para ele, o documentário teria um papel chave a desempenhar nesse projeto.

Duas questões surgem a partir disso: qual o sentido de democracia cultivado pelo autor e como pensar a ideia de “propaganda”, sobretudo quando estamos falando de um cinema subvencionado pelo governo?

A ideia de democracia de Grierson, base inicial do movimento do filme documental britânico, consistia em desenvolver no espectador maior compreensão das questões sociais e estimular formas mais ativas de cidadania (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 9). Essa noção de democracia estava estruturada em dois conceitos: justiça social e ordem social. A justiça social, para o autor-diretor, consistia na dignificação das pessoas comuns (ordinary people) e no seu esclarecimento. Nesse sentido, era crítico do modo de vida cortês e do liberalismo - para ele, o Estado tinha um papel a representar na proteção das classes trabalhadores e na garantia dos seus direitos, o que nos leva para a questão da ordem social. Nesse ponto, vemos o lado calvinista de Grierson, a partir da valorização da disciplina e do trabalho (não é à toa, portanto, que ele pensa o cinema como um púlpito). Para ele, a democracia estaria assentada na crítica ao liberalismo, no fortalecimento do Estado (que não seria tão centralizador, tal qual em países como Alemanha ou Rússia) e na participação popular no governo (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 11-14). Assim, Grierson não pode ser considerado nem um liberal, nem um revolucionário, mas um reformador moderado, na busca de um consenso social (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 11).

Aliás, a posição política de Grierson é algo controverso e pouco consensual entre seus estudiosos: “Embora Grierson tenha tomado algumas vezes uma postura de esquerda e tenha sido acusado disso, críticos tardios perceberam seu conservadorismo e seu desejo de manter o status quo” (Aufderheide, 2007Aufderheide, Patricia. (2007). Documentary film: a very short introduction. Oxford: Oxford University Press.: 36-37, tradução nossa). Isso pode ser analisado, por exemplo, a partir de suas concepções de propaganda. Por um lado, ele criticava a propaganda pensada como uma “tempestade de imaginação”, ao modo autoritário de um Goebbles, a quem considerava medíocre. Por outro, defendia que o Império Britânico só se manteria vivo se soubesse mostrar-se a si mesmo, “levando o homem do campo para o homem da cidade e a estação de pesquisa para o trabalhador” (Grierson apud Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.: 70). Nesse sentido, supostamente, a noção de propaganda do governo deixaria de ser autoritária, como na Alemanha, para ser democrática. Democracia, portanto, estaria intimamente ligada à arte, pois as ideias precisam de forma para chegar até as pessoas:

A busca da democracia é um ideal espiritual que requer propaganda esclarecida; a propaganda precisa ser criativa e dinâmica para se adequar à tarefa; a criatividade tem que estar enraizada no real, caso contrário perde-se o espírito da democracia (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 20, tradução nossa).

O “real”, nesse caso, seria o Império Britânico e seu protagonismo na modernização do mundo. Na leitura do sociólogo brasileiro Paulo Menezes:

É evidente que isso anda de mãos dadas com o positivismo fundante das ciências sociais desde Comte e Durkheim, ciência da ordem criada para promover a manutenção do social, como uma forma de manter a organicidade das sociedades europeias contra as transformações e revoluções do século XIX, contra as anomias e patologias, contra as “doenças sociais”, expressando inequivocadamente suas raízes profundamente conservadoras (Menezes, 2004Menezes, Paulo. (2004). O cinema documental como representificação: verdades e mentiras nas relações (im)possíveis entre representação, documentário, filme etnográfico, filme sociológico e conhecimento. In: Novaes, Sylvia Caiuby et al. (orgs.). Escrituras da imagem. São Paulo: Edusp /Fapesp, p. 21-48.: 41).

Acatamos essa colocação, embora pensemos que Grierson é menos um crítico da Revolução Francesa do que um admirador dos seus ideais (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 8), estando talvez mais perto das concepções durkheimianas - para quem a revolução de 1789 foi um fato social da mais alta importância (Durkheim, 1970Durkheim, Émile. (1970). Le principes de 1789 et la sociologie. In: Durkheim, Émile. La science sociale el l’action. Paris: Presses Universitaire de France (PUF).: 215) - do que das de Comte. Quando Grierson estudou nos Estados Unidos, o positivismo era a filosofia mais influente no ambiente de pesquisa em que ele atuava (Sexton, 2002Sexton, Jamie. (2002). Grierson’s machines: “Drifters”, the Documentary Film Movement and the negotiation of modernity. Canadian Journal of Film Studies , 11/1, p. 40-59. Disponível em <Disponível em https://www.jstor.org/stable/24408181 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 44). Assim como Durkheim, Grierson valorizava a ordem social, como já apontado anteriormente, e essa ordem não eliminava de modo algum a busca da justiça social, mas era uma forma de garanti-la (algo diferente do que acontecia em países como a Alemanha, por exemplo). Para Durkheim, o Estado seria uma instância representativa a garantir os direitos e liberdades individuais (Oliveira, 2011Oliveira, Márcio de. (2011). O Estado e a política em Durkheim. In: Oliveira, Márcio de & Weiss, Raquel (orgs.). David Émile Durkheim: a atualidade de um clássico. Curitiba: Editora UFPR, p. 103-129.: 119), algo que também estava no horizonte de Grierson, que criticava elementos que desfiguravam as sociedades democráticas, como o analfabetismo, o desemprego, a discriminação racial e o colonialismo (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 8).

No entanto, ele não negava os limites de ação quando se tratava de realizar um filme a serviço do governo, já que inevitavelmente o funcionário público tem que trabalhar num certo padrão de pensamento e sentimento que é indicado por seus líderes políticos. Porém, ainda que isso delineasse uma moldura para o trabalho a ser feito, Grierson dizia que o bom propagandista deveria ter um papel criativo nesse processo, para que pudesse cumprir seu dever público. Tal dever envolveria compreender como os sentimentos relacionados à raça, religião, nação, economia etc. são cristalizados na sociedade, apontando suas razões e contradições (Grierson, 1990Grierson, John. (1990). Eyes of democracy. Introdução e notas de Ian Lockerbie. Stirling: University of Stirling.: 93). Trata-se, nesse caso, de um breve espaço para a crítica social, realizada por meio da arte.

Contudo, é importante destacar que, para Grierson, o documentário só deveria ser visto como arte se fosse no sentido de uma estética comprometida com as questões sociais, buscando, dessa forma, reconciliar o “imperativo artístico” com “o imperativo social” - de outro modo, seria mais um caso de “arte pela arte” (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 17). A concepção de arte criticada por Grierson tem relação com sua crítica à vida refinada, de uma tradição cortês (courtly tradition). Para ele, não ter uma origem nobre seria uma qualidade, já que a vida cortês seria uma fonte de alienação social. Ele desenvolveu essa concepção sobretudo ao analisar a cultura canadense13 13 Grierson viveu no Canadá de 1939 a 1945, sendo um dos responsáveis pela criação do National Film Board of Canada. , que, não sendo refinada, poderia ser considerada abençoada:

De fato, a criação da cultura de um povo e a autoconfiança que a acompanha podem depender de não ter uma cultura cortês: e estaremos bem livres de qualquer complexo de inferioridade e sentimentalismo que possa ter sido nessa direção (Grierson, 1990Grierson, John. (1990). Eyes of democracy. Introdução e notas de Ian Lockerbie. Stirling: University of Stirling.: 98, tradução nossa).

Nas novelas de televisão canadenses, dizia ele, seria possível ver nas entrelinhas a América de Lincoln (Grierson, 1990Grierson, John. (1990). Eyes of democracy. Introdução e notas de Ian Lockerbie. Stirling: University of Stirling.: 98). Portanto, no que haveria de mais popular, teríamos uma fonte privilegiada para o conhecimento (o que nos permite perceber que a noção de “real” para o autor não era estritamente ligada ao sentido “documental”). Ou seja: trata-se de produzir cultura não apenas para o povo, mas a partir dele, construindo, com isso, uma democracia participativa, em que, sentindo-se parte do Estado, os cidadãos poderiam cobrar dele determinados posicionamentos.

No entanto, valorizar o popular como a base do documentário não significava um elogio à simplicidade na forma. Admirador da montagem do cinema silencioso russo14 14 Foi Grierson que apresentou O Encouraçado Potemkin (1925) ao público estadunidense. Para ele, esse filme foi uma grande referência no sentido de compreender o poder que o cinema pode exercer (Hardy, 1979: 41). , Grierson acreditava que o mais importante no filme não seria o conteúdo manifesto, mas sua organização criativa, que produziria uma forma ao superar a superfície dos acontecimentos (Lockerbie, 1990Lockerbie, Ian. (1990). Introduction. In: Grierson, John. Eyes of democracy. Stirling: University of Stirling , p. 1-21.: 19).

Em Drifters, é notória a importância que se dá aos trabalhadores no processo de expansão do Império Britânico, a partir da pesca do arenque no Mar do Norte. Cabe, portanto, buscar como (e se) essas ideias estão figuradas em seu filme.

“IMAGENS”: DRIFTERS (1929)

Drifters tem cerca de 50 minutos e é dividido em quatro partes, todas indicadas no próprio filme a partir de intertítulos - recurso, aliás, exaustivamente utilizado, uma vez que para além desses 4 intertítulos existem 26 cartelas com textos explicativos de cenas que as seguem. Como já alertava Michael Foucault (1981Foucault, Michel. (1981). As palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes.: 25), “[…] por mais que se tente dizer o que se vê, o que se vê jamais reside no que se diz […]”. Logo, a existência dessas informações textuais nos filmes silenciosos era um recurso precioso para que a imagem, essencialmente ambígua (Francastel, 1993Francastel, Pierre. (1993). A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva/EDUSP.: 97), fosse “corretamente” percebida pelo público15 15 A relação entre textos e imagens na arte e na literatura de viagem foi discutida em Trevisan (2010). , evitando qualquer dúvida sobre a mensagem a ser passada. Dadas as proposições educativas desse documentário, nada estranho em tamanho didatismo.

O filme se constrói essencialmente sobre de três espaços sociais: um vilarejo, o mar e o mercado portuário. A primeira cena mostra o vilarejo, visto em um plano geral, com poucas pessoas, que, num plano mais próximo, notamos tratar-se de pescadores caminhando para o trabalho - algo informado na cartela inicial, que antecede as imagens: “Os pescadores ainda têm as suas casas nas aldeias antigas - mas a cada estação se deslocam para trabalhar na indústria moderna” (John Grierson…, 2018John Grierson Drifters 1929 VHSrip. (2018). [S. l.: s. n.]. 1 vídeo (49 min). Publicado pelo canal jaime lara. Disponível em <Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=RUOiTNnNFvI >. Acesso em 20 set. 2022.
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, tradução nossa). Assim, o início do filme já sinaliza o discurso que constituirá sua base: a relação entre a antiga Grã-Bretanha, de moldes rurais, e a moderna, industrial, de caráter urbano. A última cena do filme é emblemática a respeito dessa proposta, pois mostra um trem em movimento, levando a produção (peixes) para os confins do mundo (“Assim, até os confins da terra vai a colheita do mar”, diz a cartela final, em tradução nossa).

A primeira parte do filme, segundo sua própria organização, apresenta os trabalhadores, desde sua origem no vilarejo, passando pelo embarque no porto, até seus primeiros momentos na viagem de pesca, com toda a organização inicial necessária. A segunda parte refere-se aos momentos em que, encontrado o local onde será realizada a pesca, todos os procedimentos nesse sentido são realizados. A terceira parte, especialmente marcada por grande agitação, tanto do mar quanto dos pescadores, apresenta a coleta dos peixes e o retorno para terra firme, para comercialização destes. A quarta e última parte é, portanto, o desfecho glorioso, com ênfase na grande população, essencialmente masculina, que espera por essa riqueza da natureza, muito bem dominada pelos trabalhadores britânicos, que imperavam, também, a própria maquinaria.

O filme mostra essa dominação a partir de vários planos intercalados dos homens lidando com os meios técnicos (fornalhas, redes, instrumentos de navegação etc.) e os efeitos imediatos dessas ações no barco - nesse sentido, grande ênfase é dada à fumaça que sai das chaminés da embarcação, sendo sinônimo de progresso. Aliás, essa dominação das máquinas e da natureza, sempre muito masculina, revela-se de várias maneiras no filme, mas uma cena é particularmente emblemática: o homem responsável por abastecer as fornalhas com carvão acende um cigarro com brasas em chamas que recolhe com a pá, uma amostra bastante sugestiva do sentido de homem trabalhador que se pretende valorizar - um ser rude, praticamente uma extensão da maquinaria.

Os corpos dos homens no filme são frequentemente fragmentados e representados de uma forma que alia suas partes corporais a partes de máquinas. Eles apenas realizam atividades necessárias e não são individualizados. Sua única folga do trabalho é por meio de funções necessárias ocasionais, como dormir e comer (Sexton, 2002Sexton, Jamie. (2002). Grierson’s machines: “Drifters”, the Documentary Film Movement and the negotiation of modernity. Canadian Journal of Film Studies , 11/1, p. 40-59. Disponível em <Disponível em https://www.jstor.org/stable/24408181 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 51, tradução nossa, grifo do autor).

Os sistemas relacionais16 16 Conceito utilizado na Sociologia do Cinema proposta por Pierre Sorlin que permite analisar como o meio social configura-se nos filmes e sob quais mecanismos de regulação. Dessa forma, torna-se possível ao analista relacionar o filme a valores da sociedade de onde ele surge (Sorlin, 1977: 241). do filme são marcados pela construção de uma rígida hierarquia, numa verdadeira divisão do trabalho social: existem homens que comandam o barco, aqueles que abastecem as máquinas com vapor, aqueles que cozinham e os que pescam (nesse caso, sobretudo na parte em que as redes são recolhidas do mar, há a sensação de uma maior participação coletiva). A divisão do trabalho continua em terra firme, com homens que retiram os peixes dos barcos, outros que os colocam em baldes ou barris para a venda, aqueles que negociam esse produto no mercado e os que compram (sempre homens, em grande número, todos muito parecidos, com roupas e chapéus bem semelhantes). Quanto às mulheres, sua presença no filme é restrita à quarta parte, e em duas situações: ou passeando em grupos, sendo elas também muito semelhantes e sempre de braços dados (não se vê uma mulher caminhando sozinha), ou então no trabalho de limpeza dos peixes. Segundo Sexton (2002Sexton, Jamie. (2002). Grierson’s machines: “Drifters”, the Documentary Film Movement and the negotiation of modernity. Canadian Journal of Film Studies , 11/1, p. 40-59. Disponível em <Disponível em https://www.jstor.org/stable/24408181 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 52), se Drifters apresenta o trabalhador masculino como “máquina nobre”, as mulheres, por sua vez, sequer alcançam esse status. Contudo, em ambos os casos (tanto homens quanto mulheres), não são apresentados como indivíduos, mas enquanto coletivos.

Segundo Eric Barnouw (1993Barnouw, Erik. (1993). Documentary: a history of the non-fiction film. 2. ed. Oxford: Oxford University Press .: 88), embora faça referência à tradição, Grierson dá pouca atenção ao vilarejo no filme - seu olhar privilegia o aço e o ferro. Drifters, portanto, pode ser lido como uma ode ao progresso. No entanto, essa admiração pelo moderno não significa uma ruptura radical com o passado (Sexton, 2002Sexton, Jamie. (2002). Grierson’s machines: “Drifters”, the Documentary Film Movement and the negotiation of modernity. Canadian Journal of Film Studies , 11/1, p. 40-59. Disponível em <Disponível em https://www.jstor.org/stable/24408181 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 48), que tem nas classes trabalhadoras sua marca. O autor-diretor destaca o papel dos trabalhadores na história, e procura promover, a partir da ação destes na engrenagem social, sua dignidade - ainda que para isso os apresente de forma despersonalizada, coletiva, não individualizada (Sexton, 2002Sexton, Jamie. (2002). Grierson’s machines: “Drifters”, the Documentary Film Movement and the negotiation of modernity. Canadian Journal of Film Studies , 11/1, p. 40-59. Disponível em <Disponível em https://www.jstor.org/stable/24408181 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 50). Não existe, assim, qualquer sugestão crítica ao sentido que essa história toma, e nem aos lugares sociais ocupados pelos personagens. Isso porque as classes trabalhadoras, em Drifters, não são revolucionárias, mas “protagonistas de um drama entre natureza, homem e máquina” (Sexton, 2002Sexton, Jamie. (2002). Grierson’s machines: “Drifters”, the Documentary Film Movement and the negotiation of modernity. Canadian Journal of Film Studies , 11/1, p. 40-59. Disponível em <Disponível em https://www.jstor.org/stable/24408181 >. Acesso em 27 ago. 2020.
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: 49), e, ainda que contribuam para a modernização do Império, seu lugar nessa modernidade parece não ser outro além da mão de obra, de ser essa extensão da maquinaria.

Compreende-se, visualmente, a proposta democrática do autor, pensada segundo os princípios da justiça social e da ordem social - não há justiça sem ordem, e vice-versa. No caso, a justiça é garantir o trabalho para quem precisa e, a julgar pelo ânimo de todas as pessoas que aparecem no filme, isso parece ser suficiente para a existência. Cada um faz o que sabe, para o bem maior da nação, no caso, do Império Britânico. As adversidades mostradas no filme são todas relacionadas à natureza: o mar agitado, os cações que destroem as redes e devoram os arenques, a tempestade em alto mar - jamais questões de ordem política, social ou econômica. Uma vez dominada a natureza, o que resta é a harmonia social e o progresso.

ENTRE PALAVRAS E IMAGENS

Grierson foi o líder do movimento britânico do filme documental que começou em 1929, e, como este trabalho aponta, defensor convicto das possibilidades educativas e democráticas desse produto cultural. Convencer o EMP de que realizar um filme seria importante para efeitos de uma publicidade positiva do Império Britânico foi fundamental para que Drifters nascesse e se tornasse um emblema desse movimento de grande relevância em termos de cultura visual. Propaganda, nesse caso, passa por discussões como democracia e participação popular na economia nacional, ou seja, pela valorização das classes populares na constituição do império. Recordemos que para Grierson (apud Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.: 70) o cinema levaria o homem do campo para o homem da cidade e a estação de pesquisa para o trabalhador, diminuindo distâncias, ligando todos os cidadãos do império.

Grierson é diretor de um filme só, embora tenha produzido vários e influenciado tantos outros, sobretudo por ter sido o responsável por vasta produção escrita sobre o tema - assim, seu projeto é constituído por imagens e palavras. Seu cinema se pretende educativo, uma ferramenta de conscientização dos trabalhadores, no sentido de construir um sentimento cívico. Em Drifters, esse caráter pedagógico reside na explicação de todo o processo de pesca do arenque e em apontar a relevância disso nas relações comerciais do Império Britânico, bem como na sua expansão.

O trabalhador, figura coletiva homogeneamente figurada no filme, não questiona sua atividade, mas a realiza com dedicação e sentimento de solidariedade. Outra questão semelhante está na divisão do trabalho social e sexual: existe um lugar para cada um na estrutura social e todos podem colaborar, desde que tenham consciência disso. Nesse caso, a disciplina é um elemento essencial. Esse aspecto, tributário do pensamento positivista, é para Grierson um caminho para a harmonia social. Essa disciplina, como foi apontado, pode ser relacionada à formação calvinista do diretor.

Para ele, ainda, a mecanização do trabalho no mundo moderno depende da força humana e isso não é um problema. Ao contrário, a ideia de propaganda pregada pelo diretor escocês é justamente construída na chave de participação do povo no progresso da indústria britânica17 17 Aliás, em 1931 é lançado o filme Industrial Britain, dirigido por Robert Flaherty e produzido em parceria com Grierson. , progresso esse que se traduz em uma locomotiva na última cena de Drifters.

Se podemos perceber certo viés positivista em suas proposições, ou que ele se esquiva em apontar contradições sociais (em especial, as do mundo do trabalho), não se pode dizer que produz um cinema autoritário ou meramente apologista de quem o financia. Mostrar pescadores e toda uma massa anônima era uma propaganda da nação, de sua unidade e do sentimento de coletividade, e, para Grierson, isso era ser moderno e significava defender a democracia.

REFERÊNCIAS

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  • Wölfflin, Heinrich. (1989). Conceitos fundamentais da História da Arte: o problema da evolução dos estilos na arte mais recente. São Paulo: Martins Fontes .

NOTAS

  • 1
    A Sociedade das Nações ou Liga das Nações foi criada ao final da Primeira Guerra Mundial, tendo em vista fornecer um novo órgão diplomático para as seis maiores potências mundiais, a saber, Rússia, Áustria, Alemanha, Itália, França e Grã-Bretanha. Em seu primeiro encontro, acontecido em 1919, criou-se um comitê técnico para desenvolver questões culturais, além de econômicas e sociais, tais como: desenvolvimento infantil; uso de drogas e prostituição; trabalho (Organização Internacional do Trabalho); trânsito e comunicação; e saúde e higiene (Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
    https://www.utpjournals.press/doi/abs/10...
    : 82).
  • 2
    Nessa época, havia não apenas o interesse em se educar pelos filmes, mas também em educar para o cinema (Druick, 2007Druick, Zoë. (2007). The International Educational Cinematograph Institute, reactionary modernism, and the formation of film studies. In: Canadian Journal of Film Studies, 16/1, p. 80-97. Disponível em <Disponível em https://www.utpjournals.press/doi/abs/10.3138/cjfs.16.1.80 >. Acesso em 27 ago. 2020.
    https://www.utpjournals.press/doi/abs/10...
    : 88). Um dos pioneiros nesse sentido seria John Grierson, como será explicado adiante neste artigo. Raymond Williams, já nos anos de 1950, elaboraria a proposta de uma crítica fílmica capaz de ser aplicada na educação de adultos, em aulas tutoriais, no sentido de se pensar a mudança social a partir dessa formação (Paixão & Trevisan, 2019Paixão, Alexandro Henrique & Trevisan, Anderson Ricardo. (2019). Cinema educativo em cena: Raymond Williams, análise fílmica e produção de um saber. ETD - Educação Temática Digital, 21/3, p. 738-759. Disponível em <Disponível em https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/etd/article/view/8652292 >. Acesso em 19 set. 2022.
    https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/in...
    ), algo que estava no horizonte de Grierson, como também será discutido adiante.
  • 3
    A concepção de Grierson como personalidade singular foi inspirada naquilo que teorizou Paixão (2017Paixão, Alexandro Henrique. (2017). Leitores de tinta e papel: elementos constitutivos para o estudo do público literário no século XIX. Campinas: Mercado de Letras.: 35) acerca de Alexandre Dumas, como um escritor que foi ponto de cruzamento de círculos sociais de uma determinada época. Lendo Simmel (e também Kracauer), Paixão nos fornece elementos para uma sociologia dos círculos sociais através de determinadas personalidades e suas obras. O mesmo raciocínio aparece em um dos trabalhos realizados sob sua orientação, que tratava do crítico literário e sociólogo Antonio Candido (Antunes, 2017Antunes, Camila Almeida Vaz. (2017). Os anos de aprendizagem de Antonio Candido (1930-1940). Dissertação de Mestrado. PPGE/Universidade Estadual de Campinas.). Waizbort (2000Waizbort, Leopoldo. (2000). As aventuras de George Simmel. São Paulo: Editora 34.: 234) explica que, para Simmel, “a personalidade exprime uma individualidade distinta da individualidade social, assim como há uma individualidade qualitativa que se diferencia de uma individualidade quantitativa”, o que possibilitou que o autor, Simmel, se dedicasse ao estudo de personalidades consideradas grandes, como Goethe, Michelangelo, Botticelli ou Beethoven. Sousa (2014Sousa, Jessé. (2014). Introdução. In: Sousa, Jessé & Öelze, Berthold (orgs.). Simmel e a modernidade. Brasília: Editora UnB, p. 9-20.: 15) esclarece que, num mundo de quantificações, Simmel defende que apenas o singular estabelece qualidades: “A figura do artista e do pensador tornam-se, assim, repositórios da reação contra o espírito moderno do cálculo e da redução de qualidade a quantidade”. Para Simmel (2006Simmel, Georg. (2006). Questões fundamentais da sociologia: indivíduo e sociedade. Rio de Janeiro: Zahar .: 28), a vida social deve ser pensada na “tessitura da natureza com a criatividade dos indivíduos”, uma vez que “[…] o absoluto só vive na forma do individual, [e a] a individualidade não é uma limitação do infinito, e sim sua expressão e seu reflexo […]” (Simmel, 2006Simmel, Georg. (2006). Questões fundamentais da sociologia: indivíduo e sociedade. Rio de Janeiro: Zahar .: 114). Grierson é pensado, aqui, como figura central no cinema documental britânico, tanto pela produção de uma obra singular (Drifters), quanto por sua posição como eixo e fundador de um movimento maior, o British Documentary Movement, que influenciou o cinema documental em diversas partes do mundo, incluindo o Brasil (Druick & Williams, 2014Druick, Zoë & Williams, Deane. (2014). The Grierson Effect: tracing documentary’s international movement. Londres: Palgrave Macmillan.: 230), sendo, dessa forma, uma personalidade singular para a compreensão desse processo.
  • 4
    Segundo Barnouw, o sucesso de Drifters significou uma nova carreira para Grierson: ao invés de dirigir novas produções, tornou-se um organizador criativo de projetos do gênero no Empire Marketing Board (Barnouw, 1993Barnouw, Erik. (1993). Documentary: a history of the non-fiction film. 2. ed. Oxford: Oxford University Press .: 89). Para uma problematização acerca do conceito de “obra” de Grierson, ver Menezes (2008Menezes, Paulo. (2008). Documentário social inglês: problematizando a “obra” de Grierson. In: Hamburger et al. (orgs.). Estudos de Cinema Socine. São Paulo: Annablume, v. 9, p. 183-190.).
  • 5
    Para Grierson, o documentário não poderia se prender à descrição superficial do assunto, mas deveria revelar a sua realidade de forma explosiva, exagerada. Nesse sentido, ele fazia uma distinção entre o documentário romântico e o documentário realista, que era aquele que ele realizava e defendia (Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.: 66).
  • 6
    A seção “Metodologia” trará mais elementos para essa discussão.
  • 7
    Sobre esse assunto, ver Gombrich (1999Gombrich, Ernst Hans. (1999). História social da arte. In: Gombrich, Ernst Hans. Meditações sobre um cavalinho de pau e outros ensaios sobre teoria da arte. São Paulo: Edusp, p. 86-95.), Ginzburg (2003Ginzburg, Carlo. (2003). De Warburg a Gombrich: notas sobre um problema de método. In: Ginzburg, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das Letras, p. 41-93.) e Trevisan (2019Trevisan, Anderson Ricardo. (2019). Imagem, sociedade e conhecimento: da História Cultural à Sociologia da Arte. Leitura: teoria e prática, 37/77, p. 113-128. Disponível em <Disponível em https://ltp.emnuvens.com.br/ltp/article/view/810 >. Acesso em 19 set. 2022.
    https://ltp.emnuvens.com.br/ltp/article/...
    ).
  • 8
    Não se trata, porém, de limitar-se ao registro formalista, que concebe os produtos da arte como autônomos em relação à sociedade - algo que estaria próximo ao que faz Heinrich Wölfflin (1989Wölfflin, Heinrich. (1989). Conceitos fundamentais da História da Arte: o problema da evolução dos estilos na arte mais recente. São Paulo: Martins Fontes .), que pensa as formas artísticas em si mesmas, trabalhando apenas no registro da evolução dos estilos, sem se preocupar com as relações dessas mudanças com a sociedade. Segundo Holly (1985Holly, Michael Ann. (1985). Panofsky and the foundations of art history. New York: Cornell University Press.: 85), a perspectiva de Wölfflin pode ser considerada positivista, por conta da plena autonomia que ela dá às formas em suas análises, ignorando a existência do mundo social.
  • 9
    Como aponta Paulo Menezes (2017Menezes, Paulo. (2017). Sociologia e cinema: aproximações teórico-metodológicas. Teoria e Cultura, 12/2, p. 17-36.: 25), trata-se de uma herança teórica não citada, mas perceptível em suas proposições.
  • 10
    Nesse caso, a principal referência é Haskell (1997Haskell, Francis. (1997). Mecenas e pintores: arte e sociedade na Itália barroca. São Paulo: Edusp .).
  • 11
    Para produzir esse filme, Grierson conseguiu £ 2500 do EMB, que teve seu lançamento no London Film Society em 1929 (Barnouw, 1993Barnouw, Erik. (1993). Documentary: a history of the non-fiction film. 2. ed. Oxford: Oxford University Press .: 87).
  • 12
    O EMB foi peça importante na consolidação do Império Britânico, e com Grierson a instituição começou a investir também em produções fílmicas (Menezes, 2004Menezes, Paulo. (2004). O cinema documental como representificação: verdades e mentiras nas relações (im)possíveis entre representação, documentário, filme etnográfico, filme sociológico e conhecimento. In: Novaes, Sylvia Caiuby et al. (orgs.). Escrituras da imagem. São Paulo: Edusp /Fapesp, p. 21-48.: 41). O órgão foi extinto em 1933 e a produção de filmes passou a ficar a cargo do General Post Office (GPO).
  • 13
    Grierson viveu no Canadá de 1939 a 1945, sendo um dos responsáveis pela criação do National Film Board of Canada.
  • 14
    Foi Grierson que apresentou O Encouraçado Potemkin (1925) ao público estadunidense. Para ele, esse filme foi uma grande referência no sentido de compreender o poder que o cinema pode exercer (Hardy, 1979Hardy, Forsyth. (1979). John Grierson: a documentary biography. Londres: Faber and Faber.: 41).
  • 15
    A relação entre textos e imagens na arte e na literatura de viagem foi discutida em Trevisan (2010Trevisan, Anderson Ricardo. (2010). Imagens e textos explicativos na investigação sociológica: apontamentos teóricos para ler a Viagem pitoresca e histórica ao Brasil de Debret (1768-1848). Cadernos Ceru, 21/2, p. 153-169. Disponível em <Disponível em https://www.revistas.usp.br/ceru/article/view/11922 >. Acesso em 9 set. 2022.
    https://www.revistas.usp.br/ceru/article...
    ).
  • 16
    Conceito utilizado na Sociologia do Cinema proposta por Pierre Sorlin que permite analisar como o meio social configura-se nos filmes e sob quais mecanismos de regulação. Dessa forma, torna-se possível ao analista relacionar o filme a valores da sociedade de onde ele surge (Sorlin, 1977Sorlin, Pierre. (1977). Sociologie du cinéma: ouverture pour l’histoire de demain. Paris: Aubier Montaigne.: 241).
  • 17
    Aliás, em 1931 é lançado o filme Industrial Britain, dirigido por Robert Flaherty e produzido em parceria com Grierson.

NOTAS

  • *
    O autor agradece à Fapesp pelo apoio (Processo: 19/23656-5).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    16 Fev 2021
  • Revisado
    27 Set 2021
  • Aceito
    03 Jan 2022
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