Resumos
Objetivo
Relacionar o uso do capacete à gravidade dos traumatismos crâniocerebrais em motociclistas acidentados atendidos em hospital de trauma.
Métodos
Estudo transversal, retrospectivo. A população foi constituída de 188 registros de atendimento a motociclistas acidentados no período de quatro meses. Para caracterizar a gravidade do trauma foi utilizada a Escala de Coma de Glasgow.
Resultados
Perfil: 84,6% sexo masculino, sendo 55,3% entre 18 e 29 anos. Quanto ao uso de capacete no momento do acidente: 51,6% usavam; 6,4% não usavam; 17,6% usaram inadequadamente; 24,5% não ocorreram registros. Dos 51,6% de motociclistas que utilizavam o equipamento de proteção, 86,6% apresentaram Traumatismos Craniocerebrais leve; 12,4% moderado; e 1% grave. Os traumatismos graves ocorreram mais nos motociclistas em que não havia registro sobre o uso do capacete.
Conclusão
Os motociclistas que utilizaram o capacete apresentaram trauma crâniocerebral leve em 44,7%, moderado em 6,4% e grave em 0,5%. As vítimas sem registro da situação do uso do capacete tiveram traumatismos graves (p≤0,000).
Acidentes de trânsito; Serviços médicos de emergência; Traumatismos craniocerebrais; Motocicletas
Objective
Relating the helmet use with the severity of craniocerebral trauma in injured motorcyclists treated at a trauma hospital.
Methods
A cross-sectional, retrospective study. The study population consisted of 188 records of service to injured motorcyclists in a four-month period. The Glasgow Coma Scale was used to characterize the severity of trauma.
Results
The profile is 84.6% of males and 55.3% aged between 18 and 29 years. Regarding the use of helmet at the time of the accident, 51.6% used, 6.4% did not use, 17.6% used it inappropriately, and there were no records in 24.5%. Among the 51.6% of motorcyclists who used the protective gear, 86.6% had mild craniocerebral trauma, 12.4% had moderate, and 1% severe. The most serious injuries occurred in motorcyclists in which there were no records on helmet use.
Conclusion
The motorcyclists who used the helmet, had mild craniocerebral trauma in 44.7% of cases, moderate trauma in 6.4%, and severe trauma in 0.5%. Victims without records of the situation of helmet use had severe trauma (p≤0.000).
Accidents, traffic; Emergency medical services; Brain injuries; Motorcycle
Introdução
Nos últimos anos, a estabilidade econômica brasileira proporcionou o crescimento
de diversos setores produtores de bens de consumo, registrando aumento de 250%
no mercado de automóveis, motocicletas e caminhões.(11 . Departamento Nacional de Trânsito. Frota de veículos [Internet].
[citado 2013 Abr 20]. Disponível em:
www.denatran.gov.br/frota.htm.
www.denatran.gov.br/frota.htm...
) Neste contexto de expansão, constata-se aumento
na produção de automóveis e de motocicletas não somente no Brasil, mas em nível
mundial.(22 . Carrasco CE, Godinho M, Barros MB, Rizoli S, Fraga GP. Fatal
motorcycle crashes: a serious public health problem in Brazil. World J Emerg
Surg. 2012; 7(Suppl 1):S5.
3 . Philip AF, Fangman W, Liao J, Lilienthal M, Choi K. Helmets
prevent motorcycle injuries with significant economic benefits. Traffic Inj
Prev. 2013; 14(5):496-500.
4 . Crandon IW, Harding HE, Cawich SO, McDonald AH, Fearron-Boothe D.
Motorcycle accident injury profiles in Jamaica: an audit from the University
Hospital of the West Indies. Int J Inj Contr Saf Promot. 2009 Sep;
16(3):175-8.-55 . Saidi H, Mutisto B. Motorcycle injuries at a tertiary referral
hospital in kenya: injury patterns and outcome. Eur J Trauma Emerg Surg. 2013;
39(5):481-5.)
A utilização da motocicleta como meio de locomoção e trabalho representa um fenômeno ocasionado pela facilidade de sua aquisição e manutenção, aliada à agilidade que este meio de transporte possibilita, explicando o crescimento da venda desta no mercado.(66 . Silva DW, Soares DA, Andrade SM. [Professional performance of motorcyclists and factors associated to the traffic accidents occurrence in Londrina-PR]. Epidemiol Servi Saúde. 2008; 17(2):135-7. Portuguese.) O aumento da quantidade de veículos, principalmente motocicletas, trafegando nas cidades e rodovias do país trouxe como consequência negativa o aumento das ocorrências e um grande número de vítimas de acidentes.(22 . Carrasco CE, Godinho M, Barros MB, Rizoli S, Fraga GP. Fatal motorcycle crashes: a serious public health problem in Brazil. World J Emerg Surg. 2012; 7(Suppl 1):S5.,77 . Silva DW, Andrade SM, Soares DA, Soares DP, Mathias TA. [Work profile and traffic accidents among motorcycle couriers in two medium-sized cities in the State of Paraná, Brazil]. Cad Saúde Pública. 2008; 24(11):2643-52. Portuguese.)
O Brasil tem um dos trânsitos mais perigosos do mundo, apresentando um acidente
para cada lote de 410 veículos em circulação, enquanto na Suécia é de 1/21.400
veículos. Estes números refletem um problema de graves consequências para a
sociedade, considerando-se a morbidade, como a invalidez total ou parcial, além
do alto custo financeiro decorrente.(88 . Marín L, Queiroz MS. [Car accidents in the age of speed: an
overview]. Cad Saúde Pública. 2000; 16(1):7-21. Portuguese.) Os acidentes de trânsito custam aos cofres públicos
aproximadamente R$ 28 milhões por ano, sem contabilizar os custos
indiretos.(11 . Departamento Nacional de Trânsito. Frota de veículos [Internet].
[citado 2013 Abr 20]. Disponível em:
www.denatran.gov.br/frota.htm.
www.denatran.gov.br/frota.htm...
,33 . Philip AF, Fangman W, Liao J, Lilienthal M, Choi K. Helmets
prevent motorcycle injuries with significant economic benefits. Traffic Inj
Prev. 2013; 14(5):496-500.)
Os acidentes que vitimam motociclistas configuram um problema de saúde pública de
grande magnitude e transcendência, com forte impacto na morbidade e mortalidade
da população. No conjunto de lesões decorrentes de causas externas, o
Traumatismo Craniocerebral destaca-se em termos de magnitude, sobretudo como
causa de morte e incapacidade, especialmente de jovens em idade
produtiva.(22 . Carrasco CE, Godinho M, Barros MB, Rizoli S, Fraga GP. Fatal
motorcycle crashes: a serious public health problem in Brazil. World J Emerg
Surg. 2012; 7(Suppl 1):S5.,99 . Feitosa MS, Faria AL, Figueira MS, Nakamiti MC, Santos TC.
Traumatismo cranioencefálico: morbidade e a mortalidade [Internet]. Paraíba:
Univap; 2011 [citado 2013 Abr. 10]. Disponível em:
http://www.inicepg.univap.br/cdINIC_2011/anais/
arquivos/0003_0208_01.pdf.
http://www.inicepg.univap.br/cdINIC_2011...
)
A avaliação inicial do paciente vítima de Traumatismo Craniocerebral inclui a Escala de Coma de Glasgow, dados relativos ao acidente e tomografia computadorizada. Esta Escala determina a gravidade dos Traumatismos Craniocerebrais, quantificando os achados neurológicos resultantes do somatório dos escores da avaliação de abertura ocular, resposta verbal e resposta motora, avaliando a profundidade e duração clínica de inconsciência e coma.(1010 . Settervall CH, Souza RM, Silva SC. [In-hospital mortality and the Glasgow Coma Scale in the first 72 hours after traumatic brain injury]. Rev Latinoam Enferm. 2011; 19(6):1337-43. Portuguese.)
A utilização de equipamentos de segurança, sobretudo do capacete, representa um
importante atenuante das implicações decorrentes do acidente de motocicleta,
sendo observado quando a vítima recebe o atendimento de emergência; portanto,
torna-se imprescindível a utilização correta deste item de proteção. O capacete
tem como objetivo atenuar o choque decorrente do impacto.(1111 . Organização Pan-Americana da Saude. Capacetes: manual de segurança
no transito para os gestores e profissionais de saúde [Internet]. Organização
Pan-Americana da Saude; Organização Mundial da Saude; 2007.[citado 2013 Mai 10].
Disponível em:
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241562994_por.pdf.
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241...
)
Na colisão de uma motocicleta, o motociclista é atirado para fora do veículo. O
movimento de sua cabeça para frente é interrompido ao atingir um obstáculo, mas
o cérebro continua até bater na parte interna do crânio e retornar, atingindo o
lado oposto, podendo resultar em uma lesão menor ou fatal.(1111 . Organização Pan-Americana da Saude. Capacetes: manual de segurança
no transito para os gestores e profissionais de saúde [Internet]. Organização
Pan-Americana da Saude; Organização Mundial da Saude; 2007.[citado 2013 Mai 10].
Disponível em:
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241562994_por.pdf.
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241...
) Os motociclistas que não usam
capacete correm um risco muito maior de sofrer lesões traumáticas na cabeça e no
cérebro ou uma combinação delas. Os capacetes criam uma camada protetora
adicional para a cabeça, resguardando o usuário de algumas das mais graves
formas de lesão cerebral traumática.(1111 . Organização Pan-Americana da Saude. Capacetes: manual de segurança
no transito para os gestores e profissionais de saúde [Internet]. Organização
Pan-Americana da Saude; Organização Mundial da Saude; 2007.[citado 2013 Mai 10].
Disponível em:
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241562994_por.pdf.
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241...
) Portanto, as vítimas de acidentes de motocicletas
sofrem menos lesões com o uso do capacete de proteção, reduzindo em dois terços
o risco de ferimentos na cabeça e pela metade na coluna cervical.(33 . Philip AF, Fangman W, Liao J, Lilienthal M, Choi K. Helmets
prevent motorcycle injuries with significant economic benefits. Traffic Inj
Prev. 2013; 14(5):496-500.)
A principal causa de morte entre usuários de motocicletas e bicicletas são lesões
na cabeça e no pescoço. Nos países europeus, lesões na cabeça contribuem
aproximadamente em 75% das mortes entre usuários de veículos motorizados de duas
rodas; em alguns países de baixa e média renda, estima-se que as lesões na
cabeça sejam responsáveis por 88% das mortes. Fraturas de nariz, mandíbula,
afundamento da face e do crânio, além de lesões no globo ocular e arcada
dentária estão entre as ocorrências mais comuns.(1111 . Organização Pan-Americana da Saude. Capacetes: manual de segurança
no transito para os gestores e profissionais de saúde [Internet]. Organização
Pan-Americana da Saude; Organização Mundial da Saude; 2007.[citado 2013 Mai 10].
Disponível em:
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241562994_por.pdf.
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241...
)
Frente a este contexto surgiu o interesse em investigar a questão: a gravidade dos Traumatismos Craniocerebrais tem relação com o uso do capacete em acidentados de motociclistas? Para responder ao questionamento de pesquisa definiu-se como objetivo relacionar o uso do capacete à gravidade dos Traumatismos Craniocerebrais, através da utilização da Escala de Coma de Glasgow em motociclistas acidentados atendidos em hospital de trauma.
Métodos
Trata-se de um estudo transversal retrospectivo quantitativo realizado no setor de emergência de um hospital de trauma localizado em Porto Alegre/RS, Brasil. Esta instituição integra o Sistema Único de Saúde (SUS), sendo referência em trauma na zona norte da cidade.
A população constituiu-se de registros dos pacientes vítimas de acidentes motociclísticos atendidos na emergência do hospital com diagnóstico de Traumatismos Craniocerebrais, entre 01/10/2012 e 31/01/2013. A amostra considerou todos os pacientes que internaram na emergência do hospital de estudo durante o período definido para a pesquisa. Os critérios de inclusão foram: registros dos pacientes acidentados de motocicleta com diagnóstico médico de Traumatismo Craniocerebral, independentemente se havia registro do uso do capacete. Neste serviço a média de atendimento de vítimas de acidentes motociclísticos é de 200/mês, dos quais 25% apresentam Traumatismo Craniocerebral. Não houve necessidade de realizar cálculo amostral, visto que foram selecionados todos os registros (100%) de pacientes que ingressaram no hospital devido à acidente de motocicleta com Traumatismo Craniocerebral , durante o período estudado, resultando em 188 registros. Elaborou-se como instrumento de coleta dos dados uma planilha em Excel com as seguintes variáveis: idade, sexo, uso de capacete, gravidade do Traumatismo Craniocerebral e posição ocupada no veículo.
Utilizou-se para análise dos dados coletados o software para a análise estatística SPSS versão 13.0. Os dados foram analisados através de tabelas e porcentagens simples. Para a verificação de associação significativa entre as variáveis utilizou-se o Teste Exato de Fisher. Nas análises dos resultados o nível de significância máximo assumido foi de 5% (p≤0,05).
O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.
Resultados
Quanto ao perfil da amostra, 84,6% dos 188 pacientes foram identificados do sexo masculino, sendo que 55,3% encontravam-se na faixa etária entre 18 e 28 anos.
Em relação ao uso do capacete, em 51,6% havia o registro do uso; em 17,6% o registro de uso foi considerado inadequado, pois ocorreu queda do equipamento no momento do acidente; e em 6,4% não foi utilizado. Chama atenção que em 24,5% dos casos não havia registro do uso ou não do referido equipamento.
A distribuição das vítimas de acidentes motociclísticos com Traumatismos Craniocerebrais em relação ao uso de capacete e as variáveis: idade, sexo, posição do motociclista, local do trauma e gravidade da lesão são apresentados na tabela 1.
Observa-se que a faixa etária entre 18 e 28 anos correspondeu à maioria das vítimas que perdeu o equipamento por ocasião do acidente.
As 188 vítimas sofreram 277 traumas na região da cabeça, correspondendo a mais de um trauma por paciente. Todas tiveram trauma de crânio, além de trauma na mandíbula, face e no pescoço. Também ocorreram traumas oculares e dentários, em menor frequência. As lesões na face podem estar associadas ao não uso do equipamento de proteção ou ao uso inadequado. Verificou-se ainda a ocorrência de traumas de nariz e mandíbula nas vítimas que faziam uso do capacete. O trauma na mandíbula foi observado com maior frequência nas vítimas que usaram inadequadamente o capacete. Os traumas na face e pescoço foram mais frequentes nas vítimas sem registro de uso do equipamento de proteção.
Através dos resultados do teste Exato de Fisher, verifica-se que
existe associação significativa do uso do capacete com a variável
Glasgow. Para esta variável, observa-se que os pacientes
que usavam capacete foram associados à classificação leve (1313 . Brasil. Código de Trânsito Brasileiro. Instituído pela Lei nº
9.503, de 23 de setembro de 1997 [Internet]. Brasília: Denatran; 2008 [citado
2013 Abr. 20]. Disponível em:
http://www.denatran.gov.br/publicacoes/download/ctb_e_legislacao_complementar.pdf.
http://www.denatran.gov.br/publicacoes/d...
a 1515 . Andrade LM, Lima MA, Silva CH, Caetano JA. [Motorcycle accidents:
characteristics of the victims and accidents at a hospital in Fortaleza - CE,
Brazil]. Rev Rene. 2009;10(4):52-9. Portuguese. pontos);
naqueles em que o uso do capacete foi identificado como inadequado à
classificação moderado (99 . Feitosa MS, Faria AL, Figueira MS, Nakamiti MC, Santos TC.
Traumatismo cranioencefálico: morbidade e a mortalidade [Internet]. Paraíba:
Univap; 2011 [citado 2013 Abr. 10]. Disponível em:
http://www.inicepg.univap.br/cdINIC_2011/anais/
arquivos/0003_0208_01.pdf.
http://www.inicepg.univap.br/cdINIC_2011...
a 1212 . Tavares-Filho R, Souza JN, Brasileiro ME. [Motorcycle accidents:
Nursing carein emergency situations]. Rev Eletr Enferm Cent Est Enferm Nutrição.
2012; 3(3):1-20. Portuguese. pontos); e os graves (33 . Philip AF, Fangman W, Liao J, Lilienthal M, Choi K. Helmets
prevent motorcycle injuries with significant economic benefits. Traffic Inj
Prev. 2013; 14(5):496-500. a 8 pontos) foram aqueles nos quais não
havia registro (p≤0,000).
Na tabela 2 apresentam-se as vítimas de acidentes motociclísticos com Traumatismo Craniocerebral em relação à gravidade do Trauma avaliado pela Escala de Coma de Glasgow com as variáveis: mês, idade, sexo, posição e local do trauma.
Quanto à gravidade dos Traumatismos Craniocerebrais sofridos pelas vítimas, 141 (50,9%) foram classificados como leve; 40 (14,4%) moderada; e 7 (2,5%) grave. A faixa etária predominante das vítimas com trauma leve, moderado e grave também foi entre 18 e 28 anos.
Em relação à posição de ocupação no veículo, identificou-se que 83% das vítimas eram os condutores e 17% estavam na carona. Evidenciou-se 21 (11%) vítimas de fraturas de mandíbula entre os condutores; 15 (8%) com trauma na face; 14 (7%) com trauma nasal, seguido do trauma em pescoço 13 (7%), denotando o uso inadequado do equipamento de proteção.
Discussão
Embora os resultados desta pesquisa esbarrem na limitação de uma amostra pequena, não abrangente de uma avaliação anual, consideram-se representativos do fenômeno estudado, contribuindo para o esclarecimento do tema e apontando evidências que ratificam resultados de outras pesquisas. O enfermeiro participa do atendimento à saúde desde o nível primário ao terciário. Os resultados sustentam o planejamento e o desenvolvimento tanto de ações preventivas quanto de recuperação para a prática do enfermeiro, podendo impactar na diminuição da morbimortalidade. Quando o acidente ocorre, o enfermeiro presta atendimento em todas as etapas, envolvendo-se desde o atendimento pré-hospitalar até a reabilitação. Portanto, quanto mais evidências melhor a ação tanto na prevenção quanto no atendimento às vítimas, uma vez que os motociclistas têm a segunda maior taxa de internação hospitalar por acidente de trânsito, perdendo apenas para os pedestres.(1212 . Tavares-Filho R, Souza JN, Brasileiro ME. [Motorcycle accidents: Nursing carein emergency situations]. Rev Eletr Enferm Cent Est Enferm Nutrição. 2012; 3(3):1-20. Portuguese.)
Um aspecto surpreendente nesta pesquisa refere-se ao fato de cinco dos condutores
serem da faixa etária entre 16 e 17 anos, visto que no Brasil a idade mínima
legal para obtenção da carteira de motociclista é 18 anos.(1313 . Brasil. Código de Trânsito Brasileiro. Instituído pela Lei nº
9.503, de 23 de setembro de 1997 [Internet]. Brasília: Denatran; 2008 [citado
2013 Abr. 20]. Disponível em:
http://www.denatran.gov.br/publicacoes/download/ctb_e_legislacao_complementar.pdf.
http://www.denatran.gov.br/publicacoes/d...
)
O perfil da amostra deste estudo foi de 84,6% homens, a maioria na faixa etária
entre 18 e 28 anos, o que vem ao encontro de outras pesquisas que evidenciaram
altos índices de acidentes com motociclistas do sexo masculino(44 . Crandon IW, Harding HE, Cawich SO, McDonald AH, Fearron-Boothe D.
Motorcycle accident injury profiles in Jamaica: an audit from the University
Hospital of the West Indies. Int J Inj Contr Saf Promot. 2009 Sep;
16(3):175-8.,55 . Saidi H, Mutisto B. Motorcycle injuries at a tertiary referral
hospital in kenya: injury patterns and outcome. Eur J Trauma Emerg Surg. 2013;
39(5):481-5.,1414 . Cavalcante JR, Oka CS, de Santana Santos T, Dourado E, de Oliveira
E Silva ED, Gomes AC. Influence of helmet use in facial trauma and moderate
traumatic brain injury victims of motorcycle accidents. J Cranifac Surg. 2012;
23(4): 982-5.,1515 . Andrade LM, Lima MA, Silva CH, Caetano JA. [Motorcycle accidents:
characteristics of the victims and accidents at a hospital in Fortaleza - CE,
Brazil]. Rev Rene. 2009;10(4):52-9. Portuguese.) e do envolvimento destes em
acidentes de trânsito, por serem condutores de veículos, possuírem habilitação e
terem aprendido a dirigir com menor idade.(1616 . Santos AM, Moura ME, Nunes BM, Leal CF, Teles JB. [Profile of
motorcycle accident victims treated at a public hospital emergency department].
Cad Saúde Pública. 2008; 24(8):1927-38. Portuguese.) A idade entre 18 e 28 anos relaciona-se principalmente
à liberação para dirigir, passando a constituir uma população de alto risco pela
inexperiência na condução de veículos, pela impulsividade característica da
idade, além de outros fatores como o consumo de álcool e outras drogas, aliados
à deficiente fiscalização do Estado.(11 . Departamento Nacional de Trânsito. Frota de veículos [Internet].
[citado 2013 Abr 20]. Disponível em:
www.denatran.gov.br/frota.htm.
www.denatran.gov.br/frota.htm...
55 . Saidi H, Mutisto B. Motorcycle injuries at a tertiary referral
hospital in kenya: injury patterns and outcome. Eur J Trauma Emerg Surg. 2013;
39(5):481-5.)
Pesquisa realizada na cidade de Fortaleza-CE com vítimas de acidentes com
motocicletas teve resultados semelhantes, com predomínio do sexo masculino, na
faixa etária entre 18 e 29 anos. Jovens são vítimas mais frequentes por
apresentarem determinados comportamentos socioculturais, assumindo maior risco
na condução de veículos.(1515 . Andrade LM, Lima MA, Silva CH, Caetano JA. [Motorcycle accidents:
characteristics of the victims and accidents at a hospital in Fortaleza - CE,
Brazil]. Rev Rene. 2009;10(4):52-9. Portuguese.)
Ao relacionar as variáveis pesquisadas neste estudo, evidenciou-se a relação mais significativa entre o uso de capacete com a classificação do Traumatismo Craniocerebral. A maior parte das vítimas (51,6%) que fazia uso efetivo do equipamento foi acometida de traumas menos graves, apresentando Traumatismo Craniocerebral conforme Escala de Coma de Glasgow: 44,7% leve, 6,4% moderado e 0,5% grave. Nos casos em que a vítima usou inadequadamente o capacete, os traumas foram em média 10,7% leve, 12,2% moderado e 1% grave, observando-se o dobro dos percentuais em relação aos traumas moderados e graves nestas vítimas. O Glasgow grave foi maior naquelas vítimas nas quais não constava o registro da informação sobre uso do capacete no momento do acidente. Acredita-se que a omissão da informação acerca do uso do capacete no local do acidente esteja relacionada aos futuros entraves jurídicos decorrentes do registro do não uso do equipamento de proteção.
Estudo realizado na Austrália(1717 . McIntosh AS, Curtis K, Rankin T, Cox M, Pang, TY, McCrory P, Finch CF. Associations between helmet use and brain injuries amongst injured pedal - and motor-cyclists: A case series analysis of trauma centre presentations. J Australas Col Road Safety. 2013; 24(2):11-20.) constatou a redução na probabilidade de lesão intracerebral de 66% para motociclistas e ciclistas com uso do capacete. Em outro estudo, realizado em Taiwan,(1818 . Yu WY, Chen CY, Chiu WT, Lin MR. Effectiveness of different types of motorcycle helmets and effects of their improper use on head injuries. Int J Epidemiol. 2011; 40(3):794-803.) os motociclistas sem capacete tiveram mais de quatro vezes a probabilidade de sofrer lesões na cabeça e dez vezes mais propensão a lesões cerebrais.
Pesquisa realizada em Pernambuco no Brasil, evidenciou, nos condutores de motocicleta atendidos após acidente no serviço de urgência, ter sido a cabeça/pescoço a segunda região corpórea mais atingida, enquanto o uso efetivo do capacete reduziu de forma significativa a gravidade destas lesões.(1414 . Cavalcante JR, Oka CS, de Santana Santos T, Dourado E, de Oliveira E Silva ED, Gomes AC. Influence of helmet use in facial trauma and moderate traumatic brain injury victims of motorcycle accidents. J Cranifac Surg. 2012; 23(4): 982-5.,1919 . Farias GM, Barros WC, Rocha KM, Freitas MC, Costas IK, Morais Filho LA. Farias GM, Barros WC, Rocha KM, Freitas MC, Costas IK, Morais Filho LA. Characterization of motorcycle drivers involved in traffic accidents attented at urgency hospital. J Nurs UFPE. 2009; 3(4):898-907. Portuguese.) Constata-se em outra pesquisa, no Rio Grande do Norte, também no Brasil, que a motocicleta foi responsável por 53,2% dos acidentes, com 38,8% dos motociclistas com lesões do tipo leve e moderada e 83,2% apresentando trauma leve.(2020 . Ramos CS. Caracterização do acidente de trânsito e gravidade do trauma: um estudo em vítimas de um Hospital de Urgência em Natal-RN [tese]. Rio Grande do Norte: Universidade Federal do Rio Grande do Norte; 2008.) Tais dados corroboram os índices encontrados nesta pesquisa e salientam a importância do uso do equipamento de proteção para prevenção de lesões de maior gravidade.
Pesquisadores no Estado de Michigan, Estados Unidos, estudaram o
impacto do uso de capacete nos condutores de motocicletas com o custo
hospitalar. Apesar da obrigatoriedade do uso do capacete neste estado, 19% dos
condutores não estavam usando quando colidiram. Os motociclistas sem capacete
sofreram mais lesões na cabeça e no pescoço e tiveram índices mais altos de
lesões graves.(1111 . Organização Pan-Americana da Saude. Capacetes: manual de segurança
no transito para os gestores e profissionais de saúde [Internet]. Organização
Pan-Americana da Saude; Organização Mundial da Saude; 2007.[citado 2013 Mai 10].
Disponível em:
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241562994_por.pdf.
whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241...
) Neste
estudo, 51,6% faziam uso do equipamento e 83% eram os condutores da motocicleta.
Na pesquisa brasileira realizada em Pernambuco, 80,1% faziam uso do
capacete;(1414 . Cavalcante JR, Oka CS, de Santana Santos T, Dourado E, de Oliveira
E Silva ED, Gomes AC. Influence of helmet use in facial trauma and moderate
traumatic brain injury victims of motorcycle accidents. J Cranifac Surg. 2012;
23(4): 982-5.) em
Quênia metade dos pilotos e 20% dos passageiros utilizaram capacete;(55 . Saidi H, Mutisto B. Motorcycle injuries at a tertiary referral
hospital in kenya: injury patterns and outcome. Eur J Trauma Emerg Surg. 2013;
39(5):481-5.) na Jamaica 49,9% usavam
capacete no momento do acidente.(44 . Crandon IW, Harding HE, Cawich SO, McDonald AH, Fearron-Boothe D.
Motorcycle accident injury profiles in Jamaica: an audit from the University
Hospital of the West Indies. Int J Inj Contr Saf Promot. 2009 Sep;
16(3):175-8.) Como o Brasil é um país com grandes diferenças culturais,
observa-se que os percentuais encontrados nesta pesquisa realizada em uma cidade
da região sul foram diferentes dos percentuais encontrados em outra do nordeste
do país; os índices encontrados neste estudo se assemelham mais aos índices
encontrados no Quênia e na Jamaica.
Nesta pesquisa, além dos pacientes apresentarem Traumatismos Craniocerebrais, também ocorreram 89 traumas associados: ocular, nasal, mandíbula, face, dentário e pescoço, sendo que as vítimas que não usavam o capacete, ou o perderam, tiveram dois ou mais traumas. O uso obrigatório e correto do dispositivo de segurança (capacete) pelos motociclistas contribui para que haja uma menor incidência tanto das lesões de tecidos moles quanto das fraturas de face,(1414 . Cavalcante JR, Oka CS, de Santana Santos T, Dourado E, de Oliveira E Silva ED, Gomes AC. Influence of helmet use in facial trauma and moderate traumatic brain injury victims of motorcycle accidents. J Cranifac Surg. 2012; 23(4): 982-5.,2020 . Ramos CS. Caracterização do acidente de trânsito e gravidade do trauma: um estudo em vítimas de um Hospital de Urgência em Natal-RN [tese]. Rio Grande do Norte: Universidade Federal do Rio Grande do Norte; 2008.) confirmado neste estudo.
A não utilização do capacete ou uso não adequado constituem-se ato ilegal, uma
vez que a partir de 1982 a legislação brasileira tornou obrigatório o uso do
capacete. O artigo 244, do Código Brasileiro de Trânsito, considera infração
gravíssima o não uso, tendo como penalidades multa e suspensão do direito de
dirigir e, como medida administrativa, o recolhimento da Carteira Nacional de
Habilitação (CNH).(1313 . Brasil. Código de Trânsito Brasileiro. Instituído pela Lei nº
9.503, de 23 de setembro de 1997 [Internet]. Brasília: Denatran; 2008 [citado
2013 Abr. 20]. Disponível em:
http://www.denatran.gov.br/publicacoes/download/ctb_e_legislacao_complementar.pdf.
http://www.denatran.gov.br/publicacoes/d...
)
Equipamentos de segurança como os capacetes muitas vezes não são usados
por motociclistas, tornando necessárias medidas de educação e
fiscalização.(1212 . Tavares-Filho R, Souza JN, Brasileiro ME. [Motorcycle accidents:
Nursing carein emergency situations]. Rev Eletr Enferm Cent Est Enferm Nutrição.
2012; 3(3):1-20. Portuguese.)
Conclusão
Este estudo permitiu relacionar o uso do capacete à gravidade dos Traumatismos Craniocerebrais dos motociclistas acidentados que receberam atendimento em um serviço de referência em trauma. Os resultados apontaram 51,6% dos motociclistas com uso do capacete no momento do acidente. Houve associação significativa entre a avaliação da Escala de Coma de Glasgow e a gravidade dos Traumatismos Craniocerebrais, evidenciando-se nos motociclistas que utilizaram corretamente o capacete Trauma leve em 44,7%, moderado em 6,4% e grave em 0,5%. As vítimas que não apresentavam registro da situação do uso do capacete tiveram traumatismos graves (p≤0,000).
A prevalência maior ocorreu entre o sexo masculino, na faixa etária entre 18 e 28 anos, e que ocupavam a posição de condutores da motocicleta.
É necessário ampliar as estratégias educativas, associadas às políticas públicas efetivas e ao maior rigor na fiscalização para o uso do capacete, no sentido de reduzir os índices elevados de acidentes envolvendo motociclistas sem uso do capacete, uma vez que todas as pesquisas comprovam a sua eficácia, atenuando a gravidade das lesões. Também é importante maior conscientização dos profissionais da saúde no registro do uso do capacete no momento do atendimento pré-hospitalar.
Agradecimentos
Agradecemos ao suporte institucional recebido para a realização do estudo.
References
-
1Departamento Nacional de Trânsito. Frota de veículos [Internet]. [citado 2013 Abr 20]. Disponível em: www.denatran.gov.br/frota.htm.
» www.denatran.gov.br/frota.htm -
2Carrasco CE, Godinho M, Barros MB, Rizoli S, Fraga GP. Fatal motorcycle crashes: a serious public health problem in Brazil. World J Emerg Surg. 2012; 7(Suppl 1):S5.
-
3Philip AF, Fangman W, Liao J, Lilienthal M, Choi K. Helmets prevent motorcycle injuries with significant economic benefits. Traffic Inj Prev. 2013; 14(5):496-500.
-
4Crandon IW, Harding HE, Cawich SO, McDonald AH, Fearron-Boothe D. Motorcycle accident injury profiles in Jamaica: an audit from the University Hospital of the West Indies. Int J Inj Contr Saf Promot. 2009 Sep; 16(3):175-8.
-
5Saidi H, Mutisto B. Motorcycle injuries at a tertiary referral hospital in kenya: injury patterns and outcome. Eur J Trauma Emerg Surg. 2013; 39(5):481-5.
-
6Silva DW, Soares DA, Andrade SM. [Professional performance of motorcyclists and factors associated to the traffic accidents occurrence in Londrina-PR]. Epidemiol Servi Saúde. 2008; 17(2):135-7. Portuguese.
-
7Silva DW, Andrade SM, Soares DA, Soares DP, Mathias TA. [Work profile and traffic accidents among motorcycle couriers in two medium-sized cities in the State of Paraná, Brazil]. Cad Saúde Pública. 2008; 24(11):2643-52. Portuguese.
-
8Marín L, Queiroz MS. [Car accidents in the age of speed: an overview]. Cad Saúde Pública. 2000; 16(1):7-21. Portuguese.
-
9Feitosa MS, Faria AL, Figueira MS, Nakamiti MC, Santos TC. Traumatismo cranioencefálico: morbidade e a mortalidade [Internet]. Paraíba: Univap; 2011 [citado 2013 Abr. 10]. Disponível em: http://www.inicepg.univap.br/cdINIC_2011/anais/ arquivos/0003_0208_01.pdf.
» http://www.inicepg.univap.br/cdINIC_2011/anais/ arquivos/0003_0208_01.pdf -
10Settervall CH, Souza RM, Silva SC. [In-hospital mortality and the Glasgow Coma Scale in the first 72 hours after traumatic brain injury]. Rev Latinoam Enferm. 2011; 19(6):1337-43. Portuguese.
-
11Organização Pan-Americana da Saude. Capacetes: manual de segurança no transito para os gestores e profissionais de saúde [Internet]. Organização Pan-Americana da Saude; Organização Mundial da Saude; 2007.[citado 2013 Mai 10]. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241562994_por.pdf.
» whqlibdoc.who.int/publications/2006/9241562994_por.pdf -
12Tavares-Filho R, Souza JN, Brasileiro ME. [Motorcycle accidents: Nursing carein emergency situations]. Rev Eletr Enferm Cent Est Enferm Nutrição. 2012; 3(3):1-20. Portuguese.
-
13Brasil. Código de Trânsito Brasileiro. Instituído pela Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 [Internet]. Brasília: Denatran; 2008 [citado 2013 Abr. 20]. Disponível em: http://www.denatran.gov.br/publicacoes/download/ctb_e_legislacao_complementar.pdf.
» http://www.denatran.gov.br/publicacoes/download/ctb_e_legislacao_complementar.pdf -
14Cavalcante JR, Oka CS, de Santana Santos T, Dourado E, de Oliveira E Silva ED, Gomes AC. Influence of helmet use in facial trauma and moderate traumatic brain injury victims of motorcycle accidents. J Cranifac Surg. 2012; 23(4): 982-5.
-
15Andrade LM, Lima MA, Silva CH, Caetano JA. [Motorcycle accidents: characteristics of the victims and accidents at a hospital in Fortaleza - CE, Brazil]. Rev Rene. 2009;10(4):52-9. Portuguese.
-
16Santos AM, Moura ME, Nunes BM, Leal CF, Teles JB. [Profile of motorcycle accident victims treated at a public hospital emergency department]. Cad Saúde Pública. 2008; 24(8):1927-38. Portuguese.
-
17McIntosh AS, Curtis K, Rankin T, Cox M, Pang, TY, McCrory P, Finch CF. Associations between helmet use and brain injuries amongst injured pedal - and motor-cyclists: A case series analysis of trauma centre presentations. J Australas Col Road Safety. 2013; 24(2):11-20.
-
18Yu WY, Chen CY, Chiu WT, Lin MR. Effectiveness of different types of motorcycle helmets and effects of their improper use on head injuries. Int J Epidemiol. 2011; 40(3):794-803.
-
19Farias GM, Barros WC, Rocha KM, Freitas MC, Costas IK, Morais Filho LA. Farias GM, Barros WC, Rocha KM, Freitas MC, Costas IK, Morais Filho LA. Characterization of motorcycle drivers involved in traffic accidents attented at urgency hospital. J Nurs UFPE. 2009; 3(4):898-907. Portuguese.
-
20Ramos CS. Caracterização do acidente de trânsito e gravidade do trauma: um estudo em vítimas de um Hospital de Urgência em Natal-RN [tese]. Rio Grande do Norte: Universidade Federal do Rio Grande do Norte; 2008.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Sep-Oct 2014
Histórico
-
Recebido
3 Jul 2014 -
Aceito
29 Jul 2014