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Identificação das necessidades de apoio em pessoas com doença mental grave utilizando a Escala de Intensidade de Apoios

Resumos

OBJETIVO:

caracterizar o perfil da intensidade das necessidades de apoio em indivíduos com doença mental grave.

METODOLOGIA:

quantitativa, no contexto de um estudo descritivo que utilizou a escala de intensidade de apoios como instrumento, sendo aplicada a amostra constituída por 182 pessoas.

RESULTADOS:

o perfil de intensidade de apoio identifica grupos, pessoas e áreas com diferentes níveis de necessidades de apoio na vida no lar, saúde, comunidade, aprendizagem, emprego e vida social. De modo geral, o perfil identificado foi de baixa intensidade, sendo que as áreas que apresentaram as maiores necessidades foram aquelas correspondentes a emprego e vida social.

CONCLUSÕES:

essa identificação contribui para o planejamento do cuidado de modo integral e, além disso, permite a identificação de necessidades na formação profissional. Essa abordagem, centrada na proporção de apoios combinada com a perspectiva de resultados referidos à pessoa, tem sido pouco utilizada no caso de indivíduos com doença mental e nisso consiste a contribuição singular do presente estudo. Além disso, este estudo possibilita a inclusão de novas formas de avaliação que são consistentes e inovadoras na área de enfermagem, porque podem representar uma ferramenta para a compreensão de outras deficiências.

Dependência (Psicologia); Apoio Social; Pessoas com Deficiência; Pessoas Mentalmente Doentes


OBJECTIVE:

to characterize the intensity of the support needs of individuals with severe mental illness.

METHODS:

quantitative and descriptive study that applied the Supports Intensity Scale to a sample comprising 182 individuals.

RESULTS:

the supports intensity profile identifies groups, individuals, and areas with different needs of support relative to the domains of home living, health, community living, learning, employment, and social living. As a whole, the intensity level of support needs found was low, and the domains with greater needs were employment and social.

CONCLUSIONS:

identification of the intensity of support needs is helpful in planning integral care and detecting professional training needs. The support provision-centered approach, associated with the person-related outcomes perspective, has been sparsely applied to individuals with mental illness, and this represents the main contribution of the present study. In addition, this study introduces novel approaches to assessment that are both concordant and an innovation in nursing because they might provide a tool for understanding other disabilities.

Dependency (Psychology); Social Support; Desabled Persons; Mentally Ill Persons


OBJETIVO:

caracterizar el perfil de intensidad de necesidades de apoyo de personas con enfermedad mental severa.

METODOLOGÍA:

cuantitativa desarrollando un estudio descriptivo, utilizando como instrumento la escala de intensidad de apoyos que se aplicó a una muestra de 182 personas.

RESULTADOS:

el perfil de intensidad de apoyos identifica grupos, personas y áreas con diferentes niveles de necesidades de apoyo en las áreas de vida en el hogar, salud, comunidad, aprendizaje, empleo y vida social. De forma global, el perfil identificado es bajo, mostrando necesidades más elevadas en las áreas de empleo y vida social.

CONCLUSIONES:

esta identificación ayuda a planificar el cuidado de forma integral permitiendo además identificar necesidades en la formación profesional. Este enfoque centrado en la proporción de apoyos, y relacionado con la perspectiva de resultados referidos a la persona ha sido poco utilizado en personas con enfermedad mental, es ahí donde radica la aportación de este estudio. Además posibilita contar con nuevas formas de valoración que son concordantes y novedosas para la Enfermería porque pueden constituir una herramienta para comprender otras discapacidades.

Dependencia (Psicología); Apoyo Social; Personas con Discapacidad; Enfermos Mentales


Introdução

A doença mental grave pressupõe uma condição de saúde caracterizada por déficit no corpo e estruturas, limitações na atividade e restrições à participação, associadas a fatores pessoais e ambientais, que causam deficiência.

O conceito atual de deficiência envolve uma mudança de paradigma da incapacidade à deficiência, que, assim, agora passa a denotar limitações no funcionamento do indivíduo dentro de um contexto social que o coloca em clara desvantagem( 11. Dhanda A. Construindo um novo léxico dos direitos humanos convençao sobre os direitos das pessoas com deficiências. Sur - Rev Int Derechos Hum. 2008;5(8):42-59.

2. Palacios A. El modelo social de discapacidad: Orígenes, caracterización y plasmación en la Convención Internacional sobre los derechos de las Personas con Discapacidad. Madrid: Editorial Cinca; 2006.
- 33. Schalock R., Luckasson R. y Shogren K. El nuevo concepto de retraso mental: comprendiendo el cambio al término discapacidad intelectual. Siglo Cero. 2004;38(224):5-20. ). Esse novo entendimento se reflete na definição de deficiência intelectual( 44. Schalock R, Borthwick-Duffy SA, Bradley VJ, Buntinx W, Coulter DL, Craig EM, et al. Intellectual disability: Definition, Classification, and Systems of Supports. Washington, DC: American Association on Intelectual and Developmental Disabilities; 2010. ), assim como na Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF)( 55. Organización Mundial de la Salud. Clasificación Internacional del Funcionamiento, la Discapacidad y la Salud-CIF. Madrid: Ministerio del Trabajo y Asuntos Sociales; 2001. ). Em ambos os casos, a funcionamento opera como um termo guarda-chuva, abrangendo funções e estruturas corporais, atividades pessoais e áreas de participação.

Essas definições podem ser extrapoladas para a doença mental grave e, além disso, fornecem novas formas de avaliação, tanto consistentes quanto inovadoras na área de enfermagem, pois podem representar uma ferramenta para se compreender, também, outras formas de deficiência, além da avaliação tradicional da doença.

A abordagem mais recente da questão, acerca do fornecimento de apoios no âmbito da deficiência, tem relação direta com a incorporação na perspectiva do Planejamento Centrado na Pessoa (PCP) ou de resultados referidos à pessoa. Termos relacionados aludem à promoção da competência, capacitação e fortalecimento do controle de suas vidas, por parte de pessoas com deficiências, assim como ao estímulo de sua autodeterminação para se integrar na comunidade( 66. López M, Marín A, De la parte J. La planificación centrada en la persona, una metodología coherente con el respeto al derecho de autodeterminación. Siglo Cero. 2004;35(210):45-55. ).

Esses aspectos são particularmente complexos no caso coletivo das pessoas com doença mental, quando se leva em conta que a confiabilidade da informação fornecida pelas pessoas afetadas é questionada muito mais frequentemente que em outros campos( 77. Goodman M, Smith T. Measuring Quality of Life in Schizophrenia. Psychiatr Mental Health J. 1997;2(6):1-13. ). Por isso, tende-se a optar pela coleta de dados junto a familiares ou informantes-chave( 88. Becchi A, Rucci P, Placentino A, Neri G, Girolamo G. Quality of life in patients with schizophrenia - comparison of self-report and proxy assessments. Soc Psychiatry Psychiatric Epidemiol. 2004;39(5):397-401. ), ao mesmo tempo em que a atenção é concentrada na identificação dos sintomas e sinais da doença mental, deixando de lado a avaliação das necessidades da pessoa em outros âmbitos da vida.

Alguns estudos têm pesquisado ora a Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS) ora a qualidade de vida global( 99. Eack S, Newhill C, Anderson C, Rotondi A. Quality of life for persons living with schizophrenia: more than just symptoms. Psychiatr Rehabil J. 2007;30(3):219-22. - 1010. Núñez D, Acuña F, Rojas G, Vogel E. Construcción y validación inicial de un cuestionario para medir calidad de vida en pacientes esquizofrénicos. Rev Chilena Neuro-psiquiatría. 2007;45(2):148-60. ). Para tanto, têm sido utilizados diversos instrumentos, incluindo o Inventário de Atitudes em relação à Medicação, Escala de Avaliação Global do Funcionamento (AGF)( 1111. Hay P, Katsikitis M, Begg J, Da Costa J, Blumenfeld N. A Two-Year Follow-Up Study and Prospective Evaluation of the DSM-IV Axis V. Psychiatric Serv. 2004;54(7):1028-30. ), o questionário de estado de saúde SF-36 e o Perfil de Qualidade de Vida de Lancashire, assim como diversos instrumentos criados ad hoc ( 1212. Ruiz MT, Núñez J, Jódar R, Meana R. Calidad de vida y esquizofrenia. Estudio realizado con la población perteneciente a las Asociaciones de Salud Mental de la Comunidad Autónoma de Madrid. Madrid: AMAFE; 2008. 101 p. ).

A maioria desses instrumentos, no entanto, apresenta um problema comum: a dificuldade para se traduzir os resultados das avaliações em planos de ação, isto é, transformar os dados sobre a qualidade de vida em intervenções.

Além disso, tais planos devem incorporar as vozes das pessoas com doença mental, assim como aquelas dos profissionais e do grupo primário de apoio, de modo a desenvolver um trabalho conjunto e avaliar, de modo mais preciso, as necessidades de apoio e de serviços das pessoas com doença mental( 1313. Foldemo A, Ek A, Bogren L. Needs in outpatients with schizophrenia, assessed by the patients themselves and their parents and staff. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2004;39(5):381-5. ).

Dentre as escalas existentes para a avaliação das necessidades de apoio, destaca-se a versão espanhola da Escala de Intensidade de Apoios (SIS)( 1414. Verdugo M, Arias B, Ibáñez A. Escala de Intensidad de Apoyos. Manual de la adaptación española. Madrid: TEA; 2007. 191 p. ), cuja abordagem concorda plenamente com os pressupostos mencionados acima. Essa escala tem sido largamente utilizada em grupos de pessoas com deficiência intelectual, porém, menos frequentemente em indivíduos com doença mental.

As possibilidades de aplicação dessa escala em pessoas com doença mental e sua adaptação preliminar ao contexto mexicano foram recentemente analisadas com sucesso( 1515. Cruz M, Jenaro C, Pérez MC, Robaina N. Applicability of the Spanish Version of the Supports Intensity Scale (SIS), in the Mexican Population with Severe Mental Illness. Rev. Latino-Am. Enfermería. 2010, 18(5):975-982. ). Por isso, tem-se utilizado, aqui, essa escala em conjunto com uma série de entrevistas, a fim de se analisar as necessidades de apoio numa amostra mais ampla de pessoas, visando responder a seguinte questão: qual é a intensidade das necessidades de apoio das pessoas com doença mental?

Objetivo

Caracterizar o perfil da intensidade das necessidades de apoio de pessoas com doença mental grave, utilizando-se a escala adaptada de necessidades de apoios.

Metodologia

O estudo foi previamente autorizado pela autoridade competente da instituição onde o trabalho foi realizado, sendo baseado na Lei Geral da Saúde quanto a pesquisas em saúde, Título Cinco, Capítulo Único, artigos 100 e 102( 1616. Ley General de salud de 7 de febrero de 1984 (MX). Reglamentaria del párrafo tercero del Artículo 4o. de la Constitución Política de los Estados Unidos Mexicanos. México: Diario Oficial de la Federación, 7 de febrero de 1984. ), assim como nos princípios de beneficência e não maleficência.

Foi utilizada uma amostra por conveniência, selecionada com base nos prontuários de indivíduos atendidos num hospital psiquiátrico público do México. Foram selecionadas pessoas com diagnóstico de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressão maior, com três ou mais anos de confirmação diagnóstica. Os dados foram coletados através de entrevistas com os pacientes e seus cuidadores primários conjuntamente, depois da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

A coleta dos dados foi realizada entre dezembro de 2008 e outubro de 2009, utilizando-se a SIS (Escala de Intensidade de Apoios 2007, adaptação ao espanhol da versão original, Supports Intensity Scale ( 1414. Verdugo M, Arias B, Ibáñez A. Escala de Intensidad de Apoyos. Manual de la adaptación española. Madrid: TEA; 2007. 191 p. )) e a escala de Avaliação Global do Funcionamento (AGF), que constitui o quinto eixo do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM)( 1717. Tungström S, Söderberg P, Armelius B. Special Section on the GAF: Reliability of Global Assessment of Functioning Ratings Made by Clinical Psychiatric Staff. Psychiatrics Serv. 2005;56(4):434-8.

18. American Psychiatric Association. DSM IV. Manual diagnóstico y estadístico de los trastornos mentales. Barcelona: American Psychiatric Association; 2003.

19. American Psychiatric Association. Diagnostic and statistical manual of mental disorders. Washington: American Psychiatric Association; 1991.
- 2020. Jenaro C, Cruz M, Pérez MC, Robaina N, Vega V. Utilization of the supports intensity scale with psychiatric populations: psychometric properties and utility for service delivery planning. Arch Psychiatric Nurs. 2011;25(5):9-17. ). A aplicação de ambas as escalas exigiu, em média, 45 minutos por pessoa.

Os dados correspondentes às variáveis sociodemográficas dos pacientes, assim como algumas das variáveis clínicas, foram coletados através de um questionário estruturado, contendo os seguintes itens: idade, sexo, escolaridade, emprego e evolução, atendimento recebido e tipo de doença.

Depois da coleta dos dados sociodemográficos e clínicos, foi aplicada a Escala de Intensidade de Apoios (SIS), que consta de três seções: escala de necessidade de apoio, escala suplementar de proteção e defesa e escala de necessidades excepcionais de apoio médico e comportamental. Essas três seções estão precedidas por outra destinada à coleta dos dados sociodemográficos do sujeito avaliado e dos informantes que contribuem com informações( 1414. Verdugo M, Arias B, Ibáñez A. Escala de Intensidad de Apoyos. Manual de la adaptación española. Madrid: TEA; 2007. 191 p. ), podendo ser familiares do sujeito avaliado ou profissionais da saúde.

A seção 1, Escala de necessidades de apoio, inclui 49 atividades divididas em seis subescalas: 1) atividades da vida no lar, 2) atividades da vida na comunidade, 3) atividades de aprendizagem ao longo da vida, 4) atividades no emprego, 5) atividades de saúde e segurança e 6) atividades sociais. A seção 2, Escala suplementar de proteção e defesa, contém oito itens que investigam o exercício de direitos e responsabilidades jurídicas, a tomada de decisões e a administração de recursos financeiros. Na seção 3, Escala de necessidades excepcionais de apoio médico e comportamental, abordam-se quatro áreas do cuidado médico e quatro áreas referentes ao cuidado comportamental: 1) cuidado respiratório, 2) ajuda com a alimentação, 3) cuidado da pele, 4) outros cuidados médicos excepcionais, 5) destrutividade dirigida ao exterior, 6) destrutividade autodirigida, 7) sexual e 8) outros.

Na avaliação da intensidade dos apoios nas duas primeiras seções, são consideradas três dimensões, a saber: frequência, tempo e tipo de apoio requerido pelo indivíduo numa escala de 0 a 4. Já a mensuração na terceira seção varia, pois os parâmetros mencionados são substituídos por uma escala tipo Likert, que diferencia entre: 0=sem necessidade de apoio, 1=necessidade de algum apoio e 2=necessidade de amplo apoio.

Na sequência, foi aplicada a escala de Avaliação Global do Funcionamento (AGF), a fim de comparar a informação obtida através da SIS. A AGF constitui o quinto eixo no sistema DSM e seu propósito é medir globalmente a gravidade da doença psiquiátrica, focando-se no funcionamento social, psicológico e profissional do paciente( 1717. Tungström S, Söderberg P, Armelius B. Special Section on the GAF: Reliability of Global Assessment of Functioning Ratings Made by Clinical Psychiatric Staff. Psychiatrics Serv. 2005;56(4):434-8. ).

Na escala AGF considera-se o funcionamento do indivíduo num contínuo hipotético de saúde/doença, com pontuação que varia de zero a 100, em intervalos de 10 pontos. Desse modo, a pontuação 100 é interpretada como funcionamento social, psicológico e profissional ideal, enquanto que os casos mais restringidos, com pontuações inferiores a 50, indicam importante severidade dos sintomas, com efeito grave no funcionamento e competência social. Na aplicação da escala não devem ser levadas em conta as limitações devidas a dificuldades físicas nem aquelas relacionadas ao ambiente( 1818. American Psychiatric Association. DSM IV. Manual diagnóstico y estadístico de los trastornos mentales. Barcelona: American Psychiatric Association; 2003. ).

A base de dados assim gerada foi analisada, utilizando-se o programa SPSS, versão 18, em análises descritivas e de correlação. Para tanto:

- computaram-se as pontuações obtidas em cada um dos itens (=somatório das pontuações da frequência, intensidade e duração de cada um dos itens);

- computaram-se a pontuação bruta total obtida em cada subescala;

- transformaram-se as pontuações brutas em pontuações padrão e percentual, de acordo com as tabelas correspondentes à amostra da população espanhola adulta.

A seguir, analisou-se a consistência interna dos itens, obtendo um α de Cronbach de .97. Levando-se em consideração que mesmo as subescalas com menor α (saúde e segurança e atividades da vida no lar = .83) apresentaram níveis satisfatórios, pode-se assinalar que, em geral, para essa amostra da população, a SIS apresenta elevada sensibilidade na identificação das necessidades de apoio em todas as suas subescalas, o que subsidia a confiabilidade do seu uso( 1515. Cruz M, Jenaro C, Pérez MC, Robaina N. Applicability of the Spanish Version of the Supports Intensity Scale (SIS), in the Mexican Population with Severe Mental Illness. Rev. Latino-Am. Enfermería. 2010, 18(5):975-982. , 2020. Jenaro C, Cruz M, Pérez MC, Robaina N, Vega V. Utilization of the supports intensity scale with psychiatric populations: psychometric properties and utility for service delivery planning. Arch Psychiatric Nurs. 2011;25(5):9-17. ).

Resultados

Os dados sociodemográficos da amostra (n=182) indicam que esteve predominantemente composta por homens (58,8%), em sua maioria solteiros (67%), com idade média de 39,1 anos (dp=12,04 anos). Quanto à ocupação laboral, 69,23% dos participantes se encontravam numa situação vulnerável, pois estavam desempregados. Contudo, analisando as demais ocupações, pôde-se conferir que 13,74% da amostra também se encontrava numa situação vulnerável, pois correspondia a donas de casa, cujo trabalho não é remunerado. Por outro lado, apenas 1,1% dos participantes trabalhava no comércio ou desenvolvia atividades especializadas no setor de serviços, enquanto que 14,29% foi agrupado na categoria emprego não especializado, correspondendo predominantemente à agricultura.

Quanto à escolaridade, predominou o ensino médio incompleto, correspondendo a 26,9% da amostra, sendo que a média de estudos foi de 7,6 anos (dp=3,8). Finalmente, só 12,09% dos participantes haviam cursado pelo menos um ano de universidade.

Os dados clínicos indicaram que 85,17% da amostra tinha diagnóstico médico de esquizofrenia paranoide crônica e pontuação média de 60,24 [variação 30-90] (dp=10,04) na escala AGF. A duração média da doença foi de 14,15 anos (dp=10,71) e a média de internações hospitalares foi de 3,14 [variação 1-7] (dp=2,0), sendo que 25,8% dos participantes nunca precisaram ser hospitalizados. O intervalo, desde a última internação, variou de dois a cinco anos em 17% dos participantes e de um a seis meses em 14,3%. A duração das internações se concentrou no período de três a quatro anos, correspondendo a 36,3% da amostra.

Em relação à Escala de Intensidade de Apoios, a pontuação total, calculada a partir do índice de necessidades, indica que o nível global médio de necessidades, apresentado pela amostra analisada, foi baixo, localizado entre os percentis 26 e 38 da escala, sendo que as subescalas de emprego e atividades sociais foram as que apresentaram a maior intensidade de necessidades de apoio (Figura 1).

Figura 1
Pontuação bruta nas subescalas da Escala de Intensidade de Apoios (SIS), apresentada por indivíduos com doença mental grave, assistidos num hospital psiquiátrico público. México, 2008-2009

Em geral, a subescala que apresentou a média mais baixa de pontuação bruta (26,05 pontos) foi a correspondente à vida no lar que, de acordo com as tabelas da SIS, equivale a uma pontuação padrão de 8. Já a subescala atividades sociais apresentou a pontuação média mais elevada (37,96 pontos), correspondente à pontuação-padrão de 9, o que implica numa maior necessidade relativa de apoios. Esse mesmo comportamento se repetiu quando se analisaram as pontuações-padrão em função dos percentis, sendo vida no lar correspondente ao percentil 26 e atividades sociais ao percentil 38.

Finalmente, a pontuação total do índice de necessidades de apoio indica que o nível global médio de necessidades de apoio da amostra estudada corresponde ao nível I=84 ou menos pontos. A dispersão dos valores obtidos indica que a amostra do presente estudo se encontra entre os níveis I e III, cujos valores variam entre 100 e 115 pontos na escala de intensidade de apoios, indicando variação entre baixa e alta intensidade de apoio.

Por outro lado, é interessante apontar que a escala correspondente a atividades no emprego apresentou o maior desvio-padrão (3,34), isto é, a maior variação entre as pontuações mínima e máxima, o que reflete a diversidade do nível de intensidade de apoios apresentada pela amostra estudada.

Deve ser ressaltado que a figura apresentada, acima, representa o perfil geral do grupo, o que permite identificar áreas especialmente comprometidas nos indivíduos com doença mental grave e, assim, visualizar uma primeira aproximação às suas necessidades de apoio. No entanto, como mostra a Tabela 1, o reagrupamento dos resultados globais das pontuações indica a presença de diversos níveis de necessidades dentro da amostra estudada.

Tabela 1
Distribuição por níveis de necessidades, segundo as pontuações globais obtidas na Escala de Intensidade de Apoios (SIS) por indivíduos com doença mental grave, assistidos num hospital psiquiátrico público. México, 2008-2009

Embora, em termos gerais, seja possível observar que a maior percentagem (60,99%) dos indivíduos estudados apresenta índice baixo de necessidades de apoio, a amostra também inclui grupos com níveis médio e alto. Assim, pode-se elaborar um perfil global para cada um dos subgrupos e, desse modo, identificar as necessidades em comum.

Desagrupando ainda mais os resultados globais, pode-se constatar que é possível não só identificar as áreas de maior necessidade em cada subescala, mas, também, as atividades concretas que precisam ser incluídas no planejamento grupal em função de sua relevância (vide Figura 2). A identificação dessas atividades concretas é relevante devido à sua utilidade no planejamento pessoal e na busca por uma vida independente.

Figura 2
Atividades que precisam de maior intensidade de apoios em indivíduos com doença mental grave, assistidos num hospital psiquiátrico público. México, 2008-2009

As análises de correlação entre as pontuações das seis subescalas e algumas variáveis de interesse são apresentadas na Tabela 2. Nessa Tabela é possível constatar as associações significativas entre as diversas subescalas, a evolução da doença e a idade dos participantes. Os resultados indicam que as necessidades de apoio aumentam com o maior tempo de evolução da doença e idade do indivíduo. É, também, importante assinalar que a correlação entre essas variáveis é elevada (rxy=0,75), o que indica que ambas as variáveis (idade e tempo de evolução da moléstia) compartilham 56% da variação.

Tabela 2
Correlações entre a pontuação percentual na Escala de Intensidade de Apoios (SIS) e variáveis de interesse em indivíduos com doença mental grave, assistidos num hospital psiquiátrico público. México, 2008-2009

Discussão

Se fosse possível apresentar uma análise caso a caso, perceber-se-ia que, efetivamente, há coincidências grupais que podem ser utilizadas. No entanto, cada um dos indivíduos estudados precisa de planejamento individual, pois as características do ambiente e do contexto geram ampla gama de necessidades caracterizadas por tempo, tipo e frequência diferenciados no apoio requerido. Esses elementos têm importância particular, porquanto o objetivo principal da escala de intensidade dos apoios é fornecer uma medida das necessidades individuais de suporte e, assim, constitui uma ferramenta para o planejamento.

Por outro lado, não se pode ignorar o impacto dos fatores individuais e daqueles relacionados à presença e evolução da doença, tal como demonstra a análise de correlação (vide Tabela 2), na qual se verifica a existência de associação das variáveis sociodemográficas e clínicas selecionadas com as subescalas da Escala de Intensidade de Apoios. Inicialmente, há associação entre a variável sexo - que geralmente não apresenta correlação com a avaliação das necessidades de apoio - e a subescala correspondente às atividades da vida no lar.

A existência de associação positiva e significativa, lembrando que aqui, nessa matriz de dados, as mulheres têm o código 1 e os homens, o código 2, sugere que os maiores valores correspondentes às necessidades de apoio no lar se associam com o fato de ser homem.

Nesse sentido, a análise das possíveis diferenças no funcionamento global do paciente (medido pela escala AGF), em função do sexo, não apontou diferenças significativas (F=0,889; gl: 1,180; p=0,347, portanto, essas diferenças puderam ser atribuídas a diferenças de gênero, isto é, diferenças atribuíveis a fatores culturais. Especificamente, poder-se-ia especular que, na amostra do presente estudo, o fato de pertencer ao sexo masculino se associou à maior necessidade de apoio para realizar tarefas do lar, o que concorda com os papéis de gênero presentes no contexto estudado. Assim, a maior necessidade de apoio por homens não estaria relacionada apenas à evolução da doença em cada indivíduo, o que já é causa de agravamento e de dificuldades para assumir o autocuidado, mas, também, com a diferença entre os papéis masculino e feminino aceitos pela sociedade estudada e que define atividades e atitudes.

Foi também possível identificar clara correlação significativa e negativa entre a pontuação no funcionamento global e algumas subescalas da SIS, assim como com o índice de necessidades de apoio. Essa correlação pode ser explicada pelo fato de que a Escala de Funcionamento Global (AGF) estima a funcionalidade social, psicológica e profissional e, assim, quanto mais comprometida ela estiver maiores serão as necessidades de apoio identificadas.

Essa correlação torna-se ainda mais evidente quando as pontuações na AGF são distribuídas separadamente, de acordo com três pontos de corte para o grau de comprometimento, e, após, correlacionadas com o nível de necessidades de apoio. Como ilustra a Figura 3, o grupo de indivíduos com 70 pontos ou mais na escala AGF apresentou o índice de necessidades de apoio mais baixo. Essa correlação demonstrou ser estatisticamente significativa (qui-quadrado=48,725, gl=4; p=0,000).

Figura 3
Comparação entre a pontuação na escala de funcionamento global e os níveis de intensidade dos apoios em indivíduos com doença mental grave, assistidos num hospital psiquiátrico público. México, 2008-2009

Conclusões

Em primeiro lugar, os resultados indicam que a pontuação percentual obtida nas várias subescalas variou entre o percentil 26, na subescala correspondente à vida no lar, e o percentil 38, na subescala social. A dispersão das pontuações indica grande heterogeneidade nas necessidades de apoio apresentadas pela amostra estudada.

O perfil global da população estudada é caracterizado por nível baixo de intensidade de apoios. No entanto, o reagrupamento da amostra, de acordo com as médias individuais, permitiu identificar três grupos definidos com necessidades baixa, média e alta. As áreas globalmente identificadas como apresentando a maior necessidade de apoios foram as correspondentes ao emprego e às atividades sociais.

Os fatores individuais que apresentaram correlação com a maior necessidade de apoios foram o tempo de evolução da doença, a idade e o nível de funcionalidade (estimado através de escala de funcionamento global). Além disso, a variável sexo apresentou correlação com maiores necessidades de apoio na área da vida no lar, o que pode estar relacionado com fatores culturais.

Tem interesse particular a correlação inversa, apresentada pelas pontuações nas escalas AGF e SIS, pois são atribuídas por diferentes tipos de avaliadores. Isto é, os dados correspondentes à SIS foram fornecidos pelo paciente e/ou seu cuidador primário, enquanto que a pontuação na escala AGF foi atribuída pelo profissional da saúde, com base na sua avaliação clínica do indivíduo com doença mental e no seu conhecimento prévio acerca do nível de funcionamento social, pessoal e ocupacional do mesmo.

Em função da carência de sistemas formais de apoio para a promoção da autodeterminação e da inclusão das pessoas com doença mental, assim como das poucas oportunidades de participação em atividades usuais para indivíduos adultos, tais como trabalho, lazer e aprendizagem, na expectativa, aqui, era de achar um valor elevado no índice de necessidades de apoios. No entanto, os resultados apontaram para um nível baixo. Ao invés de problemas na escala, esse achado poderia ser explicado pelas características do contexto cultural, de acordo com as quais a falta de oportunidades de participação para pessoas com doença mental pode ser considerada como natural. No entanto, a comprovação dessa hipótese requer estudos qualitativos complementares.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sept-Oct 2013

Histórico

  • Recebido
    11 Abr 2012
  • Aceito
    24 Jul 2013
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