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O ADVENTO E CRIAÇÃO DE PLANOS URBANÍSTICOS E A (DES)IGUALDADE URBANÍSTICA NO BRASIL: REALIDADES, DESDOBRAMENTOS E CONSEQUÊNCIAS JURÍDICO-SOCIAIS APÓS DÉCADAS E ANOS DA CHEGADA DA CONSTITUIÇÃO E DE DEMAIS ICÔNICAS LEGISLAÇÕES URBANÍSTICAS

The Advent And Creation Of Urbanistic Plans And Urbanistic (In)Equality In Brazil: Realities, Developments And Legal And Social Consequences After Decades And Years Of The Arrival Of The Constitution And Other Iconic Urban Legislation

RESUMO

O presente artigo jurídico, pautado na análise de uma relação entre o princípio da igualdade e do Direito Urbanístico, examina, primeiramente, a própria igualdade enquanto alicerce do ordenamento jurídico brasileiro para, em seguida, proceder à convergência com questões de cunho urbanístico. Mais precisamente, buscar-se-á a ligação da igualdade e de sua antítese, a desigualdade, com as figuras do plano diretor e de desenvolvimento urbano integrado (PDUI), na busca de confirmação da hipótese da existência de desigualdades constitucionalmente injustificadas, no que tange às mais sortidas relações urbanas, mesmo depois de mais de vinte anos da chegada do Estatuto da Cidade ao Direito brasileiro, assim como de décadas da Constituição da República e de anos do Estatuto da Metrópole. O método analítico-dedutivo comanda um artigo em que exemplificações são utilizadas, além de levantamento de dados e informações diretamente de fontes oficiais e governamentais. A demonstração de que as desigualdades urbanísticas são uma realidade nas principais capitais e centros urbanos brasileiros, permeará, mediata e imediatamente, o presente texto, sendo também o seu norte maior. E tudo isso para se concluir pela maciça presença de desigualdades urbanísticas nas cidades brasileiras e pela necessidade de fortificação da figura dos planos urbanísticos no país, sem o que quaisquer pretensões desenvolvimentistas e previsões constitucionais fundamentais encontrarão amparo para uma real e evolutiva concretização.

Palavras-chave:
Igualdade; Desigualdade Urbanística; Plano Diretor; Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI); Constituição

ABSTRACT

This legal article, based on the analysis of a relationship between the principle of equality and Urbanistic Law, first examines equality itself as the foundation of the Brazilian legal system, and then proceeds to convergence with issues of an urban nature. More precisely, it will seek to link equality and its antithesis, inequality, with the figures of the master plan and integrated urban development plan (PDUI - initials in Portuguese), in the search for confirmation of the hypothesis of the existence of constitutionally unjustified inequalities, in which it touches on the most varied urban relations, even after more than twenty years since the arrival of the City Statute to Brazilian Law, as well as decades of the Republican Constitution and years of the Metropolis Statute. The analytical-deductive method commands an article in which examples are used, in addition to collecting data and information directly from official and governmental sources. The demonstration that urban inequalities are a reality in the main Brazilian capitals and urban centers will permeate, mediately and immediately, this text and be its biggest goal. And all this to conclude for the massive presence of urban inequalities in Brazilian cities and the need to fortify the figure of urban plans in the country, without which any developmental pretensions and fundamental constitutional norms will find support for a real and evolutionary implementation.

Keywords:
Equality; Urban Inequality; Master Plan; Integrated Urban Development Plan (PDUI - initials in Portuguese); Constitution

INTRODUÇÃO

Diversas são as problemáticas hoje enfrentadas pelos variados centros urbanos do país, dentre as quais é sempre valioso ressaltar as comumente ligadas à aplicação e incidência dos direitos sociais, assim como as vinculadas à concretização do direito ao ambiente, em seu sentido mais amplo. A busca incessante por soluções deve ser assim objetivo não somente dos órgãos governamentais, mas também de toda a sociedade civil, por meio dos seus mais variados grupos sociais de interesse.

Saliente-se, entretanto, que, se tais afirmações contidas no parágrafo anterior fossem lidas no final do já longínquo ano de 2001, certamente possuiriam o mesmo grau de relevância e seu enquadramento, para a época citada, não seria, na opinião dos ora autores, de modo algum descabido.

Nesse sentido é que se anuncia um dos pontos centrais de exame deste estudo, qual seja, o relativo a uma abordagem contemporânea de cidades brasileiras, após mais de vinte anos da entrada em vigor da Lei 10.257, de 10 de julho de 2001, instituidora do Estatuto da Cidade e com vacatio legis de noventa dias. E, adite-se, uma abordagem que incluirá, sobretudo, levantamento quantitativo de dados sobre o advento e consolidação da figura dos planos diretores, e exame final do grau de avanço de específicas regiões metropolitanas nacionais no que diz respeito à criação ou não do plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI), trazido pelo Estatuto da Metrópole, Lei 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Mas, que se ressalte, tudo isso no afã de se teoricamente evoluir em uma visão de relação do princípio da igualdade, firme alicerce do Estado Constitucional brasileiro, com a ordem urbanística vigente.

Assim, a ideia principal será a de se confirmar hipótese da existência de grandes disparidades e inúmeras desigualdades constitucionalmente injustificadas, no que tange às mais sortidas relações urbanas, mesmo depois de mais de vinte anos da chegada do Estatuto da Cidade ao Direito brasileiro, assim como de mais de décadas da chegada da Constituição da República e de anos do Estatuto da Metrópole. Estes últimos, ressalte-se, criadores, respectivamente, dos planos urbanísticos chamados plano diretor e plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI). O caminho para a confirmação da hipótese lançada levará a uma avaliação preliminar, depois do ainda mais prévio exame de selecionadas questões sobre o princípio da igualdade, contido no capítulo primeiro, do que se chamará de igualdade urbana e urbanística, cujas semelhanças ou diferenças merecerão breve, mas aqui entendida minimamente necessária, explanação, máxime para que, ao menos didaticamente, o ora artigo possa dar sequência a seus enfrentamentos, com rumos mais bem delimitados, a partir das concepções nele trazidas.

Conforme no curso do texto se verá, não há dúvidas de que uma íntima relação entre ambientes citadinos brasileiros, desigualdades variadas e o contingente normativo do país, forma um cenário a justificar a relevância do que ora se pretende destrinchar. O exame de conceitos e desdobramentos ligados à igualdade e à desigualdade urbanísticas, juntamente com o apoio de específicas avaliações de planos urbanísticos já existentes no Brasil, frise-se, formados e criados por meio de leis federais, estaduais e municipais, montam alguns dos centrais alicerces deste artigo, constantemente permeado pela normatização constitucional, seja para reforçar a magnitude de direitos fundamentais, tais como os de liberdade e os sociais, seja para lembrar e consolidar a importância de inúmeros outros dispositivos que, agrupados, formam um verdadeiro estatuto constitucional urbanístico, no interior do qual normas sobre competências, plano diretor, ordem urbana, entre uma série de outras, encontram-se e regulam, direta ou indiretamente, relações jurídicas, sociais e econômicas travadas no cerne e cotidiano das cidades brasileiras.

Nessa linha, realce-se a defesa do fato de que, o processo de elaboração das leis, em todos os graus federativos do país, deve ser constante apoio à diminuição das desigualdades em âmbito urbano, devendo o legislador, seja federal, estadual ou municipal, respeitar, de forma incondicional, os princípios fundamentais estampados na Constituição da República Federativa do Brasil. Em especial, para os fins do presente estudo, aqueles que mais se aproximam da dinâmica citadina, tais como a qualidade de vida, o bem-estar social, a dignidade da vida e dignidade urbana, a função social da propriedade e da cidade, a função ambiental da cidade e, entre tantos, a igualdade urbana e urbanística. O respeito, assim, ao princípio da igualdade, surge como imperativo máximo, uma vez que conectado e vinculado à materialização de inúmeros outros princípios, em especial os apenas e anteriormente citados, tendo em vista os fins maiores de consecução de inclusão e, não, exclusão social, principalmente nos ambientes preponderantemente urbanos.

Destarte, sensível a tais problemáticas, busca o presente esboço, de forma concisa e objetiva, considerando os recortes temáticos escolhidos e selecionados, trazer à tona discussão essencial à melhoria das condições de vida nas grandes cidades brasileiras. Locais que, por sua vez, mesmo após uma manifesta evolução legislativa, teórica e prática de institutos e instrumentos de política urbana, decorrente dos tantos anos de contato com as normas do Estatuto da Cidade - e, igualmente, com várias outras por ele desencadeadas -, mantêm-se ainda prisioneiros de uma série de problemáticas, muitas das quais diretamente ligadas a uma desigualação no acesso a benfeitorias e equipamentos urbanos.

1. A (DES)IGUALDADE COMO FATOR DE (DES)EQUILÍBRIO URBANÍSTICO-SOCIAL

Muito embora sobre a igualdade, isonomia e o princípio delas decorrente muito já se tenha estudado e desenvolvido, seja no Brasil ou fora dele, seja em épocas distantes ou atuais, o presente artigo não escapará de sumárias considerações sobre o tema. Entende-se que tais menções e enfrentamentos serão essenciais para a montagem e conexão dos desdobramentos ao longo do texto.

Nesse sentido e, a título inicial, ressalte-se que desde tempos pretéritos e distantes já se preocupava o Homem com a ideia de igualdade, a qual, ao longo dos séculos, foi alvo implacável de aplicações desarrazoadas e voltadas para a manutenção de classes e de variadas formas de poder. Mascarando-se sempre a forma mais justa (ou menos injusta)1 1 Apesar de ter sido sempre perseguida ao longo dos tempos, a justiça foi sempre alvo de concepções diversas, as quais variaram e continuam-se modificando no espaço e no tempo. de se conceber a isonomia, assumiu a igualdade nuanças peculiares, muitas das quais patentemente discriminatórias, servindo de apoio para diversas formas de discriminação, tais como as referentes a sexo, raça2 2 Realce-se, desde já, resguardados os múltiplos aprofundamentos que o tema requer, que, embora os presentes autores rechacem o termo “raça” para distinção entre pessoas, tal vocábulo, tendo em vista uma série de razões, sobretudo de cunho social e político, pode vir a possuir sua relevância, o que explica sua previsão, por exemplo, na Constituição brasileira de 1988, assim como em incontáveis outros documentos legais ou das mais variadas espécies. Com muita brevidade, a fim de não se escapar dos rumos centrais deste trabalho, é cabível citação a palavras do antropólogo Kabengele Munanga, para quem: “’Negritude’, ‘branquitude’ e ‘amarelitude’ nos levariam ao conceito maior das raças negra, branca e amarela, conceitos biologicamente inoperantes, mas política e sociologicamente muito significativos” (MUNANGA, 2019, p. 18). Assim, biologicamente falando, entende-se que o termo “raça” é inoperante, o mesmo não devendo ser dito no âmbito das ciências políticas e sociais, para as quais tal vocábulo comporta atenção e, nesse sentido, estudos, pesquisas, desenvolvimentos e interpretações diversos e com suas respectivas riquezas. Portanto, tal termo pode vir a aparecer, ao longo do presente texto, com suas significações natural e devidamente contextualizadas. e religião, dentre tantas outras.

Já na Grécia antiga, Aristóteles lançava máxima (“tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”)3 3 Deve-se tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais? O tratamento desigual aos reputados desiguais deve levar em conta múltiplas dimensões de igualação e desigualação, as quais, se não gozarem de alguma generalização pelo direito moderno e contemporâneo, podem se tornar de longínquo e quase impossível alcance. De qualquer maneira, medidas que sejam aptas a graduar e especificar, de modo sempre mais preciso, as semelhanças e diferenças entre pessoas, são fundamentais e devem ser constantemente investigadas. Por exemplo e, em tecnicamente descompromissada comparação que leva em conta o fator saúde, não necessariamente uma pessoa com problemas cardíacos será igual a uma outra, de mesma idade e sexo, com também doenças cardiológicas. Para além dos vários tipos de patologias do coração, cada organismo pode ter reações diferentes, a depender de inúmeros fatores, tais como tratamento, impacto orgânico etc. Se a própria medicina, parte das chamadas ciências humanas, finda por trabalhar com tamanhas incertezas, o que não dizer de ciências sociais e jurídicas. Portanto, apesar de o princípio da igualdade ser uma das bases teóricas deste artigo, não se adentrará em discussões aprofundadas que se distanciem da relação entre igualdade e ordem urbanística. Nesse viés e, com o fito de já se trazer inicial concepção, mais aproximada do objeto do presente estudo, uma cidade urbanisticamente desigual será aquela em que sua estrutura, seus equipamentos, suas características, entre outros elementos, não atenderão a todos os seus habitantes. No que tange à vetusta afirmação, colocada em forma de indagação, salientada logo no início desta nota, conferir, entre outros, “Ética a Nicômaco”, de Aristóteles (ARISTÓTELES, 2013) e, para continuado exame técnico da igualdade, “O conteúdo jurídico do princípio da igualdade”, de Celso Antônio Bandeira de Mello (MELLO, 1997). , a qual fundaria fortes alicerces em diversas sociedades modernas, valendo como sustentáculo mor daquilo que se poderia considerar uma menos injusta ou, quiçá mais justa, igualdade. A verdade é que até os tempos atuais, apesar do esforço doutrinário e científico de áreas humanas e sociais no sentido de desenvolver a intelectualidade em torno do princípio4 4 A recorrência temática não afastou a necessidade pontual de lembrança da seguinte definição: “Por lo tanto, los princípios son mandatos de optimización, que están caracterizados por el hecho de que pueden ser cumplidos en diferente grado y que la medida debida de su cumplimiento no sólo depende de las posibilidades reales sino tambiém de las jurídicas” (ALEXY, 2002, p. 86.). Enquanto preponderantemente considerada como princípio, vale lembrar que, do ponto de vista conceitual, a igualdade é ora mencionada como direito, ora como dever, ora como poder, ora como máxima, ora como cláusula e, enfim, entre tantas variações, ora, ainda, como cânone. Contudo, o mais relevante é a absorção, pelo ordenamento jurídico brasileiro, dos proclames constitucionais de valorização da igualdade. Infirmá-la não deve ser a intenção do Judiciário, do Executivo e do Legislativo, no exercício primeiro de suas funções. da igualdade, pode-se pragmaticamente afirmar que o princípio em voga ainda tem difícil e tormentosa concretização, máxime se se levar em consideração o âmbito de sua concretização prática e fática, no qual exsurgem problemáticas aplicacionais de todas as ordens - econômicas, sociais, jurídicas etc. -, que findam por remontar a ideias e ideais de justiça defendidos e proclamados por múltiplos grupos sociais, ocupantes das tão variadas plurais sociedades ao redor do globo.

Nesta linha de análise, eis que, então, vem sempre à tona uma premente necessidade de se zelar pela aplicabilidade (e viabilidade) do princípio da igualdade, o qual desponta como um dos pilares de um Estado Democrático e Social de Direito. No Brasil e, mais especificamente, em sede do Direito brasileiro, não podem ser negadas tentativas de se concretizar o referido princípio e de se atenuar as enormes desigualdades que assolam o país. Mas, paralelamente, empecilhos e obstáculos surgem e ressurgem em um mundo contemporâneo recheado de mudanças e polarizações.

Em breve, mas ora reputado essencial abordagem máxime em razão dos contemporâneos movimentos polarizadores em diversas sociedades, uma das quais a brasileira, fato que, paralelamente, finda por também esbarrar na aplicação e em concepções sobre o princípio da igualdade, Cass Sunstein afirma que a polarização de grupos sociais ocorre em decorrência de três principais mecanismos. O primeiro deles enfatiza o papel da informação, que, segundo Sunstein, é pautado em rasos e limitados argumentos no âmbito de determinados grupos. O segundo mecanismo relaciona-se a influências sociais comportamentais e, em particular, na vontade que as pessoas têm de manter suas reputações e convicções. E, por fim, um terceiro enfatiza as relações entre confiança, corroboração e extremismo. Ao ver suas ideias confirmadas e corroboradas por outras pessoas, forma-se um vínculo de confiança5 5 “Three principal mechanisms underlie group polarization. The first emphasizes the role of information - in particular, the limited ‘argument pools’ within any group and the directions in which those limited pools lead group members. The second points to social influences on behavior and in particular to people’s desire to maintain their reputation and their self-conception. The third emphasizes the relationships among confidence, corroboration, and extremism. The basic idea is that when people find their views corroborated by others, they become confident - and thus more extreme. Radical movements can be fueled in that way” (SUNSTEIN, 2019, p. 20.). .

Nesse sentido, a fortificação da polarização e de extremismos, que, ainda segundo Cass Sunstein, intensifica-se dentro dos próprios grupos sociais, uma vez que, em uma deliberação entre seus membros, a tendência é que se caminhe para um extremo e, não, em direção a opiniões moderadas ou mesmo dissonantes (SUNSTEIN, 2019SUNSTEIN, Cass R. How change happens. Cambridge: MIT Press, 2019., p. 21), diretamente interfere em uma série de comportamentos, direcionamentos e enfrentamentos sociais, o que leva a um semelhante fenômeno em esferas jurídicas, no interior das quais interpretações e redimensionamentos aplicacionais de normas podem ocorrer. O princípio da igualdade, no centro gravitacional dos direitos humanos e fundamentais, é, portanto, alvo constante de possíveis ataques e tremores, fazendo com que um esforço em prol de sua substância e núcleo essencial seja primordial. E, reforce-se, aqui se apresenta mais uma razão para se revisitar estudos sobre o princípio da igualdade, mesmo que com viés voltado para os fins maiores do presente artigo.

Com efeito, retomando-se a trilha de análise da igualdade a partir de seus alicerces teórico-normativos, a atual previsão constitucional é significativamente ampla e sólida, uma vez que não somente permite vasta possibilidade hermenêutica aos artigos constitucionais que preservam e impõem igualdade de tratamento, mas também eleva o princípio isonômico à categoria de direito fundamental, cláusula pétrea e irredutível no Direito pátrio vigente. Ressalte-se, pelo menos do ponto de vista teórico ou voltado ao Direito Público, já que a referida e mesma previsão constitucional, se examinada em sua eficácia e validade privada, ainda encontra percalços e necessita de patente recrudescimento, ainda mais mediante constantes oscilações ideológicas no que diz respeito a variados tipos de pautas, sobretudo de minorias ou grupos chamados minoritários, frente a maiorias ou grupos majoritários.

De todo modo, para um mais aguçado entendimento acerca da igualdade e, tendo em vista os fins máximos colimados no presente esboço, quais sejam, o de aproximar a isonomia à ordem urbanística e à política urbana - macro e amplamente concebida - adotada no país, realçando a importância de se defender a aplicação total e irrestrita da igualdade em seara urbana, far-se-á breve digressão histórica em âmbito do Direito brasileiro, remontando-se até o período imperial. Saliente-se, um breve retorno temporal, para o resgate da história constitucional brasileira em matéria de igualdade, ainda que, neste momento, não voltada, especificamente, a matérias urbanísticas. Robustecer, preliminarmente, o princípio da igualdade, com vistas aos desdobramentos e conectividades posteriores.

Outrossim, relevante salientar que a citada digressão, considerando os limites inerentes a esta produção, alcançará somente os Documentos Constitucionais pátrios, com suas respectivas previsões sobre o princípio da igualdade.

Desta forma, em que pesasse, à época, a existência de sedimentadas e numerosas discriminações6 6 Em um primeiro momento, discriminações entendidas a partir de um olhar atual e contemporâneo das características sociais daquela época. , no seio das relações sociais brasileiras, que diretamente atentavam contra o princípio da dignidade da própria vida - e da dignidade humana, nos mais precisos dizeres da Constituição de 1988 -, normas fundamentais e caras à atual República Federativa do Brasil, a primeira Lei Máxima do país, outorgada em 1824, não abriu mão de trazer consigo um ideal de igualdade, com sua inserção no dispositivo constitucional dedicado às garantias e direitos dos cidadãos brasileiros. O Art. 179, inciso XIII, da referida e primeira Constituição brasileira7 7 Para todas as citações e transcrições das normas das Constituições brasileiras de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1969, conferir o trabalho “Constituições do Brasil”, de Adriano e Hilton Lobo Campanhole (CAMPANHOLE, 1979). , referendava uma ideia igualitária, mas, conforme se pôde, com o decorrer dos anos, melhor se investigar e concluir, uma previsão de cunho eminentemente formal8 8 Assim estatuía a Carta Outorgada de 1824, em seu Art. 179, inciso XIII: “Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte: (...) XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, e recompensará em proporção dos merecimentos de cada um”. Luis Roberto Barroso assim destaca algumas peculiaridades jurídico-sociais do período sob foco, ressaltando a adversidades na materialidade da norma constitucional isonômica: “Em seu longo e avançado elenco de ‘garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros’, remarcado de inspiração liberal, a Constituição do Império, ao lado do princípio da legalidade, consagrava o princípio da isonomia, inaugurado em nosso constitucionalismo no inciso XIII do Art. 179 (...). Durante quase toda sua vigência, o preceito conviveu, sem que se assinalassem constrangimento ou perplexidade, com os privilégios da nobreza, o voto censitário e o regime escravocrata” (BARROSO, 2000, p. 11.). , pois determinava que a lei devia ser igual para todos, quer protegesse, quer castigasse, com recompensas de acordo com o merecimento de cada pessoa, trazendo à tona um importante traço liberal-meritocrático.

A Proclamação da República e consequente término do período imperial, com o advento de nova forma de governo, qual seja, a republicana, trouxeram consigo novas tendências e normas, as quais visavam, pelo menos em tese9 9 “Pelo menos em tese”, já que, como pôde a história confirmar, a chegada da era republicana findou por representar uma troca de privilégios e regalias. Os cafeicultores paulistas e os militares, principalmente, entre outras camadas e setores sociais, que durante o Império possuíam uma diminuída participação política, passaram a mais imediatamente participar das decisões políticas do país, o que reproduziu efeitos na aplicabilidade, incidência e rumo concretizador de muitas garantias e direitos dos cidadãos brasileiros, ao menos constitucionalmente estampadas. , a extinguir privilégios enraizados e a fortificar o começo de um novo momento para o direito à igualdade. O esforço normativo, entretanto, findou por manter desigualdades materiais, iniciando um processo de perenização de desigualações10 10 Afirmação que se mostra relevante, tendo em vista as conclusões a posteriori. , cujas consequências são sentidas até os dias de hoje. Portanto, a nova Constituição da República dos Estados Unidos do Brazil, apesar de manter a base da igualdade em seu sentido formal, trazia o expresso repúdio a privilégios de nascimento, nobreza, a regalias e a títulos nobiliárquicos e de conselho, na sua concepção da época11 11 Assim estatuía o Art. 72, parágrafo 2º, da Constituição de 1891: “Art. 72. A Constituição assegura a brazileiros e a estrangeiros residentes no paíz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade nos termos seguintes: (...) § 2º Todos são iguaes perante a lei. A República não admite privilegio de nascimento, desconhece foros de nobreza, e extingue as ordens honorificas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliarchicos e de conselho”. . Se a monarquia brasileira se esgotou em si mesma, com uma burguesia cafeicultora, militares, entre outras camadas sociais se insurgindo contra a ausência de participação política e de direitos, o texto constitucional de 1891 findou por refletir tais insatisfações12 12 À parte breves considerações sobre a falta de eficácia e efetividade normativas dos conteúdos constitucionais ligados ao princípio da igualdade, a mesma Constituição de 1891 é, pelos aqui autores, entendida como um marco histórico, jurídico e constitucional para o país. Sem maiores divagações, a fim de não se desviar dos rumos centrais deste artigo, a referida primeira Constituição republicana do país trouxe consigo uma nova forma de governo (repita-se, republicana, em substituição à monárquica), uma nova forma de Estado (federal, em substituição à unitária), uma alteração nos Poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário, com eliminação do até então quarto Poder, denominado Moderador), além de uma série de outras alterações. A influência norte-americana na criação desta Constituição foi marcante e, no tocante às modificações mencionadas, foram de tal ordem e magnitude, que se mantiveram, normativa e teoricamente intactas, até a Constituição de 1988 e, por corolário, até a data de conclusão do presente trabalho. .

A Constituição de 1934, por sua vez, elaborada já sob o manto de uma nova ordem, iniciada por Getúlio Vargas, assim estatuía: “Todos são iguaes perante a lei. Não haverá privilegios, nem distincções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões proprias ou dos paes, classe social, riqueza, crenças religiosas ou ideas politicas13 13 Eis o inteiro teor do caput e do mesmo inciso transcrito no corpo do texto: “Art. 113. A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á subsistência, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes: Todos são iguaes perante a lei. Não haverá privilegios, nem distincções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões proprias ou dos paes, classe social, riqueza, crenças religiosas ou ideas politicas”. . Repara-se, de modo mais claro, para além da previsão da tradicional igualdade formal, um conteúdo já mais voltado para uma igualdade substancial, com o elenco de discriminações consideradas odiosas pelos criadores daquelas normas constitucionais. Além do que, foi a Constituição de 1934 a primeira a trazer espaço para direitos e questões sociais, ratificando a forte influência internacional trazida pelas Constituições mexicana e alemã, de 1917 e 1919, respectivamente. Os direitos fundamentais hoje classificados em gerações ou dimensões, tiveram sua segunda geração (ou dimensão) iniciada no texto constitucional brasileiro, exatamente em 1934. Direitos trabalhistas, culturais e de demais categorias sociais, foram primária e constitucionalmente registrados no Brasil com a referida Constituição daquele ano. E, dessa forma, teve-se, naquele momento, a fortificação do princípio da igualdade, por sua vez, intimamente vinculado aos direitos sociais.

Aproximados três anos depois, a Constituição de 1934 se esvaía em prol da chegada da Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 1937, que, por outro lado, influenciada pelos ideais de fascismo e autoritarismo e, inaugurando o Estado Novo brasileiro, restringiu-se a prever uma igualdade formal, limitando seus termos à conhecida frase “Todos são iguais perante a lei”.14 14 Previsão contida no Art. 122, nº 01, da Carta Constitucional imposta de 1937. Mas, que se reforce, não abdicou de tal norma igualitária, ainda que mais restrita e em patente retrocesso se comparada com previsões anteriores. E, se a Constituição de 1934 pouco durou, a de 1937 também não teve vida longa. Derrotados os regimes fascistas e nazista, os desdobramentos internacionais foram inúmeros, fato que reverberou no Brasil. Com efeito, logo após a saída de Getúlio Vargas do poder e a assunção do cargo por Eurico Gaspar Dutra, tem-se uma nova Constituição para a nação. A Constituição de 1946 - considerada, naquele momento histórico, moderna e com pontos de vanguarda - determinava, em seu Art. 141, § 1º, que “todos são iguais perante a lei15 15 Determinava que todos eram iguais perante a lei. Para a citação in verbis, manteve-se o tempo verbal original da Constituição. . Entretanto, no tocante à igualdade e a assuntos sociais, calcou-se a Constituição de 1946 na própria e extinta Constituição brasileira de 1934 e nas mesmas Constituições estrangeiras que representaram um marco histórico de elevação ao patamar constitucional dos chamados direitos de segunda geração ou dimensão, editadas no México e na Alemanha, de acordo com o anteriormente já salientado. Com 21 anos de vigência e em um momento pós Segunda Grande Guerra Mundial, a Constituição de 1946 não mais conseguiu se sustentar, sobretudo após, em 1964, a instauração do regime militar no Brasil, com a ascensão dos militares ao poder político brasileiro. Nesse contexto, retomando um determinado viés outrora já seguido no país16 16 O paralelo que aqui se faz é com a Constituição de 1937. , cria-se a Constituição brasileira de 1967, na qual a previsão de uma igualdade formal, segundo a qual todos são iguais perante a lei, finda por se estender a proibições de distinção de sexo, raça, trabalho dentre outras formas de discriminação17 17 Eis o teor do § 1º, do Art. 150, da Constituição de 24 de janeiro de 1967: “Art. 150. (...) § 1º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. O preconceito de raça será punido pela lei”. . Não obstante a conferência de algum destaque à discriminação por raça, deixou o legislador constituinte de conceder aplicabilidade plena à norma constitucional, uma vez que a plena eficácia dependia da criação de lei infraconstitucional.

Em 1969, elabora-se a Emenda Constitucional nº 01 à Constituição de 1967, que foi chamada de Constituição da República Federativa do Brasil de 1969, dadas as vastas alterações no texto da primeira Constituição criada durante o regime militar brasileiro. E tal nova Constituição apenas repetiu a norma constitucional anterior, sem nada acrescer para as teorias que circundavam a evolução do princípio da igualdade enquanto direito fundamental.

Enfim e, uma vez reestimulada a lembrança da história constitucional do Brasil em matéria de previsões expressas do princípio da igualdade, a Constituição brasileira atual, hoje com mais de três décadas de vigência e promulgada em 05 de outubro de 1988, conforme já no decorrer deste estudo salientado, conferiu relevância e magnitude ímpares aos direitos e garantias fundamentais, com um de seus focos maiores voltado para o princípio da igualdade. Mantendo-o dentro do rol dos direitos e garantias individuais e coletivos, não poupou previsões do princípio em voga, o qual também aparece, entre outros capítulos, títulos, seções e dispositivos, no caput do Art. 5º e no Art. 3º, inciso IV, da Constituição da República. Oportuno assim observar e concluir que, com todas as variações e mutações sociais e jurídicas por que passou o país desde sua independência, o princípio da igualdade, também com as devidas adaptações a cada momento histórico e, respeitadas sempre as devidas proporções de avaliação e aprofundamento, sempre esteve presente nas ordens jurídicas nacionais.

Destarte, apesar de se ter aqui considerado imprescindível a anunciação histórica supra aduzida, as breves linhas e parágrafos anteriores, antes dos quais pontuais razões já haviam sido expostas, devem ser agora e, ainda, suplementados, sobretudo com céleres menções teóricas e a princípios e regras que, de mãos dadas com a igualdade, fazem com que a mesma adquira sempre mais robustez e força normativa. Assim, se certo é que a isonomia, epistemologicamente, sempre esteve presente no âmago do Direito pátrio, em menor ou maior grau, a depender do momento histórico nacional, deve-se a tal preocupação legislativa e constituinte ser acrescida atenção complementar, por meio de um cuidado e preocupação com a aplicação e efetividade do princípio da igualdade. Outrossim, em decorrência do apenas alegado, deve-se atentar para sua extensão e raio de incidência, uma vez que uma interpretação restritiva se deve evitar em face de tão relevante pilar do Direito. Dessa forma, como também e, concomitantemente, não se lembrar da importância do princípio da razoabilidade das leis, com o qual deve conter íntima e indissociável relação o princípio da igualdade? Da mesma maneira, como não trazer à tona a neste trabalho já acolhida teoria da eficácia privada do princípio da igualdade, de acordo com a qual o princípio, além de obrigar o Estado18 18 Em todas as suas formas de atuação, vale dizer, órgãos legislativos, executivos e judiciários. a agir em consonância com os ditames igualitários, vincula invariavelmente os cidadãos, os quais, em âmbito de suas relações privadas19 19 Embora não se pretenda esmiuçar a aplicação e incidência dos direitos fundamentais no âmbito das relações privadas, recomenda-se, entre vários outros trabalhos, consulta ao livro intitulado “Direitos Fundamentais e relações privadas”, de autoria de Daniel Sarmento (SARMENTO, 2003). Os ora autores, ao longo do presente artigo, ressalte-se, valeram-se, principalmente, da referida obra, para as pontuais menções sobre aplicabilidade de direitos fundamentais em seara privada e, em especial, do princípio da igualdade. , devem respeitar, invariavelmente, o princípio fundamental ora sob análise? Veja-se, associações e suplementações aparecem a todo tempo e demonstram a magnitude do que ora se pesquisa e desenvolve.

Com efeito e, no rumo central e precípuo do presente artigo, tais considerações supra são alçadas a categoria deveras importante, sobretudo se se levar em consideração a relevante questão urbana. Por exemplo, no que tange ao princípio da razoabilidade das leis, é mister salientar que o legislador, no exercício de suas funções legiferantes, deve elaborar leis que estejam em perfeita harmonia com o princípio da igualdade, podendo e devendo ser impugnadas, por afronta ao devido processo legal substantivo20 20 O devido processo legal é, na opinião dos ora autores, direito fundamental sobremaneira importante para nortear e reger as relações jurídicas brasileiras. Não é o foco primeiro do presente estudo, entretanto, foram utilizadas três obras específicas como auxiliadoras do presente estudo. Duas de autoria de Carlos Roberto de Siqueira Casto, intituladas “O princípio da isonomia e a igualdade da mulher no Direito Constitucional” (CASTRO, 1983) e “O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil” (CASTRO, 1989) e uma de autoria de Toni M. Massaro e Thomas E. Sullivan, cujo título é “The Arc of Due Process in American Constitutional Law ” (MASSARO, SULLIVAN, 2013). Segundo estes últimos, depois de enumerarem nove princípios nucleares, tal como, entre outros e, a título de simples e delimitado exemplo, o do “respeito pela igualdade individual”, sendo que todos considerados básicos para a própria existência do devido processo legal no âmbito do direito norte-americano, a união dos referidos princípios representaria uma antecipação de um sistema que avançaria em matéria de objetivos coletivos. Assim, então, declaram: “Taken together, the principles anticipate a system that advances collective goals in a nonarbitrary manner, that respects individual autonomy, procedural regularity and equal treatment, and that observes structural restraints on official power” (MASSARO, SULLIVAN, 2013, p. 218). , normas legais que atentem contra o direito constitucional fundamental. Em seara urbana, uma lei ou espécie normativa que incentive segregações e desigualações urbanísticas, deve ser questionada, colocada em xeque e sua inconstitucionalidade examinada pela jurisdição constitucional. Normas que, salvo interpretação patentemente mais favorável aos interesses público e da coletividade, amplamente entendida, incentivem o destombamento e sejam complacentes com a poluição ambiental, enquadram-se no que apenas se está levantando. Igualmente, um planejamento territorial que privilegie o acesso21 21 Toma-se a liberdade de se apresentar classificação no que tange ao que aqui se chamará de acesso urbanístico. Assim, entende-se proveitoso subdividir o acesso urbanístico em duas categorias: (a) acessos urbanísticos gerais; (b) acessos urbanísticos específicos. No primeiro caso, enquadrar-se-ia o exemplo dado no corpo do texto, relativo ao acesso proporcionado pelo Poder Público, a partir de específico planejamento territorial, a determinadas áreas de lazer em uma cidade. O acesso à moradia, ao transporte, à segurança e a várias funções sociais da cidade e direitos sociais constitucionalizados, também se inserem na primeira classificação. Por outro lado, exemplos mais específicos da vida cotidiana em uma cidade, tais como semáforos que informem e alcancem tanto pessoas sem, quanto pessoas com deficiência, assim como idosos e todas as pessoas que precisem atravessar uma via automotiva; ciclovias que permitam a circulação de sempre mais pessoas e proporcionem a possibilidade de transporte eficaz entre localidades; praças públicas que ofereçam equipamentos capazes de proporcionar lazer a todas as pessoas, tais como as já citadas pessoas com e sem deficiência, idosos, crianças, jovens, adultos em geral, além de animais com permissão de circulação em vias públicas; calçadas que permitam a deambulação com segurança em todas as áreas da cidade etc. Repare-se, os exemplos são inúmeros e os aqui citados têm apenas o condão de mera e simplesmente tentar explicar a classificação sugerida. a determinadas áreas de lazer público e coletivo a grupos sociais economicamente mais abastados, entre tantas outras ilustrações, também se enquadram no que se quer inferir. Perceba-se, em realce aos exemplos trazidos, o destombamento assim como a poluição ambiental e um planejamento territorial segregador, com toda certeza e, por um lado, podem ser favoráveis a certos grupos sociais de pressão, mas, por outro, é igualmente certo que destoarão dos objetivos constitucionais mores da nação, dos seus Estados e de seus municípios, respectivamente guiados pela Constituição da República, pelas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas municipais.

Portanto, produções legislativas que agucem discriminações desarrazoadas devem ter seu teor inconstitucional e discriminatório sinalizados e publicizados, a fim de que crescentemente possam a população e o povo brasileiro entenderem que precisam aquelas (produções legislativas discriminatórias) ser repelidas e não admitidas. No mesmo diapasão, atos individuais que contrariem a igualdade em seara urbanística devem ser reprimidos pelo Poder Público, o qual deve agir em prol de uma sociedade mais justa e equânime. A invasão privada do espaço público, sem o consentimento do Poder Público ou, ainda que com ele, sem a concordância da população mais diretamente interessada e atingida, deve ser questionada, trazida à baila para discussão e, se for o caso, eliminada.

Destarte, nesta linha de estudo, já é possível compreender a magnitude da igualdade e como pode a mesma ser ponto chave de equilíbrio social, valendo como alavanca para a formação de uma sociedade mais justa e comprometida com o desenvolvimento nacional. Os centros urbanos brasileiros, mesmo após alguns avanços de cunho urbanístico, tendo em vista o advento da Constituição de 1988 e seu conjunto de normas voltado ao tema22 22 Conferir o trabalho de Luigi Bonizzato, intitulado “A Constituição Urbanística e a confirmação de uma teoria do Direito Constitucional Urbanístico”, no qual o autor faz menção a um verdadeiro “estatuto constitucional urbanístico” e, dos “elementos para a confirmação” de uma teoria do direito constitucional urbanístico, conforme previsto na primeira edição da obra, evoluiu para, em sua segunda edição, a confirmação de uma “teoria do direito constitucional urbanístico” (BONIZZATO, 2020). , do Estatuto da Cidade, com seus mais de 20 anos, do Estatuto da Metrópole, entre outras legislações e espécies normativas, continuam a carecer de soluções eficazes para suas numerosas mazelas e distúrbios, dentre os quais os relativos e ligados à moradia, ao saneamento básico, à segurança e à violência, aos transportes etc. A cultura em torno dos direitos da cidade, de suas funções sociais, ambientais etc. e do Direito Urbanístico na sua mais precisa e preciosa concepção, certamente se fortificou nas últimas décadas. Mas há caminho longo a ser ainda seguido, em prol de uma cultura sempre mais extensa, presente e enobrecida.

Não se pode esquecer que atos que envolvem os três graus federativos, principalmente o municipal, contribuíram, consideravelmente, para o favorecimento contínuo das classes economicamente mais abastadas e para a exclusão cada vez maior das classes, neste mesmo aspecto, mais desfavorecidas. A famosa23 23 Adjetivação assumida pelos aqui autores, a partir da ideia segundo a qual o público-alvo do presente artigo é familiarizado à expressão “especulação imobiliária” e ao seu grau de visibilidade jurídica, social, econômica etc. especulação imobiliária, sobre a qual, nas linhas seguintes, mais pontuais observações serão ainda feitas, há tempos é realidade implacável nos centros urbanos brasileiros e uma das principais responsáveis por múltiplos problemas e desigualdades, integrantes das mais variadas dinâmicas, políticas e criações urbanísticas.

Ricardo Pereira Lira, em exame da referida especulação, em 1997LIRA, Ricardo Pereira. Elementos de Direito Urbanístico. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 1997., já expunha que “no ordenamento atual brasileiro, o não-uso é uma faculdade do dominus soli”. E, em continuação, concluía que tal fato e consubstancia em “um dos fatores que ensejam a prática especulativa nos grandes centros urbanos” (LIRA, 1997LIRA, Ricardo Pereira. Elementos de Direito Urbanístico. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 1997., p. 167.).

Com efeito, adiante-se, ao se falar de especulação imobiliária, que não se olvide uma das faculdades básicas do detentor do direito de propriedade: o não-uso. E este, por sua vez, juntamente com o uso atrelado a interesses financeiros, social e majoritariamente excludentes, formam uma cadeia de difícil e complexo rompimento, uma vez que a contemporaneidade mostra a proeminência da economia de mercado sobre tantas outras agendas políticas e sociais.

O capítulo seguinte se voltará, em continuação à presente pesquisa, para uma proposta de análise de suposta relação entre o surgimento normativo e desenvolvimento fático dos planos diretor e de desenvolvimento urbano integrado - PDUI, e o princípio da igualdade. Entretanto, com maior especificidade, entre os planos citados e o que se definirá como igualdade urbana, mas, principalmente, urbanística.

Realmente, uma maior preocupação do legislador24 24 Seja em âmbito federal, estadual e, principalmente, municipal. com a igualdade no ato da elaboração de leis urbanísticas - entre as quais, em especial, os planos urbanísticos - juntamente com políticas governamentais atentas para os problemas urbanos e com uma conscientização ativa25 25 A expressão conscientização ativa, no texto presente, quer dizer uma tomada de consciência, associada à prática de atos concretos capazes de implantar e criar condições de cumprimento e materialização da igualdade em seara urbana. Para além da participação popular prevista no Estatuto da Cidade, com suas formas adotadas nas últimas décadas - audiências públicas, por exemplo -, como requisito indispensável para a elaboração de planos diretores, não somente publicidade, mas também transparência, conforme se voltará a citar, devem ser garantidas pelo Poder Público aos cidadãos. Além disso, em também adiantamento de colocações subsequentes, outras tradicionais figuras, tais como o plebiscito e o referendo, podem ser mais constantemente utilizadas pelos entes federativos, a fim de consultar a população, mesmo que a partir de perguntas simplificadas que levam a um “sim” ou “não”, a um “concordo” ou “não concordo”, sobre suas vontades majoritárias. Informação em massa e consultas feitas com base em perguntas bem lapidadas e formuladas devem ser o caminho a ser seguido, a fim de se mitigar os efeitos também não tão e necessariamente positivos dos institutos do plebiscito e do referendo. da sociedade, são requisitos fundamentais para que se possa alcançar uma maior qualidade de vida nos centros urbanos brasileiros. Mas, frise-se, qualidade igualitária, geradora de dignidade26 26 Sobre dignidade urbana, vale destacar o seguinte: “Visando a um melhor entendimento, definir-se-ia dignidade urbana como a aplicação urbana do princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, seria uma forma de subprincípio atrelado ao princípio maior, o qual ditaria os rumos e caminhos a serem seguidos. Em outras palavras, estar-se-ia diante do princípio da dignidade da pessoa humana incidente e aplicado no âmago das relações urbanas, garantindo às populações urbanas do país, o respeito pelos direitos humanos basilares, tais como habitação, segurança, saneamento básico etc.” (BONIZZATO, 2015, p. 98). E, em mais recente trabalho, o mesmo autor ressalta que “deve ser ressaltado que o afirmado subprincípio da dignidade urbana também implica no atendimento de uma série de outros direitos, tais como segurança, saúde, educação, transporte, iluminação pública, dentre tantos outros. Assinale-se, muitos dos quais, direitos sociais constitucionalizados, regados pela fundamentalidade trazida, internamente, pela Constituição de 1988” (BONIZZATO, 2020, p. 44). e igualdade nos centros urbanos e no âmbito de concretização do Direito Urbanístico.

2. IGUALDADE E DESIGUALDADE URBANÍSTICAS E UMA POSSÍVEL RELAÇÃO COM O ADVENTO E CRIAÇÃO DOS PLANOS DIRETOR E DE DESENVOLVIMENTO URBANO INTEGRADO (PDUI)

Após o exame focado para a montagem das bases sobre o princípio da igualdade, mas sem qualquer abandono e afastamento do fio condutor do presente artigo, passa-se para exame mais preciso da relação entre a Constituição da República e suas mais de três décadas de vigência, do Estatuto da Cidade e os mais de 20 anos de sua criação, assim como, ainda que de modo mais específico, do Estatuto da Metrópole. Mas, frise-se, um exame relacional com um pano de fundo central e fundamental: o da figura dos planos urbanísticos no Brasil, em especial do plano diretor, mas sem se esquecer do plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI).

A título inicial ao presente capítulo, e à guisa de mero exemplo estrangeiro e sem qualquer pretensão de se imiscuir no universo do direito comparado, ressalte-se comentário de María Pardo Álvarez, sobre a relação entre planificação, urbanismo e a Constituição da Espanha27 27 Assim estatuem os Artigos 45, 46 e 47 da Constituição Espanhola: “Artículo 45. 1. Todos tienen el derecho a disfrutar de un medio ambiente adecuado para el desarrollo de la persona, así como el deber de conservarlo. 2. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los recursos naturales, con el fin de proteger y mejorar la calidad de la vida y defender y restaurar el medio ambiente, apoyándose en la indispensable solidaridad colectiva. 3. Para quienes violen lo dispuesto en el apartado anterior, en los términos que la ley fije se establecerán sanciones penales o, en su caso, administrativas, así como la obligación de reparar el daño causado. Artículo 46. Los poderes públicos garantizarán la conservación y promoverán el enriquecimiento del patrimonio histórico, cultural y artístico de los pueblos de España y de los bienes que lo integran, cualquiera que sea su régimen jurídico y su titularidad. La ley penal sancionará los atentados contra este patrimonio. Artículo 47. Todos los españoles tienen derecho a disfrutar de una vivienda digna y adecuada. Los poderes públicos promoverán las condiciones necesarias y establecerán las normas pertinentes para hacer efectivo este derecho, regulando la utilización del suelo de acuerdo con el interés general para impedir la especulación. La comunidad participará en las plusvalías que genere la acción urbanística de los entes públicos ”. Perceba-se, conforme adiante, mesmo que brevemente, se continuará a examinar, como a intenção constituinte de “impedir a especulação”, entre outros valores de proteção da moradia, resta claramente estampada no texto constitucional espanhol, fato que demonstra que o fenômeno da especulação imobiliária é palmar e francamente objeto de preocupação em outros países, para além do Brasil. E, que se ressalte, sem que neste artigo se promova qualquer exame de direito comparado, servindo menções e citações a textos estrangeiros como meras exemplificações e agregações de cunho teórico. Artículo 47. Todos los españoles tienen derecho a disfrutar de una vivienda digna y adecuada. Los poderes públicos promoverán las condiciones necesarias y establecerán las normas pertinentes para hacer efectivo este derecho, regulando la utilización del suelo de acuerdo con el interés general para impedir la especulación. La comunidad participará en las plusvalías que genere la acción urbanística de los entes públicos ” (CONSTITUCIÓN ESPAÑOLA Y LEY ORGÁNICA DEL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, 2014, p. 31-32). (ÁLVAREZ, 2005ÁLVAREZ, María Pardo. La potestad del planeamiento urbanístico bajo el Estado social, autonómico y democrático de Derecho. Madrid: Marcial Pons, 2005., p. 250):

La Constitución efectúa, como sabemos, un expreso mandato a los Poderes públicos para que regulen el uso del suelo (art. 47), al tiempo que determina los objetivos de aquella regulación: impedir la especulación; facilitar el acceso a la vivienda digna y adecuada; proteger el medio ambiente, el patrimonio cultural y artístico, o garantizar un reparto equitativo de beneficios y cargas, entre los más importantes (arts. 45, 46 y 47).

Tal transcrita citação, tanto reforça a importância das normas constitucionais em matéria urbanística, quanto demonstra que certos princípios já mencionados neste texto, inclusive o da igualdade, são de fundamental importância para a regulação do uso do solo e, na mesma medida, para o planejamento urbano e a ordenação do território. Nesse rumo, não se pode cogitar de olvidar alguns objetivos normativos, direcionados, sobretudo, ao Poder Público brasileiro e que findam por praticamente não diferir das determinações da própria citação acima transcrita. O que se defende em vários países, verbi gratia, também na Espanha estudada por María Pardo Álvarez (ÁLVAREZ, 2005ÁLVAREZ, María Pardo. La potestad del planeamiento urbanístico bajo el Estado social, autonómico y democrático de Derecho. Madrid: Marcial Pons, 2005.), é o que se procura alcançar também no Brasil. Entretanto, no âmbito das relações sociais e urbanas, de variados e múltiplos municípios do país, são verificáveis muito mais problemáticas e déficits do que evoluções em prol da qualidade de vida e do bem-estar social, apenas a título exemplificativo.

Com efeito, importante atentar para o fato de que as chamadas funções sociais da cidade28 28 A Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, de forma semelhante com a Constituição do ente federativo de grau superior e dentro do qual se localiza, ou seja, do Estado do Rio de Janeiro, porta um elenco minimamente iluminador sobre as funções sociais da cidade, citadas no Art. 182 da Constituição da República, mas ali não definidas nem enumeradas. Assim estatui o Art. 422, caput, da Lei Orgânica Municipal carioca: “A política urbana, formulada e administrada no âmbito do processo de planejamento e em consonância com as demais políticas municipais, implementará o pleno atendimento das funções sociais da Cidade”. E eis o que estabelece seu parágrafo primeiro: “As funções sociais da Cidade compreendem o direito da população à moradia, transporte público, saneamento básico, água potável, serviços de limpeza urbana, drenagem das vias de circulação, energia elétrica, gás canalizado, abastecimento, iluminação pública, saúde, educação, cultura, creche, lazer, contenção de encostas, segurança e preservação, proteção e recuperação do patrimônio ambiental e cultural”. continuam sendo de alcance cada vez mais complexo, uma vez que sua concretização depende de um significativo volume de decisões políticas, jurídicas, econômicas e, entre outras, sociais, em relação às quais também se requer integração, conectividade e dialogia. E, tudo isso, torna-se algo de difícil realização em uma sociedade desigual e urbanisticamente segmentada, sobretudo em razão e a partir das próprias decisões supracitadas. Um socialmente cruel mecanismo de empoderamento de grupos de pressão economicamente abastados e favorecidos, faz com que as agendas decisórias se voltem menos à aplicação prática das normas portadoras das funções sociais da cidade e, por conseguinte, dos próprios direitos sociais previstos na Constituição da República, e mais para a defesa da incidência do capital e do poder financeiro sobre a ocupação territorial urbana e das cidades29 29 A especulação imobiliária é um dos mais visíveis fenômenos do que ora se expõe. Sobre o tema, com clássico, crítico e um tanto quanto sempre atual exame, David Harvey declara, no que tange à relação entre espaço, tempo, custo, lucro e, por corolário, à própria produção da organização espacial, o seguinte: “No entanto, como sempre existem limites espaciais tecnologicamente definidos de algum tipo, a questão permanece: o que acontece em seus confins? Evidentemente, o capital e a força de trabalho devem se unir em algum ponto específico do espaço para ocorrer a produção. A fábrica é um ponto de reunião, enquanto a forma espacial de urbanização pode ser vista com a resposta capitalista específica à necessidade de minimizar o custo e o tempo de movimento sob condições da conexão interindústrias, da divisão social do trabalho e da necessidade de acesso tanto à oferta de mão de obra como aos mercados dos consumidores finais. Os capitalistas individuais, em virtude de suas decisões localizacionais específicas, moldam a geografia da produção em configurações espaciais distintas” (HARVEY, 2006, p. 146.). O já citado viés crítico do autor, calcado, entre outros estudiosos e pensadores, em Karl Marx, faz com que a discussão, a “construção-desconstrução” teórico-metodológica e o fomento a reflexões e questionamentos sobre variados arquétipos, exsurjam e se mantenham constantes. O que, ao sentir dos ora autores, é sempre fundamental em âmbito acadêmico e científico. .

Entretanto, dificuldades cotidianas não podem servir de desculpa para o inacabado e para o descaso, máxime em se tratando de políticas governamentais e elaborações legislativas: os governos e parlamentares devem esforçar-se para a efetivação de suas promessas de campanha, às quais, pelo menos em tese, encontram-se vinculados, e governantes, parlamentares, administradores, cidadãos e, em resumo, todos em um Estado de Direito devem respeito incondicional à lei - neste momento mencionada em sentido lato -, conforme bem anuncia o norte da legalidade, clara e categoricamente estampado no Art. 5º, inciso II, da Constituição Federal brasileira. Assim é que, antes mesmo de se chegar aos resultados de específicos dados levantados, em obediência ao desde o início deste escrito aduzido, cabem e devem ser aditadas algumas demais reflexões e intepretações, diretamente ligadas às bases sobre as quais se fundam o presente trabalho. Novas classificações e concepções, com foco em uma maior especialização do que ora se perscruta.

Dentro, então, do contexto decorrente do até aqui construído e dos moldes desenhados sobre a igualdade e questões de natureza urbanística, propõem-se criar diferenciação entre expressões, a fim de que se possa seguir com ainda mais precisão rumo aos objetivos mores deste artigo. Assim, primeiramente, entende-se necessário diferenciar igualdade urbana de igualdade urbanística. Mas, que se ressalte, tal diferenciação ocorrerá sobre os alicerces montados no presente artigo, o que não exclui outras possibilidades interpretativas e classificatórias, uma das quais, inclusive, a de se considerar tais expressões como sinônimas.

Dessa forma, em primeiro lugar, imperioso ressaltar que se entende por igualdade urbana aquele que incide no âmbito urbano. Com maior precisão, uma espécie de interpretação que conduz à ideia segundo a qual se estaria diante da aplicação do princípio da igualdade em seara urbana. Concomitantemente e, com possíveis pontos de interseção, mas com potencial conceitual próprio, a igualdade urbanística se aproxima da noção tecnicamente mais acurada da vinculação entre Direito Urbanístico e o princípio da igualdade. O Direito Urbanístico possui interdisciplinaridade e transversalidade ímpares, assim como várias facetas, uma das quais ligadas à igualdade no tocante à implantação e vigência de políticas públicas em áreas urbanas. E tais políticas representam a concretização do Direito Urbanístico, a qual deverá ser socialmente includente e equitativa, muito embora não necessariamente e, no mundo prático, assim seja.

Nesse viés, assinale-se que não se está a afirmar que diferenciações não possam ocorrer na concretização e materialização do Direito Urbanístico. A contrario sensu, conforme já, inclusive, levantado neste artigo, o princípio da igualdade, muitas vezes, requererá desigualações pontuais para que seja respeitado, sobretudo porque deve caminhar de mãos dadas com o princípio da diferença, sem o qual não se pode conceber uma sociedade mais justa, solidária e, principalmente, plural, tal como se apresentam inúmeras sociedades na contemporaneidade.

Aliás, aproveite-se o momento e ensejo para breves esclarecimentos sobre o logo acima anunciado princípio da diferença. Sem maiores divagações, mas, ao mesmo tempo, sem a pretensão de não enfrentamento mínimo de aspectos conceituais e circundantes do referido princípio, escolhe-se teoria clássica para que se proceda a algumas definições aqui desejadas, a partir da menção utilizada, antecipando-se, desde logo, que célere menção a também um outro princípio virá à tona.

Com este breve espaço que aqui se decide abrir, portanto, debruçando-se sobre a tentativa de criar uma “teoria da justiça”, John Rawls não poupou pesquisas e estudos sobre relações entre a busca pela igualdade e a perseguição da justiça. Na linha proclamada, enfatizou a existência de dois princípios básicos, quais sejam, o princípio da reparação e o princípio da diferença. Pelo primeiro, desigualdades imerecidas exigiriam reparação; e como desigualdades de nascimento e de dotes naturais são imerecidas, elas deveriam ser de alguma forma compensadas.30 30 E, neste rumo, conclui o Autor em comento: “Assim, o princípio determina que a fim de tratar as pessoas igualitariamente, de proporcionar uma genuína igualdade de oportunidades, a sociedade deve dar mais atenção àqueles com menos dotes inatos e aos oriundos de posições sociais menos favoráveis. A idéia é a de reparar o desvio das contingências na direção da igualdade” (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000, p. 107.). Já o segundo princípio, frise-se, o princípio da diferença, representaria um consenso em se considerar, em certos aspectos, a distribuição de talentos naturais como um bem comum, e em partilhar os maiores benefícios sociais e econômicos possibilitados pela complementaridade dessa distribuição.31 31 Nesta linha, também conclui John Rawls: “Os que foram favorecidos pela natureza, sejam eles quem forem, podem beneficiar-se de sua boa sorte apenas em termos que melhorem a situação dos menos felizes” (RAWLS, John. Obra citada, p. 108.).

A associação dos dois princípios citados, com efeito e, a partir do pensamento rawlsiano, pode conduzir à conclusão segundo a qual aqueles que por dotes naturais, de alguma forma, favoreceram-se dentro de uma estrutura social, devem necessariamente agir no intuito de melhorar as condições de vida dos menos favorecidos. Restando demonstrado, exempli gratia, que o conforto habitacional de uns teve por causa talentos naturais ou desigualdades imerecidas, devem tais beneficiados moverem-se no sentido de proporcionar conforto habitacional a todos aqueles que se encontram condenados à carência de moradia. E assim sucessivamente no que tange a uma série de direitos fundamentais, sobretudo sociais, uma vez que prestacionais pelo Estado e que findam, ainda mais em sociedades subdesenvolvidas e com altos índices de desigualdades sociais, por não serem garantidos pelo Poder Público a seus cidadãos.

De toda maneira, os poucos parágrafos anteriores apenas objetivaram, a partir de uma específica e escolhida teoria sobre o tão complexo instituto, denominado “justiça”, inserir, neste artigo jurídico, uma - entre tantas - definições que circundam as ideias de diferença, quando relacionadas à igualdade e, por corolário, também à desigualdade.

Nesse sentido e, após - a título de recortado e de bem delimitado acréscimo - a construção de um alicerce primário básico sobre a ideia de um também princípio da diferença, cuja aplicação, discussão e debate são reputados cabíveis e enquadráveis em um ambiente urbano32 32 Contudo, ressalte-se, não possui o presente artigo qualquer pretensão de invadir a seara de estudos mais diretamente ligada a aprofundamentos sobre o princípio da diferença, o qual integra o âmbito de sempre complexa investigação, comumente voltada para estudos sobre a justiça enquanto um verdadeiro instituto, em relação ao qual se tenta, há tempos, formular uma teoria. A escolha, assim, pela obra de John Rawls é meramente optativa (com o perdão de possível redundância) e não pretende desmerecer quaisquer e inúmeros outros trabalhos, inclusive posteriores aos de Rawls, sobre uma ideia, teoria ou noção de justiça. , a ideia de igualdade urbanística acaba por ser recheada de mais conteúdos, em torno dos quais reflexões, investigações e enfrentamentos contínuos devem ocorrer. Destarte, se igualdade urbana aqui se apresenta como uma expressão com tendência a leituras mais genéricas, igualdade urbanística aproximar-se-á do próprio Direito Urbanístico, focado no princípio da igualdade, outros princípios correlatos e nas suas respectivas zonas de aplicação. Mas, vale lembrar, sem abandonar a ideia de acordo com a qual, do ponto de vista finalístico-fático, podem as expressões realmente encontrar-se e fundir-se em um entendimento único. Mas, inicialmente, à parte tal possibilidade, o que se traz ora à tona é, portanto, a diferenciação entre igualdades urbana e urbanística.

Outrossim e, em complementação a todo o até aqui exposto, é fundamental realçar o simultâneo nascimento da ideia de desigualdade urbana e de desigualdade urbanística, que, para os fins deste texto, mostra-se igualmente relevante. Com base nas mesmas linhas conceituais aplicadas para a igualdade, a primeira - desigualdade urbana - mais voltada a uma materialidade da aplicação do princípio da igualdade em regiões urbanas. E a segunda, mais voltada à noção técnica da desigualação decorrente da criação e consecução de políticas urbanas de modo seletivo ou de curto alcance, ou seja, de modo a ser mais excludente do que abrangente e unificador de acessos a uma determinada localidade urbana. Note-se, portanto, a patente e mesma ligação entre desigualdade urbanística e o Direito Urbanístico enquanto um ramo repleto de possibilidades jurídicas, sociais, econômicas etc. Uma verdadeira plêiade de matérias, elementos, institutos e instrumentos vêm à tona com mais aguçado rigor técnico ao se falar de desigualdade urbanística.

Nesse diapasão, finalmente, máxime a partir do desde o início deste trabalho especificado e objetivado, a ligação entre a ordenação do território e a então denominada desigualdade urbanística salta aos olhos de estudiosos e pesquisadores do extenso grupo de direitos relacionados à cidade e aos ambientes urbano e natural, assim como de outras áreas do conhecimento, tais como as do urbanismo, geografia, sociologia, arquitetura, entre vários outros ramos do Direito e do saber. Por esse motivo, a figura dos planos urbanísticos ganha importância, o que leva a um direcionamento conclusivo do presente trabalho, ao estudo de tais planos, no seio da ordem jurídica nacional vigente, construída pela Constituição de 1988. E, nesse cenário e conjuntura, o plano diretor e o plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI) ganham destaque, com especial e inicial enfoque ao primeiro, mas sem esquecimento do segundo.

Sobre a mencionada relação entre ordenação do território e o princípio da igualdade, Olivier Mongin, em seu trabalho “A condição urbana: a cidade na era da globalização”, analisa as desigualdades territoriais sob prisma peculiar e diminui o papel do Estado na configuração dos espaços urbanos. De acordo com tal autor, ao Estado, em um primeiro momento, caberia disciplinar e tentar garantir, principalmente, segurança a uma população urbana que finda por naturalmente organizar, a partir de fenômenos comportamentais próprios da vida em cidades. Eis alguns dizeres do autor (MONGIN, 2009MONGIN, Olivier. A condição urbana: a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2009., p. 206):

Sendo a reconfiguração dos territórios indissociável das desigualdades ampliadas, conclui-se frequentemente que o Estado pode responder a isso disciplinando os territórios, garantindo a segurança, em suma, manifestando seu poder. Se o papel do Estado aparentemente se enfraqueceu no contexto da terceira globalização, é preciso, no entanto, distinguir a redução de sua ação no plano econômico e seu reforço no plano da segurança. Em uma sociedade definida pelo risco, e mais ainda pela ameaça, a expectativa em relação ao Estado é sobretudo a da segurança.

E segue, com menção à cidade das “três velocidades” (MONGIN, 2009MONGIN, Olivier. A condição urbana: a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2009., p. 206):

O enredo da cidade de “três velocidades” ressalta dessa forma que a relação mantida com segurança não é homogênea e depende da maneira pela qual o indivíduo organiza seu habitat e seu ambiente. A “maneira de ser” do indivíduo importa mais que a potência do Estado como tal, e portanto os enredos que focalizam os modos de habitat são ainda mais esclarecedores a esse respeito.

O autor ora em comento salienta que as “três velocidades” seriam a exclusão, a periurbanização e a gentrificação33 33 Considerando as finalidades mores da presente pesquisa, para mais aprofundamentos sobre as referidas “três velocidades”, encaminha-se o leitor para a obra já referida de Olivier Mongin (MONGIN, 2009, p. 205-224). Mas se pode adiantar, de forma concisa, que a exclusão estaria ligada ao movimento de relegação, ligado às áreas ditas “de exclusão”. A gentrificação encontra bases no isolamento das elites globalizadas em relação aos habitantes das zonas periurbanas e dos relegados das cidades, o que já remete à periurbanização enquanto movimento de formação de zonas periurbanas, “esse espaço intermediário que ainda deixa pairar a esperança de uma promoção social” (MONGIN, 2009, p. 210). . E destrincha seu exame asseverando que a partir do momento em que a sociedade se torna totalmente urbanizada “e que a globalização econômica se acompanha de uma precarização dos empregos ‘industriais’, o sentimento de continuidade territorial se enfraquece em todas as camadas da população”. Nessa linha, declara que quando ocorre um desfazimento do sentimento de “fazer sociedade”, “nasce a impressão de que cada universo, cada um dos ‘regimes de cidade’ torna-se estranho um ao outro”. Atualmente, uma região urbana não se reduz mais a um único polo, pois, na verdade, ela seria multipolar, construída, simultaneamente, por um polo urbano, composto de uma ou várias cidades-centro e uma periferia, e por um ou diversos cinturões periurbanos (MONGIN, 2009MONGIN, Olivier. A condição urbana: a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2009., p. 208).

De todo modo, em países com elevados índices de desigualdade social, entende-se que o papel do Estado merece especial atenção, sobretudo como indutor do desenvolvimento econômico, a partir de posturas prestacionais ativas e positivas. Planejar e ordenar um território, levando em conta os direitos fundamentais e humanos, máxime sociais, deve ser pauta obrigatória para a consecução de políticas urbanas. Outrossim, Olivier Mongin antecipadamente já havia concluído que “as desigualdades territoriais, tanto horizontais, quanto verticais, tendem consequentemente a se generalizar em escala planetária” (MONGIN, 2009MONGIN, Olivier. A condição urbana: a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2009., p. 205).

Nesse caminho de grandes desigualdades, no Brasil podem até ser encontrados acertos, mas se continua a pecar em matéria urbanística. A falta de atendimento a direitos fundamentais básicos na condução da política urbana, a partir da observação do plano diretor e do respeito às normas que o regem, interna e externamente (interna: o que deve constar do plano, seu teor, conteúdo jurídico, viés normativo para a ordenação do território etc.; externa: requisitos formacionais, prazos para sua elaboração etc.), faz com que a desigualdade urbanística aumente. Pois, sem dúvida, o ato de criação e implantação de aproximados dois planos por município desde 198834 34 Tal afirmação possui caráter preliminar e será mais adequadamente entendida nos parágrafos subsequentes. Adiante-se, considerando a necessidade imposta pelo Estatuto da Cidade (com criação e entrada em vigor no ano de 2001), no sentido de os planos diretores serem revistos, pelo menos, a cada dez anos, juntamente com a criação da figura deste plano urbanístico, treze anos antes e a partir de sua previsão na Constituição de 1988, o levantamento de dados apresentado, a posteriori, demonstrará a existência média de 02 (dois) planos diretores pelos municípios selecionados, após mais de três décadas de vigência da Constituição da República e vinte anos do Estatuto da Cidade. , mais de vinte anos após a publicação da Lei 10.257/2001, é considerado realização ainda bastante imatura do ponto de vista técnico-jurídico-urbanístico. Paralelamente, seria imprudente não citar o fato de já se poderem notar evoluções na atenção e cuidado com políticas urbanas, o que foi preponderantemente desconsiderado no passado brasileiro, principalmente do ponto de vista jurídico. Deveras, está-se diante de progresso sob determinadas perspectivas35 35 A ideia ligada à evolução é a de que a mera e simples criação da figura do plano diretor pelo legislador constituinte originário brasileiro, já pode ser reputada um avanço, sucedido pela criação do Estatuto da Cidade, dos primeiros planos diretores propriamente ditos, no âmbito de cada município, do Estatuto da Metrópole e da criação legislativa de outro plano urbanístico, qual seja, o plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI). e de ainda manifesta imaturidade e escassez, a partir de uma visão mais abrangente, focada na eficácia de direitos constitucionais e infraconstitucionais, acrescida do auxílio de parâmetros de análise tanto quantitativos, quanto qualitativos, conforme ainda se verá.

De todo modo, o que com maior intensidade se verifica, é que o caminho rumo à consolidação de planos socialmente mais inclusivos - uma vez que, em tantos casos pelo Brasil, prevalece o não menos importante louvor à beleza urbana, entretanto, normalmente voltada a áreas com algum tipo de influência mais presente e incisiva do mercado e do capital36 36 Decorrentes do fenômeno maior, já neste artigo lembrado, intitulado economia de mercado. , sobretudo, imobiliários -, está, pelo menos até as constatações deste artigo e, com base no recorte temático e exemplificativo escolhido, longe de uma concretização.

Assim, sob um primeiro olhar, cria-se uma suposição segundo a qual a igualdade urbanística pode estar, entre outros fatores que, neste exato momento, se distanciam dos fitos da presente pesquisa, diretamente relacionada à eficácia inclusiva dos planos urbanísticos (preponderantemente, ainda, do plano chamado diretor)37 37 Salvo situações excepcionais não aqui comprovadas - em razão, sobretudo, do recorte temático e dos lindes da pesquisa desenvolvida - de ausência de plano e de algum grau relevante de presença de qualidade de vida. e às medidas executivas de cada Prefeito, de cada Governador e, quiçá, do Presidente da República, no exercício de seu poder, principalmente, regulamentar38 38 Com destaque para os decretos regulamentares. . Claro que também se deve falar da relação entre igualdade urbanística e medidas legislativas, mais precisamente, do trabalho legiferante. Mas, como o plano urbanístico decorre de lei, já se pressupõe a participação do Poder Legislativo, cuja atuação não para por aí: leis municipais ordinárias complementam normas previstas no plano diretor, de modo a possibilitar a concretização de ações de cunho urbanístico.

No entanto, não se pode acatar a visão do parágrafo anterior sem também outras considerações. Pois é já sedimentado em teorias e trabalhos variados, tanto de Direito Urbanístico, quanto de outros ramos do Direito e do próprio saber humano, que a ocupação do espaço urbano é marcada, em tantas e tantas cidades, por grande iniquidade. E isto também porque, a por vezes mencionada especulação imobiliária, é fator decisivo para que interesses econômicos sobressaiam sobre interesses sociais. Não que sejam interesses necessariamente antagônicos, mas é comum que a prevalência do capital na ordenação do território seja excludente e crie bairros e camadas da população à margem do acesso aos melhores equipamentos, infraestrutura, atenções e cuidados urbanos39 39 Ermínia Maricato, em clássica subdivisão entre cidade real e cidade oficial, já há anos anunciava tal problemática nos principais centros urbanos brasileiros (MARICATO, 2002). . Em suma, se a suposição referente à relação entre igualdade urbanística e planos diretores socialmente inclusivos deve ser considerada, é fundamental atentar para a dificuldade de uma materialização absoluta de tal cenário, realmente ideal, mas dissonante de um universo de articulações e agendas contemporâneas com focos multifacetados e não necessariamente interligados.

Portanto, não basta um plano diretor para que cidades atendam aos princípios de direito urbanístico, tais como o bem-estar social, a qualidade de vida, a dignidade urbana e da vida e, enfim, a própria igualdade urbanística. Em que pese uma relação essencial entre planos e inclusão social urbanística, aqueles, se influenciados em seu processo de criação por interesses ligados a grupos de pressão não preocupados com quaisquer direitos sociais e citadinos, em seu sentido constitucional mais puro e abrangente, tornar-se-ão mecanismos direcionados a vetores de crescimento que menos valorizarão a igualdade urbanística e mais se aproximarão de interesses específicos de camadas sociais com maior poder de pressão junto aos Poderes, sobretudo Legislativo e Executivo40 40 Nessa toada, exatamente pelo narrado acima, o Estatuto da Cidade e o Estatuto da Metrópole, na trilha de uma série de outras previsões constitucionais, previram a participação popular como essencial ao processo de elaboração dos planos diretores. Talvez, em uma sociedade prevalentemente subdesenvolvida como a brasileira, ainda se tenha que pensar em uma eficácia de tal participação a longo e indefinido prazo. Mas, se se conseguir informar e conscientizar, o amadurecimento democrático será gradativamente fortificado e antecipadas as previsões de criação de planos menos excludentes e com maior grau de eficácia no que tange à concretização da igualdade urbanística. E assim se declara e fala porque, por mais que avanços possam ter ocorrido, a participação popular pode e deve ainda muito crescer para a que a imberbe democracia brasileira possa se mostrar socialmente mais eficaz no processo de criação dos planos urbanísticos. As audiências e consultas públicas, por exemplo, são ainda subutilizadas, se levado em conta todo seu potencial. As audiências, ainda dependentes de informação mais abrangente e eficiente, com não somente publicidade, mas também transparência pela Administração Pública; consultas, em seu sentido formal, praticamente inexistentes em um Brasil que poderia se fazer valer com mais frequência de instrumentos como o plebiscito e referendo em matéria urbanística (convocados principalmente pelos Municípios). Ilustrativamente, a cogitação de consultas plebiscitárias e ad referendum para a realização dos Jogos Olímpicos (2016) e do Pan-americano (2007) na cidade do Rio de Janeiro, não seria aqui considerada nenhuma anormalidade. Muito pelo contrário, iria ao encontro da defesa de uma participação popular mais intensa, presente e, quiçá, eficaz. Sobre as figuras de referendo e plebiscito, recomenda-se releitura de nota de rodapé anterior, localizada na parte final do primeiro capítulo. .

Neste rumo, saltam aos olhos determinados abismos urbanos, os quais refletem, tanto em uma visão causal, quanto consequencial, a desigualdade urbanística nas grandes cidades brasileiras. Considerando, assim, as pretensões ora visadas, avaliações quantitativas e qualitativas concentrarão a pesquisa e seus resultados rumo a determinadas conclusões, auxiliadas por elementos e dados selecionados pelos aqui autores. Os meios utilizados para o alcance dos resultados, reforce-se, são mera opção metodológica dos autores. Por conseguinte, outros tantos caminhos existem. Mas, os objetivos centrais deste artigo, a partir dos recortes temáticos escolhidos, fizeram com que aqui se preferissem uns e se preterissem outros.

Assim, é imperioso assinalar, mais uma vez, que uma específica busca da relação entre igualdade (ou desigualdade) urbanística e o advento e criação de planos diretores e de planos de desenvolvimento urbano integrado (PDUI’s), é aqui reputada útil aos fins ora colimados e, portanto, a algumas conclusões qualitativas. Frise-se, com o foco metodológico voltado para os instrumentos, cenários e elementos de investigação escolhidos.

Assim, uma averiguação das 26 (vinte e seis) capitais, dos 26 (vinte e seis) Estados brasileiros, juntamente com o Distrito Federal41 41 Os resultados numéricos a partir de agora expostos encontram-se presente na “Tabela 01”, anexa ao presente estudo e denominada “ANEXO 1”, salvo os relativos ao plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI), os quais podem ser encontrados na “Tabela 02”, que representa o “ANEXO 2” deste mesmo trabalho. , mostrou que o número total de planos diretores, após a promulgação da Constituição de 1988, é de 58 (cinquenta e oito)42 42 Realce-se que tal número leva em conta, também, leis reformadoras de planos diretores, assim como eventuais legislações com o objetivo de prorrogação da vigência e validade dos planos diretores. , até setembro de 2021. Entretanto, é importante salientar que destes, 46 (quarenta e seis) foram decorrentes leis municipais elaboradas após o advento da Lei 10.257/2001, isto é, do Estatuto da Cidade43 43 A subdivisão de períodos em “após a promulgação da Constituição de 1988” e “após o advento do Estatuto da Cidade” se justifica porque, apesar de a Lei Máxima brasileira ter determinado a obrigatoriedade de criação dos planos diretores para municípios com mais de vinte mil habitantes, um mais adequado detalhamento da figura do plano diretor, incluindo sanções para o caso da não tomada de providências para sua criação e revisão, pelo menos, a cada dez anos, somente ocorreu com a chegada do Estatuto da Cidade, no ano de 2001. , e 12 (doze) criados antes do referido Estatuto e depois da entrada em vigor da Constituição da República44 44 Vale salientar que, se considerado o período que se inicia em 1988 e que vai até a data de conclusão do presente artigo, a maioria absoluta das capitais brasileiras produziu 02 (dois) planos diretores. As poucas exceções fazem com que a média seja de 2,148 (dois vírgula cento e quarenta e oito) planos diretores por capital de cada Estado do país, com acréscimo do Distrito Federal. .

Ressalte-se, ainda, que a contagem que levou aos números presentes no parágrafo anterior, levou em conta, apenas, leis elaboradas pelos municípios que correspondem às capitais dos 26 (vinte e seis) Estados do país, somados ao Distrito Federal45 45 Registre-se que o Distrito Federal, enquanto figura sui generis dentro da federação do país, possui, sempre que necessário para os escopos deste artigo, avaliação especial, em razão de não ser nem um município, nem mesmo um Estado, tendo na figura da Câmara Legislativa a encarnação do Poder Legislativo em seus confins. . Por exemplo, o município de Curitiba tem um atual planejamento territorial regido pela Lei 15.229/2006, elaborada pela Assembleia Legislativa do Estado do Paraná e, portanto, não contabilizada para os fins do presente artigo, o qual somente considera leis criadas por cada Câmara dos Vereadores (Câmara Municipal), uma vez que assim determinou a Constituição de 1988, sobretudo em seu Art. 182.

Ademais, se há capitais (e os correspondentes municípios) que possuem apenas um plano diretor depois da criação do Estatuto da Cidade, em outras se percebe a existência de mais de uma lei sobre o plano urbanístico ora em tela, a maioria das quais leis que atualizam e alteram as anteriores, portadoras dos respectivos planos diretores46 46 Exemplos são as cidades de João Pessoa, Brasília (Distrito Federal) e Manaus. . Por outro lado, em 06 (seis) capitais brasileiras não foi encontrado qualquer plano diretor após a promulgação da Constituição da República e antes da entrada em vigor do Estatuto da Cidade47 47 São elas: Maceió, Macapá, Fortaleza, São Luís, Curitiba e Aracajú. .

Por fim, novamente examinadas as 26 (vinte e seis) capitais dos Estados da federação brasileira, assim como o Distrito Federal, as regiões metropolitanas das quais fazem parte a maioria das capitais e da qual é também parte o Distrito Federal, em sua quase totalidade e, até a data de finalização do presente artigo jurídico, sequer elaboraram o plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI)48 48 Se se considerar o plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI) enquanto decorrente de um trabalho legislativo estadual, oriundo de projeto votado e aprovado, e de lei promulgada, publicada e em pleno vigor, apenas a região metropolitana da Grande Vitória, entre as que foram neste artigo estudadas, possui um plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI), já anos após a entrada em vigor do Estatuto da Metrópole. Em outras 02 (duas) situações, percebeu-se um estado de inércia legislativa, após uma aprovação dos planos de desenvolvimento urbano integrado (PDUI’s), uma vez que não se transformaram em leis estaduais, conforme determina o Estatuto da Metrópole (as pesquisas realizadas pelos ora autores, pelo menos, não foram capazes de encontrar as leis referidas e, tão-somente, minutas de planos de desenvolvimento urbano integrado - PDUI’s -, reputadas aprovadas pelas Assembleias Legislativas do Estado do Rio de Janeiro e do Estado do Mato Grosso, mas sem que se conseguisse encontrar qualquer lei). Para maiores detalhes, conferir a “Tabela 02”, anexa a este trabalho, intitulada “ANEXO 2”. , trazido para o Direito brasileiro pelo Estatuto da Metrópole, Lei 13.089, de 12 de janeiro de 2015, conforme anteriormente já ventilado. Um novo plano urbanístico, de suma importância para a conexão, articulação e interseção de políticas urbanas trazidas por planos diretores dos municípios que integram uma região metropolitana e cujos interesses mores encontram-se interligados. Pois, de transportes intermunicipais e serviços públicos variados a programas habitacionais, políticas de segurança etc., todos representativos da concretização de direitos sociais, a garantia de direitos em um município pode depender de semelhante garantia no e nos municípios limítrofes, integrantes da respectiva região metropolitana49 49 O Brasil possui mais regiões metropolitanas (74 - setenta e quatro) do que o número de suas capitais. Aliás, ressalte-se, de acordo com a “Tabela 02”, constante do “ANEXO 2”, percebe-se que nem todas as capitais dos Estados brasileiros são integrantes de regiões metropolitanas, pois em dois casos (Rio Branco, capital do Estado do Acre, e Campo Grande, capital do Estado do Mato Grosso do Sul) inexistem regiões metropolitanas legal e tecnicamente criadas, embora haja concentração populacional e, portanto, uma aglomeração urbana. Entretanto, a pesquisa realizada e que levou aos presentes resultados valeu-se de recorte específico, o qual considerou, para os fitos ora colimados, apenas as 24 (vinte e quatro) capitais, mais o Distrito Federal, enquanto partes centrais e nucleares das regiões metropolitanas das quais fazem parte. .

Por conseguinte, fortifica-se a ideia segundo a qual a desigualdade urbanística é marca, infelizmente, ainda registrada nos principais centros urbanos brasileiros, em especial, nos selecionados para exame na presente pesquisa. Nada obstante tenham sido criados, pelo menos, 02 (dois) planos diretores na maioria absoluta das capitais estudadas, de 1988 até o presente momento (setembro de 2021), as desigualdades urbanísticas seguem como um problema em busca de soluções. E isto porque, entre outros variados fatores50 50 O foco deste artigo jurídico se volta para o que nele especificamente se abordou. Entretanto, neste mesmo estudo, já foram feitas menções a macro problemáticas, ligadas à economia de mercado e que exercem grande influência nas dinâmicas urbanas. Além disso, momentos de recessão econômica, que trazem consigo desemprego, inflação, aumento da violência, falta de investimentos em políticas públicas e urbana, assim como, consequentemente, em direitos sociais, são fatores e elementos que devem ser igualmente considerados como facilitadores e fomentadores de desigualdades sociais múltiplas e extensas. que poderiam ser aqui levantados, também a majoritária inobservância no que toca à necessidade de criação dos planos de desenvolvimento urbano integrado (PDUI’s)51 51 No intuito de esclarecimentos derradeiros, mas ora ainda reputados relevantes, eis o observado por Luigi Bonizzato e Isabelle Esteves Moulin: “Paralelamente, a chegada de um novo plano urbanístico, fora da esfera constitucional, mas de magnitude ímpar, sobretudo por (a) reforçar o caminho de fortificação da figura de planos urbanísticos em um país sem tradições, principalmente jurídicas, de planos desta natureza; (b) conter relação direta com o único plano urbanístico constitucionalizado em 1988, o Plano Diretor; e (c) abrir espaço para novos horizontes de planejamento urbanístico, com base não somente em políticas urbanas e na consecução de urbanizações decorrentes do urbanismo enquanto ramo do saber, mas também e, principalmente, com base em um verdadeiro e mui rico Direito Urbanístico, torna o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI), um verdadeiro instituto, ator e elemento a ser atentamente acompanhado em seu percurso criacional e aplicacional” (BONIZZATO, MOULIN, 2018, p. 2541). , conduz à conclusão que é preciso mais entendimento do Direito Urbanístico, a fim de que a ordenação territorial possa ocorrer em prol de um processo de inclusão social contínuo e crescente.

De todo modo, os números e dados acima levantados servem, principalmente, para agregar informações a este estudo, em relação ao qual, após mais de 20 anos da publicação da Lei 10.257/2001 e de 30 anos da promulgação da Constituição brasileira em vigor, conceitos como igualdade e desigualdade urbanística foram trazidos à tona para que se pudesse robustecer teorias sobre não somente alguns dos principais e mais populosos espaços urbanos do país, mas também sobre o Brasil, ampla e extensamente considerado, onde podem ser encontradas mais de sete dezenas de regiões metropolitanas, sem se falar de cidades que não integram qualquer região metropolitana e possuem as principais características urbanísticas das que fazem parte da mencionadas regiões. A evolução quantitativa de planos diretores após a chegada do Estatuto da Cidade é patente (repita-se, 45 - quarenta e cinco - após sua criação e apenas 12 - doze - antes de sua publicação e depois da Constituição de 1988) e demonstra avanço do ponto de vista de atenção e preocupação com uma temática até não muito tempo esquecida por juristas de todo país, a saber, a relativa à ordenação do território, ao planejamento urbano e à programação e materialização de políticas públicas em prol da qualidade de vida e bem-estar social nas cidades e municípios brasileiros.

Mas não só da palavra “avanços” sobrevive as conclusões do presente artigo. E isto porque se houve progressos, são aqui reputados ainda insuficientes para todas as capitais estudadas, somadas ao Distrito Federal. A consecução e aplicação dos direitos sociais em seara urbana ainda é insuficiente para que se possa reverter o quadro de manifesta desigualdade urbanística. É longo o caminho a ser percorrido para que o próprio Direito Urbanístico possa irradiar seus poderes, capacidades e potenciais no Brasil. Carência e déficits de moradia, insegurança pública, cidades repartidas em zonas de maior conforto e atendimento às necessidades básicas da população e outras em que o Poder Público praticamente não se mostra presente. Além disso, transportes, educação, saúde, lazer, entre outros direitos, incluindo, até mesmo, direitos de liberdade tradicionais52 52 Liberdade locomoção, direito ir e vir, direito à vida, no qual também se insere o respeito ao ambiente artificial e natural, direito de reunião, inviolabilidade de domicílio, entre vários outros direitos de liberdade, previstos expressamente na Constituição de 1988, como direitos fundamentais da República Federativa do Brasil. , são precariamente garantidos à população, a qual convive, dia após dia, com um cenário de manutenção, crescimento ou tímida melhora da desigualdade, em contraposição à igualdade urbanística.

Conclusão

As grandes cidades brasileiras, conforme se procurou demonstrar, devem ser palco efervescente da luta constante por integração, inclusão e por uma igualdade urbana e, sobretudo, urbanística. O Poder Público, em todas as suas formas e esferas, em comunhão com toda a sociedade civil, genericamente concebida, devem convergir a um só objetivo: proporcionar um progressivo aumento no bem-estar social, na qualidade de vida e no respeito a normas cabais de Direito Urbanístico, intimamente relacionadas a uma série de direitos, inclusive, sociais.

O presente estudo conseguiu, com pilares na pesquisa desenvolvida, confirmar que a igualdade urbanística, atualmente, é uma meta e que a desigualdade urbanística se mantém como a realidade. O advento da figura do plano diretor com a Constituição de 1988, suas primeiras concretizações em vários municípios do Brasil, juntamente com a chegada do Estatuto da Cidade e elaboração posterior de novos e mais planos diretores, significou um avanço, mas não se mostrou suficiente, por exemplo, para uma mais ampla, extensa e eficaz materialização dos direitos sociais previstos na Constituição da República, o que conduz a desigualdades constitucionalmente injustificadas, preponderantemente em regiões urbanas, já que carências urbanísticas variadas são um espelho de direitos fundamentais e, sociais, aplicados de forma insuficiente nas tão numerosas cidades brasileiras. Da mesma maneira, a criação de novo plano urbanístico, pelo Estatuto da Metrópole, lei publicada em janeiro de 2015, não logrou conseguir com que a maioria absoluta das regiões metropolitanas, no interior das quais se encontram a maior parte das supra referidas 26 (vinte e seis) capitais dos Estados brasileiros e o Distrito Federal, conseguissem ter um planejamento urbanístico regulado por plano de maior abrangência que o plano diretor e, reforce-se, hierarquicamente superior. Em mais precisos dizeres e, dentro dos lindes de pesquisa aqui estabelecidos, até setembro de 2021, data de conclusão do presente artigo, apenas 01 (uma) região metropolitana brasileira foi capaz de elaborar e aprovar a lei instituidora do plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI). Outros 02 (dois) Estados brasileiros, entes federativos a quem compete a criação do referido plano urbanístico, conseguiram elaborar, mas sem transformação em lei, planos de desenvolvimento urbano integrado (PDUI’s) para as 02 (duas) regiões metropolitanas, nas quais se encontram suas capitais.

Tudo isso, portanto, é considerado pouco. Pois se o princípio da igualdade é uma das principais bases sobre as quais se funda o ordenamento jurídico brasileiro, deve-se, com respeito a todas as suas nuanças, inclusive o respeito às diferenças, estimular sua aplicação e concretização. E, diante da manifesta desigualdade urbanística presente nos principais centros urbanos nacionais, não é difícil concluir que trajeto a ser percorrido é longo e árduo. Em sua obra criadora, devem, assim, os Poderes Legislativos e Executivos federais, estaduais, municipais e distrital respeitar incondicionalmente o devido processo legal, processual, por obviedade e, sobretudo, substantivo, defendendo, protegendo e aplicando os princípios fundamentais constitucionais no exercício de suas funções e atividades, em especial, considerando os fins ora colimados, o princípio da igualdade.

Lembre-se, ainda, da igualdade que deve acompanhar, simultaneamente, as relações privadas. Assim, aos cidadãos compete agir de forma respeitosa à isonomia, evitando a prática de atos que possam vir a significar um abalo aos alicerces de justiça e igualdade. O próprio direito de propriedade, coração do sistema civilista e privado pátrio, deve ser exercido pelos seus detentores de modo a buscar a consecução desses princípios. Conforme já salientado, assim, a conduta especulativa, máxime nos grandes centros urbanos brasileiros, apesar de já devidamente monitorada pela lei, deve ser evitada pelos proprietários de imóveis urbanos, os quais, ao pressionarem, volumosamente, instituições nacionais e os Poderes da República, levam à criação e fomento contínuo deste real círculo vicioso. Embora hoje a ordem jurídica brasileira já possua relevantes ditames legais e constitucionais, que visam a coibir condutas especulativas e socialmente segregadoras, ainda há considerável e vasto espaço para que os detentores do poder econômico de pressão ajam da forma como são adestrados e impulsionados por uma avassaladora economia de mercado, essencialmente geratriz e fomentadora de grandes desigualdades, máxime urbanísticas. Romper tal lógica e a transformar em uma nova esfera, em rotatividade virtuosa, é o que precisa ocorrer, nada obstante todas as barreiras e dificuldades, algumas das quais salientadas durante o texto.

Nesse rumo é que o presente artigo jurídico-científico deve também poder contribuir como um estímulo a pesquisas e produções futuras. Verbi gratia, o acompanhamento e monitoramento da atuação dos Estados membros da Federação brasileira e do Distrito Federal, máxime no que diz respeito ao processo de elaboração e implantação de seus Planos de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI’s); o estudo da presença e participação cada vez mais constante das populações citadinas no processo de elaboração e criação dos futuros planos diretores, o que implica não somente em maior publicidade, mas em sempre mais robusta transparência pelo Poder Público; enfim, entre tantas agendas de estudo e aprofundamento, um monitoramento atento e crítico da no presente texto conceituada e explorada igualdade e desigualdade urbanísticas em, na visão dos ora autores, um dos mais delicados e relevantes âmbitos do Direito, qual seja, o aplicacional. Essas e outras pesquisas podem maciçamente contribuir para pressões que venham a estimular rachaduras na roda viciosa por vezes mencionada e, paralelamente, iniciar a construção de um trajeto virtuoso, do qual um país que pretende desenvolver-se nas mais variadas esferas não pode prescindir.

Por consequência, repita-se, a incidência dos princípios fundamentais no seio das relações públicas e privadas deve servir de base para a prática de atos que visem a proteger a Constituição da República e suas determinações máximas, as quais, por sua vez, objetivam a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais, além da promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Que o conjunto de normas constitucionais e infraconstitucionais brasileiras possa ser cada vez mais utilizado para a garantia e proteção dos princípios mores do Estado Constitucional pátrio, os quais amparam todas as demais previsões normativas ligadas aos múltiplos ramos do Direito, um dos principais, parte integrante e central do presente texto, o Direito Urbanístico.

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  • MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1997.
  • MONGIN, Olivier. A condição urbana: a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2009.
  • MUNANGA, Kabengele. Negritude: usos e sentidos. 04. ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.
  • RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Tradução de Almiro Pisetta e Lenita M. R. Esteves. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000.
  • SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris , 2003.
  • SUNSTEIN, Cass R. How change happens. Cambridge: MIT Press, 2019.
  • 1
    Apesar de ter sido sempre perseguida ao longo dos tempos, a justiça foi sempre alvo de concepções diversas, as quais variaram e continuam-se modificando no espaço e no tempo.
  • 2
    Realce-se, desde já, resguardados os múltiplos aprofundamentos que o tema requer, que, embora os presentes autores rechacem o termo “raça” para distinção entre pessoas, tal vocábulo, tendo em vista uma série de razões, sobretudo de cunho social e político, pode vir a possuir sua relevância, o que explica sua previsão, por exemplo, na Constituição brasileira de 1988, assim como em incontáveis outros documentos legais ou das mais variadas espécies. Com muita brevidade, a fim de não se escapar dos rumos centrais deste trabalho, é cabível citação a palavras do antropólogo Kabengele Munanga, para quem: “’Negritude’, ‘branquitude’ e ‘amarelitude’ nos levariam ao conceito maior das raças negra, branca e amarela, conceitos biologicamente inoperantes, mas política e sociologicamente muito significativos” (MUNANGA, 2019MUNANGA, Kabengele. Negritude: usos e sentidos. 04. ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019., p. 18). Assim, biologicamente falando, entende-se que o termo “raça” é inoperante, o mesmo não devendo ser dito no âmbito das ciências políticas e sociais, para as quais tal vocábulo comporta atenção e, nesse sentido, estudos, pesquisas, desenvolvimentos e interpretações diversos e com suas respectivas riquezas. Portanto, tal termo pode vir a aparecer, ao longo do presente texto, com suas significações natural e devidamente contextualizadas.
  • 3
    Deve-se tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais? O tratamento desigual aos reputados desiguais deve levar em conta múltiplas dimensões de igualação e desigualação, as quais, se não gozarem de alguma generalização pelo direito moderno e contemporâneo, podem se tornar de longínquo e quase impossível alcance. De qualquer maneira, medidas que sejam aptas a graduar e especificar, de modo sempre mais preciso, as semelhanças e diferenças entre pessoas, são fundamentais e devem ser constantemente investigadas. Por exemplo e, em tecnicamente descompromissada comparação que leva em conta o fator saúde, não necessariamente uma pessoa com problemas cardíacos será igual a uma outra, de mesma idade e sexo, com também doenças cardiológicas. Para além dos vários tipos de patologias do coração, cada organismo pode ter reações diferentes, a depender de inúmeros fatores, tais como tratamento, impacto orgânico etc. Se a própria medicina, parte das chamadas ciências humanas, finda por trabalhar com tamanhas incertezas, o que não dizer de ciências sociais e jurídicas. Portanto, apesar de o princípio da igualdade ser uma das bases teóricas deste artigo, não se adentrará em discussões aprofundadas que se distanciem da relação entre igualdade e ordem urbanística. Nesse viés e, com o fito de já se trazer inicial concepção, mais aproximada do objeto do presente estudo, uma cidade urbanisticamente desigual será aquela em que sua estrutura, seus equipamentos, suas características, entre outros elementos, não atenderão a todos os seus habitantes. No que tange à vetusta afirmação, colocada em forma de indagação, salientada logo no início desta nota, conferir, entre outros, “Ética a Nicômaco”, de Aristóteles (ARISTÓTELES, 2013ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 6. ed. São Paulo: Martin Claret, 2013.) e, para continuado exame técnico da igualdade, “O conteúdo jurídico do princípio da igualdade”, de Celso Antônio Bandeira de Mello (MELLO, 1997MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1997.).
  • 4
    A recorrência temática não afastou a necessidade pontual de lembrança da seguinte definição: “Por lo tanto, los princípios son mandatos de optimización, que están caracterizados por el hecho de que pueden ser cumplidos en diferente grado y que la medida debida de su cumplimiento no sólo depende de las posibilidades reales sino tambiém de las jurídicas” (ALEXY, 2002ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2002., p. 86.). Enquanto preponderantemente considerada como princípio, vale lembrar que, do ponto de vista conceitual, a igualdade é ora mencionada como direito, ora como dever, ora como poder, ora como máxima, ora como cláusula e, enfim, entre tantas variações, ora, ainda, como cânone. Contudo, o mais relevante é a absorção, pelo ordenamento jurídico brasileiro, dos proclames constitucionais de valorização da igualdade. Infirmá-la não deve ser a intenção do Judiciário, do Executivo e do Legislativo, no exercício primeiro de suas funções.
  • 5
    Three principal mechanisms underlie group polarization. The first emphasizes the role of information - in particular, the limited ‘argument pools’ within any group and the directions in which those limited pools lead group members. The second points to social influences on behavior and in particular to people’s desire to maintain their reputation and their self-conception. The third emphasizes the relationships among confidence, corroboration, and extremism. The basic idea is that when people find their views corroborated by others, they become confident - and thus more extreme. Radical movements can be fueled in that way” (SUNSTEIN, 2019SUNSTEIN, Cass R. How change happens. Cambridge: MIT Press, 2019., p. 20.).
  • 6
    Em um primeiro momento, discriminações entendidas a partir de um olhar atual e contemporâneo das características sociais daquela época.
  • 7
    Para todas as citações e transcrições das normas das Constituições brasileiras de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1969, conferir o trabalho “Constituições do Brasil”, de Adriano e Hilton Lobo Campanhole (CAMPANHOLE, 1979CAMPANHOLE, Adriano, CAMPANHOLE, Hilton Lobo. Constituições do Brasil. 4. ed. São Paulo: Editora Atlas, 1979.).
  • 8
    Assim estatuía a Carta Outorgada de 1824, em seu Art. 179, inciso XIII: “Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte: (...) XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, e recompensará em proporção dos merecimentos de cada um”. Luis Roberto Barroso assim destaca algumas peculiaridades jurídico-sociais do período sob foco, ressaltando a adversidades na materialidade da norma constitucional isonômica: “Em seu longo e avançado elenco de ‘garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros’, remarcado de inspiração liberal, a Constituição do Império, ao lado do princípio da legalidade, consagrava o princípio da isonomia, inaugurado em nosso constitucionalismo no inciso XIII do Art. 179 (...). Durante quase toda sua vigência, o preceito conviveu, sem que se assinalassem constrangimento ou perplexidade, com os privilégios da nobreza, o voto censitário e o regime escravocrata” (BARROSO, 2000BARROSO, Luis Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000., p. 11.).
  • 9
    Pelo menos em tese”, já que, como pôde a história confirmar, a chegada da era republicana findou por representar uma troca de privilégios e regalias. Os cafeicultores paulistas e os militares, principalmente, entre outras camadas e setores sociais, que durante o Império possuíam uma diminuída participação política, passaram a mais imediatamente participar das decisões políticas do país, o que reproduziu efeitos na aplicabilidade, incidência e rumo concretizador de muitas garantias e direitos dos cidadãos brasileiros, ao menos constitucionalmente estampadas.
  • 10
    Afirmação que se mostra relevante, tendo em vista as conclusões a posteriori.
  • 11
    Assim estatuía o Art. 72, parágrafo 2º, da Constituição de 1891: “Art. 72. A Constituição assegura a brazileiros e a estrangeiros residentes no paíz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade nos termos seguintes: (...) § 2º Todos são iguaes perante a lei. A República não admite privilegio de nascimento, desconhece foros de nobreza, e extingue as ordens honorificas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliarchicos e de conselho”.
  • 12
    À parte breves considerações sobre a falta de eficácia e efetividade normativas dos conteúdos constitucionais ligados ao princípio da igualdade, a mesma Constituição de 1891 é, pelos aqui autores, entendida como um marco histórico, jurídico e constitucional para o país. Sem maiores divagações, a fim de não se desviar dos rumos centrais deste artigo, a referida primeira Constituição republicana do país trouxe consigo uma nova forma de governo (repita-se, republicana, em substituição à monárquica), uma nova forma de Estado (federal, em substituição à unitária), uma alteração nos Poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário, com eliminação do até então quarto Poder, denominado Moderador), além de uma série de outras alterações. A influência norte-americana na criação desta Constituição foi marcante e, no tocante às modificações mencionadas, foram de tal ordem e magnitude, que se mantiveram, normativa e teoricamente intactas, até a Constituição de 1988 e, por corolário, até a data de conclusão do presente trabalho.
  • 13
    Eis o inteiro teor do caput e do mesmo inciso transcrito no corpo do texto: “Art. 113. A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á subsistência, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes: Todos são iguaes perante a lei. Não haverá privilegios, nem distincções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões proprias ou dos paes, classe social, riqueza, crenças religiosas ou ideas politicas”.
  • 14
    Previsão contida no Art. 122, nº 01, da Carta Constitucional imposta de 1937.
  • 15
    Determinava que todos eram iguais perante a lei. Para a citação in verbis, manteve-se o tempo verbal original da Constituição.
  • 16
    O paralelo que aqui se faz é com a Constituição de 1937.
  • 17
    Eis o teor do § 1º, do Art. 150, da Constituição de 24 de janeiro de 1967: “Art. 150. (...) § 1º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. O preconceito de raça será punido pela lei”.
  • 18
    Em todas as suas formas de atuação, vale dizer, órgãos legislativos, executivos e judiciários.
  • 19
    Embora não se pretenda esmiuçar a aplicação e incidência dos direitos fundamentais no âmbito das relações privadas, recomenda-se, entre vários outros trabalhos, consulta ao livro intitulado “Direitos Fundamentais e relações privadas”, de autoria de Daniel Sarmento (SARMENTO, 2003SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris , 2003.). Os ora autores, ao longo do presente artigo, ressalte-se, valeram-se, principalmente, da referida obra, para as pontuais menções sobre aplicabilidade de direitos fundamentais em seara privada e, em especial, do princípio da igualdade.
  • 20
    O devido processo legal é, na opinião dos ora autores, direito fundamental sobremaneira importante para nortear e reger as relações jurídicas brasileiras. Não é o foco primeiro do presente estudo, entretanto, foram utilizadas três obras específicas como auxiliadoras do presente estudo. Duas de autoria de Carlos Roberto de Siqueira Casto, intituladas “O princípio da isonomia e a igualdade da mulher no Direito Constitucional” (CASTRO, 1983______. O princípio da isonomia e a igualdade da mulher no Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1983.) e “O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil” (CASTRO, 1989CASTRO, Carlos Roberto de Siqueira. O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1989.) e uma de autoria de Toni M. Massaro e Thomas E. Sullivan, cujo título é “The Arc of Due Process in American Constitutional Law (MASSARO, SULLIVAN, 2013MASSARO, Toni M., SULLIVAN, E. Thomas. The Arc of Due Process in American Constitutional Law. New York: Oxford University Press, 2013.). Segundo estes últimos, depois de enumerarem nove princípios nucleares, tal como, entre outros e, a título de simples e delimitado exemplo, o do “respeito pela igualdade individual”, sendo que todos considerados básicos para a própria existência do devido processo legal no âmbito do direito norte-americano, a união dos referidos princípios representaria uma antecipação de um sistema que avançaria em matéria de objetivos coletivos. Assim, então, declaram: “Taken together, the principles anticipate a system that advances collective goals in a nonarbitrary manner, that respects individual autonomy, procedural regularity and equal treatment, and that observes structural restraints on official power” (MASSARO, SULLIVAN, 2013MASSARO, Toni M., SULLIVAN, E. Thomas. The Arc of Due Process in American Constitutional Law. New York: Oxford University Press, 2013., p. 218).
  • 21
    Toma-se a liberdade de se apresentar classificação no que tange ao que aqui se chamará de acesso urbanístico. Assim, entende-se proveitoso subdividir o acesso urbanístico em duas categorias: (a) acessos urbanísticos gerais; (b) acessos urbanísticos específicos. No primeiro caso, enquadrar-se-ia o exemplo dado no corpo do texto, relativo ao acesso proporcionado pelo Poder Público, a partir de específico planejamento territorial, a determinadas áreas de lazer em uma cidade. O acesso à moradia, ao transporte, à segurança e a várias funções sociais da cidade e direitos sociais constitucionalizados, também se inserem na primeira classificação. Por outro lado, exemplos mais específicos da vida cotidiana em uma cidade, tais como semáforos que informem e alcancem tanto pessoas sem, quanto pessoas com deficiência, assim como idosos e todas as pessoas que precisem atravessar uma via automotiva; ciclovias que permitam a circulação de sempre mais pessoas e proporcionem a possibilidade de transporte eficaz entre localidades; praças públicas que ofereçam equipamentos capazes de proporcionar lazer a todas as pessoas, tais como as já citadas pessoas com e sem deficiência, idosos, crianças, jovens, adultos em geral, além de animais com permissão de circulação em vias públicas; calçadas que permitam a deambulação com segurança em todas as áreas da cidade etc. Repare-se, os exemplos são inúmeros e os aqui citados têm apenas o condão de mera e simplesmente tentar explicar a classificação sugerida.
  • 22
    Conferir o trabalho de Luigi Bonizzato, intitulado “A Constituição Urbanística e a confirmação de uma teoria do Direito Constitucional Urbanístico”, no qual o autor faz menção a um verdadeiro “estatuto constitucional urbanístico” e, dos “elementos para a confirmação” de uma teoria do direito constitucional urbanístico, conforme previsto na primeira edição da obra, evoluiu para, em sua segunda edição, a confirmação de uma “teoria do direito constitucional urbanístico” (BONIZZATO, 2020BONIZZATO, Luigi. A Constituição Urbanística e a confirmação de uma teoria do Direito Constitucional Urbanístico: 2ª e Nova Edição, uma continuação completamente revista, ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2020.).
  • 23
    Adjetivação assumida pelos aqui autores, a partir da ideia segundo a qual o público-alvo do presente artigo é familiarizado à expressão “especulação imobiliária” e ao seu grau de visibilidade jurídica, social, econômica etc.
  • 24
    Seja em âmbito federal, estadual e, principalmente, municipal.
  • 25
    A expressão conscientização ativa, no texto presente, quer dizer uma tomada de consciência, associada à prática de atos concretos capazes de implantar e criar condições de cumprimento e materialização da igualdade em seara urbana. Para além da participação popular prevista no Estatuto da Cidade, com suas formas adotadas nas últimas décadas - audiências públicas, por exemplo -, como requisito indispensável para a elaboração de planos diretores, não somente publicidade, mas também transparência, conforme se voltará a citar, devem ser garantidas pelo Poder Público aos cidadãos. Além disso, em também adiantamento de colocações subsequentes, outras tradicionais figuras, tais como o plebiscito e o referendo, podem ser mais constantemente utilizadas pelos entes federativos, a fim de consultar a população, mesmo que a partir de perguntas simplificadas que levam a um “sim” ou “não”, a um “concordo” ou “não concordo”, sobre suas vontades majoritárias. Informação em massa e consultas feitas com base em perguntas bem lapidadas e formuladas devem ser o caminho a ser seguido, a fim de se mitigar os efeitos também não tão e necessariamente positivos dos institutos do plebiscito e do referendo.
  • 26
    Sobre dignidade urbana, vale destacar o seguinte: “Visando a um melhor entendimento, definir-se-ia dignidade urbana como a aplicação urbana do princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, seria uma forma de subprincípio atrelado ao princípio maior, o qual ditaria os rumos e caminhos a serem seguidos. Em outras palavras, estar-se-ia diante do princípio da dignidade da pessoa humana incidente e aplicado no âmago das relações urbanas, garantindo às populações urbanas do país, o respeito pelos direitos humanos basilares, tais como habitação, segurança, saneamento básico etc.” (BONIZZATO, 2015______. Propriedade Urbana Privada & Direitos Sociais: 2ª Edição - Revista e Atualizada, incluindo a Lei 13.089/15, que instituiu o Estatuto da Metrópole. Curitiba: Juruá Editora, 2015., p. 98). E, em mais recente trabalho, o mesmo autor ressalta que “deve ser ressaltado que o afirmado subprincípio da dignidade urbana também implica no atendimento de uma série de outros direitos, tais como segurança, saúde, educação, transporte, iluminação pública, dentre tantos outros. Assinale-se, muitos dos quais, direitos sociais constitucionalizados, regados pela fundamentalidade trazida, internamente, pela Constituição de 1988” (BONIZZATO, 2020BONIZZATO, Luigi. A Constituição Urbanística e a confirmação de uma teoria do Direito Constitucional Urbanístico: 2ª e Nova Edição, uma continuação completamente revista, ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2020., p. 44).
  • 27
    Assim estatuem os Artigos 45, 46 e 47 da Constituição Espanhola: “Artículo 45. 1. Todos tienen el derecho a disfrutar de un medio ambiente adecuado para el desarrollo de la persona, así como el deber de conservarlo. 2. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los recursos naturales, con el fin de proteger y mejorar la calidad de la vida y defender y restaurar el medio ambiente, apoyándose en la indispensable solidaridad colectiva. 3. Para quienes violen lo dispuesto en el apartado anterior, en los términos que la ley fije se establecerán sanciones penales o, en su caso, administrativas, así como la obligación de reparar el daño causado. Artículo 46. Los poderes públicos garantizarán la conservación y promoverán el enriquecimiento del patrimonio histórico, cultural y artístico de los pueblos de España y de los bienes que lo integran, cualquiera que sea su régimen jurídico y su titularidad. La ley penal sancionará los atentados contra este patrimonio. Artículo 47. Todos los españoles tienen derecho a disfrutar de una vivienda digna y adecuada. Los poderes públicos promoverán las condiciones necesarias y establecerán las normas pertinentes para hacer efectivo este derecho, regulando la utilización del suelo de acuerdo con el interés general para impedir la especulación. La comunidad participará en las plusvalías que genere la acción urbanística de los entes públicos ”. Perceba-se, conforme adiante, mesmo que brevemente, se continuará a examinar, como a intenção constituinte de “impedir a especulação”, entre outros valores de proteção da moradia, resta claramente estampada no texto constitucional espanhol, fato que demonstra que o fenômeno da especulação imobiliária é palmar e francamente objeto de preocupação em outros países, para além do Brasil. E, que se ressalte, sem que neste artigo se promova qualquer exame de direito comparado, servindo menções e citações a textos estrangeiros como meras exemplificações e agregações de cunho teórico. Artículo 47. Todos los españoles tienen derecho a disfrutar de una vivienda digna y adecuada. Los poderes públicos promoverán las condiciones necesarias y establecerán las normas pertinentes para hacer efectivo este derecho, regulando la utilización del suelo de acuerdo con el interés general para impedir la especulación. La comunidad participará en las plusvalías que genere la acción urbanística de los entes públicos ” (CONSTITUCIÓN ESPAÑOLA Y LEY ORGÁNICA DEL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, 2014CONSTITUCIÓN ESPAÑOLA Y LEY ORGÁNICA DEL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL. 13ª ed. Madrid: Colex, 2014., p. 31-32).
  • 28
    A Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, de forma semelhante com a Constituição do ente federativo de grau superior e dentro do qual se localiza, ou seja, do Estado do Rio de Janeiro, porta um elenco minimamente iluminador sobre as funções sociais da cidade, citadas no Art. 182 da Constituição da República, mas ali não definidas nem enumeradas. Assim estatui o Art. 422, caput, da Lei Orgânica Municipal carioca: “A política urbana, formulada e administrada no âmbito do processo de planejamento e em consonância com as demais políticas municipais, implementará o pleno atendimento das funções sociais da Cidade”. E eis o que estabelece seu parágrafo primeiro: “As funções sociais da Cidade compreendem o direito da população à moradia, transporte público, saneamento básico, água potável, serviços de limpeza urbana, drenagem das vias de circulação, energia elétrica, gás canalizado, abastecimento, iluminação pública, saúde, educação, cultura, creche, lazer, contenção de encostas, segurança e preservação, proteção e recuperação do patrimônio ambiental e cultural”.
  • 29
    A especulação imobiliária é um dos mais visíveis fenômenos do que ora se expõe. Sobre o tema, com clássico, crítico e um tanto quanto sempre atual exame, David Harvey declara, no que tange à relação entre espaço, tempo, custo, lucro e, por corolário, à própria produção da organização espacial, o seguinte: “No entanto, como sempre existem limites espaciais tecnologicamente definidos de algum tipo, a questão permanece: o que acontece em seus confins? Evidentemente, o capital e a força de trabalho devem se unir em algum ponto específico do espaço para ocorrer a produção. A fábrica é um ponto de reunião, enquanto a forma espacial de urbanização pode ser vista com a resposta capitalista específica à necessidade de minimizar o custo e o tempo de movimento sob condições da conexão interindústrias, da divisão social do trabalho e da necessidade de acesso tanto à oferta de mão de obra como aos mercados dos consumidores finais. Os capitalistas individuais, em virtude de suas decisões localizacionais específicas, moldam a geografia da produção em configurações espaciais distintas” (HARVEY, 2006HARVEY, David. A produção capitalista do espaço. 02. ed. Tradução de Carlos Szlak. São Paulo: Editora Annablume, 2006., p. 146.). O já citado viés crítico do autor, calcado, entre outros estudiosos e pensadores, em Karl Marx, faz com que a discussão, a “construção-desconstrução” teórico-metodológica e o fomento a reflexões e questionamentos sobre variados arquétipos, exsurjam e se mantenham constantes. O que, ao sentir dos ora autores, é sempre fundamental em âmbito acadêmico e científico.
  • 30
    E, neste rumo, conclui o Autor em comento: “Assim, o princípio determina que a fim de tratar as pessoas igualitariamente, de proporcionar uma genuína igualdade de oportunidades, a sociedade deve dar mais atenção àqueles com menos dotes inatos e aos oriundos de posições sociais menos favoráveis. A idéia é a de reparar o desvio das contingências na direção da igualdade” (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000, p. 107.).
  • 31
    Nesta linha, também conclui John Rawls: “Os que foram favorecidos pela natureza, sejam eles quem forem, podem beneficiar-se de sua boa sorte apenas em termos que melhorem a situação dos menos felizes” (RAWLS, John. Obra citadaRAWLS, John. Uma teoria da justiça. Tradução de Almiro Pisetta e Lenita M. R. Esteves. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000., p. 108.).
  • 32
    Contudo, ressalte-se, não possui o presente artigo qualquer pretensão de invadir a seara de estudos mais diretamente ligada a aprofundamentos sobre o princípio da diferença, o qual integra o âmbito de sempre complexa investigação, comumente voltada para estudos sobre a justiça enquanto um verdadeiro instituto, em relação ao qual se tenta, há tempos, formular uma teoria. A escolha, assim, pela obra de John Rawls é meramente optativa (com o perdão de possível redundância) e não pretende desmerecer quaisquer e inúmeros outros trabalhos, inclusive posteriores aos de Rawls, sobre uma ideia, teoria ou noção de justiça.
  • 33
    Considerando as finalidades mores da presente pesquisa, para mais aprofundamentos sobre as referidas “três velocidades”, encaminha-se o leitor para a obra já referida de Olivier Mongin (MONGIN, 2009MONGIN, Olivier. A condição urbana: a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2009., p. 205-224). Mas se pode adiantar, de forma concisa, que a exclusão estaria ligada ao movimento de relegação, ligado às áreas ditas “de exclusão”. A gentrificação encontra bases no isolamento das elites globalizadas em relação aos habitantes das zonas periurbanas e dos relegados das cidades, o que já remete à periurbanização enquanto movimento de formação de zonas periurbanas, “esse espaço intermediário que ainda deixa pairar a esperança de uma promoção social” (MONGIN, 2009MONGIN, Olivier. A condição urbana: a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2009., p. 210).
  • 34
    Tal afirmação possui caráter preliminar e será mais adequadamente entendida nos parágrafos subsequentes. Adiante-se, considerando a necessidade imposta pelo Estatuto da Cidade (com criação e entrada em vigor no ano de 2001), no sentido de os planos diretores serem revistos, pelo menos, a cada dez anos, juntamente com a criação da figura deste plano urbanístico, treze anos antes e a partir de sua previsão na Constituição de 1988, o levantamento de dados apresentado, a posteriori, demonstrará a existência média de 02 (dois) planos diretores pelos municípios selecionados, após mais de três décadas de vigência da Constituição da República e vinte anos do Estatuto da Cidade.
  • 35
    A ideia ligada à evolução é a de que a mera e simples criação da figura do plano diretor pelo legislador constituinte originário brasileiro, já pode ser reputada um avanço, sucedido pela criação do Estatuto da Cidade, dos primeiros planos diretores propriamente ditos, no âmbito de cada município, do Estatuto da Metrópole e da criação legislativa de outro plano urbanístico, qual seja, o plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI).
  • 36
    Decorrentes do fenômeno maior, já neste artigo lembrado, intitulado economia de mercado.
  • 37
    Salvo situações excepcionais não aqui comprovadas - em razão, sobretudo, do recorte temático e dos lindes da pesquisa desenvolvida - de ausência de plano e de algum grau relevante de presença de qualidade de vida.
  • 38
    Com destaque para os decretos regulamentares.
  • 39
    Ermínia Maricato, em clássica subdivisão entre cidade real e cidade oficial, já há anos anunciava tal problemática nos principais centros urbanos brasileiros (MARICATO, 2002MARICATO, Ermínia. Brasil, cidades alternativas para a crise urbana. 02. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.).
  • 40
    Nessa toada, exatamente pelo narrado acima, o Estatuto da Cidade e o Estatuto da Metrópole, na trilha de uma série de outras previsões constitucionais, previram a participação popular como essencial ao processo de elaboração dos planos diretores. Talvez, em uma sociedade prevalentemente subdesenvolvida como a brasileira, ainda se tenha que pensar em uma eficácia de tal participação a longo e indefinido prazo. Mas, se se conseguir informar e conscientizar, o amadurecimento democrático será gradativamente fortificado e antecipadas as previsões de criação de planos menos excludentes e com maior grau de eficácia no que tange à concretização da igualdade urbanística. E assim se declara e fala porque, por mais que avanços possam ter ocorrido, a participação popular pode e deve ainda muito crescer para a que a imberbe democracia brasileira possa se mostrar socialmente mais eficaz no processo de criação dos planos urbanísticos. As audiências e consultas públicas, por exemplo, são ainda subutilizadas, se levado em conta todo seu potencial. As audiências, ainda dependentes de informação mais abrangente e eficiente, com não somente publicidade, mas também transparência pela Administração Pública; consultas, em seu sentido formal, praticamente inexistentes em um Brasil que poderia se fazer valer com mais frequência de instrumentos como o plebiscito e referendo em matéria urbanística (convocados principalmente pelos Municípios). Ilustrativamente, a cogitação de consultas plebiscitárias e ad referendum para a realização dos Jogos Olímpicos (2016) e do Pan-americano (2007) na cidade do Rio de Janeiro, não seria aqui considerada nenhuma anormalidade. Muito pelo contrário, iria ao encontro da defesa de uma participação popular mais intensa, presente e, quiçá, eficaz. Sobre as figuras de referendo e plebiscito, recomenda-se releitura de nota de rodapé anterior, localizada na parte final do primeiro capítulo.
  • 41
    Os resultados numéricos a partir de agora expostos encontram-se presente na “Tabela 01”, anexa ao presente estudo e denominada “ANEXO 1”, salvo os relativos ao plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI), os quais podem ser encontrados na “Tabela 02”, que representa o “ANEXO 2” deste mesmo trabalho.
  • 42
    Realce-se que tal número leva em conta, também, leis reformadoras de planos diretores, assim como eventuais legislações com o objetivo de prorrogação da vigência e validade dos planos diretores.
  • 43
    A subdivisão de períodos em “após a promulgação da Constituição de 1988” e “após o advento do Estatuto da Cidade” se justifica porque, apesar de a Lei Máxima brasileira ter determinado a obrigatoriedade de criação dos planos diretores para municípios com mais de vinte mil habitantes, um mais adequado detalhamento da figura do plano diretor, incluindo sanções para o caso da não tomada de providências para sua criação e revisão, pelo menos, a cada dez anos, somente ocorreu com a chegada do Estatuto da Cidade, no ano de 2001.
  • 44
    Vale salientar que, se considerado o período que se inicia em 1988 e que vai até a data de conclusão do presente artigo, a maioria absoluta das capitais brasileiras produziu 02 (dois) planos diretores. As poucas exceções fazem com que a média seja de 2,148 (dois vírgula cento e quarenta e oito) planos diretores por capital de cada Estado do país, com acréscimo do Distrito Federal.
  • 45
    Registre-se que o Distrito Federal, enquanto figura sui generis dentro da federação do país, possui, sempre que necessário para os escopos deste artigo, avaliação especial, em razão de não ser nem um município, nem mesmo um Estado, tendo na figura da Câmara Legislativa a encarnação do Poder Legislativo em seus confins.
  • 46
    Exemplos são as cidades de João Pessoa, Brasília (Distrito Federal) e Manaus.
  • 47
    São elas: Maceió, Macapá, Fortaleza, São Luís, Curitiba e Aracajú.
  • 48
    Se se considerar o plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI) enquanto decorrente de um trabalho legislativo estadual, oriundo de projeto votado e aprovado, e de lei promulgada, publicada e em pleno vigor, apenas a região metropolitana da Grande Vitória, entre as que foram neste artigo estudadas, possui um plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI), já anos após a entrada em vigor do Estatuto da Metrópole. Em outras 02 (duas) situações, percebeu-se um estado de inércia legislativa, após uma aprovação dos planos de desenvolvimento urbano integrado (PDUI’s), uma vez que não se transformaram em leis estaduais, conforme determina o Estatuto da Metrópole (as pesquisas realizadas pelos ora autores, pelo menos, não foram capazes de encontrar as leis referidas e, tão-somente, minutas de planos de desenvolvimento urbano integrado - PDUI’s -, reputadas aprovadas pelas Assembleias Legislativas do Estado do Rio de Janeiro e do Estado do Mato Grosso, mas sem que se conseguisse encontrar qualquer lei). Para maiores detalhes, conferir a “Tabela 02”, anexa a este trabalho, intitulada “ANEXO 2”.
  • 49
    O Brasil possui mais regiões metropolitanas (74 - setenta e quatro) do que o número de suas capitais. Aliás, ressalte-se, de acordo com a “Tabela 02”, constante do “ANEXO 2”, percebe-se que nem todas as capitais dos Estados brasileiros são integrantes de regiões metropolitanas, pois em dois casos (Rio Branco, capital do Estado do Acre, e Campo Grande, capital do Estado do Mato Grosso do Sul) inexistem regiões metropolitanas legal e tecnicamente criadas, embora haja concentração populacional e, portanto, uma aglomeração urbana. Entretanto, a pesquisa realizada e que levou aos presentes resultados valeu-se de recorte específico, o qual considerou, para os fitos ora colimados, apenas as 24 (vinte e quatro) capitais, mais o Distrito Federal, enquanto partes centrais e nucleares das regiões metropolitanas das quais fazem parte.
  • 50
    O foco deste artigo jurídico se volta para o que nele especificamente se abordou. Entretanto, neste mesmo estudo, já foram feitas menções a macro problemáticas, ligadas à economia de mercado e que exercem grande influência nas dinâmicas urbanas. Além disso, momentos de recessão econômica, que trazem consigo desemprego, inflação, aumento da violência, falta de investimentos em políticas públicas e urbana, assim como, consequentemente, em direitos sociais, são fatores e elementos que devem ser igualmente considerados como facilitadores e fomentadores de desigualdades sociais múltiplas e extensas.
  • 51
    No intuito de esclarecimentos derradeiros, mas ora ainda reputados relevantes, eis o observado por Luigi Bonizzato e Isabelle Esteves Moulin: “Paralelamente, a chegada de um novo plano urbanístico, fora da esfera constitucional, mas de magnitude ímpar, sobretudo por (a) reforçar o caminho de fortificação da figura de planos urbanísticos em um país sem tradições, principalmente jurídicas, de planos desta natureza; (b) conter relação direta com o único plano urbanístico constitucionalizado em 1988, o Plano Diretor; e (c) abrir espaço para novos horizontes de planejamento urbanístico, com base não somente em políticas urbanas e na consecução de urbanizações decorrentes do urbanismo enquanto ramo do saber, mas também e, principalmente, com base em um verdadeiro e mui rico Direito Urbanístico, torna o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI), um verdadeiro instituto, ator e elemento a ser atentamente acompanhado em seu percurso criacional e aplicacional” (BONIZZATO, MOULIN, 2018BONIZZATO, Luigi, MOULIN, Isabelle Esteves. PDUI (Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado): primeiros aspectos, comparações, críticas, conclusões, relações e experiências após 03 (três) anos de sua criação legal. In: Revista de Direito da Cidade, vol. 10, nº 04, p.2538-2568, 2018. Acessível via Acessível via url:http em: < https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rdc/article/view/33418/27226 >. Acesso em 06 set. 2021.
    url:http em: < https://www.e-publicacoes...
    , p. 2541).
  • 52
    Liberdade locomoção, direito ir e vir, direito à vida, no qual também se insere o respeito ao ambiente artificial e natural, direito de reunião, inviolabilidade de domicílio, entre vários outros direitos de liberdade, previstos expressamente na Constituição de 1988, como direitos fundamentais da República Federativa do Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    23 Set 2021
  • Aceito
    06 Dez 2021
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