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Análise do perfil lipídico de mulheres idosas em Curitiba - Paraná

Resumos

FUNDAMENTO: A dislipidemia é considerada um dos principais fatores de risco para a doença cardiovascular, que, por sua vez, é mais freqüente em indivíduos de idade avançada. Contudo, evidências sugerem que uma parcela da população idosa desconhece a característica de seu perfil lipídico, assim como muitos não possuem acesso a um tratamento adequado. OBJETIVO: Analisar o perfil lipídico e a freqüência da utilização da terapia hipolipemiante de mulheres idosas em Curitiba - Paraná. MÉTODOS: A amostra foi composta por 312 mulheres (idade média 68,8; desvio padrão 6,0 anos). O perfil lipídico foi determinado por meio das dosagens de colesterol total (CT), colesterol de lipoproteína de alta densidade (HDL-C), colesterol de lipoproteína de baixa densidade (LDL-C) e triglicerídeos (TG). A utilização da terapia hipolipemiante foi verificada por meio de auto-relato, em seguida os grupos foram divididos em dois subgrupos, satisfatório e insatisfatório. RESULTADOS: Foi encontrada uma grande prevalência de indivíduos com valores insatisfatórios nos componentes do perfil lipídico, no grupo que relatou não estar sob terapia hipolipemiante: 74,2% das mulheres portadoras de doenças cardiovasculares (DCV) apresentaram valores superiores à meta lipêmica para o LDL-C (<100,0 mg/dl). Por sua vez, 45,8% a 49,3% dos indivíduos do grupo que relatou utilizar medicamento hipolipemiante apresentaram valores insatisfatórios para CT, TG e LDL-C, e 25,4% obtiveram valores de HDL-C inferiores a 40,0 mg/dl. CONCLUSÃO: Os resultados desta investigação indicam uma alta prevalência de mulheres idosas, independentemente do auto-relato de utilizar terapia hipolipemiante, com o perfil lipídico desfavorável, principalmente em relação à meta lipêmica para o LDL-C nas mulheres idosas portadoras de DCV.

Fatores de risco; dislipidemias; envelhecimento


BACKGROUND: Dyslipidemia is considered one of the main risk factors for cardiovascular disease (CVD), which is more frequent in older individuals. However, evidence suggests that a large number of elderly individuals is not aware of their lipid profile status; additionally, many of them do not have access to adequate treatment. OBJECTIVE: To analyze the lipid profile and the frequency of lipid-lowering therapy use in elderly women from the city of Curitiba, state of Parana, Brazil. METHODS: The sample consisted of 312 women (mean age = 68.8; SD = 6.0 years). The lipid profile was determined by plasma levels of total cholesterol (TC), high-density cholesterol (HDL-C), low-density cholesterol (LDL-C) and triglycerides (TG). The number of subjects that reported being on lipid-lowering therapy was self-reported; therefore, the groups were divided into two subgroups, satisfactory and unsatisfactory. RESULTS: A high prevalence of individuals with unsatisfactory levels of lipid profile components was observed in the group that self-reported not being on lipid-lowering therapy; of these, 74.2% of women with CVD presented levels above the LDL-C goal. On the other hand, 45.8 to 49.3% of the individuals from the group that self-reported being on lipid-lowering therapy had unsatisfactory values of TC, TG and LDL-C, and 25.4% had HDL-C levels lower than 40.0 mg/dl. CONCLUSION: The results of this investigation indicate a high prevalence of elderly women, regardless of self-reports of being on lipid-lowering therapy, with an unsatisfactory lipid profile, mainly related to LDL-C goal for those individuals with CVD.

Risk factors; dyslipidemias; aging


ARTIGO ORIGINAL

Análise do perfil lipídico de mulheres idosas em Curitiba - Paraná

Maressa P. Krause; Tatiane Hallage; Cristiane Petra Miculis; Mirnaluci Paulino Ribeiro Gama; Sergio G. da Silva

University of Pittsburgh, PA, United States, Universidade Federal do Paraná, Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, Curitiba, PR - Brasil

Correspondência Correspondência: Maressa P. Krause Rua José Rodrigues Pinheiro, 949 - Capão Raso 81130-200 - Curitiba, PR - Brasil E-mail: maressakrause@hotmail.com

RESUMO

FUNDAMENTO: A dislipidemia é considerada um dos principais fatores de risco para a doença cardiovascular, que, por sua vez, é mais freqüente em indivíduos de idade avançada. Contudo, evidências sugerem que uma parcela da população idosa desconhece a característica de seu perfil lipídico, assim como muitos não possuem acesso a um tratamento adequado.

OBJETIVO: Analisar o perfil lipídico e a freqüência da utilização da terapia hipolipemiante de mulheres idosas em Curitiba - Paraná.

MÉTODOS: A amostra foi composta por 312 mulheres (idade média 68,8; desvio padrão 6,0 anos). O perfil lipídico foi determinado por meio das dosagens de colesterol total (CT), colesterol de lipoproteína de alta densidade (HDL-C), colesterol de lipoproteína de baixa densidade (LDL-C) e triglicerídeos (TG). A utilização da terapia hipolipemiante foi verificada por meio de auto-relato, em seguida os grupos foram divididos em dois subgrupos, satisfatório e insatisfatório.

RESULTADOS: Foi encontrada uma grande prevalência de indivíduos com valores insatisfatórios nos componentes do perfil lipídico, no grupo que relatou não estar sob terapia hipolipemiante: 74,2% das mulheres portadoras de doenças cardiovasculares (DCV) apresentaram valores superiores à meta lipêmica para o LDL-C (<100,0 mg/dl). Por sua vez, 45,8% a 49,3% dos indivíduos do grupo que relatou utilizar medicamento hipolipemiante apresentaram valores insatisfatórios para CT, TG e LDL-C, e 25,4% obtiveram valores de HDL-C inferiores a 40,0 mg/dl.

CONCLUSÃO: Os resultados desta investigação indicam uma alta prevalência de mulheres idosas, independentemente do auto-relato de utilizar terapia hipolipemiante, com o perfil lipídico desfavorável, principalmente em relação à meta lipêmica para o LDL-C nas mulheres idosas portadoras de DCV.

Palavras-chave: Fatores de risco, dislipidemias/terapia, envelhecimento.

Introdução

As doenças cardiovasculares (DCV) são consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil1, atingindo principalmente indivíduos com idade mais avançada. Segundo o Ministério da Saúde2, a taxa de mortalidade por DCV na Região Sul do país, entre indivíduos de 60 a 69 anos, é de 264,62/100 mil habitantes. Além disso, dados nacionais, publicados em 2004, referentes às doenças isquêmicas cardíacas reportaram que 27,59% da população nessa faixa etária necessitaram de internação hospitalar por DCV.

Sendo assim, o diagnóstico de indivíduos com maior risco para DCV poderia modificar esse quadro pela prevenção primária, possibilitando um menor gasto da saúde pública com a DCV e suas conseqüências. Um dos principais fatores de risco para DCV é a dislipidemia, por sua associação com o desenvolvimento da doença cardiovascular (DCV)3 e por causa da progressão da aterosclerose em idosos4. Contudo, estudos referentes à sua freqüência na população brasileira ainda são escassos, principalmente entre os idosos5-7.

Evidências sugerem que uma parcela da população idosa não possui acesso a um tratamento adequado ou desconhece a característica de seu perfil lipídico8. Além disso, pesquisas nacionais7,8 e internacionais9,10 que investigaram a eficácia da terapia hipolipemiante na redução dos níveis de CT, LDL-C e TG constataram que grande parte dos indivíduos não conseguiu atingir as metas lipêmicas mesmo com o uso de terapia hipolipemiante – segundo as recomendações das IV Diretrizes Brasileiras de Dislipidemia11. Dessa forma, parece existir um consenso de que esses resultados seriam conseqüências da falta de um tratamento medicamentoso mais agressivo e/ou de modificações no estilo de vida, tais como a adoção de uma dieta saudável e a prática regular de exercícios físicos3,12-15.

Com o propósito de ampliar a compreensão sobre a dislipidemia e o seu tratamento, o objetivo desta pesquisa foi analisar o perfil lipídico e a freqüência da utilização da terapia hipolipemiante em mulheres idosas, na cidade de Curitiba - Paraná.

Métodos

O delineamento da pesquisa é caracterizado como estudo observacional transversal e descritivo. A coleta de dados foi realizada no período compreendido entre abril e julho de 2006.

População e amostra

Com o intuito de efetuar uma seleção de amostra estratificada, as seguintes etapas foram realizadas:

1) Cadastro dos grupos comunitários existentes no município Curitiba, Paraná, o qual foi obtido mediante parceria com instituições que promovem atividades recreacionais para a população da respectiva regional geográfica;

2) Mapeamento de todos os grupos cadastrados nas oito regionais do município;

3) Alocação aleatória simples dos grupos que seriam convidados a participar da pesquisa, por regional;

4) Visita ao grupo, explicação dos procedimentos da pesquisa e convite à participação voluntária no estudo, tanto para os indivíduos pertencentes ao respectivo grupo comunitário como também extensão deste convite a familiares e amigos próximos a esse grupo.

Depois de realizado o procedimento de seleção amostral, descrito anteriormente, o cronograma para a coleta de dados foi determinado. A amostra inicial foi constituída de 354 mulheres (idade média 68,8; desvio padrão 6,0 anos) que estivessem, na data da coleta, com idade cronológica superior ou igual a 60 anos. Entretanto, desse grupo excluíram-se 42 indivíduos diabéticos, e outros três foram excluídos para as análises do LDL-C, pois apresentavam valores de triglicerídeos superiores a 400,0 mg/dl.

Após detalhado esclarecimento sobre os propósitos dessa investigação, procedimentos utilizados, benefícios e possíveis riscos atrelados, os participantes assinaram o termo de consentimento, condicionando sua participação de modo voluntário. O protocolo de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética do Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná, conforme as normas estabelecidas na Declaração de Helsinki e na Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde sobre pesquisa envolvendo seres humanos.

Instrumentos e procedimentos

Todos os participantes cumpriram jejum de 12 horas antes da coleta sangüínea. Para avaliação dos níveis de triglicerídeos e colesterol total, foi utilizado o método enzimático. O HDL-C foi mensurado pelo sistema de precipitação seletiva das lipoproteínas de baixa e muito baixa densidade (LDL e VLDL). Após a centrifugação o HDL-C, determinou-se no sobrenadante utilizado o método enzimático. Todas as medidas foram analisadas no espectrofotômetro COBAS MIRA PLUS (Roche Diagnostics), com calibrador e soro controle DIASYS. O kit da LABTEST foi utilizado para a realização das dosagens de colesterol total e triglicerídeos, e o kit DIASYS para o HDL-C. O colesterol foi calculado de acordo com a fórmula de Friedewald16, sendo: LDL-C = colesterol total - (HDL-C + triglicerídeos/5).

A determinação dos indivíduos que estavam, na data da coleta, utilizando terapia hipolipemiante foi realizada por auto-relato, sendo então dividido em dois grupos (0 = sem terapia hipolipemiante ou 1 = sob terapia hipolipemiante). Da mesma forma, o LDL-C foi dividido em dois grupos, pois havia indivíduos que auto-relataram diagnóstico médico prévio de DCV, de acordo com a meta lipêmica recomendada para indivíduos não-portadores de DCV (LDL-C: <130,0 mg/dl) e para portadores de DCV (LDL-C para DCV: <100,0 mg/dl). Ambos os grupos foram divididos em subgrupos – satisfatório e insatisfatório –, classificados com base nos valores nacionalmente recomendados para cada componente do perfil lipídico (tab. 1)11. Dentre os indivíduos dessa amostra, 15,7% auto-relataram ser portadores de DCV.

Análise estatística

O teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov foi aplicado para caracterizar a distribuição de todas as variáveis deste estudo como paramétricas (p < 0,005). Aplicaram-se medidas de tendência central e variabilidade para a análise descritiva dos dados, posteriormente foi calculada a freqüência relativa, que foi analisada pelo teste do c quadrado. O teste-T independente foi utilizado para verificar diferenças entre as médias, de cada componentes do perfil lipídico, dos subgrupos satisfatório e insatisfatório.

A análise dos dados do presente estudo foi realizada mediante a utilização do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS, versão 13.0) for Windows.

Resultados

A tabela 2 apresenta as médias e o desvio padrão dos níveis de CT, HDL-C, TG e LDL-C e LDL-C para DCV do grupo que auto-relatou não estar sob terapia hipolipemiante. Os valores médios diferiram significativamente entre os subgrupos em todos os componentes do perfil lipídico. A maioria dos indivíduos apresentou valores satisfatórios para todas as variáveis do perfil lipídico, porém houve uma elevada prevalência (74,2%) de indivíduos portadores de DCV com valores superiores à meta lipêmica recomendada para o LDL-C (> 100,0 mg/dl). Todas as freqüências demonstraram diferenças significativas entre os subgrupos analisados (fig.1).


A tabela 3 apresenta a média dos componentes do perfil lipídico para os indivíduos que auto-relataram estar sob terapia hipolipemiante. Os valores médios diferiram significativamente entre os subgrupos em todos os componentes do perfil lipídico. Apesar de as freqüências encontradas não demonstrarem diferenças significativas (p > 0,05) entre os subgrupos, quase metade das mulheres idosas não atingiu as metas lipêmicas recomendadas, com exceção do HDL-C, em que a maioria dos indivíduos (74,6%) apresentaram valores superiores a 40,0 mg/dl (p < 0,001). Além disso, 47,4% dos sujeitos portadores de DCV apresentaram valores de LDL-C superiores à meta lipêmica (> 100,0 mg/dl) (fig. 2).


Discussão

Verificou-se neste estudo que uma grande parcela das mulheres idosas que auto-relataram não utilizar terapia hipolipemiante apresentou níveis insatisfatórios dos componentes do perfil lipídico, destacando-se que 74,2% das idosas portadoras de DCV demonstraram valores superiores à meta lipêmica recomendada para o LDL-C (< 100,0 mg/dl). Esses resultados são similares a outros estudos9,17 que relataram alta freqüência de dislipidemia em indivíduos adultos, de ambos os sexos, sem tratamento medicamentoso. Segundo Goff Junior e cols.17, apenas 16% dos participantes do estudo Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis relataram estar sob terapia hipolipemiante; dentre os sujeitos classificados como portadores de alto e médio risco para DCV, mais da metade não estava sob tratamento medicamentoso para dislipidemia e apresentou níveis lipêmicos acima da meta estabelecida.

No estudo Minnesota Heart Survey (MHS), após acompanhamento de vinte anos, Arnett e cols.10 constataram que apenas 33% das mulheres e 28% dos homens conheciam seu perfil lipídico, porém, apesar de apresentarem níveis indesejáveis de colesterol total, não estavam sob tratamento medicamentoso. Além disso, 55% das mulheres e 53% dos homens com níveis elevados de CT (> 200,0 mg/dl) desconheciam sua condição. Os autores também destacaram que a taxa de conscientização, tratamento e controle da hipercolesterolemia foi menor nas mulheres (6%) quando comparadas aos homens da amostra (13%), o que sugere que as mulheres possuem menor controle sobre seu CT.

O HDL-C é considerado de grande importância para mulheres pós-menopausa18, por sua característica cardioprotetora19,20. Entretanto, de acordo com os resultados deste estudo, observou-se que quase um terço das mulheres idosas apresentou níveis de HDL-C inferiores aos recomendados. Similarmente, Cervato e cols.21 verificaram uma prevalência de dislipidemia de 25,9% na população da cidade de Cotia - São Paulo, em grande parte decorrente dos baixos níveis de HDL-C.

O LDL-C é considerado um dos principais fatores de risco para DCV22, pois está envolvido na formação e desestabilização de placas ateromatosas em pacientes assistomáticos e também naqueles com aterosclerose coronariana3,23. Sendo assim, o alvo primário da terapia hipolipemiante é a redução dos níveis de LDL-C3,22. Entretanto, observou-se que 74,2% das mulheres idosas portadoras de DCV sem terapia hipolipemiante apresentaram valores de LDL-C acima da meta (< 100,0 mg/dl), apesar do diagnóstico médico prévio desse quadro. Similarmente, uma maior prevalência de LDL-C elevado (> 160,0 mg/dl) foi encontrada em mulheres quando comparadas aos homens, em um estudo com 516 idosas de ambos os sexos, conduzido por Alencar e cols.24.

As recomendações internacionais3 e nacionais16 preconizam a redução do LDL-C, por causa de sua comprovada eficácia na diminuição da mortalidade por DCV3 e, principalmente, na redução da reincidência de eventos cardiovasculares, como o infarto agudo do miocárdio25,26. Contudo, a obtenção das metas lipêmicas não tem sido amplamente alcançada. O custo da medicação3,11 e o comportamento social27,28 têm sido indicados como alguns dos fatores que poderiam explicar o porquê de as recomendações médicas não estarem sendo adotadas. Além disso, a falta de conscientização e acesso do paciente a informações sobre os fatores de risco para DCV e como prevenir essa patologia também contribui para esse problema.

Em relação às mulheres do grupo que auto-relataram o uso de terapia hipolipemiante, de 45,8% a 49,3% apresentaram valores acima da meta lipêmica do colesterol total, LDL-C e triglicérides, e 25,4% foram classificadas com níveis inferiores à meta do HDL-C (> 40,0 mg/dl). Investigações recentes demonstraram resultados similares aos encontrados neste estudo, em que um grande número de indivíduos, mesmo sob terapia hipolipemiante, não conseguiu atingir os níveis lipêmicos recomendados7,9,10.

Oliveira e Mancini Filho29 conduziram um estudo com mulheres pós-menopausa sob terapia hipolipemiante, no qual verificaram que apenas 7% apresentavam níveis de LDL-C <100,0 mg/dl, 26% com nível de CT <200,0 mg/dl, 56% com HDL-C >40,0 mg/dl e 44% com TG <150,0 mg/dl. Outra investigação8, conduzida com 190 indivíduos idosos de ambos os sexos portadores de dislipidemia, os quais foram divididos em dois grupos de risco segundo o escore de Framinghan, verificou que apenas 50,9% do grupo de baixo-médio risco e 30,2% do grupo de alto risco conseguiram atingir as metas para o LDL-C.

Resultados similares também foram encontrados na cidade de São Paulo, onde 67% dos pacientes de um hospital público relataram que o preço do medicamento se torna uma barreira para o tratamento farmacológico; além disso, a falta de orientação sobre o uso da medicação é responsável por 31% das irregularidades do tratamento hipolipemiante30. Pesquisas internacionais têm sugerido que a falta do controle sobre os níveis lipêmicos pode ser conseqüência da ausência de uma terapia medicamentosa mais agressiva, ineficácia da droga e baixa aderência ao tratamento9,26,31. Outros fatores relacionados ao sucesso ou ao fracasso da terapia hipolipemiante estão associados aos hábitos de vida, como inatividade física e tabagismo7.

Apesar das pesquisas nacionais citadas anteriormente, os estudos que abordam a prevalência de dislipidemia no Brasil ainda são escassos. Uma investigação realizada nas Regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste do Brasil, que avaliou 81.262 pessoas, relatou que a prevalência de hipercolesterolemia foi de 40% (média de todas as regiões) e de 44% em Curitiba - Paraná32.

A presente investigação não abordou o tipo e a dosagem da medicação utilizada. Assim, os resultados apresentados impedem a inferência de causalidade entre os fatores responsáveis pela falta de controle da dislipidemia, como dosagem inadequada, fármaco prescrito ou aderência ao tratamento. Além disso, esta pesquisa é de caráter transversal, então os resultados encontrados não evidenciam causalidade, como o efeito ao longo do tempo sobre a incidência da dislipidemia nos indivíduos avaliados. Contudo, ressalta-se que o objetivo deste estudo foi ampliar a compreensão sobre a dislipidemia e o seu tratamento, verificando a freqüência da dislipidemia na população idosa, de acordo com os grupos que relataram utilizar medicamentos hipolipemiantes.

Os resultados do presente estudo demonstraram que uma grande parcela das mulheres idosas apresentou um perfil lipídico desfavorável, independentemente do uso de terapia hipolimepiante. Além disso, destaca-se o elevado porcentual de mulheres portadoras de DCV que auto-relataram não estar sob terapia hipolipemiante e que apresentaram níveis insatisfatórios de LDL-C (> 100,0 mg/dl). Aconselha-se que novos estudos sejam realizados a fim de verificar os motivos pelos quais um grande número de mulheres desconhece seu perfil lipídico e para também analisar quais fatores podem interferir na aderência ao tratamento dessa condição, principalmente naqueles com diagnóstico médico prévio de DCV. Dessa forma, a prevenção primária e secundária poderia tornar-se mais abrangente, o que possivelmente atenuaria as conseqüências que a dislipidemia pode desencadear, como um maior risco de desenvolvimento da doença arterial coronariana4,33, hipertensão34 e acidente vascular cerebral35.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Dra. Mauren Isfer, bioquímica responsável pela realização das dosagens sangüíneas no laboratório de análises clínicas do Hospital de Polícia do Paraná. Ao Projeto Diabetes Objetivando Controle e Educação (DOCE), pela parceria realizada com o laboratório NOVARTIS, Farmácia DAS SETE. Aos endocrinologistas do Serviço de Endocrinologia e Diabetes do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba – Dra Sheyla Q. Alonso, Dra. Carolina F. da Luz Martins, Dra. Gabriela C. de Mira e Dra Jeanne D. Gama –, pela colaboração na coleta de dados.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo recebido em 12/09/07; revisado recebido em 20/11/07; aceito em 10/12/07.

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  • Correspondência:

    Maressa P. Krause
    Rua José Rodrigues Pinheiro, 949 - Capão Raso
    81130-200 - Curitiba, PR - Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      Maio 2008

    Histórico

    • Recebido
      12 Set 2007
    • Revisado
      20 Nov 2007
    • Aceito
      10 Dez 2007
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