COMENTÁRIOS
Caro Editor:
Lemos com interesse a pesquisa recentemente publicado por Nunes CE et al1 e acreditamos que este é um estudo muito interessante considerando o quão prevalente é a doença calculosa da vesícula biliar na América Latina. No entanto, gostaríamos de fazer algumas observações, como há alguns aspectos que podem ser discutidos.
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Pode colecistite e colelitíase ser integradas no mesmo universo? Nós não acreditamos. A primeira é condição de emergência e requer, de acordo com seu estado no momento da admissão, tratamento médico anterior e cirurgia, que pode ser adiado e re-entrar em algum outro tempo; a segunda é admissão eletiva. Colecistite será mais propensa a ter mais hospitalizações do que colelitíase; solução cirúrgica diminui o número de hospitalizações.
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Os autores referem-se, como uma das variáveis do estudo, o número total de hospitalizações, mas não é bem entendido; por isso que o indicador de "hospitalização/população em geral", como a diferença proporcional desta frequência relativa, é o mesmo que o número absoluto. É mais conveniente para medir a taxa específica de hospitalizações por faixa etária que faz a análise econômica da estadia hospitalar mais realista. Também é útil para medir a concentração de hospitalizações por caso e ajustá-lo por variáveis que podem ser confusas, como status socioeconômico, escolaridade, poder de compra, educação nutricional, a adesão ao tratamento; o último é, ao mesmo tempo, influenciado pelo horário de trabalho, cultura alimentar, e a capacidade de decidir a refeição de casa. Essas variáveis que poderiam ser intervenientes não estão sendo analisados no estudo: o número de vezes de admissão e a internação. Para análise mais econômica atualizada, despesas médicas já não são feitas com base em um evento, mas a partir de um processo; por isso, é necessário diferenciar hospitalizações por caso de incidente para não confundir as hospitalizações dos casos prevalentes. Isso melhora a análise econômica e permite propor intervenções sobre a questão dos custos de hospitalização para colecistite e colelitíase.
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Em relação à gravidade da doença calculosa da vesícula biliar, os autores levantam a hipótese de que a gravidade estaria associada com as características antropométricas, distribuição da gordura corporal e limiar de dor; no entanto, neste ponto existem outras variáveis que podem explicar as condições de severidade em pacientes que chegam aos serviços de emergência e estes são devido à outras variáveis, tais como a automedicação, o acesso aos serviços de saúde, idiossincrasias dos pacientes, entre outros, que muitas vezes envolvem atraso no atendimento hospitalar, com o consequente aumento da gravidade da colecistite.
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Em termos de mortalidade, ela foi elevada em idosos, provavelmente por estar associada à comorbidades, maior gravidade da doença na admissão hospitalar e menos reservas fisiológicas característica deste grupo de pacientes. Por outro lado, não houve nenhum critério de exclusão, o que significa que não foram misturados diagnósticos, tais como colangite, câncer da vesícula biliar, pancreatite aguda, entre outros. Além disso, a colecistectomia precoce nestes pacientes pode resultar em morbidade até 41% e mortalidade perioperatória de até 18%2.
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Considerando a média de tempo cirúrgico da colecistectomia aberta e laparoscópica, ela é reivindicada ser semelhante entre os idosos e os jovens; no entanto, devemos diferenciar entre operação eletiva ou de emergência para estes grupos de pessoas; sabe-se que os idosos têm aumento da presença de fatores de risco para a conversão de colecistectomia laparoscópica para laparotômica, como fibrose da parede da vesícula biliar devido à colecistite repetitivo que também provoca uma vesícula biliar retraída, aumento da probabilidade de síndrome de adesão pela história de operação anterior3.
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Houve restrição, pois o estudo não estabeleceu se a operação foi realizada no contexto de eletivo ou emergencial; o estudo refere-se ou distingue colecistite e colelitíase, de modo que pode aproximar-se indiretamente com distribuição de dados mais precisos, o que significa que os pacientes com colelitíase são candidatos a operações eletivas e os com doenças agudas - significando colecistite - serem operados de emergência. Análise a partir desse ponto de vista teria sido mais esclarecedora e não analisar como um todo. O estudo não classifica os pacientes de acordo com a sua gravidade, ou seja, colecistite aguda de grau I, II ou III de acordo com as diretrizes de Tóquio; portanto, não podemos dizer se o tratamento era precoce, tardio ou intermediário, o que pode afetar a mortalidade.
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Refere-se que houve grande despesa com crianças com menos de quatro anos que evoluíram com colelitíase ou colecistite, provavelmente devido à estranheza do pensamento de colelitíase como um diagnóstico neste grupo que exige novos estudos e um tratamento mais complexo do que nos adultos4 .
José Caballero
Referências bibliográficas
- 1 Nunes EC, Rosa RDS, Bordin R. Hospitalizations for cholecystitis and cholelithiasis in the state of Rio grande do Sul, Brazil. Arq Bras Cir Dig ABCD Braz Arch Dig Surg. 2016;29(2):77-80.
- 2 Wang C-H, Wu C-Y, Yang JC-T, Lien W-C, Wang H-P, Liu K-L, et al. Long-Term Outcomes of Patients with Acute Cholecystitis after Successful Percutaneous Cholecystostomy Treatment and the Risk Factors for Recurrence: A Decade Experience at a Single Center. PloS One. 2016;11(1):e0148017.
- 3 Philip Rothman J, Burcharth J, Pommergaard H-C, Viereck S, Rosenberg J. Preoperative Risk Factors for Conversion of Laparoscopic Cholecystectomy to Open Surgery - A Systematic Review and Meta-Analysis of Observational Studies. Dig Surg. 2016;33(5):414-23.
- 4 Chhabra SK, Ahmed Z, Massey A, Agarwal S, Vij V, Agarwal B, et al. Laparoscopic cholecystectomy in a 2 year old male child with choleilithiasis and recurrent right hypochondrial pain: Case report and review of literature. Int J Surg Case Rep. 2016;26:142-5.
RESPOSTA
Caro Editor:
Em resposta aos comentários e questões levantadas para discussão por Caballero, Tresierra e Diaz, respeitando a mesma ordem de apresentação dos itens, temos a considerar que:
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Nosso foco abordado, das hospitalizações por colecistite (CID-10 K80) e colelitíase (CID-10 K81), foi considerando ambas como parte do mesmo universo de doença da vesícula biliar. Como a imensa maioria dos casos de colecistite é devido à obstrução do ducto biliar pelo aparecimento de cálculos biliares (colelitíase), pareceu-nos adequado apresentar em conjunto o panorama das internações por ambas as doenças.
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Concordamos que outras variáveis podem ser incorporadas na análise. No entanto, a nossa fonte de dados foi o Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH / SUS, em Português). Este sistema de informação foi desenvolvido na década de 1980 com base no pagamento de todas as contas hospitalares do sistema público brasileiro. Este sistema é de utilização obrigatória por todos os prestadores de serviços no país e tem uma média de 11 milhões de internações por ano. Os dados são administrativos, secundários, e estão disponíveis ao público na internet. Dada a sua finalidade, a sua unidade de análise é a hospitalização e não o paciente. Devido à sua estrutura de banco de dados, carece de diversas variáveis, tais como o número de vezes de admissão dos pacientes, situação socioeconômica, nível educacional, poder de compra, educação nutricional, a adesão ao tratamento de cada paciente. Entendemos que na Tabela 2, apresentamos indicadores específicos por idade (admissões por 10.000 pessoas / ano).
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Na verdade, outras variáveis poderiam explicar a gravidade da condição. Neste ponto, citamos apenas a referência de Peron, Schliemann e Almeida ("Compreender as razões para a recusa de colecistectomia em pacientes com colelitíase: como ajudá-los na sua decisão? ABCD Arq. Bras. Cir. Dig. 2014 Apr-Jun; 27 (2): 114-19").
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O SIH / SUS não tem dados sobre comorbidades de pacientes hospitalizados. No entanto, considerando que são cerca de 20.000 internações por ano para CID-10 K80 e K81, por um período de três anos, todos realizados pelo sistema público brasileiro no Rio Grande do Sul, entendemos que este número é representativo do perfil da população que se pretendeu apresentar.
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O presente estudo não teve como objetivo analisar as diferenças entre admissões ou de emergência eletivas, o que efetivamente poderia ser realizado.
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O SIH / SUS não dispõe de dados tais como a classificação dos pacientes de acordo com as diretrizes de Tóquio. Esses dados estão nos prontuários dos pacientes e não no banco de dados secundário que foi construído pelo poder público para todos os tipos de internação e não apenas colelitíase e colecistite.
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Estamos de acordo, mas como mencionado, o SIH / SUS não tem essas variáveis. Para obter tais dados seria necessário um estudo concebido para a utilização dos dados primários. Este não é o caso do nosso artigo, que utiliza dados secundários disponíveis publicamente na internet.
Finalmente, gostaríamos de agradecer aos comentários feitos. Eles contribuíram para um exame mais aprofundado do assunto em questão a partir de outras perspectivas.
Emeline C Nunes, Roger S. Rosa e Ronaldo Bordin
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Nov-Dec 2016
Histórico
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Recebido
21 Ago 2016 -
Aceito
17 Out 2016