Acessibilidade / Reportar erro

Tempo de internação após apendicectomia aberta por três técnicas cirúrgicas diferentes

Resumos

RACIONAL:

A escolha da técnica de tratamento do coto apendicular na maioria das vezes depende da habilidade e preferência do cirurgião ou do protocolo adotado no serviço, e não se avalia a influência desta escolha no tempo de internação.

OBJETIVO:

Avaliar a relação entre a técnica cirúrgica e o tempo de permanência hospitalar pós-operatória em pacientes com apendicite aguda.

MÉTODOS:

Análise retrospectiva dos pacientes submetidos à apendicectomia aberta. Foram avaliados três grupos de acordo com a técnica cirúrgica: convencional (ligadura simples do coto apendicular), sutura em bolsa de tabaco e sutura a Parker-Kerr. Os dados foram cruzados com intervalos de tempo de internação estipulados aleatoriamente (até três dias, de quatro a seis dias, e sete ou mais dias).

RESULTADOS:

Foram avaliados 180 pacientes entre 15 e 85 anos. Destes, 95 foram submetidos à técnica convencional com média de 3,9 dias de internação e sete apresentaram complicações (infecção de ferida operatória, deiscência de sutura, evisceração e seroma). Em 67 pacientes foi feita sutura em bolsa de tabaco e a média de internação foi de 3,7 dias, com dois casos de complicação (infecção de ferida operatória). Em 18 foi feita a técnica de Parker-Kerr, e o tempo médio foi de 2,6 dias de internação, sem complicações descritas. O coeficiente de contingência entre as variáveis tempo de internação e técnica foi de 0,255 e o coeficiente V de Cramér foi de 0,186.

CONCLUSÃO:

Houve tendência ao maior tempo de recuperação e maior número de complicações na apendicectomia convencional, enquanto nos pacientes com apendicectomia à Parker-Kerr o tempo de internamento foi significativamente menor.

Apendicectomia; Apendicite; Tempo de internação


BACKGROUND:

The choice of surgical technique to approach the appendicular stump depends mostly on skill and personal preference of the surgeon or on the protocol used in the service, and the influence of this choice in hospitalization time is not evaluated.

AIM:

To evaluate the relation between surgical technique and postoperative hospitalization time in patients presenting with acute appendicitis.

METHODS:

Retrospective analysis of 180 patients who underwent open appendectomy. These where divided into three groups according to surgical technique: conventional appendectomy (simple ligation of the stump), tobacco pouch suture and Parker-Kerr suture. Data where crossed with hospitalization time (until three days, from four to six days and over seven days).

RESULTS:

A hundred and eighty patients with age from 15 to 85 years where included. From these, 95 underwent conventional technique, had an average hospitalization time of 3,9 days and seven had complications (surgical site infection, seroma, suture dehiscence and evisceration). In 67 patients, tobacco pouch suture was chosen and had average hospitalization time of 3,7 days and two complications (infection and seroma). In 18 Parker-Kerr suture was made, with average hospitalization time of 2,6 days, with no complication. Contingency coefficient between the variables hospitalization time and technique was 0,255 and Cramér's V was 0,186.

CONCLUSION:

There was tendency to larger hospitalization time and larger number of complications in conventional appendectomy, whereas in patients where Parker-Kerr suture was performed, hospitalization time was significantly smaller.

Appendectomy; Appendicitis; Length of stay


INTRODUÇÃO

A apendicite aguda figura entre as doenças mais frequentes que requerem tratamento cirúrgico de urgência. As primeiras apendicectomias datam do século XVIII, durante o qual Claudius Amyand11. Amyand C. Of an Inguinal Rupture, with a Pin in the Appendix Coeci, Incrusted with Stone; And Some Observations on wounds in the guts. Philos Trans R Soc Lond 1736; 39: 329-42 , 44. Barcat, JA. Sobre la apendicitis aguda: Amyand, Fitz, y unos pocos más. Medicina (B. Aires) vol.70 no.6 Ciudad Autónoma de Buenos Aires nov./dic. 2010. Editorial. publicou seus estudos sobre apendicite aguda e o emprego de suturas nas vísceras do trato gastrointestinal11. Amyand C. Of an Inguinal Rupture, with a Pin in the Appendix Coeci, Incrusted with Stone; And Some Observations on wounds in the guts. Philos Trans R Soc Lond 1736; 39: 329-42. Desde então diversas técnicas têm sido desenvolvidas para este fim77. Engström L, Fenyö G. Appendicectomy: assessment of stump invagination versus simple ligation: a prospective, randomized trial. Br J Surg. 1985 Dec;72(12):971-2. , 1212. Kingsley DPE. Some observations on appendicectomy with particular reference to technique. Br J Surg 1969; 56: 491-6 , 1414. Maier WP, Rosemond GP. A late complication of inversion of the appendiceal stump. Am J Surg. 1969 Sep;118(3):467-8. , 1818. Ochsner A, Lilly G. The technique of appendicectomy: With particular reference to the treatment of the appendiceal stump. Surgery 1937;2: 532-54. , 2525. Watters DA, Walker MA, Abernethy BC. The appendix stump: should it be invaginated? Ann R Coll Surg Engl. 1984 Mar;66(2):92-3, sendo as mais utilizadas a ligadura simples do coto apendicular, e o sepultamento do mesmo associado ou não à ligadura22. Andrade JI, Hsien CT, Martins Junior A, Ceneviva R. Apendicite aguda: estudo prospectivo de 90 casos, com especial referência a comparação entre duas técnicas de tratamento do coto apendicular. Rev Col Bras Cir 1989; 16(1): 3-6 , 55. Cabral Junior, AS et al . Apendicectomia pelas técnicas de ligadura simples e de sepultamento sem ligadura do coto apendicular: estudo comparativo em coelhos Rev Col Bras Cir 2001; 28(6).

A apendicectomia clássica consiste na exérese do apêndice e ligadura simples da base do coto apendicular. A técnica cirúrgica de confecção da bolsa de tabaco é feita através da amputação do coto, submetido à ligadura ou não. É possível ainda realizar a sutura da base do coto apendicular associando a técnica de Parker Kerr, na qual há sobreposição de tecido à linha de sutura2222. Sinha AP. Appendicectomy: an assessment of the advisability of stump invagination. Br J Surg 1977; 64(7): 499-500. , 2525. Watters DA, Walker MA, Abernethy BC. The appendix stump: should it be invaginated? Ann R Coll Surg Engl. 1984 Mar;66(2):92-3 , 2626. Yeager, G. The Appendiceal Stump. Annals et Surgery November 1947. 126(5) , 814-19..

A escolha da técnica de tratamento do coto na maioria das vezes depende da habilidade e preferência do cirurgião ou do protocolo do serviço88. Franzon O, Piccoli MC, Neves TT, Volpato MG. Apendicite aguda: análise institucional no manejo peri-operatório. ABCD Arq Bras Cir Dig 2009;22(2):72-5. , 1313. Lavonius MI, Liesjärvi S, Niskanen RO, Ristkari SK, Korkala O, Mokka RE. Simple ligation vs stump inversion in appendicectomy. Ann Chir Gynaecol 1996; 85(3): 222-4. , 1717. Novelletto, ST; ElHaje, A A; Kruel, NF; Franzon, O; Susuki, H; Andrian, AC. Estudo comparativo do tratamento do coto apendicular por ligadura e por sepultamento. Rev Bras Cir 1996; 86(6):293-6. , 2323. Sozutek A, Colak T, Dirlik M, Ocal K, Turkmenoglu O, Dag A. A Prospective Randomized Comparison of Single-port Laparoscopic Procedure With Open and Standard 3-port Laparoscopic Procedures in the Treatment of Acute Appendicitis. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2013 Feb;23(1):74-8.. Na avaliação dos fatores que influenciam no tempo de permanência e recuperação pós-cirúrgico, a importância da escolha da técnica é ultrapassada por outros determinantes, como tempo de evolução clínica pré-operatória, resposta à antibioticoterapia, e presença de comorbidades.

Outro fator que pode influenciar a escolha da técnica é o tempo necessário à sua realização: em pacientes que se encontram com apendicite rota, estado geral comprometido e instáveis hemodinamicamente, ou em pacientes com condições concomitantes que não permitem operação longa, como gestantes, a ligadura simples por ser mais rápida pode ser escolhida, reduzindo o tempo cirúrgico.

Os estudos que avaliam a influência da técnica cirúrgica adotada sobre o desfecho clínico do paciente são escassos. São em sua maioria retrospectivos, havendo poucos ensaios clínicos randomizados tratando desde tema77. Engström L, Fenyö G. Appendicectomy: assessment of stump invagination versus simple ligation: a prospective, randomized trial. Br J Surg. 1985 Dec;72(12):971-2. , 1111. Jacobs PP, Koeyers GF, Bruyninckx CM. Simple ligation superior toinversion of the appendiceal stump; a prospective randomized study.Ned Tijdschr Geneeskd. 1992 May 23;136(21):1020-3.. Dentre os estudos que enfatizam a técnica cirúrgica, os encontrados na literatura comparam apenas duas técnicas22. Andrade JI, Hsien CT, Martins Junior A, Ceneviva R. Apendicite aguda: estudo prospectivo de 90 casos, com especial referência a comparação entre duas técnicas de tratamento do coto apendicular. Rev Col Bras Cir 1989; 16(1): 3-6 , 33. Andrade JI, Sandoval EGB, Gomes CAP, Scarpelini S, Seneviva R. Apendicectomia: tratamento do coto apendicular por ligadura e por sepultamento. Rev Col Bras Cir 1996; 11(6): 314-9. , 55. Cabral Junior, AS et al . Apendicectomia pelas técnicas de ligadura simples e de sepultamento sem ligadura do coto apendicular: estudo comparativo em coelhos Rev Col Bras Cir 2001; 28(6) , 77. Engström L, Fenyö G. Appendicectomy: assessment of stump invagination versus simple ligation: a prospective, randomized trial. Br J Surg. 1985 Dec;72(12):971-2. , 99. Frutos MD, Abrisqueta J, Lujan J, Abellan I, Parrilla P. Randomized prospective study to compare laparoscopic appendectomy versus umbilical single-incision appendectomy. Ann Surg. 2013 Mar;257(3):413-8. , 1111. Jacobs PP, Koeyers GF, Bruyninckx CM. Simple ligation superior toinversion of the appendiceal stump; a prospective randomized study.Ned Tijdschr Geneeskd. 1992 May 23;136(21):1020-3. , 1313. Lavonius MI, Liesjärvi S, Niskanen RO, Ristkari SK, Korkala O, Mokka RE. Simple ligation vs stump inversion in appendicectomy. Ann Chir Gynaecol 1996; 85(3): 222-4. , 1616. Neves, LJVA et al. Ligadura simples ou ligadura com confecção de bolsa e sepultamento para tratamento do coto apendicular: estudo comparativo prospectivo randomizado. ABCD Arq Bras Cir Dig 2011;24(1): 15-19 , 1717. Novelletto, ST; ElHaje, A A; Kruel, NF; Franzon, O; Susuki, H; Andrian, AC. Estudo comparativo do tratamento do coto apendicular por ligadura e por sepultamento. Rev Bras Cir 1996; 86(6):293-6. para o tratamento da apendicite aguda.

Além disso, comparam apenas as duas técnicas principais: a ligadura simples, também chamada de apendicectomia clássica, e o sepultamento do coto apendicular (confecção da bolsa de tabaco) com ou sem ligadura, 99. Frutos MD, Abrisqueta J, Lujan J, Abellan I, Parrilla P. Randomized prospective study to compare laparoscopic appendectomy versus umbilical single-incision appendectomy. Ann Surg. 2013 Mar;257(3):413-8. , 1111. Jacobs PP, Koeyers GF, Bruyninckx CM. Simple ligation superior toinversion of the appendiceal stump; a prospective randomized study.Ned Tijdschr Geneeskd. 1992 May 23;136(21):1020-3. , 1313. Lavonius MI, Liesjärvi S, Niskanen RO, Ristkari SK, Korkala O, Mokka RE. Simple ligation vs stump inversion in appendicectomy. Ann Chir Gynaecol 1996; 85(3): 222-4. , 1717. Novelletto, ST; ElHaje, A A; Kruel, NF; Franzon, O; Susuki, H; Andrian, AC. Estudo comparativo do tratamento do coto apendicular por ligadura e por sepultamento. Rev Bras Cir 1996; 86(6):293-6..

Um estudo experimental em coelhos avaliando as duas técnicas mostrou que macroscopicamente não há diferenças significativas; porém, sob análise microscópica, a ligadura simples conseguiu preservar a integridade da camada mucosa do ceco e provocar menos fibrose55. Cabral Junior, AS et al . Apendicectomia pelas técnicas de ligadura simples e de sepultamento sem ligadura do coto apendicular: estudo comparativo em coelhos Rev Col Bras Cir 2001; 28(6). Já ensaios clínicos randomizados em humanos não têm conseguido mostrar diferença estatisticamente significativa entre as técnicas55. Cabral Junior, AS et al . Apendicectomia pelas técnicas de ligadura simples e de sepultamento sem ligadura do coto apendicular: estudo comparativo em coelhos Rev Col Bras Cir 2001; 28(6). Alguns estudos randomizados em humanos mostram superioridades da ligadura simples (por ser mais rápida, provocar menor deformidade cecal e menor número de aderências), porém sem significância estatística55. Cabral Junior, AS et al . Apendicectomia pelas técnicas de ligadura simples e de sepultamento sem ligadura do coto apendicular: estudo comparativo em coelhos Rev Col Bras Cir 2001; 28(6) , 77. Engström L, Fenyö G. Appendicectomy: assessment of stump invagination versus simple ligation: a prospective, randomized trial. Br J Surg. 1985 Dec;72(12):971-2. , 1111. Jacobs PP, Koeyers GF, Bruyninckx CM. Simple ligation superior toinversion of the appendiceal stump; a prospective randomized study.Ned Tijdschr Geneeskd. 1992 May 23;136(21):1020-3.. Outros concluem que as técnicas são semelhantes e levam ao mesmo padrão de desfecho clínico22. Andrade JI, Hsien CT, Martins Junior A, Ceneviva R. Apendicite aguda: estudo prospectivo de 90 casos, com especial referência a comparação entre duas técnicas de tratamento do coto apendicular. Rev Col Bras Cir 1989; 16(1): 3-6 , 1616. Neves, LJVA et al. Ligadura simples ou ligadura com confecção de bolsa e sepultamento para tratamento do coto apendicular: estudo comparativo prospectivo randomizado. ABCD Arq Bras Cir Dig 2011;24(1): 15-19.

Recentemente, com a maior evidência dada à operações videolaparoscópicas, estudos têm comparado esta via de acesso à cavidade com a laparotomia usual1515. Navarini D, Valiati AA, Rodrigues RR, Aita LN, Migliavaca A, Guimarães JR. Apendicectomia Laparoscópica Versus Aberta: Análise Retrospectiva. Rev HCPA 2009;29(2):115-119 , 2323. Sozutek A, Colak T, Dirlik M, Ocal K, Turkmenoglu O, Dag A. A Prospective Randomized Comparison of Single-port Laparoscopic Procedure With Open and Standard 3-port Laparoscopic Procedures in the Treatment of Acute Appendicitis. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2013 Feb;23(1):74-8. , 2424. Suttie SA, Seth S, Driver CP, Mahomed AA. Outcome after intra- and extra-corporeal laparoscopic appendectomy techniques. Surgical Endoscopy And Other Interventional Techniques. July 2004, 18(7), 1123-1125. ou até com a via de acesso por laparotomia umbilical99. Frutos MD, Abrisqueta J, Lujan J, Abellan I, Parrilla P. Randomized prospective study to compare laparoscopic appendectomy versus umbilical single-incision appendectomy. Ann Surg. 2013 Mar;257(3):413-8.; porém, nestes a escolha da técnica de tratamento do coto é avaliada com pouca frequência2121. Sauerland S, Kazemier G. Appendix stump closure during laparoscopic appendectomy (Protocol). Cochrane Database of Systematic Reviews 2007, Issue 2. Art. No.: CD006437. DOI: 10.1002/14651858.CD006437 .
https://doi.org/10.1002/14651858.CD00643...
.

Este estudo teve como objetivo correlacionar a técnica cirúrgica de tratamento do coto apendicular na apendicite aguda com o tempo de permanência hospitalar pós-cirúrgica, avaliando as complicações em pacientes submetidos à apendicectomias laparotômicas realizadas por três técnicas distintas.

MÉTODOS

Foi feita a análise retrospectiva de dados de prontuários de todos os pacientes submetidos à apendicectomias laparotômicas entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2012 no Hospital General Edson Ramalho em João Pessoa, PB, Brasil. Foram utilizados como critérios de inclusão: presença de registro detalhado e legível da descrição cirúrgica no prontuário e laudo de exame anatomopatológico confirmatório de apendicite aguda. Foram excluídos os prontuários nos quais a técnica cirúrgica não foi descrita ou naqueles em que que a descrição era ilegível, e as gestantes no momento da operação.

Considerando o objetivo de incluir todos os pacientes operados durante um ano e o desenho de estudo almejado, não foi necessário realizar o cálculo amostral.

Os pacientes foram divididos em três grupos de acordo com a técnica cirúrgica da apendicectomia: convencional/clássica, com confecção de bolsa de tabaco e com sutura a Parker-Kerr. Em seguida, foram classificados de acordo com o tempo de internação (até três dias, de quatro a seis dias e sete ou mais dias). Foi avaliada ainda a presença de complicações (necessidade de internação em UTI no pós-operatório imediato). Após cálculos de frequências e das medidas de tendência central, procedeu-se à análise cruzada das variáveis técnica x tempo de internação, utilizando uma tabela de contingência. Para tal análise foram aplicados o teste do Qui-quadrado, seguido pelo teste V de Kramer, o coeficiente de contingência e o coeficiente de incerteza, todos usados para comparação entre variáveis nominais. Para a análise estatística foram usados os softwares IBM SPSS e Microsoft Excel 2010.

RESULTADOS

Com base nos critérios de seleção da amostra foram incluídos 180 pacientes, sendo 113 (62,8%) homens e 67 (37,2%) mulheres. Quanto à idade, 58,9% tinha até 30 anos, e 83,9% até 40 anos de idade, e os extremos foram 15 e 85 anos. O laudo do exame anatomopatológico não foi encontrado nos prontuários de nove pacientes atendidos no serviço no período em questão, e por isso não foram incluídos na amostra. Apenas uma paciente era gestante quando confirmado o diagnóstico e realizada a operação, e por este motivo foi encaminhada à UTI no pós-operatório, sendo excluída do estudo.

A técnica de apendicectomia convencional foi usada em 52,8% dos pacientes, que tiveram tempo médio de 3,9 dias de internação, e em sete deles houve complicações com necessidade de internação em unidade de terapia intensiva no pós-operatório imediato. Os pacientes nos quais a apendicectomia com confecção de bolsa de tabaco foi realizada (37,2%), tiveram tempo médio de internação de 3,7 dias, e dois necessitaram de internação em UTI. Nos casos em que foi usada a apendicectomia a Parker Kerr (10%), o tempo médio de internação foi de 2,6 dias, e nenhum apresentou complicações no pós-operatório. Nenhum dos pacientes selecionados evoluiu para óbito.

A duração do período de internação pós-operatório foi de até três dias em 64,4% dos pacientes, de quatro a seis dias em 27,8% e de sete ou mais dias em 7,8% deles. O tempo mínimo foi de um dia (13 pacientes) e o máximo, de 19 dias (apenas um paciente, no qual a técnica usada foi a convencional, e houve necessidade de internação em UTI no pós-operatório).

Quando realizada a análise cruzada das variáveis técnica cirúrgica e tempo de internação, o coeficiente V de Cramér foi de 0,186. O coeficiente de contingência foi de 0,255. Considerando que este estes coeficientes têm valor máximo de 1 (o que indica correlação total entre as variáveis), nota-se que a tabulação cruzada mostrou correlação discreta, porém existente, entre as variáveis. O coeficiente de incerteza simétrico foi de 0,044, dependente da técnica foi de 0,042 e dependente do tempo foi de 0,046. Estes resultados apontam para uma chance discretamente aumentada de um paciente do grupo submetido à apendicectomia pela técnica convencional ter maior tempo de internação (7 ou mais dias), e de chance também discretamente aumentada de um paciente submetido à apendicectomia a Parker Kerr pertencer ao grupo com tempo de internação menor (até 3 dias).

DISCUSSÃO

A apendicite aguda é doença de diagnóstico eminentemente clínico88. Franzon O, Piccoli MC, Neves TT, Volpato MG. Apendicite aguda: análise institucional no manejo peri-operatório. ABCD Arq Bras Cir Dig 2009;22(2):72-5. , 1010. Goulart RN, Silvério GS, Moreira MB, Franzon O. Achados principais de exames laboratoriais no diagnóstico de apendicite aguda: uma avaliação prospectiva. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2012;25(2):88-90. , 1919. Pittman-Waller VA, Myers JG, Stewart RM, Dent DL, Page CP, Gray GA, Pruitt BA Jr, Root HD. Appendicitis: why so complicated? Analysis of 5755 consecutive appendectomies. Am Surg. 2000 Jun;66(6):548-54. , 2020. Robaina HF, Sánchez HF, Izquierdo OM, Camejo SYG. Apendicitis aguda: estudio estadístico de 214 casos operados. Rev Cub Invest Bioméd 2007; 26 (3).; porém, nest estudo, em apenas 4% dos pacientes a indicação cirúrgica foi baseada unicamente nos quadro clínico. Em 19,1% foi realizado penas um exame complementar (leucograma ou ultrassonografia). Nos demais o diagnóstico foi confirmado através de dois ou mais exames. Em 86,9% dos pacientes foi solicitado o leucograma, em 60,6%, a ultrassonografia.

O tamanho da amostra obtida no período estudado foi semelhante àquele calculado em ensaios clínicos randomizados nacionais e internacionais que abordam a mesma temática22. Andrade JI, Hsien CT, Martins Junior A, Ceneviva R. Apendicite aguda: estudo prospectivo de 90 casos, com especial referência a comparação entre duas técnicas de tratamento do coto apendicular. Rev Col Bras Cir 1989; 16(1): 3-6 , 99. Frutos MD, Abrisqueta J, Lujan J, Abellan I, Parrilla P. Randomized prospective study to compare laparoscopic appendectomy versus umbilical single-incision appendectomy. Ann Surg. 2013 Mar;257(3):413-8. , 1111. Jacobs PP, Koeyers GF, Bruyninckx CM. Simple ligation superior toinversion of the appendiceal stump; a prospective randomized study.Ned Tijdschr Geneeskd. 1992 May 23;136(21):1020-3. , 1717. Novelletto, ST; ElHaje, A A; Kruel, NF; Franzon, O; Susuki, H; Andrian, AC. Estudo comparativo do tratamento do coto apendicular por ligadura e por sepultamento. Rev Bras Cir 1996; 86(6):293-6.. O fato de a apendicite aguda acometer principalmente homens jovens é bem consolidado na literatura88. Franzon O, Piccoli MC, Neves TT, Volpato MG. Apendicite aguda: análise institucional no manejo peri-operatório. ABCD Arq Bras Cir Dig 2009;22(2):72-5. , 1010. Goulart RN, Silvério GS, Moreira MB, Franzon O. Achados principais de exames laboratoriais no diagnóstico de apendicite aguda: uma avaliação prospectiva. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2012;25(2):88-90., e a amostra obtida neste estudo evidenciou este mesmo padrão, uma vez que o número de homens foi quase o dobro daqueles de mulheres, e a maioria dos pacientes tinha menos de 30 anos de idade.

Uma vez que no serviço onde a pesquisa foi realizada a técnica de tratamento para abordar o coto apendicular é de escolha do cirurgião, o tamanho da amostra obtida para cada técnica foi variável. Esse fato mostra a preferência da maioria dos cirurgiões pela técnica convencional, dada a maior facilidade e rapidez de sua execução, o que se adequa às instituições onde há grande volume diário de operações.

A apendicite aguda é doença que apresenta baixa mortalidade, e em concordância com a literatura, não houve casos de óbito por apendicite no grupo de pacientes estudados.

Quanto ao tempo de internação pós-cirúrgico Neves et al1616. Neves, LJVA et al. Ligadura simples ou ligadura com confecção de bolsa e sepultamento para tratamento do coto apendicular: estudo comparativo prospectivo randomizado. ABCD Arq Bras Cir Dig 2011;24(1): 15-19. encontrou tempo médio maior quando a técnica foi o sepultamento do coto apendicular em comparação à ligadura simples. Este estudo mostrou resultado contrário considerando apenas estas duas técnicas, apesar de a diferença do tempo médio ter sido de apenas 0,2 dias.

Nos pacientes em que a sutura a Parker-Kerr foi realizada, o tempo de internação foi menor, mas não foi possível comparar este achado a resultados de estudos prévios já que há tendência a considerar apenas as duas técnicas mais comuns (a ligadura simples e o sepultamento do coto) na literatura consultada.

Estudos com casuísticas menores e que comparam apenas estas duas técnicas variaram77. Engström L, Fenyö G. Appendicectomy: assessment of stump invagination versus simple ligation: a prospective, randomized trial. Br J Surg. 1985 Dec;72(12):971-2. , 1111. Jacobs PP, Koeyers GF, Bruyninckx CM. Simple ligation superior toinversion of the appendiceal stump; a prospective randomized study.Ned Tijdschr Geneeskd. 1992 May 23;136(21):1020-3. , 1313. Lavonius MI, Liesjärvi S, Niskanen RO, Ristkari SK, Korkala O, Mokka RE. Simple ligation vs stump inversion in appendicectomy. Ann Chir Gynaecol 1996; 85(3): 222-4., podendo encontrar tempo maior de internação após a apendicectomia convencional ou após a confecção da bolsa de tabaco; todavia, nestes estudos estas diferenças não foram estatisticamente significativas. O mesmo ocorreu em relação ao número de episódios de complicações relativas à operação e a necessidade de internação em unidade de terapia intensiva.

Não foram encontrados ensaios clínicos avaliando estas variáveis (tempo de internação e presença de complicações) em pacientes submetidos à apendicectomia a Parker-Kerr.

A análise estatística das contingências mostrou que há correlação entre as variáveis e a tendência a maior tempo de internação pela técnica convencional e não é aleatória. No entanto, esta associação é discreta, considerando o valor do coeficiente V e Cramer e os coeficientes de contingência e incerteza.

Estudo recente realizado por Dhupar et al66. Dhupar R, Evankovich J, Ochoa JB, Vargas LG, Hughes SJ. Outcomes of operative management of appendicitis. Surg Infect (Larchmt). 2012 Jun;13(3):141-6., com amostra de 453 pacientes, foi demonstrado por regressão logística que a idade é um fator determinante de apendicite complicada e maior tempo de internação hospitalar. Este estudo não confirma este dado, uma vez que tanto nos pacientes submetidos à apendicectomia clássica quanto ao sepultamento do coto a média de idade das amostras foi igual (31 anos), e naqueles submetidos à apendicectomia a Parker-Kerr a média de idade foi de 29 anos.

CONCLUSÃO

Houve tendência ao maior tempo de recuperação e maior número de complicações na apendicectomia convencional, enquanto nos pacientes com apendicectomia à Parker-Kerr o tempo de internamento foi significativamente menor.

REFERENCES

  • 1
    Amyand C. Of an Inguinal Rupture, with a Pin in the Appendix Coeci, Incrusted with Stone; And Some Observations on wounds in the guts. Philos Trans R Soc Lond 1736; 39: 329-42
  • 2
    Andrade JI, Hsien CT, Martins Junior A, Ceneviva R. Apendicite aguda: estudo prospectivo de 90 casos, com especial referência a comparação entre duas técnicas de tratamento do coto apendicular. Rev Col Bras Cir 1989; 16(1): 3-6
  • 3
    Andrade JI, Sandoval EGB, Gomes CAP, Scarpelini S, Seneviva R. Apendicectomia: tratamento do coto apendicular por ligadura e por sepultamento. Rev Col Bras Cir 1996; 11(6): 314-9.
  • 4
    Barcat, JA. Sobre la apendicitis aguda: Amyand, Fitz, y unos pocos más. Medicina (B. Aires) vol.70 no.6 Ciudad Autónoma de Buenos Aires nov./dic. 2010. Editorial.
  • 5
    Cabral Junior, AS et al . Apendicectomia pelas técnicas de ligadura simples e de sepultamento sem ligadura do coto apendicular: estudo comparativo em coelhos Rev Col Bras Cir 2001; 28(6)
  • 6
    Dhupar R, Evankovich J, Ochoa JB, Vargas LG, Hughes SJ. Outcomes of operative management of appendicitis. Surg Infect (Larchmt). 2012 Jun;13(3):141-6.
  • 7
    Engström L, Fenyö G. Appendicectomy: assessment of stump invagination versus simple ligation: a prospective, randomized trial. Br J Surg. 1985 Dec;72(12):971-2.
  • 8
    Franzon O, Piccoli MC, Neves TT, Volpato MG. Apendicite aguda: análise institucional no manejo peri-operatório. ABCD Arq Bras Cir Dig 2009;22(2):72-5.
  • 9
    Frutos MD, Abrisqueta J, Lujan J, Abellan I, Parrilla P. Randomized prospective study to compare laparoscopic appendectomy versus umbilical single-incision appendectomy. Ann Surg. 2013 Mar;257(3):413-8.
  • 10
    Goulart RN, Silvério GS, Moreira MB, Franzon O. Achados principais de exames laboratoriais no diagnóstico de apendicite aguda: uma avaliação prospectiva. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2012;25(2):88-90.
  • 11
    Jacobs PP, Koeyers GF, Bruyninckx CM. Simple ligation superior toinversion of the appendiceal stump; a prospective randomized study.Ned Tijdschr Geneeskd. 1992 May 23;136(21):1020-3.
  • 12
    Kingsley DPE. Some observations on appendicectomy with particular reference to technique. Br J Surg 1969; 56: 491-6
  • 13
    Lavonius MI, Liesjärvi S, Niskanen RO, Ristkari SK, Korkala O, Mokka RE. Simple ligation vs stump inversion in appendicectomy. Ann Chir Gynaecol 1996; 85(3): 222-4.
  • 14
    Maier WP, Rosemond GP. A late complication of inversion of the appendiceal stump. Am J Surg. 1969 Sep;118(3):467-8.
  • 15
    Navarini D, Valiati AA, Rodrigues RR, Aita LN, Migliavaca A, Guimarães JR. Apendicectomia Laparoscópica Versus Aberta: Análise Retrospectiva. Rev HCPA 2009;29(2):115-119
  • 16
    Neves, LJVA et al. Ligadura simples ou ligadura com confecção de bolsa e sepultamento para tratamento do coto apendicular: estudo comparativo prospectivo randomizado. ABCD Arq Bras Cir Dig 2011;24(1): 15-19
  • 17
    Novelletto, ST; ElHaje, A A; Kruel, NF; Franzon, O; Susuki, H; Andrian, AC. Estudo comparativo do tratamento do coto apendicular por ligadura e por sepultamento. Rev Bras Cir 1996; 86(6):293-6.
  • 18
    Ochsner A, Lilly G. The technique of appendicectomy: With particular reference to the treatment of the appendiceal stump. Surgery 1937;2: 532-54.
  • 19
    Pittman-Waller VA, Myers JG, Stewart RM, Dent DL, Page CP, Gray GA, Pruitt BA Jr, Root HD. Appendicitis: why so complicated? Analysis of 5755 consecutive appendectomies. Am Surg. 2000 Jun;66(6):548-54.
  • 20
    Robaina HF, Sánchez HF, Izquierdo OM, Camejo SYG. Apendicitis aguda: estudio estadístico de 214 casos operados. Rev Cub Invest Bioméd 2007; 26 (3).
  • 21
    Sauerland S, Kazemier G. Appendix stump closure during laparoscopic appendectomy (Protocol). Cochrane Database of Systematic Reviews 2007, Issue 2. Art. No.: CD006437. DOI: 10.1002/14651858.CD006437 .
    » https://doi.org/10.1002/14651858.CD006437
  • 22
    Sinha AP. Appendicectomy: an assessment of the advisability of stump invagination. Br J Surg 1977; 64(7): 499-500.
  • 23
    Sozutek A, Colak T, Dirlik M, Ocal K, Turkmenoglu O, Dag A. A Prospective Randomized Comparison of Single-port Laparoscopic Procedure With Open and Standard 3-port Laparoscopic Procedures in the Treatment of Acute Appendicitis. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2013 Feb;23(1):74-8.
  • 24
    Suttie SA, Seth S, Driver CP, Mahomed AA. Outcome after intra- and extra-corporeal laparoscopic appendectomy techniques. Surgical Endoscopy And Other Interventional Techniques. July 2004, 18(7), 1123-1125.
  • 25
    Watters DA, Walker MA, Abernethy BC. The appendix stump: should it be invaginated? Ann R Coll Surg Engl. 1984 Mar;66(2):92-3
  • 26
    Yeager, G. The Appendiceal Stump. Annals et Surgery November 1947. 126(5) , 814-19.
Correspondência: Agláia Moreira Garcia Ximenes E-mail: aglaiamoreiragx@yahoo.com.br
Conflito de interesses: não há
  • Fonte de financiamento: não há

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2014

Histórico

  • Recebido
    04 Dez 2013
  • Aceito
    11 Mar 2014
Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva Av. Brigadeiro Luiz Antonio, 278 - 6° - Salas 10 e 11, 01318-901 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (11) 3288-8174/3289-0741 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaabcd@gmail.com