Resumos
Essa revisão relata os aspectos etiológicos da resistência à insulina, bem como a participação do zinco nesse processo. O zinco participa de vias metabólicas que envolvem a síntese de proteínas, metabolismo de carboidratos, de lipídeos e de ácidos nucléicos. Esse mineral tem sido relacionado com a interação entre hormônios e seus receptores, e com melhoras no estímulo pós-receptor. Estudos in vitro apontam que a insulina pode se ligar com o zinco, melhorando a solubilidade deste hormônio nas células beta do pâncreas, e, ainda, pode aumentar a capacidade de ligação da insulina ao seu receptor. Na obesidade e resistência à insulina, têm sido detectadas alterações na concentração e na distribuição de zinco nos tecidos, bem como melhora da sensibilidade à insulina após a suplementação com esse mineral. Portanto, o papel metabólico do zinco na síndrome de resistência insulínica deve ser mais pesquisado, tendo em vista que esse mineral pode contribuir no controle das alterações metabólicas comumente presentes em pacientes obesos.
Resistência à insulina; Zinco; Obesidade; Estado Nutricional; Metabolismo
This review reports the etiological aspects of insulin resistance as well as the participation of zinc in this process. Zinc participates in the metabolic pathways involving protein synthesis, and the metabolism of carbohydrate, lipid and nucleic acid. This element has been associated with the interaction between hormones and their receptors and to the improvement in the post-receptor stimulus. In vitro studies show that insulin may form a complex with zinc improving the solubility of this hormone in the pancreatic b cells and also increasing the binding ability of insulin to its receptor. Regarding obesity and insulin resistance, alterations in zinc concentration and distribution in tissues, as well as improvement in sensitivity to insulin after supplementation with this element, have been detected. Thus, the metabolic role of zinc in the insulin resistance syndrome should be further investigated having in mind that this element may contribute to the control of the usual metabolic alterations present in obese patients.
Insulin resistance; Zinc; Obesity; Nutritional status; Metabolism
REVISÃO
Participação do zinco na resistência à insulina
Participation of zinc in insulin resistance
Dilina N. Marreiro; Bruno Geloneze; Marcos A. Tambascia; Antonio C. Lerário; Alfredo Halpern; Silvia M.F. Cozzolino
Departmento de Alimentos e Nutrição Experimental (DNM, SMFC), Faculdade de Ciências Farmacêuticas e Disciplina de Endocrinologia (ACL, AH), Universidade de São Paulo, SP; e Disciplina de Endocrinologia (BG, MAT), Universidade de Campinas, SP
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Silvia Maria Franciscato Cozzolino Departamento de Alimento e Nutrição Experimental - USP Av. Lineu Prestes 580 05508-900 São Paulo, SP Fax: (11) 3815-4410 E.Mail: smfcozzo@usp.br
RESUMO
Essa revisão relata os aspectos etiológicos da resistência à insulina, bem como a participação do zinco nesse processo. O zinco participa de vias metabólicas que envolvem a síntese de proteínas, metabolismo de carboidratos, de lipídeos e de ácidos nucléicos. Esse mineral tem sido relacionado com a interação entre hormônios e seus receptores, e com melhoras no estímulo pós-receptor. Estudos in vitro apontam que a insulina pode se ligar com o zinco, melhorando a solubilidade deste hormônio nas células beta do pâncreas, e, ainda, pode aumentar a capacidade de ligação da insulina ao seu receptor. Na obesidade e resistência à insulina, têm sido detectadas alterações na concentração e na distribuição de zinco nos tecidos, bem como melhora da sensibilidade à insulina após a suplementação com esse mineral. Portanto, o papel metabólico do zinco na síndrome de resistência insulínica deve ser mais pesquisado, tendo em vista que esse mineral pode contribuir no controle das alterações metabólicas comumente presentes em pacientes obesos.
Descritores: Resistência à insulina; Zinco; Obesidade; Estado Nutricional; Metabolismo
ABSTRACT
This review reports the etiological aspects of insulin resistance as well as the participation of zinc in this process. Zinc participates in the metabolic pathways involving protein synthesis, and the metabolism of carbohydrate, lipid and nucleic acid. This element has been associated with the interaction between hormones and their receptors and to the improvement in the post-receptor stimulus. In vitro studies show that insulin may form a complex with zinc improving the solubility of this hormone in the pancreatic b cells and also increasing the binding ability of insulin to its receptor. Regarding obesity and insulin resistance, alterations in zinc concentration and distribution in tissues, as well as improvement in sensitivity to insulin after supplementation with this element, have been detected. Thus, the metabolic role of zinc in the insulin resistance syndrome should be further investigated having in mind that this element may contribute to the control of the usual metabolic alterations present in obese patients.
Keywords: Insulin resistance; Zinc; Obesity; Nutritional status; Metabolism
RESISTÊNCIA À INSULINA E ZINCO
NOS ANOS RECENTES, PERCEBE-SE um crescente interesse no que diz respeito às alterações metabólicas presentes em indivíduos obesos. Nesse sentido, investigações têm procurado elucidar os mecanismos envolvidos no processo de desenvolvimento da resistência à insulina. Estas vão desde as alterações no número e na afinidade de receptores de insulina, até as bases moleculares intracelulares envolvidas no metabolismo da glicose (1,2).
Em pesquisas conduzidas tanto em animais quanto em humanos, tem-se evidenciado que o metabolismo de minerais apresenta-se alterado na presença da obesidade. O zinco, em particular, tem sido um elemento de interesse para muitos pesquisadores. Este mineral possui uma relação com os sinais de membrana na regulação hormonal, que parece melhorar a interação entre hormônios e seus receptores (3,4).
Tem-se evidenciado a participação do zinco estimulando a atividade do receptor de insulina tirosina quinase, que, posteriormente, por meio do estímulo pós-receptor, parece aumentar a translocação dos transportadores de glicose dos seus sítios intracelulares para a membrana plasmática. Associado a esse fato, muitos estudos têm demonstrado que as concentrações de zinco no plasma, eritrócitos e no soro de indivíduos obesos estão diminuídas, e que a suplementação com esse mineral reduz a resistência à insulina (5-8).
ASPECTOS ETIOLÓGICOS DA RESISTÊNCIA À INSULINA
A resistência à insulina é uma característica comum da obesidade. Muitos estudos com o objetivo de esclarecer os mecanismos envolvidos nesta relação têm demonstrado que as alterações na sensibilidade à insulina associadas à obesidade são o resultado de anormalidades na sinalização deste hormônio nos tecidos-alvo. Entretanto, as bases bioquímicas envolvidas nestas anormalidades não estão ainda completamente definidas.
Os primeiros estudos indicaram que a resistência à insulina na obesidade era atribuída à regulação quantitativa dos transportadores de glicose sensíveis à insulina e dos seus receptores. Entretanto, as pesquisas realizadas recentemente têm contribuído para o grande avanço no entendimento da via molecular da ação da insulina, com a observação da atividade catalítica intrínseca do receptor deste hormônio, bem como os eventos sinalizadores em cascata. Os resultados destes estudos demonstraram que animais obesos e indivíduos com diabetes mellitus tipo 2 apresentavam alterações no metabolismo da glicose como resultado de um estado de resistência à insulina (9).
O receptor de insulina é uma proteína que compreende duas sub-unidades extracelulares, que contém um sítio de ligação da insulina, e duas sub-unidades b intracelulares, estas últimas ligadas à membrana que faz a transdução do sinal da insulina à célula (10).
A ação da insulina inicia-se a partir da sua ligação às sub-unidades a do receptor específico na membrana, estimulando a sub-unidade b que se autofosforila e implementa sua capacidade tirosina quinase. A sub-unidade b é capaz de autofosforilar-se e de fosforilar outras proteínas ou substratos sinalizadores citoplasmáticos intracelulares, dentre eles o substrato 1 do receptor de insulina (IRS-1) e o substrato 2 do receptor de insulina (IRS-2) (11).
Após a fosforilação do substrato 1 do receptor de insulina (IRS-1), este pode se associar à fosfatidil-inositol-3-quinase (PI3-quinase), ativando-a. Esta ativação é necessária para a estimulação do transporte de glicose pela insulina, e é suficiente para induzir, pelo menos parcialmente, a translocação do GLUT4 para a membrana plasmática. Após a fosforilação da PI3-quinase, esta proteína passa a ativar outros substratos citoplasmáticos, como as serinas quinases, proteína kinase B (AKT) e a proteína kinase C (PCK), que, uma vez fosforiladas, também participam das vias de transmissão do sinal de insulina durante o transporte de glicose (12).
Em se tratando de obesidade, a resistência à insulina é manifestada pela redução do transporte e metabolismo da glicose estimulado pela insulina no adipócito e músculo esquelético, entre outros tecidos, bem como pelo aumento da liberação da glicose hepática. Estas alterações funcionais podem resultar, em parte, de alterações nas vias de transmissão do sinal da insulina. De acordo com Kahn & Flier (1), tanto no músculo quanto no tecido adiposo a ligação da insulina ao seu receptor na membrana, bem como a fosforilação e a atividade quinase deste receptor, estão reduzidas em indivíduos com resistência à insulina.
Nos diversos estágios de resistência à insulina, a expressão do GLUT4 é regulada diferentemente em tecidos como o músculo e o tecido adiposo. Nos adipócitos de indivíduos obesos, a concentração de GLUT4 encontra-se reduzida e, no músculo esquelético, esta proteína está normal. Considerando-se que o músculo é o principal local para utilização de glicose estimulada pela insulina, as alterações na sensibilidade à insulina sistêmica não seriam explicadas pela redução da produção do GLUT4. Portanto, a redução na captação de glicose no músculo esquelético em indivíduos obesos e em diabéticos é atribuída à redução na translocação do GLUT4 das vesículas intracelulares à membrana da célula (1).
Vários estudos têm demonstrado que as alterações verificadas nas vias de transmissão do sinal de insulina ocorrem em tecidos específicos. No estudo de Kim e cols. (13), foi demonstrada uma redução da expressão do IRS-1 no músculo esquelético de indivíduos obesos com resistência à insulina, resultando em uma diminuição da atividade da PI3-quinase e, conseqüentemente, na translocação intracelular do GLUT4.
Para alguns autores, a fosforilação da tirosina poderia encontrar-se alterada, o que levaria a mudanças nos sinais dentro da célula. De acordo com Garvey (14), a concentração das proteínas transportadoras de glicose está normal nas células musculares esqueléticas de indivíduos que apresentam resistência à insulina. Deste modo, o defeito estaria na atividade funcional ou na translocação destes transportadores mediada pela insulina.
Ainda dentro dessa abordagem, é oportuno destacar a identificação de substâncias secretadas no tecido adiposo, que têm contribuído para um melhor entendimento dos mecanismos moleculares envolvidos na manifestação da resistência à insulina. O TNFa e os ácidos graxos livres induzem ao aparecimento dessa síndrome em tecidos como o músculo e o fígado, além do tecido adiposo. O TNFa inibe a fosforilação do substrato 1 do receptor de insulina (IRS1) e também altera a atividade deste receptor (15,16).
Recentemente, outros fatores moleculares secretados no tecido adiposo, que estão envolvidos na inibição da função e/ou na sinalização do receptor de insulina, têm sido caracterizados, dentre eles os ácidos graxos livres, a lipase de lipoproteína, a leptina, adiponectina e a interleucina-6 (17).
Em um estudo recente, Steppan e cols., em 2001 (18), identificaram outro hormônio, a resistina, que atua aumentando a resistência à insulina, provavelmente por diminuir a habilidade da insulina em promover a captação da glicose pelos adipócitos e por inibir o processo de recrutamento de pré-adipócitos para sua conversão em adipócitos. Por outro lado, as tiazolidinedionas, drogas que atuam aumentando o metabolismo da glicose, possuem efeito inibidor sobre a produção de resistina (16,17).
As tiazolidinedionas reduzem a resistência à insulina por estimular o receptor ativado por proliferadores do peroxisoma (PPAR-gama), fator de transcrição de receptores de hormônios nucleares, que atuam induzindo a diferenciação dos pré-adipócitos em adipócitos e promovendo o metabolismo da glicose. Os prováveis mecanismos para explicar a ação das tiazolidinedionas sobre a redução da resistência à insulina agiriam por meio de seu efeito direto sobre o PPAR gama, com redução da liberação dos ácidos graxos livres e da sinalização do TNFa (16).
Diferentemente dos demais fatores secretados no tecido adiposo, a adiponectina encontra-se paradoxalmente reduzida em indivíduos obesos. Esta proteína aumenta a oxidação dos ácidos graxos livres, reduzindo os triacilgliceróis dos tecidos e, conseqüentemente, reduzindo a resistência à insulina. Além disso, já foi demonstrado que a adiponectina pode inibir a resposta inflamatória e parece estar envolvida nos mecanismos que participam da relação entre aterosclerose e obesidade (19).
Finalmente, a etiologia molecular da resistência à insulina é multifatorial, onde vários mecanismos contribuem para o fenômeno final. Considerando-se que os efeitos metabólicos da insulina são mediados pelas rápidas alterações na fosforilação e função de proteínas, a redução na atividade quinase do receptor deste hormônio é a chave para a manifestação da resistência à insulina.
ZINCO E RESISTÊNCIA À INSULINA
O interesse pelo desenvolvimento de estudos sobre zinco e resistência à insulina baseia-se no fato do zinco ser importante para várias funções orgânicas, as quais encontram-se alteradas em pacientes obesos resistentes à insulina.
O papel do zinco na nutrição humana tem sido cada vez mais ressaltado, e tem havido um progresso dos conhecimentos no que diz respeito aos aspectos bioquímicos, imunológicos e clínicos. A importância deste mineral foi demonstrada com a descoberta de processos metabólicos envolvendo o zinco em diversas atividades enzimáticas. Ele participa do metabolismo energético como componente catalítico de mais de 300 metaloenzimas nos tecidos humanos, e como componente estrutural de diversas proteínas, hormônios e nucleotídeos (20).
A participação do zinco na cristalização da insulina foi evidenciada por Scott em 1934 (21). Os estudos que relacionavam este mineral com a obesidade sugeriam que as alterações encontradas na sua distribuição tecidual estariam relacionadas com distúrbios na atividade da insulina, principalmente no que diz respeito à secreção pancreática e ação desse hormônio nos tecidos.
A propriedade da insulina em se complexar com o zinco, foi demonstrada in vitro por Maske & Germany (22), o que explicaria a influência do zinco na solubilidade e armazenamento deste hormônio nos grânulos das células beta do pâncreas. Posteriormente, foi demonstrado em camundongos obesos que o zinco aumenta a proporção de ligação da insulina aos seus receptores. Por outro lado, também já foi verificado que ratos deficientes em zinco apresentam redução da habilidade do pâncreas para secretar insulina em resposta à glicose e diminuição da ação da insulina nos tecidos (23,24).
O zinco tem um efeito estimulatório da lipogênese em adipócitos de ratos, similar à ação da insulina, e esse efeito é somado quando os dois são incubados em conjunto. A partir desses dados, tem sido bastante discutido o fato de que a importância do zinco na interação zinco/adipócito se deve ao efeito sobre o aumento da capacidade de ligação da insulina aos seus receptores (5). Uma outra hipótese poderia estar relacionada a uma maior sinalização do sistema PPAR nestes tecidos por influência do zinco.
O zinco pode modular a transcrição do receptor de insulina por meio das proteínas dedos de zinco, que contêm três dedos de zinco necessários para sua ligação. Os sítios de ligação dessas proteínas são necessários para ativar a expressão do receptor de insulina, conforme já demonstrado por Araki e cols. (25).
A avaliação da concentração de zinco no plasma durante o teste oral de tolerância à glicose em indivíduos obesos tem demonstrado que os indivíduos obesos apresentam uma redução na concentração desse mineral no plasma, e este está inversamente correlacionada à glicemia e à insulina plasmática. A concentração deste mineral no plasma não é alterada com a hiperglicemia induzida pela administração de glicose, sugerindo que não há uma mobilização de zinco dos tecidos pela hiperglicemia, ou seja, a redução da concentração deste mineral no plasma não reflete uma alteração metabólica a curto prazo (4).
Em outro estudo conduzido no ano de 1998 (26), foi avaliado o efeito da suplementação com zinco sobre o controle glicêmico e níveis de insulina em camundongos obesos diabéticos com resistência à insulina. Os autores verificaram uma redução da insulina plasmática e na resposta glicêmica de 34% e 42%, respectivamente. Os autores também sugeriram que o efeito do zinco sobre a redução da insulina no plasma poderia ser atribuído ao efeito direto desse mineral na redução da secreção pancreática da insulina ou, ainda, à potencialização da ação desse hormônio em tecidos periféricos.
Em outro estudo sobre a suplementação de zinco na utilização de glicose, foram administrados 136mg de zinco/dia durante 60 dias em 10 pacientes cirróticos que apresentavam intolerância à glicose e deficiência de zinco. Houve melhora na utilização da glicose, mas nenhum efeito sobre a secreção pancreática e a sensibilidade à insulina. Os autores sugeriram que a ação do zinco estaria relacionada ao aumento da atividade dos transportadores de glicose (GLUT 1 e GLUT 2) independente da insulina ou, ainda, à modificação da estrutura destes transportadores (27).
No estudo de Marreiro e cols. (8), foi avaliado o efeito da suplementação com 30mg de zinco/dia durante 4 semanas sobre a resistência à insulina em mulheres obesas, e ficou demonstrado que a terapia com esse mineral pode melhorar a sensibilidade à insulina.
Os resultados de vários estudos demonstram a importância da proteção dos grupos tiol na tradução do sinal da insulina, sendo que o zinco participa nesta proteção e, assim, exerce um efeito benéfico adicional sobre a sensibilidade tecidual a este hormônio. A importância deste mineral na proteção dos grupos tiols em conjunto com outros mecanismos de interação do zinco e metabolismo de glicose abre perspectivas para a utilização deste mineral no paciente diabético para melhorar o controle metabólico, ou em estágios de intolerância à glicose para impedir a progressão para o diabetes.
INTOLERÂNCIA À GLICOSE E ZINCO
A participação do zinco na homeostase da glicose começou a ser investigada ainda na década de 60, quando Boquist e cols. (28) observaram uma redução na tolerância à glicose sem alteração na produção de insulina em resposta à infusão de glicose em ratos deficientes em zinco. A deficiência de zinco poderia inibir os eventos intracelulares pós-receptor da insulina, o que resultaria em redução na tolerância à glicose.
Outra hipótese levantada por vários pesquisadores seria de que o efeito da deficiência de zinco sobre o metabolismo periférico da glicose estaria relacionado ao papel deste mineral como antioxidante biológico. O aumento da peroxidação lipídica, comum em indivíduos diabéticos, seria atribuído à redução da atividade da superóxido dismutase, dependente de zinco, o que favoreceria o aparecimento de alterações na fluidez da membrana e na ação da insulina sobre o transporte de glicose (29).
Os estudos realizados in vivo para avaliar o efeito do zinco sobre a tolerância à glicose demonstram que a terapia com esse mineral pode melhorar a sensibilidade à insulina. No entanto, segundo os autores, mais investigações seriam necessárias para definir o papel da depleção intracelular de elementos com propriedades insulinomiméticas na redução da sensibilidade à insulina, normalmente presente no diabetes mellitus tipo 2, na obesidade, na hipertensão arterial (30).
LEPTINA E ZINCO
As pesquisas realizadas têm visado verificar o efeito da suplementação com zinco na expressão de leptina. Os resultados da maioria dos estudos têm demonstrado que animais deficientes em zinco apresentam aumento da concentração desse hormônio após a suplementação com zinco. Em um estudo realizado em humanos por Mantzoros e cols. (31), foi avaliada a relação entre o estado nutricional relativo ao zinco e a concentração de leptina sérica em indivíduos com deficiência deste mineral, induzida pela dieta, antes e após a suplementação. A deficiência de zinco reduziu a concentração de leptina sérica, enquanto a suplementação aumentou os níveis deste hormônio. Além disso, a suplementação com zinco também aumentou a produção de interleucina 2 (IL-2) e do TNFa. Já foi demonstrado em outros estudos que estas citocinas aumentam a produção de leptina. Ainda não está claramente definido se o zinco regula a expressão da leptina diretamente ou indiretamente por meio do aumento da produção de interleucina-6 e do TNFa (32). O provável mecanismo proposto para o efeito do zinco na redução da hiperglicemia em animais diabéticos obesos e não obesos seria por meio do aumento da expressão da leptina induzida por este mineral, com a consequente interação deste hormônio com a insulina, promovendo uma melhor sinalização insulínica (32).
GLICOCORTICÓIDES E ZINCO
Trabalhos recentes têm demonstrado uma interação entre o zinco e os glicocorticóides nas alterações do metabolismo da glicose. No estudo de Telford & Fraker (33), foi demonstrado que o zinco inibe a ligação dos glicocorticóides ao seu receptor, e que existe uma região de ligação do zinco no receptor destes hormônios.
Outro fato interessante é que animais deficientes em zinco apresentam elevadas concentrações de glicocorticóides e concomitante resistência à insulina. Associado a isso, elevadas concentrações de glicocorticóides levam a uma redução dos níveis de zinco no plasma e aumento da captação desse mineral pelo fígado (34).
Os principais mecanismos envolvidos na participação do zinco na resistência à insulina estão representados na figura 1.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Existem várias evidências experimentais, em modelos animais e mesmo em ensaios clínicos em humanos, que demostram a participação do zinco no metabolismo da glicose através da sua interação com a ação insulínica. Novos estudos sobre outros mecanismos de interação do zinco diretamente com o receptor da insulina, ou indiretamente influenciando a produção de hormônios e citoquinas que participam dos mecanismos da ação insulínica, poderão fornecer bases para o entendimento bioquímico da interação deste mineral com a resistência à insulina. O desdobramento deste conhecimento poderá nortear outros ensaios clínicos para estabelecer o potencial terapêutico do zinco sobre os estados de resistência à insulina, como a obesidade e o diabetes tipo 2.
Recebido em 08/08/03
Revisado em 07/01/04
Aceito em 20/01/04
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
12 Jul 2004 -
Data do Fascículo
Abr 2004
Histórico
-
Aceito
20 Jan 2004 -
Revisado
07 Jan 2004 -
Recebido
08 Ago 2003