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Literatura(s): língua(s)

Literature(s): language(s)

Resenha de: GASPARINI, Pablo. . Puertos: Diccionarios. Literaturas y alteridad lingüística desde la pampa . Rosario: Beatriz Viterbo Editora, 2021. 340 p.

O livro Puertos: diccionarios. Literaturas y alteridad lingüística desde la pampa reúne e articula significativos resultados de pesquisas que Pablo Gasparini vem desenvolvendo há vários anos. Tais resultados, que redundaram em sua tese de livre docência como professor da Universidade de São Paulo, em diversos aspectos avançam, inovam e desdobram reflexões a respeito das relações entre literatura(s) e língua(s), que vêm ganhando corpo e constituindo redes de interlocução acadêmica, configurando assim uma linha de pesquisa de relevante impacto nos estudos literários e culturais na contemporaneidade.

Como evidencia o autor logo na introdução da obra, sua proposta é “indagar momentos, experiencias y materiales en que el aparente y ‘natural’ reconocimiento en la lengua común se revela conmovido [...] por su alteridad constitutiva” (GASPARINI, 2021GASPARINI, Pablo. Puertos: Diccionarios. Literaturas y alteridad lingüística desde la pampa. Rosario: Beatriz Viterbo Editora, 2021., p. 25). Para tanto, o pesquisador constitui seu recorte de objetos de investigação focalizando, em diálogo com Steiner (1990STEINER, George. Extraterritorial: a literatura e a revolução da linguagem. Trad. Julio Castañon Guimarães. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. ), autores modernos e contemporâneos que, tanto por sua condição extraterritorial de emigrantes/imigrantes quanto por seu empenho de alterização dos padrões linguístico-normativos, desestabilizam valores formativos do campo literário (argentino? hispano-americano? latino-americano?).

Tal hesitação na tentativa de adjetivação desse campo coincide com o gesto de Gasparini, que embora situe sua reflexão ‘desde’ os pampas, traz como Capítulo 1 da obra uma discussão sobre as inflexões glotopolíticas do pensamento teórico-crítico de Ángel Rama, intelectual fundamental para a consolidação de uma perspectiva latino-americanista no contexto dos anos 1970. Ao interrogar a dicotomia cosmopolitismo vs. localismo, assinala-se o interesse do crítico uruguaio pela heterogeneidade linguística mobilizada por autores vanguardistas centrais de diferentes países da América Hispânica. Nesse sentido, Rama estabelece uma separação entre as poéticas mais universalistas de Carpentier e Huidobro em contraste com certa “cumplicidade” entre distintas variedades da língua espanhola em Vallejo. Contrapondo-se a esse discurso homogeneizador, vinculado à ideia de hispanismo enquanto “pátria comum”, Gasparini reivindica outra leitura tanto de Vallejo quanto de Rama, mostrando uma dimensão de estranhamento do “próprio” da língua espanhola, ou da língua(gem) para além de qualquer nomeação, como potência glotopolítica contra-hegemônica, ainda pouco explorada, das vanguardas.

Na esteira desse debate que subverte pressupostos da tradição historiográfica vanguardista, no Capítulo 2 Gasparini aborda as relações ecfrásticas da estética de Xul Solar, fazendo interagir sua produção visual, bastante difundida, e seu projeto linguístico, assentado na invenção de uma língua, chamada de neocriollo (ou criol). A leitura desse capítulo chama atenção para o modo como o trabalho plástico de Xul transcende a especificidade do pictórico, apropriando-se de processos de crioulização linguística. Tal imbricação do verbal com o não-verbal aproxima criticamente a heterogeneidade da língua(gem) à heterogeneidade da cultura popular. A atenção de Gasparini a esse aspecto vai de encontro às tendências discursivas que tentam cristalizar o legado vanguardista em estereótipos vinculados à formação simbólica do nacional.

Seguindo essa linha de problematização do nacional, o Capítulo 3 é dedicado à análise de dois autores centrais na composição do cânone literário argentino - Jorge Luis Borges e Adolfo Bioy Casares - focalizando textos que ambos publicaram sob o pseudônimo de Bustos Domecq. Tal gesto, além de representar um deslocamento em relação às imagens autorais projetadas por Borges e Bioy Casares, abre-se ao questionamento do processo de estandardização do idioma nacional. Não à toa, o enfoque do capítulo recai sobre “La fiesta del monstruo” (1947), de Domecq, texto em que se ressalta o uso do cocoliche - língua de contato italiano-espanhol, falada por imigrantes italianos na Argentina. É importante assinalar que tal socavamento dos contatos linguísticos que emergem no cocoliche e no lunfardo, a que se permitem ambos os escritores via pseudônimo, contradiz a hegemonia monoglóssica de seus projetos literários principais, aderidos ao cânone. Nessa “meia-língua”, performada pelos textos de Domecq, ganha voz o sujeito urbano industrial, pertencente ao lumpemproletariado imigrante; e por meio dessa língua de entremeio, associada por Gasparini à “lalíngua” de Lacan, assomam gestos de resistência aos processos de homogeneização da língua oficial e apagamento do subalterno enquanto sujeito político.

Desdobrando ainda a discussão a respeito dos impactos da imigração italiana no contexto portenho, o Capítulo 4 centra-se na obra de Antonio Porchia, imigrante calabrês, anarquista e cristão radicado na Argentina, cujos aforismos se pautam não no translinguismo, mas num uso extremamente depurado do espanhol. Contudo, a escrita de Porchia promove torções da norma culta, por dentro da própria norma, produzidas por hipercorreção. Essa busca do apuro gramatical que o faz corrigir e recorrigir, até atingir uma possível “perfeição”, carrega consigo uma pulsão de agramaticalidade no modo como maneja a sintaxe do idioma. Gasparini aproxima Porchia a Borges, mostrando como o texto porchiano traz à tona uma atitude do estrangeiro que se arroga o direito a toda tradição. Entretanto, aponta argutamente também a maneira como a relação deslocalizada de Porchia com a língua fora sancionada pelo grupo da revista Sur, que em determinada ocasião o (re)coloca no lugar do “imigrante” que deve corrigir e “adequar” seu texto.

Se por um lado a depuração idiomática parece impelir a uma análise que enfatiza a estrangeiridade de uma autoria, no Capítulo 5 Gasparini nega-se a replicar uma leitura de Gombrowicz sob a ótica do exílio ou da imigração, chave interpretativa que permanece filiada a uma perspectiva nacionalista. Requer, ao contrário disso, uma discussão sobre o desapego gombrowicziano do discurso nacional e sua dessacralização do uso da língua polonesa. Tal contraposição a uma identidade linguístico-nacional fixa associa-se em Gombrowicz a um movimento de rejuvenescimento e liberação homossexual na Argentina, concomitante ao advento do homoerotismo marginal em meio à classe operária peronista. Isso reafirma um processo de reinvenção da subjetividade, e da língua(gem), pelo fora, pelo extraterritorial, critério esse que faz o pesquisador relacionar Gombrowicz aos autores argentinos estudados. Também seria possível considerar, levando em conta a trajetória de Gasparini, que sua reflexão na verdade empreende uma inversão, relacionando os autores argentinos que o interessam ao que já vinha discutindo a partir de Gombrowicz desde seu doutorado.

Já o Capítulo 6, bem mais extenso do que os demais, centrado na escrita em francês de Copi, parte de uma atenção ao significante “desmadre” - vocábulo do espanhol que significa “desmesura”, utilizado como ponto de partida etimológico para a elaboração de um possível conceito capaz de visibilizar a metonímia que aproxima os gestos de desfiliação da língua materna e de desconstrução das diversas normatividades e índices identitários. As práticas translíngues que entrecruzam na textualidade de Copi línguas primeiras e segundas trazem à baila discursividades migrantes, performances antinormativas de gênero, dicção alunfardada, aproximação entre tango e homoerotismo. Percebe-se, nesse capítulo, um grande investimento analítico de Gasparini no sentido de comprovar uma hipótese central de sua argumentação: a de que há uma forte relação entre imigração e cultura popular na Argentina, e sobretudo nas dicções não cooptadas pelas elites intelectuais do país, o legado heteróclito dessa estética portuária produz gestos de afastamento ou dissidência em relação ao espanhol argentino e aos padrões hegemônicos de nacionalidade, gênero e sexualidade

Não à toa, o Capítulo 7 dá continuidade a esse movimento analítico que associa o problema da língua ao problema de gênero, tratando de dar visibilidade crítica ao modo como a literatura moderna e contemporânea é atravessada por pulsões antinormativas que desafiam a Lei do Outro (inscrita na língua e no gênero). Para isso, examina-se aí a apropriação poética do portunhol na escrita de Néstor Perlongher. No intuito de desfazer qualquer possibilidade de vinculação determinista entre a dicção aportunholada de Perlongher e sua condição de imigrante em São Paulo, Gasparini esmera-se em comprovar, por meio da análise de cartas escritas em português pelo antropólogo e poeta portenho, seu pleno “domínio” (ainda que essa seja uma ideia linguisticamente questionável) da distinção estrutural entre as línguas portuguesa e espanhola. A partir disso, explora a ideia de “resbale” (resvalo) entre vocábulos, fonemas e grafias do português e do espanhol como estratégia intencional de erotização do campo social, por meio da imbricação entre trágico e sexual, sagrado e profano, gozo e sofrimento. A própria importância do corpo e do erotismo nessa poesia parece motivar contínuos atravessamentos entre oralidade e escrita que levam Gasparini a lançar mão de noções como prosódia, timbre e voz, ao abordar os resvalos linguísticos do texto perlongheriano - impulsionador de dicções translíngues/transnacionais sul-americanas atuais, como o portunhol selvagem, por exemplo.

No Capítulo 8 sobre Wilcock, parte-se da questão do exílio e do plurilinguismo enquanto dados biográficos do escritor nascido na Argentina, filho de imigrantes, que publicou parte significativa de sua obra em italiano, a fim de se assinalar o peso do ideário clássico e da construção verbal que restringe a ambiguidade, calcada numa assepsia monolíngue, como procedimentos que criam o efeito de anacronismo. Ao refletir sobre o movimento abismal de escavação arquifilológica da língua, que faz Wilcock perseguir elos perdidos entre o etrusco, o latim, o toscano e o italiano, Gasparini afirma que a maior aposta desse escritor está “en decir las impurezas de todo origen en una lengua pura, atenida al paradigma clásico” (GASPARINI, 2021GASPARINI, Pablo. Puertos: Diccionarios. Literaturas y alteridad lingüística desde la pampa. Rosario: Beatriz Viterbo Editora, 2021., p. 211). Desse modo, a escrita de Wilcock em língua italiana desvela efeitos da política linguística de repressão ao uso de dialetos na Itália, demonstrando a natureza estrangeira do standard linguístico disseminado pelos agenciamentos glotopolítico-midiáticos. É interessante notar nesse capítulo ainda a dimensão do trabalho de pesquisa de Gasparini sobre sociolinguística do italiano. Aliás, vale assinalar que, em quase todo o livro, o pesquisador utiliza muitas notas de rodapé que expandem de modo rizomático o texto, propiciando um denso mergulho crítico no universo de cada autor e de suas relações com diferentes línguas/culturas, de tal modo que torna a leitura de cada capítulo um desafio de readaptação ao leitor, inscrevendo a própria leitura num ambiente de significação heteroglóssico.

O Capítulo 9 é paradigmático desse modo de ler, bastante conectado, inclusive, à forte inclinação do campo intelectual argentino ao cosmopolitismo e ao poliglotismo. Nesse capítulo analisa-se a obra de Héctor Bianciotti, escritor argentino naturalizado francês, em cujos textos parece haver a tentativa de recuperação de uma linguagem adâmica por meio de uma relação fetichista e monumentalizada com a língua francesa. Ao longo de seu desenvolvimento, Gasparini chama atenção para a sonoridade e a forma de apropriação do francês na escrita de Bianciotti. Por conta disso, parece optar por não traduzir os excertos em francês, embora citações em outras línguas que não o espanhol sejam quase sempre traduzidas ao longo da obra. A falta dessa tradução obriga o leitor a adentrar a materialidade do francês de Bianciotti - uma língua estrangeira que esse escritor se empenha em transformar em íntima - e, ao mesmo tempo, parece representar uma espécie de “ato falho” que sinaliza certa francofilia do campo acadêmico humanista latino-americano, no qual a “escuta” desse idioma é historicamente “íntima” para os interlocutores. Tal procedimento realça ainda mais a hipótese crítica de que a extraterritorialidade e o afrancesamento de Bianciotti corresponderiam a uma vontade intelectual de pertencer à cultura hegemônica.

Já no Capítulo 10, analisa-se, na obra de Juan Gelman, uma interface entre o idioma sefardi e um registro do castelhano que dialoga com a retórica dos místicos espanhóis. Demonstra-se nesse poeta um movimento de busca por substratos da língua e uma tentativa de afirmação subjetiva perante a experiência de exílio - o que é associado às noções de “habitar na apatridade” e de bodenlos (que significa, literalmente, “sem chão”) em Flusser (2007FLUSSER, Vilém. Bodenlos: uma autobiografia filosófica. Trad. Gustavo Bernardo. São Paulo: Annablume, 2007.). A poesia para Gelman seria assim uma forma de escavar a proto-história da língua por “calcinação”. No entanto, embora tal perspectiva pareça incidir numa espécie de chave essencialista, é importante notar como Gasparini relaciona tal ideia de calcinação ao conceito de “língua pura” em Benjamin (2011BENJAMIN, Walter. A tarefa do tradutor. In: BENJAMIN, Walter. Escritos sobre mito e linguagem. Trad. Susana Kampff Lages e Ernani Chaves. São Paulo: Editora 34, 2011. p. 101-119. ), mobilizando a tradução como busca desse impossível da língua(gem) por meio do encontro entre diferentes línguas. Desse modo, Gelman posiciona o leitor como um tradutor, isto é, como um sujeito-entre-línguas. Tal relação calcinante com o passado, e com o substrato, ou seja, com a ruína, com aquilo que continua passando e atravessando o presente, constitui uma forma sobrevivência, associada à tragédia pessoal de Gelman, que teve seu filho sequestrado e assassinado durante a Ditadura Militar argentina.1 1 É interessante notar também que a leitura do texto em língua sefardi em Gelman remete o leitor brasileiro à experiência de leitura de textos em galego ou de textos em portunhol, como os de Wilson Bueno, Fabián Severo e Douglas Diegues.

Aprofundando ainda mais a reflexão a respeito da operação tradutória neste debate sobre literatura e alteridade linguística, o Capítulo 11 é dedicado à tradução argentina, feita por Leopoldo Brizuela em La casa de los conejos (2008), de Laura Alcoba, romance originalmente escrito em francês. O Leitmotiv da análise, como em outros capítulos do livro, parte do olhar sensível ao uso de determinada palavra que indicie alguma estranheza ou peculiaridade na relação com a(s) língua(s). Isso ocorre em Alcoba, filha de montoneros, que traz para seu texto em francês o termo “embute”, utilizado no jargão da militância montonera na Argentina para nomear formas de disfarce ou estratégias para dissuadir/manobrar a vigilância policial. A tradução de Brizuela abre, por meio de um castelhano alternativo, uma possibilidade de superação do trauma que teria levado Alcoba a abandonar o idioma materno. Nesse sentido, a tradução funciona como um “desembute”, isto é, algo que trai/subverte o “embute” do original, numa espécie de suplemento - debate este que remete também, a meu ver, à discussão sobre o “entre-lugar” (SANTIAGO, 2000SANTIAGO, Silviano. O entre-lugar do discurso latino-americano. In: SANTIAGO, Silviano. Uma literatura nos trópicos. Rio de Janeiro: Rocco, 2000. p. 9-26.).

No Capítulo 12, o último do livro, Gasparini parte da passagem bíblica a respeito do shibboleth para refletir sobre a não percepção do próprio sotaque (em geral só escutado pelo outro) como metáfora da tensão entre sujeito, língua(gem) e alteridade. A partir disso, analisa o livro Vivir entre lenguas (2016), de Sylvia Molloy, mostrando como nele a escritora e crítica argentina radicada nos Estados Unidos, descendente de imigrantes de origem anglófona e francófona, parece querer estabelecer um “ethos acusmático”, capaz de perscrutar a alteridade que atravessa o “eu”, ouvindo-se a si mesma. Isso implica, para Gasparini, uma busca por livrar-se da sujeição aos mitos de origem, reelaborando os restos da memória. Nesse sentido, o pesquisador explora a apropriação autobiográfica do “romance familiar” na obra de Molloy, discutindo suas impressões a respeito das coerções e interdições em relação ao translinguismo, e, ao mesmo tempo, o olhar atento da autora aos espaços de potência e sobrevivência que a alternância de idiomas pode propiciar, como se a própria escrita fosse testemunha não de uma subjetividade plena e fixada em padrões identitários, mas de um sujeito que se constitui fragmentariamente no trânsito entre as línguas.

Para finalizar, gostaria ainda de ressaltar que nas considerações finais desse livro - o qual sem dúvida traz inúmeras contribuições ao campo de estudos sobre literatura e práticas translíngues - Gasparini aciona a noção linguística de isoglossa: linha divisória que serve para demarcar fronteiras linguísticas. É interessante notar o tensionamento glotopolítico que a solicitação desse conceito aponta, visto que os próprios fenômenos de migração, mobilidade planetária, cosmopolitismo, poliglotismo e translinguismo - centrais nas análises sobre a extraterritorialidade da escrita literária - constituem formas de deslocamento (e/ou esquiva) das fronteiras geodialetais. Nessa parte final, o pesquisador também reforça e esclarece sua elaboração conceitual em torno das noções de “portos” e “dicionários”, mostrando que elas não devem ser vistas como uma dicotomia, mas como uma tensão inerente a este “posible mapa glotopolítico de la literatura” (GASPARINI, 2021GASPARINI, Pablo. Puertos: Diccionarios. Literaturas y alteridad lingüística desde la pampa. Rosario: Beatriz Viterbo Editora, 2021., p. 313). Essa tensão e esse atravessamento recíproco, emblematizados pelos dois-pontos que interligam os termos (“portos: dicionários”), ganham diferentes matizes ao longo da obra, interpelando disputas entre ideologia do monolinguismo e práticas translíngues, entre legitimação da língua oficial e processos de contato ou crioulização. Enquanto o “portuário” metaforiza uma paisagem linguístico-cultural que discrepa em relação à construção imaginária de uma origem popular pretensamente homogênea, o “dicionário”, ao simbolizar certo fetiche elitista quanto às línguas estrangeiras, constitui também sintoma do processo de desterritorialização, caracterizado simultaneamente pela imposição e pelo desejo da alteridade linguística, ainda que ancorada em dicionários bi/multilíngues.

Ao tentar dar um fechamento possível ao caráter inexoravelmente em aberto da reflexão, Gasparini reforça sua perspectiva crítica em relação ao modo como esse campo literário configura sua relação - muitas vezes coercitiva - com a heterogeneidade constitutiva do “idioma dos argentinos”, indiciando assim o traço classista que pode ter determinado o impulso cosmopolita e poliglota como gestos de barreira, seja em relação à dimensão “exofônica” (PERLOFF, 2013PERLOFF, Marjorie. O gênio não original: poesia por outros meios no novo século. Trad. Adriano Scandolara. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2013.) - mais interna, interdiscursiva e não-marcada -, seja no que tange à dimensão “macarrônica” - mais externa, intradiscursiva e marcada na tessitura enunciativa -, ambas as quais ressoam incomodamente na ordem do discurso nacional.

Referências

  • BENJAMIN, Walter. A tarefa do tradutor. In: BENJAMIN, Walter. Escritos sobre mito e linguagem Trad. Susana Kampff Lages e Ernani Chaves. São Paulo: Editora 34, 2011. p. 101-119.
  • FLUSSER, Vilém. Bodenlos: uma autobiografia filosófica. Trad. Gustavo Bernardo. São Paulo: Annablume, 2007.
  • GASPARINI, Pablo. Puertos: Diccionarios. Literaturas y alteridad lingüística desde la pampa. Rosario: Beatriz Viterbo Editora, 2021.
  • PERLOFF, Marjorie. O gênio não original: poesia por outros meios no novo século. Trad. Adriano Scandolara. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2013.
  • SANTIAGO, Silviano. O entre-lugar do discurso latino-americano. In: SANTIAGO, Silviano. Uma literatura nos trópicos Rio de Janeiro: Rocco, 2000. p. 9-26.
  • STEINER, George. Extraterritorial: a literatura e a revolução da linguagem. Trad. Julio Castañon Guimarães. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
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    É interessante notar também que a leitura do texto em língua sefardi em Gelman remete o leitor brasileiro à experiência de leitura de textos em galego ou de textos em portunhol, como os de Wilson Bueno, Fabián Severo e Douglas Diegues.
  • Parecer Final dos Editores

    Ana Maria Lisboa de Mello, Elena Cristina Palmero González, Rafael Gutiérrez Giraldo e Rodrigo Labriola, aprovamos a versão final deste texto para sua publicação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    15 Maio 2022
  • Aceito
    30 Jun 2022
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