Open-access Museus de Cabo Verde: continuidade e inovação

Resumos

O cenário da museologia cabo-verdiana tem-se vindo a desenvolver ao longo de pouco mais de três décadas, pelo que comporta ainda aspectos que se deverão considerar como em vias de definição. A independência, proclamada em julho de 1975, perfila-se assim como um marco determinante do horizonte cronológico a analisar. As referências aos antecedentes setecentistas, oitocentistas e mesmo novecentistas que se procurarão explicitar, assumem particular importância, num contexto histórico que ultrapassa a realidade do território, o que confere a esses elementos um interesse acrescido. Será portanto relativamente ao período mais recente que são detectáveis os vectores de evolução que se afiguram mais significativos. O comentário a apresentar será desenvolvido nessa linha, sendo focadas a par algumas questões relevantes para um melhor esclarecimento do assunto tratado que se julgam merecedoras de comentário.

Cabo Verde; Museologia; Museu nacional; Sítios históricos; Jardim botânico; Museus regionais


The scenario of Cape Verdean museology has been developing over slightly more than three decades so that stills encompasses aspects that should be considered as a process of definition. The independence in July 1975 emerges as a milestone determining the timespan being analyzed here. References to eighteenth-century, nineteenth century and even nineteenth-century history that we seek to explain, hold particular importance in a historical context that goes beyond the reality of the territory, which adds interest to these elements. Therefore, it is rather in the most recent period that vectors of evolution are perceived as most significant. Our comments will follow that line, focusing on some questions relevant to a better understanding of the subject matter which are deemed worthy.

Cape Verde; Museology; National Museum; Historical sites; Botanical Gardens; Regional Museums


DOSSIÊ - TENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS DE REFLEXÃO SOBRE MUSEUS E MUSEOLOGIA

Museus de Cabo Verde – continuidade e inovação

Henrique Coutinho Gouveia

Investigador do CEHFCi da Universidade de Évora e Docente convidado da Universidade de Cabo Verde. E-mail: <henriquecgouveia@gmail.com>

RESUMO

O cenário da museologia cabo-verdiana tem-se vindo a desenvolver ao longo de pouco mais de três décadas, pelo que comporta ainda aspectos que se deverão considerar como em vias de definição. A independência, proclamada em julho de 1975, perfila-se assim como um marco determinante do horizonte cronológico a analisar. As referências aos antecedentes setecentistas, oitocentistas e mesmo novecentistas que se procurarão explicitar, assumem particular importância, num contexto histórico que ultrapassa a realidade do território, o que confere a esses elementos um interesse acrescido. Será portanto relativamente ao período mais recente que são detectáveis os vectores de evolução que se afiguram mais significativos. O comentário a apresentar será desenvolvido nessa linha, sendo focadas a par algumas questões relevantes para um melhor esclarecimento do assunto tratado que se julgam merecedoras de comentário.

Palavras-chave: Cabo Verde. Museologia. Museu nacional. Sítios históricos. Jardim botânico. Museus regionais.

ABSTRACT

The scenario of Cape Verdean museology has been developing over slightly more than three decades so that stills encompasses aspects that should be considered as a process of definition. The independence in July 1975 emerges as a milestone determining the timespan being analyzed here. References to eighteenth-century, nineteenth century and even nineteenth-century history that we seek to explain, hold particular importance in a historical context that goes beyond the reality of the territory, which adds interest to these elements. Therefore, it is rather in the most recent period that vectors of evolution are perceived as most significant. Our comments will follow that line, focusing on some questions relevant to a better understanding of the subject matter which are deemed worthy.

Key words: Cape Verde. Museology. National Museum. Historical sites. Botanical Gardens. Regional Museums.

Os primórdios setecentistas do panorama museológico de Cabo Verde são comparáveis na generalidade aos dos restantes territórios ultramarinos portugueses, diferindo apenas nalgumas peculiaridades. Registar-se-ia na época o que se poderá qualificar como um protagonismo brasileiro, parecendo de sublinhar todavia que o esforço desenvolvido em Cabo Verde daria origem a movimentações com uma importância equiparável à daquelas que seriam resultantes das explorações científicas, levadas acabo nos contextos angolano e moçambicano1. A bibliografia publicada, relativamente aos trabalhos do naturalista João da Silva Feijó, permite já uma avaliação fundamentada acerca da expedição por que seria responsável e que constitui a iniciativa dominante nessa época2.

Tal como sucederia nos restantes territórios, que integravam na altura o espaço ultramarino português, o trabalho de museu então efectuado seria prosseguido em função de um centralismo metropolitano, não tendo despontado na altura iniciativas museológicas prenunciando uma autonomia local3.

O aprofundamento da realidade oitocentista, devido a pesquisas recentes, tem proporcionado uma visão mais esclarecida desse século, que deverá ser tido como um período de arranque da museologia cabo-verdiana. A apreciação comparativa passará todavia a restringir-se aos territórios ultramarinos africanos, uma vez que ocorrera entretanto a proclamação da independência brasileira.

A orientação visando subordinar o trabalho de pesquisa desenvolvido aos interesses dos museus metropolitanos continuava a ser prosseguida, posto que começassem a esboçar-se vias tendentes a uma autonomização local. As movimentações surgidas nesse sentido, operar-se-iam na segunda metade do século, posto que se possa constatar que se estava perante projectos sem expressão aplicada ou em que o grau de concretização era incipiente4.

Nesse quadro de situação viria contudo a ocorrer em Cabo Verde um facto assinalável, visto ter surgido aí um estabelecimento que acabaria por se manter em funcionamento por um período dilatado. Refere-se aqui a Biblioteca e Museu Nacionais, uma iniciativa dos começos dos anos setenta, em que a componente museológica, posto que oscilante, viria a subsistir por quase uma vintena de anos. Os esforços visando a implementação de uma museologia local manifestar-se-iam também através da criação de museus escolares, acompanhando o processo de desenvolvimento do ensino. Estar-se-ia portanto perante tentativas de diversificação da realidade do território com alguma continuidade5

No século XX, mas anteriormente à proclamação da independência, Cabo Verde viria a ser de novo palco de projectos museológicos, sem consolidação, desencadeados nos anos sessenta. Tais projectos seriam recuperados no decurso do período a analisar, pelo que virão a ser objecto de apreciações complementares6.

A evocação histórica, a que se acaba de proceder, permite esboçar uma contextualização do panorama museológico de Cabo Verde, no seio da evolução operada na realidade ultramarina portuguesa, aspecto que se julga de interesse para a explanação que se pretende traçar. Derivam daí distâncias e proximidades, a que importará atender, sendo de salientar a ausência de estabelecimentos museológicos consolidados quando da proclamação da independência. Verifica-se portanto um contraste relativamente aos restantes territórios africanos até então sob soberania portuguesa7.

Importará justificar agora a proposta de condução da análise, no tocante ao período posterior à independência, na dupla perspectiva da inovação e da continuidade, tal como se encontra anunciado em título.

A esse propósito, julga-se de sublinhar que têm avultado em Cabo Verde iniciativas no domínio museológico que se restringem a manifestações de intenção, acrescendo aquelas que não ultrapassaram ainda uma fase de concretização diminuta. Poder-se-á também constatar que uma parte dos estabelecimentos existentes se encontra por enquanto num estádio de percurso ou carece de melhorias, apontadas de há muito, mas que não puderam beneficiar até à data de adequadas condições de concretização.

Tendo em conta os dois tópicos agora referidos, julga-se de adiantar que os primeiros museus criados em Cabo Verde revestem características que deverão ser sublinhadas.

Com efeito, em finais dos anos oitenta seria aí inaugurado um Jardim Botânico, juntando-se-lhe, em meados da década seguinte, dois novos estabelecimentos – o Museu de Documentos Especiais e o Museu dos Correios e Telecomunicações8. Estava-se assim perante um primeiro museu, cujo acervo era constituído essencialmente por espécimes botânicos vivos, tendo-se-lhe seguido um segundo, em que as colecções provinham do Arquivo Nacional e um terceiro inserido no domínio tecnológico, mas com tutela empresarial9.

Atendendo a que o enquadramento previsto para a gestão de museus tinha sido instituído havia mais de uma década, tanto no plano governativo como a nível da administração, parece de sublinhar o facto de os estabelecimentos de arranque da museologia cabo-verdiana terem surgido à margem desse contexto10.

No intuito de complementar esta visão preliminar importará mencionar um outro projecto, que é o da reconversão museológica do Campo prisional da Chão Bom, sendo essa uma realização que se deverá reportar também aos anos oitenta. Introduziu-se desse modo no país uma categoria museológica inovadora, que seria a dos museus de sítio, o que constitui um elemento a reter tendo em vista a caracterização do panorama cabo-verdiano da especialidade11.

Parece de destacar no entanto que já se procurava avançar então com um projecto, tido como latente no contexto museológico do país, que é o da organização de um museu nacional.

Perfilava-se desse modo o que se poderá considerar como uma via fulcral de afirmação da museologia cabo-verdiana, sendo esse um aspecto a salientar na análise em curso. Uma primeira valência a integrar nesse projecto seria a etnográfica, pelo que foram prosseguidos trabalhos de campo nalgumas ilhas do arquipélago, tendo daí resultado um acervo com apreciável dimensão12.

Importará referir que se considerava admissível, logo nessa fase preliminar, que o projecto gizado viesse a comportar outras valências nomeadamente a da arte13. A arte seria aliás um domínio que se procuraria projectar, desde cedo, no contexto museológico do país, tendo sido avançadas nesse sentido diversas propostas, comportando inclusive uma tendência descentralizadora14.

O acervo etnográfico reunido na altura viria a ser depois aproveitado para que fosse organizado na Praia, em 1997, um Museu da especialidade, operando-se dessa forma uma inflexão na orientação traçada. Gerar-se-ia assim o que se poderá qualificar como uma via museológica de carácter disciplinar, extensiva depois ao domínio da arqueologia e mesmo ao da história. Tais realizações viriam a constituir o vector de desenvolvimento mais expressivo do actual panorama cabo-verdiano, pois existem hoje na capital um Museu Etnográfico e um Museu de Arqueologia que podem ser tidos como pilares da realidade museológica do país.

A linha de rumo que parecia desenhar-se, no projecto de criação do museu nacional mencionado, conjugava a etnografia com a arqueologia e a história15. Julga-se de reter o critério previsto para a composição desse acervo, pois proporciona uma achega quanto à orientação a imprimir à museologia cabo-verdiana que se afigura oportuno comentar. Com efeito, a informação conhecida permite concluir que a missão do museu a criar seria a de documentar e promover a identidade cultural cabo-verdiana, mediante o processamento de testemunhos relativos aos três domínios científicos mencionados.

Estar-se-ia, desse modo, perante um modelo de conjugação disciplinar frequente em museus comparáveis existentes noutros contextos entre os quais o português16.

Importará procurar contudo uma explicação para a ausência nesse projecto de elementos culturais, com manifesta expressão na identidade cabo-verdiana, tais como a música, a literatura, a língua ou mesmo a gastronomia. Estar-se-ia dessa forma perante um leque temático em que a selecção não pressupunha um critério de base disciplinar.

Para isso julga-se conveniente evocar a evolução operada, no plano internacional, conducente a uma progressiva diversificação do panorama museológico, pelo que adviria daí a criação de museus contemplando qualquer um dos quatro domínios mencionados.

A concretização desses estabelecimentos exigia no entanto o concurso de testemunhos decorrentes da materialização de ideias, sendo produzidos por conseguinte em função de necessidades de documentação.

Será de admitir que a transposição desses avanços para a realidade cabo-verdiana pudesse ser dificultada pelo facto de a acepção aí vigente de um museu central, ser orientada por uma visão menos ousada17.

Parece assim de constatar que se poderão contrapor, na orientação a imprimir à programação de um museu nacional, concepções marcadas por preocupações de modernização ou obedecendo, pelo contrário, a modelos mais usuais. Residirá aqui por certo um dos aspectos da contraposição entre inovação e continuidade, apontada como factor de caracterização do panorama museológico cabo-verdiano. Entende-se, por conseguinte, que o projecto de um museu central pluridisciplinar e a posterior concretização de museus unidisciplinares, com idêntico estatuto, podem ser tidos como elementos de continuidade no contexto museológico cabo-verdiano.

A fim de se procurar esclarecer melhor esta posição, serão de ter em conta não só o panorama português, em que essa orientação era dominante para os museus nacionais, mas também as realidades dos países lusófonos. Acresce que se estava face a um modelo que já havia sido ensaiado, a nível local, no período oitocentista, conforme foi anteriormente focado.

No caso português os museus nacionais seriam de base disciplinar, até meados dos anos setenta do século passado, altura em que se começariam a desenhar novas movimentações. Mas seria só na década imediata que se iriam criar, com idêntico estatuto, os primeiros museus temáticos18.

Muito embora com diferenças de escala, serão detectáveis características similares no panorama angolano, moçambicano, guineense e sãotomense19. De adiantar contudo que não parecem detectáveis, em qualquer desses quatro países lusófonos, correntes museológicas de índole inovadora com uma expressão consistente. Adoptando-se aqui uma posição comparativa com a realidade cabo-verdiana, dir-se-á que a via de inovação, no âmbito das realidades museológicas angolana e moçambicana se tinha traduzido principalmente na criação de parques nacionais20.

O território arquipelágico e a diversidade cultural patentes em Cabo Verde explicam a emergência, em paralelo com as preocupações apontadas, de vectores tendentes à implementação de museus de carácter regional. A composição do território e a evolução cultural daí decorrente permitem explicar uma dinâmica que parece afirmar-se igualmente nos países lusófonos de maior dimensão21.

Tal como sucede no plano nacional, depara-se a esse nível sobretudo com projectos de intenção ou apenas com um diminuto grau de organização, em que se pretendem documentar as particularidades culturais existentes nas diversas ilhas. Uma vasta gama de propostas contrasta assim com uma percentagem de concretizações mínima. Um levantamento dos projectos até agora avançados permite constatar que predominam aí os museus temáticos, configurando-se assim à escala regional uma orientação susceptível de articulação com aquela que foi traçada no plano nacional. Com base nas considerações agora formuladas poder-se-á depreender que a posição assumida era a de se vir a promover um critério disciplinar nos museus de carácter nacional e um critério temático para a museologia regional.

É igualmente detectável o empenho da administração central na promoção dessas iniciativas, parecendo previsível que se venha a intensificar o papel assumido pelos municípios, visto que este reveste por enquanto carácter pontual. De acrescentar que se verifica uma situação idêntica no campo da iniciativa privada22.

Numa perspectiva de descentralização territorial poderá ser igualmente explorado o confronto entre as cidades do Mindelo e da Praia, situadas em S. Vicente e Santiago, que tem vindo a gerar expectativas de instalação na primeira de um projecto museológico de grande envergadura23. De citar ainda as propostas de reconversão museológica de valores patrimoniais, com projecção nacional e mesmo internacional, localizados noutras ilhas24.

As preocupações relativas ao panorama museológico cabo-verdiano, até agora assinaladas, orientam-se para a salvaguarda de valores patrimoniais, que são produto da vivência humana no território, tendo revestido carácter disciplinar e uma amplitude tanto nacional como regional. As manifestações inovadoras não se tornam por isso expressivas em qualquer dos dois planos focados, não tendo chegado sequer a ser equacionadas as possibilidades que pareciam oferecer-se nessa linha no tocante ao projecto de um museu nacional.

Por contraposição, importará referir agora os casos dos museus em que o processamento dos acervos se torna compatível com a sua manutenção in loco. Conforme foi dito, os museus de sítio prefiguram-se como uma componente inovadora do panorama tipológico cabo-verdiano, posto que se esteja por agora face a uma iniciativa isolada.

Os sítios históricos revestem contudo uma importância acentuada em Cabo Verde, muito especialmente no contexto urbano, pelo que as potencialidades museológicas inerentes se perfilam como uma via a explorar. Nessa perspectiva será de mencionar o sítio da Cidade Velha, classificado como património da humanidade em 2010, sendo esse um projecto emblemático e prioritário da política patrimonial e museológica cabo-verdiana. A menção a esse sítio histórico permite formular uma achega confirmando a necessidade de enriquecimento do leque tipológico a que se tem vindo a recorrer na condução da política patrimonial do país. Com efeito, torna-se aí patente a ausência de uma base conceptual que permita conferir ao programa global a executar o enquadramento teórico que se torna indispensável25.

De adicionar aqui os centros históricos, tidos como uma realidade prioritária da política patrimonial cabo-verdiana, em que a condução das intervenções a empreender suscita interrogações, visto que se encontram por definir os critérios que deverão presidir aos programas de valorização a empreender.

Em termos afins será de atentar na reconversão museológica de casas históricas, uma vez que os testemunhos determinantes são aí processados in loco, tal como sucede nos museus de sítio26.

Crê-se que será de ter ainda em linha de conta o facto de se estar perante uma temática que tem vindo a ser objecto de atenção em Cabo Verde, dada a projecção nacional dos testemunhos que motivaram os projectos entretanto desencadeados27. As potencialidades oferecidas pela reconversão de sítios e de casas históricas, no contexto da política patrimonial cabo-verdiana, prefiguram-se assim como uma via de inovação a aprofundar, visto ser susceptível de contribuir para o enriquecimento da oferta museológica local que carece de uma maior ampliação.

A análise das perspectivas de inovação, patentes na museologia cabo-verdiana, deverá ser extensiva a um outro tema que é o dos centros interpretativos, pois estes começam já a marcar presença no panorama do país. A ligação com os sítios históricos é aqui manifesta, podendo estar-se no entanto perante realidades com diferentes características. Uma referência a dois tipos de situações, qualquer uma delas presente a nível local, permite comentar alguns problemas que a questão suscita.

Sucede que foram criados, em Cabo Verde, centros de interpretação em Chão Bom e na Cidade Velha, constituindo o primeiro uma componente do museu de sítio aí existente28. O segundo prefigura-se como um elemento de iniciação da visita ao sítio, tendo sido integrado no programa de recuperação e valorização que vem sendo prosseguido. De sublinhar que nenhum desses centros se articula com uma interpretação in loco, implementada através da organização de itinerários para visitantes29.

Caso sejam componentes de museus, os centros interpretativos inserem-se na estrutura própria desse tipo de estabelecimentos, processando-se a sua gestão nesse âmbito. Em situações como aquela que se verifica na Cidade Velha, em que o enquadramento é mais lato, torna-se necessário proporcionar uma resposta igualmente eficaz, às exigências de funcionamento e de manutenção do centro aí criado30.

Os centros históricos, cuja importância no seio da realidade patrimonial cabo-verdiana foi já focada, constituem um outro cenário em que o recurso aos centros interpretativos se afigura oportuno31.

A apreciação sumária de concepções como as de museus de sítio e de casas históricas ou de centros interpretativos, a que se procedeu, permite confirmar a importância que reveste a exploração do aparato conceptual indispensável para que se possa modernizar a política patrimonial e museológica em construção. Em causa encontra-se a necessidade de diversificação e de ampliação da tipologia museológica presente no país.

A natureza e características do património que tem vindo a ser objecto de intervenção em Cabo Verde, permitem introduzir uma nova perspectiva de abordagem na linha de orientação que se tem procurado seguir. Essa perspectiva centra-se no património biológico, a que se devem associar os valores paisagísticos e ecossistémicos, que se configuram actualmente como uma realidade com uma presença assinalável no contexto museológico local. Prefiguram-se aí características de inovação que deverão ser tidas como motores de transformação de um panorama em crescimento.

Na linha apontada, foi já referida a criação de um Jardim Botânico, em finais dos anos oitenta, uma das iniciativas pioneiras da museologia cabo-verdiana.

Nos começos da década seguinte, emerge um novo tipo de estabelecimentos – os parques naturais – particularmente adaptados ao contexto patrimonial do país e às suas necessidades, pelo que as iniciativas promovidas nesse âmbito vieram a adquirir uma posição de relevo. Serão de focar ainda as repercussões da promoção do património biológico e ambiental no domínio educativo, sendo esse um vector de análise de capital importância na orientação a imprimir à política patrimonial e museológica cabo-verdiana.

Já foi dito que os parques naturais introduziram em Cabo Verde um modelo de intervenção museológica particularmente adequado à realidade do país. O território encontra-se profundamente humanizado, o que justifica a presença de um tipo de estabelecimento que visa salvaguardar a biodiversidade, compatibilizando esse objectivo com as vivências das populações residentes. Daí que estas se devam tornar parceiras dos projectos desencadeados. A concepção de parque natural tinha surgido em contextos europeus similares, nos princípios do século passado, pelo que a sua introdução em Cabo Verde permite tirar proveito das suas diversas potencialidades.

Neste contexto será de começar por salientar o papel desempenhado na conservação do património biológico, pois as acções desenvolvidas contribuem, de modo efectivo, para a salvaguarda de espécies em risco de extinção e para a valorização e subsistência de recursos com acentuado interesse para o desenvolvimento rural. Os parques naturais prefiguram-se igualmente como um instrumento de educação das populações aí residentes ou periféricas, incutindo comportamentos e práticas essenciais para um bom relacionamento com o meio ambiente.

A política cabo-verdiana, no domínio do património paisagístico e ambiental, teria como sustentáculo legislação especializada promulgada em princípios do século actual32. Essa legislação define a tipologia das áreas protegidas susceptível de aplicação prática, introduzindo-se dessa forma um factor susceptível de proporcionar aos parques naturais um enquadramento coerente e fundamentado no contexto patrimonial cabo-verdiano33. Está-se aí perante uma base que permite superar as fragilidades derivadas da ausência de legislação patentes noutros sectores do panorama museológico do país34.

Seria a partir dessa base que viriam a ser criados os primeiros parques, localizados nas ilhas do Fogo, de Santiago, de São Nicolau e de São Vicente, pretendendo-se dar continuidade a essa intervenção mediante a organização de novos parques em Santo Antão, Maio, Sal e Boavista. A política posta em prática adquire hoje expressão à escala nacional, havendo ilhas onde passará a existir mais do que um parque35.

O comentário ao papel desempenhado pelos parques naturais, no desenvolvimento de Cabo Verde, terá de se projectar necessariamente no domínio do turismo, cuja promoção constitui hoje em dia um objectivo em que o país se encontra profundamente empenhado.

O relacionamento com os visitantes constitui, nessa perspectiva, um factor relevante da actuação prosseguida e daí as preocupações manifestadas nesse sentido pelos responsáveis por estes estabelecimentos. A interpretação, concretizada sobretudo através de módulos introdutórios, de centros de interpretação e de itinerários de visita, conjuga-se com a implementação de estratégias comerciais, compreendendo serviços de vendas e de restauração. Os propósitos educativos patenteiam-se nas actividades desenvolvidas, nomeadamente nas políticas editoriais.

Encontra-se portanto cometida hoje em dia aos parques naturais de Cabo Verde a prossecução de objectivos múltiplos, incidindo na valorização do património ambiental, no desenvolvimento sustentado e na educação. Estar-se-á assim em presença de um instrumento fundamental da política patrimonial e museológica em curso.

São constatáveis presentemente em Cabo Verde expectativas muito acentuadas quanto à importância do património como factor de progresso do país, pelo que importará tecer algumas considerações relativamente à situação dos estabelecimentos museológicos nesse contexto e aos desempenhos que lhes poderão ser atribuíveis.

O propósito de promoção do turismo, no âmbito da museologia, manifestar-se-ia em Cabo Verde em simultâneo com algumas das primeiras iniciativas desencadeadas nesse domínio. O projecto de referência seria a construção, no Mindelo, de um oceanário da autoria de um arquitecto de grande prestígio36. Procurava-se explorar dessa forma uma via em evidência no contexto internacional, que era a da criação de museus cujo impacto advinha do valor arquitectónico e atractividade dos edifícios sede37. Gerava-se desse modo um elemento indutor capaz de motivar fluxos turísticos de apreciável dimensão. No caso de Cabo Verde a opção por um oceanário e a instalação no Mindelo perfilavam-se como escolhas em consonância com as potencialidades da urbe.

Os estudos preliminares, que chegariam a ter lugar, tornariam contudo patentes alguns obstáculos determinantes, o que motivaria a suspensão da iniciativa. O cenário esboçado implicava a mobilização de um investimento muito difícil de concretizar, não se afigurando também viável obter resposta para as exigências de funcionamento previstas. Em causa estavam factores de retorno como os quantitativos de visitantes esperados e o montante médio estimado para os consumos38.

A nomeação do arquitecto Álvaro Siza Vieira como responsável pelo programa de intervenção no sítio histórico da Cidade Velha parecia orientar-se por uma perspectiva similar. E o facto de se estar perante iniciativas tendo com protagonista a mesma figura política reforça seguramente esta visão do assunto39. Numa linha afim, poderá evocar-se ainda uma situação antecedente, que seria a da instalação na Praia de um museu de que Óscar Niemeyer seria o projectista40.

Parece no entanto de acrescentar a propósito, que Cabo Verde atravessava então uma fase da sua evolução política em que a promoção do turismo não era tida como um objectivo prioritário. Estar-se-á portanto perante uma iniciativa que ilustra, de modo menos concludente, o ponto de vista apresentado. Relativamente a esta questão, será de adiantar que a oferta museológica existente hoje em dia, não parece contemplar devidamente as necessidades de promoção do turismo cabo-verdiano.

Um diagnóstico sumário permite afirmar que o leque de museus em funcionamento é escasso, pouco inovador, proporcionando uma oferta diminuta e uma fraca atractividade. As duas principais cidades do país – Praia e Mindelo – possuem apenas três museus, cujas características não parecem susceptíveis de gerar movimentos de visitantes com suficiente impacto turístico41. No tocante a este tópico, julga-se também de referir que não foram ainda criados museus em qualquer uma das duas ilhas que canalizam maiores fluxos turísticos – a do Sal e a da Boavista – pelo que se torna necessário estudar, definir e executar políticas patrimoniais e museológicas adaptadas aos cenários turísticos emergentes.

O papel a desempenhar pelos museus em prol do desenvolvimento de Cabo Verde deverá comportar ainda outras valências, que têm sido já objecto de referência, pelo que importará dedicar-lhes a devida atenção.

Têm-se aqui em mente possibilidades, por enquanto inexploradas, e que viriam por certo enriquecer o panorama museológico do país. Em causa estarão aqueles museus a que poderá ser cometido um papel orientador dos percursos escolares, bem como da sua diversificação e enriquecimento. Nessa perspectiva parecem de começar por mencionar os museus e centros de ciência, entidades fundamentais para a implementação de uma cultura local em domínios como os das ciências experimentais e exactas, de que Cabo Verde efectivamente carece42.

Numa óptica que visa tão somente exemplificar as possibilidades prefiguradas pela via agora indicada a criação de um museu do desporto parece impor-se como um tópico a aprofundar. A finalidade pretendida será a de se vir a dispor de um estabelecimento, cujo objectivo será o de transmitir aos seus frequentadores uma visão esclarecida da importância do universo do desporto nas sociedades contemporâneas. Deverá constituir ainda um elemento promotor das práticas desportivas nas suas diversas modalidades.

A fim de encerrar este tema, será de acrescentar que a interligação entre museus e desenvolvimento viria a adquirir, na segunda metade do século findo, novos contornos conducentes à ampliação da tipologia museológica. São de referir aqui os museus ditos de vizinhança e comunitários que evidenciam potencialidades susceptíveis de produzir resultados de interesse num país em que se depara com situações análogas àquelas em que viriam a surgir esses estabelecimentos.

A vida urbana de Cabo Verde enfrenta no seu quotidiano problemas estreitamente relacionados com as condições de vida dos bairros carenciados, estando-se assim perante cenários que parecem justificar o recurso a um instrumento de intervenção como os museus comunitários e de vizinhança. Ainda que com características diferentes, devendo ser convenientemente adaptados aos problemas que se lhes irão colocar, crê-se que tais iniciativas poderiam ser extensíveis aos contextos rurais.

A respeito deste assunto, parece de acrescentar que as populações cabo-verdianas da diáspora têm sido alvo de todo um conjunto de medidas de apoio, perfilando-se a criação de museus de vizinhança como uma possibilidade a explorar. A medida chegaria a ser apresentada, a título experimental, ao Ministro responsável pela pasta da Cultura, em 1998, tendo sido acolhida com receptividade, posto que não se tivesse tornado possível reunir na altura condições propícias à sua implementação43. Uma abordagem exploratória dessa via mostraria que as comunidades cabo-verdianas emigradas enfrentam problemas para cuja solução este tipo de museus poderá vir a prestar contributos de interesse44.

O teor do discurso anterior conduz a que deva ser tratada neste estudo uma questão central, no seio da realidade museológica cabo-verdiana, que é a das inter-ligações entre museus e educação. Uma tal questão encontrava-se patente logo no período oitocentista, tendo acompanhado as iniciativas tendentes à implementação no território de museus contemplando as necessidades e aspirações locais. Com efeito, as preocupações educativas tornam-se claramente perceptíveis no caso do Museu que marcaria então presença na capital, por cerca de duas décadas. E essas preocupações viriam a ser reforçadas, pouco depois, dada a organização de museus escolares, tendo como o objectivo fornecer apoio ao ensino daquelas matérias em que o concurso de colecções se tornava necessário45. Acresce que esses instrumentos de apoio se iriam manter no âmbito do ensino liceal ministrado na Praia no século passado46. As actividades educativas permaneceram como uma preocupação dominante dos actuais museus do país, posto que, por falta de recursos, não se encontrem ainda instituídos nesses organismos serviços vocacionados para trabalho específico dessa área47.

A este propósito, parece de apontar a inexistência de um museu de história natural em Cabo Verde, uma vez que se está perante um domínio científico de referência no âmbito do relacionamento entre museus e educação48. Já foi feita menção ao caso das ciências experimentais e exactas, sendo de esperar que esses domínios disciplinares se venham a projectar no contexto museológico do país.

Como complemento da apreciação da realidade museológica cabo-verdiana que se tem procurado esboçar, afigura-se oportuno concluir este texto tecendo algumas considerações, numa óptica que se poderá qualificar como de cúpula. Tem-se aqui em mente a articulação entre teoria e prática, uma vez que a progressiva construção da realidade focada pressupõe necessariamente um sustentáculo conceptual que lhe sirva de alicerce. Só desse modo se poderá introduzir nos avanços registados a coerência e fundamentação que se tornam indispensáveis. No intuito de reforçar este ponto de vista, dir-se-á que os sucessivos projectos desencadeados no país carecem com frequência de um capital de conhecimentos capaz de fundamentar não só a sua concepção, como a condução do processo de concretização subsequente.

As lacunas advenientes de insuficiências dessa ordem, emergem claramente nalguns projectos de vulto, que decorrem presentemente em Cabo Verde, ocasionando desvios prejudiciais ao seu correcto desenvolvimento49. A criação de ensino na área do património e da museologia, a nível superior, parece conferir todavia novos contornos aos problemas agora abordados. Uma tal medida começaria por revestir um carácter complementar, constituindo uma via de especialização da licenciatura em História, ministrada no âmbito do ensino politécnico50.

Com a criação da Universidade de Cabo Verde, em 2006, proporcionar-se-ia a oportunidade para a organização de um curso de Mestrado em Património e Desenvolvimento, operando-se desse modo um avanço determinante no processo desencadeado51. A vigência do ensino universitário, a nível de mestrado, prefigura-se actualmente como um factor determinante para a criação em Cabo Verde de um quadro de situação capaz de proporcionar resposta aos quesitos anteriormente apontados. Com efeito, a prática da docência constitui um exercício de apuramento conceptual susceptível de influenciar positivamente concepção e condução de futuros projectos. Será de ter também em linha de conta a consequente qualificação do sector profissional e informação dos decisores políticos, pois estes não se têm alheado da evolução que se tem vindo a operar no âmbito da museologia cabo-verdiana52.

O trabalho de investigação deverá ser tido como uma faceta adicional do cenário emergente, dado constituir uma componente necessária do grau de ensino implementado. Crê-se que se virão a gerar assim as achegas capazes de atenuar as carências apontadas anteriormente, posto que se entenda que estas configuram uma realidade compreensível num panorama em construção como o cabo-verdiano. Importará contudo que venham a ser criadas condições que permitam ultrapassar os impasses detectados. O incremento do ensino da especialidade perfila-se portanto como um factor decisivo no âmbito de um processo de inflexão da realidade museológica do país que se torna necessário vir a intensificar.

REFERÊNCIAS

LIVROS, ARTIGOS E MONOGRAFIAS

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LEGISLAÇÃO

Decreto-Lei nº 3/2003, de 24 de Fevereiro. Boletim Oficial da República de Cabo Verde nº 5, I Série, 24-02-2003.

Lei nº 47/2004, de 19 de Agosto. Diário da República nº 195, I Série-A, de 19-08-2004.

Artigo apresentado em 29/10/2012

Aprovado em 16/05/2013

Referências bibliográficas

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  • Lei nº 47/2004, de 19 de Agosto. Diário da República nº 195, I Série-A, de 19-08-2004.
  • 1
    . Relativamente ao quadro setecentista angolano será de fazer menção a um estudo das relações mantidas com a realidade portuguesa da época. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (1992, p. 82-86). No tocante a Moçambique não se conhece nenhum trabalho monográfico. De citar no entanto a descrição da pesquisa desenvolvida por Manuel Galvão da Silva na Índia, como trabalho de percurso na rota que o levaria a Moçambique, seu território de destino. Ver: J.H da Cunha Rivara (1862).
  • 2
    . Essa expedição teria lugar de 1784 a 1789, tendo sido previsto que viesse a incluir também a costa da Guiné. Ver: G. Fonseca Sacarrão (1953a, p. 45) e Henrique Coutinho Gouveia (1992, p. 84).
  • 3
    . Nessa perspectiva o caso do Brasil contemplava também aspectos de excepção, visto terem aí surgido os primeiros projectos de feição autónoma. Ver: Maria Margaret Lopes (1997) e Henrique Coutinho Gouveia (2013b, p. 1-16).
  • 4
    . Ver: Henrique Coutinho Gouveia e Luís P. Antunes (2013) e Henrique Coutinho Gouveia (2011, p.8-16).
  • 5
    . Serão de citar as colecções didácticas e o pequeno museu constituídos na Escola Principal e no Seminário Liceu, da Ribeira Brava de S. Nicolau, mediante reaproveitamento do acervo proveniente do estabelecimento praiense citado. Ver: Tiago Estrela (1998) e Leão Lopes (2011, p. 61).
  • 6
    . Em causa estava o quadro museológico a implementar no sítio histórico da Cidade Velha, pois este viria a ser então objecto das primeiras achegas, bem como a instalação na ilha Brava de uma casa-museu evocando o poeta Eugénio Tavares aí residente num período significativo da sua vida. Ver: Henrique Coutinho Gouveia, (2013a, p. 4).
  • 7
    . Referem-se aqui não só Angola e Moçambique, mas também a actual Guiné-Bissau. Em São Tomé e Príncipe verificava-se uma situação análoga à de Cabo Verde, pois o Museu existente só seria organizado depois de proclamada a independência.
  • 8
    . Ver: José Maria Almeida (1992); Tiago Estrela (1998),
    Museu das Telecomunicações... (1994) e
    Museu dos CTT... (1993, 1994).
  • 9
    . Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p.18).
  • 10
    . O cenário institucional do panorama museológico cabo-verdiano seria objecto de um trabalho académico que permite acompanhar a sua evolução. Ver: António Fernandes Martins (2011).
  • 11
    . A data apontada refere-se ao arranque do processo de constituição deste Museu, pois a sua inauguração só viria a ter lugar passadas cerca de duas décadas. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 30 e 36).
  • 12
    . Esses trabalhos seriam realizados entre 1992 e 1995, tendo compreendido as ilhas de Santiago, Santo Antão, Fogo e Brava. Info. de Nélida Rodrigues, protagonista do processo.
  • 13
    . Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 13-15).
  • 14
    . Uma proposta inicial seria datada do começo de década de noventa, reconvertendo-se uma parte das instalações do Arquivo Histórico Nacional. A ideia seria retomada, já no presente século, mediante a apresentação de projectos a instalar tanto na Praia como no Mindelo, Informação de Leão Lopes, então Ministro da Cultura e José Maria de Almeida, antigo director do Arquivo Histórico Nacional, Julho de 2011. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 15).
  • 15
    . Julga-se de mencionar a este propósito que o acervo arqueológico obtido na sequência das pesquisas subaquáticas, realizadas entre 1992 e 2001, seria apontado como componente desse futuro estabelecimento. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 20-21) e Gonçalo de Carvalho (2009).
  • 16
    . De citar aqui o Museu Etnológico Português, criado por Leite de Vasconcelos em finais do século XIX, em que se pretendia documentar a cultura nacional mediante representações da arqueologia, etnografia e antropologia física. Ver: José Leite Vasconcelos (1915), Henrique Coutinho Gouveia (1994, p. 614-619) e tb. Henrique Coutinho Gouveia (1997, v. I).
  • 17
    . Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 18).
  • 18
    . Esta questão foi abordada a propósito da "evolução dos museus nacionais portugueses", em 1993 e mais recentemente numa "evocação da museologia portuguesa novecentista". Ver: Henrique Coutinho Gouveia (1993; 2007).
  • 19
    . De recordar que em Angola se pretendia já no começo dos anos setenta, vir a desdobrar o Museu multidisciplinar, criado em 1938, de acordo com as principais componentes que o integravam ou seja a história natural, a etnologia e as belas artes. Essa medida seria activada no pós-independência mediante a criação dos Museus Nacionais de História Natural e de Antropologia e do chamado Depósito Central do Instituto Nacional do Património Cultural. Posteriormente viria ainda a surgir um Museu Nacional de Arqueologia, localizado em Benguela. Ver: Henrique Coutinho Gouveia e Adília Alarcão (1990. p. 424-433) e Henrique Coutinho Gouveia (2010, p. 42-46). Em relação a Moçambique dir-se-á que existiam, em 1975, o Museu Álvaro de Castro, dedicado sobretudo à história natural e um Museu de Etnologia sediado em Nampula. Ver: Alda Costa (1989) e Paulo Soares (1991). Na actual Guiné-Bissau tinha sido instituído, em 1946, um Museu com secções de história, de ciências naturais, de etnografia e de economia, extinto após a independência, tendo dado lugar, em 1988, a um Museu Etnográfico Nacional. Ver: José Lampreia (1962) e Armando Tchoba (1991). Em São Tomé seria instalado na Fortaleza de S. Sebastião, localizada na capital, um Museu Nacional combinando apresentações de índole disciplinar com evocações temáticas. Ver: Armindo Aguiar (1991).
  • 20
    . Tal como será explicado adiante, a opção, feita em Cabo Verde, em favor dos parques naturais, justificava-se pelo facto de se estar perante paisagens fortemente humanizadas. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2010, p. 31-32; 2013a, p. 20).
  • 21
    . De citar aqui os casos de Angola e Moçambique em que se prefiguram claramente movimentações museológicas significativas de feição regional. A título complementar poder-se-ia mencionar ainda a realidade açórica, em que o desenvolvimento da museologia regional tem uma expressão notória.
  • 22
    . O município de S. Filipe, na ilha do Fogo, é por enquanto o promotor do único museu deste tipo criado em Cabo Verde. A iniciativa privada a mencionar será apenas a da Casa da Memória, localizada também em S. Filipe.
  • 23
    . Ter-se-á aqui como antecedente a proposta de criação de um Museu do Mar, seguindo-se-lhe, nos anos noventa, a de criação de um Oceanário com projecção internacional. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p.18-19).
  • 24
    . De mencionar a propósito as Salinas da Pedra de Lume, na ilha do Sal e o vulcão da ilha do Fogo e o centro histórico de S. Filipe, nessa mesma ilha.
  • 25
    . A consulta da bibliografia divulgada relativamente ao processo de reconversão museológica dos valores patrimoniais da Cidade Velha permite constatar que a análise desta questão tem sido claramente marginalizada.
  • 26
    . A designação adoptada em Portugal para os estabelecimentos assim constituídos era a de casas-museu. Com a organização de um Comité Internacional especializado no seio do ICOM, em que Portugal passou a estar representado, essa designação seria substituída pela tradução literal da expressão
    historic house museums, usada havia muito na bibliografia de proveniência norte-americana.
  • 27
    . A fim de exemplificar este ponto de vista far-se-á aqui referência a projectos como os da Casa Amílcar Cabral, em Assomada, na ilha de Santiago, da Casa Eugénio Tavares , na ilha Brava e ainda aos das Casas de Roberto Duarte Silva, Baltazar Lopes e Manuel Lopes em Santo Antão. Ver: Henrique Coutinho Gouveia, 2013a, p. 4.
  • 28
    . De assinalar que o centro interpretativo do chamado Museu da Resistência, em Chão Bom, acabaria por permanecer em funcionamento apenas cerca de uma década – 2000 a 2009. Localizado no exterior da parte muralhada do campo prisional, junto da zona de acesso, seria substituído depois por um simples painel vertical com informação sumária sobre o sítio. V. Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 65-66).
  • 29
    . Um programa desse tipo chegou a ter início no espaço interior da Fortaleza de S. Filipe, que lhe é contígua, ficando no entanto por concluir.
  • 30
    . São manifestas nesse centro a falhas de organização do espaço interno, bem como a degradação dos materiais interpretativos em exposição. De assinalar ainda que esse centro compreende valências comerciais, cuja exploração foi concessionada. Esta chamada de atenção vem colocar em evidência a importância dos problemas de enquadramento focados.
  • 31
    . São conhecidas as possibilidades de interpretação de zonas urbanas de interesse histórico, mediante a conjugação de centros interpretativos e de itinerários de visita. Centros históricos como os da Praia e do Mindelo parecem oferecer possibilidades para o estudo e concretização desse tipo de programas.
  • 32
    . V. Decreto-Lei nº 3/2003, de 24 de Fevereiro.
  • 33
    . Essas categorias tipológicas seriam estabelecidas "em função dos bens e valores a proteger e com o objectivo de graduar os níveis de protecção e usos compatíveis no território nacional, compreendendo as reservas nacionais, os parques nacionais, os parques naturais, os monumentos naturais, as paisagens protegidas e os sítios de interesse científico". Ver: António Fernandes Martins (2011, p. 54-56).
  • 34
    . De esclarecer a este propósito que a criação de qualquer dos museus anteriormente referidos não foi objecto de legislação específica.
  • 35
    . Tais serão os casos de Santo Antão, S. Vicente, Santiago e Fogo. Ver: António Fernandes Martins (2011, p. 55).
  • 36
    . Esse arquitecto seria Peter Chermayeff, autor de diversos projectos desse tipo, entre os quais o Oceanário de Lisboa, inaugurado em 1998, quando se procurava desencadear, em Cabo Verde, um projecto comparável. A ideia inicial seria a da criação de um aquário mediante aproveitamento da chamada réplica da Torre de Belém, tendo vindo a configurar-se depois como uma iniciativa de maior envergadura.
  • 37
    . O Museu de Bilbau, aberto ao público em 1998, constitui por certo um dos projectos emblemáticos a apontar nesta linha, sendo de mencionar como caso precursor o Museu Guggenheim, de Nova Iorque, construído nos começos da década. Ver: Alberto Tellitu
    et al, 1997.
  • 38
    . Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 19).
  • 39
    . Com efeito, o responsável por qualquer dessas medidas seria o arquitecto António Jorge Delgado, Ministro da Cultura à data.
  • 40
    . Qualificada habitualmente como museu essa realização seria também designada por centro cultural numa listagem de obras da autoria desse arquitecto. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 11).
  • 41
    . Tal como foi dito existem actualmente na capital do país apenas dois museus – o Etnográfico e o de Arqueologia - carecendo ambos de programas de melhoramentos consistentes. Acresce que o número de visitas é baixo e que o segundo se encontra localizado numa zona urbana não muito propícia em termos de acesso. De acordo com a informação disponível, o quantitativo anual de visitantes não tem ultrapassado, nesses estabelecimentos, as mil e quinhentas pessoas, o que comprova o retrato de situação esboçado.
  • 42
    . A distinção entre museus e centros de ciência deverá centrar-se nas características dos acervos, podendo estes ser constituídos, no segundo caso, apenas por testemunhos concebidos e executados em função das necessidades de interpretação. Ver: André Desvallées e François Mairesse (2011, p. 574).
  • 43
    . Ver: Henrique Coutinho Gouveia e João Lopes Filho (1998).
  • 44
    . O tema foi tratado num trabalho académico, incidindo numa comunidade cabo-verdiana da área metropolitana de Lisboa, tendo-se obtido resultados que aconselhavam um aprofundamento do assunto. Ver: Martinho Robalo Brito (2000).
  • 45
    . Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2010, p. 6-9) e Luís Pequito Antunes (2013, p. 6-14).
  • 46
    . De mencionar aqui o caso do Liceu aí construído, na segunda metade do século passado, em que o ensino das ciências naturais beneficiava desse apoio. Info. de Ana Maria Hopffer Almada docente desse estabelecimento de ensino.
  • 47
    . Essa preocupação torna-se evidente no movimento editorial de índole pedagógica, atingindo uma qualidade assinalável nas publicações editadas pelos parques naturais.
  • 48
    . A investigação promovida pelos museus de história natural, viria a experimentar, num passado recente, mudanças sensíveis, o que implicará que venha a ser ponderado o papel a atribuir a um futuro museu cabo-verdiano da especialidade, em domínios como os da investigação e da educação.
  • 49
    . Este problema poder-se-á clarificar invocando as intervenções em curso em sítios históricos como o da Cidade Velha e do Campo prisional de Chão Bom. Os estudos que têm vindo a ser realizados, a nível académico, têm permitido evidenciar o que poderá ser designado como um défice teórico com inegáveis repercussões no plano aplicado. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2013a, p. 2-4).
  • 50
    . A designação adoptada seria
    Ramo de Património. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2011).
  • 51
    . O binómio proposto deverá ser entendido como uma temática de enquadramento, permitindo privilegiar domínios do conhecimento afins nos planos de estudos ministrados. Essa possibilidade seria concretizada, logo na segunda edição do curso, alterando-se por isso a sua designação para Património, Turismo e Desenvolvimento. Ver: Henrique Coutinho Gouveia (2011).
  • 52
    . De notar que os contactos entre o meio universitário e o político têm vindo a adquirir uma expressão significativa no plano municipal, permitindo intensificar a participação conjunta em diversas realizações. Será de referir ainda a frequência do Mestrado por alguns dos protagonistas da política autárquica.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      29 Out 2012
    • Aceito
      16 Maio 2013
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