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Amazônia, Fronteira e Áreas Protegidas: dialética da expansão econômica e proteção da natureza

Resumo

A dinâmica territorial da fronteira na Amazônia brasileira indica que a terra e os recursos da natureza continuam sendo incorporados aos mecanismos de acumulação do capital. Na atualidade, esse processo se expande em Áreas Protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas), atingindo espaço naturais e territórios tradicionais habitados por povos indígenas e comunidades amazônicas. Assim, analisa-se a expansão da fronteira no sul do estado do Amazonas, dadas as pressões do Estado e das economias extrativas para converter Áreas Protegidas em espaço do capital. Tal expansão não está apoiada apenas nos agentes econômicos e na sociedade, mas tem o Estado como principal agente indutor, cujo resultados indicam aumento do desmatamento e desestruturação da política ambiental, configurando a reestruturação da fronteira.

Palavras-chave:
Amazônia; Áreas Protegidas; Comunidades Tradicionais; Território

Abstract

The territorial dynamics of the frontier in the Brazilian Amazon region indicates that land and natural resources continue to be incorporated into the mechanisms of capital accumulation. This process has largely spread into Protected Areas (Conservation Areas and Indigenous Lands), reaching natural spaces and traditional territories inhabited by indigenous peoples and Amazonian communities. Thus, the expansion of the frontier in the south of the state of Amazonas is analyzed, in view of the pressures of the Government and extractive economies to convert Protected Areas into a space of capital. Such expansion is not supported solely by economic agents and society, but has the Government as the main inducing agent. The results indicate an increase in deforestation and disruption of the environmental policy, configuring the restructuring of the frontier.

Keywords:
Amazon; Protected Areas; Traditional Communities; Territory

Resumen

La dinámica territorial de la frontera en la Amazonía brasileña señala que la tierra y los recursos de la naturaleza continúan siendo incorporados a los mecanismos de acumulación de capital.

Proceso que en la actualidad se extiende hacia las Áreas Protegidas (Unidades de Conservación de Tierras Indígenas) alcanzando no solo espacios naturales, sino los territorios habitados tradicionalmente por los pueblos indígenas y las comunidades amazónicas. Tal es el caso de la expansión de la frontera al sur del estado de Amazonas debido a las presiones del Estado y a las actividades extractivas para convertir las áreas protegidas en espacios de capital. Expansión que apenas encuentra apoyo en los agentes económicos y en la sociedad, pero que tiene al Estado como el principal agente inductor con resultados, tales como el aumento de la deforestación y la desestructuración de la política ambiental, configurando, en consecuencia, la reestructuración de la frontera.

Palabras-clave:
Amazonía; Áreas protegidas; Comunidades tradicionales; Territorio

Introdução

Na Amazônia brasileira, registra-se sete décadas de aplicação de políticas públicas mais incisivas para fomentar o crescimento econômico da região (1960/2020). Essas ações governamentais direcionaram à região a produção de matérias primas, convertendo sua exuberante natureza em campo de acumulação e acumulação primitiva do capital nacional e internacional.

Os impactos ambientais e as desterritorializações ganharam escalas nacional e internacional. Na década de 1990, o Estado brasileiro assume uma postura direcionada à preservação e conservação ambiental e de reconhecimento dos territórios tradicionais na Amazônia, respondendo às pressões dos organismos internacionais, dos movimentos sociais, grupos ambientalistas, centros de pesquisa e universidades. O governo passou a adotar mecanismos de proteção à natureza no âmbito das políticas públicas, sobretudo nas ações estruturantes aplicadas na Amazônia, a exemplo do Programa Nossa Natureza (1988), que priorizou o ordenamento territorial da região com a institucionalização do Zoneamento Socioeconômico-Ecológico e a redução do elevado índice de desmatamento (BECKER; EGLER; 1997BECKER, B; EGLER, C. A. G. Detalhamento da metodologia para execução do Zoneamento Ecológico-Econômico pelos estados da Amazônia Legal. Brasília, DF: MMA/SAE, 1997.; KOHLHEPP, 2002KOHLHEPP, G. Conflitos de interesse no ordenamento territorial da Amazônia brasileira. Estudos Avançados, São Paulo, v.16(45), 37-61, 2002. Disponível em: www.scielo/scielo.php?script=sci_arttex&pid=S0103-40142002000200004 . Acessado em: 16 maio 2019.
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; MELLO, 2006MELLO, N. A. Políticas territoriais na Amazônia. São Paulo, Brasil: Amablume, 2006.; BECKER, 2007).

O esforço governamental foi, na medida possível, adequar as atividades produtiva/econômicas extrativas com a proteção da natureza. Contudo, no contexto de reprodução do capital marcado pela fase da globalização, percebe-se duas condições conflitantes: a (i) crescente expansão da fronteira agrícola tem consequência direta na (ii) fragilidade das Áreas Protegidas (AP). Supõem-se que a criação de AP pudesse conter o ímpeto do fluxo econômico por terra e recursos naturais. Contudo, a fronteira se caracteriza pela incorporação e transformação da natureza em ativos do capital agropecuário, industrial e financeiro, erodindo os pactos e ordenamentos territoriais vigentes quando estes se tornam obstáculos às bases do desenvolvimento regional (BECKER, 2007BECKER, B. K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. 2.ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.; COSTA SILVA, 2018COSTA SILVA, R. G. Da apropriação da terra ao domínio do território: as estratégias do agronegócio na Amazônia brasileira. In: COSTA SILVA, R. G.; LIMA, L. A. P.; CONCEIÇÃO, F. S. (orgs). Amazônia: dinâmicas agrárias e territoriais contemporâneas. 1ed.São Carlos: Pedro & João Editores, 2018, v. 1, p. 25-48. Disponível em: https://gtga.unir.br/pagina/exibir/9501
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). Tais contradições são evidenciadas no sul do estado do Amazonas, uma região que se converte em nova frente de expansão da fronteira.

Assim, o artigo problematiza a expansão da fronteira agrícola na Amazônia ocidental, especificamente no sul do estado do Amazonas, onde se localizam áreas institucionalizadas em Unidades de Conservação (UC’s) e Terras Indígenas (TI’s). Trata-se de uma sub-região amazonense que reúne sete munícipios, atingidos nos últimos anos pelos fluxos das economias extrativas. Analisa-se a reestruturação da fronteira no sul do estado do Amazonas, seus elementos territoriais relacionados as ações do Estado e dos grupos econômicos, e seus impactos nas Áreas Protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas). Neste caso, há uma contradição central na ação do Estado: ao tempo que implanta a política ambiental na Amazônia, estimula as economias destrutivas desses espaços protegidos.

A metodologia adotada neste estudo apoiou-se em abordagem qualitativa centrada nos estudos das dinâmicas territoriais agrárias, fronteiras, proteção ambiental e conflitos socioterritoriais, somados aos trabalhos de campo e observação direta na área de estudo, análise cartográfica e documental. Para isso, o recorte geográfico abrange os municípios do sul do Estado do Amazonas (Figura 1). Os trabalhos cartográficos foram operacionalizados a partir de dados espaciais (“shapefiles”) dos bancos de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM) e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Com esse conjunto de informações elaborou-se um banco de dados espacial, por meio do Sistema de Informação Geográfica, integrando informações espaciais das Áreas Protegidas, que compreendem as Unidades de Conservação e Terras Indígenas, com informações referentes ao desmatamento, requerimento de áreas de exploração mineral e hidrelétricas. Esses procedimentos permitiram organizar os dados para ordená-los em informações qualitativas, com vistas a construir uma interpretação da configuração territorial da fronteira na Amazônia.

Figura 1:
Sul do Amazonas, localização da área de estudo (2020)

Para melhor sistematização, o estudo está dividido em quatro partes: i) qualifica-se a transformação da Amazônia em fronteira agrícola; ii) em seguida, discute-se as políticas ambientais como possível reverso da fronteira; iii) indicando, em sequência, a formação da nova fronteira agrícola no sul do estado do Amazonas; iv) problematizando-se as contradições nas lógicas das economias extrativas e da política ambiental manifestas na região estudada, seguido das indicações nas considerações finais.

A transformação da Amazônia em fronteira agrícola

O desenvolvimento econômico e a migração populacional na Amazônia brasileira foram mais incisivos a partir da década de 1960, quando um conjunto de políticas territoriais do Estado brasileiro permitiu, de modo intensivo, a exploração dos recursos naturais na região, configurando-a em uma fronteira do capital nacional e internacional (BECKER, 2007BECKER, B. K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. 2.ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.; MELLO, 2006MELLO, N. A. Políticas territoriais na Amazônia. São Paulo, Brasil: Amablume, 2006.; COSTA SILVA, 2018COSTA SILVA, R. G. Da apropriação da terra ao domínio do território: as estratégias do agronegócio na Amazônia brasileira. In: COSTA SILVA, R. G.; LIMA, L. A. P.; CONCEIÇÃO, F. S. (orgs). Amazônia: dinâmicas agrárias e territoriais contemporâneas. 1ed.São Carlos: Pedro & João Editores, 2018, v. 1, p. 25-48. Disponível em: https://gtga.unir.br/pagina/exibir/9501
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). Neste período, sob a égide do Estado, a região se constituiu em uma fronteira da mercantilização da natureza, com impactos ambientais que contemporaneamente continuam a atingir o campesinato regional, os povos indígenas e as comunidades tradicionais em seus diversos territórios tradicionais (MARTINS, 1997MARTINS, J.de S. Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano. São Paulo, Brasil: Hucitec, 1997.; PORTO-GONÇALVES, 2001PORTO-GONÇALVES, C. W. Amazônia, Amazônias. São Paulo, Brasil: Contexto, 2001.; CONCEIÇÃO; RIBEIRO, COSTA SILVA, 2019).

Durante a Ditadura Militar (1964/1985), a estruturação da Amazônia como fronteira agrícola se fez com a aplicação de políticas de ocupação desenvolvimentista e de integração territorial. O I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND 1970/1972) gerou meios para a expansão da fronteira econômica no Brasil, priorizando as regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte. Dentro do PND, o Programa de Integração Nacional (PIN), instituído pelo Decreto Lei n. 1.106 de 16 de junho de 1970, previa a construção de rodovias e colonização agrícola, que se concentraram nos estados de Rondônia, Mato Grosso e ao longo da rodovia BR-230 (Transamazônica). Nesse período, as políticas territoriais foram compostas por um mosaico de projetos estruturantes formados pelo Programa para Integração Nacional (PIN), Programa Polamazônia, Programas de Desenvolvimento Rural Integrado, Programa Grande Carajás e, no período democrático (posterior à Ditadura, iniciando em 1985), os projetos Avança Brasil e Projeto de Aceleração do Crescimento (KOHLHEPP, 2002KOHLHEPP, G. Conflitos de interesse no ordenamento territorial da Amazônia brasileira. Estudos Avançados, São Paulo, v.16(45), 37-61, 2002. Disponível em: www.scielo/scielo.php?script=sci_arttex&pid=S0103-40142002000200004 . Acessado em: 16 maio 2019.
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; CASTRO, 2005CASTRO, E. Dinâmica Socioeconômica e desmatamento na Amazônia. Novos Cadernos NAEA, 8(2), 5-39, 2005. Doi: 10.5801/ncn.v8i2.51. Disponível em: www.repositório.ufpa.br/jspui/bitsream/2011/3175/1/Artigo_Dinamica_SocieconomicaDesmatamento.pdf . Acessado em: 20/06/2019.
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; BECKER, 2007BECKER, B. K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. 2.ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.; WANDERLEY, 2016WANDERLEY, L. J. de M. Repensando a noção de fronteira no contexto da reestruturação espacial da Amazônia no século XXI. Terra Livre - N. 46 (1): 13-48, 2016.).

Neste contexto, a colonização agrícola foi uma política territorial estratégica, sobretudo como alternativa à reforma agrária exigida pelos movimentos sociais, pari passu a expansão de áreas agrícolas, processo que configurou a Amazônia como reserva espacial de reprodução do capital. No II PND (1975-1979), por meio dos fartos incentivos fiscais às grandes empresas agropecuárias, o Estado garantiu também a colonização privada - para médios e grandes proprietários - e adotou a estratégia de ocupação produtiva na Amazônia, com forte ação no Mato Grosso. Os incentivos fiscais gerenciados pela SUDAM - a principal agência estatal - possibilitaram aos grandes projetos agropecuários, minerais e agroindustriais inserirem na região a mercantilização da natureza como racionalidade da nova sociedade que se formava a partir da migração populacional. Esses novos migrantes da colonização, oriundos principalmente dos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Espírito Santo, povoaram o Mato Grosso, Rondônia e o sudeste do Pará, obtendo na pecuária, extração madeireira, mercado de terras e, posteriormente agronegócios (soja e milho), o nexo econômico de reprodução social na fronteira, que já nascia “desamazonizada” (COSTA SILVA, 2022COSTA SILVA, R. G. A desamazonização da Amazônia: conflitos agrários, violência e agrobandidagem. Conflitos no Campo Brasil, v. 1, p. 104-111, 2022. Link: https://gtga.unir.br/uploads/81837305/arquivos/Artigo_CPT_A_desamazonizacao_da_Amazonia_2022_1146079968.pdf
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).

Nesse período foram criados 15 polos regionais que, por meio do Polamazônia, contaram com melhorias na infraestrutura e recursos financeiros e humanos. Através do II PND o governo federal planejou reparar a economia nacional em função dos desajustes causados pela crise internacional, como por exemplo, a crise do petróleo em 1974, abrindo a região aos fluxos intensivos de exploração da natureza (MELLO, 2006MELLO, N. A. Políticas territoriais na Amazônia. São Paulo, Brasil: Amablume, 2006.).

Essas estratégias produtivas e territoriais atingiram seus objetivos para com as empresas nacionais e internacionais, na medida em que proporcionou a acumulação de capital, intensificando os conflitos socioterritoriais entre diferentes sujeitos sociais envolvidos nos projetos de integração. Áreas ocupadas por comunidades tradicionais foram pressionadas e deslocadas pelos novos sujeitos da fronteira, como os grandes proprietários rurais e suas práticas de grilagem de terras púbicas, fazendo uso da pistolagem. Com os povos indígenas os conflitos e invasões em Terras Indígenas (TI’s) se tornaram mais recorrentes, e um dos mais graves conflito ficou conhecido como o Massacre do Paralelo 11, ocorrido em 1963, quando morreram cerca de 3.500 Cinta Larga, envenenados por arsênico, na reserva indígena Roosevelt, nos limites do estado do Mato Grosso (BRASIL, 1968).

Como corolário, ampliou-se a degradação ambiental e as desigualdades socioeconômicas, uma vez que a região se configurava como fonte de recurso para o fluxo econômico externo, marginalizando principalmente a população rural em seus múltiplos territórios. Neste contexto, no final da década de 1980, intensificaram-se os discursos referentes à problemática ambiental, cujas preocupações com a conservação e preservação da natureza, em grande medida, foram incorporadas às políticas públicas territoriais na região. Um dos relevantes resultados foi a implantação do Programa Nossa Natureza (Decreto 96.944/88), importante instrumento para redução dos impactos ambientais e disciplinar a ocupação e a exploração econômica sustentável na Amazônia Legal.

No âmbito do Programa Nossa Natureza ampliaram-se os debates referentes ao ordenamento territorial e a instrumentalização do Zoneamento Socioeconômico-Ecológico, servindo como um moderno mecanismo de proteção ambiental e de gestão do território. Também foram definidas as atribuições do Estado no setor ambiental, com a criação do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (IBAMA), o Fundo Nacional de Meio Ambiente (Lei 7.797 de 10 de julho de 1989), o Programa Nacional de Meio Ambiente, com apoio financeiro externo do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento - BIRD, a criação de novas Unidades de Conservação (UC’s), o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) e o Plano Emergencial de Controle de Derrubadas e Queimadas na Amazônia Legal (MELLO, 2006MELLO, N. A. Políticas territoriais na Amazônia. São Paulo, Brasil: Amablume, 2006.).

A partir dos debates ambientais em escala internacional, sobretudo após a II Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente - Eco-92 ou Rio-92 - a questão ambiental foi paulatinamente incorporada às políticas públicas territoriais do país, com forte ação na Amazônia. Ao longo dessa trajetória se cristalizou, ao menos, dois campos antagônicos de projetos econômicos ativos na região que incorporavam a natureza de forma diferente. Os povos indígenas, comunidades tradicionais, ambientalistas e parte do campesinato tradicionalmente amazônico advogam a defesa da natureza e dos territórios tradicionais em seus projetos socioeconômicos como modos de vida coletiva; já o capital agropecuário, mineral, hidrelétrico, industrial, somada a parte da sociedade migrante, defendem uma relação econômica intensiva na extração dos recursos naturais, com consequente desterritorialização dos povos amazônicos, processo contemporaneamente atualizado pelo agronegócio (RIBEIRO; COSTA SILVA; CORREA, 2015RIBEIRO, A. F. A.; COSTA SILVA, R. G; CORREA, S. S. Geografia da soja em Rondônia: monopolização do território, regionalização e conflitos territoriais. Campo - Território, v. 10, p. 180-201, 2015. Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/campoterritorio/article/viewFile/28439/17010
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).

O reverso da fronteira: políticas ambientais e proteção territorial na Amazônia

Em consideração das contradições do desenvolvimento econômico, o governo federal, em conjunto com a sociedade organizada e organismos internacionais, instituiu em 1990 o Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais (PPG-7), sendo uma iniciativa dos sete países mais industrializados (G-7) e do Banco Mundial. O objetivo do PPG-7 foi reduzir a taxa de desmatamento na Amazônia, a partir de cinco linhas de ações: experimentação e a demonstração de atividades que buscaram conciliar a conservação ambiental e o desenvolvimento; conservação e criação de áreas protegidas; demarcação das terras indígenas; consolidação de instituições públicas responsáveis pelas políticas ambientais; cooperação e pesquisa científica. A questão ambiental no âmbito do PPG-7, certamente a principal contribuição pode ser atribuída à realização do Zoneamento Socioeconômico-Ecológico e novas estratégias e políticas prioritárias, com foco no arco do desmatamento (Amazônia Central) e nos eixos de integração (Amazônia Ocidental).

Ainda que a perspectiva ecológica, sustentabilidade ambiental e desenvolvimento sustentável tenham influenciado os parâmetros das políticas públicas, as políticas territoriais na Amazônia continuaram atendendo a uma agenda política da economia global, do capital transnacional, garantindo a nova forma de produção introduzida pela globalização do mercado (ANTONI, 2010ANTONI, G. O programa piloto para proteção das florestas tropicais do Brasil (PPG-7) e a globalização da Amazônia. Ambiente & Sociedade, v.13(2), 209-311, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1414-753X2010000200006 . Acessado em: 15 maio 2019.
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). Nesse sentido, o Decreto 1.541 de 27 de junho de 1995, que regulamentou o Conselho Nacional da Amazônia Legal, segundo Madeira (2014MADEIRA, W. do V. Plano Amazônia sustentável e desenvolvimento desigual. Ambiente & Sociedade, v.17(3), 19-34, 2014. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1414-753X2014000300003
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), foi o “modelo” para incluir a Amazônia no “modelo de inserção competitiva”.

As políticas do governo brasileiro indicadas no Decreto 1.541/95 que integraram os Planos Plurianuais do governo de Fernando Henrique Cardoso (1996/1999) foram o Programa Brasil em Ação e Programa Avança Brasil (2000/2003), tendo nos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento (ENID’s) a referência de ordenamento regional no Brasil, com fortes impactos territoriais na Amazônia, assumindo função estratégica para integrar áreas do Brasil com a América do Sul. Assim, os eixos de integração passaram a ser a base do governo brasileiro para o “modelo de inserção competitiva”, influenciando todos os demais programas governamentais (MADEIRA, 2014MADEIRA, W. do V. Plano Amazônia sustentável e desenvolvimento desigual. Ambiente & Sociedade, v.17(3), 19-34, 2014. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1414-753X2014000300003
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).

No Governo Lula (2003/2010), a Amazônia foi repensada no âmbito do Plano Amazônia Sustentável (PAS), mantendo as políticas territoriais e ambientais anteriores. Neste Plano, lançado em 2008, apresentava-se como objetivos a consolidação do modelo de desenvolvimento sustentável, combater processos de degradação ambiental, estabelecer diretrizes para o ordenamento territorial e gestão ambiental e integrar políticas de ordenamento territorial com políticas de desenvolvimento sustentável (BRASIL, 2008).

No âmbito do PAS, o governo encaminhou o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), que reuniu os ministérios do Meio Ambiente, Defesa, Integração Nacional, Desenvolvimento Agrário e Agricultura, Pecuária e Abastecimento, dentre outros. Na fase I (2004- 2008) o Plano teve diretrizes importantes como a valorização da floresta para conservação e uso sustentável, ordenamento fundiário e territorial para combater a grilagem de terras públicas, criação de unidades de conservação e homologação de terras indígenas. Foram incorporadas à fase II (2012-2015) a gestão descentralizada compartilhada de políticas públicas, com parceria entre União, Estado e Municípios, estímulo à participação de diferentes setores da sociedade amazônica e incentivo ao comprometimento dos setores produtivos à conservação das florestas (MELLO; ARTAXO, 2017MELLO, N. G. R., ARTAXO, P. Evolução do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n.66,108-129, 2017. Doi: https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i66p108-129 Acessado em: 16/05/2019.
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). No PPCDAm foram instituídas novas AP e implementado o Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter/INPE), contribuindo para a diminuição nas taxas de desmatamento no período de 2002 a 2012. Assim, as AP foram incorporadas ao ordenamento e planejamento do território como instrumento para conservação da natureza, proteção ambiental e formação de territórios tradicionais.

O PPCDAm passou ainda por mais duas fases e em 2020 foi concluída a quarta fase. O governo atual parece ter descontinuado o programa lançando o Plano Nacional para Controle do Desmatamento Ilegal e da Recuperação da Vegetação Nativa, no entanto sem ações concretas para o objetivo do Plano.

Ainda como parte da gestão territorial, e apoiado na Lei 9.985 de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o artigo 26 define um novo instrumento de gestão, denominado de mosaico de unidades, que é constituído por um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, justapostas ou sobrepostas, AP públicas ou privadas, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, valorização das sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional e com gestão integrada e participativa.

À vista disso, o Ministério de Meio Ambiente (MMA), conforme portaria nº 332 de 25 de agosto de 2011, reconheceu o Mosaico da Amazônia Meridional (MAM), formado por quarenta (40) unidades de conservação de nível federal e estadual, abrangendo áreas dos estados do Amazonas, Rondônia e Mato Grosso, sob a gestão do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e das Secretarias de Meio Ambiente dos três Estados envolvidos. O objetivo do MAM é evitar o avanço do desmatamento pelas atividades produtivas/extensivas da fronteira, ou seja, as pressões da pecuária, do garimpo, mineração, invasão de áreas públicas (grilagem), extração de madeira e soja. Como aplicação da política ambiental e territorial, o Mosaico do Apuí constitui uma iniciativa do governo do Estado do Amazonas para controlar o avanço do desmatamento e integrando unidades de conservação estaduais, em parte dos municípios de Apuí e Novo Aripuanã (região objeto deste texto).

Acompanhando a diretriz ambiental do governo federal de gestão territorial na região Amazônica, o Estado do Amazonas instituiu, conforme Lei n. 3.417 de 31 de julho de 2009, o Macrozoneamento do Estado do Amazonas (MZEE), ordenando áreas dos municípios da fronteira sul do Amazonas como áreas produtivas da agropecuária, Áreas Protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas) e áreas potenciais para a criação de unidades de conservação. Esta política territorial atende a proposta e fundamentos do Macrozoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia Legal, estabelecido pelo Decreto 7.378/2010 como instrumento de orientação à formulação e espacialização das políticas públicas de desenvolvimento, ordenamento territorial e meio ambiente, assim como para as decisões dos agentes privados.

Instituiu-se três mecanismos de ordenamento do território no âmbito do Macrozoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia Legal: territórios-rede, territórios-fronteira e territórios-zona. Os territórios-rede compreendem o corredor de integração Amazônia-Caribe, as capitais costeiras, a mineração e outras cadeias produtivas, o entroncamento Pará-Tocantins-Maranhão, o eixo Araguaia-Tocantins, o complexo agroindustrial e o polo logístico. Os territórios-fronteira abrangem a fronteira agroflorestal e pecuária e as frentes de expansão, onde se localiza os municípios do sul do Estado do Amazonas. Os territórios-zona correspondem as áreas de floresta ombrófila densa e outras formações vegetais contínuas e com baixo grau de antropismo (BRASIL, 2010).

O ordenamento territorial, a partir do Macrozoneamento da Amazônia Legal e do Zoneamento do Estado do Amazonas, indica para a região a perspectiva de conservação/proteção da natureza e de fronteira agrícola. Por isso, ainda que o ordenamento territorial para a Amazônia tenha incorporado a perspectiva ambiental e proteção dos territórios tradicionais, o Estado brasileiro tem estimulado projetos econômicos voltados à exploração intensiva da natureza que comprometem a sociobiodiversidade da região, potencializando a reconfiguração da fronteira no sul do estado do Amazonas, como se analisa na próxima seção.

Sul do estado do Amazonas: nova fronteira agrícola e ameaças às Áreas Protegidas

O ordenamento territorial atual no sul do Estado do Amazonas é resultado das políticas territoriais ambientais federais e estaduais, que conferiram a região ênfase na conservação da natureza e proteção dos modos de vida dos povos originários e comunidades tradicionais, materializados tanto em Áreas Protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas) como em novas modalidades de assentamentos rurais de uso sustentável (SILVA; COSTA SILVA; LIMA, 2019SILVA, V.V.; COSTA SILVA, R.G; LIMA, L. A. P. A estruturação da fronteira agrícola no sul do estado do Amazonas. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 1, p. 67 - 82, 2019.; AMAZONAS, 2009).

Para alguns autores esse contexto indicaria uma condição de pós-fronteira (COY; KLINGLER; KOHLHEPP, 2017COY, M.; KLINGLER, M.; KOHLHEPP, G. De frontier até pós-frontier: regiões pioneiras no Brasil dentro do processo de transformação espaço-temporal e sócio-ecológico. Confins 30, 1-41, 2017. Disponível em: http://journals.openedition.org/confins/11683 . Acessado em: 10/08/2020.
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; DROULERS; LE TOURNEAU, 2000DROULERS, M; LE TOURNEAU, F. M. Amazonie: la fin d’une frontière? Caravelle, n°75, 109-135, 2000. Disponível em: https://www.persee.fr/doc/carav_1147-6753_2000_num_75_1_1261 . Acessado em: 10/08/2020.
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); para outros, a mesma condição de pós-fronteira aconteceria quando se esgotassem os estoques de terras livres e de recursos naturais (BROWDER; PEDLOWSKI; WALKER, 2008BROWDER, John; PEDLOWSKI, Marcos; WALKER, Robert. Revisiting theories of frontier expansion in the Brazilian Amazon: a survey of the colonist farming population in Rondônia’s post-frontier, 1992-2002. World Development, v. 36, n. 8, p. 1469-1492, 2008.; COSTA SILVA et al, 2021COSTA SILVA, R. G; SILVA, V. V; MELLO-THÉRY, N. A; LIMA, L. A.P. New frontier of expansion and protected areas in the state of Amazonas. Mercator, Fortaleza, v.20, e20025, p. 1-13, 2021. Disponível em: http://www.mercator.ufc.br/mercator/article/view/e20025
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). Por outro lado, essa região ainda é uma franja intermediária em condição indefinida de expansão de frentes pioneiras, por isso, é possível imaginar diferentes cenários em virtude do foco que se pretende com as políticas públicas (THÉRY, 2005THÉRY, H. Situações da Amazônia no Brasil e no continente. Estudos Avançados, São Paulo, v. 53, p. 37-49, 2005.). Na perspectiva das forças políticas e econômicas do agronegócio, sobretudo na Frente Parlamentar da Agropecuária no Congresso Nacional, o mercado de terras é a referência para condição de fronteira agrícola global, visto as pressões para transferências em larga escala da terra pública para o setor privado, o que tem resultado em ações sistemáticas de redução e/ou obliteração de Áreas Protegidas e Territórios Tradicionais (COSTA SILVA, 2016; RIBEIRO et al., 2018RIBEIRO, A. F. A.; SANTOS, J. L; COSTA SILVA, R. G; RODRIGUES, C. B. P. A agenda territorial do agrohidronegócio em tempos de golpe: análise da “nova” lei de terras do Brasil. OKARA: GEOGRAFIA EM DEBATE (UFPB), v. 12, p. 678-698, 2018. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/okara/article/view/41336
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).

Pode-se designar lato sensu a fronteira como a transferência da terra pública para o setor privado, a conversão de áreas naturais em espaço do capital extrativo. Significa que o processo histórico condiciona o advento de projetos econômicos que podem reconfigurar os elementos socioterritoriais das regiões com “estoques de terras”, quase sempre representados na mercantilização da natureza, sua consequente exploração intensiva e campo de conflitos sociais (MARTINS, 1997MARTINS, J.de S. Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano. São Paulo, Brasil: Hucitec, 1997.; CASTRO, 2005CASTRO, E. Dinâmica Socioeconômica e desmatamento na Amazônia. Novos Cadernos NAEA, 8(2), 5-39, 2005. Doi: 10.5801/ncn.v8i2.51. Disponível em: www.repositório.ufpa.br/jspui/bitsream/2011/3175/1/Artigo_Dinamica_SocieconomicaDesmatamento.pdf . Acessado em: 20/06/2019.
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; MELLO, 2006MELLO, N. A. Políticas territoriais na Amazônia. São Paulo, Brasil: Amablume, 2006.; BECKER, 2007BECKER, B. K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. 2.ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.). Dessa forma, observa-se a reestruturação do sul do Amazonas a partir de elementos contraditórios à perspectiva da sustentabilidade ambiental e conservação da natureza, como a pecuária, extração ilegal de madeira, mineração, garimpos, projetos energéticos, grilagem de terras que pressionam as Áreas Protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas), as quais formam um corredor para justamente impedir o avanço do desmatamento (SILVA; COSTA SILVA, LIMA, 2019SILVA, V.V.; COSTA SILVA, R.G; LIMA, L. A. P. A estruturação da fronteira agrícola no sul do estado do Amazonas. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 1, p. 67 - 82, 2019.). A reestruturação compreende distintas fronteiras dirigidas para exploração de diversos elementos físicos da natureza, da terra (agrícola e pastagem) e áreas em estágio de pós-fronteira (WANDERLEY, 2016WANDERLEY, L. J. de M. Repensando a noção de fronteira no contexto da reestruturação espacial da Amazônia no século XXI. Terra Livre - N. 46 (1): 13-48, 2016.).

Diferentemente das décadas passadas, em que a fronteira se expandia na Amazônia nas chamadas terras devolutas e projetos governamentais, atualmente, com o ordenamento territorial, a restruturação da fronteira avança sobre as AP e florestas públicas não destinadas, ocasionando desmatamento e conflitos entre aqueles que resistem a todo esse processo de espoliação (povos indígenas, ribeirinhos e extrativistas, quilombolas, dentre outros sujeitos sociais).

As Áreas Protegidas foram instituídas no sul do Estado do Amazonas (Figura 2), associadas à perspectiva ambiental do desenvolvimento sustentável, sobretudo a partir da II Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente (Eco-92). Além do objetivo de conservar/preservar a natureza, as UC’s também impediram por algum tempo o avanço da fronteira para o extremo norte do país. Hoje, esses novos elementos que foram incorporados à região pelo Estado totalizam trinta e duas (32) Unidades de Conservação federais e estaduais, com predominância das unidades de uso sustentável (RESEX, RDS, FLONA, entre outras), que permitem uso econômico dos recursos naturais, conciliando apoio dos agentes econômicos em sua instituição e implementação sustentável.

A criação e implementação de Reservas Extrativista (RESEX) e Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) estão relacionadas as pressões das comunidades ribeirinhas e extrativistas para protegerem seus modos de vida e seus territórios tradicionais; as Florestas Nacionais (FLONAS) são impulsionadas pelo próprio Estado com foco no ordenamento da exploração madeireira. No sul do Amazonas estão localizadas trinta duas (32) Terras Indígenas (TI), destas, trinta (30) estão regularizadas, uma (01) homologada e uma (01) em estudo, em sobreposição com o Parque Nacional de Mapinguari e a Reserva Extrativista Ituxi.

Figura 2:
As Áreas Protegidas na fronteira sul do estado do Amazonas (2020)

Do governo militar (1964-1986), os eixos de circulação formados pelas rodovias BR-230 (Transamazônica) e BR-319 (Porto Velho/Manaus) atravessam os municípios do sul do Estado do Amazonas e reconfiguraram o espaço regional para os projetos de colonização, produção agropecuária e madeireira. Esses eixos estruturantes transformaram e ainda transformam significativamente o espaço regional da Amazônia Sul Ocidental, sobretudo, na intensificação do desmatamento em áreas que há poucos anos não estavam no “radar” das pressões territoriais do capital extrativo (SILVA; COSTA SILVA; LIMA, 2019SILVA, V.V.; COSTA SILVA, R.G; LIMA, L. A. P. A estruturação da fronteira agrícola no sul do estado do Amazonas. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 1, p. 67 - 82, 2019.)

Assim, no sul do Amazonas verifica-se diferentes eixos estruturantes, ressaltando que a rodovia Transamazônica emerge como motor impulsionador da economia da fronteira, fomentadas a partir das dinâmicas territoriais dos estados do Pará, Mato Grosso, Rondônia e Acre. Todos esses processos de expansão das atividades econômicas de exploração intensiva da natureza e de criação de novas AP configuram o espaço regional, qualificando as diferenças e as dialéticas na fronteira do sul do estado do Amazonas (COSTA SILVA, et al, 2021COSTA SILVA, R. G; SILVA, V. V; MELLO-THÉRY, N. A; LIMA, L. A.P. New frontier of expansion and protected areas in the state of Amazonas. Mercator, Fortaleza, v.20, e20025, p. 1-13, 2021. Disponível em: http://www.mercator.ufc.br/mercator/article/view/e20025
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).

Economias extrativas e proteção ambiental no sul do Amazonas

O movimento de reestruturação da fronteira atinge cada vez mais as AP por meio dos mesmos mecanismos econômicos que transformam as áreas mais remotas da região Amazônica: extração madeireira, pecuária, agronegócio, exploração mineral, hidrelétricas, grilagem de terras e desmatamento. De Apuí à Humaitá (400km de distância) sobressaem as frentes de exploração mineral, hidrelétricas e agronegócio (soja). De Humaitá à Boca do Acre intensificam-se a extração de madeira, pecuária, grilagem de terras e desmatamentos (Figura 3).

A extração madeireira costuma ser a primeira atividade ilegal que aparece na fronteira, constituindo a base da economia na região afetada. Atualmente, conforme legislação ambiental, trata-se de crime ambiental. Estrutura-se em um sistema complexo, desde processos tradicionais, passando por modos mais agressivos, como uso de motosserras, até os processos industriais de beneficiamento legal e ilegal (CASTRO, 2005CASTRO, E. Dinâmica Socioeconômica e desmatamento na Amazônia. Novos Cadernos NAEA, 8(2), 5-39, 2005. Doi: 10.5801/ncn.v8i2.51. Disponível em: www.repositório.ufpa.br/jspui/bitsream/2011/3175/1/Artigo_Dinamica_SocieconomicaDesmatamento.pdf . Acessado em: 20/06/2019.
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). Na atualidade, a ilegalidade da economia madeireira atinge até os setores que supostamente estão parametrizados pelos indicadores de sustentabilidade ambiental, como se verifica nas ações de fiscalização do IBAMA quando das apreensões de madeira ilegal sob a guarda de empresas madeireiras que executam “manejo florestal”.

Figura 3:
A restruturação da fronteira no sul do Amazonas (2020)

Como consequência, o crescimento da pecuária, assentada na perspectiva econômica da rentabilidade e da segurança, tem ocasionado elevada “corrida” por terra, concentração fundiária e, principalmente, desmatamento. Tal processo também atinge os assentamentos rurais da modalidade tradicional, que tem contribuído para o aumento da pecuária, desmatamento e, dadas as fragilidades institucionais, para concentração de terra (CARRERO; FEARNSIDE, 2011CARRER0, G.C.; FEARNSIDE, P.M. Forest Clearing Dynamics and the Expansion of Landholdings in Apuí, a Deforestation Hotspot on Brazil’s Transamazon Highway. Ecology and Society, 16(2): 26, 2011.Disponível em: http://www.ecologyandsociety.org/vol16/iss2/art26/ Acessado em: 10/08/2020.
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; LEAL et al., 2017LEAL, M. L. M.; SILVA, V. V.; FULAN. J. Â.; SOUZA, A. L. Uso da terra e a legislação florestal no projeto de assentamento Matupi, AM. Boletim de Geografia (ONLINE), v. 35, p. 122-133, 2017. Disponível: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/BolGeogr/article/view/31897
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). Em 2019, o desmatamento nos assentamentos localizados na área de estudo correspondeu a 36,54% do total de áreas desmatadas no sul do Amazonas, com destaque para os Projetos de Assentamento Rio Juma e Acari.

O desmatamento, associado sobretudo a extração madeireira e à pecuária (Figura 4), é uma outra característica da fronteira que se expande na região objeto desta análise, cujo indicadores apresentam os municípios de Lábrea, Boca do Acre e Apuí com as maiores áreas desmatadas e maiores efetivos bovinos em 2020, contribuindo para que o Amazonas ocupasse a quinta posição em número de efetivos de rebanho na Região Norte (IBGE, 2020).

Figura 4:
Relação entre efetivo bovino e desmatamento nos municípios do sul do Amazonas (2020)

A ação do agronegócio da soja nos estados de Mato Grosso e Rondônia impôs o deslocamento da pecuária e extração madeireira para a Amazônia Sul Ocidental. Particularmente no estado do Amazonas, o baixo preço da terra e dos custos de transporte (RIVERO et al, 2009RIVERO, S.; ALMEIDA, O.; ÁVILA, S.; OLIVEIRA, W. Pecuária e desmatamento: uma análise das principais causas diretas do desmatamento na Amazônia. Nova Economia, v.19 (1), 41-66, 41- 66, 2009. Doi: https://doi.org/10.1590/S0103-63512009000100003 Acessado em: 10/05/2018.
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) relacionados ao aumento da demanda interna e externa de carne bovina e proximidade geográfica dos municípios que concentram grandes rebanhos bovinos nos estado de Rondônia (Porto Velho, Nova Mamoré, Ariquemes) e Mato Grosso (região concentrada no norte-noroeste), também contribuíram para a transferência da pecuária dessas regiões para o sul do estado do Amazonas, indicando a expansão da fronteira nas regiões preservadas e com Áreas Protegidas. Nesse contexto, amplia-se as pressões político-econômicas para a abertura dessas áreas naturais, buscando sua suposta integração ao processo produtivo do capital agropecuário globalizado, o que tem ocasionado disputas por territórios pelos diferentes agentes, ou seja, Estado, capital, povos amazônicos e movimentos sociais.

Com relação a exploração mineral, segundo dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), entre 1962 a 2020 foram feitas ao órgão público 815 solicitações de registro de atividade nos municípios do sul do Amazonas. Desse total, 470 estão localizados em áreas de Unidades de Conservação ou na zona de entorno de UC’s, como Parques Nacionais e Estaduais, Florestas Nacionais e Estaduais, Reservas de Desenvolvimento Sustentável, Áreas de Proteção Ambiental e Reservas Extrativistas, e treze (13) estão no entorno de Terras Indígenas, sobretudo nos munícipios de Manicoré, Novo Aripuanã e Apuí (Figura 5).

Figura 5:
Requerimentos minerários no interior das Áreas Protegidas (2020).

Muitas dessas solicitações foram feitas ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) anteriormente a criação das UC’s, indicando que a fronteira mineral tende a se expandir, mesmo que agora essas áreas estejam protegidas. Ainda que a maioria dessas solicitações não tenham sido autorizadas, em virtude da criação das UC’, neste ano (2020) constam no banco de dados do órgão trinta e um (31) processos de interesses minerários, como requerimento de pesquisa e requerimento de lavra no interior de unidades de conservação.

Desta forma, deve-se admitir que as UC’s enfrentam uma programada vulnerabilidade política. Considerando as políticas de integração ao mercado internacional, atualmente o governo federal, atendo a bancada BBB (Bíblia, Boi e Bala) propõem alterações nas tipologias e redução de Áreas Protegidas, acenando à incorporação dessas áreas ao estoque de terras privadas na fronteira. A escala institucional dessa lógica de desterritorializações encontra nos parlamentos estaduais um terreno fértil às essas propostas. A exemplo, cita-se a propositura de um grupo de parlamentares amazonenses que sinalizaram à redução das Áreas Protegidas de 2,83 milhões para 1,18 milhões de hectares, afetando diretamente a Área de Proteção Ambiental dos Campos de Manicoré, as Florestas Nacionais de Aripuanã e de Urupadi, a Reserva Biológica do Manicoré e o Parque Nacional do Acari. Estudos realizados pelo Instituto Socioambiental identificaram que a redução das áreas coincidia com as áreas que foram solicitadas para exploração mineral antes da criação dessas unidades (Instituto Social Ambiental, 2017).

Outro instrumento legal que concretiza esse processo foi a Lei Federal nº 12.678, de 25 de junho de 2012, que alterou os limites dos Parques Nacionais da Amazônia, dos Campos Amazônicos e Mapinguari, das Florestas Nacionais de Itaituba I, Itaituba II e do Crepori e da Área de Proteção Ambiental dos Tapajós, localizadas nos Estados do Amazonas, Pará e Rondônia. As áreas excluídas dessas UC foram destinadas tanto a regularização fundiária quanto a área de alagamento das hidrelétricas.

Também, analisa-se no Congresso Nacional a flexibilização do ordenamento jurídico das Terras Indígenas para permitir atividades econômicas como a mineração, extração madeireira, hidrelétricas, arrendamentos, agropecuária e outras. Portanto, há a pavimentação do espaço de conflito nas Áreas Protegidas e seus limites, e um espaço do conflito institucional no âmbito do Congresso Nacional, conformando duas frentes de ação do capital agropecuário, mineral, hidroelétrico e outras frações interessadas no desmantelamento jurídico das Áreas Protegidas e dos Territórios Tradicionais.

Os projetos para a produção de energia também estão presentes na fronteira sul do estado do Amazonas. Tais projetos foram denominados por Lima e Costa Silva (2018LIMA, L. A. P; COSTA SILVA, R. G. Cartografia das hidroestratégias na Amazônia brasileira. ACTA Geográfica, Boa Vista, v.12(28), 129-142, 2018. Disponível em: https://revista.ufrr.br/actageo/article/view/4510 . Acesso em 10 abril 2019.
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) de hidroestratégias, consignado em ações do Estado associado com o capital industrial que projetam à Amazônia um espaço de acumulação e intensa mercantilização e privatização dos recursos hídricos. Neste sentido, segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica, estão previstas a construção de onze (11) hidrelétricas, sendo seis (06) usinas hidrelétricas e cinco (05) pequenas centrais hidrelétricas na fronteira sul do Amazonas, o que contribui para formar um campo de pressão político-territorial para flexibilizar ou converter áreas naturais em territórios das hidroelétricas. Essa estratégia, aliada aos eixos de circulação, sobretudo das rodovias BR-230 e BR-319, favorecem a expansão do capital na fronteira, levando a expropriação dos povos amazônicos, reforçando, assim, a narrativa do agronegócio de que as Áreas Protegidas impedem o desenvolvimento econômico da região1 1 - “O presidente da Comissão de Meio Ambiente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Assuero Doca Veronez, durante sua participação no Seminário Desafios à Expansão Agropecuária Brasileira, promovido pela Comissão de Agricultura, Pecuária e Abastecimento e desenvolvimento Rural e pelo Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica da Câmara dos Deputados, afirmou que as restrições impostas ao agronegócio em nome da preservação do meio ambiente, especialmente na Amazônia, são excessivas e impedem o crescimento do Brasil”. Fonte: Agência Câmara de Notícias, 2006. Link: https://www.camara.leg.br/noticias/91922-agronegocio-se-ressente-de-amarras-da-legislacao-ambiental/ Acesso em: 07/06/2022. .

Atualmente, na fronteira agrícola do sul do Amazonas observamos o que Santos (2008SANTOS, M. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008.) denominou de sistemas de objetos e de ações que reconfiguram Humaitá, o principal município da região. Essa geografia se materializa na construção de novos portos fluviais no rio Madeira para atender a produção de soja (Porto Graneleiro do Grupo Masutti) e a construção do Anel Viário, que possibilitará a fluidez do transporte rodoviário dos grãos de Rondônia e Mato Grosso. Adiciona-se a recente construção da ponte sobre o rio Madeira, ligando Porto Velho (RO) à Humaitá (AM), o que tende a acelerar o fluxo de transportes e a armazenagem de grãos de soja e milho no porto graneleiro de Humaitá, assim como, o deslocamento da pecuária para região de Humaitá e Canutama, como observado em pesquisa de campo (SILVA; COSTA SILVA; LIMA, 2019SILVA, V.V.; COSTA SILVA, R.G; LIMA, L. A. P. A estruturação da fronteira agrícola no sul do estado do Amazonas. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 1, p. 67 - 82, 2019.; COSTA SILVA et al, 2021).

O avanço da pecuária, da extração de madeira e dos projetos de extração mineral e energéticos convergem como um conjunto de pressões político-territoriais relacionados às mudanças nas políticas de gestão ambiental e territorial, a exemplo das alterações do Código Florestal (2012), alterações no Código de Mineração (2018), alterações no Projeto Terra Legal (Lei 11.952/09 e a Lei 13. 465/2017), que ficou conhecida como a “MP da Grilagem” (Ribeiro et al., 2018RIBEIRO, A. F. A.; SANTOS, J. L; COSTA SILVA, R. G; RODRIGUES, C. B. P. A agenda territorial do agrohidronegócio em tempos de golpe: análise da “nova” lei de terras do Brasil. OKARA: GEOGRAFIA EM DEBATE (UFPB), v. 12, p. 678-698, 2018. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/okara/article/view/41336
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). As alterações nos instrumentos jurídicos e normativos de gestão do território permitiram aos diversos capitais/empresas a se apropriarem da natureza, muitas vezes legalizando terras griladas e, assim, expandindo a fronteira em AP sob o signo da violência.

A resposta do Estado brasileiro em conter o avanço do desmatamento na região Amazônica e a invasão de terras públicas, dentre vários instrumentos jurídicos, certamente a institucionalização de Áreas Protegidas - entendidas com Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Áreas Quilombolas - e a fiscalização interinstitucional mais ampla foram os mecanismos de maior efetividade na região, o que permitiu a redução da taxa de incremento do desmatamento no período de 2005 a 2012, aumentando no período de 2013 a 2018 (INPE/PRODES, 2019).

Contudo, no plano interno da ação governamental, apesar da inclusão das Áreas Protegidas no contexto de gestão e ordenamento do território pelo Estado, percebe-se a fragilidade endógena que tem possibilitado a geração de conflitos no sul do Amazonas. Em especial, algumas UC, tanto de proteção integral quanto de uso sustentável, não têm a plena regularização fundiária, algumas sem plano de manejo, conselho gestor e a falta/escassez de servidores públicos para gerenciamento das unidades de conservação.

Essas fragilidades permitiram, no plano externo, a sobreposição de áreas de diferentes usos, invasão de pecuaristas, garimpeiros, madeireiros, grileiros e, por consequência, frentes de desmatamento que tende cada vez mais a reconfigurar a fronteira nos limites e dentro do território de algumas áreas protegidas. Segundo os dados do INPE, em 2020, no estado do Amazonas as UC’s tiveram 42,78km² de áreas desmatadas no seu interior e as TI’s 19,09km². Em especial, no sul do Amazonas, o desmatamento concentra-se no PARNA do Mapinguari, localizado nos estados do Amazonas (Lábrea e Canutama) e Rondônia (Porto Velho) e na TI Tenharim do Igarapé Preto (Novo Aripuanã).

Tal conjuntura tem acirrado os conflitos por terra, sendo o conflito um dos fatores que também qualifica a fronteira na Amazônia (MARTINS, 2018). No sul do Amazonas os conflitos envolvendo posseiros, extrativistas, indígenas e pequenos produtores se deslocam para municípios que relativamente não figuravam como região de conflitos agrários, a exemplo do município de Boca do Acre, que nos últimos anos se destacou como um dos mais expressivos crescimentos em conflitos pela terra (CPT, 2018).

Portanto, a expansão da fronteira no sul do Amazonas tende a conceber as Áreas Protegidas como espaço agrário em disputa. O governo, em suas diversas esferas e agências, tanto pode inibir a fronteira como favorecer sua expansão, constituindo também um campo de disputa institucional, o que sugere que a fronteira não está somente alicerçada na sociedade e nos agentes econômicos, mas nas esferas governamentais que imprimem a transformação no sul do estado do Amazonas.

Considerações Finais

O período da modernização econômica da Amazônia (1960/1980), gestada na ditadura militar, transformou a região em intensa fronteira das economias extrativas, assentadas em grandes projetos hidrelétricos, rodoviários, minerais, agropecuários e migração populacional.

A cartografia dessas dinâmicas territoriais se expressou no aumento populacional, tanto nas cidades como no campo e floresta, impactos ambientais e territoriais, desmatamento e grilagem de terras públicas, somadas as inúmeras tensões socioterritoriais que impuseram à Amazônia uma fronteira do conflito. No âmbito da expansão da fronteira os processos já experienciados em décadas passadas nos estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia, contemporaneamente assume proeminência na Amazônia Sul Ocidental, particularmente no sul do estado do Amazonas.

De modo geral, a expansão da fronteira sul do Amazonas se configura em uma geografia do conflito, justamente por possuir elementos contraditórios relacionados à mercantilização da natureza, quais sejam: pecuária, extração legal e ilegal de madeira, mineração, hidrelétricas, soja e invasões às Áreas Protegidas. A política ambiental, que outrora fora elogiada por instituições internacionais, principalmente pela a relevância ambiental e social das Áreas Protegidas, na atual conjuntura política do Brasil são indicadas como obstáculos ao desenvolvimento econômico, argumento central das forças políticas do agronegócio e demais economias extrativas.

O que se apresenta como elementos novos na dinâmica da fronteira agrícola amazônica nos parece ser as crescentes pressões dos agentes econômicos, com apoio de agências estatais, em erodir o estatuto jurídico das Áreas Protegidas e a desestruturação de toda política ambiental e de direitos territoriais. Nessa leitura, indica-se que a questão da terra se deslocou para os territórios normados (Áreas Protegidas) e áreas devolutas sob a gestão do governo federal, característica comum no estado do Amazonas, em que a gestão do território ainda não atingiu todas as sub-regiões, ou em sub-regiões em que a presença do Estado ainda é incipiente para conter a expansão da fronteira.

Em síntese, a expansão da fronteira na Amazônia se desloca para as áreas demarcadas, áreas públicas destinadas à conservação/proteção ambiental e aos territórios tradicionais dos povos e comunidades amazônicas. Nesses espaços protegidos os diversos grupos econômicos impõem a violência e o crime ambiental como mecanismo de pressão para alicerçar os projetos de mercantilização da natureza vinculado a reprodução econômica do capital. Contemporaneamente, a expansão da fronteira busca a desterritorialização dos povos originários e comunidades tradicionais, ignorando os parcos direitos originários e territoriais garantidos na Constituição Federal de 1988.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao apoio das instituições: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas - FAPEAM e Fundação Rondônia de Amparo ao Desenvolvimento das Ações Científicas e Tecnológicas e à Pesquisa do Estado de Rondônia - FAPERO.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    21 Ago 2019
  • Aceito
    21 Fev 2022
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
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