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ABRAÇO ANTROPOLÓGICO: reflexões sobre o processo de ensino-aprendizagem na Antropologia

ANTHROPOLOGICAL EMBRACE: reflections on the teaching-learning process in anthropology

L’ÉTREINTE ANTHROPOLOGIQUE: réflexions sur le processus d’enseignement et d’apprentissage de l’anthropologie

Resumos

Este trabalho tem como objetivo apresentar considerações teóricas e metodológicas acerca das estratégias de ensino em Antropologia, tomando como base os debates desenvolvidos ao longo do curso “Transformação, corporeidade e afeto na criação do conhecimento acadêmico em tempos de crise”, seminário especial vinculado à Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e realizado no primeiro semestre de 2020 em formato remoto devido à pandemia de covid-19. Refletindo sobre as possibilidades investigativas que surgem a partir do reconhecimento das afetividades e da aproximação com outras formas de saber, apresentamos um relato descritivo e propositivo sobre a experiência deste curso, no qual implementamos e debatemos metodologias que levam em consideração esses aspectos tanto na sala de aula como no trabalho de campo. Como resultados, destacamos que o espaço de formação acadêmica baseado na experimentação de percepções, reflexões e partilhas que aproximem conhecimentos acadêmicos formais e métodos de educação populares se mostrou como uma possibilidade profícua, sempre em construção, de reflexão crítica e dialógica.

Ensino de Antropologia; Diálogo de saberes; Ensino remoto


This paper aims to present theoretical and methodological considerations about teaching strategies in Anthropology, based on the debates developed during the course “Transformation, corporeality and affection in the construction of academic knowledge in times of crisis”, a special seminar held at the Federal University of Paraíba (UFPB) in the first semester of 2020 in remote format due to the covid-19 pandemic. Reflecting on the investigative opportunities that arise from recognizing affectivities and approaching other forms of knowledge, we present a descriptive and propositional account of the experience of this course, in which we implemented and debated methodologies that take these aspects into account both in the classroom and in fieldwork. As a result, we highlight that the academic training space based on experimenting with perceptions, reflections and exchanges that bring together formal academic knowledge and popular education methods proved to be a fruitful possibility, always under construction, for critical and dialogical reflection.

Teaching Anthropology; Dialogue between Knowledges; Remote Learning


Cet article vise à présenter des considérations théoriques et méthodologiques sur les stratégies d’enseignement en anthropologie, sur la base des débats développés lors du cours “Transformation, corporalité et affection dans la création de connaissances académiques en temps de crise”, un séminaire spécial lié à l’Université fédérale de Paraíba (UFPB) et organisé au premier semestre 2020 dans un format en ligne en raison de la pandémie de covid-19. Réfléchissant aux possibilités d’investigation qui découlent de la reconnaissance de l’affectivité et de l’approche d’autres formes de connaissance, nous présentons un compte rendu descriptif et propositionnel de l’expérience de ce cours, dans lequel nous avons mis en œuvre et débattu de méthodologies qui prennent en compte ces aspects à la fois dans la salle de classe et dans le travail sur le terrain. En conséquence, nous soulignons que l’espace de formation académique basé sur l’expérimentation de perceptions, de réflexions et de partages qui réunissent les connaissances académiques formelles et les méthodes d’éducation populaire s’est avéré être une possibilité fructueuse, toujours en construction, pour une réflexion critique et dialogique.

Enseignement de l’anthropologie; Dialogue entre les savoirs; Enseignement à distance


INTRODUÇÃO

Neste artigo, apresentamos algumas considerações acerca da metodologia de ensino em Antropologia a partir da experiência de um curso especial realizado no período da pandemia de covid-19 na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). O curso “Transformação, corporeidade e afetos na criação do conhecimento acadêmico em tempos de crise” foi ministrado de modo remoto em 2020 e voltou-se à experimentação de percepções, reflexões e partilhas a partir de provocações que afligem a conjuntura atual, buscando aproximar interesses e contribuições entre conhecimentos acadêmicos formais e métodos de educação popular, potencializando assim diálogos, tensionamentos, expressões éticas e poéticas para a constituição de refúgios de resistência.

O fazer científico altamente especializado que tem lugar no ambiente universitário, com frequência deixa de lado elementos fundamentais a serem tomados em conta no processo de aprendizagem, como são os vínculos emocionais, as situações conflitivas do cotidiano de estudantes e docentes, bem como outras formas de conhecimento e saberes práticos que são de maior importância dentro e fora das salas de aula. Especialmente no que toca à formação antropológica, a criação de espaços formativos é uma tarefa importante e árdua que implica tanto descobertas pessoais como compartilhamento de angústias e incômodos referentes ao processo de aprendizagem.

Neste processo, percorremos experiências que são sempre singulares, mas que nos levam a reflexões coletivas enquanto área de conhecimento, permitindo, de diferentes modos, alimentar um olhar crítico e aberto sobre a Antropologia. Nosso objetivo ao propor este curso especial era resgatar ferramentas que promovessem a inclusão de dimensões afetivas, corporais e artísticas como meios para analisar os diversos contextos de interesse na investigação antropológica. Assim, decidimos fazer este registro a maneira de relato de experiência, a fim de apresentar às leitoras e aos leitores distintos elementos trabalhados no curso em questão, que, consideramos, podem fornecer aportes significativos ao ensino da Antropologia e servir de inspiração para a criação de novos espaços educativos nas universidades.

Em território brasileiro, a pandemia de covid-19 foi decretada no dia 20 de março de 2020. Na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), após um breve momento de suspensão das atividades acadêmicas, optou-se por dar continuidade ao período vigente na graduação por meio de atividades realizadas de forma remota.1 1 Ainda sem perspectivas de vacinação e de possibilidades palpáveis de retorno para as atividades presenciais, guiando-se pela resolução n. 13/2020 do Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFPB, entre o período de 6 de junho a 14 de agosto a instituição recomendou a realização de atividades inteiramente remotas. Abriu-se um leque de possibilidades que incentivaram a experimentação de metodologias de ensino virtuais, viabilizando a abertura de componentes curriculares regulares e estágios para os cursos de graduação, mas priorizando a realização de cursos, minicursos, palestras e outras atividades extracurriculares de acordo com a deliberação coletiva de cada departamento de ensino.

O Departamento de Ciências Sociais, sediado no Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA/UFPB, Campus 1 – João Pessoa/PB), optou por realizar cursos livres, oficinas e minicursos, promovendo um espaço para a aplicação de estratégias de ensino voltadas ao contexto remoto, com temáticas e formatos escolhidos pelas/os professoras/es ministrantes. Cabe destacar que houve uma grande mudança nas práticas de ensino em função da mediação imposta pelo isolamento, com a necessidade de utilizar tecnologias de informação e comunicação que anteriormente não eram acessadas tão intensamente e para as quais as universidades não estavam preparadas, tampouco muitas/os estudantes. Ao longo deste período foram se apresentando diferentes problemas relacionados à falta de equipamentos adequados e de treinamento para seu uso, bem como à escassez de ambientes virtuais amigáveis, à dificuldade de acesso à internet, ao cansaço intensificado pelo uso de computadores, entre outros.

Ao processo já complexo de ensino-aprendizagem, o ensino remoto trouxe impactos ainda não completamente mensurados para docentes e estudantes. Couceiro e Rosistolato (2022)COUCEIRO, Luiz Alberto; ROSISTOLATO, Rodrigo. Estratégias didático-pedagógicas no ensino on-line de antropologia em contexto pandêmico. Antropolítica - Revista Contemporânea de Antropologia, 54(3), 2022. Disponível em: https://doi.org/10.22409/antropolitica2022.i3.a54262. Acesso em: 14 nov. 2023.
https://doi.org/10.22409/antropolitica20...
escrevem sobre sua experiência docente em disciplinas de Antropologia nos cursos de Ciências Sociais e Pedagogia e sobre as estratégias didático-pedagógicas mediadas por tecnologias de informação e comunicação adotadas durante o período da pandemia de covid-19.2 2 Os autores utilizaram, por exemplo, análises fílmicas e exercícios netnográficos como recursos didáticos. Como explicam os autores, não houve uma migração para o formato EaD, no qual há um direcionamento prévio e planejado das atividades de ensino com a mediação de tecnologias, senão uma adaptação intermediária e temporária a essas. Diante do quadro que se apresentava, a preocupação com a qualidade do ensino era evidente.

Perante a impossibilidade de manutenção das atividades presenciais nas universidades, o curso em questão foi pensado de modo a configurar mais um espaço possível para a convivência e manutenção de vínculos – ainda que limitados – entre a comunidade acadêmica ao longo do período da pandemia de covid-19. Durante aquele momento de profunda incerteza, duas das autoras deste artigo planejaram um curso livre que promovesse o debate sobre formas de produção do conhecimento acadêmico em intersecção com uma metodologia situada na educação popular, concordando assim com Sônia Maluf ao considerar os espaços educacionais “como lugares não apenas de transmissão de conhecimento, mas de reflexão crítica, dialógica e desenvolvimento de potências de transformação social” (2022, p. 117).

A proposta do curso margeou-se pelas relações de afeto compartilhadas entre as docentes e suas experiências pregressas de sala de aula, bem como em outros âmbitos de trabalho coletivo. Ancorado na disciplina antropológica, o curso teve contribuições também das Artes, da Pedagogia e da Filosofia, construindo um trançado feito a muitas mãos com pesquisadoras/es especialistas que se propuseram a abordar o diálogo entre os saberes acadêmicos e populares vinculados à luta por direitos na América Latina. Isto posto, este artigo articula os debates e diálogos produzidos nas relações entre as professoras do curso, pesquisadoras/es convidadas/os, participantes inscritas/os e o público no geral que se somou a esse espaço nomeado carinhosamente de Abraço Antropológico.

Na primeira parte deste texto apresentamos os procedimentos metodológicos que guiaram a criação do curso e algumas das bases teóricas vinculadas às experiências anteriores das professoras proponentes. Já na segunda parte do texto, através das contribuições das/os investigadoras/es que aceitaram participar neste curso especial e de suas respectivas leituras indicadas, tecemos reflexões sobre como corporalidade, afeto, compromisso e criatividade também formam parte da construção do conhecimento acadêmico. Por fim, discorremos criticamente sobre a possibilidade de uma educação voltada à autonomia, com atenção especial ao contexto do ensino de antropologia.

O ABRAÇO ANTROPOLÓGICO E OUTRAS METODOLOGIAS POSSÍVEIS

Como mencionamos, o curso Abraço Antropológico se desenvolveu com a proposta de estimular um olhar crítico sobre a produção do conhecimento acadêmico e fomentar reflexões sobre a formação antropológica tomando por base as experiências pedagógicas prévias das docentes, as quais descreveremos brevemente a seguir. Ao longo do tempo, desenvolvemos diversas atividades práticas com o objetivo de entrelaçar as discussões teóricas do campo da Antropologia com sensorialidades e poéticas a partir de múltiplas perspectivas. Um exemplo das referências utilizadas para embasar a construção do curso e que foi trazida em diferentes ocasiões pela professora Patrícia Pinheiro foi a metodologia dos cafés, que possui como parâmetro a metodologia World Café e foi aplicada com livre adaptação no formato do Abraço Antropológico.3 3 Para mais informações, acesse https://theworldcafe.com.

A dinâmica já havia sido adotada de forma presencial em duas ocasiões anteriores.4 4 A primeira delas, durante a disciplina Teoria Antropológica Contemporânea na Universidade Federal de Pelotas (ministrada por Cláudia Turra Magni e Patrícia Pinheiro em 2015) e a segunda na Universidade Federal da Paraíba (ministrada por Patrícia Pinheiro e Luciana Chianca em 2017). À época, parte da metodologia consistia em organizar debates em espaços diferentes aos da universidade, sendo escolhidos locais que se relacionavam com as diferentes temáticas a serem trabalhadas, como uma estação rodoviária, um parque ou um bar engajado com o movimento feminista, por exemplo. As turmas circulavam pelos locais, observando e interagindo com as pessoas, para só então seguirem para debates gestados a partir das leituras indicadas no programa do curso – que tratavam temáticas relacionadas a procedimentos rituais, interseções entre raça e gênero, relação entre natureza e cultura, entre outras. Embora os lugares visitados muitas vezes fossem familiares para os estudantes, a orientação pedagógica proposta tornava possível um estranhamento positivo a partir da observação sob novos prismas, provocando assim interessantes questionamentos sobre os fenômenos sociais analisados.

Outros elementos enfatizados no curso foram a centralidade da troca de saberes e a inclusão do âmbito simbólico ao considerar a construção de espaços educativos, trabalhados a partir dos diálogos realizados pela professora María Elena Martínez-Torres junto a organizações e movimentos indígenas e camponeses.5 5 Tais diálogos vêm sendo trabalhados pela autora há alguns anos. Para saber mais, consultar Martínez-Torres; Rosset, 2016. Ditos elementos foram incluídos numa série de debates fundamentados na interação entre saberes comunitários com saberes de outras latitudes trabalhados através de seminários e oficinas ofertados pela professora no Centro de Investigações e Estudos Superiores em Antropologia Social (Ciesas Campus Sudeste, México), numa escola autônoma indígena tsotsil,6 6 Pode-se consultar algumas dessas experiências no Bertely, Martinez-Torres, Muñoz, 2015. e na Rede de Programas de Pós-Graduação de San Cristóbal de las Casas (México). A metodologia intercultural foi adotada também no curso intensivo da Escola de Altos Estudos, organizada pela professora Alicia Ferreira Gonçalves, no Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal da Paraíba (PPGA-UFPB) em 2017, com boa recepção de estudantes de pós-graduação e alguns professores da UFPB.

Diferentemente dos contextos antes descritos, no âmbito do curso aqui abordado tivemos que tratar de inserir tais técnicas em um contexto remoto por causa da distância espacial e social imposta naquele momento, quando ainda não conhecíamos caminhos salubres para o ensino virtual e sofríamos com a perda de colegas e familiares para uma doença até então misteriosa. Com o objetivo de realizar essa empreitada, conformamos a equipe do Abraço Antropológico com quatro pessoas (todas vinculadas à UFPB) buscando uma composição diversificada: uma professora visitante mestiça mexicana, uma professora de pós-doutorado afro-brasileira, um estagiário docente branco cursando mestrado em Antropologia e um estudante monitor indígena graduando em Licenciatura em Ciências Sociais e com experiência prévia no uso de tecnologias para ensino (também autor deste artigo). Consideramos que a consolidação dessa equipe permitiu um acompanhamento diversificado e cuidadoso do processo de ensino-aprendizagem, dando conta de uma ampla gama de temáticas que foram articuladas de maneira dinâmica a partir das plataformas de trabalho utilizadas no decorrer do curso.

Para tecer de forma coletiva as reflexões e discussões desde perspectivas diversas, convidamos colegas e lideranças de localizações geográficas variadas como Brasil, México e Guatemala. Deste modo, as conferências ocorreram majoritariamente em português, tendo algumas delas ocorrido em espanhol ou “portunhol”, forma como é nomeada a mistura dos dois idiomas oriunda das experiências prévias de quem fala. Optamos por realizar as conferências e oficinas no formato live, a fim de que nossos convidados e convidadas pudessem chegar a mais estudantes. Em um esforço por democratizar os espaços de divulgação dos conhecimentos produzidos em nosso meio, foram realizadas dez palestras públicas que ficaram gravadas como acervo disponível ao público, todas elas alvo das discussões apresentadas ao longo deste artigo.7 7 Cabe mencionar que todas as sessões foram divulgadas previamente, o que gerou um bom engajamento com o curso. As sessões tiveram uma média de 130 visualizações cada e, dentre essas, destacamos a palestra realizada com Graça Graúna, que foi reproduzida 423 vezes até o momento de escrita deste artigo. Recomendamos a consulta aos encontros na íntegra, disponíveis em: https://www.youtube.com/@MARIATORRES-np9eg/streams..

Utilizamos o plano gratuito da plataforma StreamYard com transmissão automatizada para o YouTube, a fim de poder receber as/os convidadas/os e realizar as lives de forma aberta. Além disso, compreendemos que para desenvolver as discussões de forma mais acolhedora entre a turma necessitamos uma plataforma de reuniões virtuais síncronas que permitisse a divisão da classe em salas simultâneas para que pudéssemos criar pequenos grupos de trabalho. Para tanto, decidimos usar a plataforma BlueJeans, disponibilizada pelo Ciesas/Conahcyt do México, instituição a qual uma das docentes do curso também se vincula. Ao final de nossa experiência, o curso teve dez sessões online, totalizando 30 horas-aula.

A dinâmica das sessões consistia em três momentos pedagógicos síncronos e um assíncrono. O primeiro momento ocorreu por meio da plataforma de videoconferência, tendo duração de cerca de 30 minutos. Após as saudações e boas-vindas, dedicamos os primeiros minutos para solucionar possíveis problemas técnicos de conexão entre discentes e docentes, seguindo posteriormente para a realização de uma atividade coletiva denominada centramento. Nela, fazíamos exercícios de 15 a 20 minutos voltados à ampliação da consciência corporal e da qualidade de atenção, finalizando com uma breve discussão sobre a semana anterior e possíveis ajustes das atividades do curso.

O segundo momento contava com a participação de um/a pesquisador/a convidado/a que ministrava uma aula expositiva sobre suas experiências e temas de pesquisa por meio de uma conferência ao vivo divulgada previamente. Esse momento público teve durações variáveis, entre 60 e 110 minutos, incluindo a interação com ouvintes através de mensagens de texto via chat online e respostas das/os expositoras/es e das professoras mediadoras. Depois de um breve recesso, o terceiro momento se dava através da volta para a sala de videoconferência, onde realizamos um momento de troca direta entre estudantes, professoras e convidadas/os com discussões em grupos menores, finalizando com a designação de atividades a serem realizadas de forma assíncrona ao longo da semana.

Como base para os momentos de compartilhamento síncrono de conteúdos, cada uma das sessões contou com recomendações de leituras focadas nas falas das/os expositoras/es, resultando em uma ementa composta majoritariamente por textos discutidos e apresentados pelas/os próprias/os autoras/es convidadas/os. Durante o momento assíncrono, as/os estudantes realizavam atividades em formatos diversos – tais como textos manuscritos, desenhos, fotografias autorais, colagens de imagens etc. – para acompanhar o conteúdo de cada uma das sessões, construindo um panorama de reações às bibliografias e aos debates realizados previamente. Essas contribuições eram enviadas por e-mail, compartilhadas em um grupo de troca de mensagens ou apresentadas em momentos específicos nas aulas por videochamada. Parte dessas reações constituiu um acervo de imagens mantido em um perfil coletivo privado na rede social Instagram, de acordo com a prévia pactuação coletiva.

Como mencionado anteriormente, um dos recursos metodológicos que se destacaram em meio à orientação transversal do curso foi o centramento, durante o qual se buscava uma percepção integral dos diferentes elementos que constituem nossas corporalidades – de estudantes, docentes e palestrantes. Partindo da “premissa metodológica de que o corpo não é um objeto a ser estudado em relação à cultura, mas é o sujeito da cultura; em outras palavras, a base existencial da cultura” (CSORDAS, 2008CSORDAS, Thomas. A corporeidade como um paradigma para a Antropologia. In: CSORDAS, Thomas. Corpo/significado/cura. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p. 101-146., p. 102), argumentamos que todo processo de ensino-aprendizagem é beneficiado quando se utilizam técnicas que atravessam o corpo e fazem uso dos sentidos e afetos para gerar reflexões. Em consonância com Paulo Freire compreendemos que, apesar de haverem sido historicamente menosprezadas perante a intelectualidade, as práticas corporais podem efetivamente contribuir a uma melhor compreensão nas atividades pedagógicas: “de modo geral o chamado primeiro mundo em certo sentido tem uma espécie de remorso pelo corpo, ele tem uma vergonha do corpo, [...] eu acho que uma das contribuições que a gente pode dar [...] é exatamente o valor do corpo na cultura” (Lopes; Freire, 1990).

Figura 1
Guiando outros corpos, fazendo sentir

Assim, no início de cada uma das sessões voltamos nossa atenção de forma especial para as sensações percebidas no corpo, bem como para as emoções individuais e coletivas gestadas naquele período. Diante das orientações proferidas por uma das professoras, todos fechavam os olhos e detinham a atenção em diferentes partes do corpo, priorizando o universo sensível e evocando indagações, como: “Como estou me sentindo hoje? Estou confortável fisicamente? Meu corpo dói em algum lugar? Consigo perceber o ar que toca a minha pele e a temperatura das diferentes partes do meu corpo? O que muda na minha percepção quando fecho meus olhos?”, entre outras. Esse tipo de dinâmica que conduz a atenção ao âmbito corpóreo como base da aprendizagem tem sido pouco praticada nos espaços de ensino de Antropologia, mas podemos observar que já vem sendo apontada desde os trabalhos de Paulo Freire, por exemplo, quando o pedagogo afirma que “a minha consciência não está aqui no coração, nem na cabeça, nem no pulmão. A minha consciência sou eu mesmo, é o meu corpo que é consciente, é o meu corpo que apreende o outro corpo” (Lopes; Freire, 1990).

Ao longo do curso pudemos constatar que esse reconhecimento constante do corpo contribui ao processo de aprendizagem, despertando nas/os alunas/os um interesse que se refletia em sua presença participativa nesses espaços virtuais compartilhados, mesmo em meio às adversidades que a crise sanitária e o ensino remoto traziam. Durante o Abraço Antropológico diversas/os estudantes teceram comentários contrastando suas experiências em nossos encontros com relação aos outros cursos, expressando, por exemplo, como tinham mais dificuldades de sentir-se presentes em outras aulas ou como tendiam a se entediar com mais facilidade devido à virtualidade. Esses exercícios de centramento, juntamente a outras práticas que experimentamos virtualmente durante o curso, caracterizaram esforços por habitar de melhor maneira os espaços virtuais e compensar os déficits que a perda do vínculo físico causava nos espaços de ensino – exercícios estes que, posteriormente, viriam a ser aplicados em muitas outras aulas e espaços de formação ministrados nos anos seguintes.

Em meio à pandemia global que afetava estudantes e discentes de múltiplas maneiras, o confronto com a morte de familiares, amigos e colegas e a preocupação com a saúde se tornaram pautas permanentes em nossos encontros. Assim, mobilizamos também formas de dar espaço aos sentimentos e afetações das/os estudantes neste contexto. Um exemplo que vale a pena ser destacado foi o de uma sessão especial dedicada ao compartilhamento de saberes ritualísticos, nomeada “A força da espiritualidade e cura da saúde vindo da Mãe Terra: Toré e ancestrais Potiguara e Cerimônias do Fogo Maya”, realizada através do intercâmbio entre tradições do povo Maya, por Metztly Romero, e do povo Potiguara, por Tuxáua Nathan Potiguara. O compartilhamento de experiências entre os convidados desse encontro incentivou a ampla participação da turma a partir de suas próprias narrativas familiares e suas concepções a respeito de temas relacionados à saúde, à espiritualidade e às identidades coletivas. Essa sessão foi interna (sem compartilhamento ao público) e evidenciou um elemento de extrema importância no decorrer do curso aqui relatado, que se refere à construção de um pertencimento coletivo entre as/os estudantes iniciado desde a primeira sessão.8 8 No primeiro encontro iniciamos as atividades com uma apresentação coletiva guiada pela exibição de um símbolo pessoal de cada um/a dos/as estudantes. Neste sentido, não partimos meramente de uma apresentação das professoras, dos cursos e dos nomes dos estudantes, mas sim de uma apresentação que permitia o início da formação dos conhecimentos e vínculos coletivos que ali se construíram.

Nossa preocupação ao adotar essa e outras metodologias de ensino e aprendizagem nas Ciências Sociais e, mais especificamente, na Antropologia, tem sido a de alternar aulas expositivas com outros formatos mais interativos capazes de sensibilizar as/os alunas/os para um estudo profundo da alteridade, criando situações que estimulam a reflexão crítica. A proposta consiste, finalmente, em tornar mais complexo o processo de ensino-aprendizagem a partir de um maior envolvimento das/os estudantes com os contextos analisados. Deste modo, a interação serve como base para o ensino, instigando que as/os estudantes busquem formular perguntas frutíferas para construir um conhecimento mais criativo e colaborativo a partir de suas pesquisas (Barbosa, 2008BARBOSA, Talita Prado. Ensino e aprendizagem de antropologia: um estudo de caso no curso de ciências sociais da Unespe-Marília. Revista de Iniciação Científica da FFC, v. 8, n. 3, p. 338-350, 2008.).

ABRINDO HORIZONTES PARA O CONHECIMENTO ANTROPOLÓGICO

Nesta seção descreveremos algumas das experiências e conhecimentos compartilhados pelas/os professoras/es convidadas/os, tratando de evidenciar as entusiasmantes repercussões que podem ter sobre a formação antropológica. A composição do grupo de palestrantes que recebemos ao longo do curso expressa nosso desejo de trabalhar perspectivas plurais que deem conta de conceber as múltiplas formas de relação e troca de saberes que podem estabelecer-se entre as/os pesquisadoras/es e seus universos de investigação. Apresentaremos os diferentes acercamentos abordados no curso a partir de quatro segmentos que atravessaram os debates e que concernem ao processo de ensino-aprendizagem na Antropologia, a saber, as afetividades, as questões étnicas, as expressões artísticas e a concepção de autonomia.

Deixar-se afetar e implicar-se desde a Antropologia

Na primeira sessão de nosso curso, inauguramos o debate abordando a relação entre os afetos e o contexto político na construção do conhecimento acadêmico em países latino-americanos, tomando por base as experiências de pesquisa de nosso convidado Jonatan Rodas (2020)RODAS, J. Llegar, sentir e implicarse: reflexiones sobre una investigación entorno a las emociones. In: Cruz Hernández, Delmy y Manuel Bayón (coords.). 2020. Cuerpos, territorios y feminismos. Compilación latinoamericana de teorías, metodologías y prácticas políticas. Abya Yala Ediciones – Bajo Tierra Ediciones. p. 201-214. e, em especial, as questões levantadas pelo seu texto “Llegar, sentir e implicarse: reflexiones sobre una investigación en torno a las emociones”. Em sua pesquisa na Guatemala, Rodas advoga pela importância de estabelecer um caminho que vá além da observação participante para compreender a experiência dos sujeitos, defendendo assim uma postura implicada em campo. Em outras palavras, o autor incita a não somente participar da vida dos sujeitos, mas reconhecer-se de fato em uma relação e evitar o processo de reificação do/a pesquisador/a frente ao mundo.

Em sua investigação, Rodas abordou a atuação das mulheres em um contexto de mobilizações de resistência em defesa de territórios tradicionais de povos indígenas e comunidades camponesas diante de projetos da indústria extrativa na Guatemala (Rodas, 2020), trabalho que expôs na sessão do curso, de modo a provocar reflexões críticas sobre as noções de afeto e corporeidade na Antropologia e como essas são determinantes na experiência investigativa. O tema evocou uma série de discussões pertinentes para o desenvolvimento do Abraço Antropológico, como por exemplo reflexões sobre a invalidação dos conhecimentos permeados pelas emoções ou sobre a excessiva racionalização do conhecimento científico oriunda dos ideais iluministas. Essa suposta oposição entre os afetos e a objetividade científica vem sendo questionada amplamente no âmbito da Antropologia nos últimos anos e, vale ressaltar, já havia sido pontuada também por Paulo Freire em trabalhos como “Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa”:

É preciso, por outro lado, reinsistir em que não se pense que a prática educativa vivida com afetividade e alegria, prescinde da formação científica séria e da clareza política dos educadores ou educadoras. A prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade científica, domínio técnico (2002 [1995], p. 53).

Desse modo, percebemos que a afetividade é inerente à vida, aos processos de aprendizagem e, consequentemente, à produção científica. Portanto, partimos do entendimento que uma práxis antropológica de qualidade não deve guiar-se por pressupostos que defendem uma reificação racionalista por meio de uma suposta anulação de nossas emoções. Ao contrário, para a construção de análises mais significativas há de compreender-se que, onde quer que estejamos, somos atravessados pelos nossos afetos. Nossas inserções nos espaços de pesquisa e as relações que construímos com nossas/os interlocutoras/es são pautadas pelos nossos corpos no mundo, sendo permeadas por diversos aspectos subjetivos que afetam o fazer investigativo. Cada corporeidade está implicada em seu campo de trabalho de forma variável, de acordo com os marcadores sociais e as relações gestadas entre pesquisador e interlocutor (inclusive relações de poder pautadas por diferenças de idade, gênero, classe e origem étnico-racial), o que também se estende às relações entre professoras/es e estudantes nos espaços de formação.

Reconhecer a inexistência de respostas únicas para as formas de conceber o afeto na produção do conhecimento é elementar. Cada contexto demanda suas próprias estratégias, a exemplo dos esforços específicos voltados à adequação de uma metodologia de corpo-afeto no contexto do ensino remoto no qual estivemos imbricadas/os ao longo de nosso curso. Em lugar de trabalharmos com receitas metodológicas prontas acerca dos processos de ensino-aprendizagem preestabelecidos, seguimos as pistas dos fluxos da experiência em nosso meio, replicando acertos e melhorando processos de ensino diante das complexas expectativas que enfrentávamos.

Figura 2
Emoções e afetos no trabalho etnográfico

Em sua pesquisa, Rodas (2020)RODAS, J. Llegar, sentir e implicarse: reflexiones sobre una investigación entorno a las emociones. In: Cruz Hernández, Delmy y Manuel Bayón (coords.). 2020. Cuerpos, territorios y feminismos. Compilación latinoamericana de teorías, metodologías y prácticas políticas. Abya Yala Ediciones – Bajo Tierra Ediciones. p. 201-214. propõe uma análise cuidadosa das estratégias de envolvimento com nossas realidades, entendendo que a tomada de consciência sobre a política das emoções na produção do conhecimento pressupõe um movimento de envolver-se – não apenas participando ativamente da vida coletiva, mas também entendendo-se como parte do meio em que se vive. Na sessão conduzida por ele, tanto estudantes como docentes debatemos sobre o meio acadêmico em que convivemos e sobre os mecanismos de violência presentes nele, os quais geram afetações que impactam negativamente os processos de ensino-aprendizagem e também de investigação. Assim, em nossa discussão chegamos à conclusão de que se faz necessário um movimento de sanación dos espaços educacionais, quer dizer, um movimento que, antes de tudo, reconheça tais espaços como lugares capazes de adoecer e finalmente que busque conceber novas estratégias e práticas pedagógicas que ajudem a tornar esse ambiente mais saudável – já seja abordando questões relacionadas à saúde mental ou situações de vulnerabilidade social e econômica, por exemplo.

A ideia de sanación parte de um lugar de cuidado que se vincula à cura física e emocional de nossas corporeidades, gestando uma modificação nos afetos provocados durante nossa presença nos espaços de ensino. Além disso, esse conceito pressupõe ainda o reconhecimento das experiências de opressões históricas que estão enraizadas em nossos corpos e atividades cotidianas, o que leva a outorgar maior protagonismo aos saberes e experiências de pessoas e grupos que historicamente estiveram restritos ao lugar de objetos no estudo acadêmico. Com isso em perspectiva, cabe construirmos um olhar cuidadoso para alavancar os processos de ensino-aprendizagem, entendendo que é através do corpo que experimentamos o mundo e também que é deixando-nos afetar que aprendemos, entregando-nos à intensa curiosidade que nos arrebata e finalmente nos leva a querer investigar determinados assuntos e comprometer-nos com nossos contextos de pesquisa – ou, no caso das práticas de ensino, filiando nossas atividades “à coragem de querer bem aos educandos e à própria prática educativa de que participo [...] a afetividade [...] significa [...] a maneira que tenho de autenticamente selar o meu compromisso com os educandos” (Freire, 2002FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002 [1996]. [1995], p. 53).

Outra convidada que trabalhou temas afins foi Luiza Flores, abordando reflexões sobre a relação entre espiritualidade, corporeidade e territorialidade a partir de sua pesquisa etnográfica na comunidade kilombola Morada da Paz, no Rio Grande do Sul (Flores, 2018). Trata-se de uma pesquisa que não se constitui apenas por laços acadêmicos, mas de vida, com o estabelecimento de uma forte conexão entre sujeitos que ocupam territórios em paralelo às entidades que ocupam sujeitos. Evocando o conceito de ocupação, Flores constrói uma correspondência entre o ato de ocupar escolas do movimento secundarista que ocorreu no Brasil no ano de 2016 e o ato de ocupar o corpo com orixás, entendendo que “ocupar é, portanto, habitar o mundo com outras formas de sentir e de pensar” (informação verbal).9 9 Palestra de Luiza Flores intitulada “Ocupar, retomar, reativar: ‘receitas de resistência’ e conexões possíveis entre quilombolas, indígenas e bruxas” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/VBp1TVyMS54

Flores conecta ainda o ato de ocupar com as retomadas indígenas, tomando como base o caso dos Tupinambá, do Sul da Bahia, relatado pelo Cacique Babau (2019)BABAU, Cacique. Retomada. Piseagrama. Belo Horizonte, 2019. Disponível em: https://piseagrama.org/retomada/. Acesso em: 14 nov. 2023.
https://piseagrama.org/retomada/...
. De maneira análoga às ocupações, as retomadas impulsionam um sentido de enraizamento que se desenvolve a partir do cuidado com a terra. Assim, as noções de ocupar, retomar e reativar se aproximam em seu trabalho como possibilidades de tomar parte no meio onde estamos, reconhecendo ambientes que, assim como nós, estão doentes e precisam ser curados para que seus povos se curem junto. Os debates presentes ao longo dessa sessão acabam aflorando lembranças de Flores sobre as trocas de saberes entre movimentos sociais e a universidade, como neste relato trazido pela convidada em nosso encontro:

Era uma roda de mulheres e lá as Yas fizeram uma fala apresentando a comunidade [Kilombo Morada da Paz, território de Mãe Preta]. Tinha uma mãe com uma criança, a criança não parava de chorar e aquilo produzia um desconforto na mãe. A gente conhece muito bem isso né: mães quando levam suas filhas e aquele desconforto nos espaços universitários, acadêmicos. E a Ya [Yashodhan Abya Yala, Yalasé da comunidade] olhou pra ela, só quem conhece a Ya sabe né, e disse pra ela ficar tranquila porque aquilo, o choro da criança, as crianças correndo pelos espaços, a criança intervindo na fala, faz parte do processo educativo (informação verbal).10 10 Ibidem.

Refletir sobre esse acolhimento das crianças e o respeito a este momento de expansão de sensorialidades trouxe à tona um debate sobre como o espaço universitário sofre muitas vezes de uma impassibilidade, uma postura de indiferença que possivelmente tem suas origens justamente na aspiração ilusória de produzir um conhecimento neutro e objetivo. Assim, com o passar das aulas e o aprofundamento dessas discussões, começamos a distanciar-nos cada vez mais desse tipo de pressupostos para expandir as possibilidades de formação e experimentação como antropólogas/os – ainda que dependêssemos da mediação tecnológica que se impôs como necessária durante o período pandêmico.

Outro de nossos encontros se intitulou “Reinvenções pós-pandêmicas nas Ciências Sociais: velhas questões ainda em aberto”. Nessa sessão, uma das proponentes do curso aqui apresentado, Patrícia Pinheiro, instigou a discussão com base em dois textos. Uma das leituras abordadas neste encontro foi “Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial”, de Donna Haraway (1995)HARAWAY, Donna. Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, n. 5, 1995, p. 07-41.. A discussão denotada nesta ocasião foi a de que sempre há um risco de romantização ou até mesmo de uma apropriação que se torna superficial quando os saberes acadêmicos se propõem a dar voz a grupos sociais subalternizados, mas seguem reticentes a que de fato sejam escutados (pois já possuem voz, cabe saber se a sociedade consegue escutar) e ocupem os espaços de decisão, conformando-se como partes autônomas nos espaços onde estão presentes. Nas palavras de Haraway,

Os posicionamentos dos subjugados não estão isentos de uma reavaliação crítica, de decodificação, desconstrução e interpretação; isto é, seja do modo semiológico, seja do modo hermenêutico da avaliação crítica. As perspectivas dos subjugados não são posições “inocentes”. Ao contrário, elas são preferidas porque, em princípio, são as que têm menor probabilidade de permitir a negação do núcleo crítico e interpretativo de todo conhecimento. Elas têm ampla experiência com os modos de negação através da repressão, do esquecimento e de atos de desaparição - com maneiras de não estar em nenhum lugar ao mesmo tempo que se alega ver tudo (1995, p. 23).

Na construção do conhecimento, Haraway argumenta a favor de políticas e epistemologias de posicionamento, nas quais falamos em parcialidade e situação – que situa a vida das pessoas, suas contradições e complexidade –, ao invés de evocar uma universalidade transcendente. Assim, como nos outros encontros expostos nesta seção, a autora nos convida finalmente a deixar-nos afetar por e implicar-nos em nossos âmbitos de pesquisa, propondo uma ciência que tome em consideração as sensibilidades de modo a promover um conhecimento transformador e crítico.

AFETOS E ATRAVESSAMENTOS ENTRE CORPOS E IDENTIDADES

Outra preocupação basilar do Abraço Antropológico era proporcionar perspectivas que também fossem acolhedoras desde o ponto de vista étnico. Uma das contribuições pensadas com esse objetivo se encontrava também na sessão de Patrícia Pinheiro a partir da outra leitura proposta pela professora, que foi o texto “Por um feminismo afro-latino-americano”, de Lélia González (1988)GONZÁLEZ, Lélia. Por um feminismo afro latinoamericano. In: ISIS International. Mujeres, crisis y movimiento: America Latina y el Caribe. Chile. Vol. IX, Jun. de 1988. p. 132-141., trazendo uma abordagem acerca das especificidades da produção científica feminina negra no cenário brasileiro e planeando um questionamento norteador: como inserir-se em um espaço de produção de conhecimento no qual até pouco tempo atrás concepções racistas eram tidas como uma das correntes teóricas da disciplina?

Lidando com uma antropologia historicamente ditada pelo colonialismo, Lélia González (1988)GONZÁLEZ, Lélia. Por um feminismo afro latinoamericano. In: ISIS International. Mujeres, crisis y movimiento: America Latina y el Caribe. Chile. Vol. IX, Jun. de 1988. p. 132-141. já demonstrava como o afeto gestado por suas próprias experiências permitia possibilidades outras de produção do conhecimento, em especial quando se enfoca no combate das teorias pseudocientíficas que usavam discursos intelectuais para propagar imaginários racistas. González constrói articulações teóricas em oposição a questões como o ideário da branquitude e o mito da democracia racial, ambos temas que incidem sobre a corporeidade tanto da autora como de parte das/dos participantes de nosso curso. Como podemos perceber na trajetória de González, é a partir da inserção de pesquisadoras/es não branco-ocidentais que a Antropologia vai conseguir dar propulsão a investigações mais cuidadosas sobre o contexto colonial brasileiro, algo que pode ser constatado diante dos avanços que observamos nos dias de hoje na produção antropológica.

Dentre as muitas contribuições de González, a intelectual chama a atenção à situação das mulheres negras, que mesmo após a modernização e a desagregação do escravismo, seguiram sofrendo com a manutenção das hierarquias sociais e raciais brasileiras. Entre o racismo, o colonialismo e o sexismo, concorrem e se conectam diferentes processos de subordinação, conformando uma miríade de experiências e efeitos perniciosos para as corporalidades e subjetividades dos sujeitos subalternizados. Assim, as construções racializadas de gênero, por estereótipos, acabam por delimitar o “normal” e o “natural” em desigualdade de poder (González, 1988).

Figura 3
— Amor resistência, cor resistência

A democratização da escrita e da fala é outro movimento da autora, que reverbera diretamente nas formas de compartilhamento da Antropologia e nos pressupostos para a construção teórica do curso aqui apresentado. Combatendo diretamente as formas de escrita elitistas e hegemônicas, em seus textos e falas públicas González demarca sua corporeidade por meio da replicação de sua fala cotidiana. Esse fator constrói um movimento de democratização do conhecimento ao torná-lo mais acessível para grupos sociais que até então não estavam presentes no cotidiano dos espaços de produção científica brasileira. Sua utilização no contexto da formação acadêmica permite o autorreconhecimento de estudantes não brancos que, muitas vezes, acabam se deparando com dificuldades para ajustar-se às expectativas do modo de fala e escrita reproduzido pela maior parte da comunidade acadêmica contemporânea.

Em nosso encontro com Luis Esparza também nos deparamos com questões étnico-identitárias ao tratarmos de experiências vivenciadas em um contexto pré-pandêmico (final de 2019), a partir do programa Morehouse Pan-African Global Experience (MPAGE), apresentadas na fala “Corporeidade e afetividade na (trans)formação da identidade afrodescendente no México: o caso de Veracruz”. Nessa sessão, Esparza nos comentava sobre as iniciativas de trocas de saberes mediadas pelo MPAGE e sobre como essas discussões sobre as comunidades negras em território mexicano se inserem em uma ótica mais ampla de fomento e incentivo à cultura negra ao redor do mundo.

Na edição relatada por ele, Esparza foi convidado para ser um dos coordenadores locais do projeto no México. Na ocasião, um grupo de estudantes afro-estadunidenses realizou um intercâmbio para conhecer comunidades afro-mexicanas em um movimento que impulsionava trocas afetivas e intelectuais entre os coletivos dos dois países. Para tanto, ele organizou uma série de experiências coletivas voltadas às identidades afro-mestiças no México, em especial na costa do Golfo de México, no estado de Veracruz. Assim, ao longo de nosso encontro, Esparza compartilhou algumas propostas articuladas nesse contexto que poderiam nortear uma investigação científica mais sensível ao trabalhar com grupos racializados, como por exemplo a priorização de atividades corporais, a construção de vínculos afetivos e a participação na articulação política dos coletivos.

No encontro com a pesquisadora Vera Rodrigues, intitulado “Afeto, teoria e política na perspectiva de Intelectuais Negras”, nos deparamos com o compartilhamento de saberes que em muito dialogam com as propostas pontuadas até aqui. Rodrigues nos apresenta um grupo de pesquisadoras e militantes negras vinculadas à mobilização política e teórica junto ao projeto Mulheres Negras Resistem, sediado na cidade de Fortaleza, Ceará. O projeto visa construir pontes entre o conhecimento científico e os movimentos sociais, formando um curso ministrado e voltado para mulheres negras que atuam como pesquisadoras e/ou fazem parte de articulações coletivas, abrindo assim caminhos para uma produção negra que não se limita aos reflexos das dores e violências coloniais.

Vera Rodrigues destacou a necessidade de compreendermos de forma integral as diferentes nuances dos processos de construção do conhecimento científico que, como já enfatizado aqui por Rodas (2020)RODAS, J. Llegar, sentir e implicarse: reflexiones sobre una investigación entorno a las emociones. In: Cruz Hernández, Delmy y Manuel Bayón (coords.). 2020. Cuerpos, territorios y feminismos. Compilación latinoamericana de teorías, metodologías y prácticas políticas. Abya Yala Ediciones – Bajo Tierra Ediciones. p. 201-214. e Freire (2002FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002 [1996]. [1995]), não podem seguir sendo limitados pelos paradigmas racionalistas. Para Rodrigues:

Afeto, teoria e política estão juntas em nós. Não queremos uma visão cartesiana de que são coisas separadas. É possível produzir conhecimento, ciência, unindo afeto, teoria e política, porque por exemplo, a teoria, não é nada mais do que uma interpretação do vivido, ela precisa estar colada ao vivido. É assim que a gente entende (informação verbal11 11 Palestra de Vera Rodrigues intitulada “Afeto, teoria e política na perspectiva de Intelectuais Negras” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/o_8EF_Dk4r8. ).

Ao longo do encontro, ela compartilhou diferentes estratégias para fazer esse trançado entre o afeto e o fazer científico ser possível. A exemplo das mobilizações possíveis a partir dos afetos, Rodrigues comentou as experiências de mulheres negras diante do assassinato da vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, que posteriormente viria a impulsionar a articulação que formou o projeto compartilhado por ela em nosso encontro. No livro “Mulheres negras resistem: território, raça/cor e gênero”, organizado por Vera Rodrigues e demais autores (2020), a partir das reflexões gestadas no curso homônimo, a autora traz à tona como os reflexos da dor acabam sendo utilizados para fomentar a movimentação e a articulação coletiva:

Marielle Franco foi morta naquele 14 de março de 2018. E nós, mulheres negras, vivenciamos a dororidade na perspectiva de Piedade (2017). Era um sentir. Era uma dor que “contém as sombras, o vazio, a fala silenciada, a dor causada pelo racismo. E essa dor é preta”. Marielle, mulher negra, estava morta. E essa dor que só pode ser sentida a depender da cor da pele por dizer muito de trajetórias coletivas de vida marcadas pela experiência comum do racismo, especialmente o racismo que mata. Estruturalmente mata. [...] inicialmente parecia um grito preso na garganta. Um sentir doloroso, latejante e sem fim. Mas, o tempo - senhor de todas as demandas -, converteu esse sentir, em um refletir e um agir pautados pelo protagonismo feminino, negro e nordestino (2020, p.17).

No contexto dessa aula, debatemos sobre as dramáticas marcas adquiridas pelo racismo estrutural, pelo avanço do neoliberalismo conservador no contexto brasileiro e também pelo estado de calamidade instaurado pela pandemia de covid-19 – cujas repercussões ainda hoje seguem aprofundando os níveis de desigualdade em todo o mundo. A partir desses diálogos estabelecidos com a pesquisadora, visualizamos como o reconhecimento de nossas emoções e corporeidades pode viabilizar a construção de redes de articulação que promovem espaços mais frutíferos para a troca de saberes e para uma construção coletiva de mundos.

Expressões artísticas como fertilizadoras da formação antropológica

A poesia evoca sensibilidades e sensorialidades, faz brotar diferentes emoções e percepções em quem se aventura em suas linhas, permitindo assim tanto conhecer realidades como imaginar novas possibilidades de mundo através dos afetos que produz. Reconhecendo a importância da linguagem poética para trabalhar uma Antropologia capaz de afetar-se e implicar-se, em uma de nossas sessões realizamos exposições teóricas, proclamação de poemas e outros debates que compuseram o encontro intitulado “Literatura e resistência: poesia indígena em tempos de pandemia”, mediado por Graça Graúna, indígena Potiguara do Rio Grande do Norte, a primeira indígena a doutorar-se em literatura e agora professora da Universidade de Pernambuco (UPE). Por meio de um exercício poético, nos debruçamos sobre as relações entre corpo, território e identidade, reconhecendo a relevância dos usos da literatura indígena como caminho para contornar violências coloniais, como é possível constatar no seguinte trecho da autora:

O dia deu em chuvoso

na geografia do poema

um sonho foi desfeito

mil povos pratearam.

A terra está sentida de tanto sofrimento.

Mas...

Haverá manhã

e o sol cobrirá

com os seus raios de luz

a rosa dos ventos.

(Geografia do Poema, Graça Graúna, 2001GRAÚNA, Graça. Tessituras da Terra. Belo Horizonte: M. E. Edições Alternativas, 2001, p. 46-49.)

A exposição de perspectivas indígenas através da linguagem poética viabiliza um rompimento com estereótipos racistas, promovendo um entendimento mais amplo e autêntico sobre múltiplos aspectos da experiência indígena no Brasil, especialmente sobre os movimentos de resistência. Em um esforço por demonstrar que as sensibilidades indígenas não estão excluídas da produção de arte e conhecimento e que contam com suas próprias formas de expressão, Graúna afirma que “quer seja coletivo ou individual; contado ou cantado; escrito ou falado; em prosa ou em verso; no formato milenar (árvore) ou atual (em papel impresso ou virtual), o livro faz parte também do protagonismo indígena” (2013, p. 120).

Figura 4
Yo tengo un collar, de muchas historias y diferentes etnias

Assim, a autora argumenta que o ensino sobre a temática indígena deve estar diretamente vinculado com as produções literárias, reflexão que ela tece a partir de considerações sobre a promoção da Lei 11.645/2008, vinculada ao ensino de conteúdos negros e indígenas nas escolas de educação básica. Para Graúna, a poesia e a literatura escrita-oralizada por pessoas indígenas se mostram como uma importante ferramenta para dissolver preconceitos construídos a partir do racismo anti-indígena, podendo servir inclusive como subsídio para estratégias de ensino no ambiente acadêmico. Frente à insuficiência dos esforços mobilizados pelas formas de produção do conhecimento acadêmico no combate aos enganos coloniais, Graúna encontra na poesia e em seu potencial afetivo um caminho para a impulsão dos saberes tradicionais.12 12 Para acesso a mais poesias e textos da autora, visite o blog autoral Art’palavra, disponível em: https://ggrauna.blogspot.com/.

Antes de participar de nosso curso, Graça Graúna não havia se proposto a fazer encontros e aulas remotas, dedicando-se sobretudo ao cuidado da saúde pessoal e familiar naquele contexto de pandemia. Após nossa experiência, contudo, a poeta descreveu o curso como um espaço para desaguar sentimentos, constatação que foi determinante para seguir com o planejamento das sessões que nos levou a apelidar carinhosamente nosso curso de Abraço Antropológico. Em meio ao encontro com Graúna, percebemos como a afetividade permite a construção de caminhos que vão em oposição ao desalento e nutrem a esperança.

Ao longo da sessão, dialogamos acerca de poesias que comovem gerando sentimentos de acalanto, dor e frustração quando indagamos sobre as repercussões das violências que afligem as populações indígenas brasileiras. Em contrapartida, vislumbramos em conjunto novas rotas para resistir, como transparece no seguinte trecho de uma mensagem enviada no chat da sessão por uma aluna que comentava as sensações da convidada sobre seus próprios poemas no contexto pandêmico: “é engraçado que você não encontre finais felizes em muitos poemas teus, porque a minha impressão foi oposta. Não apenas em Geografia do poema, todos eles parecem traçar um horizonte de possibilidades” (informação verbal13 13 Comentário realizado na palestra de Graça Graúna intitulada “Literatura e resistência: poesia indígena em tempos de pandemia” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/9L4H0eYlAdc. ).

Esse exemplo permite elucidar sobre o processo de diversificação dos saberes permeados pelos afetos ao longo dessa sessão. Percebemos uma ampla pluralidade de perspectivas gestadas junto às proclamações e aos debates sobre a poesia e a literatura indígena: o que um sujeito sente como melancólico soa para outro como força e coragem, imprimindo nessas experiências pessoais uma nova forma de entendimento que se potencializa por meio da troca de saberes coletiva.

Voltando algumas sessões, durante o encontro com Sônia Bittencourt de Sá aborda-se a leitura como uma atividade frutífera para o exercício da liberdade. Por meio da palestra “Filosofia e literatura, a bricolagem na construção do conhecimento e o espaço do diálogo para a liberdade”, Sá trouxe para o nosso curso uma reflexão interdisciplinar voltada para a compreensão das ações pessoais e coletivas no reconhecimento da autonomia do meio ambiente e de outras vidas e seres presentes em nosso ecossistema. Partindo de uma análise sobre o contexto de meados de 2020, a autora também fez referência ao desprezo por parte do governo da educação e da cultura, que se amplificou durante a pandemia, aumentando a desigualdade na sociedade brasileira. Todos esses temas abordados na bricolagem de Sá se mostraram importantes para pensar as diferentes possibilidades de abordagem antropológica, fazendo reconhecer que a natureza, a cultura, a educação e a política não estão separadas.

A autora trouxe à discussão textos de Eduardo Galeano, Hannah Arendt e San Juan de la Cruz, que foram combinados às suas próprias experiências para tecer uma reflexão sobre o cuidado. Durante o encontro, pudemos dar vazão aos sentires e pensares relativos ao processo de isolamento e às dinâmicas nas quais estávamos inseridos, tomando a aula como um espaço de diálogo que dava propulsão a um sentir coletivo vinculado às diferentes formas de (sobre)viver em meio ao contexto da pandemia e reconhecendo que “o ato educativo é um ato de paciência e cuidado, onde precisamos aprender um tipo de sentimento de solidariedade e ampliar essa capacidade” (informação verbal14 14 Palestra de Sonia Sá intitulada “Filosofia e literatura, a bricolagem na construção do conhecimento e o espaço do diálogo para a liberdade” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/zTL3Q2LEqYg. ).

De forma análoga às linguagens poéticas e literárias, Antonio Prieto Stambaug, da Universidade Veracruzana, encontra no teatro e na performance um espaço profícuo para a evidenciação dos afetos e das memórias. Ao longo da palestra “Teatro e performance para resistir à violência no México contemporâneo”, Stambaug refletiu sobre como o teatro e a performance criam espaços de visibilização de corpos dissidentes ao ocupar um lugar artístico que se enfoca eminentemente sobre a corporeidade. Com a performance, por exemplo, abre-se um espaço de denúncia, expressão e troca de saberes, permitindo assim maior diálogo e viabilizando o compartilhamento de testemunhos e estratégias de cuidado coletivo (Diéguez, 2016DIÉGUEZ, I. C. Cuerpos sin duelo. Iconografías y teatralidades del dolor. México: Universidad Autónoma de Nuevo León, 2016.). A ação rememorada no corpo de quem atua/performa evoca sentimentos tanto de indignação como de empatia, o que pudemos apreciar durante a sessão quando discutimos a performance “¿Donde estás Bruno?”, realizada por Lukas Avendano, artista muxe15 15 Muxe é uma palavra na língua Zapoteca utilizada para denominar uma expressão de gênero não binária presente tradicionalmente nas famílias indígenas Zapoteca da região costeira do estado de Oaxaca, México. Para saber mais, acesse https://www.eldiario.es/catalunya/identidad-cuestiona-pequena-comunidad-mexico_1_2054964.html e/ou consultar STRYKER, Susan. Transgender History: The Roots of Today’s Revolution. 2. ed. Berkeley: Seal Press, 2017. de Oaxaca (México) que denuncia as injustiças sofridas pelas famílias dos desaparecidos políticos no México.

Lukas Avendaño realiza performances públicas para relembrar regularmente e dar visibilidade (inclusive internacional) ao desaparecimento de Bruno Avendaño, ocorrido em 2017. Stambaug destacou como a arte viabiliza um espaço de visibilidade para a causa dos desaparecimentos de civis no México, de uma forma que logra vincular afeto e política. Em “¿Dónde está Bruno Avendaño?” (Lozano, 2019LOZANO, Rían. ¿Dónde está Bruno Avendaño? La práctica artística como “espacio de aparición”. El Ortinotrinco Tachado, n. 8, nov./abr. 2019. Disponível em: https://www.redalyc.org/journal/5315/531557110018/html/. Acesso em: 14 nov. 2023.
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), visualizamos a arte sendo utilizada para sensibilizar e reivindicar o direito à memória, gestando igualmente um espaço de conscientização sobre os impactos sofridos pelas famílias de desaparecidos políticos e a necessidade de responsabilização do Estado frente a esses casos. Em sua sessão, Stambaug nos incitou a ver que, seja no caso do México com o exemplo abordado, seja no do Brasil, com as articulações coletivas de mães e familiares de vítimas de violências praticadas por agentes do Estado, a dor vivenciada por essas famílias tem proporções indecifráveis que somente pode chegar a ser tocada através de expressões sensíveis como as artísticas (Vianna; Farias, 2011VIANNA, Adriana; FARIAS, Juliana. A guerra das mães: dor e política em situações de violência institucional. Cadernos Pagu, Campinas, n. 37, 2011. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/8645008. Acesso em: 15 nov. 2023.
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).

Miradas rumo a um ensino de Antropologia autônomo

Todos os debates e as reflexões aportadas pelas/os palestrantes convidadas/os apontavam, finalmente, para uma práxis antropológica descolonizante. Assim, decidimos finalizar o curso trazendo para o centro da discussão a experiência de uma investigadora zapatista que, ao afetar-se e implicar-se profundamente nas dinâmicas das comunidades racializadas com as quais trabalhou, levou a cabo uma investigação colaborativa.

Em seu livro Política kuxlejal: autonomía indígena, el estado racial e investigación descolonizante en comunidades zapatistas, Mariana Mora (2018)MORA, Mariana. Política Kuxlejal: autonomía indígena, el estado racial e investigación descolonizante en comunidades zapatistas. Ciesas Publicaciones de la Casa Chata. 2018. aborda as relações de autonomia, gênero e racialidade na experiência zapatista. A autora apresenta uma série de questões éticas vinculadas à produção de um conhecimento antropológico descolonizante, tendo como base o trabalho de campo para sua pesquisa. Na introdução do livro, Mora descreve a primeira assembleia em que esteve presente para apresentar seu projeto de investigação e como se posicionou neste espaço, compartilhando o questionamento que fez a suas/seus interlocutoras/es e que viria a ser crucial para o desenvolvimento de seu trabalho junto aos Tseltales e Tojolab’ales no Município Autônomo 17 de Noviembre: “¿Como quieren que se realice el estudio?” (2018, p. 75). A pergunta, direcionada a todas/os as/os presentes na assembleia, inseriu a pesquisa planejada por Mora em um contexto de produção coletiva de conhecimento pensado de forma cuidadosa para aquele espaço.

Figura 5
O corpo, a mente e o campo

Dando seguimento à assembleia, uma longa discussão foi realizada no idioma materno daquela comunidade, língua que Mora sabia pouco. Após algumas traduções pontuais realizadas por uma das lideranças locais, a discussão voltou a ser realizada em espanhol e teve início uma rodada de questionamentos direcionados diretamente à pesquisadora, com o intuito de tirar dúvidas e estabelecer dinâmicas coletivas para a realização daquela investigação na comunidade onde estavam. Assim, a autora, que almejava construir um projeto que partisse de estratégias descolonizantes, buscou reconhecer desde o ponto de partida de seu trabalho investigativo a autonomia zapatista.

Em cada uma das 12 aldeias zapatistas participantes de sua pesquisa, a investigadora se posicionou da mesma forma, buscando honrar desde um início a dinâmica social que ela mesma pretendia estudar: “las conversaciones que describo permiten entender cómo este trabajo de investigación antropológico fue sujeto a las mismas prácticas de la autonomia que yo proponía observar” (2018, p. 79). Inserindo-se no circuito de relações daquele contexto, a autora conseguiu reconhecer a demanda coletiva vinculada ao respeito e à autonomia das comunidades. Para Mora, este giro na postura investigativa não sinaliza tanto um avanço das teorias e práticas antropológicas, mas antes reflete as transformações em curso nos contextos estudados e nas formas de se posicionar dos atores sociais:

Son los actores mismos quienes están estableciendo nuevas condiciones para que la investigación cambie su forma de ser/hacer. En los últimos quince años en Chiapas, la investigación científica se ha tenido que replantear nuevas formas de llevar a cabo un estudio. Los debates en torno a la autonomía y la autodeterminación de los pueblos, durante el zapatismo y previo al levantamiento, han generado efectos concretos en las formas en que miembros de comunidades indígenas aceptan o no que se realicen investigaciones (2011, p. 83).

O exemplo da investigação de Mora foi sumamente significativo para abordar as estratégias e os acordos necessários para a realização de uma pesquisa descolonizante e infundir nas/os estudantes o desejo de realizar etnografias que busquem uma construção coletiva do conhecimento antropológico. Assim, a conclusão do curso trouxe alento para que as discussões metodológicas não tenham lugar apenas no âmbito acadêmico, mas também – e talvez principalmente – nos espaços compartilhados com as populações envolvidas na pesquisa, reconhecendo a fertilidade que as discussões sobre educação e autonomia podem trazer para a formação antropológica e buscando, por fim, vincular a esta uma noção colaborativa de um conhecimento que se constrói junto aos movimentos sociais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como explicitamos a partir dos diálogos realizados ao longo do curso, pouco a pouco antropólogas e antropólogos têm buscado noções e estratégias que deem conta da importância do corpo, dos afetos e das vivências localizadas na atividade investigativa, viabilizando, assim, relações mais justas e sensíveis para a produção de conhecimento em nossa área de estudo. Contudo, apesar desses avanços significativos, ainda são escassos os exemplos de espaços de ensino em Antropologia que de fato fomentem uma educação dialógica movida pela horizontalidade e por um paradigma de trocas de saberes.

A tarefa é árdua. Sendo a teoria antropológica tão intensamente alimentada pela pesquisa etnográfica (fato que se expressa na própria construção da disciplina), temos adiante uma série de desafios a serem tomados em conta para a formação de antropólogas/os. Fazer pesquisa de campo – desde um amplo leque de possibilidades de estar em campo – é essencial, mas como afirma Peirano (1992), ensinar a estar em campo é inviável, ainda mais a partir de encontros que se dão exclusivamente em sala de aula e de manuais de investigação.

Conhecendo as limitações que enfrentamos para alcançar uma apreensão plena da práxis antropológica em disciplinas teóricas, fizemos circular em nosso curso contribuições analíticas e contextos de pesquisa concretos que pudessem instigar novas possibilidades de incursão etnográfica. Nosso questionamento norteador era: como aprimorar e complexificar a qualidade da formação antropológica para além do entendimento das linhagens antropológicas, da preparação técnica e das elucidações sobre a importância do estranhamento em campo? Para Peirano,

Trata-se, mais, de ver brotar no estudante a descoberta de que, atrás do exótico, existe uma outra alternativa, uma outra possibilidade além da que nos é dada. Ao aprender sobre mitos e ritos de povos estranhos, apreende-se um ethos específico: lentamente, como do resultado de um processo de iniciação, o estudante passa a reconhecer a racionalidade do outro, o respeito à alteridade, o relativismo das sociedades e das ideologias, a ausência de distinção fundamental entre os primitivos e os modernos, a horizontalidade das práticas humanas, a afinidade entre a ciência e a magia, entre a magia e a religião (1992, p. 370).

Ao longo da formação acadêmica, a construção de um olhar antropológico demanda um processo intensamente reflexivo de descobertas subjetivas e de questionamento das categorias e dos costumes que carregamos muitas vezes como se fossem universais, processo que finalmente nos brinda uma abertura à escuta e à diversidade. Ao mesmo tempo, a progressiva ocupação da universidade por parte de grupos outrora relegados ao papel de “objeto de estudo” traz ainda outros questionamentos e questões a serem enfrentadas.

Cabe-nos traçar estratégias criativas para desestabilizar os paradigmas que – até então – têm guiado o ensino da Antropologia. Para além de uma abordagem interdisciplinar no que tange às práticas de educação acadêmica, devemos dar especial ênfase às possibilidades de atuação que concernem uma Antropologia implicada e que desafiam a própria prática científica. Uma coisa é certa: faz-se necessário o reconhecimento da afetividade e da noção de autonomia nos processos de ensino para que possamos realizar pesquisas junto a populações historicamente marginalizadas. Se almejamos uma Antropologia sensível e voltada para o reconhecimento da autodeterminação dos povos, devemos nos imbuir de processos de ensino que fomentem estas mesmas qualidades nas/os educadoras/es e educandas/os.

Uma das tendências apontadas por Couceiro e Rosistolato (2022)COUCEIRO, Luiz Alberto; ROSISTOLATO, Rodrigo. Estratégias didático-pedagógicas no ensino on-line de antropologia em contexto pandêmico. Antropolítica - Revista Contemporânea de Antropologia, 54(3), 2022. Disponível em: https://doi.org/10.22409/antropolitica2022.i3.a54262. Acesso em: 14 nov. 2023.
https://doi.org/10.22409/antropolitica20...
nos estudos sobre Antropologia e educação diz respeito às práticas educacionais e de transmissão de conhecimentos que acontecem em espaços diferentes aos escolares ou acadêmicos e que são atravessadas por alteridades, tensionamentos e perspectivas diversas. Um último exemplo que gostaríamos de trazer para pensar em como construir esse tipo de colaboração se encontra nas reflexões trazidas pelo mestre quilombola Antônio Bispo dos Santos (2018)BISPO DOS SANTOS, Antônio. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, 2018. Disponível em: https://piseagrama.org/somos-da-terra/. Acesso em: 14 nov. 2023.
https://piseagrama.org/somos-da-terra/...
. Para Bispo dos Santos, parte da luta do povo quilombola reside na relação constante entre o saber sintético (colonialista, como o do Estado e da Universidade, que intervêm para compor o mundo do Ter) e o saber orgânico (que se desenvolve para compor o mundo do Ser). Assim, enquanto o conhecimento sintético atua no limite da relação com a diferença e estabelece com outras formas de saber uma lógica de imposição e de não escuta, o conhecimento orgânico atua na fronteira, quer dizer, buscando uma forma de intercâmbio que permita o diálogo, mas que ao mesmo tempo não se deixe capturar e aprisionar pelos conhecimentos sintéticos.

À luz dessas reflexões, podemos dizer que o curso “Transformação, corporeidade e afeto na criação do conhecimento acadêmico” procurou justamente reunir diferentes educadoras/es que compartilham o intuito de posicionar-se nestas bordas. O que buscamos com esse Abraço Antropológico foi trazer uma proposta que imprima em seu cerne o diálogo entre saberes sintéticos e orgânicos, entre o conhecimento acadêmico e o das comunidades/movimentos sociais, entendendo que os saberes sintéticos não podem anular os demais e que contamos com uma ampla gama de referências de cientistas e intelectuais que estão presentes nesses diferentes espaços. Em síntese, por meio de nossas metodologias de ensino buscamos promover esse diálogo feito nas bordas para movimentar os paradigmas relacionados ao ensino e fazer despontar no horizonte novas maneiras de tecer as relações entre sujeitos na produção do conhecimento antropológico.

REFERÊNCIAS

  • BABAU, Cacique. Retomada. Piseagrama. Belo Horizonte, 2019. Disponível em: https://piseagrama.org/retomada/ Acesso em: 14 nov. 2023.
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    » https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/8645008
  • 1
    Ainda sem perspectivas de vacinação e de possibilidades palpáveis de retorno para as atividades presenciais, guiando-se pela resolução n. 13/2020 do Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFPB, entre o período de 6 de junho a 14 de agosto a instituição recomendou a realização de atividades inteiramente remotas.
  • 2
    Os autores utilizaram, por exemplo, análises fílmicas e exercícios netnográficos como recursos didáticos.
  • 3
    Para mais informações, acesse https://theworldcafe.com.
  • 4
    A primeira delas, durante a disciplina Teoria Antropológica Contemporânea na Universidade Federal de Pelotas (ministrada por Cláudia Turra Magni e Patrícia Pinheiro em 2015) e a segunda na Universidade Federal da Paraíba (ministrada por Patrícia Pinheiro e Luciana Chianca em 2017).
  • 5
    Tais diálogos vêm sendo trabalhados pela autora há alguns anos. Para saber mais, consultar Martínez-Torres; Rosset, 2016MARTÍNEZ-TORRES, María Elena; ROSSET, Peter. Diálogo de saberes en La Vía Campesina. Espacio Regional, v. 1, n. 13, jan./jun. 2016. Disponível em: https://revistaespacioregional.ulagos.cl/index.php/espacioregional/article/view/3008.
    https://revistaespacioregional.ulagos.cl...
    .
  • 6
    Pode-se consultar algumas dessas experiências no Bertely, Martinez-Torres, Muñoz, 2015.
  • 7
    Cabe mencionar que todas as sessões foram divulgadas previamente, o que gerou um bom engajamento com o curso. As sessões tiveram uma média de 130 visualizações cada e, dentre essas, destacamos a palestra realizada com Graça Graúna, que foi reproduzida 423 vezes até o momento de escrita deste artigo. Recomendamos a consulta aos encontros na íntegra, disponíveis em: https://www.youtube.com/@MARIATORRES-np9eg/streams..
  • 8
    No primeiro encontro iniciamos as atividades com uma apresentação coletiva guiada pela exibição de um símbolo pessoal de cada um/a dos/as estudantes. Neste sentido, não partimos meramente de uma apresentação das professoras, dos cursos e dos nomes dos estudantes, mas sim de uma apresentação que permitia o início da formação dos conhecimentos e vínculos coletivos que ali se construíram.
  • 9
    Palestra de Luiza Flores intitulada “Ocupar, retomar, reativar: ‘receitas de resistência’ e conexões possíveis entre quilombolas, indígenas e bruxas” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/VBp1TVyMS54
  • 10
    Ibidem.
  • 11
    Palestra de Vera Rodrigues intitulada “Afeto, teoria e política na perspectiva de Intelectuais Negras” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/o_8EF_Dk4r8.
  • 12
    Para acesso a mais poesias e textos da autora, visite o blog autoral Art’palavra, disponível em: https://ggrauna.blogspot.com/.
  • 13
    Comentário realizado na palestra de Graça Graúna intitulada “Literatura e resistência: poesia indígena em tempos de pandemia” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/9L4H0eYlAdc.
  • 14
    Palestra de Sonia Sá intitulada “Filosofia e literatura, a bricolagem na construção do conhecimento e o espaço do diálogo para a liberdade” durante o curso Abraço Antropológico no ano de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/live/zTL3Q2LEqYg.
  • 15
    Muxe é uma palavra na língua Zapoteca utilizada para denominar uma expressão de gênero não binária presente tradicionalmente nas famílias indígenas Zapoteca da região costeira do estado de Oaxaca, México. Para saber mais, acesse https://www.eldiario.es/catalunya/identidad-cuestiona-pequena-comunidad-mexico_1_2054964.html e/ou consultar STRYKER, Susan. Transgender History: The Roots of Today’s Revolution. 2. ed. Berkeley: Seal Press, 2017.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    05 Abr 2023
  • Aceito
    08 Nov 2023
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