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Previsão do Consumo Agregado: o papel de índices de confiança do consumidor O autor Fábio A. R. Gomes agradece ao CNPq pelo financiamento parcial deste trabalho (303172/2017-7).

Resumo

Este artigo investiga se os índices de confiança do consumidor podem melhorar as projeções do consumo agregado no Brasil, levando em conta informações dos fundamentos econômicos contidas em defasagens de indicadores financeiros e das taxas de crescimento do PIB e do volume de crédito às famílias. Nesse contexto, permitimos estruturas de defasagens distintas entre os potenciais preditores do consumo, o que dá origem a um grande espaço de potenciais modelos. Usamos, então, técnicas de ponderação bayesiana de modelos como uma estratégia agnóstica para lidar com a inerente incerteza sobre o modelo. Esta abordagem nos permitiu investigar quais regressores podem ser considerados robustos. Os resultados sugerem que PIB, crédito às famílias, retorno do mercado acionário e indicadores de confiança dos consumidores apresentam um potencial preditivo robusto na análise dentro da amostra. Finalmente, os resultados fora da amostra sugerem um papel não desprezível para os índices de confiança do consumidor na previsão da taxa de crescimento do consumo agregado no Brasil, especialmente em horizontes de previsão curtos.

Palavras-chave:
Consumo agregado; Índices de confiança do consumidor; Previsão; Ponderação bayesiana de modelos

Abstract

This paper investigates whether consumer confidence indices can improve the forecasts of aggregate consumption in Brazil, taking into account information on economic fundamentals contained in lagged financial indicators and growth rates of GDP and credit to households. In this context, we allow different lag structures for the potential predictors of consumption, which gives rise to a large space of potential models. Thus, we apply Bayesian model averaging techniques as an agnostic strategy to deal with the inherent uncertainty about the model. This approach allowed us to investigate which predictors can be considered robust. The in-sample results suggest that GDP, credit to households, return on stocks and consumer confidence indices have a robust predictive potential. Finally, the out-of-sample results suggest a not insignificant role for consumer confidence indices in forecasting the growth rate of the aggregate consumption in Brazil, especially for short-term forecasting horizons.

Keyword:
Aggregate consumption; Consumer confidence indices; Forecast; Bayesian model averaging

1. Introdução

O consumo agregado é o componente mais expressivo do PIB na ótica da despesa. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do primeiro trimestre de 1995 ao quarto trimestre de 2019, o consumo correspondeu, em média, a cerca de 63% do PIB no Brasil, sendo relevante a previsão da taxa de crescimento do consumo.1 1 A base de dados utilizada é detalhada na Seção 3. De fato, prevê-la pode constituir um passo importante para a própria previsão da taxa de crescimento do PIB. De qualquer modo, analistas de mercado e de governo acompanham atentamente a evolução do consumo (Weiss 2003). Em particular, profissionais nessas posições se preocupam com a evolução dos índices de confiança do consumidor (Weiss 2003; Ludvigson 2004Ludvigson, Sydney C. 2004. “Consumer confidence and consumer spending.” Journal of Economic Perspectives 18(2) : 29-50.).2 2 Weiss (2003) menciona, também, que os índices de confiança dos consumidores norte-americanos são acompanhados em nível internacional e tem impacto em decisões de investimento na Ásia e na Europa, por exemplo.

Não por acaso, parte da literatura internacional sobre previsão do consumo preocupa-se em investigar a capacidade preditiva de indicadores de confiança do consumidor (Ludvigson 2004Ludvigson, Sydney C. 2004. “Consumer confidence and consumer spending.” Journal of Economic Perspectives 18(2) : 29-50.). Esses indicadores, também chamados de índices de sentimento do consumidor, são construídos a partir das opiniões de consumidores sobre as condições atual e futura da economia (Bentes 2006Bentes, Fabio Gomes Morand. 2006. “O Poder Preditivo do Índice de Confiança de Consumidor no Brasil: Uma Análise através de Vetores Autorregressivos.” Rio de Janeiro 83.). A atenção dada por profissionais e pela mídia aos indicadores de confiança, como forma de antecipar movimentos futuros do consumo e do próprio PIB, levou diferentes pesquisadores a investigar as propriedades de tais indicadores. Por exemplo, após levarem em conta os fundamentos econômicos capturados por defasagens de indicadores macroeconômicos típicos - renda, consumo, taxa de juros e retorno acionário - Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).) e Ludvigson (2004) analisaram se defasagens de índices de confiança do consumidor tem poder preditivo incremental para diferentes categorias do consumo agregado norte-americano. De modo geral, apesar da grande atenção dada às pesquisas de confiança do consumidor, Ludvigson (2004) conclui que os índices de confiança analisados geram um ganho preditivo modesto.

A literatura brasileira sobre consumo tem foco na estimação de equações de Euler derivadas do problema intertemporal do consumidor, o que permite a recuperação de parâmetros estruturais, como a elasticidade de substituição intertemporal (Hall 1988Hall, Robert E. 1988. “Intertemporal substitution in consumption.” Journal of Political Economy 96(2) : 339-357.).3 3 A equação de Euler descreve uma condição que a trajetória ótima do consumo atende (Parker 2008). Na literatura sobre o caso brasileiro há evidência clara de que a taxa de crescimento do consumo depende da taxa de crescimento esperada da renda (Gomes e Paz 2004Gomes, Fábio Augusto Reis, e Lourenço Senne Paz. 2004. “Especificações para a função consumo: Testes para países da América do Sul”. Pesquisa e Planejamento Econômico 34(1): 39-55.; Gomes 2004; de Barros Jr. et al., 2018). Inclusive, esta dependência é, por vezes, interpretada como uma evidência de restrição de crédito (de Barros Jr. et al. 2018). A ideia é simples: ao invés de depender da renda permanente, o consumo dependeria da renda corrente porque o crédito é escasso.4 4 Veja essa discussão em Ludvigson (1999) e Brady (2008).

Quanto à previsão do consumo propriamente, há alguns trabalhos na literatura brasileira que investigam o papel dos índices de confiança dos consumidores. Bentes (2006Bentes, Fabio Gomes Morand. 2006. “O Poder Preditivo do Índice de Confiança de Consumidor no Brasil: Uma Análise através de Vetores Autorregressivos.” Rio de Janeiro 83.) investigou a capacidade preditiva do indicador de confiança do consumidor produzido pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP) por meio da abordagem de vetores autorregressivos (VAR), concluindo que outras variáveis macroeconômicas têm capacidade semelhante à deste indicador para antecipar o comportamento dos gastos dos consumidores. Em análises dentro da amostra, Graminho (2015Graminho, Flávia Mourão. 2015. “Sentimento e Macroeconomia: uma análise dos índices de confiança no Brasil.” Trabalhos para Discussão 408, Brazilian Central Bank.) encontrou evidência de que o índice de confiança do consumidor (da indústria) do Instituto Brasileiro de Economia tem poder preditivo incremental sobre o consumo (a produção industrial), após levar em conta outros indicadores econômicos. Por sua vez, de Oliveira e Carneiro (2015de Oliveira, Fernando Nascimento, e Catarina Carneiro. 2015. Índices de Confiança, suas influências e impactos. Revista Econômica 17(2).) analisaram a relação contemporânea entre o consumo e índices de confiança do consumidor. Ainda que a estimação tenha sido feita pelo Método Generalizado dos Momentos (MGM), esta abordagem é essencialmente diferente da proposta deste trabalho, pois verificamos se defasagens de índices de confiança do consumidor melhoram a previsão do consumo.

Finalmente, em exercícios de previsão fora da amostra, de Mello e Figueiredo (2017de Mello, Euler Pereira, e Francisco Figueiredo. 2017. “Assessing the short-term forecasting power of confidence indices.” Economia Aplicada 21(4): 713-727.) investigaram o poder preditivo de diversos índices de confiança com respeito a variáveis que medem o nível de atividade econômica, incluindo o consumo das famílias. Basicamente, os autores estimaram modelos univariados autorregressivos para cada medida do nível de atividade e, posteriormente, incluíram em tais modelos defasagens dos índices de confiança para verificar se a inclusão gera ganhos em termos de previsibilidade. No caso do consumo agregado das famílias não há evidência de que qualquer índice de confiança usado apresente previsão melhor do que o simples modelo AR(p). Em alguma medida, isso pode ser devido à estratégia particular dos autores de simplesmente acrescentarem defasagens dos índices do confiança aos modelos AR(p).

Nosso objetivo neste trabalho é prever a evolução do consumo agregado, considerando um arcabouço já consolidado na literatura internacional que investiga a capacidade incremental de previsão de índices de confiança do consumidor. Também nos apoiamos na literatura brasileira para justificar os preditores do consumo selecionados. Dessa forma, em linha com Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).) e Ludvigson (2004) usamos defasagens do próprio consumo agregado, do PIB, da taxa de juros Selic e do retorno do Ibovespa para capturar os fundamentos econômicos, além de defasagens de índices de confiança. Adicionalmente, consideramos informações sobre o crédito, uma vez que há evidência de substancial restrição de crédito no Brasil, a despeito de o volume de crédito ter crescido consideravelmente a partir de 2004, como discutido na Seção 3.

Quanto à medida do sentimento dos consumidores, utilizamos três índices de confiança produzidos pela Fecomercio-SP, a saber, o Índice de Condições Econômicas Atuais (ICEA), o Índice de Expectativas do Consumidor (IEC) e o Índice de Confiança do Consumidor (ICC), que é simplesmente uma média ponderada dos dois índices anteriores. Embora exista uma variedade de índices de confiança do consumidor no Brasil, optamos por aqueles cujas séries históricas são mais longas - critério também adotado por Bentes (2006Bentes, Fabio Gomes Morand. 2006. “O Poder Preditivo do Índice de Confiança de Consumidor no Brasil: Uma Análise através de Vetores Autorregressivos.” Rio de Janeiro 83.) -, o que é importante para nossos exercícios de previsão fora da amostra, especialmente porque os dados do consumo e do PIB têm frequência trimestral, o que reduz o número de observações disponíveis relativamente a estudos que empregam dados em frequência mensal.

Portanto, considerando modelos teóricos de consumo bem como a literatura empírica internacional e nacional, construímos uma base de dados em frequência trimestral, de 1995 a 2019, contendo diversos potenciais preditores da taxa de crescimento do consumo. Em relação à literatura nacional, a investigação feita no presente trabalho considera séries mais longas e realmente investiga o poder preditivo incremental dos índices de confiança do consumidor em relação a diversos indicadores macroeconômicos, tanto em análises dentro da amostra quanto fora da amostra.

Se, por um lado, a presença de diferentes potenciais preditores para o consumo é interessante, por outro, ela dá origem ao problema conhecido como incerteza sobre o modelo de previsão (Wright 2008Wright, J. H. 2008. Bayesian Model Averaging and Exchange Rate Forecasts. Journal of Econometrics 146: 329-341., 2009), uma vez que cada preditor tem poder de previsão distinto e não é claro como a combinação entre eles afeta a qualidade da previsão. Para lidar com esta questão, que não é exclusiva deste trabalho, recorremos à ponderação bayesiana de modelos (Bayesian Model Averaging, daqui em diante, BMA) para identificar os preditores robustos à incerteza no modelo para o crescimento do consumo.

Mais especificamente, recorremos ao BMA aplicado à previsão, tal como em Koop e Potter (2004Koop, Gary, e Simon Potter. 2004. “Forecasting in Dynamic Factor Models Using Bayesian Model Averaging.” The Econometrics Journal 7(2): 550-65.), Garratt et al. (2009Garratt, A., G. Koop, E. Mise, e S. P. Vahey. 2009. “Real-time Prediction with U.K. monetary aggregates in the presence of model uncertainty”. Journal of Business and Economic Statistics 27(4):480-491.), Wright (2008Wright, J. H. 2008. Bayesian Model Averaging and Exchange Rate Forecasts. Journal of Econometrics 146: 329-341., 2009) e Korobilis (2013bKorobilis, Dimitri. 2013b. “VAR forecasting using Bayesian variable selection. Journal of Applied Economics.” 28 : 204-230.). Tal método é importante em nossa análise, uma vez que ele permite sermos agnósticos acerca de quais seriam os “melhores” modelos para o crescimento do consumo no Brasil, delegando a escolha aos dados. Além disso, tal método permite-nos considerar diferentes estruturas de defasagens para cada um dos preditores selecionados, sem que nos comprometamos com uma ou certas estruturas em particular. De fato, dado o número de potenciais preditores selecionados, cada um podendo ter uma estrutura distinta de defasagens, o espaço de modelos em nosso trabalho compreende milhões de modelos, e o BMA permite-nos reduzir drasticamente o espaço de modelos apenas para aqueles empiricamente relevantes para prever o consumo dentro da amostra. Realizamos, em segundo lugar, análises fora da amostra, que compreendem o nosso exercício de previsão propriamente e principal contribuição.

Os resultados nos exercícios dentro da amostra apontam que a primeira e a segunda defasagens do crescimento do PIB, a primeira defasagem do crescimento do crédito às famílias, a primeira defasagem do retorno do mercado acionário e a quarta defasagem do crescimento dos indicadores de confiança dos consumidores podem ser consideradas preditores robustos do crescimento do consumo no Brasil. Para a análise fora da amostra, seguimos a estratégia de Garratt et al. (2009Garratt, A., G. Koop, E. Mise, e S. P. Vahey. 2009. “Real-time Prediction with U.K. monetary aggregates in the presence of model uncertainty”. Journal of Business and Economic Statistics 27(4):480-491.), em que o BMA contendo as variáveis de interesse tem seu desempenho de previsão comparado ao de um BMA em que tais variáveis são excluídas. Para tal comparação, consideramos diferentes horizontes de previsão e analisamos medidas relativas baseadas no erro quadrático médio de previsão, na verossimilhança preditiva e numa versão bayesiana da estatística de Diebold e Mariano (1995Diebold, F., e R. Mariano. 1995. “Comparing predictive accuracy”. Journal of Business and Economics Statistics v13 : 134-144.). De um modo geral, os resultados sugerem que a previsão do crescimento do consumo no Brasil é mais acurada se o modelo inclui defasagens do crescimento dos indicadores de confiança. No entanto, para horizontes maiores de previsão, o ganho informacional de tais indicadores se reduz. De todo modo, interpretamos os resultados como sugestivos de que indicadores de confiança dos consumidores podem ser considerados preditores robustos do consumo no Brasil, especialmente para previsão de curto prazo.

Além desta introdução, o artigo está organizado do seguinte modo. A Seção 2 apresenta a revisão da literatura internacional e nacional sobre a previsão do consumo. De fato, no caso brasileiro apresentamos uma breve revisão de artigos que estimam equações de Euler do consumidor, uma vez que tal revisão é útil para justificar as variáveis utilizadas nos exercícios de previsão. A Seção 3 apresenta a metodologia econométrica, o que inclui a descrição da base de dados e dos modelos econométricos empregados. Na Seção 4 são apresentados os resultados, tanto da análise dentro da amostra quanto fora da amostra. Por fim, a Seção 5 sumariza os principais resultados e as contribuições deste trabalho.

2. Literatura Relacionada

Na Seção 2.1 apresentamos uma revisão de artigos da literatura internacional sobre previsão do consumo, com ênfase na descrição dos preditores por eles empregados. Na Seção 2.2 apresentamos os artigos da literatura brasileira sobre previsão do consumo. Por fim, na Seção 2.3 apresentamos uma revisão da literatura brasileira sobre equações de Euler cujos resultados são úteis para a escolha de possíveis preditores para a taxa de crescimento do consumo agregado.

2.1. Literatura internacional sobre previsão do consumo

Como discutido por Bentes (2006Bentes, Fabio Gomes Morand. 2006. “O Poder Preditivo do Índice de Confiança de Consumidor no Brasil: Uma Análise através de Vetores Autorregressivos.” Rio de Janeiro 83.), os dois principais índices que medem o grau de confiança dos consumidores norte-americanos são o Consumer Sentiment Index da Universidade de Michigan (CSI) e o Consumer Confidente Index (CCI) calculado pelo Conference Board, uma entidade sem fins lucrativos que elabora índices e pesquisas de interesse público.

Os dois índices são construídos com base na resposta dos entrevistados para cinco perguntas. No entanto, as perguntas não são idênticas nas duas pesquisas, de modo que, embora os índices meçam o mesmo conceito, eles não são diretamente comparáveis (Bram e Ludvigson 1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).; Ludvigson 2004). De todo modo, nos dois casos são feitas duas perguntas sobre a condição corrente da economia e três perguntas sobre a expectativa acerca da condição futura.

Vale ressaltar que a Universidade de Michigan constrói três indicadores: 1) Index of Current Economic Conditions, baseado nas perguntas sobre as condições correntes; 2) Index of Consumer Expectations, baseado nas perguntas sobre as condições futuras; 3) CSI, que é justamente a média ponderada dos dois anteriores com pesos de 40% e 60%, respectivamente. O Conference Board atua da mesma forma, produzindo três indicadores: 1) Present Situation Index; 2) Expectations Index; 3) CCI, também uma média ponderada dos dois anteriores com pesos de 40% e 60%, respectivamente. Portanto, tanto o CSI quanto o CCI são formados por dois subíndices.

Parte da literatura que emprega os índices de confiança do consumidor tem como foco a previsão do nível de atividade, ao invés de especificamente o consumo. Por exemplo, Leeper (1992Leeper, Eric M. “Consumer attitudes: king for a day.” 1992. Federal Reserve Bank of Atlanta Economic Review 77(4): 1-15.) investigou a relação entre índices de confiança e o nível de atividade da economia norte-americana, considerando, também, indicadores financeiros para capturar os fundamentos econômicos.5 5 Por meio de modelos VAR, Leeper (1992) investigou se choques inesperados no Index of Consumer Expectations, produzido pela Universidade de Michigan, tem poder preditivo sobre a produção industrial e a taxa de desemprego. Ao levar em conta o índice S&P 500 e a taxa de juros de curto prazo, o sentimento do consumidor perde capacidade de prever o nível de atividade da economia norte-americana. O uso de outros indicadores macroeconômicos, em particular, índices financeiros, tornou-se habitual em estudos cuja ênfase era antecipar o comportamento do consumo.

Carroll et al. (1994Carroll, Christopher D., Jeffrey C. Fuhrer, e David W. Wilcox. 1994. “Does consumer sentiment forecast household spending? If so, why?” The American Economic Review 84(5): 1397-1408.) investigaram se defasagens do índice de confiança tem poder preditivo acerca do comportamento futuro do consumo. Para tanto, os autores regrediram a taxa de crescimento de diferentes categorias do consumo, incluindo o consumo total, contra defasagens do índice de confiança do consumidor e da taxa de crescimento da renda do trabalho e do próprio consumo. Os resultados indicaram que o sentimento do consumidor tem algum poder preditivo incremental, embora modesto, em relação a essas variáveis. De todo modo, é importante destacar que este é um exercício de previsão dentro da amostra que, consequentemente, não mimetiza a situação enfrentada por analistas de mercado e de governo (previsão fora da amostra).

Não por acaso, Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).) argumentaram que apesar da popularidade dos índices de confiança do consumidor, não havia consenso sobre a capacidade deles de capturarem informações sobre os gastos futuros dos consumidores que já não seriam capturadas por indicadores econômicos típicos. Com o intuito de resolver esse impasse, esses autores investigaram o poder preditivo incremental de defasagens dos índices de confiança da Universidade de Michigan e do Conference Board, considerando no modelo quatro defasagens taxa de crescimento do consumo e da renda do trabalho, do retorno do mercado acionário (S&P 500) e da primeira diferença da taxa de juros de curto prazo (three-month Treasury bill).6 6 De fato, Bram e Ludvigson (1998) consideraram o índice geral do sentimento do consumidor de cada uma dessas pesquisas - CSI e CCI -, mas, também, o subíndice de expectativa da situação futura da economia de cada uma delas. Embora os resultados sejam sensíveis à medida de consumo analisada, de um modo geral, tanto nas análises dentro quanto fora da amostra, os índices de confiança do Conference Board apresentaram desempenho melhor do que os índices da Universidade de Michigan.

Ludvigson (2004Ludvigson, Sydney C. 2004. “Consumer confidence and consumer spending.” Journal of Economic Perspectives 18(2) : 29-50.) fez uma análise extensiva do poder preditivo dos índices de confiança do Conference Board e da Universidade de Michigan. A análise dentro da amostra aponta que, após considerar os indicadores macroeconômicos típicos - defasagens do crescimento do consumo e da renda, do retorno acionário e da primeira diferença da taxa de juros do título de 3 meses -, a informação independente proveniente desses índices de confiança tem poder preditivo (incremental) modesto com respeito ao consumo. Apesar dessa conclusão geral, os autores evidenciam que os resultados dependem da medida de consumo empregada. No caso do consumo total, os resultados indicaram que índices do Conference Board e da Universidade de Michigan geram um ganho preditivo modesto, enquanto em outras categorias de consumo os resultados são ainda mais fracos. De todo modo, é importante ressaltar que Ludvigson (2004) teve como foco a análise dentro da amostra.

Quanto à análise fora da amostra, Howrey (2001Howrey, E. Philip. 2001. “The predictive power of the index of consumer sentiment.” Brookings papers on economic activity 2001(1) : 175-207.) destacou o fato que os índices de confiança do primeiro mês do trimestre são rapidamente disponibilizados, podendo ser usados para prever as despesas do consumidor no trimestre. Ao utilizar esta estratégia com o CSI para prever o crescimento trimestral de diferentes categorias de consumo, Howrey (2001) concluiu que tal índice é um preditor estatisticamente relevante. No entanto, uma vez que os valores da despesa de consumo pessoal e da renda disponível do primeiro mês do trimestre são conhecidos, a relevante estatística do CSI desaparece (Howrey, 2001).

Slacalek (2004Slacalek, Jiri. 2004. “Forecasting consumption.” German Institute for Economic Research, DIW, Department of Macro Analysis and Forecasting.) analisou a capacidade preditiva do CSI e do CCI por meio de rolling regressions com data inicial fixa, considerando três modelos: (1) modelo básico composto por duas defasagens de indicadores macroeconômicos típicos; (2) modelo básico acrescido de duas defasagens do indicador de confiança; (3) passeio aleatório. Após a comparação entre os modelos, Slacalek (2004) concluiu que índices de confiança do consumidor fornecem informações adicionais que não estão contidas nas variáveis tipicamente incluídas nas regressões da taxa de crescimento do consumo.

O presente estudo se assemelha ao de Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).) e de Ludvigson (2004) no que diz respeito aos potenciais preditores do consumo, pois consideramos defasagens do próprio consumo, do PIB, do retorno do mercado acionário e da taxa de juros. No entanto, diferentemente de todos esses estudos, empregamos uma abordagem bayesiana que nos permite levar em conta a incerteza sobre o modelo econométrico e, com isso, avaliar se um preditor é robusto.

2.2. Literatura brasileira sobre previsão do consumo

A literatura brasileira investiga a capacidade preditiva de índices de confiança acerca de medidas de atividades reais, como o produto e o consumo agregado.

Bentes (2006Bentes, Fabio Gomes Morand. 2006. “O Poder Preditivo do Índice de Confiança de Consumidor no Brasil: Uma Análise através de Vetores Autorregressivos.” Rio de Janeiro 83.) investigou a capacidade preditiva do ICC produzido pela Fecomercio-SP por meio de modelos VAR, concluindo que tal índice pode ser classificado como indicador antecedente do consumo.7 7 Como discutido na Seção 3.2, há razões para considerar que o erro seja descrito por um processo MA(1). No entanto, ao utilizar o modelo VAR, Bentes (2006) negligenciou esta possibilidade. É importante destacar que tal processo acarretaria uma correlação entre o erro e a primeira defasagem do consumo, causando endogeneidade (Carroll et al, 1994; Ludvigson, 2004). No entanto, o autor também encontrou evidência que outras variáveis macroeconômicas se mostram pelo menos tão eficientes quanto o índice de confiança em antecipar o comportamento dos gastos dos consumidores.8 8 Vale destacar que Bentes (2006) considera os seguintes indicadores macroeconômicos: renda, crédito, desemprego, inflação e produção industrial. Nos diferentes modelos VAR estimados, a inclusão do ICC ora aumentou, ora diminuiu o coeficiente de determinação ajustado da equação do consumo. Nos casos em que houve incremento, o poder explicativo incremental do ICC não superou três pontos percentuais.

Graminho (2015Graminho, Flávia Mourão. 2015. “Sentimento e Macroeconomia: uma análise dos índices de confiança no Brasil.” Trabalhos para Discussão 408, Brazilian Central Bank.) investigou a capacidade preditiva dos índices de confiança do consumidor e da indústria do IBRE-FGV acerca do consumo e da produção industrial. No entanto, diferente da abordagem do presente artigo, Graminho (2015) decompôs esses índices em dois componentes. Um componente é idiossincrático, descrito por um passeio aleatório, sendo denominado “sentimento”. O outro componente é a parcela dos índices de confiança explicada por suas próprias defasagens e por variáveis macroeconômicas típicas. De todo modo, a autora analisou a capacidade dos índices antes de decompô-los e concluiu que os índices de confiança do consumidor (da indústria) precedem temporalmente o consumo (a produção industrial) e tem poder preditivo incremental, em relação a outros indicadores macroeconômicos.

De Mello e Figueiredo (2017de Mello, Euler Pereira, e Francisco Figueiredo. 2017. “Assessing the short-term forecasting power of confidence indices.” Economia Aplicada 21(4): 713-727.) investigaram o poder preditivo de diversos índices de confiança com respeito a variáveis que medem o nível de atividade econômica. Os autores procederam do seguinte modo: i) estimaram um modelo autorregressivo de ordem p, AR(p), para cada medida do nível de atividade; ii) adicionaram em cada um desses modelos defasagens de um dos índices de confiança; iii) por meio de rolling regressions foram geradas previsões de curto prazo fora da amostra9 9 Para ser preciso, de Mello e Fiqueiredo (2017) fazem previsões um período à frente (one-step-ahead) e nowcasting. ;9 iv) comparou-se a habilidade preditiva de cada modelo AR(p) e de sua respectiva versão estendida com os índices de confiança por meio dos testes de Diebold e Mariano (1995Diebold, F., e R. Mariano. 1995. “Comparing predictive accuracy”. Journal of Business and Economics Statistics v13 : 134-144.) e de Hansen (2005Hansen, Peter Reinhard. 2005. “A test for superior predictive ability.” Journal of Business & Economic Statistics 23(4): 365-380.). Os autores também implementaram a abordagem MCS, como sugerido por Hansen, Lunde e Nason (2011). No caso do consumo agregado das famílias não houve evidência de que qualquer índice de confiança usado apresente previsão melhor do que o simples modelo AR(p).

Finalmente, de Oliveira e Carneiro (2015de Oliveira, Fernando Nascimento, e Catarina Carneiro. 2015. Índices de Confiança, suas influências e impactos. Revista Econômica 17(2).) analisaram quais fatores macroeconômicos afetam os indicadores de confiança do consumidor e se esses indicadores são correlacionados com o consumo agregado. Para tanto, os autores regrediram a taxa de crescimento do consumo contra taxa de crescimento de diversos indicadores de confiança. Ainda que a estimação tenha sido feita pelo Método Generalizado dos Momentos, este tipo de exercício é diferente do proposto neste trabalho, uma vez que buscamos verificar se defasagens de índices de confiança do consumidor melhoram a previsão do consumo, após ser levado em conta defasagens de indicadores macroeconômicos típicos. De todo modo, ao incluir nos modelos medidas correntes do nível de atividade, como o PIB, de Oliveira e Carneiro (2015) observaram que em 4 de 16 casos um indicador de confiança mostrou-se relevante, à 5% de significância. Um destes casos refere-se justamente ao ICC da Fecomercio-SP.

Esses estudos da literatura nacional empregaram diferentes abordagens para investigar se indicadores de confiança são preditores relevantes do consumo. No entanto, esses estudos têm um aspecto em comum: não consideraram a incerteza sobre o verdadeiro modelo. Nossa abordagem não somente leva em conta tal incerteza, como investiga um período mais longo e diversos indicadores macroeconômicos, nos permitindo medir o poder preditivo incremental dos indicadores de confiança.

2.3. Equações de Euler e estimações da literatura brasileira

Como mencionado, a literatura sobre consumo no Brasil tem como foco a estimação de equações de Euler derivadas do problema intertemporal do consumidor representativo que, por sua vez, culminam na estimação de parâmetros estruturais. De fato, desde os estudos de Hansen e Singleton (1982Hansen, Lars Peter, e Kenneth J. Singleton. 1982. “Generalized instrumental variables estimation of nonlinear rational expectations models.” Econometrica: Journal of the Econometric Society: 1269-1286.) e Hansen e Singleton (1983) sobre o consumo agregado norte-americano, tornou-se comum a estimação de equações de Euler para recuperar parâmetros como a aversão relativa ao risco, o desconto intertemporal e a elasticidade de substituição intertemporal.

Segundo Gomes e Issler (2017Gomes, Fábio Augusto Reis, e João Victor Issler. 2017. “Testing consumption optimality using aggregate data.” Macroeconomic Dynamics 21(5) : 1119-1140.), a abordagem padrão em macroeconomia consiste em uma economia com um único bem e um consumidor representativo cuja utilidade instantânea é do tipo CRRA. Neste arcabouço, a versão log-linearizada da equação de Euler do problema intertemporal do consumidor é dada por:

Δ ln C t + 1 = μ + ψ r i , t + 1 + ε i , t + 1 , i = 1,..., N (1)

em que Ct+1 é o consumo, ri,t+1 é o retorno do i-ésimo ativo,i=1,...,N, e o termo de erro εi,t+1 é uma inovação, isto é, Et[εi,t+1]=0. Quanto aos parâmetros, ψ é a elasticidade de substituição intertemporal, sendo igual ao recíproco da aversão relativa ao risco.

Campbell e Mankiw (1989Campbell, John Y., e N. Gregory Mankiw. 1989. “Consumption, income, and interest rates: Reinterpreting the time series evidence.” NBER Macroeconomics Annual 4: 185-216.) propuseram uma extensão desta abordagem que foi amplamente implementada na literatura brasileira. Esses autores consideraram que há dois tipos de consumidores. Um que suavizaria o consumo, cuja evolução seria dada pela equação de Euler, no caso a equação (1). Outro que simplesmente seguiria a regra de bolso de consumir a renda corrente, que seria uma fração constante da renda agregada da economia.10 10 O termo em inglês para regra de bolso é rule-of-thumb e, por isso, tornou-se comum o uso de termos como rule-of-thumb consumers e rule-of-thumb behavior. Com isso, os autores propuseram o seguinte modelo:

Δ ln C t + 1 = λ Δ ln Y t + 1 + ( 1 λ ) [ μ + ψ r i , t + 1 + ε i , t + 1 ] , i = 1,..., N (2)

em que Yt é a renda agregada da economia no período t e λ é proporcional à presença de consumidores que seguem a regra de bolso. Assim, quanto maior λ, maior a dependência do consumo agregado em relação à renda agregada corrente.

Diversos estudos estimaram, por meio de variáveis instrumentais, os modelos (1) e (2) para o caso brasileiro e as conclusões são similares, a saber, a taxa de crescimento esperada da renda é relevante, enquanto o retorno esperado do ativo empregado é irrelevante, aos níveis usuais de significância (Cavalcanti 1993Cavalcanti, Carlos B. 1993. “Intertemporal substitution in consumption: an American investigation for Brazil.” Brazilian Review of Econometrics 13(2): 203-229.; Reis et al. 1998Reis, E. J., J. V. Issler, F. A. Blanco, e L. M. D. Carvalho. 1998. “Renda permanente e poupança precaucional: evidências empíricas para o Brasil no passado recente.” Pesquisa e Planejamento Econômico 28(2) : 233-272.; Issler e Rocha 2000Issler, João Victor, e Fernando de Paula Rocha. 2000. “Consumo, restrição à liquidez, e bem estar no Brasil.” Economia Aplicada 4(4): 637-665.; Gomes e Paz 2004Gomes, Fábio Augusto Reis, e Lourenço Senne Paz. 2004. “Especificações para a função consumo: Testes para países da América do Sul”. Pesquisa e Planejamento Econômico 34(1): 39-55.; Gomes 2004; Gomes 2010). Enquanto Cavalcanti (1993) estima λ em torno de 0,32, estudos como de Reis et al. (1998) e Gomes (2004) obtém estimativas mais elevadas, em torno de 0,80. De Barros Jr. et al. (2018) consideram um modelo mais amplo que inclui, por exemplo, formação de hábito. No entanto, os resultados obtidos sugerem que apenas a taxa de crescimento esperada da renda é um fator relevante para a taxa de crescimento do consumo.11 11 Os estudos de Vaidyanathan (1993) e Evans e Karras (1996) estimam λ para um conjunto amplo de países, incluindo o Brasil. Em ambos os casos obtiveram estimativas positivas e significativas de λpara o Brasil.

A justificativa usual para a relevância da expectativa da renda corrente é a existência de restrição de crédito (de Barros Jr. et al. 2018). O consumidor consome de acordo com a renda corrente, ao invés da renda permanente, porque ele enfrenta limitações no acesso ao crédito. Para o caso norte-americano, Ludvigson (1999Ludvigson, Sydney. 1999. “Consumption and credit: a model of time-varying liquidity constraints.” Review of Economics and Statistics 81(3) : 434-447.) e Brady (2008Brady, Ryan R. 2008. “Structural breaks and consumer credit: Is consumption smoothing finally a reality?.” Journal of Macroeconomics 30(3) : 1246-1268.) estimaram equações que são versões linearizadas da equação de Euler do consumidor nas quais constam a taxa de crescimento do crédito. Esta abordagem foi implementada para o caso brasileiro por Endo (2020Endo, Marcos Hitoshi. 2020. “Essays on Consumption Predictability”, tese de doutorado, Universidade de São Paulo.). Empregando intervalos de confiança robustos a instrumentos fracos, esse autor concluiu que a taxa de crescimento esperada da renda e/ou a taxa de crescimento do crédito são relevantes para explicar a taxa de crescimento do consumo.

Como discutido na Seção 2.1, há uma literatura de previsão do consumo que se preocupa em investigar o poder preditivo dos índices de confiança, levando em conta variáveis macroeconômicas típicas. Coincidentemente, defasagens da taxa de crescimento da renda e de indicadores financeiros poderiam ser motivadas pelas equações de Euler (1) e (2). Quanto às defasagens da própria taxa de crescimento do consumo, essas seriam motivadas por modelos com formação de hábito (Kiley 2010). Por fim, a taxa de crescimento do crédito - que adicionamos à lista usual de fundamentos econômicos -, também poderia ser motivada por trabalhos que estimaram equações de Euler do consumidor, como Endo (2020Endo, Marcos Hitoshi. 2020. “Essays on Consumption Predictability”, tese de doutorado, Universidade de São Paulo.).

Embora a literatura de estimação de Equações de Euler e a de previsão do consumo sejam distintas, neste artigo procuramos estabelecer uma conexão entre ambas e, de fato, a análise dos modelos intertemporais sugere o uso de defasagens da renda, do crédito e dos retornos de ativos como possíveis preditores do consumo, em linha com a abordagem de Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).) e de Ludvigson (2004).

3. Metodologia Econométrica

A Seção 3.1 descreve a base de dados utilizada neste estudo. A Seção 3.2 apresenta a metodologia econométrica, o que envolve os exercícios de previsão dentro e fora da amostra.

3.1. Dados

A Tabela 1 apresenta as informações relevantes sobre as variáveis de interesse, como a notação utilizada, a frequência original das séries, e as transformações realizadas. A base de dados tem frequência trimestral, uma restrição advinda do uso do consumo agregado e do PIB. Finalmente, o período amostral inicia-se no primeiro trimestre de 1995 e encerra-se no quarto trimestre de 2019.

Tabela 1
Informações sobre as variáveis sob análise

É importante destacar que desde 1994 a Fecomercio-SP calcula e disponibiliza três índices de sentimento do consumidor: o Índice de Confiança do Consumidor (ICC), o Índice de Condições Econômicas Atuais (ICEA) e o Índice de Expectativas do Consumidor (IEC). De fato, o ICC é um índice global formado pela média ponderada do ICEA e do IEC, cujos pesos são, respectivamente, 40% e 60%. Naturalmente, o objetivo do ICEA é captar o sentimento dos consumidores quanto às suas condições econômicas atuais e do IEC é captar suas expectativas quanto à situação econômica futura. O ICC seria o resultado da percepção dos consumidores quanto às condições corrente e futura. Os três índices variam de zero, que indica pessimismo total, a 200, que indica otimismo total. A amostra que dá origem a esses índices é coletada mensalmente, sendo composta por aproximadamente 2,1 mil consumidores do município de São Paulo.

Como consideramos dados do consumo e do PIB em frequência trimestral, é desejável que o período amostral contemple diversos anos para atingirmos um número razoável de observações, sendo esta a motivação principal para o uso dos indicadores da pesquisa da Fecomércio-SP. Esta pesquisa é a pioneira do país e não sofreu descontinuidade ou interrupções ao longo do tempo. No entanto, esta pesquisa tem um inconveniente, pois, como mencionado, ela se refere ao município de São Paulo. Por um lado, é razoável supor que os respondentes dessa pesquisa sejam influenciados por choques regionais e nacionais. Por outro lado, a agregação do consumo em todo território nacional mitigaria os choques regionais, pois enquanto em uma região haveria choques positivos, em outra haveria choques negativos. Nesta perspectiva, a capacidade do índice de confiança do consumidor paulistano de prever o consumo agregado brasileiro dependeria da magnitude dos choques nacionais e da importância dada a eles por esses consumidores. Naturalmente, esta é uma questão empírica, justamente analisada no presente trabalho.

O painel (a) da Figura 1 apresenta a evolução das taxas de crescimento do consumo e do PIB. Observamos uma maior oscilação na taxa de crescimento do consumo no início da amostra, quando as quedas do consumo em episódios de crise foram mais acentuadas do que as quedas do próprio PIB (crise do México em 1994, crise da Ásia em 1997 e ano eleitoral de 2002). Posteriormente, o PIB passou a apresentar quedas mais acentuadas nas crises, como em 2008, quando ocorreu a crise internacional do subprime, e em 2015, com a crise interna. De todo modo, observamos muita semelhança na evolução das taxas de crescimento do consumo e do PIB.

O painel (b) da Figura 1 apresenta a evolução da taxa de crescimento do crédito às famílias. Para comodidade do leitor, incluímos nesta figura a evolução da taxa de crescimento do consumo. Observamos uma similaridade entre essas taxas de crescimento. Em 2001 houve uma queda acentuada do crédito, mas uma rápida recuperação. Entre 2004 e 2008, a taxa de crescimento do crédito foi elevada e sistematicamente superior à do consumo, havendo uma expansão considerável do volume de crédito. Este período de considerável expansão do crédito é afetado pela crise internacional do subprime. De todo modo, o crédito ainda continuou a apresentar taxas de crescimento positivas, até 2015 com a crise interna.

Figura 1
Taxas de crescimento do consumo e dos preditores selecionados

O painel (c) da Figura 1 apresenta a evolução da taxa de juros Selic e do retorno do Ibovespa. Por simplicidade nos referimos a essas séries por Selic e Ibovespa. Naturalmente, em geral, o Ibovespa supera a Selic, sendo também mais volátil que esta taxa.

Quanto aos índices de confiança do consumidor, construiu-se a média de cada um deles em cada trimestre para se obter índices em frequência trimestral.12 12 Esta estratégia também foi usada por outros autores, como de Oliveira e Carneiro (2015). Por brevidade, referimo-nos a essas séries por ICC, ICEA e IEC, cujas taxas de crescimento são apresentadas no painel (d) da Figura 1. Note-se que, embora as três taxas apresentem comportamentos semelhantes, a do ICEA apresenta oscilações mais pronunciadas em relação às dos outros dois índices, em especial em 1999 no contexto da moratória da Rússia e em 2015, no primeiro ano do segundo mandato da presidente Dilma.

Finalmente, a Tabela 2 apresenta as estatísticas descritivas das séries empregadas nos modelos econométricos, o que inclui a média, o desvio-padrão e o coeficiente de variação de cada variável, além da correlação da primeira defasagem de cada variável com a taxa de crescimento do consumo. Nota-se que tanto a média quanto o desvio padrão da taxa de crescimento consumo são levemente superiores àquelas observadas para o PIB. O crédito apresenta uma taxa de crescimento média superior à do consumo e da renda, o que indica que, de um modo geral, esse foi um período de considerável expansão do crédito. Em termos de volatilidade, como esperado, destaca-se o retorno do Ibovespa, mas também os índices de confiança, especialmente quando se considera o coeficiente de variação. Em termos de correlação da taxa de crescimento do consumo com a primeira defasagem de cada uma das variáveis, destaca-se que em geral rejeita-se que esta correlação seja nula, a 10% de significância. Destaca-se que a relevância da renda e do crédito estão em linha com a evidência de restrição de crédito no Brasil. Por sua vez, a existência de correlação com os dois índices de confiança seriam uma evidência a favor da importância deles para a previsão do consumo. Para inspecionar mais detalhadamente essas questões, empregamos a abordagem econométrica descrita na Seção 3.2.

Tabela 2
Estatística Descritiva

3.2. Abordagem econométrica

Esta seção apresenta a abordagem econométrica utilizada neste trabalho. A subseção 3.2.1 apresenta a metodologia BMA para seleção dos potenciais melhores modelos de previsão e do modelo BMA em si, num procedimento que faz uso de toda a amostra para estimar a verossimilhança marginal de cada modelo. Em seguida, a subseção 3.2.2 apresenta as quantidades utilizadas para avaliar o desempenho fora da amostra do modelo BMA.

3.2.1. Análise dentro da amostra

Neste trabalho estamos interessados em analisar se as taxas de crescimento do ICC (ΔlnStICC), ICEA (ΔlnStICEA) e IEC (ΔlnStIEC) possuem poder preditivo sobre a taxa de crescimento do consumo (ΔlnCt)).13 13 Como mencionado, a Tabela 1 apresenta a notação usada para todas as variáveis. Contudo, embora tenhamos elencado oito variáveis na Tabela 1 cujas defasagens teriam potencial preditivo sobre ΔlnCt, não é claro, dos pontos de vistas teórico e empírico, qual combinação de tais variáveis seria a que melhor descreveria o crescimento do consumo futuro. Além disso, há ainda menos indicação a respeito da estrutura de defasagens que o modelo para a taxa de crescimento do consumo deveria seguir. Por estas razões, seguimos Koop e Potter (2004Koop, Gary, e Simon Potter. 2004. “Forecasting in Dynamic Factor Models Using Bayesian Model Averaging.” The Econometrics Journal 7(2): 550-65.) e Wright (2008Wright, J. H. 2008. Bayesian Model Averaging and Exchange Rate Forecasts. Journal of Econometrics 146: 329-341., 2009) e empregamos a metodologia BMA aplicada a modelos de previsão, o que nos permite admitir a possibilidade de que cada preditor do consumo tenha uma quantidade distinta de defasagens. Neste sentido, tratamos o modelo empírico de crescimento do consumo de maneira mais geral do que, por exemplo, Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).), e levamos em conta a incerteza sobre o modelo.14 14 Considerar que todos os preditores tem o mesmo número defasagens, como em Bram e Ludvigson (1998), implicaria assumir que apenas um subconjunto de modelos possa ter poder explicativo sobre a taxa de crescimento do consumo.

Para ilustrar a metodologia, suponha um conjunto de n modelos M1,,Mn O m-ésimo modelo Mm é indexado pelo conjunto de parâmetros θm, em que θm é potencialmente distinto entre os n modelos. Assumimos que a probabilidade a priori de Mm ser o verdadeiro modelo é π(Mm). Assim, após observarmos os dados, D, a probabilidade posterior do modelo Mm é definida por:

p ( M m | D ) = p ( D | M m ) π ( M m ) i n p ( D | M i ) π ( M i ) , (3)

em que p(D|Mm)=p(D|θm,Mm)π(θm)dθm é a probabilidade marginal do modelo Mm, π(θm) é a probabilidade a priori dos parâmetros no vetor θm e p(D|θm,Mm) é a verossimilhança.

Cada modelo pertencente ao espaço de modelos possui uma densidade de previsão associada, denotada por fm para o modelo Mm. Assim, na presença de incerteza sobre o modelo, a densidade de previsão é dada por

f B M A = i n p ( M i | D ) f i . (4)

Tendo expressadas as probabilidades a priori mencionadas acima, o problema é computar p(Mm|D) e fm para, então, recuperar a previsão ponderada que leva em conta a incerteza sobre o modelo.

Representamos o m-ésimo modelo de previsão do crescimento do consumo por:

Δ l n C t = γ m + β m X t m + ϵ t m . Φ ( L ) ϵ t m = ε t m (5)

em que θm=(γm,βm) é o vetor de parâmetros de interesse e Xt é potencialmente composto de defasagens de quaisquer dos indicadores macroeconômicos dispostos na Tabela 1. O termo de erro é modelado como um processo MA(1), tal que Φ(L)=1+ϕmL, em que L é o operador de defasagem, e em que εtm~iid(0,σε2). Segundo Sarantis e Stewart (2003Sarantis, Nicholas, e Chris Stewart. 2003. “Liquidity constraints, precautionary saving and aggregate consumption: an international comparison.” Economic Modelling 20(6): 1151-1173.), por conter bens duráveis, a taxa de crescimento do consumo total dependeria de um termo MA(1). De fato, Hall (1988Hall, Robert E. 1988. “Intertemporal substitution in consumption.” Journal of Political Economy 96(2) : 339-357.) argumenta que, mesmo no caso de bens não duráveis, haveria correlação serial no erro em virtude da agregação temporal presente nas séries de consumo trimestrais.15 15 Esta correlação serial pode fazer com que o termo de erro seja correlacionado com a primeira defasagem da taxa de crescimento do consumo, causando endogeneidade. Ao modelar explicitamente o termo MA(1), este problema é evitado (Carroll et al., 1994; Ludvigson, 2004).

Seguindo abordagem bayesiana para acomodar as incertezas sobre o modelo para ΔlnCt e sobre o conjunto de parâmetros associados ao m-ésimo modelo (5), assumimos o seguinte esquema de priori:

π ( γ m ) 1 π ( σ ε 2 ) 1 σ ε 2 β m | γ m , ϕ m , σ ε 2 , g N ( 0, g σ ε 2 ( X t ' X t ) 1 ) ϕ m | γ m , β m , σ ε 2 , g N ( 0, Σ ϕ 0 ) π ( γ | w ) = w p γ ( 1 w ) P p γ w B e t a ( b , c )

em que hiper-parâmetros b e c são escolhidos tal que o tamanho médio do modelo seja E[pγ]=κ e Var(pγ)=2κ(Pκ)P. Note que a priori π(γ|w), proposta por Ley e Steel (2009Ley, E., e M. F. J. Steel. 2009. “On the Effect of Prior Assumptions in Bayesian Model Averaging with Applications to Growth Regression.” Journal of Applied Econometrics 24: 651-674.), e w, permitem aos dados influenciarem o tamanho do modelo, o que torna a análise mais robusta em termos de crenças sobre tal parâmetro.

A priori conjugada para βm é dada pela priori “g” de Zellner (1971Zellner A. 1971. An Introduction to Bayesian Inference in Econometrics. Wiley: Nova Iorque.), em que o parâmetro g determina o grau de srinkage do modelo. Neste trabalho, seguimos duas estratégias para tal parâmetro. Seguindo a tradição da literatura BMA, como referência, utilizamos a priori g-BRIC sugerida por Fernandez, Ley e Steel (2001Fernández, C., Eduardo Ley, e Mark F. J. Steel. 2001. “Model uncertainty in cross-country growthregressions.” Journal of Applied Econometrics 16(5): 563-576), em que g=max(T,k2), em que k é o número de potenciais preditores e T o número de observações no tempo. Para acomodar a incerteza sobre g e permitir que os dados possam influenciar tal hiper-parâmetro assumimos a priori Hyper-g/T, proposta por Liang et al. (2008), dada por:

p ( g ) = a 2 2 T ( 1 + g T ) a / 2 , e m q u e a > 2 (6)

O hiper-parâmetro a é calibrado com a=3 seguindo a recomendação de Ley e Steel (2012Ley, E., e M. F. J. Steel. 2012.“Mixtures of g−priors for Bayesian Model Averaging with Economic Applications. Journal of Econometrics 171: 251-266.), que examinaram a performance de distintas configurações de priori sobre g. Como em Ley e Steel (2012), assumimos ainda uma distribuição log-normal para amostragem.

Para computar p(Mm|D) e obtermos as estimativas de interesse, utilizamos uma variação do algoritmo de Gibbs adaptativo (ADGibbs) proposto por Lamnisos, Griffin e Steel (2013aLamnisos, Demitris, Jim E. Griffin, , e Mark F. J. Steel. 2013a. “Adaptive MC3 and Gibbs Algorithms for Bayesian Model Averaging in Linear Regression Models.” CRiSM Working Paper 13-11.), que em nosso trabalho é estendido para acomodar o termo MA(1) e computar a previsão no contexto de BMA.16 16 Lamnisos, Griffin e Steel (2013a) propõem ainda uma versão adaptativa do algoritmo MC3 comumente usado pela literatura BMA, cujo desempenho é ligeiramente superior ao do algoritmo ADGibbs. Optamos pelo último por conveniência de programação e adaptação ao nosso caso, uma vez que o algoritmo de ADGibbs não contém o passo Metropolis-Hastings necessário para amostrar os modelos. Em nosso caso, tal escolha resultaria em até 3 passos via Metropolis-Hastings para o caso da priori Hyper-g/T, o que implicaria num custo computacional mais elevado. Note-se, entretanto, que o desempenho do algoritmo ADGibbs é ainda superior aos obtidos pelos algoritmos MC3 e de Gibbs típicos da literatura. Os autores adaptam para o caso linear os algoritmos propostos por Lamnisos, Griffin e Steel (2013b), que possuem como característica atrativa identificar variáveis redundantes no modelo, atribuindo a elas probabilidades mais baixas de seleção, o que tende a resultar em ganhos de eficiência em relação aos algoritmos de salto reversível e de Gibbs comumente utilizados na literatura. Isso decorre do fato de que variáveis contendo informação similares tendem a inflar a variância dos coeficientes do modelo. Além disso, quando a distribuição marginal posterior não é conhecida e um passo via algoritmo de Metropolis-Hastings é necessário, os autores introduzem um esquema adaptativo que resulta em ganhos adicionais de eficiência computacional. Tal esquema adaptativo calibra automaticamente a variância das distribuições proponentes de modo que as taxas de aceite das amostragens sejam tais que a convergência de medidas ergódicas é garantida (ver Lamnisos, Griffin e Steel 2013a e Lamnisos, Griffin e Steel 2013b para detalhes técnicos).

Para o termo MA(1), seguimos a abordagem de Chib (1993Chib, Siddhartha. 1993. “Bayes regression with autoregressive errors: A Gibbs sampling approach.” Journal of Econometrics 58: 275-294), que mostra que, de posse de uma estimativa de ϕ, uma transformação GLS (Generalized Least Squares) das variáveis do modelo leva a posteriores análogas àquelas obtidas quando o modelo não contém dependência serial. Assim, introduzimos um passo adicional ao algoritmo ADGibbs original, em que amostramos ϕm utilizando sua distribuição posterior, que é normal. Em suma, dado um sorteio de ϕm, transformamos as variáveis seguindo Chib (1993) e aplicamos o algoritmo ADGibbs de Lamnisos, Griffin e Steel (2013aLamnisos, Demitris, Jim E. Griffin, , e Mark F. J. Steel. 2013a. “Adaptive MC3 and Gibbs Algorithms for Bayesian Model Averaging in Linear Regression Models.” CRiSM Working Paper 13-11.).

Além das duas configurações de priori para g, consideramos duas configurações, ambos os casos permitindo que cada preditor possa ter de 1 a 4 defasagens.17 17 A truncagem é feita em 4 devido ao pequeno tamanho da amostra. Na primeira, denotada por C1, permitimos que os potenciais preditores do crescimento do consumo sejam defasagens do consumo, PIB, crédito, Selic, Ibovespa e ICC, de maneira que excluímos os indicadores ICEA e IEC do procedimento. Neste caso, temos um total de 26×4=16.777.216 modelos18 18 Todos os modelos incluem a constante. para visitar e, assim, selecionar um subconjunto com aqueles que melhor ajudariam a prever o crescimento do consumo. As variáveis mais provavelmente selecionadas são interpretadas como previsores robustos. Assim, caso o ICC tenha razoável probabilidade de ser selecionado, interpretamo-lo como sendo preditor robusto, ao menos para fins de previsão dentro da amostra. Na segunda configuração de nossos experimentos, denotada por C2, excluímos o ICC do conjunto de modelos e incluímos defasagens dos potenciais preditores ICEA e IEC. Com isso, o espaço de modelos a ser visitado passa a conter 27×4=268.435.456 modelos.

3.2.2. Análise fora da amostra.

Para a previsão fora da amostra, seguimos a estratégia proposta por Garratt et al. (2009Garratt, A., G. Koop, E. Mise, e S. P. Vahey. 2009. “Real-time Prediction with U.K. monetary aggregates in the presence of model uncertainty”. Journal of Business and Economic Statistics 27(4):480-491.). Para ilustrar o procedimento dos autores, suponhamos que estejamos interessados no potencial ganho de informação de um subconjunto de preditores de interesse, denotado por SPI, em que SPI por conter entre 1 e k variáveis. Dado o contexto de incerteza sobre o modelo, Garratt et al. (2009) propõem analisar o poder preditivo de SPI utilizando um modelo BMA irrestrito, que contém SPI. O desempenho preditivo de tal modelo é, então, comparado ao desempenho de um modelo BMA restrito, que exclui apenas SPI como possíveis preditores. A ideia é que, se o conjunto de informações adicionais contido no modelo irrestrito cumpre papel preditivo, então, a previsão do modelo BMA irrestrito será relativamente mais acurada do que aquela do modelo restrito em razão, justamente, do ganho de informação presente em SPI. Se, por um lado, tal procedimento difere daquele tipicamente utilizado na literatura, em que o modelo de interesse tem sua capacidade preditiva comparada com aquela de um modelo AR(p) (ver, por exemplo, Korobilis 2013aKorobilis, Dimitri. 2013a. “Bayesian forecasting with highly correlated predictors”. Economic Letters 118:148-150., 2013b, Koop e Korobilis 2012Koop, Gary, e Dimitri Korobilis. 2012. “Forecasting inflation using dynamic model averaging.” International Economic Review 53: 867-886.), por outro, ele nos permite acomodar a incerteza sobre o modelo tanto no caso do modelo de referência (BMA restrito) quanto no de interesse (BMA irrestrito).

Os modelos são avaliados usando uma variedade de medidas de desempenho e acurácia de previsão utilizadas na tradição da literatura de previsão bayesiana (Garratt et al. 2009Garratt, A., G. Koop, E. Mise, e S. P. Vahey. 2009. “Real-time Prediction with U.K. monetary aggregates in the presence of model uncertainty”. Journal of Business and Economic Statistics 27(4):480-491., Korobilis 2013aKorobilis, Dimitri. 2013a. “Bayesian forecasting with highly correlated predictors”. Economic Letters 118:148-150., 2013b, Koop e Korobilis 2012Koop, Gary, e Dimitri Korobilis. 2012. “Forecasting inflation using dynamic model averaging.” International Economic Review 53: 867-886., Wright 2008Wright, J. H. 2008. Bayesian Model Averaging and Exchange Rate Forecasts. Journal of Econometrics 146: 329-341., 2009). Três de tais medidas são o Difference of Mean Absolute Forecast Error (DMAE), o Difference of Root Mean Squared Forecast Error (DRMSE) e a medida Bayesian Diebold-Mariano (BDM), todas baseadas no erro quadrático médio de previsão. Além delas, utilizamos também a verossimilhança preditiva (VP). Para as três primeiras medidas, precisamos inicialmente explicitar o erro quadrático médio de previsão (EQM) no contexto BMA. Para tanto, de modo análogo a Wright (2008), iniciamos definindo o modelo m de previsão do consumo para h períodos à frente por:

Δ ln C t + h y t + h m = γ m + β m Z t m + ϑ t + h m (7)

em que Ztm pode conter o valor corrente e de até três defasagens dos preditores do consumo. Dada a amostra D, assumindo que yt+hm é uma variável aleatória, definimos, então, o valor previsto do BMA por:

E ( y t + h | D ) = i n p ( M i | D ) E ( y t + h m | D , M i ) (8)

Na prática, condicionado ao modelo Mi, precisamos de uma estimativa de E(yt+hm|D,Mi), o que requer a simulação de choques ϑt+hm. Este passo é repetido por um número razoável de vezes para cada modelo. Com isso, definimos o EQM por:

E Q M = ( y t + h E ( y t + h | D ) ) 2 = ε t + h 2

cujas contrapartidas amostrais são estimadas por EQM^=1Ni=1Nεi2, em que N é o número de amostras utilizadas na simulação.

Computamos estimativas das medidas DMAE e DRMSE, condicionadas a um certo horizonte de tempo h e tempo t, por meio das seguintes fórmulas:

D M A E = 1 τ 1 h τ 0 + 1 t = τ 0 τ 1 h ( | ε t + h R | | ε t + h I | )

e

D R M S E = E Q M R E Q M I

em que R indica modelo restrito e I modelo irrestrito e τ0 e τ1 indicam o início e o fim da pseudo amostra usada para a previsão fora da amostra. Para ambas as estatísticas, valores altos indicam que o modelo I possui, em média, maior performance preditiva comparativamente ao modelo de referência.

Contudo, como discute Korobilis (2013bKorobilis, Dimitri. 2013b. “VAR forecasting using Bayesian variable selection. Journal of Applied Economics.” 28 : 204-230.), estatísticas como DMAE e DRMSE são úteis para o ranqueamento dos modelos de previsão e permitem o entendimento, por exemplo, do impacto de diferentes prioris para a previsão do BMA. Entretanto, se o interesse for no papel de uma variável adicional na acurácia do modelo de previsão, uma medida útil, inspirada em Diebold e Mariano (1995Diebold, F., e R. Mariano. 1995. “Comparing predictive accuracy”. Journal of Business and Economics Statistics v13 : 134-144.) e proposta por Garratt et al. (2009Garratt, A., G. Koop, E. Mise, e S. P. Vahey. 2009. “Real-time Prediction with U.K. monetary aggregates in the presence of model uncertainty”. Journal of Business and Economic Statistics 27(4):480-491.), pode ser obtida computando-se a distribuição da diferença nas perdas entre dois modelos competidores, restrito contra um irrestrito. Define-se tal diferença por:

d t + h = ( e t + h R ) 2 ( e t + h I R ) 2

em que (et+hR)2 é o erro quadrático de previsão para o modelo restrito e (et+hIR)2 é seu análogo associado ao modelo irrestrito, e em que o subscrito t diz respeito apenas ao pseudo período fora da amostra. Ou seja, dt+h mede a diferença da performance dos modelos restrito e irrestrito para prever a variável dependente. O objetivo é utilizar dt+h a fim de calcularmos uma estatística que é uma medida da diferença no desempenho de previsão entre os modelos com e sem a variável de interesse. O teste frequentista originalmente proposto por Diebold e Mariano (1995Diebold, F., e R. Mariano. 1995. “Comparing predictive accuracy”. Journal of Business and Economics Statistics v13 : 134-144.) baseia-se na nula de que E(dt+h)=0. Entretanto, no contexto bayesiano, dt+h é uma variável aleatória e, como tal, é possível construir a distribuição de tal estatística utilizando o algoritmo de amostragem a fim de se estimar Pr(dt+h), que expressa probabilidade da diferença sistemática entre as acurácias de previsão entre os modelos restrito e irrestrito. Neste caso, Garratt et al. (2009Garratt, A., G. Koop, E. Mise, e S. P. Vahey. 2009. “Real-time Prediction with U.K. monetary aggregates in the presence of model uncertainty”. Journal of Business and Economic Statistics 27(4):480-491.) definem a estatística BDM por

B D M = 1 τ 1 h τ 0 + 1 t = τ 0 τ 1 h Pr ( d t + h > 0 )

Se Pr(dt+h>0)>0,5, ou seja, se um valor positivo para dt+h for mais provável do que um valor negativo, tem-se evidência de que o modelo irrestrito, aquele contendo a variável de interesse, performa melhor do que o modelo restrito, sem tal variável.

Finalmente, dado que as estatísticas acima são baseadas apenas no erro de previsão, computamos a VP, motivada, por exemplo, por Geweke e Amisano (2007Geweke, John, e Gianni Amisano. 2007. “Hierarchical Markov normal mixture models with applications to financial asset returns.” Working Paper Series 831, European Central Bank.), que faz uso de toda a distribuição preditiva associada a certo modelo. No contexto de inúmeros modelos, para o modelo Mi, tal distribuição é denotada por p(yt+hm|Ztm,Mi).

4. Resultados

Executamos 1.200.000 iterações do algoritmo de ADGibbs para cada caso apresentado nesta seção, descartando as primeiras 200.000 iterações para reduzir a dependência dos resultados em relação às iterações iniciais. Os resultados são robustos a diferentes configurações iniciais e ao aumento no número de iterações, indicando convergência do algoritmo. Inicialmente, na Seção 4.1, apresentamos os resultados para a análise dentro da amostra, destacando os preditores considerados robustos. Em seguida, na Seção 4.2, apresentamos os resultados das análises fora da amostra.

4.1. Previsão dentro da amostra

A Tabela 3 apresenta os resultados obtidos por meio da abordagem BMA para a configuração C1, conforme descrito na Seção 3.2. Interpretamos um preditor como robusto se sua probabilidade de inclusão posterior (PIP) for superior a 10% (Koop 2003Koop, Gary. 2003. Bayesian Econometrics. Wiley: Nova Iorque.) e seu parâmetro for estimado com incerteza relativamente baixa (razão entre a média da posterior do coeficiente e o desvio-padrão maior que |1.96|). A motivação é que uma alta incerteza sobre o parâmetro tende a inflar a variância do erro de previsão.

Para a configuração C1, o primeiro resultado a ser notado é a diferença entre o tamanho médio do modelo sob cada esquema de priori. Sob a priori g-BRIC, em média, o BMA tem 6.51 variáveis, enquanto sob a priori Hyper-g/T, o tamanho médio do modelo é de 12.12 variáveis. Não por acaso, as PIPs sob cada esquema de prioris são bastante distintas. Entretanto, as variáveis consideradas robustas são similares em ambos os casos.

Após acomodar a incerteza sobre o modelo econométrico, sob a priori g-BRIC, encontramos que os preditores robustos (PIP10% e razão coeficiente médio/desvio-padrão maior do que |1.96|) da taxa de crescimento do consumo são ΔlnYt1,ΔlnYt2,ΔlnDt1,Rt1B,eΔlnSt4ICC. Quando a priori considerada é Hyper-g/T, o mesmo conjunto de variáveis é considerado robusto. Embora o número de variáveis selecionadas sob tal priori seja praticamente o dobro em termos daquele obtido sob a priori g-BRIC, as médias dos impactos das variáveis adicionais são estimadas com grande incerteza.

Tabela 3
Resultados do BMA para a configuração C1

Os resultados para a análise referente à configuração C2 são apresentados na Tabela 4. Em grande medida, são análogos aos obtidos para C1. Destaca-se que ΔlnSt4IEC parece conter relativamente mais informação sobre o crescimento do consumo corrente do que ΔlnSt4ICEA, embora ambas sejam consideradas preditoras robustas. Assim, os resultados dentro da amostra sugerem que certas defasagens do PIB, do crédito, do retorno no mercado de ações e dos indicadores de confiança do consumidor são preditores robustos do consumo no Brasil.

Tabela 4
Resultados do BMA para a configuração C2

Reportamos que os resultados desta seção são robustos ao aumento do número máximo de defasagens para seis, tanto para C1 quanto para C2. Entretanto, pelo fato de o espaço de modelos aumentar exponencialmente, estatísticas como PIP, tamanho do modelo e coeficientes estimados são afetadas.

Como discutido na Seção 2.3, com base na estimação de equações de Euler do consumidor há ampla evidência de que a taxa de crescimento esperada da renda impacta a taxa de crescimento do consumo, o que é interpretado como uma evidência de restrição de crédito. Ainda, há certa evidência de que o crédito esperado afeta o consumo. Nesta perspectiva, a capacidade da renda e do crédito defasados preverem a taxa de crescimento do consumo é um resultado esperado, embora nas equações de Euler se examine relações contemporâneas enquanto na previsão se examine a precedência temporal. Por um lado, a relevância do mercado acionário não é surpreendente, pois os preços das ações reagiriam rapidamente a mudanças no ambiente econômico. Por outro lado, a literatura estrutural brasileira encontra pouca ou nenhuma evidência de que o consumidor reage à expectativa dos retornos acionários contemporaneamente.

Destaca-se, ainda, que os resultados da configuração C1 constituem evidência de que a confiança do consumidor possui poder preditivo sobre o crescimento futuro do consumo. Neste ínterim, é interessante notar que tal poder preditivo possui quatro trimestres de defasagem, sugerindo que mudanças na confiança do consumo no período corrente se refletirão no consumo do mesmo trimestre do ano subsequente.

No caso da configuração C2, os resultados são similares, com os preditores robustos sendo dados por ΔlnYt1, ΔlnYt2, ΔlnDt1, ΔlnRt1B, ΔlnSt4ICEA e ΔlnSt4IEC. Note-se que, tal como para o ICC, os resultados para a C2 sugerem que tanto o ICEA quanto o IEC têm algum potencial de predizerem o crescimento do consumo 4 trimestres à frente.

Finalmente, é interessante notar que as defasagens do crescimento do consumo não foram consideradas preditores robustos em nenhum dos exercícios, o que está em linha com os trabalhos que não encontraram formação de hábito ao estimarem Equações de Euler do consumidor, como Gomes (2004Gomes, Fábio Augusto Reis, e Lourenço Senne Paz. 2004. “Especificações para a função consumo: Testes para países da América do Sul”. Pesquisa e Planejamento Econômico 34(1): 39-55.) e de Barros Jr. et al. (2018).19 19 De todo modo, como comentado por um parecerista, defasagens do PIB, que inclui o consumo, foram consideradas preditores robustos da taxa de crescimento do consumo.

4.2. Previsão fora da amostra

Passamos, então, a analisar a capacidade preditiva de indicadores de confiança dos consumidores fora da amostra. Para tanto, implementamos o seguinte exercício, inspirado na literatura de previsão bayesiana (Korobilis 2013aKorobilis, Dimitri. 2013a. “Bayesian forecasting with highly correlated predictors”. Economic Letters 118:148-150., 2013b, Koop e Korobilis 2012Koop, Gary, e Dimitri Korobilis. 2012. “Forecasting inflation using dynamic model averaging.” International Economic Review 53: 867-886.): dada a pré-seleção probabilística de certo modelo, 70% da amostra disponível é usada para uma estimativa inicial dos parâmetros dos modelos e, então, a previsão h passos à frente é feita e o erro de previsão é calculado para h=1,2,4,8. Tal erro é dado pela diferença entre o valor observado do crescimento do consumo num certo instante de tempo e o valor previsto pelo modelo para aquele mesmo instante do tempo, sendo tal observação não utilizada no procedimento de estimação. Em seguida, a observação utilizada para aferir a acurácia da previsão é adicionada ao final da amostra inicial e uma nova estimativa e a previsão são calculadas, a fim de se computar mais um erro de previsão. Este procedimento de previsão recursiva é repetido até que toda a pseudo amostra selecionada para aferir a acurácia de previsão do modelo seja coberta20 20 Devido à complexidade e elevados custos computacionais, seguimos Wright (2007, 2008) e estimamos p(Mi|D) em (8) sem utilizar os dados da pseudo amostra. .

Para a previsão fora da amostra, executamos novamente o algoritmo com 1.200.000 de iterações e 200.000 descartes a fim de estimar as probabilidades de inclusão com a amostra reduzida. As simulações futuras para a obtenção de uma estimativa de p(yt+1m|Ztm,Mi) são feitas com base nas últimas 10.000 iterações do algoritmo bayesiano, em que, em cada uma delas, 10.000 sorteios de sequências de choques são realizados para cada modelo amostrado, com descarte dos primeiros 1.000 sorteios como burn-in. Este procedimento é feito tanto para o modelo irrestrito quanto para o restrito.

Antes de analisar os resultados de acurácia relativa dos modelos BMA, convém apresentarmos as PIPs para os diferentes horizontes de tempo sob os dois esquemas de prioris utilizados no trabalho. Os resultados estão na Tabela 5 para a configuração C1 e na Tabela 6 para C2. Em ambas as tabelas, valores em negrito destacam PIPs maiores do que 20% para a priori g-Pior e acima de 50% para a priori Hyper-g/T, visto que esta última tende a selecionar todas as variáveis com probabilidade não desprezível. Observa-se que, para todos os horizontes de tempo, e diferentes prioris, ao menos uma defasagem das variáveis de interesse, ICC no caso de C1 e ICEA e IEC para C2, compõe o grupo de variáveis com maiores PIPs. Tais resultados sugerem que os indicadores de sentimento do consumidor podem cumprir papel preditivo também fora da amostra.

Tabela 5
PIPs dos BMAs para previsão h períodos à frente para a configuração C1

Para analisar mais a fundo essa questão, procedemos com os exercícios de análise da acurácia da previsão relativa entre o BMA irrestrito e o BMA restrito, ou seja, aquele que exclui a(s) variável(is) de interesse e suas defasagens. Os resultados estão dispostos na Tabela 7 para os diferentes horizontes de tempo, configurações, prioris e medidas de acurácia. Reiteramos que os resultados são apresentados em termos relativos. Critérios DMAE e DRMSE com valores positivos indicam melhor desempenho do modelo irrestrito. Para a estatística BDM, há evidências em favor de tal modelo se obtemos valores acima de 0,5, enquanto a VP relativa privilegia o modelo de interesse se o valor computado for superior à 1.

Tabela 6
PIPs dos BMAs para previsão h períodos à frente para a configuração C2

Os resultados sugerem que, ao menos no curto prazo, os indicadores de sentimento do consumidor cumprem papel não desprezível na previsão do consumo fora da amostra, independentemente do critério utilizado. Entretanto, para horizontes de tempo a partir de 4 trimestres, as evidências são mistas. Neste caso, quando a priori considerada é g-BRIC, tanto para a configuração C1 quanto para C2 as estatísticas DMAE e DRMSE sugerem desempenho superior do modelo restrito, enquanto BDM e VP/VPr continuam sugerindo evidência em favor do modelo com os indicadores de sentimento do consumidor. Já quando a priori escolhida é Hyper-g/T, para h=4, a estatística VP/VPr tende a sugerir melhor desempenho do modelo restrito, e para h=8, tal modelo é sugerido também pelo critério BDM.

Tabela 7
Comparação entre o BMA irrestrito e o BMA restrito

Finalmente, cabe perguntar se os resultados para C2 são devidos à presença de ICEA, IEC ou ambas no modelo irrestrito. Executamos o exercício anterior novamente, desta vez excluindo ora ICEA, ora IEC do modelo irrestrito. Os resultados, omitidos aqui, mas disponíveis ao leitor interessado, sugerem que o desempenho do modelo contendo apenas ICEA é análogo àquele do modelo contendo o indicador ICC. Já o modelo que considera apenas IEC produz resultados mistos em diversas situações comparativamente ao modelo restrito, sem qualquer índice de sentimento do consumidor. Neste sentido, os resultados para o modelo com ICC parecem mais relacionados às informações sobre condições econômicas correntes do que com as expectativas do consumidor.

Em suma, os resultados sugerem, tanto para a configuração C1 quanto para a configuração C2, que os indicadores de confiança cumprem papel não desprezível na previsão da taxa de crescimento do consumo, especialmente na previsão de um e dois passos à frente. Para horizontes de previsão maiores, as evidências sobre ganhos preditivos são mistas.

5. Conclusão

Este artigo investigou se índices de confiança do consumidor melhoram a acurácia da previsão do consumo agregado no Brasil, levando em conta variáveis macroeconômicas típicas como o PIB, o crédito e indicadores financeiros. Para isso, utilizamos a ponderação bayesiana de modelos e, assim, levando-se em conta a incerteza sobre os modelos econométricos, investigamos quais regressores são preditores robustos do consumo.

Na análise dentro da amostra, consideramos um preditor robusto se sua PIP for superior a 10% e seu parâmetro for estimado com incerteza relativamente baixa. Esta abordagem nos levou a concluir que defasagens do PIB, do crédito, do retorno acionário e de indicadores de confiança do consumidor são preditores robustos. Quanto ao PIB e ao crédito, os resultados estão em linha com a literatura baseada na estimação de equações de Euler do consumidor para o Brasil. Finalmente, como indicadores de confiança figuram entre os preditores robusto, este resultado acarreta a conclusão de que tais variáveis tem poder preditivo incremental, em relação a indicadores macroeconômicos típicos.

Na análise fora da amostra, implementamos a estratégia proposta por Garratt et al. (2009Garratt, A., G. Koop, E. Mise, e S. P. Vahey. 2009. “Real-time Prediction with U.K. monetary aggregates in the presence of model uncertainty”. Journal of Business and Economic Statistics 27(4):480-491.) em que o modelo BMA completo tem seu desempenho em termos de acurácia de previsão comparado ao de um BMA em que as variáveis indicadoras da confiança do consumidor são excluídas. Analisando uma miríade de medidas relativas baseadas no erro quadrático médio de previsão e na verossimilhança preditiva, as evidências sugeriram que os indicadores de confiança do consumidor trazem ganho preditivo, mas que esse ganho tende a se reduzir à medida que o horizonte de previsão aumenta. De todo modo, as evidências sugerem, especialmente para horizontes menores, que indicadores de confiança do consumidor cumprem papel não desprezível na previsão da taxa de crescimento do consumo fora da amostra.

Como qualquer estudo, este enfrenta certas limitações, como o fato de os indicadores de confiança utilizados serem baseados em entrevistas feitas apenas com consumidores do município de São Paulo. Incorremos nessa limitação para aumentarmos o período amostral e, ainda assim, o número de observações em nossa amostra é relativamente pequeno. De todo modo, concluímos que esses indicadores de confiança têm poder preditivo incremental, em relação a indicadores macroeconômicos típicos. Pesquisas futuras, que possam contar com maior disponibilidade de dados, poderiam analisar indicadores de confiança de abrangência do território nacional.

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  • O autor Fábio A. R. Gomes agradece ao CNPq pelo financiamento parcial deste trabalho (303172/2017-7).
  • JEL Classification

    C22, C53, E21, E27.
  • 1
    A base de dados utilizada é detalhada na Seção 3.
  • 2
    Weiss (2003) menciona, também, que os índices de confiança dos consumidores norte-americanos são acompanhados em nível internacional e tem impacto em decisões de investimento na Ásia e na Europa, por exemplo.
  • 3
    A equação de Euler descreve uma condição que a trajetória ótima do consumo atende (Parker 2008).
  • 4
    Veja essa discussão em Ludvigson (1999Ludvigson, Sydney. 1999. “Consumption and credit: a model of time-varying liquidity constraints.” Review of Economics and Statistics 81(3) : 434-447.) e Brady (2008Brady, Ryan R. 2008. “Structural breaks and consumer credit: Is consumption smoothing finally a reality?.” Journal of Macroeconomics 30(3) : 1246-1268.).
  • 5
    Por meio de modelos VAR, Leeper (1992Leeper, Eric M. “Consumer attitudes: king for a day.” 1992. Federal Reserve Bank of Atlanta Economic Review 77(4): 1-15.) investigou se choques inesperados no Index of Consumer Expectations, produzido pela Universidade de Michigan, tem poder preditivo sobre a produção industrial e a taxa de desemprego. Ao levar em conta o índice S&P 500 e a taxa de juros de curto prazo, o sentimento do consumidor perde capacidade de prever o nível de atividade da economia norte-americana.
  • 6
    De fato, Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).) consideraram o índice geral do sentimento do consumidor de cada uma dessas pesquisas - CSI e CCI -, mas, também, o subíndice de expectativa da situação futura da economia de cada uma delas.
  • 7
    Como discutido na Seção 3.2, há razões para considerar que o erro seja descrito por um processo MA(1). No entanto, ao utilizar o modelo VAR, Bentes (2006Bentes, Fabio Gomes Morand. 2006. “O Poder Preditivo do Índice de Confiança de Consumidor no Brasil: Uma Análise através de Vetores Autorregressivos.” Rio de Janeiro 83.) negligenciou esta possibilidade. É importante destacar que tal processo acarretaria uma correlação entre o erro e a primeira defasagem do consumo, causando endogeneidade (Carroll et al, 1994Carroll, Christopher D., Jeffrey C. Fuhrer, e David W. Wilcox. 1994. “Does consumer sentiment forecast household spending? If so, why?” The American Economic Review 84(5): 1397-1408.; Ludvigson, 2004Ludvigson, Sydney C. 2004. “Consumer confidence and consumer spending.” Journal of Economic Perspectives 18(2) : 29-50.).
  • 8
    Vale destacar que Bentes (2006Bentes, Fabio Gomes Morand. 2006. “O Poder Preditivo do Índice de Confiança de Consumidor no Brasil: Uma Análise através de Vetores Autorregressivos.” Rio de Janeiro 83.) considera os seguintes indicadores macroeconômicos: renda, crédito, desemprego, inflação e produção industrial.
  • 9
    Para ser preciso, de Mello e Fiqueiredo (2017de Mello, Euler Pereira, e Francisco Figueiredo. 2017. “Assessing the short-term forecasting power of confidence indices.” Economia Aplicada 21(4): 713-727.) fazem previsões um período à frente (one-step-ahead) e nowcasting.
  • 10
    O termo em inglês para regra de bolso é rule-of-thumb e, por isso, tornou-se comum o uso de termos como rule-of-thumb consumers e rule-of-thumb behavior.
  • 11
    Os estudos de Vaidyanathan (1993Vaidyanathan, Geetha. 1993. “Consumption, liquidity constraints and economic development.” Journal of Macroeconomics 15(3):591-610.) e Evans e Karras (1996Evans, Paul, e Georgios Karras 1996. “Private and government consumption with liquidity constraints.” Journal of International Money and Finance 15(2): 255-266.) estimam λ para um conjunto amplo de países, incluindo o Brasil. Em ambos os casos obtiveram estimativas positivas e significativas de λpara o Brasil.
  • 12
    Esta estratégia também foi usada por outros autores, como de Oliveira e Carneiro (2015de Oliveira, Fernando Nascimento, e Catarina Carneiro. 2015. Índices de Confiança, suas influências e impactos. Revista Econômica 17(2).).
  • 13
    Como mencionado, a Tabela 1 apresenta a notação usada para todas as variáveis.
  • 14
    Considerar que todos os preditores tem o mesmo número defasagens, como em Bram e Ludvigson (1998Bram, Jason, e Sydney C. Ludvigson. 1998. “Does consumer confidence forecast household expenditure? A sentiment index horse race.” Economic Policy Review 4(2).), implicaria assumir que apenas um subconjunto de modelos possa ter poder explicativo sobre a taxa de crescimento do consumo.
  • 15
    Esta correlação serial pode fazer com que o termo de erro seja correlacionado com a primeira defasagem da taxa de crescimento do consumo, causando endogeneidade. Ao modelar explicitamente o termo MA(1), este problema é evitado (Carroll et al., 1994Carroll, Christopher D., Jeffrey C. Fuhrer, e David W. Wilcox. 1994. “Does consumer sentiment forecast household spending? If so, why?” The American Economic Review 84(5): 1397-1408.; Ludvigson, 2004Ludvigson, Sydney C. 2004. “Consumer confidence and consumer spending.” Journal of Economic Perspectives 18(2) : 29-50.).
  • 16
    Lamnisos, Griffin e Steel (2013aLamnisos, Demitris, Jim E. Griffin, , e Mark F. J. Steel. 2013a. “Adaptive MC3 and Gibbs Algorithms for Bayesian Model Averaging in Linear Regression Models.” CRiSM Working Paper 13-11.) propõem ainda uma versão adaptativa do algoritmo MC3 comumente usado pela literatura BMA, cujo desempenho é ligeiramente superior ao do algoritmo ADGibbs. Optamos pelo último por conveniência de programação e adaptação ao nosso caso, uma vez que o algoritmo de ADGibbs não contém o passo Metropolis-Hastings necessário para amostrar os modelos. Em nosso caso, tal escolha resultaria em até 3 passos via Metropolis-Hastings para o caso da priori Hyper-g/T, o que implicaria num custo computacional mais elevado. Note-se, entretanto, que o desempenho do algoritmo ADGibbs é ainda superior aos obtidos pelos algoritmos MC3 e de Gibbs típicos da literatura.
  • 17
    A truncagem é feita em 4 devido ao pequeno tamanho da amostra.
  • 18
    Todos os modelos incluem a constante.
  • 19
    De todo modo, como comentado por um parecerista, defasagens do PIB, que inclui o consumo, foram consideradas preditores robustos da taxa de crescimento do consumo.
  • 20
    Devido à complexidade e elevados custos computacionais, seguimos Wright (2007, 2008) e estimamos p(Mi|D) em (8) sem utilizar os dados da pseudo amostra.

Editor Responsável:

Dante Mendes Aldrighi

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    17 Abr 2020
  • Aceito
    04 Abr 2022
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