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“Mar de bullying”: turbilhão de violências contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais na escola

Resumo

Este trabalho teve como objetivo compreender as vivências e os sentidos do bullying experienciados por lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada com nove participantes, maiores de dezoito anos e que se identificam como integrantes do grupo de interesse, por meio de entrevistas conduzidas a partir de um roteiro semiestruturado. A análise do corpus foi guiada pela teoria social do discurso e auxiliada pelo software Kitconc 4.0. Os relatos mostram a contraposição entre a temporalidade do termo bullying, estrangeirismo do século XXI no contexto brasileiro, e a constante presença das violências em espaço escolar nas trajetórias das e dos participantes. O avanço das tecnologias comunicativas também constitui esse mar de bullying ao propiciar a ampliação do alcance de cenas violentas e ao globalizar o vexame, o xingamento e o soco. A forma de lidar com isso perpassa o enfrentamento direto, incitando a comunidade escolar a debater e a proteger crianças e adolescentes marcados pela hegemonia cis-heteronormativa. Desse modo, é na resistência do existir que corpos em assembleia esperançam e reivindicam os direitos inerentes à vida, avançando para além da sobrevivência e da cidadania regulada. Adolescentes e crianças atravessadas pelo bullying são potências de si mesmas e cabe a nós, agora adultos, o compromisso ético de possibilitar outras formas de estar neste mundo.

Bullying; Violência; Escola; LGBT

Abstract

This study aimed to understand the experiences and senses of bullying experienced by lesbians, gays, bisexuals, transvestites, transsexuals, and other identities. This qualitative research was conducted with nine participants older than eighteen years and who identified as members of the interest group through interviews conducted from a semi-structured script. The corpus analysis was guided by the social theory of discourse and aided by Kitconc 4.0 software. The reports show the contrast between the temporality of the term bullying, foreign word of the 21st century in the Brazilian context, and the constant presence of violence in the school environment in the trajectories of the participants. The advancement of communicative technologies also constitutes this sea of bullying by widening the reach of violent scenes and globalizing shame, cursing, and punching. The way to deal with this permeates the direct confrontation, encouraging the school community to debate and protect children and adolescents marked by cis-heteronormative hegemony. Thus, it is in the resistance of existence that bodies in assembly hope and claim the rights inherent in life, advancing beyond survival and regulated citizenship. Adolescents and children crossed by bullying are potencies of themselves, and it is up to us, now adults, the ethical commitment to enable other ways of being in this world.

Bullying; Violence; School; LGBT

Introdução

O bullying tem sido pauta de discussões nas escolas e nos círculos científicos desde as décadas finais do século passado, ganhando maior notoriedade no Brasil a partir dos anos 2000. Sua definição é bastante diversificada, chegando mesmo a se desvirtuar do contexto escolar. Para este artigo, utilizaremos o conceito de Medeiros (2012MEDEIROS, Alexandre Vinícius Malmann. O fenômeno bullying: (in)definições do termo e suas possibilidades. 2012. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Universidade de Goiás, Goiânia, 2012., p. 108):

[...] o bullying no Brasil deveria ser entendido como um conjunto de atitudes hostis e agressivas, que ocorrem de maneira direta ou indireta, intencionais e repetitivas e sem motivação evidente, adotado por um ou mais alunos contra outro(s) no ambiente escolar, sem distinção de gênero ou de idade, que apresenta a diferença de poder entre os envolvidos, causando dor, angústia e sofrimento para a vítima e o sentimento de satisfação para o agressor.

Tal fenômeno, ainda que afete crianças e adolescentes indistintamente dos marcadores sociais que carregam, é motivado por alguma característica entendida na relação de poder desigual, entre pares ou mesmo entre diferentes atores da comunidade escolar, como passível de violência.

No Brasil, mais de 20 por cento dos adolescentes escolares já sofreram bullying verbal, com tendência de crescimento em todo o país, sendo o tipo de violência que mais vitimiza sujeitos nessa faixa etária (SILVA et al., 2019). Em outro estudo (ZEQUINÃO et al., 2016), com pessoas de 8 a 16 anos, mais de 40 por cento dos garotos e 29 por cento das garotas relataram já ter sofrido algum tipo de agressão na escola, sendo realizado, na maioria das vezes, por colegas mais velhos e por meio de apelidos vexatórios em sala de aula. Tal fenômeno é visto semanal ou diariamente por 28 por cento dos diretores de escola de ensino fundamental e 18 por cento do ensino médio; embora os índices sejam bem maiores se examinados nas escolas públicas (35 e 23 por cento, respectivamente). Esse resultado coloca o Brasil em posições superiores em relação às médias mundial e da América Latina (INEP, 2019INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Relatório nacional: pesquisa internacional sobre ensino e aprendizagem: Talis 2018: primeira parte. Brasília, DF: INEP, 2019.). No mundo, segundo a Organização das Nações Unidas (UN, 2016), metade das crianças e adolescentes já sofreu algum tipo de bullying em razão da sua aparência física, orientação sexual, gênero, etnia ou país de origem, sendo que, no Brasil, tal percentual alcança a marca de 43 por cento. Em outra pesquisa (KOYANAGI et al., 2019), foi indicado que adolescentes entre 12 e 15 anos que sofreram bullying apresentam até três vezes mais risco de ideações e tentativas de autoextermínio. Estar nessa situação gerou crises de ansiedade, insônia e desejo de mudar de escola ou absenteísmo. Em uma revisão de literatura recente (SILVA; OSIECKI, 2019SILVA, Viviane Heck da; OSIECKI, Ana Claudia. Influência do gênero no bullying escolar. Revista Inspirar: Movimento e Saúde, São Paulo, v. 19, n. 2, p. 1-26, 2019.), fatores como exposição a drogas lícitas e ilícitas e seu uso, problemas familiares e questões regionais podem aumentar o risco ao bullying e ao suicídio, além de alcançar estudantes com diferentes marcadores sociais, como renda, classe econômica e religião.

Tais pesquisas, de diferentes afiliações epistemológicas, têm buscado compreender o bullying no esforço de que, assim, seja reconhecido enquanto questão contemporânea escolar (LOURO, 1997LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: uma perspective pós-estruturalista. Petrópolis: Vozes, 1997.; ZEQUINÃO et al., 2016). Nesse sentido, a comunidade de pessoas dissidentes da matriz cis-heteronormativa4 4 - Tal matriz advém de uma ideia de núcleo identitário rígido que é imposto a todos os corpos, ancorada nos binarismos homem-mulher, macho-fêmea, masculino-feminino e na linearidade compulsória corpo-sexo-expressão-gênero (BUTLER, 2018). , como lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades, que aqui abreviaremos pela sigla LGBT+, tem sido recorrentemente alvo dessas violências.

Neste artigo, partimos das considerações de Butler (2003)BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. para compreender tais sexualidades como performatividades, que fazemos e desfazemos, que construímos discursivamente por atos, gestos e práticas. Esse fazer performativo das sexualidades implica um conjunto de atos inteligíveis e comportamentos cenificados, agentes apropriados para a iteração de atos e procedimentos específicos executados pelos agentes (FARIA, 2018FARIA, Mateus Aparecido de. A luta é coletiva, mas a resistência é individual? Violências vivenciadas e estratégias de enfrentamento construídas pela comunidade universitária de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018.; MINGO; MORENO, 2017MINGO, Araceli; MORENO, Hortensia. Sexismo en la universidad. Estudios Sociológicos, Ciudad de México, v. 35, n. 105, p. 571-595, 2017.). Assim, a pessoa lésbica performatiza o gênero feminino, e sua orientação sexual – enquanto conjunto de práticas constituídas na relação com outro – é predominantemente voltada para corpos femininos. Na mesma linha, a pessoa gay performatiza o masculino e deseja o masculino. Pessoas bissexuais, por sua vez, agem de modo a se relacionar com corpos masculinos, femininos e quaisquer outros que transitam nesse continuum generificado.

Pessoas transexuais, transgênero, travestis ou trans são denominações que representam performatividades que ousam romper com o instituído, com o cis-heteronormativo, uma vez que não reconhecem as designações de gênero dadas ao nascer. Por exemplo, alguém que se reconheça enquanto homem trans afirma que lhe foi designado o gênero feminino, no entanto seus processos de subjetivação constituem um corpo masculino. Já a mulher trans não reconhece o gênero masculino que lhe foi designado ao nascer e itera práticas discursivas do âmbito feminino. Travestis são pessoas que não desejam se definir em um dos dois polos generificados, transitando entre eles. Podemos, ademais, seguir para outras identidades5 5 - Aqui o conceito de identidade será utilizado para se referir a construções discursivas que atravessam os âmbitos sociais, culturais e históricos, a partir das relações de poder e saber, sendo, portanto, fluidas, em movimento e constituídas por múltiplas práticas categorizantes e regulatórias (BUTLER, 2003). como assexuais, queer e intersexuais (BRIGEIRO, 2013BRIGEIRO, Mauro. A emergência da assexualidade: notas sobre política sexual, ethos científico e o desinteresse pelo sexo. Sexualidad, Salud y Sociedad, Rio de Janeiro, n. 14, p. 253-283, 2013.) que funcionam como ponto de partida, e não de chegada, para as vivências em comunidade.

Ainda que muitos não desejem se identificar com um gênero apenas, tal separação entre termos possui relevância no sentido didático e no sentido legal. O primeiro serve ao compartilhamento de informações sobre essa população, suas demandas e desejos, por vezes lançando mão da restrição de práticas de pessoas trans ao dar um nome para que a população em geral consiga ancorar seu entendimento. Já o segundo – sentido legal – serve à garantia de direitos em um sistema jurídico baseado em identidades fixas: licença-paternidade para homens e maternidade para mulheres, casamento entre um homem e uma mulher etc. As pessoas trans entram nessa relação social pelo reconhecimento de que seus corpos são igualmente legítimos para pleitear quaisquer garantias já consolidadas para outros corpos generificados, seja para mudança de nome social e sexo no registro civil, seja para adequação corporal em virtude da performatividade de gênero construída.

Pesquisas anteriores mostraram que o bullying contra pessoas LGBT+ em ambiente escolar está estritamente vinculado à construção de uma masculinidade controlada e que atrapalha não apenas o desenvolvimento da vítima, mas também as relações estabelecidas na comunidade escolar (BARBERO, 2017BARBERO, Matías de Stéfano. Hacerse hombre en el aula: masculinidad, homofobia y acoso escolar. Cadernos Pagu, Campinas, n. 50, p. 1-28, 2017.), assim como a importância de agir com vistas à prevenção dessas violências e preservar a consolidação da identidade sexual (GOYER; BLAIS; HÉBERT, 2015; RUSSEL, 2011).

Considerando o contexto político-educacional atualmente constituído no Brasil e a consequente necessidade de fortalecer discursos e práticas que corroborem o respeito às diversidades, o desafio aqui é compreender as vivências e os sentidos do bullying vivenciado pela comunidade LGBT+.

Caminho metodológico

Esta pesquisa qualitativa foi exploratória, por favorecer a familiaridade e a explicitação do problema de pesquisa, e descritivo-interpretativa, por imputar criticidade à descrição dos fenômenos (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009SILVEIRA, Denise Tolfo; CÓRDOVA, Fernanda Peixoto. A pesquisa científica. In: GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo (org.). Métodos de pesquisa. Porto Alegre: UFRGS, 2009. p. 31-42.).

Foram realizadas entrevistas, a partir de um roteiro semiestruturado, com pessoas que se identificavam como LGBT+. A escolha de participantes foi feita por meio da técnica bola de neve, em que se utiliza uma cadeia de referências iniciada com informantes-chave, aos e às quais são solicitadas indicações de pessoas com as características desejadas (VINUTO, 2014VINUTO, Juliana. A amostragem em bola de neve na pesquisa qualitativa: um debate em aberto. Temáticas, Campinas, v. 22, n. 44, p. 203-220, 2014.). Nossos informantes foram movimentos sociais de defesa de direitos humanos, movimentos estudantis, organizações não-governamentais e coordenações de projetos de extensão universitária atuantes na região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais. Após receber as indicações, entramos em contato com cada pessoa, apresentando a pesquisa, seus objetivos, a forma como seria realizada a entrevista, escolha do local em função das necessidades da pessoa e esclarecimento de dúvidas. Após a pessoa demonstrar interesse, marcamos um momento para conversarmos e, presencialmente, repetimos os objetivos e a forma de condução da pesquisa, a garantia do anonimato, e apresentamos o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido a ser assinado. A definição do número de participantes foi feita à medida que nos aproximávamos ao máximo do objeto pesquisado sem, com isso, pretender saturá-lo (MINAYO, 2017MINAYO, Maria Cecília de Souza. Amostragem e saturação em pesquisa qualitativa: consensos e controvérsias. Revista Pesquisa Qualitativa, São Paulo, v. 5, n. 7, p. 1-12, 2017.), de modo que nove entrevistas (Tabela 1) foram consideradas suficientes para possibilitar uma análise profunda – condizente com a riqueza dos relatos –, considerando, igualmente, o cronograma de trabalho.

Tabela 1
Perfil das pessoas entrevistadas segundo idade, gênero, orientação sexual, raça/cor/etnia, escolaridade e local de residência

As entrevistas foram gravadas, transcritas e analisadas sob a perspectiva da análise de discurso crítica (ADC), de vertente britânica, desenvolvida e proposta por Norman Fairclough (2001)FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001., inserida em um conjunto de ideias cunhadas como teoria social do discurso (TSD), cuja tese inicial é que existem relações dialéticas entre a vida social e os discursos, ou seja, discursos constroem e constituem relações sociais e não apenas as refletem (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001.), ou seja, discursos são constituídos e constituintes da vida social. Alicerçada na postura crítico-realista, a TSD busca oferecer suporte científico para pesquisas sobre o funcionamento dos discursos na instauração, manutenção e/ou superação de problemas socialmente construídos (RAMALHO; RESENDE, 2011RAMALHO, Viviane; RESENDE, Viviane de Melo. Análise de discurso (para a) crítica: o texto como material de pesquisa. Campinas: Pontes, 2011.). A TSD se baseia na concepção tridimensional do discurso, conforme esquematizado na Figura 1, com a proposta de contextualização dos discursos, sempre situados temporal, circunstancial e espacialmente.

Figura 1
Concepção tridimensional do discurso

O procedimento metodológico pela TSD conta com três dimensões, de acordo com Fairclough (2001)FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001.: análise do texto (descrição), da prática discursiva (interpretação) e da prática social (explanação crítica). Para utilizar metodologicamente a TSD não é necessário lançar mão de todas as categorias possíveis, pois cada corpus terá elementos próprios a partir da escolha do foco do processo de pesquisa. Para esta pesquisa, foram selecionadas as categorias vocabulário, gramática, intertextualidade e interdiscursividade, hegemonia e ideologia. O vocabulário trata primordialmente das palavras individuais, mas vai além de seus significados dicionarizados. As palavras implicam processos de significação do mundo que ocorrem temporalmente e para grupos sociais, de formas diferentes. Trabalharemos aqui com significados e sentidos das palavras, especialmente como esses sentidos entram em disputas mais amplas pela posição dinamicamente hegemônica, e o uso de metáforas, uma vez que elas demonstram as implicações políticas e ideológicas dos discursos (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001.). A categoria gramática possibilita aprofundar-se na compreensão das orações, conjuntos de significações ideacionais, interpessoais e textuais, que as pessoas escolhem de acordo com o desejo de formação ontológica, de construção das relações sociais e de afirmação/negação de sistemas de conhecimentos e crenças. Na oração estabelecem-se atores, processos, metas, identidades e representações que atravessam e são transversalizadas pelas ordens discursivas e sociais (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001.).

Transitando para a esfera das práticas discursivas, há a intertextualidade e a interdiscursividade. A intertextualidade é a propriedade dos textos de serem cheios de fragmentos de outros textos, que são delimitados explicitamente por aspas ou mesclados no interior do texto, de forma a provocar ecos, contradições e outros efeitos discursivos (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001.). Quando nitidamente identificados, dizemos que existe intertextualidade manifesta, pois o discurso é heterogêneo, cheio de falas de outros atores, como este artigo e suas citações. Por outro lado, a interdiscursividade é a intertextualidade constitutiva, não explícita, que se apresenta no discurso apenas por vestígios, metáforas, presença/ausência de vozes sociais ou ainda por pressuposições. Nesse momento da ADC, é importante compreender quais ordens dos discursos se fazem presentes, ou seja, quais conjuntos de termos e significados que determinam, hegemonica e temporariamente, práticas sociais (LOPES, 2018LOPES, Juliana Aurora de Oliveira. Matrizes explicativas sobre as causas do rompimento da barragem da Samarco em Mariana, 2015: uma análise crítica dos discursos. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018.). Assim, “pode-se considerar uma ordem do discurso como a faceta discursiva do equilíbrio contraditório e instável que constitui uma hegemonia” (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001., p. 123).

Chegamos à hegemonia como categoria analítica que possibilita identificar a liderança e/ou a dominação de escopos sociais como o econômico, o político, o cultural e o ideológico (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001.). Estabelece-se a hegemonia a partir de alianças, com a prevalência de certos grupos em relações assimétricas de poder, imputando a naturalização de valores, símbolos, normas e demais especificidades do grupo hegemônico de modo a manter sua posição (LOPES, 2018LOPES, Juliana Aurora de Oliveira. Matrizes explicativas sobre as causas do rompimento da barragem da Samarco em Mariana, 2015: uma análise crítica dos discursos. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018.). A ideologia atravessa todo o modelo analítico, materializando-se por meio das práticas discursivas e interpelando sujeitos construtores do e construídos pelo discurso. Ideologia é entendida por Fairclough (2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001., p. 117) como:

[...] significações/construções da realidade (o mundo físico, as relações sociais, as identidades sociais) que são construídas em várias dimensões das formas/sentidos das práticas discursivas e que contribuem para a produção, reprodução ou a transformação das relações de dominação.

Assim como acontece com a hegemonia, a ideologia funciona muito bem quando embutida nas práticas discursivas, naturalizando-se e atingindo o status de senso comum. Assim, a ideologia está presente tanto nas estruturas sociais quanto nos processos e eventos, sendo dialeticamente móvel, com vistas à manutenção ou transformação do instituído (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília, DF: UnB, 2001.).

Para auxiliar na análise textual, foi utilizado o software brasileiro Kitconc versão 4.0. O uso do software possibilitou a rápida visualização do corpus no que tange ao vocabulário, às relações estabelecidas entre os sintagmas das orações e à recorrência de grupos.

Buscando assumir estratégias de pesquisas participativas (CAMPOS, 2011CAMPOS, Rosana Onocko. Fale com eles! O trabalho interpretativo e a produção de consenso na pesquisa qualitativa em saúde: inovações a partir de desenhos participativos. Physis, Rio de Janeiro, v. 21, n. 4, p. 1269-1286, 2011.), após a interpretação das narrativas, voltamos às pessoas entrevistadas para compartilhar o que nós entendemos daquele momento e, a partir do encontro e de novas reflexões, construir novas interpretações – agora não sobre elas, mas com elas. Ao conduzir dessa forma, tentamos rejeitar a violência interpretativa, pois “ninguém é mão de obra para o pensamento de outrem. Todos pensam. Todos ganham” (CAMPOS, 2011CAMPOS, Rosana Onocko. Fale com eles! O trabalho interpretativo e a produção de consenso na pesquisa qualitativa em saúde: inovações a partir de desenhos participativos. Physis, Rio de Janeiro, v. 21, n. 4, p. 1269-1286, 2011., p. 1284).

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto René Rachou da Fundação Oswaldo Cruz sob o número CAAE 63857317.6.0000.5091 e parecer de aprovação nº 1.925.485.

O mar de bullying

Bullying é um termo oriundo da língua inglesa e que não tem uma tradução para o português devido a impasses de ordem conceitual. Vamos manter seu uso aqui, uma vez que não é o objetivo realizar tal discussão, porém preocupando-se com possíveis banalizações do termo que, em vez de ampliar o escopo, tem esvaziado seus significados e suas consequências no ambiente escolar (MEDEIROS, 2012MEDEIROS, Alexandre Vinícius Malmann. O fenômeno bullying: (in)definições do termo e suas possibilidades. 2012. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Universidade de Goiás, Goiânia, 2012.).

Um dos participantes da pesquisa evidencia a temporalidade do termo bullying, que antes não contava com uma denominação específica, apesar de o fenômeno ser constante no cotidiano escolar: “acontecia muito tipo de violência que hoje é considerado como bullying, apelidos, uma certa diferenciação das pessoas no tratamento, pelo fato de eu ser gay e até negro mesmo, como referência a personagens de televisão que eram negros” (P1).

Percebe-se a modalização do relato de P1 por meio do emprego dos termos muito e hoje. O primeiro intensifica o processo existencial (acontecia) acerca do elemento existente – o bullying – que é sinônimo de diferenciação das pessoas no tratamento. Isso mostra a grande frequência com que o participante era destacado da turma, seja pela sua negritude, seja pela sua orientação sexual, ou ainda por ambas. O cruzamento de marcadores sociais atravessa seu corpo como fluidos de poder que visam seu extermínio simbólico, já que um gay negro é considerado uma vida sacrificável, indigna de luto (BUTLER, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.; FARIA, 2018FARIA, Mateus Aparecido de. A luta é coletiva, mas a resistência é individual? Violências vivenciadas e estratégias de enfrentamento construídas pela comunidade universitária de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018.). O personagem citado por P1 é Cirilo, da telenovela Carrossel, exibida no Brasil pela primeira vez no início da década de 1990 e reexibida diversas vezes pela rede de televisão Sistema Brasileiro de Televisão (SBT). Nela, Cirilo era um dos poucos personagens negros, além de ser apaixonado por uma garota rica e branca, Maria Joaquina, que o esnoba quase a história toda, enquanto o personagem se inferioriza perante as outras crianças. A difusão massiva da e pela televisão, majorada pela sua capacidade de potencializar seus efeitos pelo uso da estética da imagem, se torna poderoso artefato cultural e social, influenciando o cotidiano que a circunda. Ao referir-se a P1 como um personagem fictício, as pessoas agressoras aderem às práticas discursivas vendidas pelos meios comunicacionais, o que acontece de modo prazeroso, já que tal adesão é feita pelo lazer, pelo divertimento da televisão (GONÇALVES; ANDRADE, 2011GONÇALVES, Catarina; ANDRADE, Fernando. O currículo do bullying na novela da vida. Espaço do Currículo, João Pessoa, v. 4, n. 1, p. 40-54, 2011.).

Já o segundo modalizador (hoje) localiza no tempo o nome daquilo que antes vivia. Na literatura científica mundial, o termo bullying aparece por volta dos anos 1980 e 1990, sendo utilizado por pesquisadoras(es) brasileiras(os) mais fortemente no século XXI. A forma de exemplificação utilizada por P1 para relatar as violências que sofreu não exaure o rol de atos contra pessoas não brancas e não heterossexuais: violências de ordens físicas e psicológicas são as principais no ambiente escolar, como socos, coação, chutes, perseguição etc. (GÓIS; SOLIVA, 2011GÓIS, João Bosco Hora; SOLIVA, Thiago Barcelos. A violência contra gays em ambiente escolar. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, n. 123, p. 38-45, 2011.).

A comparação temporal do bullying foi feita também por outro participante, conforme excerto a seguir:

A diferença do bullying pra o que eu sofri há uns 15 anos atrás, o que muda é que hoje tem internet, hoje você tem smartphone, mas o bullying com o gay é sempre o mesmo, é a chacota, é a agressão física, a não aceitação, é a humilhação. O bullying é o mesmo, a diferença é que hoje você tem uma coisa mais perversa que é o smartphone, que pode gravar isso. (P2).

Aqui o processo existencial (ter) é utilizado para definir o existente contemporâneo: tecnologias comunicacionais. O smartphone, adjetivado de perverso por P2, pode ser entendido como um instrumento de violência sutil, que provoca agonia, medo e isolamento. Tais violências já existiam contra pessoas LGBT+; no entanto, o smartphone, enquanto tecnologia que, criada socialmente, interfere nas relações interpessoais, afeta também as relações de poder geradas e reproduzidas pelas violências, já que registra, documenta e serve de prova e exposição das cenas enunciativas (SCHREIBER; ANTUNES, 2015SCHREIBER, Fernando Cesar de Castro; ANTUNES, Maria Cristina. Cyberbullying: do virtual ao psicológico. Boletim Academia Paulista de Psicologia, São Paulo, v. 35, n. 88, p. 109-125, 2015.). P2 utiliza a estratégia discursiva da exemplificação, assim como P1, para definir o bullying: chacota, agressão física, não aceitação, humilhação. Reforça-se a noção de violência mais associada a aspectos físicos e psicológicos em comparação com outras esferas, como as de ordem patrimonial e sexual (FARIA, 2018FARIA, Mateus Aparecido de. A luta é coletiva, mas a resistência é individual? Violências vivenciadas e estratégias de enfrentamento construídas pela comunidade universitária de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018.).

A temporalidade da abordagem do bullying entre as(os) participantes desta pesquisa pode ter se dado pelo viés de seleção, já que P1 e P2 são jovens adultos universitários que relatam as vivências escolares de um momento anterior, na educação básica. Tal comparação visa ressignificar as experiências daquele tempo por meio do olhar atual, podendo trazer à tona alguns relatos considerados até tragicômicos, uma vez que as práticas discursivas denotam ideologias que marginalizam as diversidades ao compará-las com arquétipos sociais. P7 narra um desses episódios: “uma vez o pessoal [na escola] me chamando ‘Oh viadinho!’, essas coisas, […] e a professora falou ‘Cuidado! Não fica chamando [de viadinho] porque ele pode depois virar tipo um maníaco’” (P7).

O vocativo utilizado para chamar P7 é o substantivo diminutivo de viado – insulto muito comum no Brasil, variação de desviado e, ao mesmo tempo, sinonímico do animal veado (também associado ao personagem dos filmes Bambi, que na verdade é um cervo). Essa variação linguística utilizada para caçoar de homens gays é uma tentativa de aproximar pessoas de animais, desumanizando-os, para facilitar a legitimação de práticas violentas (SILVA, 2014SILVA, Leandro Soares da. Vinte e quatro notas de viadagem. Revista Periódicus, Salvador, v. 1, n. 2, p. 1-11, 2014.). Porém, a iteração dessa prática discursiva limita o corpo do homem gay ao lhe atribuir certas performances e restringir outras: ao ouvir viadinho, todos os atores na cena enunciativa constroem os modos que o agredido é ou supostamente deveria ser. Esse corpo-limite, limitado discursivamente e até geograficamente, como demonstrado por Faria (2018)FARIA, Mateus Aparecido de. A luta é coletiva, mas a resistência é individual? Violências vivenciadas e estratégias de enfrentamento construídas pela comunidade universitária de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018., é humilhado e menosprezado pelos discursos que o interpelam e, no entanto, abre espaço para o deslocamento do insulto: ao dar um nome para aquele corpo abjeto, dá-se uma existência possível, inaugurando um sujeito no discurso que pode usar a própria língua para reagir. Viado é, assim, enxertado em outros contextos, servindo também de “bandeira” de afirmação identitária, de referência contra-hegemônica em relação às violências (BUTLER, 1997BUTLER, Judith. Excitable speech: a politics of the performative. Abingdon: Routledge, 1997.; SILVA, 2014SILVA, Leandro Soares da. Vinte e quatro notas de viadagem. Revista Periódicus, Salvador, v. 1, n. 2, p. 1-11, 2014.).

Voltando ao excerto de P7, a prática profissional da docente (o uso de profissional é adequado, uma vez que estava em ambiente escolar mediando as relações de aprendizado entre educandos) evidencia os atravessamentos de seu discurso violento, ainda que a intenção dela fosse proteger ou interromper as violências cometidas contra P7. A comparação a um maníaco perpassa ordens do discurso médico-criminal: geralmente associado a pessoas que cometeram crimes de violência sexual repetidamente, o maníaco dito pela professora seria resultado de crianças e adolescentes gays insultados que, quando chegam à idade adulta, poderiam “descontar” o que sofreram com violência. A interjeição no início de sua fala (Cuidado!) é, de fato, um alerta a quem agredia na cena e não a P7, interpelado e humilhado, reforçando quem precisa de cuidado e proteção e quem precisa de prisão ou hospício – instituições constituídas para alojar “maníacos”.

Tais relatos evidenciam o que P2 resume como: “escola é outro mar de bullying”.

Nota-se o uso da palavra outro, indicando que não é apenas nesse espaço que pessoas LGBT+ sofrem por reivindicarem uma existência digna de ser vivida. Fernandes (2013)FERNANDES, Felipe Bruno Martins. Assassinatos de travestis e “pais de santo” no Brasil: homofobia, transfobia e intolerância religiosa. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 37, n. 98, p. 485-492, 2013. discute a amplitude da busca pela eliminação de corpos dissidentes que chega ao terreiro, à favela, ao interior, aos serviços de saúde, parecendo mesmo um oceano de violências, naturalizadas no cotidiano. Outra participante também narra suas experiências:

[...] eu já sofri na escola, muito na escola porque as pessoas percebiam que eu olhava as meninas e tudo mais e começava a me cutucar assim indiretamente, às vezes até diretamente, me fazia sentir mal, me sentir inferior sabe, me colocar pra baixo e às vezes por quererem mesmo me inferiorizar mesmo […]. Na minha sala eu lembro que tinha um menino, ele é gay também, ele era assumido pra sala mas todo mundo tratava ele bem, as meninas tinham amizade com ele, mas comigo o pessoal ficou totalmente estranho, até ele ficou meio estranho, sabe?! Só que recorrer assim não tinha ninguém mesmo. (P9).

O que P9 relata sinaliza a trama complexa das violências contra pessoas LGBT+ composta por processos materiais (cutucar), mentais (perceber, sentir, colocar para baixo), existenciais (ser) e relacionais (ter), todos ligados e atravessados por significantes e modalizadores que potencializam os sentidos da cena violenta. O cutucar, diretamente como ação física de agressão ou indiretamente enquanto violência simbólica, aparece como provocador de um sentimento (sentir inferior), por vezes intencional, que marcou a passagem da participante pelo ambiente escolar.

Interessante notar a relativa intencionalidade da agressão, que pela Organização Mundial da Saúde (KRUG et al., 2002) não é elemento necessário para a violência. Ao dizer que “às vezes por quererem mesmo me inferiorizar mesmo”, P9, que era agredida, demonstra que, em outras ocasiões, as violências motivadas pela sua orientação sexual (ou mesmo pela “suspeita”) eram praticadas com outras intenções, outros objetivos que não “colocá-la para baixo”. A falta de solidariedade e a ilusão da independência podem auxiliar no entendimento dessas violências não intencionais – parafraseando o personagem Chaves, de uma série televisa de mesmo nome – sem querer querendo. Esse bordão é tão simples e tão interessante que será útil para compreender como acontecem tais cenas violentas.

O desejo expresso e ao mesmo tempo sublimado do “sem querer querendo” parece estar presente em discursos que buscam a “cura” de pessoas LGBT+, fortemente atravessados por práticas discursivas religiosas, baseando-se em interpretações de livros, principalmente da Bíblia no Brasil. Tal discurso se envereda pela ciência, pela escola e por outras instituições sociais pois, afinal, a linguagem é uso e troca. Porém, isso pode acontecer de modo acrítico, irrefletido, mecânico, não interrompendo reproduções hostis dos discursos. Um exemplo nítido são as terapias de reversão sexual que buscam mudar a orientação sexual de um indivíduo a fim de estabelecer uma normalidade e, assim, supostamente, diminuir o sofrimento do sujeito diante dos preconceitos, ou ainda para cumprir os desígnios de algum ente superior registrados em livros antigos (JONES; YARHOUSE, 2011JONES, Stanton L.; YARHOUSE, Mark A. A longitudinal study of attempted religiously mediated sexual orientation change. Journal of Sex & Marital Therapy, New York, v. 37, n. 5, p. 404-427, 2011.). Percebe-se a não intencionalidade da violência pelos corpos que (re)produzem esse discurso, já que objetivam proteção ao “sofrimento” ou uma vida livre de “pecados”, no entanto, ao fazer isso, já agem violentamente, pois impõem algo externo ao sujeito, “sem querer querendo”, pois há práticas sociais hegemônicas que os subsidiam, ideologicamente orientadas para a naturalização de algo anacrônico, no caso, a cis-heterossexualidade compulsória (BUTLER, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.; FARIA, 2018FARIA, Mateus Aparecido de. A luta é coletiva, mas a resistência é individual? Violências vivenciadas e estratégias de enfrentamento construídas pela comunidade universitária de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018.). Desse modo, P9 relata que desejam mesmo sua inferiorização, enquanto mulher e enquanto lésbica, ao passo que, outras vezes, também o fazem sem querer, mas querendo.

Essa iteração de discursos violentos interpela inclusive aqueles corpos que, em outras cenas, são alvos. P9 relata que “até ele ficou meio estranho”, sendo ele o garoto adjetivado como gay assumido da sala, que era tratado bem, apesar de sua condição. Aqui se destaca o pressuposto de violência sobre as identidades LGBT+: ser diferente do hegemonicamente constituído implica necessariamente sofrer violências. No entanto, ele também foi perpetrador de cenas violentas envolvendo P9, já que ela não esperava que assim o fosse, evidenciado pelo uso do modalizador até – talvez pela expectativa de solidariedade LGBT+. Portanto, ninguém possui o monopólio da opressão, todas e todos estamos à mercê dessa naturalização das violências enquanto seus agentes (BUTLER, 2015BUTLER, Judith. Relatar a si mesmo: crítica da violência ética. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.).

A escola, como visto até aqui, não é a instituição redentora da sociedade, apesar de ser frequentemente colocada nesse posto. Ela é útil aos interesses hegemônicos, principalmente daqueles que possuem capital econômico para financiar seus projetos, e negligente quanto a temas que já existem em seu espaço. P6 traz para a entrevista a escola pública e o resumo de suas vivências: “já sofri violência de abuso sexual, de abuso físico, de abuso psicológico principalmente em escola né, […] saí da escola pública justamente por isso, porque não aguentava mais o tanto que sofria na escola” (P6).

A enumeração de P6 corrobora outros estudos sobre o bullying e sua variedade de formas (SANTOS et al., 2013; SCHREIBER; ANTUNES, 2015SCHREIBER, Fernando Cesar de Castro; ANTUNES, Maria Cristina. Cyberbullying: do virtual ao psicológico. Boletim Academia Paulista de Psicologia, São Paulo, v. 35, n. 88, p. 109-125, 2015.; ZEQUINÃO et al., 2016). Esse fenômeno não é monolítico, já que viola direitos ligados à sexualidade, ao corpo, ao bem-estar biopsicossocial e à educação, sendo a escola seu locus – perceptível pela modalização de intensidade utilizada por P6 e pelas consequências provocadas, já que a estratégia de enfrentamento a essas violências foi a mudança de escola. Faria (2018)FARIA, Mateus Aparecido de. A luta é coletiva, mas a resistência é individual? Violências vivenciadas e estratégias de enfrentamento construídas pela comunidade universitária de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018. elenca também outras formas de lidar com as violências contras corpos dissidentes da cis-heteronormatividade, como a rede de amigos, religião e movimentos sociais.

Outro ponto destacado por P6 é que o bullying é da ordem do sofrer: a recorrência do processo mental sofrer em sua narrativa aponta para a dimensão dessas violências na constituição subjetiva da criança e do adolescente em tempo escolar. Santos et al. (2013) salientam os prejuízos a que elas estão assujeitadas, como dificuldade de aprendizagem e concentração, redução da capacidade de memorização e relatos de sentimento de indignação pela negligência institucional em relação às pessoas agressoras. Outro momento permeado por sofrimento é relatado por P2 durante uma de suas palestras:

Eu lembro quando que eu tava falando na última escola que eu estive e tudo que eu falava o menino ficava assim “mas e se a gente tivesse uma escola que o aluno faz o bullying com a gente e o professor ri?” Ele tava pedindo ajuda, era nítido que ele tava falando dele, e depois ele virou pra mim e falou assim “Ah aquele menino que eu falei na verdade era eu”. Ele tava pedindo ajuda, tanto que eu falei assim com o coordenador que tava do meu lado: “Você tá ouvindo essas histórias? Pensa nesses meninos, coordenador, talvez aqui não aconteça isso, mas se acontecer você não vai descobrir, você não vai saber.” (P2).

Nesse excerto, P2 aparece na cena não mais como corpo-limite, aquele que é limitado pelas agressões, constrangimentos e deontologias do outro violento (FARIA, 2018FARIA, Mateus Aparecido de. A luta é coletiva, mas a resistência é individual? Violências vivenciadas e estratégias de enfrentamento construídas pela comunidade universitária de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras identidades. 2018. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto René Rachou, Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte, 2018.), mas sim buscando intervir, como palestrante, em uma escola, sobre violências. A releitura do espaço escolar por alguém que antes sofria as violências e, no momento presente, volta a esse mesmo espaço pode ser de grande importância para o planejamento escolar e para as relações estabelecidas. Sobreviventes do bullying que conseguiram se constituir de outros modos, apesar dos xingamentos e negligências, demonstram a possibilidade de se viver uma vida boa, apesar da vida ruim, ou seja, de como viver melhor enquanto indivíduo apesar de estruturas e operações mais amplas de poder e dominação que permeiam nossos corpos (BRETAS, 2018BRETAS, Alexía Cruz. Pode-se levar uma vida boa em uma vida ruim? Cadernos de Ética e Filosofia Política, São Paulo, v. 2, n. 33, p. 213-229, 2018.; BUTLER, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.). P2, ao retornar, permite que outras formas de viver e de vida sejam possíveis, conduzidas por ele, mesmo que não completamente. Como fazer isso se inscreve em suas vivências posteriores ao bullying, algo não alcançado por essa pesquisa, mas que certamente envolve outras pessoas que buscaram interferir no processo vicioso da violência, assim como ele o faz neste momento nas escolas. P8 evidencia essa necessidade ética de interferir:

[...] agora a gente vai falar sobre isso nas escolas sim, a gente vai educar as crianças a crescerem e entenderem que a diversidade existe e ela precisa continuar, então por falta disso tudo a gente tem essa consequência, porque… os tabus sociais sempre existiram, eles não vão deixar de existir enquanto a gente não tiver efetivamente um governo que milite a favor da diversidade. (P8).

O uso de modalizadores como sim, precisa continuar, sempre demonstram a emergência da ação contrária ao bullying devido a condições precárias de viver na instituição escolar, permeadas por preconceitos contra as diversidades humanas. O tabu, presente no excerto, se relaciona às práticas discursivas e sociais do não dito (ou não digno de dizer) que, segundo P8, existem na mesma medida na sociedade, em que o discurso hegemônico força outras ordens discursivas, notadamente contra-hegemônicas, à invisibilização. O tema gênero, por exemplo, tem sido considerado o principal tabu na escola, juntamente com outros termos esvaziados de sentidos, como socialismo, comunismo e ideologia. Perde-se, portanto, a oportunidade de proporcionar uma educação reflexiva acerca das desigualdades sociais para forçar um (não) debate com foco nas “forças do mal, no inimigo a ser combatido a qualquer custo” (REIS; EGGERT, 2017REIS, Toni; EGGERT, Edla. Ideologia de gênero: uma falácia construída sobre os planos de educação brasileiros. Educação & Sociedade, Campinas, v. 38, n. 138, p. 9-26, 2017., p. 19). Apesar de a entrevista ter acontecido em meados de 2017, P8 já chamava à cena um Estado comprometido com todas as vidas, o que atualmente está quase inviabilizado com a ascensão de governos da pós-verdade, que, a qualquer custo, buscam o (re)estabelecimento de estruturas e operações que perpetuam privilégios. O tabu da diversidade também é trazido por P2:

Não há possibilidades de discutir transexualidade, tanto que os diretores de escolas que a gente passou tem, teve e tem problemas com os pais sobre isso, que os filhos chegam falando “Ah, nós falamos hoje sobre transexualidade, respeito a trans”, pais que são na maioria das vezes religiosos fundamentalistas, seja evangélico, seja católico, seja de qualquer outra denominação, isso tem problemas, eles levam “O que vocês estão ensinando ao meu filho?!” (P2).

Na pesquisa de Sales (2012)SALES, Adriana Barbosa. Travestilidades e escola nas narrativas de alunas travestis. 2012. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de Mato Grosso, Rondonópolis, 2012., a escola é compreendida como espaço de correção e vigilância de um ethos cis-heteronormativo, que cerceia as definições de masculino e feminino. Pelo que P2 relata, a comunidade escolar, que (re)produz essa escola vigilante, também itera outras práticas discursivas, notadamente religiosas, com o intuito de conjugar forças simbolicamente para o questionamento acerca do reconhecimento da vida trans enquanto currículo escolar.

Ao questionar “O que vocês estão ensinando ao meu filho?!”, questiona-se o outro pelas ações, no caso a escola, como se não fosse possível a questão inversa: o que esses pais e mães estão ensinando aos filhos e às filhas quando agem dessa forma? A intolerância, a valoração desigual de vidas e corpos que podem ou não estar na cena enunciativa escolar, a negligência frente ao bullying e a incapacidade de deixar-se constituir pelas diversidades também são parte do currículo das violências, em que o ensino é liderado pela família – a mesma que certos governos e coletividades reivindicam como sendo a instituição correta para ensinar sexualidade aos filhos.

Considerações finais

Esta pesquisa buscou, a partir de e em conjunto com pessoas LGBT+ sobreviventes do bullying, compreender os significados e as cenas de violências na escola. Percebe-se o impacto na construção do sujeito provocado pela interpelação ao outro de forma violenta, em um espaço eleito para ensinar que, de fato, age e deixa agir também com outros propósitos que extrapolam suas paredes.

O bullying é um estrangeirismo que, mesmo antes inominável, já se fazia presente nas vivências de crianças e adolescentes que, no atual momento, participaram da pesquisa. Atribuímos hoje ao termo o que antes eram socos, chutes, rasteiras, pedradas, xingamentos, abusos, assédios – instrumentos do ethos violento que tenta desesperadamente se naturalizar no presente, ainda que baseado em concepções do passado. Portanto, o bullying é não apenas topograficamente localizado, mas temporalmente definido, como relatado nesta pesquisa.

A contribuição das pessoas participantes da pesquisa resume, sem esgotar, o mar de bullying em que a escola está imersa e que, ao mesmo tempo, produz. Por limitações do trabalho científico, não conseguimos nos aproximar de vivências transfemininas autobiográficas, apesar de outras(os) participantes terem relatado acerca da (também) exclusão desses corpos do espaço escolar.

A esperança reside na resistência da existência de corpos que, em assembleia, na rua ou isoladamente, reivindicam direitos de viver além da sobrevida e da cidadania regulada. Crianças e adolescentes atravessados pelo significante bullying são, portanto, potências de si mesmas, que podem buscar outras formas de vida que nós, agora adultos, temos o dever ético de oferecer.

Referências

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  • 4
    - Tal matriz advém de uma ideia de núcleo identitário rígido que é imposto a todos os corpos, ancorada nos binarismos homem-mulher, macho-fêmea, masculino-feminino e na linearidade compulsória corpo-sexo-expressão-gênero (BUTLER, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.).
  • 5
    - Aqui o conceito de identidade será utilizado para se referir a construções discursivas que atravessam os âmbitos sociais, culturais e históricos, a partir das relações de poder e saber, sendo, portanto, fluidas, em movimento e constituídas por múltiplas práticas categorizantes e regulatórias (BUTLER, 2003BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2020
  • Aceito
    20 Out 2020
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