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Eu te fodo ou você me fode? Performance, pornotopia e reivindicação estética da violência em Baise-moi, de Virginie Despentes e Coralie Trinh Thi1 1 Uma versão bastante embrionária desse trabalho foi apresentada no Colloque International Politiques et récits du corps, no primeiro semestre de 2021. Nem o resumo submetido ao colóquio nem o artigo apresentado foram publicados.

Do I fuck you or do you fuck me? Performance, pornotopia and aesthetic claim of violence in Baise-moi, by Virginie Despentes and Coralie Trinh Thi

Resumo

Esse artigo apresenta uma análise do filme Baise-moi (2000), de Virginie Despentes e Coralie Trinh Thi, tomando-o como obra capaz de produzir rasuras nos modos de enunciar o desejo e certos afetos comumente ligados às convenções do “feminino”. Propomos uma articulação teórica entre as formulações de Diana Taylor sobre performance, de Paul B. Preciado sobre pornotopia e de Sam Bourcier sobre ação dissensual queer para proceder à análise de três sequências do longa-metragem. Acionamos também a obra teórica e literária da própria Despentes, que opera de forma complementar ao filme e nos ajuda a perceber como Baise-moi produz uma reivindicação estética da violência marcada por traços como o exagero, a hiperviolência gráfica e o sexo explícito.

Palavras-chave
performance da violência; pornotopia; estudos queer; cinema feminista; Baise-moi

Abstract

This paper presents an analysis of the film Baise-moi (2000), by Virginie Despentes and Coralie Trinh Thi, regarding it as a work capable of producing cracks in the ways of enunciating desire and certain affections commonly connected to “feminine” conventions. We propose a theoretical articulation between the formulations of Diana Taylor on performance, Paul B. Preciado on pornotopia, and Sam Bourcier on queer dissenting action to analyse three sequences of the feature film. We also use the theoretical and literary work of Despentes herself, which operates complementarily to the film and helps to perceive how Baise-moi produces an aesthetic claim of violence marked by traits such as exaggeration, graphic hyperviolence and explicit sex.

Keywords
performance of violence; pornotopia; queer studies; feminist filmmaking; Baise-moi

Introdução

Baise-moi (2000), o filme, é uma adaptação do livro homônimo de autoficção de Virginie Despentes, publicado em 1994, que coloca em cena a elaboração da memória de um estupro sofrido por ela no final da adolescência. Censurado após uma semana em cartaz no circuito de cinema autoral da França, o longa-metragem foi classificado pelo Conselho de Estado francês como X (ou seja, filme pornográfico), após um pedido de reconsideração da classificação feito por uma associação conservadora autointitulada defensora dos “valores judaico-cristãos e da família” (SOARES, 2000SOARES, R. Proibição de “Baise-moi” acende debate sobre pornografia na França. Folha de S. Paulo, São Paulo, 06 de jul. de 2000, caderno Ilustrada. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u1769.shtml>. Acesso em: 13 de jun. de 2021.
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). Despentes, ex-prostituta, escritora e cineasta, divide os créditos pelo roteiro e direção do filme com Coralie Trihn Thi, ex-atriz pornô, escritora e cineasta também. A partir de Baise-moi, o presente artigo visa discutir os giros produzidos na esfera do desejo e do afeto através da representação de um outro “feminino”, dedicando atenção, especialmente, aos modos como o filme produz figurações da violência e do sexo.

O desenho teórico-metodológico da pesquisa se baseia numa triangulação que articula: 1. a noção de performance em Diana Taylor (2013aTAYLOR, D. O arquivo e o repertório: performance e memória cultural nas Américas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013a. e 2013b)______. Traduzindo performance. In: DAWSEY, J.; MOLLER, R.; MONTEIRO, M. Antropologia e performance: ensaios na pedra. São Paulo: Terceiro nome, 2013b., 2. pornotopia, na obra do filósofo trans Paul B. Preciado (2020a______. Um apartamento em Urano. Rio de Janeiro: Zhahar, 2020a. e 2020b)______. Pornotopia: playboy e a invenção da sexualidade multimídia. São Paulo: N-1 Edições, 2020b. e 3. ação dissensual queer em Sam Bourcier (2020)BOURCIER, S. Homo Inc.Orporated: o triângulo e o unicórnio que peida. São Paulo: N-1 Edições, 2020., também autor trans dos estudos de gênero e sexualidade, para proceder à análise de três sequências do filme que ilustram o debate colocado. Trabalhamos também com os escritos da própria Virginie Despentes, que produz uma reflexão sobre o estupro, seu relato, seus interditos e a eventual “capacidade de se recuperar, mais do que simplesmente recitar uma antologia complacente de traumas” (DESPENTES, 2016DESPENTES, V. Teoria King Kong. São Paulo: N-1 Edições, 2016., p. 35).

Nos interessa investigar a agência da autora enquanto sujeita feminista e queer2 2 Sobre as apropriações e disputas em torno do termo queer, que está longe de ser pacificado, ver o último capítulo do livro Corpos que importam, de Judith Butler (2019), intitulado “Criticamente queer”. Ainda, pensando as questões relativas à transposição da teoria queer para espaços periféricos, ver o artigo Queer nos trópicos, de Pedro Paulo Gomes Pereira (2012). dissidente que elabora, em seu trabalho teórico, em sua ficção escrita e também no filme, uma persona próxima do que define em seu livro Teoria King Kong: “as feias, as caminhoneiras, as frígidas, as mal comidas, as incomíveis, as histéricas, as taradas, todas as excluídas do grande mercado da boa moça” (DESPENTES, 2016DESPENTES, V. Teoria King Kong. São Paulo: N-1 Edições, 2016., p. 7). Afirmamos que o filme produz uma reivindicação estética da violência marcada por traços como o exagero, o deboche, a hiperviolência gráfica e o sexo explícito, como contraponto “à matriz de inteligibilidade que impede que minorias se tornem sujeitos com direito sobre a própria vida” (BUTLER, 2020______. Prefácio à edição brasileira. In: DORLIN, E. Autodefesa: uma filosofia da violência. São Paulo: Crocodilo/Ubu editora, 2020, p. 7-10., p. 10).

Como será possível verificar a partir da argumentação desenvolvida, os femininos são constituídos, no filme, por relações de negação do masculino e do feminino normatizador. Não há lugar para a passividade ou para a elaboração de um luto melancólico em Baise-moi, obra em que uma de suas diretoras encena o estupro que sofreu buscando produzir, com as imagens, a reação que lhe faltou durante o ato. Alguém que, como afirma Ramayana LiraLIRA, R. Dicionário crítico: puta. Florianópolis: Cultura e Barbárie, 2017. Disponível em: <https://bf776209-72d3-41b8-b6c0-dea5df6852cb.filesusr.com/ugd/4a4510_e17f896fe9dd4d9bbf01abe63d04fc32.pdf>. Acesso em: 14 de jun. de 2021.
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, “fala como uma mulher que foi puta e como mulher puta com o estado das coisas” (2017, s/p).

“Impossível estuprar uma mulher cheia de vícios”3 3 Título do capítulo do livro Teoria King Kong dedicado ao tema do estupro, extraído, por sua vez, de um trecho da música Antisocial, da banda punk francesa Trust (DESPENTES, 2016, p. 27).

Além do livro de autoficção e do filme homônimo Baise-moi, a temática do estupro é revisitada por Despentes posteriormente em Teoria King Kong. Livro que a tornou mais conhecida no Brasil, nele dedica um capítulo à discussão das possibilidades de resistência e de existência para mulheres vítimas de estupro, uma vez que existe uma enorme probabilidade de que elas se percebam constrangidas entre narrar ou calar a experiência da violação sexual, com enormes riscos inerentes a cada um desses gestos.

Despentes se dispõe, assim, a discutir em parte de sua obra — em dois livros e um filme os ditos e não-ditos em torno do estupro e, principalmente, a perguntar o que resta como possibilidade a uma mulher marcada pela violência sexual, durante e após o fato: como não minimizá-lo e, ao mesmo tempo, como não permitir que o estupro se torne o grande acontecimento definidor da vida de uma mulher, já que, para a autora, isso implicaria em conferir à figura masculina — e ao patriarcado, de forma mais geral — uma importância excessiva? Se não se trata de uma recusa a narrar o estupro e nem de passar a se autodefinir exclusivamente a partir dele, como fabular o trauma?

O estupro é, então, o acontecimento que constitui a situação dramática inicial de Baise-moi, mas o contexto anterior ao estupro apresentado na obra é de naturalização da convivência das personagens com a violência num banlieue parisiense, especialmente a violência de gênero. O filme é protagonizado por Manu, atriz pornô de ascendência magrebina, frequentemente agredida e destratada pelo irmão (inclusive com ofensas de cunho moral) e por outros homens do bairro onde mora, e Nadine, prostituta que também vive um contexto marcado por dificuldades de diversas ordens. No entanto, no início do filme elas não se conhecem ainda.

Enquanto toma uma cerveja com uma amiga na rua, à luz do dia, Manu é abordada por um grupo de homens que levam as duas mulheres a um galpão e cometem o estupro. Trata-se de uma das sequências mais incômodas do filme, pela violência em si e pela opção das diretoras por mostrar o estupro explicitamente, inclusive com planos fechados de penetração. Ocorre que, para além da violência e do incômodo por ela gerado, a cena produz estranhamentos que dialogam de forma muito próxima com o que diz Despentes em Teoria King Kong.

No filme, Manu permanece imóvel e muda durante quase toda a agressão sexual. Sua amiga, Karla, grita, pede socorro, tenta fugir e evitar que tirem sua roupa, se desespera e é agredida fisicamente também por isso. No entanto, em um contexto em que parte do gozo masculino pela violação se produz justamente na afirmação da força — e, nesse sentido, é preciso para o estuprador que a mulher demonstre sofrimento com a situação — a imobilidade de Manu desconcerta seu algoz, que em certo momento, após dizer que parece estar fazendo sexo com um zumbi4 4 É importante sublinhar que o violador diz estar fazendo sexo e não estuprando, mas é necessário algum cuidado com essa sugestão de falta de autoconsciência masculina em relação ao ato de violência. Como a própria autora aponta, “[...] o estupro é também um diálogo particular através do qual um homem declara aos outros homens: eu fodo suas mulheres à força” (DESPENTES, 2016, p. 33). e pedir que ela mexa o quadril, recebe como resposta da personagem: “O que você acha que tem entre as pernas, seu idiota”?. Ao que o estuprador responde: “Já deu. Puta”, e interrompe o ato.

Figuras 1 e 2
Contrapontos: o desespero de Karla e a aparente falta de reação de Manu.

Em Teoria King Kong, Virginie fala de seu incômodo por não ter conseguido reagir ao estupro sofrido aos 17 anos e comenta que levava inclusive um canivete no bolso da jaqueta, a ser utilizado caso precisasse se defender, mas quando chegou, efetivamente, o momento de se defender, ela não conseguiu esboçar reação:

Não consegui ferir um homem para proteger minha própria pele. [...] Não estou furiosa comigo mesma por não ter ousado matar alguém. Estou furiosa com uma sociedade que me educou sem me ensinar a ferir um homem se ele abrir minhas pernas à força, sendo que essa mesma sociedade me inculcou a ideia de que o estupro é um crime do qual eu nunca mais poderia me recuperar

(DESPENTES, 2016DESPENTES, V. Teoria King Kong. São Paulo: N-1 Edições, 2016., p. 39-40).

Se, no relato presente no livro, Despentes sugere que gostaria de ter reagido de outro modo durante o estupro, no filme, a personagem Manu consegue produzir sua pequena vingança. Após o estupro, dois acontecimentos vão produzir o encontro entre Manu e Nadine que cataliza a narrativa: numa briga com o irmão, Manu acaba por matá-lo com um tiro na testa. Nadine, por sua vez, mata por asfixia, também durante uma briga, a moça com quem dividia apartamento, e foge. Elas se cruzam e começam a conversar em uma estação de trem, de onde saem, pegam um carro e iniciam sua jornada como dupla. Em termos narrativos, nenhum dos atos cometidos pelas personagens (o assassinato do irmão e da amiga) se justifica integralmente. No entanto, uma das chaves para compreender Baise-moi é sua hiperviolência, inclusive gráfica: do estupro a essas mortes e às outras que as personagens cometerão após passarem a viajar juntas. Tudo é muito explícito.

Baise-moi produz para as protagonistas um lugar totalmente afastado de certa imagem dada da mulher vítima de uma violência tomada como insuperável. Como a própria autora questiona:

Enquanto não é nomeada, a agressão perde sua especificidade, pode se confundir com outras agressões, como ser roubada, ser detida pela polícia, ser presa ou golpeada. Essa estratégia míope tem sua utilidade. Porque, a partir do momento que se chama o estupro de estupro, todo o aparelho de vigilância feminino se coloca em andamento: você quer que fiquem sabendo sobre isso que te aconteceu? Você quer que todo mundo te veja como uma mulher que foi vítima disso? E, de qualquer maneira, você saiu disso viva, sem ser uma puta patenteada? Uma mulher preocupada com sua dignidade preferiria ser morta. Minha sobrevivência é em si uma prova contra mim

(DESPENTES, 2016DESPENTES, V. Teoria King Kong. São Paulo: N-1 Edições, 2016., p. 32).

Para Fernanda Capibaribe Leite (2018)LEITE, F. C. E se fosse o contrário? Narrativas cruzadas de enfrentamento à cultura do estupro em Virginie Despentes. C. Legenda, Niterói, [S. I.], n. 36, p. 91-113, 2018. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/ciberlegenda/article/view/37983/23104>. Acesso em: 18 de maio de 2021.
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, que apresenta uma leitura do filme inspirada na ideia de relatar a si mesmo, de Judith Butler (2017)BUTLER, J. Relatar a si mesmo: crítica da violência ética. São Paulo: Autêntica, 2017., relatar e encenar o estupro, tornando-o público, é acionar criticamente o ethos que acolhe a cultura do estupro e assim esgarçá-lo, denunciá-lo, desnaturalizá-lo: “Narrar o estupro é demarcar um lugar de abjeção. é marcar seu corpo como violado. [...] Nomear o estupro, assim, é desafiar o sistema patriarcal, porque a memória do estupro é uma memória velada” (LEITE, 2018LEITE, F. C. E se fosse o contrário? Narrativas cruzadas de enfrentamento à cultura do estupro em Virginie Despentes. C. Legenda, Niterói, [S. I.], n. 36, p. 91-113, 2018. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/ciberlegenda/article/view/37983/23104>. Acesso em: 18 de maio de 2021.
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, p. 4).

A questão que atravessa o filme, como aponta Leite (2018)LEITE, F. C. E se fosse o contrário? Narrativas cruzadas de enfrentamento à cultura do estupro em Virginie Despentes. C. Legenda, Niterói, [S. I.], n. 36, p. 91-113, 2018. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/ciberlegenda/article/view/37983/23104>. Acesso em: 18 de maio de 2021.
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, é “e se resolvermos nos vingar?”. Ao colocar essa pergunta no centro, Despentes e Trihn Thi tensionam papéis de gênero e desorganizam imaginários relativos às mulheres vítimas de violência simbólica, sexual e física, exercendo um importante controle criativo sobre o repertório cultural que o filme evoca em função de sua temática: em Baise-moi, a mulher estuprada não é a coitada que tantas narrativas anteriores nos mostraram5 5 A esse respeito, sugerimos a consulta à obra da antropóloga feminista Rita Segato, especialmente o livro Las estructuras elementares de la violência. Ensayos sobre género entre la antropologia, el psicoanálises y los derechos humanos (2003), que conta com capítulo intitulado “La estrutura de género y el mandato de violación”. Nesse texto, Segato discute o que chama de violación cruenta, que seria a violência sexual ocorrida em espaços públicos, por pessoas desconhecidas, mediante emprego da força física e do poder de morte de um indivíduo sobre outro, como no caso do acosso que resultou em estupro encenado em Baise-Moi, e que é distinto daquela violência sexual mais comum quantitativamente, que se dá em espaços privados como o doméstico, mediante também persuasão e não apenas força física. .

Interessante, nesse caso, é a elaboração de um relato que sugere uma inversão totalmente espelhada e sem nuances dos papéis associados ao feminino e ao masculino no senso comum: as duas amigas vítimas de violências diversas embarcam numa viagem sem rumo muito definido, fazendo sexo, agredindo e matando pessoas (principalmente homens brancos), materializando traços de agressividade e desejo sexual incontrolável que costumam ser atribuídos — muitas vezes, de forma naturalizada — à masculinidade hegemônica.

Trata-se, no entanto, de uma performance de violência estilizada e eventualmente debochada que o cinema já encenou muitas vezes em filmes dirigidos por cineastas homens (como Quentin Tarantino e Gaspar Noé, para ficar em exemplos contemporâneos e, no caso de Noé, conterrâneo de Despentes também). Mas, quando produzida por mulheres e mostrando papéis invertidos, parece incômoda não apenas à entidade conservadora que requereu a censura do filme, mas também a segmentos sociais progressistas, como grupos de mulheres feministas, pesquisadoras(es) e militantes que ainda hoje dirigem ao filme críticas relativas ao que consideram um excesso de violência e à lógica da violência como resposta a uma violência sofrida.

A performance e a reivindicação estética da violência

A performance, enquanto ritualização de sons e gestos, pode ser caracterizada por comportamentos altamente estilizados (no caso das artes) ou dizer respeito ao comportamento da vida diária. Refere-se a atos duplamente exercidos, codificados e transmissíveis, gerados através de interações entre o jogo e o ritual. E uma definição de performance pode ser a “de comportamento ritualizado condicionado/permeado pelo jogo” (SCHECHNER, 2012SCHECHNER, R. Ritual. In: LIGIÉRO, Z. (org.). Performance e antropologia de Richard Schechner. Rio de Janeiro, Mauad X, 2012. p. 49-89., p. 49). Performance envolve, assim, ação, interação e relação e, para Schechner, ela não está nas coisas, mas entre as coisas.

Pensar a performance demanda pensar nas variações de ritual, sagrado e secular, e compreender que algumas performances são mais conscientes do que outras. Diante das dificuldades em distinguir, na vida cotidiana, o que é ritual, hábito e rotina, é preciso, para Schechner (2012, p. 56-57)SCHECHNER, R. Ritual. In: LIGIÉRO, Z. (org.). Performance e antropologia de Richard Schechner. Rio de Janeiro, Mauad X, 2012. p. 49-89., entender aquilo que envolve as ritualizações (sejam elas sagradas ou seculares) e que ele divide em quatro âmbitos: 1. estruturas (como os rituais são vistos e ouvidos, como usam o espaço, quem os realiza e como são realizados); 2. funções (que rituais se realizam por grupos, culturas e indivíduos); 3. processos (dinâmicas subjacentes que conduzem os rituais); e 4. experiências (como é “estar” em um ritual).

Diana Taylor traz contribuições que nos interessam sobremaneira, principalmente em seu entendimento da performance como episteme. A autora toma inspiração no trabalho pioneiro de Schechner em torno da dimensão teatral dos rituais e da performance como forma de transmissão de memória cultural, porém manifesta maior interesse na centralidade da teatralidade e da performance no cotidiano. Taylor reconhece que os processos históricos e transdisciplinares que ajudaram a constituir este campo na década de 1960 estão ligados a um posicionamento de língua inglesa e de “primeiro mundo”, uma vez que a maior parte das pesquisas que ganharam reconhecimento internacional foram desenvolvidas nos Estados Unidos e na Inglaterra. Vai defender, então, que o estudo da performance deve ser revisado frequentemente através do entrosamento com outras realidades regionais, políticas e linguísticas.

A autora intensifica, assim, a perspectiva política sobre a performance ao incorporar de forma mais radical as vivências do cotidiano e sugerir o cruzamento entre os estudos da performance e os estudos latino-americanos. Taylor entende que os estudos latino-americanos surgiram nos Estados Unidos como forma de expandir a sua influência em países situados ao sul e colocam o estadunidense sempre como aquele que olha, considerando que algo potente pode ser extraído ao explorar as histórias do norte e do sul como profundamente interligadas.

Há, para ela, um mundo sensível do cotidiano e seria importante compreender: “Como o comportamento expressivo (a performance) transmite a memória e a identidade cultural?” (TAYLOR, 2013b______. Traduzindo performance. In: DAWSEY, J.; MOLLER, R.; MONTEIRO, M. Antropologia e performance: ensaios na pedra. São Paulo: Terceiro nome, 2013b., p. 17). Assim, a performance é episteme, pois diz respeito a um modo de conhecer, e não apenas a um objeto de estudo. Diana Taylor também questiona: “Seria a performance aquilo que desaparece ou o que persiste, transmitido por meio de um sistema não-arquival que acabei chamando de repertório?” (TAYLOR, 2013b______. Traduzindo performance. In: DAWSEY, J.; MOLLER, R.; MONTEIRO, M. Antropologia e performance: ensaios na pedra. São Paulo: Terceiro nome, 2013b., p. 18).

Se a noção de performance que encontramos em Schechner tem a ver com repetição, com atos de transferência por meio dos quais se transmite conhecimento, memória e um sentido de identidade social (e que podem ser, por exemplo, rituais, encenações, danças, comícios ou funerais), em Taylor, a performance aparece como uma lente metodológica que permite analisar eventos como performances. Essa perspectiva dialoga com as vivências e identidades exteriorizadas pelos sujeitos:

Obediência cívica, resistência, cidadania, gênero, etnicidade e identidade sexual, por exemplo, são ensaiados e performatizados diariamente na esfera pública. [...] A performance e a estética da vida cotidiana variam de comunidade para comunidade, refletindo a especificidade cultural e histórica existente tanto na encenação quanto na recepção

(TAYLOR, 2013aTAYLOR, D. O arquivo e o repertório: performance e memória cultural nas Américas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013a., p. 27).

Ao mesmo tempo em que pensa sobre a transmissão de conhecimento e de memórias, a performance também é uma forma de fazer reivindicações políticas e de pensar nas junções entre o real e o artifício. Existe uma dimensão da performance como “simultaneamente ‘real’ e ‘construída’, como um conjunto de práticas que reúnem o que historicamente ficou separado como discursos ontológicos e epistemológicos distintos, supostamente autônomos” (TAYLOR, 2013aTAYLOR, D. O arquivo e o repertório: performance e memória cultural nas Américas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013a., p. 28). Taylor vai nos lembrar, assim, que nas leituras mais complexas o construído é vizinho do real.

A ideia de performance é atravessada por noções como teatralidade, espetáculo, ação e representação (TAYLOR, 2013b______. Traduzindo performance. In: DAWSEY, J.; MOLLER, R.; MONTEIRO, M. Antropologia e performance: ensaios na pedra. São Paulo: Terceiro nome, 2013b., p. 14) e nos parece desafiador pensar como Baise-moi constrói uma performance da violência e, especialmente, produz uma reivindicação do direito à violência como forma de vingança, materializada esteticamente nas chaves do exagero, do lúdico e da afetação, como buscamos explorar ao longo do texto. Deslocamos, aqui, os estudos de performance de Diana Taylor para o cinema, como também já fez Dieison Marconi (2020)MARCONI, D. Ensaios sobre autorias queer no cinema brasileiro contemporâneo. Tese de doutorado defendida no PPGCOM da UFRGS, 2020. Disponível em: < https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/206808/001113764.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 11 de jun. de 2020.
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.

A teoria do cinema e muitos(as) cineastas ao longo do tempo têm se dedicado a discutir as relações entre cinema e violência, considerando o cinema como parte integrante da engrenagem que não apenas determina como a violência política é percebida, mas também como é performada6 6 Esse debate encontra grande ressonância nas discussões sobre as representações do Holo-causto, de genocídios e da violência de estado. De Claude Lanzmann a Jean-Luc Godard, num confronto que se tornou canônico no cinema, passando mais recentemente por Rithy Panh e Joshua Oppenheimer, e no campo da teoria, por Georges Didi-Huberman, há significativa fortuna crítica dedicada às implicações entre cinema e violência e à pedagogia fílmica da mostração dessa violência. Ver DIDI-HUBERMAN, 2012 e BRINK e OPPENHEIMER, 2012. , e nos interessa pensar nas formas possíveis de resistência e produção de contra-discursos no seio do próprio cinema, valendo-se de sua própria linguagem e de seus meios expressivos. Como sugere Hito Steyerl: “resistir a um poder/saber/arte — que reduzia populações inteiras a objetos de conhecimento, dominação e representação — não apenas através da luta social e da revolta, mas também através da inovação epistemológica e estética” (STEYERL, 2010STEYERL, H. ¿Una estética de la resistencia? La investigación artística como disciplina y flito. Viena: European Institute for Progressive Cultural Policies, 2010. Disponível em: <https://transversal.at/transversal/0311/steyerl/es>. Acesso em: 13 de jun. de 2021.
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, tradução nossa).

No filme, o extravasamento da raiva e da vingança na forma de uma performance da violência pode ser visto, por exemplo, na sequência em que Nadine e Manu vão a um cassino. Ao chegarem nesse espaço — comumente associado à figura do homem branco e heterossexual — elas começam a apostar nas máquinas. Em determinado momento, um homem se aproxima e ambas se olham. Podemos compreender, com a cena, o que elas decidem fazer com o sujeito.

A sequência prossegue com os três em um quarto, provavelmente no mesmo hotel onde o cassino estava instalado. Nadine usa cocaína enquanto Manu se despe e caminha até o rapaz, que até então as observava. Aos poucos Manu e o rapaz começam a conversar, se beijar e transar. Em toda a cena, ela está em uma posição de poder e dominação e, entre outras coisas, se nega a usar preservativo, deixando o homem assustado. Nadine observa. Em determinado momento, Manu morde o pênis do homem e vomita nele. O homem começa a gritar e chamá-la de puta (“salope”). Manu e Nadine riem e aparentam se divertir. Elas voltam a usar cocaína enquanto o homem se veste e, quando ele faz menção de sair, Manu diz que não o deixou ir embora. Neste momento, ela dá uma cabeçada no personagem, que cai no chão e começa a sangrar. Nadine, que até então apenas observava, se junta a Manu na escalada de violência contra o homem, pisoteando sua cabeça e chutando-o. Quando o homem finalmente está aparentemente morto, ambas usam cocaína uma última vez e saem do quarto.

Figuras 3 e 4
Atos de ira: Manu e Nadine matam um homem no quarto de hotel do cassino.

A cena nos mostra a formação de um espaço de pornotopia da violência, sentido que será desenvolvido mais à frente do texto. A morte do homem é figurada de forma exagerada, com chutes em sua cabeça, enquanto ele se debate no chão e as personagens assumem, em todos os momentos, locais associados ao masculino hegemônico. O que está posto pelo filme nessa cena é uma inversão de papéis bem clara a partir da exploração estética do exagero e de clichês ligados aos papéis de gênero: aqui são as mulheres, e não os homens, que se recusam a usar preservativo, que não sabem fazer sexo oral, que usam drogas, que forçam o sexo quando o parceiro quer ir embora e que são agressivas.

A noção de performance pode fornecer algumas pistas para pensarmos sobre o tipo de fabulação política7 7 Inspiradas por Rancière, trabalhamos com a ideia da fabulação como trabalho ficcional dissensual, conforme define Ângela Marques (2020), que afirma: “De acordo com Rancière (2019), o modo como a ficção atua na produção de figurações, resistências e questionamentos, para ele, implica em uma forma de compor as imagens (entrelaçadas com discursos, textos e palavras) que perturbe a maneira como usualmente as representações tendem a apresentar, ao mesmo tempo, os conflitos e suas soluções pacificadas.” Quando consideramos a fabulação em sua relação com o dissenso, estamos interessadas nas rasuras possíveis de serem produzidas, por sujeitos(as) sem-parte, em formas de distribuição do tempo, do espaço e dos regimes de enunciação que buscam circunscrevê-los(as) em determinadas identidades impostas. Em nosso caso, de mulheres pobres e periféricas vítimas de violência sexual. A fabulação tem a ver com um “‘como se’ envolvido no ‘é o modo como as coisas são’” (RANCIÈRE apud MARQUES, OLIVEIRA; MORICEAU, 2018). em torno da violência que um filme como Baise-moi é capaz de produzir. E, ainda, esta noção de performance empresta dimensão política à matriz queer e transfeminista de resistir, formulada por Bourcier (2020)BOURCIER, S. Homo Inc.Orporated: o triângulo e o unicórnio que peida. São Paulo: N-1 Edições, 2020., e com a qual o filme de Despentes e Trihn Thi conversa:

Mas as práxis e subjetividades de atuação queer e transfeminista existem, e não é por acaso que o corpo e a performance desempenham um papel central nelas. Que o corpo seja um dos principais suportes da resistência. A subjetivação capitalista e neoliberal apresenta falhas. Muito foi escrito sobre o novo espírito do capitalismo, mas muito pouco sobre o novo corpo que ele produz. Gays, lésbicas e trans* não são todos “bons homos”

(BOURCIER, 2020BOURCIER, S. Homo Inc.Orporated: o triângulo e o unicórnio que peida. São Paulo: N-1 Edições, 2020., p. 116).

Bourcier comenta que, por muito tempo, as práticas políticas de sujeitos dissidentes de sexo e gênero (RUBIN, 2017RUBIN, G. Políticas do sexo. São Paulo: Ubu, 2017.) — especialmente gays e lésbicas — estiveram centradas em uma resistência ligada a quadros jurídicos e legais, ao contrário de uma resistência que integrasse enfrentamento político com foco nos direitos, na disciplina (o corpo e as normas) e na administração da população em sentido amplo. Porém, ao pensarmos a performance como base da dimensão política queer e transfeminista, esse cenário se faz outro:

O objetivo principal da política de igualdade de direitos é nos fazer acreditar que ela trabalha visando uma igualdade real, ao contrário do que acontece. Ao se colocar em outros níveis, as políticas queer e transfeministas rompem com o individualismo arraigado, uma armadilha da política de direitos, e constantemente realizam um cruzamento permanente de problemáticas

(BOURCIER, 2020BOURCIER, S. Homo Inc.Orporated: o triângulo e o unicórnio que peida. São Paulo: N-1 Edições, 2020., p. 61).

Assim, com essa ideia de cruzamentos, um dos focos centrais da questão da performance e das pautas contemporâneas de enfrentamento político, podemos pensar em uma nova realidade criada por sujeitos queer que visa a fuga da violência epistêmica neoliberal. No caso de Baise-moi, um enfrentamento da violência através da violência, uma apropriação dos discursos e imagens característicos de uma sociedade patriarcal e hetero-ciscentrada para a criação de um mundo novo possível, uma utilização do corpo feminino underground como arma de enfrentamento ao biopoder exercido sobre as minorias de sexo e gênero. Dessa forma, a performance é centro de resistência política queer, de modo a opor o corpo do sujeito à subjetivação neoliberal, dessexualizante e despolitizadora (Bourcier, 2020BOURCIER, S. Homo Inc.Orporated: o triângulo e o unicórnio que peida. São Paulo: N-1 Edições, 2020.).

O cinema, a pornografia e a pornotopia da violência

Avançamos a partir da pergunta identificada por Leite (2018)LEITE, F. C. E se fosse o contrário? Narrativas cruzadas de enfrentamento à cultura do estupro em Virginie Despentes. C. Legenda, Niterói, [S. I.], n. 36, p. 91-113, 2018. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/ciberlegenda/article/view/37983/23104>. Acesso em: 18 de maio de 2021.
https://periodicos.uff.br/ciberlegenda/a...
como centro do filme de Despentes e Trihn Thi: o que acontece quando estes femininos resolvem se vingar? Ou melhor, qual é esse mundo criado a partir de uma contra-violência? Além disso, por termos como objeto empírico um produto audiovisual, questionamos também qual o papel do cinema na construção de uma imagem neoliberal do feminino e, do mesmo modo, na ação de contra- violência perpetrada por esses femininos, como propõe Preciado (2020a)______. Um apartamento em Urano. Rio de Janeiro: Zhahar, 2020a.:

O cinema não representa uma sexualidade preexistente, mas é (junto com o discurso médico, jurídico, literário etc.) um dos dispositivos que constroem o marco epistemológico e que traçam os limites dentro dos quais a sexualidade aparece como visível. [...] A questão decisiva, portanto, não é se a imagem é uma representação verdadeira ou falsa de determinada sexualidade (lésbica ou outra), mas quem tem acesso à sala de montagem coletiva na qual se produzem as ficções da sexualidade. O que uma imagem mostra não é a verdade (ou falsidade) do representado, mas o conjunto de convenções (ou críticas) visuais e políticas da sociedade que olha

(PRECIADO, 2020a______. Um apartamento em Urano. Rio de Janeiro: Zhahar, 2020a., p. 104).

Não há dúvidas de que o cinema seja um dos elementos centrais na formação de um padrão social de gênero e sexualidade, porém, ao revermos as sujeitas que ocupam a sala de montagem — no caso de Baise-moi, duas mulheres que, antes de se tornarem cineastas, já existiam como sujeitas dissidentes de gênero — podemos interrogar que política da imagem (RANCIÈRE, 2012RANCIÈRE, J. O espectador emancipado. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.) se produz aí.

Como propõe Preciado (2020a)______. Um apartamento em Urano. Rio de Janeiro: Zhahar, 2020a. em relação às multidões queer, elas utilizam a oposição ao discurso neonacionalista e neoliberal como forma de ampliação das alianças democráticas. Desta forma, propomos aqui chamar de pornotopia da violência esta ação realizada no filme Baise-moi. A pornotopia, como apresentada por Preciado (2020b)______. Pornotopia: playboy e a invenção da sexualidade multimídia. São Paulo: N-1 Edições, 2020b., seria um avanço a partir da ideia de heterotopia desenvolvida por Foucault (2013)FOUCAULT, M. De espaços outros. Estudos Avançados, [S. I.], v. 27, n. 79, p. 113-122, 2013. — um espaço outro, um local onde se justapõem diversos espaços incompatíveis.

A heterotopia estaria presente em ambientes como o cinema, a biblioteca, o museu e a escola; nela, forma e função têm suas relações alteradas, criando assim espaços provisórios de existências para os sujeitos e para as ações. Para a passagem para a pornotopia, Preciado (2020b)______. Pornotopia: playboy e a invenção da sexualidade multimídia. São Paulo: N-1 Edições, 2020b. se utiliza, principalmente, do exemplo dos bordéis, onde as qualidades de espaço e tempo estão embaralhadas de modo a dissipar a realidade exterior, ou seja, a ilusão do recinto heterotópico cria as próprias regras — ao menos no curto período em que o sujeito ali está.

A pornotopia, então, assim como a proposta original de heterotopia em Foucault, seria um lugar provisório de suspensão das normas morais que regem o mundo comum. A pornotopia é este espaço próprio de arrebatamento provocado por um vetor sexual e/ou pornográfico:

O que caracteriza a pornotopia é a sua capacidade de estabelecer relações singulares entre espaço, sexualidade, prazer e tecnologia (audiovisual, bioquímica etc.), alterando as convenções sexuais ou de gênero e produzindo a subjetividade sexual como um derivado de suas operações espaciais

(PRECIADO, 2020b______. Pornotopia: playboy e a invenção da sexualidade multimídia. São Paulo: N-1 Edições, 2020b., p. 126).

Nessa lógica, Baise-moi funcionaria como um espaço pornotópico devido às ações das personagens em todo o filme, porém, ao contrário de outras pornotopias, seria uma pornotopia que tem a violência como dado inerente. A violência é apresentada no filme como o motor de toda a narrativa: iniciada na apresentação do cotidiano das personagens repleto de violências naturalizadas e seguida pela cena do estupro, ela percorre todo o trajeto real e simbólico das personagens, até o momento de apogeu e exagero máximo, ao final do filme. Assim, esse território de códigos e realidades próprias só é possível pela presença de uma resistência ao performativo hegemônico, que no filme é incorporada pela violência. Nos aproximando de Preciado (2020a)______. Um apartamento em Urano. Rio de Janeiro: Zhahar, 2020a., uma desidentificação utilizando a violência para a reconstrução de uma subjetividade ferida pelo performativo dominante.

Se a ideia de pornotopia da violência pode ser presentificada em um filme, como é o caso de Baise-moi, ela deve ser pensada em correlação com as cenas que transformam este universo em um universo pornotópico, ou seja, as cenas com teor sexual ou pornográfico. Como aponta Preciado (2018)______. Testo Junkie: sexo, drogas e biopolítica na era farmacopornográfica. São Paulo: N-1 Edições, 2018., a pornografia pode ser vista como a própria sexualidade transformada em espetáculo, isto é, em virtualidade e informação digital disponível para a circulação e o consumo.

Talvez seja possível afirmar que a consolidação do biopoder no século XX colocou as práticas sexuais dissidentes e desejos não normativos na mesma gaveta da pornografia e do trabalho sexual. Segundo Preciado, a pornografia reúne as mesmas características de qualquer outro espetáculo da indústria cultural e deles difere apenas por estar ainda situada em um “estatuto underground”. [...] a pornografia e a prostituição podem ser consideradas os âmbitos performativos da indústria do espetáculo que foram relegados durante muito tempo ao ostracismo e à ilegalidade

(ALMEIDA; MELLO, 2019ALMEIDA, G.M.R. MELLO. J. G.; Oh bondage! Up yours! Sexualidades dissidentes e manifestações não-normativas do desejo na obra de Hito Steyerl. E-Compós, [S. I.], v. 1, n. 22, 2019. Disponível em: <https://www.e-compos.org.br/e-compos/article/view/1559/1950>. Acesso em: 25 de mai. de 2021.
https://www.e-compos.org.br/e-compos/art...
, p. 18).

Além disso, a pornografia também pode ser vista como o sexo em um estado de performance, o sexo composto de (re)apresentações e repetições públicas dos processos e criações politicamente reguladas — o sexo na pornografia, assim como a identidade sexual em si, é um efeito de reinscrição das práticas hegemônicas de sexo e gênero no corpo, como diz Preciado: “A pornografia diz a verdade performativa sobre a sexualidade não por ser o grau zero da representação, mas porque revela que a sexualidade é sempre performance, prática pública de uma repetição regulada, uma encenação [...].” (PRECIADO, 2018______. Testo Junkie: sexo, drogas e biopolítica na era farmacopornográfica. São Paulo: N-1 Edições, 2018., p. 286). Porém, as cenas pornográficas em Baise-moi funcionam de maneira oposta. Não podemos falar de repetições reguladas nesse filme. A narrativa nos apresenta uma fuga deste mecanismo, por meio especialmente da ótica da violência. Baise-moi traz cenas com teor sexual de modo a fugir da lógica comum do pornográfico — em especial do pornográfico hetero-ciscentrado. O pornográfico é o espaço de acionamento biopolítico no qual os corpos das personagens podem, finalmente, exteriorizar seus atos de ira e agressividade contra aquele que é antagonista da narrativa, o homem cis e heterossexual.

Em uma das últimas sequências do filme e, por convergência, a última em que Nadine e Manu exteriorizam a violência do universo pornotópico da narrativa, o potencial de acionamento biopolítico do pornográfico se torna claro. As protagonistas chegam a um bordel e pedem uma garrafa de champanhe, utilizando figurinos que remetem à cultura do BDSM8 8 Conforme Almeida e Mello (2019), “O BDSM, de forma mais ampla, é uma sigla que conjuga a denominação de três duplas de práticas sexuais consideradas por Gayle Rubin (1989) como sexualidades dissidentes ou dissidentes eróticos, aqueles comportamentos que estavam à margem do sistema normativo como as práticas sexuais não-reprodutivas, homossexuais, poligâmicas, intergeracionais, pornográficas, sadomasoquistas, entre outras. [...] A sigla BDSM é dividida, então, em Bondage e Disciplina (BD), Dominação e Submissão (DS) e Sadismo e Masoquismo (SM), além de incorporar também, ainda que em menor grau, algumas práticas de fetichismo [...]. Em geral, são práticas eróticas produzidas por uma pessoa na condição de dominação e outra na de submissão”. , com elementos de couro e metal. Nadine anda pelo espaço e observa mulheres e homens que ali performam atos sexuais e, enquanto isso, um homem tenta se aproximar de Manu no bar e ela o afasta. A cena é mais um momento de mostração de sexo explícito.

O homem insiste na abordagem com Manu, e ela bate sua cabeça contra o balcão do bar, transformando o ambiente sexual em um espaço de violência. Manu e Nadine sacam suas armas e começam a andar pelo bordel atirando em todas as pessoas, inclusive nas mulheres que ali estavam. Os corpos nus, que antes estavam em um ambiente de excitação, estão agora mortos e ensanguentados. Após sobrar apenas um homem vivo no bordel, Manu ordena que ele fique de quatro, abaixe suas calças e balance seu quadril como um cachorro (retomando a posição em que Manu é obrigada a ficar quando é estuprada no início do filme). Voltando à ideia de Bourcier (2020)BOURCIER, S. Homo Inc.Orporated: o triângulo e o unicórnio que peida. São Paulo: N-1 Edições, 2020. de ação dissensual queer, esta cena, bem como a do quarto de hotel, é a incorporação fílmica desta ação. As personagens rompem com a imagem do bom homo pornotópico para a violência — uma violência contra todos, homens e mulheres, que reproduzem um regime disciplinador sobre o corpo queer.

Figuras 5 e 6
Pornotopia da violência: o último homem vivo do bordel é morto com uma arma penetrada e um tiro no ânus.

Manu então penetra o homem com sua arma e atira. Este é o momento em que, após toda sua peregrinação de violência, sexo e morte, Manu e Nadine colocam a figura masculina em uma posição mais extrema de submissão e a matam, violando uma parte do corpo associada — em regimes hetero- ciscentrados — à falta de masculinidade. O olhar do feminino outro, personificado no filme por Nadine e Manu, se sobrepõe ao olhar masculino no universo pornográfico e de violência.

Esse detalhe é crucial, pois, como nos mostra Preciado (2020b)______. Pornotopia: playboy e a invenção da sexualidade multimídia. São Paulo: N-1 Edições, 2020b., as imagens pornográficas funcionariam como um exagero do olhar hegemônico dominante — facilmente representado pelo olhar do homem, hetero, cis, branco e de alta classe — ou seja, seria o espaço no qual todas as disciplinas contra o corpo feminino seriam possíveis e validadas.

Diversos críticos da representação e da linguagem pornográficas como John Berger, Laura Mulvey ou Linda Williams coincidem em apontar que o verdadeiro centro da representação pornográfica é exatamente o olho (o olhar e a subjetividade) masculino que, paradoxalmente, nunca faz parte da imagem. Não obstante, o olho masculino deixa sua marca — indício de seu poder de fabricar imagens — para assim completar a moldura que teve a sagacidade de abandonar justo antes de a fotografia ser tirada

(PRECIADO, 2020b______. Pornotopia: playboy e a invenção da sexualidade multimídia. São Paulo: N-1 Edições, 2020b., p. 70).

É na pornografia que o olhar masculino pode depositar não apenas seus fetiches, mas as suas sistemáticas para os demais corpos — ou ao menos é o que aconteceria em espaços outros que não Baise-moi. No filme esse olhar é não só dominado, mas pensado para um feminino raivoso e vingativo, um feminino que ocupa a sala de montagem, como dito anteriormente. Guiadas então pela possibilidade de revanche, as personagens de Despentes e Trihn Thi ocupam o olhar da câmera para a criação de uma pornotopia centrada na pornografia performática da violência. O exagero desta violência é o que torna tudo isso possível e, ao mesmo tempo, distante. Assim, a partir da ótica do exagero da violência é que a fuga epistêmica do filme se faz corpo e imagem. Com a criação de um mundo possível para estes femininos underground, Baise-moi enfrenta as imagens tradicionais associadas à performance hegemônica: o corpo que foge às normas é a arma utilizada por Despentes e Trihn Tin para questionar os controles do biopoder de sexo e gênero.

“Peguei carona na estrada, fui estuprada, peguei carona na estrada de novo”9 9 Frase de Virginie Despentes em Teoria King Kong (2016, p. 14).

É possível pensar como Baise-moi aciona imagens e discursos para criação da fantasmagoria de uma pornotopia que se apoia na violência e na pornografia para se fazer viável: a ferramenta de promoção da performance hegemônica — o cinema — é re-ocupada de modo a dar voz e visibilidade às narrativas dos femininos das autoras. Um mundo de contra-violência epistêmica. Um ato de ação dissensual queer frente ao mundo neoliberal em que vivemos, como propõe Bourcier (2020)BOURCIER, S. Homo Inc.Orporated: o triângulo e o unicórnio que peida. São Paulo: N-1 Edições, 2020., sendo que esta ação queer deve ser refletida tendo em consideração sua produção, recepção e discussão. No caso de Baise-moi, um filme censurado na França por levar à tela o debate do estupro e da reação a essa forma de violência. Um filme que, por questionar um sistema hegemônico de performances e violência de sexo e gênero, é relegado a uma circulação bastante restrita, de modo a não afetar as sensibilidades dos detentores da moral e dos bons costumes.

Acreditamos que a obra é capaz de criar suspensões e interrupções na esfera do desejo e do sensível de modo a questionar os ideais hetero-ciscentrados de masculinidade e, em especial, de feminilidade. O sexo e a violência são o motor de resposta à pergunta “e se resolvemos nos vingar?”. Um motor que, como demonstrado nas cenas finais de Baise-moi, possibilita não apenas a resposta do feminino, mas a criação completa de uma ficção do gênero e da sexualidade.

Como propõe Mombaça (2021, p. 66)MOMBAÇA, J. Não vão nos matar agora. Rio de Janeiro: Cobogó, 2021., “o monopólio da violência é uma ficção de poder baseada na promessa de que é possível forjar uma posição neutra desde a qual medeiam-se conflitos”. E é neste escape da neutralidade que Despentes e Trihn Thi criam sua própria pornotopia em Baise-moi. Uma pornotopia centrada na prática performática do exagero e da violência. Uma pornotopia que instiga e valida a ação dissensual queer, por meio da reação, como possibilidade de sobrevivência.

  • 1
    Uma versão bastante embrionária desse trabalho foi apresentada no Colloque International Politiques et récits du corps, no primeiro semestre de 2021. Nem o resumo submetido ao colóquio nem o artigo apresentado foram publicados.
  • 2
    Sobre as apropriações e disputas em torno do termo queer, que está longe de ser pacificado, ver o último capítulo do livro Corpos que importam, de Judith Butler (2019)______. Corpos que importam: os limites discursivos do sexo. São Paulo: N-1 Edições; Crocodilo, 2019., intitulado “Criticamente queer”. Ainda, pensando as questões relativas à transposição da teoria queer para espaços periféricos, ver o artigo Queer nos trópicos, de Pedro Paulo Gomes Pereira (2012)PEREIRA, P. P. G. Queer nos trópicos. Contemporânea, São Carlos, v. 2, n. 2, p. 371-394, jul. de 2012..
  • 3
    Título do capítulo do livro Teoria King Kong dedicado ao tema do estupro, extraído, por sua vez, de um trecho da música Antisocial, da banda punk francesa Trust (DESPENTES, 2016DESPENTES, V. Teoria King Kong. São Paulo: N-1 Edições, 2016., p. 27).
  • 4
    É importante sublinhar que o violador diz estar fazendo sexo e não estuprando, mas é necessário algum cuidado com essa sugestão de falta de autoconsciência masculina em relação ao ato de violência. Como a própria autora aponta, “[...] o estupro é também um diálogo particular através do qual um homem declara aos outros homens: eu fodo suas mulheres à força” (DESPENTES, 2016DESPENTES, V. Teoria King Kong. São Paulo: N-1 Edições, 2016., p. 33).
  • 5
    A esse respeito, sugerimos a consulta à obra da antropóloga feminista Rita Segato, especialmente o livro Las estructuras elementares de la violência. Ensayos sobre género entre la antropologia, el psicoanálises y los derechos humanos (2003), que conta com capítulo intitulado “La estrutura de género y el mandato de violación. Nesse texto, SegatoSEGATO, R. Las estructuras elementares de la violência. Ensayos sobre género entre la antropologia, el psicoanálises y los derechos humanos. Bernal: Universidad Nacional de Quilmes, 2003. discute o que chama de violación cruenta, que seria a violência sexual ocorrida em espaços públicos, por pessoas desconhecidas, mediante emprego da força física e do poder de morte de um indivíduo sobre outro, como no caso do acosso que resultou em estupro encenado em Baise-Moi, e que é distinto daquela violência sexual mais comum quantitativamente, que se dá em espaços privados como o doméstico, mediante também persuasão e não apenas força física.
  • 6
    Esse debate encontra grande ressonância nas discussões sobre as representações do Holo-causto, de genocídios e da violência de estado. De Claude Lanzmann a Jean-Luc Godard, num confronto que se tornou canônico no cinema, passando mais recentemente por Rithy Panh e Joshua Oppenheimer, e no campo da teoria, por Georges Didi-Huberman, há significativa fortuna crítica dedicada às implicações entre cinema e violência e à pedagogia fílmica da mostração dessa violência. Ver DIDI-HUBERMAN, 2012DIDI-HUBERMAN, G. Imagens apesar de tudo. Lisboa: KKYM, 2012. e BRINK e OPPENHEIMER, 2012BRINK, J. T., OPPENHEIMER, J. (orgs.). Killer images: documentary film, memory and the performance of violence. New York: Columbia University Press, 2012..
  • 7
    Inspiradas por Rancière, trabalhamos com a ideia da fabulação como trabalho ficcional dissensual, conforme define Ângela Marques (2020)MARQUES, A. A fabulação dos intervalos nas imagens: o momento qualquer como operação estética e política em Jacques Rancière. In: Anais do 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Intercom. São Paulo: Ed. Intercom, 2020. Disponível em: <http://www.intercom.org.br/sis/eventos/2020/resumos/R15-1718-1.pdf/>. Acesso em: 20 de set. de 2021.
    http://www.intercom.org.br/sis/eventos/2...
    , que afirma: “De acordo com Rancière (2019)RANCIÈRE, J. O espectador emancipado. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012., o modo como a ficção atua na produção de figurações, resistências e questionamentos, para ele, implica em uma forma de compor as imagens (entrelaçadas com discursos, textos e palavras) que perturbe a maneira como usualmente as representações tendem a apresentar, ao mesmo tempo, os conflitos e suas soluções pacificadas.” Quando consideramos a fabulação em sua relação com o dissenso, estamos interessadas nas rasuras possíveis de serem produzidas, por sujeitos(as) sem-parte, em formas de distribuição do tempo, do espaço e dos regimes de enunciação que buscam circunscrevê-los(as) em determinadas identidades impostas. Em nosso caso, de mulheres pobres e periféricas vítimas de violência sexual. A fabulação tem a ver com um “‘como se’ envolvido no ‘é o modo como as coisas são’” (RANCIÈRE apud MARQUES, OLIVEIRA; MORICEAU, 2018MARQUES, A.; OLIVEIRA, A. K. C.; MORICEAU, J. L. A política da escrita e a performatividade da palavra do homem ordinário no método da igualdade de Jacques Rancière. Questões Transversais – Revista de Epistemologias da Comunicação, São Leopoldo, 2018, vol. 6, n. 12, pp. 92-103. Disponível em: <http://revistas.unisinos.br/index.php/questoes/article/view/18082>. Acesso em: 20 de set. de 2021.
    http://revistas.unisinos.br/index.php/qu...
    ).
  • 8
    Conforme Almeida e Mello (2019)ALMEIDA, G.M.R. MELLO. J. G.; Oh bondage! Up yours! Sexualidades dissidentes e manifestações não-normativas do desejo na obra de Hito Steyerl. E-Compós, [S. I.], v. 1, n. 22, 2019. Disponível em: <https://www.e-compos.org.br/e-compos/article/view/1559/1950>. Acesso em: 25 de mai. de 2021.
    https://www.e-compos.org.br/e-compos/art...
    , “O BDSM, de forma mais ampla, é uma sigla que conjuga a denominação de três duplas de práticas sexuais consideradas por Gayle Rubin (1989)RUBIN, G. Políticas do sexo. São Paulo: Ubu, 2017. como sexualidades dissidentes ou dissidentes eróticos, aqueles comportamentos que estavam à margem do sistema normativo como as práticas sexuais não-reprodutivas, homossexuais, poligâmicas, intergeracionais, pornográficas, sadomasoquistas, entre outras. [...] A sigla BDSM é dividida, então, em Bondage e Disciplina (BD), Dominação e Submissão (DS) e Sadismo e Masoquismo (SM), além de incorporar também, ainda que em menor grau, algumas práticas de fetichismo [...]. Em geral, são práticas eróticas produzidas por uma pessoa na condição de dominação e outra na de submissão”.
  • 9
    Frase de Virginie Despentes em Teoria King Kong (2016, p. 14).

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    29 Jun 2021
  • Aceito
    02 Nov 2021
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