Open-access Teorias da comunicação e experiência: aproximações

Theories of communication and experience: approximations

LEAL, Bruno; MENDONÇA, Carlos. Teorias da comunicação e experiência: aproximações. Cachoeirinha: Fi, 2023. 178 p.

RESUMO

A coletânea Teorias da comunicação e experiência: aproximações aborda as reflexões com base na ancoragem teórica e metodológica na experiência para a apreensão dos processos comunicacionais. Organizada por Bruno Leal e Carlos Mendonça, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a obra pensa a comunicação pela perspectiva da experiência e se propõe a discutir os impactos dela nos processos comunicacionais. O livro faz um movimento de retirar a temática das bordas e trazê-la para a centralidade de cada um dos sete textos apresentados. A experiência é concebida como um termo amplo, flutuante e que abrange múltiplas dimensões em diversos campos do conhecimento.

PALAVRAS-CHAVE
teorias da comunicação; experiência; processos comunicacionais

ABSTRACT

The compilation Teorias da comunicação e experiência: aproximações addresses reflections based on the theoretical and methodological anchoring of experience for the apprehension of communication processes. Organized by Bruno Leal and Carlos Mendonça, from Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), the work thinks about communication from the perspective of experience and proposes to discuss its impact on communication processes. The book takes the theme out of the margins and brings it to the center of each of the seven texts presented. Experience is conceived as a broad, fluctuating term that covers multiple dimensions in various fields of knowledge.

KEYWORDS
communication theories; experience; communication processes

Reflexões disruptivas para teorias outras da comunicação, essa é a proposta da coletânea Teorias da comunicação e experiência: aproximações, organizada por Bruno Leal e Carlos Mendonça, publicada pela Editora Fi. Os organizadores explicam as relações e incertezas que constituem a perspectiva que conduz a obra:

Nessa perspectiva, pensar a Comunicação a partir da experiência implica aproximar-se de relações ainda imprecisas, que envolvem diferentes fenômenos e processos que existem na vida cotidiana e também os caminhos, construtos teóricos, procedimentos operacionais e aproximações empíricas que envolvem a produção do conhecimento. Essas reflexões podem alcançar dimensões que articulam comunicação e experiência, como tempo, agência, corpo e texto, que servem então como vetores dos investimentos teóricos e em torno da aproximação a distintos fenômenos

(Leal e Mendonça, 2023, p. 9).

A relação intrínseca entre experiência e comunicação está presente há muitos anos nos escritos de autores que se dedicam à compreensão não somente de noções conceituais, mas também de inquietações metodológicas e análises empíricas. De modo bastante amplo, podemos afirmar que pode ser encontrada em inúmeros autores considerados referenciais para os estudos de comunicação e em outros fundamentais para a compreensão de fenômenos comunicacionais (Bondía, 2002; Dewey, 1958, 1980; Guimarães, Leal e Mendonça, 2006; Lapoujade, 2017). Mas essa relação não nos parece óbvia nem facilmente identificável e estaria no campo da experiência como pressuposto. O livro faz um movimento de retirar a temática das bordas e trazê-la para a centralidade de cada um dos sete textos apresentados. A obra enfrenta a problemática de um termo – experiência – polissêmico, escorregadio e de difícil compreensão, buscando matrizes teóricas diversas, tais como abordagens filosóficas hermenêuticas e pragmatistas, pensamentos embasados nos estudos culturais, reflexões apoiadas na semiótica, dicções próximas à história, além de aproximações com autores como Jacques Rancière e Walter Benjamin, em releituras mais contemporâneas.

O livro é um convite a um mergulho no qual o leitor organiza o seu próprio percurso; não há necessariamente uma hierarquia proposta para a leitura. A obra reforça a importância de propostas epistemológicas democráticas, disruptivas e ao mesmo tempo construtivas. Disruptivas porque problematizam uma série de noções entrelaçadas à comunicação e à experiência, assumindo a relação entre ambas como fundamental para a compreensão de teorias possíveis da comunicação; e construtivas porque são propositivas no sentido de nos desvelar pistas para essa compreensão e aplicabilidade em estudos futuros.

Engana-se quem pensa que a proposta do livro é dogmática ao se deparar com o primeiro texto, logo após a apresentação, de Bruno Souza Leal, intitulado Postulado. O título pode, simultânea e paradoxalmente, nos provocar em sentidos e imaginários da doxa para o truísmo, verdade incontestável ou evidente por si mesma. O autor quebra essa expectativa, caso ela tenha ocorrido, ao apresentar um questionamento em que a simplicidade reside somente na formulação de um ato de fala interrogativo: O que implica pensar a comunicação com base na experiência? Se o ato de fala se constitui simples pela sua formulação, revela, no não dito inicial, o que está por vir: a complexidade de um pensar, as implicações diversas sobre os fenômenos e os processos comunicacionais, além dos aspectos epistêmicos e metodológicos presentes na sua investigação e na reflexão sobre eles.

Em Consciência afetiva, modificações de presença e fluxo: comunicação e experiência nos estudos culturais, Itania Maria Mota Gomes pretende evidenciar o movimento que possibilitou a compreensão de cultura nos estudos culturais como terreno de enfrentamento e resistência, de potência de transformação e de problematização da noção de experiência. Em diálogo com E. P. Thompson e Raymond Williams, a pesquisadora evidencia “que experiência pode ser tomada como consciência afetiva, tem qualidade de presença e constitui-se como força ativa de transformação” (Gomes, 2023, p. 43). Márcio Souza Gonçalves nomeia Experiência e comunicação a proposta na qual enumera sete pontos que considera elementares ou fundamentais para o entendimento das experiências para pesquisas empíricas e reflexões teóricas. O autor ressalta que, diante da infinidade de sentidos para os termos comunicação e experiência, optou por um certo caminho possível, deixando claro que há outros.

Como o próprio nome diz, A experiência emancipatória da borda: intervalos e coexistências espaço-temporais no pensamento de Jacques Rancière, de autoria de Ângela Cristina Salgueiro Marques, concentra sua reflexão em três aspectos da presença da noção de experiência no processo de emancipação na perspectiva de Jacques Rancière. Para tal, a autora incursiona pelo significado do devaneio e do tédio na criação de uma temporalidade desviante para a experiência emancipatória. O segundo aspecto revela como o devaneio, compreendido como uma operação temporal desviante, pode não só reconfigurar a superfície da experiência, mas também alterar suas coordenadas. E o terceiro e último momento da análise se debruça sobre a abertura de temporalidades e espacialidades liminares e suas contribuições para que a emancipação se configure como experiência política transformadora.

Clotilde Perez conclui, em A experiência nas teorias de Charles Sanders Peirce, entre outras considerações, que a experiência pode se configurar como uma possibilidade de questionamento da crença, o que independe dos fundamentos de sua fixação. Ao assumir que a comunicação contemporânea é marcadamente transmidiática, Geane Carvalho Alzamora nos lembra, em Reflexões sobre a dinâmica transmídia de (des)informação à luz das noções peirceanas de experiência e comunicação, que isso significa reconhecer a fluidez da produção de informação, distribuição multiplataforma e propagação em rede impulsionada pela ação integrada de agentes humanos e algorítmicos. A pesquisadora reflete sobre como e em que medida uma circunstância implica a outra. E se questiona e nos questiona “quais seriam os limites e as potencialidades derivados de tal imbricamento empírico-conceitual” (Alzamora, 2023, p. 135) na relação comunicação e experiência.

O ensaio de Carlos Magno Camargos Mendonça, Comunicação: a experiência partilhada, requer atenção cuidadosa à gramática, que aciona sintagmas próprios de uma abordagem nas quais as teorias da comunicação são percebidas de uma perspectiva que destaca aspectos importantes às noções de comunicação e experiência e os sentidos propostos por uma grande metáfora. O autor propõe uma conversação ou uma partilha, que parte dele para as pessoas leitoras, em diálogo com autores e saberes tradicionais, cuja centralidade está na tríade do compartilhamento das vivências: experiência, conhecimento e comunicação.

Esse olhar, mais detalhado e focado em reflexões, propõe trazer à cena a interface entre experiência e comunicação, no sentido de atravessar, em processo descontínuo de construção, possibilidades outras de pensar teorias possíveis da comunicação. Os textos não têm a pretensão de apresentar noções únicas, fechadas e autoritárias, nem de experiência, nem de comunicação. Se, por um lado, o livro realça quão inacabada e repleta de possibilidades é essa interrelação, por outro, deixa lacunas quanto à exploração das reflexões teóricas dialogadas com pensamentos analíticos em estudos empíricos. Um problema que permanece sem resposta, a nosso ver, está relacionado à dificuldade de articular metodologias que deem conta de lidar com empirias experienciais, em especial, aquelas relacionadas a situações de pessoas vulnerabilizadas em pesquisa. Quais os limites da experiência? Em quais circunstâncias se estabelecem o esvaziamento da experiência em fenômenos comunicacionais? Em quais dimensões sociais, além da singularidade e do coletivo, a experiência é tanto potência quanto fraqueza nos estudos comunicacionais? Essas inquietações permanecem em aberto, a serem exploradas em escritos futuros.

REFERÊNCIAS

  • ALZAMORA, Geane Carvalho. Reflexões sobre a dinâmica transmídia de (des)informação à luz das noções peirceanas de experiência e comunicação. In: LEAL, Bruno; MENDONÇA, Carlos (org.). Teorias da comunicação e experiência: aproximações. Cachoeirinha: Fi, 2023. p. 135-156.
  • BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 19, p. 20-28, jan./fev./mar./abr. 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbedu/a/Ycc5QDzZKcYVspCNspZVDxC/?format=pdf⟨=pt Acesso em: 28 ago. 2024.
    » https://www.scielo.br/j/rbedu/a/Ycc5QDzZKcYVspCNspZVDxC/?format=pdf⟨=pt
  • DEWEY, John. Experience and nature Nova York: Dover, 1958.
  • DEWEY, John. Art as experience Nova York: Perigee, 1980.
  • GOMES, Itania Maria Mota. Consciência afetiva, modificações de presença e fluxo: comunicação e experiência nos estudos culturais. In: LEAL, Bruno; MENDONÇA, Carlos (org.). Teorias da comunicação e experiência: aproximações. Cachoeirinha: Fi, 2023. p. 41-66.
  • GUIMARÃES, César; LEAL, Bruno S.; MENDONÇA, Carlos (org.). Comunicação e experiência estética Belo Horizonte: ed. UFMG, 2006.
  • LAPOUJADE, D. William James, a construção da experiência. São Paulo: N-1, 2017.
  • LEAL, Bruno; MENDONÇA, Carlos (org.). Teorias da comunicação e experiência: aproximações. Cachoeirinha: Fi, 2023.
  • MENDONÇA, Carlos. Comunicação: a experiência partilhada. In: LEAL, Bruno; MENDONÇA, Carlos (org.). Teorias da comunicação e experiência: aproximações. Cachoeirinha: Fi, 2023. p. 159-177.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jun 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    03 Set 2024
  • Aceito
    20 Nov 2025
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