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Formação continuada por meio da pesquisa-ação: participação e decisão dos professores

Continuing education through action research: teacher participation and decision

La educación continua a través de la investigación-acción: participación y decisión de los docentes

Resumo

Este artigo é fruto de uma pesquisa de doutorado que tem como objetivo analisar a formação continuada desenvolvida por meio de um processo de pesquisa-ação. O local da pesquisa é uma escola de Educação Infantil localizada em uma capital do Centro-Oeste do país. Os sujeitos da pesquisa são cinco professores da Educação Infantil. Os dados da pesquisa, apresentados neste artigo, foram produzidos durante o ano de 2022. Destacamos que nossa opção pela abordagem qualitativa, especificamente pela metodologia da pesquisa-ação, é por entendermos que os professores que atuam na Educação Básica produzem, mediante sua atuação, uma gama de conhecimentos; portanto, apresentam condições de participar e de decidir o tipo de formação continuada que necessitam ter. Os aspectos teóricos que trazemos nesta pesquisa são aqueles que enfatizam os conhecimentos dos professores como importantes, necessários e qualificadores do processo de formação continuada. Como conclusão, podemos afirmar, com base na produção dos dados, que a formação continuada, desenvolvida por meio da pesquisa-ação, explicita que a possibilidade de participar e o poder de decisão dos professores fazem com que eles se sintam mais comprometidos e respeitados no ambiente formativo.

Palavras-chave
formação continuada; professores; pesquisa-ação

Abstract

This article has derived from a doctoral research that aims to analyze the continuing education developed through an action-research process. The research setting is a kindergarten school located in a capital in the Midwestern region of the country. The research subjects are five kindergarten teachers. Research data presented in this article were produced in 2022. We emphasize that our option for the qualitative approach, specifically for the action-research methodology, is due to the understanding that teachers who work in Basic Education produce, through their performance, a range of knowledge; hence, they are entitled to participate and decide the type of continuing education they need. The theoretical issues brought up in this research highlight both the importance of and the need for the knowledge of teachers to qualify the continuing education process. In conclusion, based on the production of data, we can say that continuing education developed through action research shows that the possibility of participating and the decision-making power of teachers make them feel more committed and respected in the educational environment.

Keywords
continuing education; teachers; action research

Resumen

Este artículo es el fruto de una investigación doctoral que tiene como objetivo analizar la formación continua desarrollada a través de un proceso de investigación-acción. El local de la investigación es una escuela de Educación Infantil ubicada en una capital del Centro-Oeste del país. Los sujetos de la investigación son cinco maestras de Educación Infantil. Los datos de la investigación, presentados en este artículo, fueron producidos durante el año 2022. Destacamos que nuestra opción por el enfoque cualitativo, específicamente por la metodología de investigación-acción, es porque entendemos que los docentes que actúan en la Educación Básica producen, a través de su actuación, una gama de conocimientos; por lo tanto, son capaces de participar y decidir el tipo de educación continua que necesitan tener. Los aspectos teóricos que traemos en esta investigación son aquellos que enfatizan el conocimiento docente como importante, necesarios y calificadores del proceso de formación continua. Como conclusión podemos decir, con base en la producción de datos, que la educación continua, desarrollada a través de la investigación-acción, explica que la posibilidad de participar y el poder de decisión de los docentes los hacen sentir más comprometidos y respetados en el ambiente de formación.

Palabras clave
educación continua; maestros; investigación-acción

1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

Este estudo tem como objetivo analisar a formação continuada desenvolvida por meio de um processo de pesquisa-ação realizado em uma escola com professores da Educação Infantil.

Apresentamos, inicialmente, os teóricos que referenciam a pesquisa e que dão suporte para a análise. Dentre eles, destacamos os que discutem a educação reconhecendo a contribuição cotidiana dos professores para o processo formativo, bem como para a educação. A discussão teórica apresentada nesta pesquisa busca romper com um suposto abismo entre o conhecimento produzido pela pesquisa acadêmica e o conhecimento dos professores que atuam na escola. Portanto, a pesquisa procura explicitar a necessidade e a produtividade do diálogo entre as diferentes instâncias formativas: a acadêmica e a escolar.

Em seguida, apresentamos a abordagem metodológica da pesquisa, em que ressaltamos a importância da pesquisa qualitativa na educação, especificamente, da pesquisa-ação, para a produção dos dados. Após a metodologia, apresentamos a análise dos dados produzidos no campo empírico, ou seja, junto aos professores da Educação Infantil que participaram da pesquisa-ação.

Por fim, apresentamos algumas conclusões, em que enfatizamos a importância da pesquisa-ação, tanto no âmbito da pesquisa com professores quanto no processo de formação continuada.

2 A TEORIA CRÍTICA DA EDUCAÇÃO E A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

Em um contexto de lutas por uma educação permeada pela escuta, pelo diálogo, pela esperança, na busca de transformação social, Pavan (2018)NÓVOA, Antonio. Devolver a formação de professores aos professores. Cadernos de Pesquisa em Educação, Vitória, v. 18, n. 35, p. 11–22, jan./jun. 2012 afirma a importância do “processo que nos leva a esse redizer da necessidade da esperança como impulso para a construção de uma educação pública, justa, democrática, plural e multicultural” (PAVAN, 2018, p. 1440NÓVOA, Antonio. Devolver a formação de professores aos professores. Cadernos de Pesquisa em Educação, Vitória, v. 18, n. 35, p. 11–22, jan./jun. 2012). Um redizer que permita o envolvimento e a participação, em que os professores possam expressar-se, afinal:

Todos os que exercem uma atividade quotidiana no social, quer sejam ou não professores, todos mergulham em práticas que, geralmente, lhes permitem lidar em diversos contextos, com diferentes pessoas que, elas também, se confrontam com uma larga diversidade de problemas. Mas, por vezes, e apesar desta existência de múltiplas e diversificadas situações e problemas com que cada um se confronta, os acontecimentos que têm lugar no meio em que quotidianamente se movem tornaram-se tão familiares que as formas de as enfrentar, que, frequentemente, se situam no quadro do senso comum, deixam de suscitar qualquer questionamento. (CORTESÃO, 2018, p. 166CORTESÃO, Luiza. O valor da prática em Paulo Freire. Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 26, n. 1, p. 165–78, abr. 2018. ISSN 1982-9949. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/reflex/article/view/12014. Acesso em: 18 mar. 2023.
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).

Lidar com diferentes práticas, com diferentes contextos e com uma diversidade de problemas possibilita ao professor refletir criticamente “[...] consoante as condições pessoais e profissionais em que trabalha [...], estabelecendo no seu quotidiano, em diferentes momentos, diferentes tipos de interações, em consequência da forma como vai conseguindo desenvolver as suas atividades” (CORTESÃO, 2018, p. 167CORTESÃO, Luiza. O valor da prática em Paulo Freire. Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 26, n. 1, p. 165–78, abr. 2018. ISSN 1982-9949. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/reflex/article/view/12014. Acesso em: 18 mar. 2023.
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).

Freire (2021, p. 133) lembra-nos de que “testemunhar a abertura aos outros, a disponibilidade curiosa à vida, a seus desafios, são saberes necessários à prática educativa”. Também evidencia que o sujeito que “se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se confirma como inquietação e curiosidade, como inconclusão em permanente movimento na história” (FREIRE, 2021, p. 133). O ensinar exige, como Freire aponta, saber escutar, pois “o educador que escuta aprende a difícil lição de transformar seu discurso” (FREIRE, 2021, p. 111). Abertos à escuta e ao diálogo, fortalecemos a esperança de um fazer pedagógico que atenda às realidades sociais dos sujeitos que ali habitam, que seja próximo de suas necessidades e que cumpra com a finalidade da educação de formar sujeitos críticos e autônomos.

Ao mergulhar nas práticas, nos contextos e nas diversas e múltiplas situações existentes nos cotidianos escolares, “verifica-se que, frequentemente, se atua, desenvolvendo uma prática cujo significado, cujos efeitos reais são, por vezes, mais ou menos ignorados, mas que também podem ser questionados ou até valorizados” (CORTESÃO, 2018, p. 167CORTESÃO, Luiza. O valor da prática em Paulo Freire. Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 26, n. 1, p. 165–78, abr. 2018. ISSN 1982-9949. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/reflex/article/view/12014. Acesso em: 18 mar. 2023.
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).

Questionar a atuação docente e a formação continuada por meio da teoria crítica é de suma importância no contexto atual. Parafraseando Santos (1999, p. 197)NÓVOA, António. Firmar a posição como professor, afirmar a profissão docente. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 47, n. 166, p. 1106–33, 2017. Doi: https://doi.org/10.1590/198053144843
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, quando afirma que vivemos “[...] num mundo onde há tanto para criticar [...]”, podemos dizer que há muito para criticar na educação e na formação continuada.

A teoria crítica é promissora, pois, por meio dela, entendemos que a educação e a formação continuada não se resumem ao que elas são e incluem o que podem tornar-se: “A análise crítica do que existe assenta no pressuposto de que a existência não esgota as possibilidades da existência e que, portanto, há alternativas susceptíveis de superar o que é criticável no que existe” (SANTOS, 1999, p. 197NÓVOA, António. Firmar a posição como professor, afirmar a profissão docente. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 47, n. 166, p. 1106–33, 2017. Doi: https://doi.org/10.1590/198053144843
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).

Assim, ainda de acordo com o autor, as inquietações diante dos problemas que surgem são suficientes “[...] para nos obrigar a interrogarmo-nos criticamente sobre a natureza e a qualidade moral da nossa sociedade e a buscarmos alternativas teoricamente fundadas nas respostas que dermos a tais interrogações” (SANTOS, 1999, p. 197NÓVOA, António. Firmar a posição como professor, afirmar a profissão docente. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 47, n. 166, p. 1106–33, 2017. Doi: https://doi.org/10.1590/198053144843
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). Segundo nossa argumentação, ao recorrermos à pesquisa-ação articulada com a teoria crítica, as alternativas podem ser encontradas coletivamente e, em função disso, terão mais possibilidades de responderem às interrogações e de produzirem transformações nas escolas – transformações alimentadas “[...] por uma paixão pela justiça social, a igualdade econômica, os direitos humanos, o meio ambiente sustentável, uma educação [...] digna”. (APPLE, 2013, p. 51APPLE, Michael. As tarefas do estudioso/ativista crítico em uma época de crise educacional. Revista Pedagógica, Chapecó, v. 15, n. 30 [Dossiê Educação Crítica], p. 29–66, jan./jun. 2013. Disponível em: https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/pedagogica/article/view/1564 Acesso em: 20 mar. 2023.
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).

Os autores Freire (2021), Pavan (2018)NÓVOA, Antonio. Devolver a formação de professores aos professores. Cadernos de Pesquisa em Educação, Vitória, v. 18, n. 35, p. 11–22, jan./jun. 2012, Cortesão (2018)CORTESÃO, Luiza. O valor da prática em Paulo Freire. Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 26, n. 1, p. 165–78, abr. 2018. ISSN 1982-9949. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/reflex/article/view/12014. Acesso em: 18 mar. 2023.
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, Santos (1999)NÓVOA, António. Firmar a posição como professor, afirmar a profissão docente. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 47, n. 166, p. 1106–33, 2017. Doi: https://doi.org/10.1590/198053144843
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e Apple (2013)APPLE, Michael. As tarefas do estudioso/ativista crítico em uma época de crise educacional. Revista Pedagógica, Chapecó, v. 15, n. 30 [Dossiê Educação Crítica], p. 29–66, jan./jun. 2013. Disponível em: https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/pedagogica/article/view/1564 Acesso em: 20 mar. 2023.
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expressam o significado e a importância da apropriação crítica da realidade pelo professor. Nesse sentido, reiteramos a importância da pesquisa-ação no processo de formação continuada, como forma de fortalecimento da perspectiva crítica e emancipatória.

3 A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA-AÇÃO NA FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

Franco (2005)FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, dez. 2005. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022005000300011&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 20 mar. 2023.
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aponta que a pesquisa-ação oportuniza “[...] uma pesquisa de transformação, participativa, caminhando para processos formativos” (FRANCO, 2005, p. 486FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, dez. 2005. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022005000300011&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 20 mar. 2023.
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). A pesquisa-ação rompe com a racionalidade técnica, pois é um tipo de pesquisa que se opõe à epistemologia positivista, a qual sustenta a racionalidade técnica. A pesquisa-ação pressupõe “a integração dialética entre o sujeito e sua existência; entre fatos e valores; entre pensamento e ação; e entre pesquisador e pesquisado” (FRANCO, 2005, p. 488FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, dez. 2005. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022005000300011&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 20 mar. 2023.
https://www.scielo.br/scielo.php?script=...
). A autora apresenta um conjunto de princípios fundantes necessários para que a pesquisa-ação, com suas características, possa ser utilizada na educação, promovendo a formação e emancipação. São eles:

  • a ação conjunta entre pesquisador-pesquisados;

  • a realização da pesquisa em ambientes onde acontecem as próprias práticas;

  • a organização de condições de autoformação e emancipação aos sujeitos da ação;

  • a criação de compromissos com a formação e o desenvolvimento de procedimentos

  • crítico-reflexivos sobre a realidade;

  • o desenvolvimento de uma dinâmica coletiva que permita o estabelecimento de referências contínuas e evolutivas com o coletivo, no sentido de apreensão dos significados construídos e em construção;

  • reflexões que atuem na perspectiva de superação das condições de opressão, alienação e de massacre da rotina;

  • ressignificações coletivas das compreensões do grupo, articuladas com as condições sociohistóricas [sic];

  • o desenvolvimento cultural dos sujeitos da ação. (FRANCO, 2005, p. 489FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, dez. 2005. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022005000300011&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 20 mar. 2023.
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    ).

A partir desses princípios, fica explícito que a pesquisa-ação se torna eminentemente pedagógica. Nesse sentido, defendemos os processos formativos “[...] baseados no modelo da racionalidade crítica – os quais são explicitamente orientados para promover maior igualdade e justiça social” (DINIZ PEREIRA, 2002, p. 16), e “[...] foi Freire quem desenvolveu uma ideia política sobre tal concepção, por meio de seu método do diálogo de levantamento de problemas [...]”. Essa perspectiva percebe “o professor [...] como alguém que levanta problemas e dirige um diálogo crítico em sala de aula; levantamento de problema é um sinônimo de pedagogia” (DINIZ PEREIRA, 2002, p. 12).

Segundo Freire (1980, p. 69), “a educação é comunicação, é diálogo, na medida em que não é a transferência de saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores que buscam a significação dos significados” (FREIRE, 1980, p. 69).

Zeichner e Diniz-Pereira (2005, p. 64)SILVEIRA, Denise Tolfo; CÓRDOVA, Fernanda Peixoto. A pesquisa científica. In: GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo (Org.). Métodos de Pesquisa. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. p. 31–42. chamam atenção para o fato de que uma formação crítica necessita “[...] reforçar os laços do movimento de pesquisa-ação com as lutas mais amplas por justiça social, econômica e política em todo o mundo”. Os autores também mencionam algumas contribuições da pesquisa-ação para o processo de formação continuada.

1. melhorar a formação profissional e, por conseguinte, propiciar serviços sociais (educação, saúde etc.) de melhor qualidade; 2. potencializar o controle que esses profissionais passam a exercer sobre o conhecimento ou a teoria que orienta os seus trabalhos; 3. influenciar as mudanças institucionais nos locais de trabalho desses profissionais (escolas, hospitais, agências de serviço social etc.); 4. contribuir para que as sociedades tornem-se mais democráticas e mais decentes para todos (ou seja, sua ligação com temas de reprodução ou de transformação social). (ZEICHNER; DINIZ-PEREIRA, 2005, p. 64–5SILVEIRA, Denise Tolfo; CÓRDOVA, Fernanda Peixoto. A pesquisa científica. In: GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo (Org.). Métodos de Pesquisa. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. p. 31–42.).

O movimento da pesquisa-ação promove envolvimento, participação, protagonismo, pois é “uma pesquisa sistemática feita por profissionais sobre as suas próprias práticas” (ZEICHNER; DINIZ-PEREIRA, 2005, p. 64SILVEIRA, Denise Tolfo; CÓRDOVA, Fernanda Peixoto. A pesquisa científica. In: GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo (Org.). Métodos de Pesquisa. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. p. 31–42.). A importância do protagonismo do professor, do seu envolvimento e de sua participação expressa-se como “[...] investimento na construção de redes de trabalho colectivo que sejam o suporte de práticas de formação baseadas na partilha e no diálogo profissional” (SANTOS, 2013, p. 233PAVAN, Ruth. A necessidade de redizer e reviver a pedagogia da esperança de Paulo Freire. Revista e-Curriculum, São Paulo, v. 16, n. 4, p. 1437–56 out./dez. 2018. Disponível em: https://revistas. pucsp.br/index.php/curriculum/article/view/37098. Acesso em: 28 jul 2021.
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). A autora ainda afirma que “[...] as experiências mais interessantes de formação estão organizadas em torno de professores fortemente comprometidos com a profissão” (SANTOS, 2013, p. 233PAVAN, Ruth. A necessidade de redizer e reviver a pedagogia da esperança de Paulo Freire. Revista e-Curriculum, São Paulo, v. 16, n. 4, p. 1437–56 out./dez. 2018. Disponível em: https://revistas. pucsp.br/index.php/curriculum/article/view/37098. Acesso em: 28 jul 2021.
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).

Outro elemento ressaltado por Santos (2013)PAVAN, Ruth. A necessidade de redizer e reviver a pedagogia da esperança de Paulo Freire. Revista e-Curriculum, São Paulo, v. 16, n. 4, p. 1437–56 out./dez. 2018. Disponível em: https://revistas. pucsp.br/index.php/curriculum/article/view/37098. Acesso em: 28 jul 2021.
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é a importância atribuída ao diálogo no processo formativo do professor, com destaque para os conhecimentos apropriados em sua atuação na escola, “através da experiência e da reflexão sobre a experiência. O que dá sentido à formação é o diálogo entre os professores, a análise rigorosa das práticas e a procura colectiva das melhores formas de agir” (SANTOS, 2013, p. 233PAVAN, Ruth. A necessidade de redizer e reviver a pedagogia da esperança de Paulo Freire. Revista e-Curriculum, São Paulo, v. 16, n. 4, p. 1437–56 out./dez. 2018. Disponível em: https://revistas. pucsp.br/index.php/curriculum/article/view/37098. Acesso em: 28 jul 2021.
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).

É na escola que a experiência do professor se constrói de forma inter-relacional, coletiva, dialógica, e é por meio dela que vamos nos constituindo como profissionais. Conforme aponta Franco (2019)FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pesquisa-Ação: lembretes de princípios e de práticas. Revista Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 11, n. 25, p. 358–70, set./dez. 2019. Disponível em: https://periodicos.unisantos.br/pesquiseduca/article/view/949/pdf. Acesso em: 16 mar. 2023.
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:

Quando a pesquisa-ação é realizada sem vínculos com a pesquisa coletiva de sujeitos, ela corre o risco de transformar suas possibilidades emancipatórias em mais um instrumento domesticador das consciências e das liberdades individuais e pode perder a oportunidade de formação de pessoas na direção da partilha, da solidariedade, do trabalhar junto e da produção coletiva de conhecimentos. (FRANCO, 2019, p. 359FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pesquisa-Ação: lembretes de princípios e de práticas. Revista Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 11, n. 25, p. 358–70, set./dez. 2019. Disponível em: https://periodicos.unisantos.br/pesquiseduca/article/view/949/pdf. Acesso em: 16 mar. 2023.
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).

Na educação, a primazia deve ser do trabalho coletivo, participativo, sobretudo, baseado em reflexão e diálogo, com vistas a práticas libertadoras e emancipatórias. É nesse sentido que a pesquisa-ação se apresenta como uma possibilidade: “A pesquisa-ação é uma pesquisa de caráter social e formativo, associada a uma estratégia de intervenção/formação e que evolui durante o processo, atendendo à dinâmica do contexto social em que se insere” (FRANCO, 2019, p. 363FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pesquisa-Ação: lembretes de princípios e de práticas. Revista Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 11, n. 25, p. 358–70, set./dez. 2019. Disponível em: https://periodicos.unisantos.br/pesquiseduca/article/view/949/pdf. Acesso em: 16 mar. 2023.
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). Essa formação deverá constituir-se no processo, inserindo “todos os participantes considerados coautores do conhecimento que se produz durante a pesquisa” (FRANCO, 2019, p. 363FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pesquisa-Ação: lembretes de princípios e de práticas. Revista Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 11, n. 25, p. 358–70, set./dez. 2019. Disponível em: https://periodicos.unisantos.br/pesquiseduca/article/view/949/pdf. Acesso em: 16 mar. 2023.
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).

4 ESPECIFICIDADES DA PESQUISA-AÇÃO NA FORMAÇÃO CONTINUADA

Uma pesquisa de caráter qualitativo exige um método de investigação científica com a finalidade de produzir dados acerca de um tema e/ou objeto de estudo a partir da realidade na qual está inserido, para que se possa compreender, descrever e analisar o objeto da investigação.

De acordo com Bogdan e Biklen (1994)BOGDAN, Robert C.; BIKLEN, Sari K. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994., a abordagem qualitativa possibilita a captação de diferentes enfoques por meio das palavras, das imagens e da realidade detalhada, seja de forma descritiva, seja de forma analítica. Para os autores, a

[...] abordagem da investigação qualitativa exige que o mundo seja examinado com a ideia de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir uma pista que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do nosso objecto de estudo. (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 49BOGDAN, Robert C.; BIKLEN, Sari K. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994.).

Ao afirmar que a pesquisa qualitativa implica um partilhar denso com as pessoas e com o contexto, Chizzotti (2003, p. 3)CHIZZOTTI, Antonio. A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais: evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação, Braga, v. 16, n. 2, p. 221–36, 2003. explica que, com este procedimento, é possível captar “[...] os significados visíveis e latentes que são perceptíveis a uma atenção sensível”.

Silveira e Córdova (2009)SANTOS, Boaventura de Souza. Por que é tão difícil construir uma teoria crítica? Revista Crítica de Ciências Sociais, Coimbra, n. 54, jun. 1999. Disponível em: http://www.boaventuradesousasantos. pt/media/pdfs/Porque_e_tao_dificil_construir_teoria_critica_RCCS54.PDF. Acesso em: 20 mar. 2023.
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corroboram este pensamento, pois, para estes autores, a pesquisa qualitativa está voltada ao aprofundamento compreensivo e explicativo das dinâmicas ocorridas nas relações de um grupo social; em nosso caso, de um grupo de professores.

Nossa opção é por uma abordagem qualitativa na perspectiva da pesquisa-ação crítica. Isto significa dizer que “a condição para ser pesquisa-ação crítica é um mergulho na práxis do grupo social em estudo, do qual se extraem as perspectivas latentes, o oculto, o não familiar que sustentam as práticas, sendo as mudanças negociadas e geridas no coletivo” (FRANCO, 2005, p. 486FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, dez. 2005. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022005000300011&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 20 mar. 2023.
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).

O local da pesquisa é uma escola de Educação Infantil localizada em uma capital do Centro-Oeste do país. Os sujeitos da pesquisa são cinco professores da Educação Infantil. Os dados da pesquisa, apresentados neste artigo, foram produzidos durante o ano de 2022.

No próximo item, apresentamos a análise dos dados produzidos no período acima explicitado.

5 OS DADOS PRODUZIDOS: O PROTAGONISMO DAS PROFESSORAS NO PROCESSO FORMATIVO

Argumentamos, com Diniz-Pereira (2014)DINIZ-PEREIRA, Julio Emílio. Da racionalidade técnica à racionalidade crítica: formação docente e transformação social. Perspectivas em Diálogo – Revista de Educação e Sociedade, v. 1, n. 1, p. 34–42, 12 jun. 2014. Disponível em: https://periodicos.ufms.br/index.php/persdia/article/view/15. Acesso em: 20 mar. 2023.
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, que “[...] os professores envolvidos em pesquisas de suas próprias práticas parecem [...] adotar modelos de ensino mais centrados nos alunos e se convencem da importância de ouvir, observar e procurar entender os seus estudantes” (DINIZ-PEREIRA, 2014, p. 51DINIZ-PEREIRA, Julio Emílio. Da racionalidade técnica à racionalidade crítica: formação docente e transformação social. Perspectivas em Diálogo – Revista de Educação e Sociedade, v. 1, n. 1, p. 34–42, 12 jun. 2014. Disponível em: https://periodicos.ufms.br/index.php/persdia/article/view/15. Acesso em: 20 mar. 2023.
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). Com isso, “é possível dizer que a pesquisa-ação está, sem sombra de dúvida, satisfazendo professores e os ajudando a fazer o que desejam fazer de uma maneira melhor” (DINIZ-PEREIRA, 2014, p. 51DINIZ-PEREIRA, Julio Emílio. Da racionalidade técnica à racionalidade crítica: formação docente e transformação social. Perspectivas em Diálogo – Revista de Educação e Sociedade, v. 1, n. 1, p. 34–42, 12 jun. 2014. Disponível em: https://periodicos.ufms.br/index.php/persdia/article/view/15. Acesso em: 20 mar. 2023.
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).

Oportunizar a participação em todas as etapas dos processos formativos de professores é um grande desafio. Segundo Diniz-Pereira (2002)DINIZ-PEREIRA, Julio. A Pesquisa dos educadores como estratégia para construção de modelos críticos de formação docente. In: DINIZ-PEREIRA, Julio Emilio; ZEICHNER, Kenneth. M. (Org.). A Pesquisa na formação e no trabalho docente. Belo Horizonte: Autêntica, 2002., precisamos romper com modelos formativos que vivenciamos historicamente. O autor explica que, no modelo denominado de racionalidade técnica:

[...] o professor é visto como um técnico, um especialista que rigorosamente põe em prática as regras científicas e/ou pedagógicas. Assim, para se preparar o profissional da educação, conteúdo científico e/ou pedagógico é necessário [sic], o qual servirá de apoio para sua prática. Durante a prática, professores devem aplicar tais conhecimentos e habilidades científicos e/ou pedagógicos. (DINIZ-PEREIRA, 2002, p. 8DINIZ-PEREIRA, Julio. A Pesquisa dos educadores como estratégia para construção de modelos críticos de formação docente. In: DINIZ-PEREIRA, Julio Emilio; ZEICHNER, Kenneth. M. (Org.). A Pesquisa na formação e no trabalho docente. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.).

Romper com esse modelo hegemônico, presente historicamente nas instituições, é um dos grandes desafios, sobretudo quando defendemos, juntamente ao autor, processos formativos alicerçados em um contexto de envolvimento e de participação dos sujeitos.

Decidimos com as professoras que, após os momentos formativos, dois momentos de reflexão seriam realizados: o primeiro, de forma individual, e o segundo, por meio de uma avaliação coletiva. No primeiro momento, as participantes apontavam seus registros e suas percepções do encontro, o que ele representou para cada uma, e faziam o levantamento das próximas temáticas a serem discutidas no encontro formativo seguinte. Já no segundo momento, em uma roda de conversa, partilhavam a experiência do processo formativo, trocavam ideias e ampliavam a discussão sobre o processo de formação continuada que haviam vivenciado.

Traremos as falas das professoras sobre suas impressões da participação na pesquisa-ação. Por tratar-se de um artigo, optamos por trazer apenas este recorte. Não apresentaremos resultados das ações e/ou observações.

Participaram da pesquisa cinco professoras, e os nomes utilizados para identificá-las são fictícios, mantendo seu anonimato. A professora Letícia assim se manifesta em relação à participação na pesquisa:

Uma prática colaborativa para refletirmos sobre nossas ações em sala de aula, uma experiência de sermos protagonistas como professoras da Educação Infantil. Sinto-me privilegiada em participar e contribuir para a educação de crianças pequenas na instituição de ensino, [por] refletir, avaliar, trocar experiências com nossas colegas de trabalho em equipe, buscar melhorar nossas práticas por meio dos encontros, informações com os temas escolhidos pelo grupo, de acordo com a realidade de cada turma.

A ideia da professora Letícia de sentir-se uma protagonista de seu processo de formação continuada por meio de uma prática colaborativa vem ao encontro do que afirma Franco (2015)FRANCO, Maria Amélia Santoro. Práticas pedagógicas de ensinar-aprender: por entre resistências e resignações. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 41, n. 3, p. 601–14, jul./set. 2015. Acesso em: 20 mar. 2023., quando fala da importância da participação do professor no seu processo de formação. Para Franco (2015, p. 611)FRANCO, Maria Amélia Santoro. Práticas pedagógicas de ensinar-aprender: por entre resistências e resignações. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 41, n. 3, p. 601–14, jul./set. 2015. Acesso em: 20 mar. 2023., é fundamental que “[...] pesquisadores e sujeitos da prática sejam, ao mesmo tempo, participantes e protagonistas”. Participantes e protagonistas do processo de formação – assim que fomos delineando e reconstruindo, conjuntamente com as professoras, as possibilidades do processo de formação continuada na instituição.

É interessante que a professora Letícia imediatamente remete à possibilidade de “contribuir para a educação das crianças pequenas”. Isto ratifica o que dizem autores como Nóvoa (2012)FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação? 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980., ou seja, que os professores devem ser ouvidos, pois eles refletem cotidianamente sobre a sua ação pedagógica. Portanto, no processo formativo, ouvi-los e caminhar com eles, e não sobre eles, é, como afirma a professora Letícia, “melhorar nossas práticas”.

A professora Letícia, em outro momento, relatou:

[...] eu, por exemplo, tenho alguma dificuldade... Preciso descontruir... Tipo assim, eu não estou dando aula, mas as crianças estão interagindo... Esses dias, mesmo, fiz uma atividade com as crianças, e foi tão fantástico, porque a menina estava colocando o arroz dentro de um escorredor de macarrão e aí, de repente, ela percebeu que o grão do arroz passava por dentro... Gente, olha que momento rico e como na Educação Infantil a gente precisa se descontruir... Porque eu achava que a gente tinha que ficar o tempo todo “dando aula”, “ fazendo atividade”, porque, se eu não fizesse isso, eu não est[aria] dando aula... Aí a gente se depara com esses momentos que a criança vivencia.

A professora Letícia, conforme relata, assumiu a sala na Educação Infantil na instituição e, logo no começo, sentia muita dificuldade em compreender a organização e o mecanismo das propostas na Educação Infantil. Quando aponta a questão de desconstruir aquilo que ela vivenciava, refere-se à forma como organizava o seu trabalho quando atuava na sala de alfabetização, que é muito diferente de uma sala de bebês. O fato de a professora Letícia refletir sobre sua prática, repensar suas atividades com base no diálogo com a professora que ministrou a formação continuada, mostra novamente o protagonismo das professoras no seu processo formativo, reafirmando o que menciona Giroux (1997)FREIRE, Paulo. Educação e mudança. 43. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2021. sobre o professor ser identificado como “intelectual transformador”.

A professora Emília afirma: “desde minha graduação, sei da importância da formação continuada para a prática docente. O estudo e pesquisa não se findam na universidade/ graduação, e ter a possibilidade de fazer parte, dar opiniões para esta formação, me deixa feliz [...]”. A professora Emília, além de reconhecer o papel da formação continuada para sua reflexão e prática docente, também destaca a importância de participar desta formação, por meio da pesquisa-ação. Com apoio nas ideias de Thiollent e Collete (2014)SANTOS, Luciola. Entrevista com o professor Antônio Nóvoa. Educação em Perspectiva, Viçosa, MG, v. 4, n. 1, 2013. Doi: http://dx.doi.org/10.22294/eduper/ppge/ufv.v4i1.436
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, é possível afirmar que este processo oportuniza que os docentes desempenhem “um papel de pesquisador sobre: o conteúdo do ensino; o grupo; a didática; a comunicação; a melhoria da aprendizagem dos estudantes; os valores da educação; e o ambiente em que esta ocorre” (THIOLLENT; COLLETE, 2014, p. 213SANTOS, Luciola. Entrevista com o professor Antônio Nóvoa. Educação em Perspectiva, Viçosa, MG, v. 4, n. 1, 2013. Doi: http://dx.doi.org/10.22294/eduper/ppge/ufv.v4i1.436
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).

Acrescenta, ainda, a professora Emília:

Sinto-me feliz, e é muito bom poder participar das escolhas para as nossas formações continuadas, e não só as escolhas, mas também discutir e, num consenso entre todas as professoras, direção e coordenação da nossa instituição, repensar e opinar em nossas práticas e ações no âmbito escolar.

A fala da professora Emília vem ao encontro do que propõe Nóvoa (2017)GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997., quando sustenta que a formação de professores deve oportunizar condições para a “renovação, recomposição, do trabalho pedagógico, nos planos individual e colectivo” (NÓVOA, 2017, p. 1128GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.). Para que esse processo ocorra e seja realizado nas instituições escolares, “[...] é necessário que os professores realizem estudos de análise das realidades escolares e do trabalho docente” (NÓVOA, 2017, p. 1128GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.). Ainda com base nas ideias do autor, observa-se a relevância de que a formação incorpore a pesquisa e de que esta se dê de forma coletiva: “O que [...] interessa é o sentido de uma reflexão profissional própria, feita da análise sistemática do trabalho, realizada em colaboração com os colegas da escola” (NÓVOA, 2017, p. 1128GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.).

A professora Gisele considera importante o processo formativo por meio da pesquisa-ação, pois esta prioriza

[...] as minhas necessidades e dificuldades para assim eu aperfeiçoar minha prática pedagógica dentro da sala de aula, porque [...] sala de aula exige que nós, professores, sempre busquemos alternativas, tanto em relação aos conteúdos e experiências que serão compartilhados com as crianças, quanto em relação a outras demandas, por exemplo, a indisciplina. A oportunidade de podermos sugerir temas de acordo com as nossas necessidades traz tranquilidade [...].

A professora mencionou as possibilidades da pesquisa-ação, com a expectativa de que esta pudesse interferir em seu processo formativo e, com isso, qualificar sua atuação na escola. Novamente, podemos ressaltar o comprometimento da professora em refletir sobre sua ação pedagógica.

Em outro excerto, a professora Gisele destaca que, por meio dos estudos oportunizados pelo processo formativo desenvolvido na escola,

[...] a gente vai refletindo, [...] a gente sempre vai estar aprendendo o que a gente vai fazer com esse conhecimento... A gente ouviu, agora, a gente vai refletir e tentar mudar algumas coisas, tentar conhecer muitas coisas [...] e quão isso foi importante para eu poder levar para as crianças. Eles têm direitos de aprendizagem [...] eu preciso melhorar o meu repertório, pois a gente sempre aprende.

Nas palavras de Nóvoa (2017, p. 1116)GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997., “é preciso que toda a formação seja influenciada pela dimensão profissional, não num sentido técnico ou aplicado, mas na projecção da docência como profissão baseada no conhecimento”. Como se pode observar, a professora Gisele enfatiza o movimento de reflexão e os aprendizados como elementos necessários para o trabalho com as crianças.

Em direção semelhante à da professora Gisele, também a professora Lizandra afirma que a pesquisa-ação possibilita

[...] uma reflexão, ação, reflexão, ouvindo e dando voz aos professores às suas necessidades enquanto educadores. Nós, como professores, sempre estamos e precisamos estar buscando conhecimentos, pesquisar, estudar, refletir, para poder desenvolver a nossa prática [...].

A professora sublinha que a pesquisa-ação se constitui em uma reflexão ação que dá voz aos professores, oportunizando a pesquisa e o estudo, de forma a desenvolver sua prática. A professora Lizandra, assim como as outras professoras, vai ao encontro do que afirmam Thiollent e Collete (2014)SANTOS, Luciola. Entrevista com o professor Antônio Nóvoa. Educação em Perspectiva, Viçosa, MG, v. 4, n. 1, 2013. Doi: http://dx.doi.org/10.22294/eduper/ppge/ufv.v4i1.436
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, quando destacam a importância da participação, da reflexão e da escuta: “[...] a participação em uma pesquisa-ação, além de ganhos simbólicos, possibilita aos atores desenvolver e promover hábitos críticos construtivos, tão necessários na gestão e na produção de conhecimentos adequados” (THIOLLENT; COLLETE, 2014, p. 215SANTOS, Luciola. Entrevista com o professor Antônio Nóvoa. Educação em Perspectiva, Viçosa, MG, v. 4, n. 1, 2013. Doi: http://dx.doi.org/10.22294/eduper/ppge/ufv.v4i1.436
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).

A professora Lara também enfatiza a importância da pesquisa-ação para o processo de formação continuada. O relato da professora, bem como das demais professoras da instituição, trouxe-nos a compreensão de que, por meio da pesquisa-ação, as suas necessidades formativas são atendidas. Essa compreensão relaciona-se ao fato de que, desde o início da pesquisa, ficou claro que a participação, o envolvimento e as escutas do grupo continuamente fariam parte da pesquisa-ação, pois são requisitos essenciais para sua efetivação.

As falas das professoras lembram-nos do que afirmam Diniz-Pereira e Lacerda (2009)DINIZ-PEREIRA, Julio Emílio; LACERDA, Mitsi Pinheiro. Possíveis significados da pesquisa na prática docente: ideias para fomentar o debate. Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 30, n. 109, p. 1229–42, set./dez. 2009., de que precisamos e é possível (re)pensar “as diferentes concepções de pesquisa, repensar o que compreendemos como prática [...] precisamos tomar como princípio que a prática é locus de produção de conhecimentos [...]” (DINIZ-PEREIRA; LACERDA, 2009, p. 1239DINIZ-PEREIRA, Julio Emílio; LACERDA, Mitsi Pinheiro. Possíveis significados da pesquisa na prática docente: ideias para fomentar o debate. Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 30, n. 109, p. 1229–42, set./dez. 2009.). Isto certamente terá implicações na melhoria da qualidade da educação, pois os professores fortalecem o seu protagonismo na formação docente, o que reverbera em sua atuação docente.

6 ALGUMAS CONCLUSÕES

Como conclusão do fragmento de pesquisa que apresentamos neste artigo, pensamos que levar em conta o fazer diário desenvolvido em nossas instituições é um aspecto imprescindível para a elaboração da formação continuada dos professores. Neste fazer diário, é de suma importância a produtividade do diálogo entre as diferentes instâncias formativas, a acadêmica e a escolar, bem como a centralidade do protagonismo dos professores em seu processo formativo.

Com base na produção dos dados, destacamos que a formação continuada desenvolvida por meio da pesquisa-ação explicita que a possibilidade de participação e o poder de decisão dos professores fazem com que eles se sintam mais comprometidos e respeitados em seu ambiente formativo. Dessa forma, os professores vão qualificando cotidianamente sua prática docente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2023

Histórico

  • Recebido
    02 Abr 2023
  • Aceito
    31 Maio 2023
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