Acessibilidade / Reportar erro

A MATERNIDADE E SUA REPRESENTAÇÃO ONÍRICA NA POESIA DE ADRIENNE RICH

The Motherhood and its Oneiric Representation in the Poetry by Adrienne Rich

La maternidad y su representación onírica en la poesía de Adrienne Rich

Resumo

Esse artigo busca compreender a especificidade do discurso acerca da maternidade elaborado nos ensaios e na poesia de Adrienne Rich no momento de sua afirmação feminista. De fato, estabelecendo uma continuidade com a tradição da dicção revoltada e democrática de Walt Whitman, Rich, que até hoje é pouco lida no Brasil, utiliza em seu discurso a enumeração e a narratividade buscando encenar com coragem a dor e a ambivalência relacionadas à experiência da maternidade. A violência da escrita e o uso da linguagem onírica, que enfrentam a tradição órfica patriarcal associada ao fonocentrismo tornam a poesia de Rich condizente com as propostas da desconstrução em seus aspectos subversivos.

Palavras-chave:
Maternidade; Discurso; Desconstrução; Adrienne Rich; Walt Whitman

Abstract

This paper seeks to understand the specificity of the discourse about the motherhood elaborated in the essays and the poetry by Adrienne Rich at the time of her feminist affirmation. Effectively, in establishing a continuity with Walt Whitman's tradition of rebel and democratic diction, Rich, to this day rarely read in Brazil, uses in her discourse the enumeration and the narrative mode to represent courageously the pain and the ambivalence related to the experience of motherhood. The violence of writing as well as the use of oneiric language that face the orphic patriarchal tradition linked to phonocentrism make the poetry by Rich conform to the theory of deconstruction in its subversive aspects.

Keywords:
Motherhood; Discourse; Deconstruction; Adrienne Rich; Walt Whitman

Resumen

Este artículo busca comprender la especificidad del discurso sobre la maternidad desarrollado en los ensayos y la poesía de Adrienne Rich en el momento de su afirmación feminista. De hecho, estableciendo una continuidad con la tradición de la expresión rebelde y democrática de Walt Whitman, Rich, quien aún es poco leída en Brasil, utiliza en su discurso la enumeración y la narración en un intento de escenificar con valentía el dolor y la ambivalencia relacionados con la experiencia de la maternidad. La violencia de la escritura y el uso del lenguaje onírico, que desafían la tradición órfica patriarcal asociada al fonocentrismo, hacen que la poesía de Rich sea congruente con las propuestas de la deconstrucción en sus aspectos subversivos.

Palabras clave:
Maternidad; Discurso; Deconstrucción; Adrienne Rich; Walt Whitman

O momento crucial da consciência humana chega, então, quando o homem descobre que é ele mesmo, e não a lua ou a chuva primaveral, ou o espírito do morto que engravida a mulher.

Adrienne Rich

Da Mulher em igualdade com o Homem eu canto.

Walt Whitman

1 INTRODUÇÃO

Uma das mais eficientes e recorrentes críticas metafísicas da escrita rejeita-a como uma “efratura de uma espécie totalmente original, violência arquetípica” (Derrida, 1973DERRIDA, J. Gramatologia. Trad. M. Schnaiderman e R. Janini Ribeiro. São Paulo: Perspectiva, 1973., p. 42). Considerada como o fora ameaçador da fala plena no âmbito fonocêntrico, que não apenas privilegia a poética da presença evitando a poética negativa, e a escrita fonética em detrimento da sintética e da analógica, como também enfatiza a proximidade entre o ser e a voz, tornando, destarte, muito fácil a exclusão da grafia, a escritura vê-se relegada ao papel de uma técnica suspeita. Sombra, fantasma, a escrita é uma emanação subterrânea condenada a uma existência esquiva.

Além de desvalorizar as escritas não fonéticas, reservando-lhes um lugar subalterno, a longa tradição fonocêntrica exclui também o projeto de uma semiologia geral, complexa e abrangente, relativa aos diversos sistemas de signos. De fato, o fonocentrismo substitui uma tal disciplina versátil “por aquela que deveria ser apenas uma de suas disciplinas” (Nascimento, 2001NASCIMENTO, E. Derrida e a Literatura. “Notas” de literatura e filosofia nos textos da desconstrução. Niterói: EDUFF, 2001., p. 133). No contexto da reflexão acerca da diferença de gênero importante para esse estudo, que versa sobre a representação da ambivalência da experiência da maternidade, a afirmação da proximidade entre o ser e a voz acaba por trazer os ecos longínquos dos mitos da origem, a saber, “da fertilização pelo som da voz”, dentre os quais “uma explicação singular da concepção imaculada da Virgem: ela teria sido concebida pela orelha” (Devereux, 1990DEVEREUX, G. Mulher e mito. Trad. B. Sidou. Campinas: Papirus, 1990., p. 172).

A imagem maternal corresponde, com efeito, à experiência da língua materna, que na visão desconstrucionista se revela antes de mais nada em seus aspectos da escrita. Sendo uma formação da forma, o delicado tecido do irredutível rastro pertencente ao movimento da significação não depende de plenitudes sensoriais, adquirindo destarte o caráter não-linear e descontínuo. Dificilmente captável, pois o movimento fugidio é sua característica por excelência, o rastro “afasta-se de qualquer presença e se atenta aos efeitos (que não chegam a ser uma ausência)” (Haddock-Lobo, 2008, p. 65).

2 ADRIENNE RICH: A PAIXÃO FEMININA E AS AMBIVALÊNCIAS DA MATERNIDADE

Assim, ao analisar a estrutura da paixão feminina representada nos textos de diferentes épocas da história da literatura ocidental a partir do âmbito do discurso feminista, Peggy Kamuf insiste na transgressão como o âmbito predileto de seu desvelamento. De fato, a paixão que determina a articulação da representação do desejo feminino manifesta-se sobretudo na transgressão da lei que a encerra, mantendo-a sob controle: “a paixão que dá a forma a essas ficções pode se descobrir por meio da transgressão da lei que a encerra” (Kamuf, 1982, p. XVII). Destarte, longe de estar simplesmente ausente da estrutura patriarcal do poder, o desejo feminino ocupa dentro dela um lugar escondido e, com isso, extremamente ameaçador. Nesse sentido, a representação literária, que também desempenha um papel potencialmente subversivo em relação aos limites estabelecidos pelo discurso da ordem dominante, torna-se o âmbito privilegiado de sua tematização:

Subsequentemente, a formação filosófica, a profissão, a posição de professor foram também um desvio para voltar a essa pergunta: “O que é a escritura em geral?” e, no espaço da escritura em geral, a esta pergunta, que é mais e outra coisa além de um simples caso particular: “o que é a literatura?”; a literatura como instituição histórica, com suas convenções, suas regras etc., mas também essa instituição da ficção que dá, em princípio, o poder de dizer tudo, de se liberar das regras, deslocando-as, e, desse modo, instituindo, inventando e também suspeitando da diferença tradicional entre natureza e instituição, natureza e lei convencional, natureza e história (Derrida, 2018DERRIDA, J. Essa estranha instituição chamada literatura. Uma entrevista com Jacques Derrida. Trad. M. Dias Esqueda. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2018., p. 51)

O poder específico da ficção literária enfatizado por Derrida, que chega à possibilidade de deslocar os limites estabelecidos pelo discurso dominante, faz dela o espaço único da construção da estrutura do esconderijo do desejo feminino perseguido pelo patriarcado. Pois a linguagem literária é também inevitavelmente política, e é justamente este aspecto seu que se vê frisado pela poeta americana Adrienne Rich: “Esse impulso de se adentrar, junto com os outros, por meio da linguagem, a ordem e a desordem do mundo é poético em sua raiz tão certamente quanto é em sua raiz político”, observa a autora, acrescentando que “a poesia e a política ambas têm a ver com a descrição e com o poder. Isso é também o caso da ciência” 1 1 “This impulse to enter, with other humans, trough language, into the order and disorder of the world, is poetic at its root as surely as it is political at its root. Poetry and politics both have to do with the description and with power. And so, of course, does science”. (Rich, 1993, p. 6).

Aos olhos de Rich (2018RICH, A. Que tempos são estes. Trad. M. Lotufo. São Paulo: Jabuticaba, 2018.), que recusou um importante prêmio, continuando a tradição whitmaniana do engajamento político da forma da poesia, que envolve também a subversão da articulação subjetiva do gênero no discurso, e que considera o poder enquanto tal como o valor o mais importante no patriarcado, assinalando que esse poder inclui também uma ignorância voluntária e uma estupidez moral em relação aos outros, a compreensão da maternidade enquanto experiência se torna o problema mais urgente. De fato, a ideologia patriarcal elaborou um discurso opressivo, no qual rejeitou o corpo feminino como corrupto e contaminado física e moralmente, reservando, ao mesmo tempo, um imaginário positivo à mulher em seu papel de mãe:

O patriarcado é o poder dos pais: um sistema sócio-familial, ideológico e político no qual os homens, por meio da força, da pressão direta ou através do ritual, da tradição, da lei e da linguagem, dos costumes, da etiqueta, da educação e da divisão do trabalho determinam qual é o papel desempenhado ou não pelas mulheres e no qual, em todos os lugares, o feminino está subsumido ao masculino (Rich, 1986RICH, A. Of Woman Born. Motherhood as Experience and Institution. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 1986., p. 57).2 2 “Patriarchy is the power of the fathers, a familial-social, ideological, political system in which men - by force, direct pressure, or through ritual, tradition, law, and language, customs, etiquette, education and the division of labor, determinate what part women shall or shall not play, and in which the female is everywhere subsumed under the male”.

É importante ressaltar que nesse contexto, no qual o trabalho de parto desempenha um papel muito importante, a imagem da feminilidade torna-se inseparável da experiência da dor. Dificilmente descritível e definível, pois a dor e o amor “estão carregados de associações que remontam aos inícios da vida e de atitudes culturais moldadas pela própria linguagem” (Rich, 1986RICH, A. Of Woman Born. Motherhood as Experience and Institution. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 1986., p. 157)3 3 “[…] are charged with associations going back to early life, and with cultural attitudes wrought into language itself”. , a dor é por vezes inscrita no discurso enquanto dividida em uma experiência sensorial e psicológica, ou então, considerada como um sofrimento iluminador oposto à aflição da dor impotente do escravizado. Dessa maneira, a dor do parto, mas também o medo - que ambos trazem consigo as reminiscências discursivas da dilacerante história da alta mortalidade das mulheres durante a gravidez e sobretudo no trabalho de parto -, passam a constituir um elemento muito importante do imaginário e, com isso, do discurso especificamente feminino.

Assim, torna-se urgente negociar a possibilidade da representação discursiva da experiência da maternidade sobretudo em sua complexidade e sua relação com o corpo feminino. “A arte da narrativa reside na habilidade de se condensar a ação em um momento exemplar, extraí-lo do fluxo contínuo do tempo, revelar o quem [...]”4 4 “The art of narrative resides in the ability to condense the action into an exemplary moment, to extract it from the continuous flow of time, and reveal the who [...]”. (Kristeva, 2001KRISTEVA, J. Hannah Arendt. Life is a Narrative. Trad. F. Collins. Toronto: Toronto University Press, 2001., p. 17). Em sua visão da vida humana como sendo passível de ser transformada em uma narrativa, Hannah Arendt insistiu na importância da representação discursiva da vida e da morte humanas. Rich é frequentemente evocada como a autora do denso ensaio sociológico Of Woman Born. Motherhood as Experience and Institution, de 1976, no qual constam também várias citações do diário íntimo do tempo de sua própria maternidade. No poema de Rich “Sonho que sou a morte de Orfeu” (“I Dream I’m the Death of Orpheus”), de 1968, que é o principal objeto de nossa análise neste artigo, surpreendem, de fato, o tom narrativo do poema e o recurso à poética da evocação das reminiscências de um sonho:

I am walking rapidly through striations of light and dark thrown under an arcade. I am a woman in the prime of life, with certain powers and those powers severely limited by authorities whose faces I rarely see. I am a woman in the prime of life driving her dead poet in a black Rolls-Royce through a landscape of twilight and thorns. A woman with a certain mission which if obeyed to the letter will leave her intact. A woman with the nerves of a panther a woman with contacts among Hell’s Angels a woman feeling the fullness of her powers at the precise moment when she must not use them a woman sworn to lucidity who sees through the mayhem, the smoky fires of these underground streets her dead poet learning to walk backwards against the wind on the wrong side of the mirror. Estou andando com pressa através das listras de luz e de treva lançadas sob uma arcada. Sou uma mulher no ápice da vida, com algum poder mas esse poder tem rigorosos limites colocados pelas autoridades cujos rostos raramente vejo. Sou uma mulher no ápice da vida levando seu poeta morto em uma Rolls-Royce preta através de uma paisagem de crepúsculo e de espinhos. Uma mulher com uma certa missão que, se for seguida até a letra, a deixará intacta uma mulher com os nervos de uma pantera uma mulher com os contatos no Inferno dos Anjos uma mulher sentindo a plenitude de seus poderes no exato momento no qual não pode usá-los uma mulher prometida à lucidez que vê através do caos, dos fogos fumacentos dessas ruas subterrâneas como seu poeta morto aprende a andar para trás contra o vento do lado errado do espelho (Rich, 2002RICH, A. The Fact of a Doorframe, P. Poems 1950-2001. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 2002., p.78-79, tradução minha).

À violência da escritura que se substitui a sua própria origem corresponde, no poema de Rich, a violência do “eu” lírico feminino que se desdobra por meio da repetição, substituindo a figura central do poeta mítico Orfeu, conhecido da tradição antes de mais nada por sua relação íntima com a sonoridade da linguagem. Pelo poder que possuía sobre a natureza Orfeu corresponde, com efeito, também à metáfora da encantação, da escritura natural intimamente unida ao sopro, unida ao livro do mundo. De acordo com Derrida, que critica o apego à imagem do “livro do mundo”, é o trabalho do sonho, e não a linguagem, que constitui uma melhor comparação com a escritura:

O representante de pulsão está assim no centro do problema: ele não é nem biológico nem semiótico; delegado pela pulsão e destinado à linguagem, ele apenas revela a pulsão nos seus produtos a apenas acede à linguagem através das combinações retorcidas dos “investimentos de coisas”, mesmo para aquém das representações verbais. É, pois, preciso invocar um tipo irredutível de relações entre significantes e significados. Estes signos, estes efeitos de sentido, têm vocação de linguagem, mas não são, na sua textura específica, da ordem da linguagem. É o que Freud salienta pela palavra Vorstellung, representação; e é isto que mantém a ordem do fantasma distinta da fala (Ricoeur, 1989RICOEUR, P. O conflito das interpretações. Ensaios de hermenêutica. Trad. M. F. Sá Correia. Porto: Rés, 1989., p. 167-168).

Assim, no poema “Sonho que sou a morte de Orfeu”, as repetições “uma mulher” e “através” desafiam a forma linear da linguagem, insistindo em sua disposição no espaço, encenando a diferença, o espaçamento da não-presença e do não-consciente. Pois o inconsciente escapa ao discurso, não tem uma linguagem e a negação não existe no universo onírico, a única evocada no poema dizendo respeito ao uso do poder pela mulher: “Não parece não existir no sonho; a antítese costuma ser reduzida à unidade” 5 5 “no does not appear to exist in the dream; antithesis is usually reduced to unity”. (Hoffman, 1967HOFFMAN, F. J. Freudianism and the literary mind. Baton Rouge: Louisiana State University Press, 1967., p. 40).

A hesitação entre a palavra falada e a escrita pode ser, aliás, observada no passado da representação do mito de Orfeu, encontrando no soneto “El Desdichado” (1854) de Gérard de Nerval, o poeta do sonho traído e da travessia das fronteiras entre mundos, seu exemplo mais evocativo. No último verso do soneto, que escapa à traduzibilidade, a representação da experiência lutuosa da perda desenvolvida ao longo das estrofes como uma busca pelo papel do “eu”, associada ao canto órfico, que é também o de um poder inútil, transforma-se na encenação de uma presença quimérica do objeto que aparece e desaparece, tal a sombra da escrita (l’écrit) entrevista na palavra “les cris” (os gritos):

Je suis le ténébreux, - le veuf, - l’inconsolé, Le prince d’Aquitaine à la tour abolie: Ma seule étoile est morte, - et mon luth constellé Porte le soleil noir de la Mélancolie. Dans la nuit du tombeau, toi qui m’as consolé, Rends-moi le Pausilippe et la mer d’Italie, La fleur qui plaisait tant à mon cœur désolé, Et la treille où le pampre à la rose s’allie. Suis-je Amour ou Phébus, Lusignan ou Biron? Mon front est rouge encor du baiser de la reine; J’ai rêvé dans la grotte où nage la sirène… Et j’ai deux fois vainqueur traversé l’Achéron: Modulant tour à tour sur la lyre d’Orphée Les soupirs de la sainte et les cris de la fée Sou o sombrio, - o viúvo, - o desolado, Príncipe d’Aquitânia à torre ruída: Meu astro morreu, meu alaúde estrelado Traz da Melancolia o sol negro sem vida. Na tumba negra, você que me consolou, Traga o Posillipo e o mar d’Itália, A flor que tanto meu coração alegrou E o ramo que vinha e rosa embaralha. Sou Amor ou Febos, Lusignan ou Biron? Do beijo da rainha rubra minha fronte Sonhei na gruta onde a sereia nada... Duas vezes venci as águas d’Aqueronte: Na lira de Orfeu modulando o tom Dos suspiros da santa e dos gritos da fada. (Nerval, 1949NERVAL, G. de. El Desdichado. In. GIDE, André (org.). Anthologie de la poésie française. Pléiade. Paris: Gallimard, 1949, p. 508., p. 508, tradução minha).

Associado ao tema de uma “culpabilidade obscura” (Fairlie, 1970FAIRLIE, A. B. Le mythe d’Orphée dans l’œuvre de Gérard de Nerval. Cahiers de l’Association Internationale des Etudes Françaises 22, 1970, p. 153-168., p. 158), ao enigma da perda, assim como à falha do poder, o mito de Orfeu havia, de fato, passado a constituir o núcleo da tradição do imaginário patriarcal e do discurso acerca da criatividade masculina inspirada, cujo fruto é o canto que ressoa, e não a escrita. No poema de Rich, a alusão ao filme de Jean Cocteau e à violência da memória cinematográfica revela-se solidária da ironia manifesta na construção do “eu”. Pois o poeta Orfeu é também a figura da violência do olhar (cf. Brunel, 2003BRUNEL, P. As vocações de Orfeu. In: BRICOUT, B. (org.). O olhar de Orfeu. Os mitos literários do Ocidente. Trad. L. O. Benoit. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 39-62.) em sua relação com a morte, que Cocteau metamorfoseou no reflexo no espelho e no olho da câmera.

De fato, “a clivagem entre poeta e persona” (Díaz-Diocaretz, 1985, p. 95), necessária para a criação do sujeito lírico, é uma das questões mais instigantes na discussão acerca da poesia feminista, sobretudo em sua relação com o discurso autobiográfico. No poema de Rich, que convida o leitor a uma leitura intertextual e intersemiótica, muito evocativa a esse respeito revela-se a repetição da auto-apresentação “Sou uma mulher”, enquanto uma pessoa dotada de diversos atributos do poder patriarcal com seus respectivos comprometimentos e, quem sabe, como uma espectadora do filme de Cocteau.

Como notou Hannah Arendt em sua descrição do surgimento dos totalitarismos que tornaram o ser humano supérfluo, nivelando com isso a diferença entre nascimento e morte, e impossibilitando a transformação da vida em narrativa, “a verdade é que as massas surgiram dos fragmentos de uma sociedade altamente atomizada cuja estrutura competitiva e a concomitante solidão do indivíduo têm sido colocadas em xeque apenas por meio da participação em uma classe”6 6 “The truth is that the masses grew out of the fragments of a highly atomized society whose competitive structure and concomitant loneliness of the individual had been held in check only trough membership in a class”. (Arendt, 1976, p. 317). Escrito segundo as convenções patriarcais da lírica individualista, cujas estruturas se veem expostas, o poema busca por uma articulação irônica, encenando a intensidade do desejo feminino, a extrema solidão do sujeito feminino, e evocando uma imagem escandalosa da morte como uma experiência da maternidade às avessas.

3 WALT WHITMAN: O ELÉTRICO CORPO, A FEMINILIDADE E A MORTE

No poema Eu canto o elétrico corpo que compõe as Folhas de relva, Walt Whitman havia prefigurado muitas das preocupações feministas do século seguinte, dentre as quais a experiência do corpo feminino, a experiência do desejo e a experiência genérica ancorada ao corpo:

Este é o núcleo - depois a criança nasce da mulher, o homem nasce da mulher, Este é o banho do nascimento, a imersão do pequeno e amplo, e outra vez o fim. Não fiquem envergonhadas, mulheres, seu privilégio carrega os demais e dá à luz os demais, Em vocês estão os portões do corpo, em vocês estão os portões da alma. (Whitman, 2011WHITMAN, W. Folhas de relva. Trad. B. Gambarotto. São Paulo: Hedra, 2011., p. 95).

Evocado por Rich, assim como por seus leitores críticos, Whitman fez da enumeração um dos procedimentos mais relevantes de sua dicção poética e transformou a poética da visão, por vezes abertamente onírica, em uma rigorosa pesquisa da sensibilidade humana. Assim, a incorporação pode ser considerada como a articulação da subjetividade democrática whitmaniana: “E deles e de todos teço a canção de mim mesmo” (Whitman, 2011, p. 56).

Compaixão, as válvulas do coração, as válvulas do palato, a sexualidade, a maternidade, A feminilidade é tudo o que é da mulher, e o homem que vem da mulher, O útero, as tetas, os mamilos, o leite do peito, as lágrimas, o riso, o lamento, os olhares amorosos, a perturbação amorosa e seu despertar, A voz, articulação, linguagem, sussurros, gritos, Comida, bebida, pulso, digestão, suor, sono, passos, nado, [...] (Whitman, 2011WHITMAN, W. Folhas de relva. Trad. B. Gambarotto. São Paulo: Hedra, 2011., p. 99).

Tendo tido muito contato direto com o sofrimento, a agonia e a morte humanas durante a Guerra Civil, “uma guerra de amputação” (Ceniza, 1998CENIZA, S. Walt Whitman and the 19-th Century Women Reformers. Tuscaloosa: The University of Alabama Press, 1998., p. 37), Whitman fez da morte uma parte indissociável da existência, que a acompanha como seu enigma e sua sombra inseparável.

Sua recepção relutante e superficial na França simbolista parece ter tido como um de seus motivos a incompatibilidade do discurso decadentista com a alegria e a energia das Folhas. Ao mesmo tempo, o poeta evitou a ênfase na costumeira visão da feminilidade sedutora, corrupta e nefasta, da virgem ou da prostituta, típica da misoginia da segunda metade do século XIX, que encontrou seu discurso evocativo nas numerosas representações de Herodíade, comparada, por exemplo, a um réptil, na forma ornamentada enfatizada pelas rimas ricas emparelhadas:

[...] Je meurs! J’aime l’horreur d’être vierge et je veux Vivre parmi l’effroi que me font mes cheveux Pour, le soir, retirée en ma couche, réptile Inviolée sentir sur ma chair inutile Le froid scintillement de ta pâle clarté Toi qui te meurs, toi qui brûles de châsteté, Nuit blanche de glaçons et de neige cruelle! Et ta sœur solitaire, ô ma sœur éternelle Mon rêve montera vers toi: telle déjà, Rare limpidité d’un cœur qui le songea, Je me crois seule en ma monotone patrie Et tout, autour de moi, vit dans l’idolâtrie D’un miroir qui reflète en son calme dormant Hérodiade au clair regard de diamant... O charme dernier, oui! je le sens, je suis seule. (Mallarmé, 1913MALLARMÉ, S. Poésies. Paris: Nouvelle Révue Française, 1913., p. 64-65)7 7 “Morro! / Amo o horror de ser virgem e anelo / Viver entre o pavor de meu cabelo / Para, à noite, de volta a meu leito, reptante / Inviolado sentir sob meu corpo vacante / O brilho frio de sua pálida claridade / Você que agoniza, que queima de castidade, / Noite branca de gelo e de neve terrível! / E sua irmã solitária, sua irmã imperecível / Meu sonho subirá até você: tal se mostrou / a rara limpidez de um coração que o sonhou, / Penso-me só em minha pátria de monotonia / E tudo, em minha volta, vive na idolatria / De um espelho que reflete em sua calma dormente / Herodíade de olhar puro de diamante... / Ó último encanto, sim! Sinto que estou só.” (Trad. minha) .

Existe, de fato, nas Folhas de relva uma teoria “daquilo a que nós nos referimos agora como gênero, mas que Whitman chama em sua poesia ‘identidade’”8 8 “what we now refer to as gender but what Whitman calls in his poetry ‘identity’”. (Ceniza, 2006CENIZA, S. Gender. In. KUMMINGS, Donald (org.). A Companion to Walt Whitman. Malden: Blackwell Publishing, 2006. p. 180-196., p. 180). Além da conhecida afirmação das relações homoeróticas no “Cálamo”, tendo prestado muita atenção ao movimento das mulheres e à morfologia da expressão linguística em sua relação com as implicações genéricas, o poeta elaborou as formas femininas das diversas palavras: “quakeress, translatress, oratresses, originatress, dispensatress, all-acceptress, protectress” (Ceniza, 2006, p. 182)9 9 “quakera, tradutora, oradora, originadora, dispensadora, tudo-aceitadora, protetora” . O próprio início da publicação do livro nos anos 50 coincide com a intensidade do movimento pelos direitos das mulheres e pela qualidade da inscrição discursiva do feminino, afirmando a vocação igualitária da obra, expressa na tradução brasileira por meio do verbo “grassar”, que corresponde aos mais diversos verbos em inglês (cf. Whitman, 2014). A mãe do poeta Louisa Van Velsor Whitman teve uma grande importância para a composição das Folhas de relva, que o próprio poeta descrevia imaginativa e discursivamente como sua “filha” (Ceniza, 1998, p. 8). A personalidade da mãe, leitora do livro das Folhas, e seu gosto pela escrita das cartas teriam sido também a fonte da “voz emotivamente presente” (Ceniza, 1998, p. 15) da poesia de Whitman. A maternidade adquire destarte na poesia de Whitman o sentido político, de certa forma impessoal, não sendo reservada ao domínio do feminino.

De fato, Whitman fez da representação do corpo humano um dos principais desafios das Folhas de relva e “retratou o corpo humano como um campo belo, porém um campo de batalha”10 10 “portraits the human body as a beautiful but embattled terrain”. (Killingsworth, 2007KILLINGSWORTH, J. M. The Cambridge Introduction to Walt Whitman. Cambridge: Cambridge University Press, 2007., p. 16). Enraizado em alguns preconceitos, dentre os quais a visão da atração sexual na forma da energia elétrica, o elétrico corpo tornou-se uma das imagens mais conhecidas, ainda que raramente explicadas, do poema whitmaniano: “Dos escritores ecléticos medievais tais como Edward H. Dixon, ele pegou emprestada a estranha noção da energia sexual, a ideia de que uma verdadeira corrente de energia elétrica passa entre o homem e a mulher durante a corte e a relação”11 11 “From eclectic medical writers like Edward H. Dixon, he took the strange notion of sexual electricity, the idea that an actual electric charge passes between men and women during courtship and intercourse […]”. (Killingsworth, 2007, p. 17).

Excluído quase por completo do discurso culto e literário, o corpo via-se, de fato, afastado para o domínio do indizível, sendo destarte entregue aos discursos opressivos da política e da justiça. Voltado para os desejos e os prazeres, migrante, trabalhador, adormecido ou ferido, o corpo era, de fato, disputado pelo poder. Quanto à maternidade, trata-se de um “assunto com o qual Whitman se identificou fortemente, pelos motivos complexos”12 12 “a topic with which Whitman was strongly identified, for complex reasons”. (Pollack, 1998POLLACK, V. R. Motherhood. In: LeMASTER, J. R.; KUMMINGS, Donald D. (org.). The Routledge Encyclopedia of Walt Whitman. Nova Iorque: Routledge, 1998, p. 435-437., p. 435), tanto pessoais quanto políticos. De fato, a educação cristã no meio Quaker, discutida por ele depois ao longo das décadas e das sete edições da obra poética, levou-o à formação de uma complexa e dinâmica visão cósmica do corpo genérico no qual convergem as forças materiais e espirituais.

Pois a busca pela linguagem do gênero corresponde nas Folhas de relva também à tentativa da transmissão do saber subjetivo e complexo acerca da morte:

Aquilo que o poeta sabe sobre o sentido da morte - aquilo que sente ter-lhe sido revelado - corre o risco de ser intangível ou até mesmo intraduzível; e sua tarefa é então descobrir ou inventar um ‘idioma’ que tornará essa revelação traduzível e compreensível até mesmo para aqueles cuja fluência linguística é mais fraca de que a sua13 13 “What the poet knows about the meaning of death - what he feels has been revealed to him - is likely to be something intangible or even untranslatable; and his task, therefore, is to discover or invent an ‘idiom’ that will make this revelation translatable and comprehensible even to those whose language skills are far weaker than his own”. (Aspiz, 2004ASPIZ, H. So Long! Walt Whitman’s Poetry of Death. Tuscaloosa: The University of Alamaba Press, 2004., p. 6).

Uma das formas sob as quais o sujeito lírico whitmaniano tem a experiência da morte corresponde, de fato, à ternura maternal: “E em todo lugar ao longo de seu interminável caminho surge a fantasmática imagem da morte, ora como um espectro nebuloso, um consolador maternal, ora como o guardião de um deus com o qual a persona gostaria de travar uma relação camarada, ou eventualmente se unir”14 14 “And everywhere along this endless road looms the ghostly image of death, whether as a nebulous specter, a motherly comforter, or as the gatekeeper of the god with whom the persona aspires to form a comradely relationship, to identify, or eventually to merge”. (Aspiz, 2004ASPIZ, H. So Long! Walt Whitman’s Poetry of Death. Tuscaloosa: The University of Alamaba Press, 2004., p. 23). Em várias passagens surge, de fato, a possibilidade de uma existência do outro lado do mundo, ainda que sua manifestação permaneça obscura, que frequentemente remete a algum outro território:

Cheio de vida agora, compacto, visível, Eu, quarenta anos de idade no octogésimo terceiro ano dos Estados, Para alguém um século à frente ou um sem-número de séculos à frente, Para você ainda não nascido, estas canções à sua procura.15 15 “Full of life, sweet-blooded, compact, visible, I, forty years old, the Eighty-third Year of the States, To one the century hence, or any number of centuries hence, To you, yet unborn, these seeking you”. (Whitman, 2011WHITMAN, W. Folhas de relva. Trad. B. Gambarotto. São Paulo: Hedra, 2011., p. 123)

4 CONCLUSÃO

O mais onírico e difícil de todos os poemas que compõem o vasto texto das Folhas de relva, “Os adormecidos”, termina com o enigmático verso que afirma ao mesmo tempo o renascimento e o retorno à mãe: “É certo que atravessarei o dia Ó minha mãe, e é certo que retornarei a você”16 16 “I will duly pass the day, O my mother, and duly return to you”. (Whitman, 2011WHITMAN, W. Folhas de relva. Trad. B. Gambarotto. São Paulo: Hedra, 2011., p. 343). É surpreendente como esse poema parece dialogar do confuso passado do século XIX com a imagem do fim do poema feminista de Rich - que recentemente encontrou sua primeira tradução brasileira em uma edição bilíngue -, que transforma o poeta em filho, o saber em dúvida e a morte em vida.

Notemos ainda “o uso do imaginário do nascimento para descrever as transições da vida para a morte e da morte para a vida” (Aspiz, 2004ASPIZ, H. So Long! Walt Whitman’s Poetry of Death. Tuscaloosa: The University of Alamaba Press, 2004., p. 96), que assinala a violência do discurso poético whitmaniano. Ao misturar seu sonho com o sonho dos outros, ao descrever os seres fantasmáticos emergindo da escuridão, ao sonhar o sonho dos outros em seu sonho, Whitman anuncia, de fato, também a densidade teórica do trabalho do sonho freudiano: “Faço incisões na escuridão, novos seres aparecem, / A terra recua para longe de mim noite adentro, / Via o que era belo, e vejo que o que não é a terra é belo”17 17 “Now I pierce the darkness - new beings appear, / The earth recedes from me into the night, / I saw that it was beautiful, and I see that what is not the earth is beautiful”. . (Whitman, 2011, p. 338)

Marcado pelos abusos do poder patriarcal, o discurso acerca da relação entre o feminino e a maternidade encontrou na poesia uma de suas articulações mais importantes e libertadoras. Desvinculando-se da representação misógina decadentista, carregado das reminiscências da dor e da paixão, inscrito na hierarquia patriarcal que sempre busca subverter, o discurso sobre a maternidade afirma-se como violento e, com isso, comparável à escritura.

REFERÊNCIAS

  • ARENDT, H. The Origins of Totalitarianism. San Diego: Harcourt Brace & Company, 1976.
  • ASPIZ, H. So Long! Walt Whitman’s Poetry of Death. Tuscaloosa: The University of Alamaba Press, 2004.
  • BRUNEL, P. As vocações de Orfeu. In: BRICOUT, B. (org.). O olhar de Orfeu. Os mitos literários do Ocidente. Trad. L. O. Benoit. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 39-62.
  • CENIZA, S. Walt Whitman and the 19-th Century Women Reformers. Tuscaloosa: The University of Alabama Press, 1998.
  • CENIZA, S. Gender. In. KUMMINGS, Donald (org.). A Companion to Walt Whitman. Malden: Blackwell Publishing, 2006. p. 180-196.
  • DERRIDA, J. Gramatologia. Trad. M. Schnaiderman e R. Janini Ribeiro. São Paulo: Perspectiva, 1973.
  • DERRIDA, J. Essa estranha instituição chamada literatura. Uma entrevista com Jacques Derrida. Trad. M. Dias Esqueda. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2018.
  • DEVEREUX, G. Mulher e mito. Trad. B. Sidou. Campinas: Papirus, 1990.
  • DÍAZ-DIOCARETZ, M. Translating Poetic Discourse: Questions on Feminist Strategies in Adrienne Rich. Amsterdam: John Benjamins Publishing Company, 1985.
  • FAIRLIE, A. B. Le mythe d’Orphée dans l’œuvre de Gérard de Nerval. Cahiers de l’Association Internationale des Etudes Françaises 22, 1970, p. 153-168.
  • HADDOCK-LOBO, R. Derrida e o labirinto de inscrições. Porto Alegre: Zouk, 2008.
  • HOFFMAN, F. J. Freudianism and the literary mind. Baton Rouge: Louisiana State University Press, 1967.
  • KAMUF, P. Fictions of feminine Desire. Disclosures of Heloise. Lincoln: University of Nebraska Press, 1982.
  • KILLINGSWORTH, J. M. The Cambridge Introduction to Walt Whitman. Cambridge: Cambridge University Press, 2007.
  • KRISTEVA, J. Hannah Arendt. Life is a Narrative. Trad. F. Collins. Toronto: Toronto University Press, 2001.
  • MALLARMÉ, S. Poésies. Paris: Nouvelle Révue Française, 1913.
  • NASCIMENTO, E. Derrida e a Literatura. “Notas” de literatura e filosofia nos textos da desconstrução. Niterói: EDUFF, 2001.
  • NERVAL, G. de. El Desdichado. In. GIDE, André (org.). Anthologie de la poésie française. Pléiade. Paris: Gallimard, 1949, p. 508.
  • POLLACK, V. R. Motherhood. In: LeMASTER, J. R.; KUMMINGS, Donald D. (org.). The Routledge Encyclopedia of Walt Whitman. Nova Iorque: Routledge, 1998, p. 435-437.
  • RICH, A. Of Woman Born. Motherhood as Experience and Institution. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 1986.
  • RICH, A. What is Found There. Notebooks on Poetry and Politics. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 1993.
  • RICH, A. The Fact of a Doorframe, P. Poems 1950-2001. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 2002.
  • RICH, A. Que tempos são estes. Trad. M. Lotufo. São Paulo: Jabuticaba, 2018.
  • RICOEUR, P. O conflito das interpretações. Ensaios de hermenêutica. Trad. M. F. Sá Correia. Porto: Rés, 1989.
  • WHITMAN, W. Leaves of Grass 1860 (The Facsimile Edition). Iowa: University of Iowa Press, 2009.
  • WHITMAN, W. Folhas de relva. Trad. B. Gambarotto. São Paulo: Hedra, 2011.
  • WHITMAN, W. Folhas de relva. Trad. R. Garcia Lopes. São Paulo: Iluminuras, 2014.
  • 1
    “This impulse to enter, with other humans, trough language, into the order and disorder of the world, is poetic at its root as surely as it is political at its root. Poetry and politics both have to do with the description and with power. And so, of course, does science”.
  • 2
    “Patriarchy is the power of the fathers, a familial-social, ideological, political system in which men - by force, direct pressure, or through ritual, tradition, law, and language, customs, etiquette, education and the division of labor, determinate what part women shall or shall not play, and in which the female is everywhere subsumed under the male”.
  • 3
    “[…] are charged with associations going back to early life, and with cultural attitudes wrought into language itself”.
  • 4
    “The art of narrative resides in the ability to condense the action into an exemplary moment, to extract it from the continuous flow of time, and reveal the who [...]”.
  • 5
    no does not appear to exist in the dream; antithesis is usually reduced to unity”.
  • 6
    “The truth is that the masses grew out of the fragments of a highly atomized society whose competitive structure and concomitant loneliness of the individual had been held in check only trough membership in a class”.
  • 7
    “Morro! / Amo o horror de ser virgem e anelo / Viver entre o pavor de meu cabelo / Para, à noite, de volta a meu leito, reptante / Inviolado sentir sob meu corpo vacante / O brilho frio de sua pálida claridade / Você que agoniza, que queima de castidade, / Noite branca de gelo e de neve terrível! / E sua irmã solitária, sua irmã imperecível / Meu sonho subirá até você: tal se mostrou / a rara limpidez de um coração que o sonhou, / Penso-me só em minha pátria de monotonia / E tudo, em minha volta, vive na idolatria / De um espelho que reflete em sua calma dormente / Herodíade de olhar puro de diamante... / Ó último encanto, sim! Sinto que estou só.” (Trad. minha)
  • 8
    “what we now refer to as gender but what Whitman calls in his poetry ‘identity’”.
  • 9
    “quakera, tradutora, oradora, originadora, dispensadora, tudo-aceitadora, protetora”
  • 10
    “portraits the human body as a beautiful but embattled terrain”.
  • 11
    “From eclectic medical writers like Edward H. Dixon, he took the strange notion of sexual electricity, the idea that an actual electric charge passes between men and women during courtship and intercourse […]”.
  • 12
    “a topic with which Whitman was strongly identified, for complex reasons”.
  • 13
    “What the poet knows about the meaning of death - what he feels has been revealed to him - is likely to be something intangible or even untranslatable; and his task, therefore, is to discover or invent an ‘idiom’ that will make this revelation translatable and comprehensible even to those whose language skills are far weaker than his own”.
  • 14
    “And everywhere along this endless road looms the ghostly image of death, whether as a nebulous specter, a motherly comforter, or as the gatekeeper of the god with whom the persona aspires to form a comradely relationship, to identify, or eventually to merge”.
  • 15
    “Full of life, sweet-blooded, compact, visible, I, forty years old, the Eighty-third Year of the States, To one the century hence, or any number of centuries hence, To you, yet unborn, these seeking you”.
  • 16
    “I will duly pass the day, O my mother, and duly return to you”.
  • 17
    “Now I pierce the darkness - new beings appear, / The earth recedes from me into the night, / I saw that it was beautiful, and I see that what is not the earth is beautiful”.

Editado por

Editor de Seção:

Fábio José Rauen

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    08 Jun 2021
  • Aceito
    06 Out 2023
Universidade do Sul de Santa Catarina Av. José Acácio Moreira, 787 - Caixa Postal 370, Dehon - 88704.900 - Tubarão-SC- Brasil, Tel: (55 48) 3621-3369, Fax: (55 48) 3621-3036 - Tubarão - SC - Brazil
E-mail: lemd@unisul.br