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Responde a democracia à busca de certeza?

QUESTÕES DA POLÍTICA

Responde a democracia à busca de certeza?

Norbert Lechner

Doutor em Ciência Política (Freburg, RFA), e professor da FLACSO, Santiago do Chile

A demanda de certeza

Que segurança oferece a democracia? O debate sobre a democracia, como grande parte do pensamento político moderno, gira em torno da segurança; ou seja, responde a medos sociais. Do medo à guerra e à violência, ao desamparo e à miséria surgem as tarefas da política: assegurar a paz, garantir a segurança física e jurídica (Estado de direito) e promover a segurança econômica (Estado de bem-estar). Junto aos perigos materiais há outros difusos e difíceis de notar. Percebemos ameaças veladas, porém tanto mais violentas na medida em que nos sentimos entregues a elas sem proteção. Este medo, este abandono, questionam a ordem social. Está colocada a questão da ordem.1 1 Não podendo escapar a meus fantasmas, prossigo as reflexões de "La conflictiva y nunca acabada construção dei orden desejado", FLACSO, Santiago 1984, reeditado pelo Centro de Investigações Sociológicas, Madri, 1986.

A questão da ordem tem características específicas na época moderna. Só se pode falar de modernidade, diz Koselleck,2 2 Citado por Habermas, JOrgen: Der philosophische Diskuss der Moderno, Suhrkamp Frankfurt, 1985, p. 22. quando o horizonte social das expectativas já não encontra sustento nas experiências passadas. Enquanto a sociedade se abre ao diferente, deixando de ser única, as pessoas se vêem obrigadas a escolher, por sua conta e risco, entre múltiplas possibilidades de ser, de fazer, de pensar. A confrontação com o "novo"fascina e atemoriza. O despertar tem o seu encanto quando remete a um futuro por conquistar. Faz vinte, trinta anos, denunciamos o imobilismo da ordem estabelecida, por que vislumbrávamos uma alternativa. Quando o futuro se dilui, o novo torna-se uma ameaça ao existente. Mesmo o presente se desagrega. Já é um lugar comum falar da fragmentação do tecido social provocada pelo autoritarismo. Mas esta destruição por certo traumática, não é um risco exclusivo do autoritarismo, nem desaparece com ele. As rupturas autoritárias se inserem numa transformação do capitalismo em escala mundial, o desenvolvimento de uma "nova ordem internacional"que se expressa no duplo processo de "integração transnacional e desintegração nacional"(Sunkel). Trata-se de um processo de diferenciação social que desborda o campo econômico e abarca todas as esferas da sociedade. A já clássica "heterogeneidade estrutural"da América Latina se torna assim ainda mais complexa. Diferentemente do processo de modernização nos anos sessenta, a nova complexidade social não remete a nenhum referente. Não dispomos nem de uma memória histórica ou um projeto de futuro, nem de um paradigma teórico ou algum modelo prático. O ar de dissolução atualiza a origem da sociedade moderna: "Todas as relações estancadas e esmaecidas, com seu cortejo de crenças e de idéias veneradas durante séculos, se quebram; as novas se fazem amarradas antes de terem podido cristalizar-se. Todo o estamental e estancado se dissipa, todo o sagrado é profano e os homens, ao fim, se vêem forçados a considerar seriamente suas condições de existência e suas relações recíprocas".3 3 Marx, Karl e F. Engels: El Manifiesto Comunista, (Ed. Austral, Santiago, 1969)

Nos encontramos num novo estágio de secularização com a conseqüência do desamparo. Tudo está sob suspeita: quem é o outro e quem é você mesmo? Não só o futuro sempre imprevisível, mas inclusive a realidade existente torna-se inatingível. Perdidas as garantias, dissolvido todo o estabelecido, tudo parece possível. Perguntando-nos "pelo possível"nos instalamos na incerteza.

Desta incerteza nasce a democracia moderna. "O essencial - afirma Claude Lefort - é que a democracia se institui e se mantém na dissolução das referências de certeza. Ela inaugura uma indeterminação, última quanto ao fundamento do Poder, da Lei e do Saber, e quanto ao fundamento da relação de um com outro em todos os registros da vida social."4 4 Lefort, Claude: "El Problema de la democracia", in Opciones, nº 6, Santiago, 1985, p. 84. Aceitando o desencadeamento do mundo como ponto de partida, podemos identificar a democracia com o desencanto? A atual "cultura pós-moderna"se alegra em desmontar as, sem dúvida frágeis, certezas de outrora e em proclamar um desencanto que, justificado frente a um discurso totalizante, no fim das contas resulta ser de uma falsa radicalidade e de um realismo grosseiro.

A desmontagem das falsas certezas é, desde logo, uma crítica indispensável.5 5 Ver recentemente Hirschman, Albert: "On Democracy in Latin America", in The New York Review of Books. 10 de abril de 1986. Penso na "inflação ideológica"tão típica da política latino-americana: a tendência a sacralizar os princípios políticos como verdades absolutas e a guiar a ação política segundo planificações globais da sociedade. Tal "superideologização"contribui para uma forte intransigência para negociar compromissos e para modificar decisões tomadas. Não se aceita que todo tema da política contribua necessariamente a um conflito de interpretações.6 6 Ver, por exemplo, Edelman, Murray: Polítical Language and Political Reality, in PS, inverno 1985. Estabelece-se uma cultura antagônica em que a política é percebida como uma luta de vida ou morte e a ordem como a imposição da vontade triunfadora. A esta violência corresponde, sem dúvida, uma desesperada busca de certeza. Contudo, me parece inoportuna uma crítica que não resgate os motivos desta busca. Quero dizer: a crítica a uma solução dada não elimina o problema. O problema é a existência de uma demanda por certeza.

O atual clima intelectual está marcado por um "desconstrucionismo"e, em particular, a crítica neonietzscheana ao racionalismo iluminista. O debate sobre a modernidade tem o mérito de restabelecer a dialética da secularização. Abre-se aqui um caminho fértil para repensar a democracia. Ela é filha da secularização em um duplo sentido. Por um lado, proclama a incerteza ao instituir a vontade popular como princípio constitutivo da ordem; pelo outro, se encarrega das demandas de certeza provocadas precisamente por uma sociedade secularizada. Não começam nesta tensão nossas dificuldades em institucionalizar a democracia?

Não é casual que Gino Germani, o maior estudioso dos processos de modernização na América Latina, dedique seu último trabalho a este problema.7 7 Germani, Gino: Democracia y autoritarismo en la sociedade moderna, in Critica y Utopia, nº 1, Buenos Aires, 1979. O posterior debate foi reunido em Los limites de la democracia, CLACSO, Buenos Aires, 1985 (2 tomos). A mesma secularização da sociedade, que mediante a passagem de formas prescritivas a formas eletivas de ação, mediante a legitimação da mudança social e a crescente especialização de papéis e instituições, faz possível a democracia, também a solapava pelo questionamento ilimitado de todo o estabelecido.

Por um lado, a democracia supõe a secularização. Só uma atitude laica que não reconhece nenhuma autoridade ou norma como portadora exclusiva e excludente da verdade permite a uma sociedade organizar-se segundo o princípio da soberania popular e o princípio da maioria. E a secularização significa precisamente desvincular a legitimidade da autoridade e das leis das pretensões de verdade absoluta. Ao fazer da fé religiosa e dos valores morais um assunto da consciência individual, a secularização transfere para a política a tarefa de estabelecer normas de validade sobre-individuais. Trata-se de uma relação de complementariedade: as prescrições morais e as pretensões de certeza podem ser privatizadas na medida em que a esfera pública aparece regulada por normas objetivas e universalistas.

Dito em outras palavras: as pretensões de certeza são remetidas ao foro subjetivo enquanto complementariamente se compartilham critérios objetivos de certeza, concretamente, a racionalidade formal. O paralelo avanço do mercado e da burocracia dota a esfera pública de uma calculabilidade que compensa a relativização e privatização dos valores. Sob este ponto de vista, a democracia seria a forma política de uma sociedade secularizada.

Por outro lado, não obstante, a secularização desestabiliza a democracia. A dinâmica secularizante se estende a todos os campos sociais e também à democracia, esta não conhecendo outro limite que a vontade popular, acelera este processo. Por um lado, submete os conteúdos materiais da política a uma revisão sistemática e permanente. As teorias democráticas modernas prescindem de princípios de verdade, inquestionáveis e imutáveis; a legitimidade de uma decisão depende de sua legalidade. Em base a tal "legitimidade por procedimento"toda norma pode ser revogada ou modificada por uma nova maioria. Os procedimentos democráticos (eleições regulares, princípio de maioria) não garantem que determinada medida ou meta programática perdure no tempo. Em conseqüência, a transição democrática não pode findar-se num pacto substantivo sobre determinados objetivos mas somente num pacto institucional acerca dos procedimentos.8 8 Przeworski, Adam: "Ama a incerteza e serás democrático", in Novos Estudos, nº 9, CEBRAP, São Paulo, julho 1984. Por outro lado, tampouco os procedimentos formais dão uma segurança absoluta. O relativismo de valores também relativiza as "regras do jogo". Não há procedimentos "verdadeiros"e "objetivos"; são acordos contratuais que estabelecem um direito, mas hão um dever; não oferecem garantias rio sentido de uma obrigação ética. O contrato fica imerso no mundo do poder e do medo. Um pacto sobre as regras do jogo só seria eticamente vinculante em relação a uma normatividade externa, precisamente aquele fundamento de valores corroídos pela secularização. A mesma neutralidade valorativa dos procedimentos democráticos que faz da certeza um assunto da consciência individual também introduz a incerteza na esfera pública. Também a racionalidade formal supõe um marco de comunicação. O cálculo de custos/benefícios requer um reconhecimento intersubjetivo dos interesses, pois somente assim um benefício mantém um valor duradouro no tempo. Sem esta estabilidade temporal não há cálculo racional.9 9 Para uma crítica das teorias neoutilitaristas da democracia ver Pizzorno, Alessandro: "Sobre la racionalidad de la opción democrática, in Los limites de la democracia, op. cit.

O caso chileno ilustra dramaticamente quão difícil resulta neutralizar o medo e as ameaças, reais ou imaginárias, mediante procedimentos formais. As dificudades da "engenharia institucional"remetem ao mundo simbólico e aos imaginários coletivos; redescobrimos que a política não se guia somente por interesses, mas igualmente por paixões e imagens, crenças e emoções.10 10 O economicismo dos economistas se vê confirmado pela concessão do Prémio Nobel de economia 1986 a James Buchanan, que reduz a democracia a uma dotação racional de impostos e gastos fiscais. Sua meta é "uma ordem política que canalize o comportamento egoísta dos participantes para o bem comum de modo que se acerque o mais possível ao que nos descreveu Adam Smith em relação à ordem econômica". ( El Mercurio, 9.12.1986). O desvio da sociedade põe à luz a cara oculta da política: o medo ao desenraizamento social, a ansiedade de sentir-se pertencendo à coletividade, a angústia por transcender a imediatez da vida singular. A democracia não pode ser surda a estes clamores sob pena de ser arrasada por eles. Ou bem assume os medos e os desejos, ou bem sucumbe à "lógica da guerra".

Os processos de transição são um caso limite; por isso mesmo iluminam com nitidez o lugar central da incerteza. Ela provoca o medo a mudanças e conflitos e, portanto, à própria democracia, promovendo ao mesmo tempo uma fé cega em qualquer promessa de unidade e harmonia, por ilusória que seja, Não basta então exorcizar a incerteza, proclamando-a uma virtude democrática. A demanda por certeza existe e a pergunta é quem se aproxima dela.

Considerando esta dinâmica, Adam Przeworski define acertadamente a democracia como "um resultado contigente dos conflitos".11 11 O título original do texto de Przeworski é Democracy as a contigent outcome of conflicts (1983) O pacto democrático não é um resultado necessário e inevitável, mas uma possibilidade. É possível enquanto oferece certas seguranças mínimas de que os diversos "interesses vitais"sejam respeitados no futuro. Em caso contrário, conclui Germani, a dinâmica secularizadora bem pode dar lugar a um novo autoritarismo. O que é o autoritarismo senão um intento por restaurar uma certeza e, em concreto, de restabelecer um sentimento de comunidade num mundo de desagregação insuportável? Denunciar a ditadura e sua ordem implica elaborar novos referentes de certeza.

Assumir a incerteza de uma história sem sujeito nem fins é um desencanto necessário, mas insuficiente. Para elaborar uma visão desencantada é preciso assumir as demandas de encanto. Justamente o realismo político nos faz ver que na incerteza está implantada a busca de certeza. Se a democracia surge da incerteza, não surge precisamente como uma tentativa de resposta?

Sobre o processo de secularização

A democracia moderna nasce junto com o desencanto do mundo. Somente quando a sociedade percebe a problemática de sua constituição enquanto sociedade, pode aparecer a política moderna como ação consciente da sociedade sobre si mesma. Então concluiu a lenta transição secular de uma ordem integralmente recebida para uma ordem mais e mais produzida.12 12 Sobre o seguinte, ver Gauchet, Mareei: Le dósenchantment du monde, Gallimard, Paris, 1985. Na origem da ordem recebida se encontra a religião: a desapropriação radical do mundo vivo-visível de seu fundamento. A anterioridade e a supremacia absoluta da religião como princípio constitutivo da ordem faz da sociedade um reino do passado puro, herança imutável. A posterior transformação da imagem do divino, a personalização dos deuses, a racionalização dos heróis míticos em símbolos abstratos, a interiorização da origem do mundo numa "gênese", solapavam o caráter transcendente do fundamento. Com o enfraquecimento da garantia exterior e indiscutível, surge o problema moderno da liberdade e, portanto, da certeza.

Mareei Gauchet faz ver um paradoxo presente desde então e particularmente visível em nossa época: quanto mais produtores somos da ordem social, mais nostalgia sentimos daquela veneração absoluta da ordem, concebida como um estado de coisas radicalmente subtraído à nossa capacidade de dispor dela mas que em troca nos assegura um lugar firme em seu seio. Esta garantia inviolável reside em uma lei totalmente alheia à nossa vontade e, por isso mesmo, integralmente assumida como a melhor possível. A ordem que interiorizamos como inteiramente recebida é simultaneamente aquela ordem que nos permite um consentimento sem reservas. Pelo contrário, a ordem produzida por nós exige ser decifrada e, portanto, nos custa reconhecer-nos nela. Além disso seus mecanismos nos desbordam e finalmente sofremos seus resultados sem saber controlá-los. Enquanto que a ordem que recebemos é por sua vez um destino que nos acolhe, a ordem que produzimos é um futuro que nos escapa.

O paradoxo insinua o campo da atual incerteza: o sentido da ordem ou dito em termos sociológicos, a integração simbólica da sociedade. Não pode haver sociedade, dizia Durkheim, se não há uma afirmação constante dos sentimentos coletivos e das idéias coletivas que fazem sua unidade e sua personalidade. No passado, a religião cumpre a função de integrar simbolicamente a sociedade enquanto vida coletiva. Quando a religião deixa de ser o "referencial sagrado", aquele sistema de símbolos últimos, do qual se desprendiam os sentidos da interação social, por meio de que referencial a sociedade pode reconhecer-se e afirmar-se enquanto ordem coletiva?

O fim da religião como princípio constituinte do corpo social marca uma ruptura total. A sociedade segue afirmando e reconhecendo a "si mesma"por meio de um referencial exteriorizado, mas trata-se de um deus-sujeito presente no mundo. Uma vez questionada a geração temporal do fundamento, a distância espacial diminui progressivamente. A sociedade constitui o sentido da ordem através de uma instância fisicamente metafísica: o Estado. De agora em diante o vértice da ordem coletiva reside no Estado, no qual confluem o fundamento constitutivo da vida social e seu ordenamento material-concreto. Já não se crê num princípio sacrossanto, subtraído ao raciocínio humano, de cuja correta interpretação se deduziriam as leis, mas tampouco se pode abandonar toda referência a uma lei fundamental. A auto-afirmação da sociedade enquanto sociedade segue apoiada no que Gauchet denomina uma "dívida de sentido",13 13 Gauchet, Mareei: La dette du sens et les radnes de ittat, Paris, 1977, livro 2. ou seja, a submissão da ordem social a um princípio regulador separado da sociedade, só que sob a forma de uma contradição, desde então central: a validez do princípio regulador fica vinculada aos efeitos de seu exercício. Assim como a crença em determinado fundamento condiciona a aceitação de sua organização material, assim a opinião sobre o estado de coisas existente condiciona por sua vez a validez de seu fundamento normativo. Perdido o encanto de um princípio absoluto desde sempre válido para todos, as divisões na sociedade (os diferentes interesses e experiências) dão lugar a múltiplos princípios reguladores - um novo "politeísmo".

Posto que a religião já não opera como um mecanismo de neutralização dos conflitos, produz-se uma reestruturação do conjunto das relações sociais. Se antes a perspectiva de transformação radical do fundamento excluía conflitos acerca do que deveria ser a forma de convivência social, agora o sentido e a legitimação da ordem se encontram no centro mesmo dos conflitos. Isto é, não só os interesses de um ou de outro setor social, mas a identidade da sociedade mesma se encontra permanentemente ameaçada.

Do medo desta ameaça nasce a demanda de certeza. Não se trata pois de um problema individual. Ainda que individualmente renuncie a qualquer ancoradouro firme e absolutamente imóvel neste turbilhão de possibilidades e abrace a incerteza, a vida coletiva requer certezas e, em particular, certeza precisamente sobre o "coletivo".

Reivindicando sua soberania a sociedade moderna deixa de conceber-se como produto de um destino e se reclama dona de seu futuro. Dirigindo o olhar ao futuro - o possível - nasce a liberdade moderna: a constituição consciente da sociedade por ela mesma. Se Marx exalta a autodeterminação como processo de emancipação social, Tocqueville vislumbra o desamparo: dono de si mesmo o povo pode conceber tudo e atrever-se a tudo. Uma vez instituído o princípio da soberania popular, tudo fica ao alcance da crítica, a imaginação, a vontade humana. Se tudo é questionável, se nada está subtraído à discussão e ao conflito, o que coesiona a vida em comum? A secularização não é, pois, somente um processo de descontrução. A própria decomposição da ordem recebida estabelece a recomposição. Esta reconstrução já não pode apoiar-se em uma legitimação divina nem orientar-se por critério de algum passado exemplar. Em lugar de restaurar uma ordem consagrada, trata-se de instituir a ordem a partir da própria sociedade. Deste modo a secularização faz da auto-identificação o problema fundamental da modernidade.14 14 Habermas, JOrgen: "Das Zeitbe unssisen der Moderne und ihr Bedurfnis nach Selbstvergewisserung", in Der philosophische Deskurs der Modeme, op. cit. Como assegurar-nos de "nós"mesmos? De certo modo, a busca de certeza é resumida na pergunta que formulara Habermas: "podem sociedades complexas elaborar uma identidade razoável?"15 15 Habermas. JOrgen: Rekonstruktion des Historischen Materialèmus. Suhrkamp Frankfurt, 1976, cap. IV. Esta pergunta é decisiva, no meu entender, para enfocar a democratização em nossos países.

Supondo que a busca de certeza se refere principalmente à identidade coletiva, podemos elaborar uma resposta política? No pensamento político latino-americano prevaleceu por séculos, através da tradição ibérica, um modelo "holista"de sociedade,16 16 Morse, Richard: El espejo de Próspero, Siglo XXI, México, 1982, e as obras de Louis Dumont. entendido como o primado do todo sobre as partes. Diferentemente do modelo individualista, onde a ordem coletiva resulta da associação entre indivíduos (contrato social), o modelo holista se baseia na anterioridade (histórica e lógica) da comunidade. Dada esta tradição, o pensamento latino-americano é mais sensível à dimensão política da incerteza, mas não oferece uma resposta propriamente política. A visão holista da ordem como uma comunidade orgânica, hierarquicamente estruturada, se apóia no dualismo que afirma um "bem comum"como fundamento inquestionável da ordem e, simultaneamente, submete a política à "boa razão do Estado". Este dualismo, proveniente do barroco espanhol e desenvolvido pela doutrina social da Igreja católica, está presente até a nossa época.17 17 Ilustrativo deste esquema que teve influência nos anos sessenta, vinculado ao auge da democracia cristã, é a obra de Roger Vekemans S. J.; por x. Doctrina, Ideologia y Política, Desal, Santiago, 1970. Na América Latina não houve uma ruptura nítida com a legitimação transcendente da ordem colonial. As revoluções de independência enfrentam a sociedade latino-americana com o mesmo problema que de modo exemplar havia formulado a Revolução Francesa: é possível instituir o social a partir de si mesmo, sem recorrer a uma legitimação transcendente18 18 Furei, Franco is, entrevistado por Massimo Boffa in Debats. nº 4, Valencia, 1982, p. 112. . A Revolução Francesa reinstitucionaliza o social através do princípio da soberania popular. Nas condições sociais e políticas da América Latina, esta idéia não consegue assentar-se como sentido nem pode ser invocada como justificação do poder oligárquico. Haverá pois uma coexistência entre a legitimação democrático-igualitária e a legitimação divino-hierárquica em uma espécie de legitimação escalonada, invocando-se - segundo a oportunidade - a "vontade popular"ou o "bem comum".

Menciono este fundo histórico para chamar a atenção sobre a carga religiosa da política. Não se trata de um traço típico da América Latina; aqui só é mais visível porque a política assume a função integradora que antes cumpriu a religião. A convivência social é reinterpretada como comunidade através de algum tipo de "teologia política".19 19 Segue sendo sugestivo o texto de Schimitt, Cari: Polistische Teologie (1922), Berlim, 1979. Esta oferece à sociedade uma imagem de plenitude na qual reconhece-se enquanto ordem coletiva e, reverenciando o princípio legitimador, estabiliza-se no tempo. Não só a noção de bem comum, também o princípio de soberania popular contém uma promessa de harmonia final. Tanto na interpretação liberal como na marxista, a vontade popular remete à felicidade. Este desdobramento é mais notório na América Latina, dada a mencionada "superideologização"de diverso significado; mas mesmo em sociedades mais secularizadas a política cristaliza os desejos e as promessas de um "final feliz". Esta utopia secularizada provoca, hoje em dia, uma desproporção entre os objetivos e os recursos disponíveis. O que havia permitido a política assumir a direção integradora da sociedade, hoje fomenta uma desconfiança generalizada na política. Estamos frente a um novo impulso secularizador que desmonta os "resíduos"religiosos para inaugurar um realismo radical relativo ao "possível"? Ou assistimos a uma sobre-secularização que despoja a política de seus mecanismos integradores, provocando uma crise de identidade?

A secularização do princípio religioso por parte da política significa não só fundar a integração social numa "última instância"(princípio lógico e teleológico), mas também institucionalizar este fundamento num esquema centralizado. Este traço não é exclusivo da América Latina, se bem que se encontre realçado pelo modelo "holista"de uma ordem hierarquicamente estruturada. De fato, a centralidade - uma institucionalidade referida ao uno - desperta reações muito menos excitadas que na França, por exemplo, porque sempre esteve amortecida por uma tendência centrífuga.20 20 "No mundo latino nunca temos sido tão influenciados como para necessitar agora uma cura de espiritualismo cósmico. Nunca temos sido tão terrivelmente racionais que necessitemos agora de uma pedagogia do irracional, nunca tão individualistas como para ter generalizada a necessidade de uma união compensatória com o uno". Xavier Rubert in Ventos: Moral, Laia, Barcelona, 1985. A fragmentação geográfica, étnica, social, cultural e econômica em cada uma das sociedades latino-americanas, a justaposição e sobreposição de diversas formas de vida, só permitem falar de "arquipélagos". A defasagem entre esta heterogeneidade estrutural e a tradição holista de comunidade nos faz ver na centralidade uma força homogenizadora indispensável para criar uma efetiva comunidade política. Frente a uma sociedade facciosa, caracterizada por uma política de fronda e de estratégias corporativistas, a unidade é uma invocação recorrente do discurso político.21 21 Para Argentina, ver por exemplo Palermo, Vicente: "Cultura Política, Conflicto, Democracia", in Ideas en las Ciências Sociales, nº4, Buenos Aires, 1985. Agora, se a centralidade aparece como uma aspiração legítima em relação à histórica desagregação social, também poderia tratar-se de uma aspiração obsoleta para a moderna diferenciação social. Em realidade, o processo de diferenciação questiona toda noção de centralidade como um obstáculo ao desdobramento das diferenças. A visão descentralizada, que proclama o pós-modernismo, é uma desconstrução pendente para secularizar uma política monoteísta? Ou não será precisamente tarefa da política conformar estruturas de centralidade que coesionem o processo de diferenciação?

Me pergunto, em resumo, pelos eventuais limites da secularização. Quando a secularização recupera como produto dos homens o que estes haviam projetado para o céu, a política assume aspirações anteriormente entregues à fé religiosa. Esta carga religiosa da política pode ser considerada hoje uma sobrecarga de expectativas. Sugere-se uma secularização radical da política, liberando-a de demandas que não poderiam satisfazer dada a complexidade das relações sociais. Somente tal desencantamento permitiria formular uma concepção realista da democracia. Eu presumo, pelo contrário, que a complexidade social exige uma noção mais completa de "realismo político".22 22 Ver as contribuições in Quê es realismo en Política?. Catalogos, Buenos Aires (no prelo).

MARX, TOCQUEVILLE e a legitimação da ordem social

Pode a sociedade constituir-se a partir dela mesma, criando sua normatividade própria? Uma resposta é precisamente a democracia. A respeito convém distinguir dois aspectos: a democracia como princípio de legitimidade e como princípio organizativo. Ambas as dimensões se entrelaçam e se confundem na teoria da democracia, de Rousseau em diante. Por certo, ambos os momentos se relacionam, segundo veremos, mas sua distinção nos permite visualizar dois enfoques da "questão democrática". Uma corrente privilegia o problema da constituição da ordem social, buscando fundamentar uma legitimação objetiva da democracia. Se bem que, atualmente, poucos ponham em dúvida o princípio da soberania popular, seu significado segue controvertido e ele repercute sobre as modalidades de institucionalização. Outra corrente enfoca diretamente a organização institucional da autodeterminação, fazendo pé firme nas formas históricas específicas. As análises de Marx e Tocqueville nos permitem confrontar os dois enfoques.

Marx herdara de Hegel e do iluminismo a pergunta pelo princípio constitutivo de uma sociedade secularizada. Existe uma racionalidade substantiva na qual se funda a ordem social? Marx radicaliza o racionalismo iluminista em dois sentidos: o desenvolvimento da razão é concebido como práxis e a práxis remete ao futuro de uma sociedade emancipada. Toda sua obra é, no fundo, uma complexa reformulação do princípio da soberania popular.

Por um lado, Marx segue vinculando a busca de certeza ao fundamento da ordem social. Mas a constituição do social já não se legitima por um princípio divino, mas pela práxis. O "paradigma da produção"implica uma dupla ruptura. Marx rompe com toda a legitimação transcendente, explicando a ordem como produto histórico social. Além disso, rompe com a idéia de uma instituição político-estatal do social e, pelo contrário, toma as condições sociais de produção como base da institucionalidade política. Quer dizer, não só substitui a vontade divina pela vontade humana, mas reconduz a soberania popular às divisões sociais. Explicitando a tensão entre "vontade geral"e a "vontade de todos", Marx critica a certeza ilusória que oferece não só a religião, mas também a política. Esta crítica não invalida, todavia, a demanda por certeza. Marx a assume como uma necessidade real, mas que somente pode ser satisfeita mediante uma revolução social.

A crítica da sociedade capitalista remete, por outro lado, à sociedade possível. Qual é o futuro possível? Inserido na tradição iluminista, Marx saúda a secularização como o irrevogável avanço da razão. E esta filosofia da história permite determinar o possível: uma sociedade plenamente racional e universalista. Esta sociedade será, diferentemente da realidade existente, a sociedade verdadeira. Identificando o futuro como uma "verdade por fazer", a práxis humana adquire um referente de certeza. O desejo por certeza pode renunciar a ilusões religiosas e ideologias políticas porque o mesmo desenvolvimento da sociedade antecipa um futuro de plenitude. Numa sociedade transparente, idêntica consigo mesmo, a incerteza fica excluída por definição.

Não deixa de ser paradoxal que uma obra que se entendia fundamentalmente como crítica e desestruturadora do sistema existente, hoje seja denunciada como uma fonte de totalitarismo. No debate atual a crítica a Marx, além de objeções específicas, volta à tradição da contra-ilustração. Se se vê no racionalismo iluminista a origem de uma "razão identificante, planificadora, controladora, objetivizante, sistematizante e unificante, em uma palavra: uma razão totalizante".23 23 Para um resumo sucinto ver Wellmer, Albrecht: "La dialéctica de modemidad y postmodernidad", in Debats, nº 14, Valência, 1985 (citação na p. 85). Se as denúncias da razão totalizante - desde Nietzsche até os pós-estruturalistas, começando por Marx - não impediram a progressiva racionalização e burocratização da vida social, isto se deve, creio eu, à dialética da secularização. Quanto mais questionamos o real e o racional, o legítimo e o necessário, tanto mais nos agarramos a uma razão totalizante que nos assegure os limites da realidade social. O redescobrimento do social como um "magma de diferenças"que nunca pode ser plenamente estruturado e institucionalizado, reflete bem a percepção da nova complexidade social. A simplicidade de um mundo, uma natureza, uma racionalidade única se dissolveu. Do processo de diferenciação social não se depreende porém a radical cisão entre os diferentes aspectos da vida social. A crítica ao discurso onicompressivo não implica renunciar a uma noção de totalidade. Precisamente porque a realidade social sempre nos ultrapassa, instituímos a sociedade mediante um "fechamento"do universo social. Se prescindimos de uma delimitação "da sociedade", a imediatez e o relativismo diluem toda a identidade social. Conseqiientemente, a atual desconstrução da metateoria totalizadora nos aparece insuficiente; fica pendente a reconstrução de uma nova noção de totalidade. Como reconceitualizar a totalidade de modo que dê conta da pluralidade? Me parece ser este o problema de fundo. Tanto Marx como o liberalismo suspendem a tensão entre totalidade e pluralidade, reduzindo respectivamente um pólo ao outro. Presumo que a fundamentação da ordem social seguirá sendo um "buraco negro"enquanto não logremos articular os dois aspectos da democracia: ordem conflitiva e ordem coletiva.

É possível afirmar "o coletivo"em um fundamento objetivo ou somente pode ser analisado enquanto produto histórico? Buscando opor às ficções ideológicas uma certeza objetiva, Marx bate o pé na legitimidade (material) da ordem democrática. Em troca, Tocqueville se interessa exclusivamente pela modalidade concreta em que opera a institucionalidade democrática. Tocqueville desloca o âmbito de análise: a fundamentação teórica da "boa ordem"é substituída pelo estudo histórico de uma "democracia real".

Segundo Tocqueville, os referentes de certeza são elaborações culturais. Diferentemente de uma "engenharia institucional"que aborda a legitimação e os procedimentos democráticos separadamente dos valores, crenças, hábitos e motivações existentes em determinada sociedade, Tocqueville enfoca as instituições da democracia norte-americana como uma configuração cultural. Neste sentido, Tocqueville (igual a Marx) entende a democracia mais como um Estado social que como uma forma de governo. Só que seu enfoque, menos sistêmico, mais compreensivo que explicativo, percebe a cultura como um âmbito constituinte (não "derivado") da realidade social. Sem ignorar a desigualdade na sociedade norte-americana, Tocqueville se apoia precisamente na ideologia igualitária - a semelhança de sentimentos, crenças e costumes - como sendo o sentido comum da democracia. Esta sensibilidade pela cultura política faz o pensamento de Tocqueville tão moderno; vale dizer, tão atento às conseqüências da secularização. Reaparece de maneira muito mais explícita que em Marx o que me parece ser um dos problemas fundamentais da democracia na América Latina: o que coesiona uma sociedade secularizada de modo que a diversidade de valores e interesses possa desenvolver-se como pluralidade e não conduza para a desarticulação social?

Tocqueville estabelece a questão democrática em relação direta com o processo de secularização: "Que fazer de um povo, dono de si mesmo, se não está submetido a Deus?"Enquanto a soberania popular propunha uma liberdade de ação nunca antes conhecida, a fé religiosa estabelece os limites do possível. "Ainsi donc, em même temps que la loi permet au peuple americain de tout faire, la réligion Tempèche de tout concevoir et tout oser".24 24 Tocqueville, Alexis de: De la democratie en Amérique in Ouvres l/1, Paris, 160 p. 390. Mas Tocqueville já não pensa na religião como fundamento radicalmente externo da ordem social. Refere-se a uma sociedade de crentes (e não a uma sociedade religiosa). Ou seja, reinterpreta a religião em termos secularizados como uma "hegemonia"moral-intelectual. Tocqueville visualiza a necessidade de um "cimento ideológico-cultural"para assentar as instituições políticas sobre as experiências sociais.

A legitimação transcendente é substituída por uma "religião civil". Neste ponto Tocqueville se afasta do iluminismo francês e se aproxima do tradicionalismo inglês (Burke). A coesão da democracia americana não reside na construção racionalista da ordem, mas na tradição histórica. É a sedimentação histórica das pautas culturais o que conduz a essa semelhança entre os homens, em base à qual podem sentir-se membros de uma mesma comunidade. Em lugar de um princípio abstrato, o "contrato social"não seria outra coisa que aquele conjunto histórico de práticas e critérios comuns.

Tal acordo factual (histórico) é entretanto precário, dado o significado equívoco da ação social. A secularizaçãoo relegou a certeza para a consciência individual, responsável por harmonizar a particularidade com as normas universais. A certeza subjetiva supõe, portanto, a existência de um princípio universalista. Se este é objeto de múltiplas interpretações e não tem um sentido unívoco, surge novamente a incerteza. Assim o mesmo Tocqueville, sensível à ambiguidade da ideologia igualitária (podendo significar individualização e anonimato, inovação e uniformidade), restabelece o problema do fundamento do social.

Tocqueville aborda o tema de modo negativo: o perigo de uma tirania da maioria. Aceitando que - instaurada a soberania popular - o princípio da maioria é o único princípio de legitimidade factível, como evitar que a maioria faça o que deseja? Tocqueville vislumbra a tendência de a maioria não só dominar a minoria, mas absorvê-la. Representando os desafios do mundo, a ambiguidade e contraditoriedade dos significados estabelecidos, a minoria ameaça a fé da maioria em si mesma: as coisas não têm que ser assim. Por medo de perder sua identidade, a maioria pode desejar algo mais que expressar sua vontade: pode tentar universalizá-la.25 25 Sennett, Richard: "Lo que Tocqueville temia", in Narcisismo y Cultura Moderna, Kairos, Barcelona, 1980. A tirania da maioria consiste na imposição de sua identidade como identidade nacional. O que provoca tal universalização falsa? Não residirá precisamente na incerteza acerca do "geral"? Podemos ver na tirania uma resposta à ausência ou erosão de uma vontade coletiva.

Não creio, como afirma Furet, que Tocqueville "rompe com a obsessão do fundamento do social, tão característico do século XVIII e de Marx que, sob este ponto de vista é seu herdeiro".26 26 Furet, François: op. cit., p. 115. Também Tocqueville o tem presente; inplicitamente retoma o enfoque de Rousseau, antepondo uma identidade (vontade geral) à pluralidade (vontade de todos). A auto-imagem da sociedade como "ego coletivo"é o pressuposto para que opere o pluralismo da democracia norte-americana; sem essa referência a pluralidade desemboca na anarquia e, como reação, no despotismo. Nesta perspectiva parece haver interpretado Tocqueville o desenvolvimento político da América Latina no século XIX, oscilando permanentemente entre a anarquia e o despotismo militar.

Tocqueville critica os latino-americanos por não terem sabido enraizar as instituições democráticas no sentido comum: "ao transportar para sua pátria a letra da lei, não puderam transportar ao mesmo tempo o espírito que a anima".27 27 Citado por Botana, Natalio: La tradicion republicana, Sudamericana, Buenos Aires, 1984. Porém, é factível tal transplante do "espirito das leis"? O mesmo Tocqueville parte das crenças igualitaristas e dos costumes democráticos (traços específicos da sociedade norte-americana) como uma /actualidade. Segundo vimos, parece compartilhar com o tradicionalismo contra-iluminista a presunção de que cada período histórico remete a um conjunto de pressuposições básicas, uma espécie de "axiomas"que sendo ininteligíveis nesse período proporcionam uma inspiração latente para as crenças e aspirações explícitas da época em questão. Bem, tomando a institucionalidade democrática como uma cristalização cultural, Tocqueville não tematiza um problema fundamental da democracia na América Latina: a génese de uma cultura política democrática. O paradoxo de Tocqueville enraiza-se num enfoque histórico que não coloca o problema do tempo.

Uma cultura democrática é o resultado de um processo histórico. Quer dizer, seu desenvolvimento requer tempo. Mas justamente o tempo é um dos recursos mais escassos na transição democrática. Ele explica em boa medida os sucessivos fracassos da democracia na América Latina; a democracia não consegue consolidar-se porque não lhe é dado o tempo para que se desenvolvam os costumes e crenças em que poderia apoiar-se a construção institucional. A legitimidade das instituições democráticas supõe o amadurecimento de uma cultura democrática que, entretanto, por sua vez supõe o funcionamento relativamente duradouro das instituições. Significa que, na ausência de uma tradição democrática, a democracia tampouco tenha futuro? O fato é que na tradição republicana da América Latina sempre se misturam democracia e autoritarismo.

Nem a democracia nem o autoritarismo pareceram capazes de elaborar o tempo histórico que requer a cristalização de uma identidade coletiva. O problema do tempo nos conduz de volta a Marx. Ele expressa, melhor que Tocqueville, a ruptura na concepção do tempo: o recurso ao passado é substituído por uma antecipação do futuro.

A filosofia da práxis implica uma visão "construtivista": a criação deliberada do futuro. Ainda mais: tende a uma determinação do processo histórico enquanto auto-realização plena do indivíduo em comunidade: "A livre associação de indivíduos livres". À afirmação enfática de uma ordem plenamente racional e universal subjaz uma idéia de verdade. Para Marx, a crítica à religião não descarta o critério de verdade. Marx supõe a existência de uma verdade que permita discernir no presente conflito de interesses e interpretações um referente coletivo válido para todos. Retoma pois a idéia de um "bem comum"definido em termos substantivos (e não só por procedimento),, mas projetando-o ao futuro.

Junto com a sua teoria do sujeito, a idéia de uma "verdade por fazer"é seguramente um dos aspectos mais rejeitados do pensamento político marxista. Supor que existia uma verdade que devemos realizar é visto como a definição da mesma de uma imposição totalitária. Sem dúvida, a vinculação de política e verdade é problemática. Eu mesmo tenho criticado reiteradamente tal referência à verdade como uma sacralização indevida de posições políticas, porque destrói os procedimentos democráticos. Entretanto, não podemos deixar de pergunta-nos por que um projeto gnóstico logra obter adesões em uma sociedade secularizada. Provavelmente as noções de progresso, revolução ou emancipação não sejam somente uma secularização de esperanças escatológicas, mas também uma maneira de neutralizar a incerteza do futuro. Trata-se de dar ao tempo uma direção e de constituir uma continuidade que permita situar o tempo atual. Se o presente não fosse mais que uma sucessão de instantes, se o tempo não tivesse duração, não haveria processo social. Sob este ponto de vista, a idéia de progresso como todo "projeto"é um modo de assegurar-nos da idéia de tempo, antecipando o futuro.

A projeção de um "bem comum"como meta histórica há de ser muito atrativa em um continente que se caracteriza pela tradição comunitária e pelas desigualdades sociais. Uma vez deslegitimado o ordenamento existente, a utopia pareceria ser a única perspectiva capaz de superar a desarticulação da sociedade. Daí a força do pensamento utópico na política latino-americana. Tal antecipação do futuro, entretanto, asfixia o presente pois exige "provas"que nenhuma política pode oferecer; a utopia termina sendo uma profilaxia autodestrutiva.

Podemos objetar a resposta que oferece Marx para a demanda de certeza.28 28 Recordemos a frase com que Horkheimer e Adorno iniciam seus estudos da dialética do iluminismo: "O iluminismo no sentido mais amplo de pensamento em contínuo progresso, tem perseguido sempre o objetivo de tirar o medo dos homens e de convertê-los em amos. Mas a terra inteiramente iluminada resplandece sob o signo de uma triunfal des aventura". Dialéctica del iluminismo, Sur, Buenos Aires, 1979, p. 15. Como insistia Weber, a política não pode ter por objetivo a redenção da alma. Não obstante, a crítica da fé religiosa que "invade"a política não devia esquecer que a política por sua vez adianta as promessas de felicidade e harmonia final. Justamente na raiz da secularização, a sociedade assume as esperanças religiosas como tarefas políticas. Hoje em dia , a força de tais utopias secularizadas parece desgastada e predomina outra modalidade, não menos insatisfatória, de antecipar o futuro: a tecnocracia.

A planificação instrumental do futuro tem incrementado o controle social sobre os efeitos de nosso atuar. Mas também ajuda à tentativa de manipular ao outro, fixando-lhe de antemão um determinado curso de ação. A razão instrumental resulta ser tão determinista como a filosofia da história. Planificando o futuro roubamos ao outro não somente a liberdade de eleger o seu futuro, mas também seu presente. O momento instrumental da ação desloca o momento expressivo a um ponto tal que os indivíduos já não logram adquirir a experiência da contemporaneidade. E o indivíduo que não compartilha um presente comum com seu próximo não participa na elaboração conjunta do tempo. Em consequência, dado este déficit simbólico-expressivo, o controle tecnocrático do futuro aguça mais ainda a incerteza.

Uma tarefa pendente

Pode a democracia responder à demanda de certeza? Minha pergunta pretende vincular a questão democrática com o debate sobre a modernidade. Por trás das dificuldades dos processos de democratização na América Latina percebo um problema deixado pela secularização: a dificuldade de uma sociedade cada vez mais complexa de certificar-se de si mesma enquanto ordem coletiva. A sociedade não só é livre para organizar-se segundo sua própria vontade, mas também livre de toda prescrição consagrada que anteriormente garantia a validez da ordem estabelecida. Vale dizer: ao ocupar o vazio deixado pela religião, a política também tem que dar conta das demandas de certeza.

Pode haver democracia sem religião? A inquietude de Tocqueville é muito mais perspicaz do que costuma acreditar nossa sociedade (mal) desencantada. Para salvaguardar um núcleo mínimo de valores sobre-individuais é preciso subtraí-los ao conflito político. Percebendo a dinâmica centrífuga da democracia emergente, Tocqueville se preocupa com os limites da vontade popular. Seu estudo das crenças e costumes enquanto "religião civil"é uma primeira resposta ao problema suscitado pela revolução francesa.

É possível instituir a sociedade a partir dela mesma, sem recorrer a uma legitimidade transcendente? A pergunta de Furet segue, sendo o grande desafio da democracia. A sociedade moderna tem de criar a partir dela mesma sua própria normatividade. Como legitimar as regras constitutivas da ordem sem sacralizá-las? Podemos conceber a soberania popular como um referente transcendental (não transcendente), cindido da sociedade, por meio da qual as diferenças na sociedade podem reconhecer-se enquanto parte de uma coletividade. A exteriorização permite instituir um referente coletivo subtraído ao conflito, porém pelo mesmo, imposto aos sujeitos. Se partimos, pelo contrário, da pluralidade de sujeitos, então como instituir um princípio legitimador da ordem, reconhecido por todos? O processo de diferenciação social permite conceber a totalidade somente no plural. Mas da mesma forma que a totalidade, também a pluridade tem que ser produzida. E só elaboramos uma pluralidade por meio de uma noção de coletividade; sem referencial coletivo a diferenciação social desemboca numa desarticulação. Este é o caso das sociedades latino-americanas.

Podem sociedades complexas elaborar uma identidade razoável? A pergunta de Habermas supõe precisamente a erosão ou a perda dos tradicionais referenciais de identificação coletiva: religião, classe, Estado. A complexidade das estruturas sociais tem feito implodir as promessas de certeza cristalizadas nessas instâncias. Este desencantamento é necessário, mas insuficiente. Se descartamos a premissa neoliberal de uma auto-regulação automática da sociedade, fica pendente a questão de ordem: a necessidade de todo indivíduo a reconhecer-se e afirmar-se a si mesmo como pertencente a uma comunidade.

Temos visto dois modos de enfocar a construção da ordem. A pretensão de Marx é descobrir no movimento interno da sociedade uma racionalidade substantiva. Ele retém a concepção antiga de fundar a ordem num princípio objetivo e universal, porém 1) definindo-o como um produto social; e 2) projetando-o ao futuro. A substituição da transcendência religiosa por uma histórica não expressa somente a nova consciência do tempo. Responde à necessidade de excluir outros princípios legitimadores. Só a materialização do fundamento invocado numa sociedade plenamente racional confirma a utopia como a verdadeira totalidade. Concebidos como "verdades por fazer", os princípios de racionalidade e universalidade se tornam um referente indiscutível de identificação. O problema salta à vista: fundando a certeza em um fundamento único e exclusivo, se nega a pluralidade.

Não menos problemático é um enfoque que substitui o problema do fundamento por uma lógica e ética da ação. Por certo, Tocqueville vê bem as tendências totalitárias que desencadeiam a secularização; a razão totalizante é uma resposta "lógica"da sociedade para assegurar sua identidade num processo de diferenciação. Assentando a coesão social nos mecanismos de integração cultural, o enfoque de Tocqueville não suspende a pluralidade. Mas a ênfase nas experiências sociais implica uma determinação histórico-concreta. Ao tomar uma cultura determinada pela premissa histórica da democracia, esta se torna um resultado contingente. Quer dizer, sempre podemos desejar a democracia; mas será uma aspiração vã se não contamos com uma integração cultural prévia.

Em ambos os enfoques a demanda por certeza é interceptada "ao nível de"uma lógica social (econômica ou cultural), sem chegar à esfera política. Não seria tarefa da política responder à busca de certeza. Bem ao contrário, a sociedade já tem que ter-se certificado de si mesma para que possa institucionalizar uma ordem democrática. Pois bem, segundo vimos, não é este o caso dos processos de democratização na América Latina. Aqui a instituição do social passa pela política.

Como responder politicamente à busca de certeza? Logo que se reconhece à política uma produtividade própria ela é domesticada mediante procedimentos formais. Na medida em que a secularização provocou a erosão dos costumes tradicionais e dos valores consagrados, a política é submetida progressivamente a dispositivos de racionalidade formal. Segundo assinalei no início, a relativização e privatização dos valores é compensada pelo paralelo avanço do mercado e da burocracia. Não podemos ignorar tampouco o alcance limitado do cálculo formal. Muitos setores da vida social não conseguem ser articulados nem pelo mercado nem através de mecanismos administrativos. Ainda mais: o peso crescente de relações burocráticas e mercantis nos processos políticos provoca dinâmicas desintegradoras.29 29 São estas dinâmicas des integradoras os que põem (dialeticamente) o tema do socialismo. Para uma teoria socialista da democracia ver agora Keane, John: Public Life and Lute Capitalism, Cambridge University Press, 1984.

A racionalidade formal procura uma calculabilidade e eficiência instrumental que pressupõe um acordo sobre os fins. As "regras do jogo"por si não oferecem segurança, pois seu significado está fora delas, no que se pode denominar o "espírito das leis". Daí o princípio regulador - o sentido da ordem - é objeto de conflito, a controvérsia relativiza de imediato os procedimentos formais. Basta recordar o processo chileno.

Não é necessário sublinhar a precariedade dos referentes coletivos em nossas sociedades, demonstrada recorrentemente pela "questão social"e pela "questão nacional". Quem sabe por isso seja mais freqüente um tipo de produção política de identidade: o carisma. A luta mais ou menos aberta entre diferentes princípios constitutivos da ordem pode encontrar uma trégua com a aparição de um líder carismático, encarnação física da identidade metafísica da nação. E não me refiro ao caudilhismo tradicional, mas à democracia presidencialista. Figuras como Tancredo Neves, Raul Alfonsín ou Alan Garcia ilustram bem como a democracia conquista legitimidade mediante a adesão entregue ao presidente. É um carisma secularizado, instituído institucionalmente; mas uma vez estabelecido, a lealdade ao líder carismático se toma o pilar da lealdade ao regime democrático. Poderíamos falar de um "carisma situacional"30 30 Tomo o termo de Tucker, Robert: "The Theory of Charismatic Leadership"in Deadalus. verão 1968, p. 745. Ver também Moscovici, Serge: L'age des foules, Fayard, Paris, 1981. Só excepcionalmente o líder carismático conduz - como Moisés - à fundação de uma identidade nacional, pois sempre está exposto a uma crise de confiança e credtoilidade. no sentido de que uma situação de desamparo e incerteza cria a necessidade de crer em um líder e assim - por meio de um líder carismático - afirmar uma identidade coletiva. Isto explica, no meu entender, porque em muitas democracias latino-americanas a fé na autoridade prevalece sobre as rotinas e regras e resulta, na percepção dos cidadãos, mais importante que a eficiência da gestão governamental.31 31 Remeto às análises de Emilio de Ipola e Juan Carlos Portantiero sobre o caso argentino.

O carisma coexiste com a racionalidade formal. Esta contemporaneidade contradiz a idéia de uma evolução linear das estruturas de consciência e identidade sociais. Pareceria mais adequado pensar em uma sobreposição de estruturas mentais parecida a camadas geológicas.32 32 Devo muito aos estudos de Benjamin Nelson: Der Ursprung der Moderne. Suhrkamp, Frankfurt, 1984; sobre este ponto, p. 75 ss. Na sociedade latino-americana prevalecem indubitavelmente pautas de racionalidade formal: operações de generalização, sistematização, abstração e formalização orientam a ação social de acordo com critérios racional-universalistas. Trata-se de um nível internacional que uma vez instituído marca a estrutura mental em nossa sociedade, por distorcida que seja sua presença. Mas esta "consciência moderna"se sobrepõe a outras estruturas. Na medida em que a racionalidade formal-instrumental não consegue assegurar a integração simbólico-normativa da sociedade, pode aflorar uma "consciência gnóstica". A fé no transcendente ressurge como sucedâneo dos princípios de racionalidade e universalidade. Não é necessário que estes estejam plenamente realizados pois, como dissera Tierno Galván, aceitar o imperfeito forma parte da instalação perfeita no finito.33 33 Tierno, Enrique, Que és ser agnóstico?, Tecnos, Madri, 1985 (4ª ed. ). Porém devem existir tais referentes de certeza para poder instalar-nos na finitude. Em caso contrário, onde a consciência moderna fracassa em elaborar tais referentes conceituais, as pessoas ressuscitam um princípio transcendente para certificar-se de sua identidade coletiva.

Em resumo, não podemos identificar sem mais a democracia com a incerteza. Desde logo, a democracia supõe um desencanto e, particularmente na América Latina, resulta urgente desmontar as planificações globais. Seria errôneo, entretanto, radicalizar o desencantamento a um grau que - sob o pretexto de denunciar a solução totalitária - nos desentendamos do problema de fundo. Bem ao contrário, precisamente a crítica às ditaduras no Cone Sul nos fez descobrir no autoritarismo uma (falsa e fracassada) tentativa de restabelecer a certeza frente a um processo de desarticulação acelerada. E deste problema deve dar conta o processo de democratização.

Não será justamente este tipo de tarefas, o que provoca a ingovernabilidade? Uma visão realista nos sugere descarregar a política de demandas e promessas excessivas, restringindo-a ao âmbito de uma administração eficiente. Pois bem, só podemos identificar a política com a gestão administrativa se supormos resolvido o "sentido da ordem". Para poder conceber a democracia como um "mercado político"é preciso pressupor uma normatividade reconhecida por todos e a crença numa "mão invisível". Explicitando esta premissa, não faltam pessoas desejando restaurar o império da religião para devolver-lhe as tarefas que havia usurpado a política no processo de secularização. De fato, a pretendida "racionalização"termina invocando novamente uma verdade absoluta para justificar as decisões políticas. Em consequência, se queremos evitar um fundamentalismo, a busca de certeza tem de ser assumida como uma tarefa mundana. Talvez poderíamos elaborar uma resposta desenvolvendo (falta ver como) uma "política identificante".34 34 Ver Pizzorno, A.: op. cit. Tradução: Luiz Eduardo P. Barreto Filho Em todo caso, considerando nossa secularização inconclusa, não será um enfoque mais realista da democracia fazer-nos responsáveis dos medos à incerteza?

Notas:

  • 1
    1 Não podendo escapar a meus fantasmas, prossigo as reflexões de "La conflictiva y nunca acabada construção dei orden desejado", FLACSO, Santiago 1984,
  • reeditado pelo Centro de Investigações Sociológicas, Madri, 1986.
  • 2 Citado por Habermas, JOrgen: Der philosophische Diskuss der Moderno, Suhrkamp Frankfurt, 1985, p. 22.
  • 3 Marx, Karl e F. Engels: El Manifiesto Comunista, (Ed. Austral, Santiago, 1969)
  • 4 Lefort, Claude: "El Problema de la democracia", in Opciones, nÂş 6, Santiago, 1985, p. 84.
  • 5 Ver recentemente Hirschman, Albert: "On Democracy in Latin America", in The New York Review of Books. 10 de abril de 1986.
  • 6 Ver, por exemplo, Edelman, Murray: Polítical Language and Political Reality, in PS, inverno 1985.
  • 7 Germani, Gino: Democracia y autoritarismo en la sociedade moderna, in Critica y Utopia, nÂş 1, Buenos Aires, 1979.
  • O posterior debate foi reunido em Los limites de la democracia, CLACSO, Buenos Aires, 1985 (2 tomos).
  • 8 Przeworski, Adam: "Ama a incerteza e serás democrático", in Novos Estudos, nÂş 9, CEBRAP, São Paulo, julho 1984.
  • 9 Para uma crítica das teorias neoutilitaristas da democracia ver Pizzorno, Alessandro: "Sobre la racionalidad de la opción democrática, in Los limites de la democracia, op. cit.
  • 11 O título original do texto de Przeworski é Democracy as a contigent outcome of conflicts (1983)
  • 12 Sobre o seguinte, ver Gauchet, Mareei: Le dósenchantment du monde, Gallimard, Paris, 1985.
  • 13 Gauchet, Mareei: La dette du sens et les radnes de ittat, Paris, 1977, livro 2.
  • 14 Habermas, JOrgen: "Das Zeitbe unssisen der Moderne und ihr Bedurfnis nach Selbstvergewisserung", in Der philosophische Deskurs der Modeme, op. cit.
  • 15 Habermas. JOrgen: Rekonstruktion des Historischen Materialèmus. Suhrkamp Frankfurt, 1976, cap. IV.
  • 16 Morse, Richard: El espejo de Próspero, Siglo XXI, México, 1982, e as obras de Louis Dumont.
  • 17 Ilustrativo deste esquema que teve influência nos anos sessenta, vinculado ao auge da democracia cristã, é a obra de Roger Vekemans S. J.; por x. Doctrina, Ideologia y Política, Desal, Santiago, 1970.
  • 18 Furei, Franco is, entrevistado por Massimo Boffa in Debats. nÂş 4, Valencia, 1982, p. 112.
  • 19 Segue sendo sugestivo o texto de Schimitt, Cari: Polistische Teologie (1922), Berlim, 1979.
  • 20 "No mundo latino nunca temos sido tão influenciados como para necessitar agora uma cura de espiritualismo cósmico. Nunca temos sido tão terrivelmente racionais que necessitemos agora de uma pedagogia do irracional, nunca tão individualistas como para ter generalizada a necessidade de uma união compensatória com o uno". Xavier Rubert in Ventos: Moral, Laia, Barcelona, 1985.
  • 21 Para Argentina, ver por exemplo Palermo, Vicente: "Cultura Política, Conflicto, Democracia", in Ideas en las Ciências Sociales, nÂş4, Buenos Aires, 1985.
  • 23 Para um resumo sucinto ver Wellmer, Albrecht: "La dialéctica de modemidad y postmodernidad", in Debats, nÂş 14, Valência, 1985 (citação na p. 85).
  • 24 Tocqueville, Alexis de: De la democratie en Amérique in Ouvres l/1, Paris, 160 p. 390.
  • 25 Sennett, Richard: "Lo que Tocqueville temia", in Narcisismo y Cultura Moderna, Kairos, Barcelona, 1980.
  • 27 Citado por Botana, Natalio: La tradicion republicana, Sudamericana, Buenos Aires, 1984.
  • 28 Recordemos a frase com que Horkheimer e Adorno iniciam seus estudos da dialética do iluminismo: "O iluminismo no sentido mais amplo de pensamento em contínuo progresso, tem perseguido sempre o objetivo de tirar o medo dos homens e de convertê-los em amos. Mas a terra inteiramente iluminada resplandece sob o signo de uma triunfal des aventura". Dialéctica del iluminismo, Sur, Buenos Aires, 1979, p. 15.
  • 29 São estas dinâmicas des integradoras os que põem (dialeticamente) o tema do socialismo. Para uma teoria socialista da democracia ver agora Keane, John: Public Life and Lute Capitalism, Cambridge University Press, 1984.
  • 30 Tomo o termo de Tucker, Robert: "The Theory of Charismatic Leadership"in Deadalus. verão 1968, p. 745.
  • Ver também Moscovici, Serge: L'age des foules, Fayard, Paris, 1981.
  • 32 Devo muito aos estudos de Benjamin Nelson: Der Ursprung der Moderne. Suhrkamp, Frankfurt, 1984; sobre este ponto, p. 75 ss.
  • 33 Tierno, Enrique, Que és ser agnóstico?, Tecnos, Madri, 1985 (4ÂŞ ed.
  • 1
    Não podendo escapar a meus fantasmas, prossigo as reflexões de "La conflictiva y nunca acabada construção dei orden desejado", FLACSO, Santiago 1984, reeditado pelo Centro de Investigações Sociológicas, Madri, 1986.
  • 2
    Citado por Habermas, JOrgen:
    Der philosophische Diskuss der Moderno, Suhrkamp Frankfurt, 1985, p. 22.
  • 3
    Marx, Karl e F. Engels: El Manifiesto Comunista, (Ed. Austral, Santiago, 1969)
  • 4
    Lefort, Claude: "El Problema de la democracia", in
    Opciones, nº 6, Santiago, 1985, p. 84.
  • 5
    Ver recentemente Hirschman, Albert: "On Democracy in Latin America", in
    The New York Review of Books. 10 de abril de 1986.
  • 6
    Ver, por exemplo, Edelman, Murray: Polítical Language and Political Reality, in
    PS, inverno 1985.
  • 7
    Germani, Gino: Democracia y autoritarismo en la sociedade moderna, in
    Critica y Utopia, nº 1, Buenos Aires, 1979. O posterior debate foi reunido em
    Los limites de la democracia, CLACSO, Buenos Aires, 1985 (2 tomos).
  • 8
    Przeworski, Adam: "Ama a incerteza e serás democrático", in Novos Estudos, nº 9, CEBRAP, São Paulo, julho 1984.
  • 9
    Para uma crítica das teorias neoutilitaristas da democracia ver Pizzorno, Alessandro: "Sobre la racionalidad de la opción democrática, in
    Los limites de la democracia, op. cit.
  • 10
    O economicismo dos economistas se vê confirmado pela concessão do Prémio Nobel de economia 1986 a James Buchanan, que reduz a democracia a uma dotação racional de impostos e gastos fiscais. Sua meta é "uma ordem política que canalize o comportamento egoísta dos participantes para o bem comum de modo que se acerque o mais possível ao que nos descreveu Adam Smith em relação à ordem econômica". (
    El Mercurio, 9.12.1986).
  • 11
    O título original do texto de Przeworski é
    Democracy as a contigent outcome of conflicts (1983)
  • 12
    Sobre o seguinte, ver Gauchet, Mareei:
    Le dósenchantment du monde, Gallimard, Paris, 1985.
  • 13
    Gauchet, Mareei:
    La dette du sens et les radnes de ittat, Paris, 1977, livro 2.
  • 14
    Habermas, JOrgen: "Das Zeitbe unssisen der Moderne und ihr Bedurfnis nach Selbstvergewisserung", in
    Der philosophische Deskurs der Modeme, op. cit.
  • 15
    Habermas. JOrgen:
    Rekonstruktion des Historischen Materialèmus. Suhrkamp Frankfurt, 1976, cap. IV.
  • 16
    Morse, Richard:
    El espejo de Próspero, Siglo XXI, México, 1982, e as obras de Louis Dumont.
  • 17
    Ilustrativo deste esquema que teve influência nos anos sessenta, vinculado ao auge da democracia cristã, é a obra de Roger Vekemans S. J.; por x.
    Doctrina, Ideologia y Política, Desal, Santiago, 1970.
  • 18
    Furei, Franco is, entrevistado por Massimo Boffa in
    Debats. nº 4, Valencia, 1982, p. 112.
  • 19
    Segue sendo sugestivo o texto de Schimitt, Cari:
    Polistische Teologie (1922), Berlim, 1979.
  • 20
    "No mundo latino nunca temos sido tão influenciados como para necessitar agora uma cura de espiritualismo cósmico. Nunca temos sido tão terrivelmente racionais que necessitemos agora de uma pedagogia do irracional, nunca tão individualistas como para ter generalizada a necessidade de uma união compensatória com o uno". Xavier Rubert in Ventos:
    Moral, Laia, Barcelona, 1985.
  • 21
    Para Argentina, ver por exemplo Palermo, Vicente: "Cultura Política, Conflicto, Democracia", in
    Ideas en las Ciências Sociales, nº4, Buenos Aires, 1985.
  • 22
    Ver as contribuições in
    Quê es realismo en Política?. Catalogos, Buenos Aires (no prelo).
  • 23
    Para um resumo sucinto ver Wellmer, Albrecht: "La dialéctica de modemidad y postmodernidad", in
    Debats, nº 14, Valência, 1985 (citação na p. 85).
  • 24
    Tocqueville, Alexis de:
    De la democratie en Amérique in
    Ouvres l/1, Paris, 160 p. 390.
  • 25
    Sennett, Richard: "Lo que Tocqueville temia", in
    Narcisismo y Cultura Moderna, Kairos, Barcelona, 1980.
  • 26
    Furet, François: op. cit., p. 115.
  • 27
    Citado por Botana, Natalio:
    La tradicion republicana, Sudamericana, Buenos Aires, 1984.
  • 28
    Recordemos a frase com que Horkheimer e Adorno iniciam seus estudos da dialética do iluminismo: "O iluminismo no sentido mais amplo de pensamento em contínuo progresso, tem perseguido sempre o objetivo de tirar o medo dos homens e de convertê-los em amos. Mas a terra inteiramente iluminada resplandece sob o signo de uma triunfal des aventura".
    Dialéctica del iluminismo, Sur, Buenos Aires, 1979, p. 15.
  • 29
    São estas dinâmicas des integradoras os que põem (dialeticamente) o tema do socialismo. Para uma teoria socialista da democracia ver agora Keane, John:
    Public Life and Lute Capitalism, Cambridge University Press, 1984.
  • 30
    Tomo o termo de Tucker, Robert: "The Theory of Charismatic Leadership"in
    Deadalus. verão 1968, p. 745. Ver também Moscovici, Serge:
    L'age des foules, Fayard, Paris, 1981. Só excepcionalmente o líder carismático conduz - como Moisés - à fundação de uma identidade nacional, pois sempre está exposto a uma crise de confiança e credtoilidade.
  • 31
    Remeto às análises de Emilio de Ipola e Juan Carlos Portantiero sobre o caso argentino.
  • 32
    Devo muito aos estudos de Benjamin Nelson:
    Der Ursprung der Moderne. Suhrkamp, Frankfurt, 1984; sobre este ponto, p. 75 ss.
  • 33
    Tierno, Enrique,
    Que és ser agnóstico?, Tecnos, Madri, 1985 (4ª ed. ).
  • 34
    Ver Pizzorno, A.: op. cit.
    Tradução: Luiz Eduardo P. Barreto Filho
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 1988
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