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Olhares e Produções de Saberes: Narrativas da Psicologia Acerca das Relações Raciais

Gaze and Knowledge Production: Psychology Narratives about Racial Relations

Mirada y Producción de Saber: Narrativas de la Psicología Sobre las Relaciones Raciales

Resumo

Este artigo realiza um percurso histórico das narrativas teóricas construídas pelas elites intelectuais brancas brasileiras sobre as relações raciais no campo psicológico, bem como os efeitos desse processo no desenvolvimento da psicologia enquanto ciência e profissão. Como a maioria de profissionais da área é branca em um país cuja maioria da população é negra, torna-se cada vez mais urgente e necessário revisitar tanto as bases da psicologia acerca das relações raciais quanto o modo como essas relações se dão no cotidiano, com vistas a construir caminhos para pensar teoria e prática comprometidas com a igualdade racial. Nesse sentido, tecem-se considerações sobre as narrativas teóricas acerca das relações raciais no campo científico brasileiro, destacando o lugar da psicologia nesse percurso. Em seguida, discutem-se as relações entre as perspectivas da realidade social e das produções de saberes nesse campo. Ainda mais especificamente no campo da psicologia, evidenciam-se os paradigmas que orientaram os estudos sobre as relações raciais na área e, por fim, aponta-se um caminho possível para a construção de uma ciência psicológica compromissada com a igualdade racial.

Palavras-chave:
Psicologia; Relações Raciais; Narrativas

Abstract

This paper presents a historical overview of the theoretical narratives constructed by white Brazilian intellectual elites about race relations within psychology and its the effects on the development of Psychology as a science and a profession. As psychology professionals are white, whereas the majority of the population is black, it is increasingly urgent and necessary to revisit the foundations of psychology on everyday life racial relations, towards a theory and practice committed to racial equality. The text presents considerations on the theoretical narratives about race relations in the Brazilian scientific field, highlighting the role played by psychology. It then discusses the relations between social reality and knowledge production in this field. Regarding psychology specifically, it highlights the paradigms that guided studies on race relations in the field and proposes a possible way to develop a psychological science committed to racial equality.

Keywords:
Psychology; Race Relations; Narratives

Resumen

Este trabajo realiza un recorrido histórico sobre las narrativas teóricas construidas por las élites intelectuales brasileñas blancas sobre las relaciones raciales en el campo de la Psicología, y los efectos de este proceso en el desarrollo de la psicología como ciencia y profesión. Como la mayoría de los profesionales en el área son blancos en un país donde la mayoría de la población es negra, es cada vez más urgente y necesario revisar los fundamentos de la psicología sobre las relaciones raciales, y cómo son estas relaciones en la vida cotidiana, para que podamos construir teoría y práctica comprometidas con la igualdad racial. Primero, se reflexionará sobre las narrativas teóricas de las relaciones raciales en este campo científico brasileño, destacando el lugar de la psicología en este camino. Luego, se discutirán las relaciones entre las perspectivas sobre la realidad social y la producción de conocimiento en este campo. Aún más específicamente en el campo de la psicología, se resaltarán los paradigmas que guiaron los estudios sobre las relaciones raciales en el área y, finalmente, se señalará un posible camino en la construcción de una ciencia psicológica comprometida con la igualdad racial.

Palabras clave:
Psicología; Relaciones raciales; Narrativas

Introdução

A partir da perspectiva de que a história é cumulativa e de que fenômenos do passado se atualizam no presente, parto da premissa de que determinadas lógicas coloniais ainda organizam, no presente, as relações sociais entre pessoas negras e brancas e seus respectivos desenvolvimentos. Com isto, quero dizer que aspectos do racismo como a estigmatização, a exclusão e a inferiorização atravessam os processos de construção identitária e subjetiva dessas pessoas e refletem-se em seus modos de autopercepção, de percepção do outro, de criar perspectivas de vida e de socializar com outras pessoas (hooks, 2019hooks, b. (2019). Mulheres negras revolucionárias: Nos transformamos em sujeitas. In T. Breda (Ed.), Olhares negros: Raça e representação (pp. 96-127). Elefante.; Schucman, 2014Schucman, L. V. (2014). Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude paulistana. Psicologia & Sociedade, 26(1), 83-94.).

Em termos desenvolvimentais, no caso das populações negras, cada vez mais se consolida a ideia de que fatores de risco para o desenvolvimento desse grupo estão relacionados a experiências de humilhação e constrangimento decorrentes de conflitos raciais: altas cargas de tensões emocionais emergem como resposta a essas situações e, consequentemente, desembocam em sintomas como taquicardia, úlcera gástrica, obesidade, ansiedade, depressão, autopercepção e percepção do mundo distorcidas, e até dificuldades de se relacionar e compartilhar afetos (Damasceno & Zanello, 2018Damasceno, M. G., & Zanello, V. M. L. (2018). Saúde mental e racismo contra negros: produção bibliográfica brasileira dos últimos quinze anos. Psicologia: Ciência e Profissão , 38(3), 450-464.; Ministério da Saúde, 2017Ministério da Saúde. (2017). Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Editora do Ministério da Saúde.; Silva, 2005Silva, M. L. (2005). Racismo e os efeitos na saúde mental. In L. E. Batista, S. Kalckmann (Orgs.). Seminário Saúde da População Negra Estado de São Paulo 2004. Instituto de Saúde.; Tavares & Kuratani, 2019Tavares, J. S. C., & Kuratani, S. M. D. A. (2019). Manejo Clínico das Repercussões do Racismo entre Mulheres que se “Tornaram Negras”. Psicologia: Ciência e Profissão, 39.; Werneck, 2016Werneck, J. (2016). Racismo institucional e saúde da população negra. Saúde e Sociedade, 25, 535-549.). Esses dados enquadram a questão do racismo como questão de saúde pública, e são, portanto, um desafio urgente para as ciências da saúde, das quais destaco a psicologia.

No caso das populações brancas, os estudos sobre a categoria da “branquitude” (Bento, 2002Bento, M. A. S. (2002). Branqueamento e branquitude no Brasil. In I. Carone & M. A. S. Bento (Orgs.), Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil (pp. 25-58). Vozes.; DiAngelo, 2018DiAngelo, R. (2018). Fragilidade branca. Revista ECO-Pós, 21(3), 35-57.) vêm discutindo sobre como o desenvolvimento desse grupo está intimamente relacionado à ideia de que a identidade branca é universal. Estas populações, ao longo da história, construíram um patrimônio de privilégios materiais e simbólicos a partir da espoliação de terras e do tráfico de pessoas no comércio de escravos a partir do século XVI, expandindo suas riquezas e compreendendo-se como o ápice da civilização (Mbembe, 2018Mbembe, A. (2018). Crítica da Razão Negra. N-1 edições.). Desse modo, mesmo atualmente, as populações brancas1 1 Cabe pontuar que, no presente trabalho, são feitas referências às populações brancas e negras em geral. Nesse sentido, não excluo as experiências individuais de cada pessoa. Como discute Schucman (2014), as experiências de vida das pessoas brancas se diferem de acordo com a tonalidade de suas peles e classe social, de forma que a autora cria as categorias do “encardido”, do “branco” e do “branquíssimo”: a primeira categoria inclui pessoas que possuem traços negroides (cabelos crespos ou nariz achatado, p. ex.); a última, aquelas cujo fenótipo aproxima-se do europeu (olhos, cabelos e peles claros); e a segunda, inclui pessoas que estão no meio termo. continuam a se desenvolver em um ambiente de privilégios e protegidas de fatores de riscos experienciados pelas populações negras em termos de discriminação racial. Consequentemente, quando expostas a experiências de tensionamentos raciais, respondem com a raiva, o isolamento, a culpa e a dissonância cognitiva (DiAngelo, 2018DiAngelo, R. (2018). Fragilidade branca. Revista ECO-Pós, 21(3), 35-57.).

Em termos acadêmicos, algumas produções relevantes foram desenvolvidas refletindo a temática das relações raciais: no exterior, Fanon (2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA.), psiquiatra martinicano, é um dos grandes expoentes no estudo dos efeitos do racismo sobre as estruturas psíquicas não apenas de pessoas negras, mas também de pessoas brancas. Ele demonstrou como as sequelas da colonização francesa conformavam a subjetividade dos povos antilhanos, e como pessoas brancas se relacionam com pessoas negras como se fossem infantis, hiperssexualizadas ou cognitivamente menos capazes. A partir de suas investigações, ele apontou caminhos possíveis para a descolonização de pessoas negras e brancas. Já no Brasil, dois estudos clássicos se destacam: o de Bicudo (1945Bicudo, V. L. (1945). Estudo de atitudes raciais de pretos e mulatos em São Paulo [Tese de Doutorado, Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, Universidade de São Paulo].), cientista social e psicanalista, que articula sociologia e psicologia social para dialogar sobre efeitos subjetivos do racismo sobre pessoas negras; e Santos (1983Santos, N. S. (1983). Tornar-se negro: as vicissitudes da identidade do negro brasileiro em ascensão social. Graal.), psiquiatra e psicanalista, sobre as vicissitudes psicológicas de pessoas negras em ascensão social.

Mesmo com grandes referências, a produção bibliográfica que articula saúde mental e racismo no Brasil, além de escassa em termos quantitativos, conta com pouca contribuição da psicologia (Damasceno & Zanello, 2018Damasceno, M. G., & Zanello, V. M. L. (2018). Saúde mental e racismo contra negros: produção bibliográfica brasileira dos últimos quinze anos. Psicologia: Ciência e Profissão , 38(3), 450-464.). Chama atenção ainda que, em análise dos estudos de uma revisão sistemática no campo da psicologia brasileira sobre preconceito racial (Sacco et al., 2016Sacco, A. M., Couto, M. C. P. de P., & Koller, S. H. (2016). Revisão sistemática de estudos da psicologia brasileira sobre preconceito racial. Temas em Psicologia, 24(1), 233-250.), poucas produções refletem sobre as lógicas que organizam as relações raciais, seus possíveis impactos na saúde e no desenvolvimento, e sobre o desenvolvimento identitário de pessoas brancas.

Nesse sentido, sendo a saúde e o desenvolvimento humano objetos de estudo da psicologia, é enriquecedor para a área compreender essas temáticas específicas articuladas às reflexões sobre as relações raciais. Contudo, no campo da psicologia, há ainda uma baixa articulação desses temas na área das relações raciais, aspecto que é percebido, inclusive, na própria formação universitária, na qual estudantes relatam que, durante sua graduação de psicologia, as reflexões sobre as questões étnico-raciais ou estão submetidas ao interesse e à sensibilidade de algumas/uns docentes, ou vinculadas a discussões sobre as políticas de cotas (Castelar & Santos, 2012Castelar, M., & Santos, C. C. de O. (2012). Relações raciais no ensino de psicologia: Uma experiência de sensibilização. Psicologia, Diversidade e Saúde, 1(1).; Khouri & Castelar, 2016Khouri, J. G. R., & Castelar, M. (2016). Percepções de Estudantes sobre o Debate das Relações Raciais na Formação em Psicologia. Psicologia Ensino & Formação, 7(2), 53-62.; Santos & Schucman, 2015Santos, A. D. O. D., & Schucman, L. V. (2015). Desigualdade, relações raciais e a formação de psicólogo(as). Revista EPOS, 6(2), 117-140.). Diante disso, surge a questão: o que aconteceu no percurso do desenvolvimento da psicologia enquanto ciência e profissão no Brasil para que houvesse essa limitação atual?

Considerando a importância da articulação dos temas de saúde mental e desenvolvimento com as questões étnico-raciais e as ciências psicológicas, o interesse deste artigo é compreender, de forma crítica, as abordagens sobre as relações raciais brasileiras no campo psicológico entre o final do século XIX e o século XXI, destacando aspectos que podem ter contribuído para a limitação dessa articulação. Pessoas brancas, em lugar de hegemonia, por muito tempo foram as únicas autorizadas a produzir conhecimentos válidos sobre o mundo e, mesmo após a instituição da república, são as que detêm poder e domínio sobre os meios de divulgação tradicional de informações. Desse modo, ao longo do texto serão discutidas as relações entre perspectivas sobre a realidade social e produções de saberes nesse campo.

Este ensaio teórico é composto por estudos acerca das questões étnico-raciais e das ciências psicológicas, especialmente a psicologia, para entendermos como as temáticas de saúde mental e desenvolvimento, em termos de relações raciais, foram e têm sido estudadas por esse campo científico no Brasil. Para tanto, parte-se do final do século XIX, destacando o uso da noção de raça nos discursos científicos e as disputas narrativas em torno do termo. Posteriormente, segue-se para reflexões a respeito do lugar da psicologia no debate sobre as relações raciais no Brasil, e em seguida, discute-se como estão atreladas perspectivas sobre a realidade e produção de saber científico.

Em seguida, apontam-se algumas mudanças nos paradigmas de estudos sobre as relações raciais no campo da psicologia, cujos marcos foram as décadas de 1940 e 1950 e a década de 1990. Essa última mudança compreende principalmente a “transferência do olhar das margens para o centro” (Santos et al., 2012Santos, A. D. O. D., Schucman, L. V., & Martins, H. V. (2012). Breve histórico do pensamento psicológico brasileiro sobre relações étnico-raciais. Psicologia: Ciência e Profissão , 32, 166-175.), ou seja, do olhar sobre os sujeitos considerados racializados, como negros e indígenas, para os brancos, que também passam a ser racializados. Por fim, foram apresentados alguns caminhos referentes ao desenvolvimento de saberes compromissados com a igualdade racial.

Orientado pela perspectiva epistemológica do feminismo negro (Collins, 2018Collins, P. H. (2018). Epistemologia feminista negra. In J. Bernadino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (pp. 139-170). Autêntica.), este estudo, como qualquer outro, é também uma perspectiva da realidade. Neste posicionamento, compreendo que toda pesquisa parte de um lugar social e, por isso, está imbuída de valores. Collins (2018)Collins, P. H. (2018). Epistemologia feminista negra. In J. Bernadino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (pp. 139-170). Autêntica. aponta que a escolha epistemológica que fazemos para produzir conhecimento irá conduzir a escolha das questões de pesquisa, as interpretações feitas na análise dessa produção e a finalidade da produção desses conhecimentos.

Como aponta Cannone (2019), a epistemologia feminista está além da defesa dos direitos das mulheres, mas diz respeito, de forma ampla, ao próprio campo de produção de saberes e concepções sobre o mundo. Nesse sentido, integra os posicionamentos políticos, científicos e intelectuais. Assim, essa epistemologia busca desenvolver saberes comprometidos com populações historicamente vulnerabilizadas.

Algumas das produções que orientam este trabalho estão situadas no campo das teorias raciais na psicologia e na psiquiatria (Masiero, 2002Masiero, A. L. (2002). “Psicologia das raças” e religiosidade no Brasil: uma intersecção histórica. Psicologia: Ciência e Profissão , 22(1), 66-79.; 2005; Santos et al., 2012Santos, A. D. O. D., Schucman, L. V., & Martins, H. V. (2012). Breve histórico do pensamento psicológico brasileiro sobre relações étnico-raciais. Psicologia: Ciência e Profissão , 32, 166-175.); psicologia e formação em relações raciais (Castelar & Santos, 2012Castelar, M., & Santos, C. C. de O. (2012). Relações raciais no ensino de psicologia: Uma experiência de sensibilização. Psicologia, Diversidade e Saúde, 1(1).; Khouri, 2019Khouri, J. G. R. (2019). Formando psicólogas/os para as relações raciais: avanços e contradições nos cursos de Psicologia da Bahia. [Dissertação de Mestrado, Universidade Católica de São Paulo].; Khouri & Castelar, 2016Khouri, J. G. R., & Castelar, M. (2016). Percepções de Estudantes sobre o Debate das Relações Raciais na Formação em Psicologia. Psicologia Ensino & Formação, 7(2), 53-62.; Santos & Schucman, 2015Santos, A. D. O. D., & Schucman, L. V. (2015). Desigualdade, relações raciais e a formação de psicólogo(as). Revista EPOS, 6(2), 117-140.; Tavares et al., 2013Tavares, N. O., Oliveira, L. V., & Lages, S. R. C. (2013). A percepção dos psicólogos sobre o racismo institucional na saúde pública. Saúde em Debate, 37, 580-587.; Veiga, 2019Veiga, L. M. (2019). Descolonizando a psicologia: Notas para uma Psicologia Preta. Fractal: Revista de Psicologia, 31, 244-248.); e saúde mental da população negra (Damasceno & Zanello, 2018Damasceno, M. G., & Zanello, V. M. L. (2018). Saúde mental e racismo contra negros: produção bibliográfica brasileira dos últimos quinze anos. Psicologia: Ciência e Profissão , 38(3), 450-464.; Silva, 2005Silva, M. L. (2005). Racismo e os efeitos na saúde mental. In L. E. Batista, S. Kalckmann (Orgs.). Seminário Saúde da População Negra Estado de São Paulo 2004. Instituto de Saúde.; Tavares & Kuratani, 2019Tavares, J. S. C., & Kuratani, S. M. D. A. (2019). Manejo Clínico das Repercussões do Racismo entre Mulheres que se “Tornaram Negras”. Psicologia: Ciência e Profissão, 39.; Werneck, 2016Werneck, J. (2016). Racismo institucional e saúde da população negra. Saúde e Sociedade, 25, 535-549.).

“Raça” e “relações raciais” no contexto científico brasileiro

Inicialmente, o termo raça era utilizado pelas ciências biológicas para classificar plantas e animais (Munanga, 2003Munanga, K. (2003). Uma abordagem conceitual das noções de raça, racismo, identidade e etnia. [Palestra] 3º Seminário Nacional sobre Relações Raciais e Educação -PENESB-RJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.). Mais especificamente no século XVI, quando países europeus praticavam expansão mercantilista e colonização de terras e povos, a raça tornou-se também ferramenta de classificação de seres humanos, justificando, inclusive, a escravização (Almeida, 2018Almeida, S. (2018). O que é racismo estrutural? Letramento.; Munanga, 2003Munanga, K. (2003). Uma abordagem conceitual das noções de raça, racismo, identidade e etnia. [Palestra] 3º Seminário Nacional sobre Relações Raciais e Educação -PENESB-RJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.). Dois séculos depois, no século XVIII, o projeto iluminista estava a todo vapor e tinha como objeto de contemplação filosófica os seres humanos; nesse momento, os instrumentos de comparação e classificação dos diversos grupos populacionais ganham mais refinamento, e as noções de povos civilizados e selvagens são concebidas (Almeida, 2018Almeida, S. (2018). O que é racismo estrutural? Letramento.).

No século XIX, cientistas começaram a demandar métodos de conhecimentos científicos e práticos para os objetos sociais, nos quais se incluía o ser humano (Laville & Dione, 1999Laville, C., & Dione, J. (1999). O nascimento do saber científico. In C. Laville & J. Dione (Eds.), A construção do saber: Manual de metodologia da pesquisa em ciências sociais (pp. 17-47). Artes Médicas. ). Nesse cenário, as ciências humanas começam a ser desenvolvidas, e uma das necessidades do campo era compreender as diferenças entre os povos. Muitas das postulações construídas para explicar essas diferenças tinham caráter determinista, tanto geográfico quanto biológico: grupos humanos nascidos em países tropicais e de pele escura teriam tendências para comportamentos imorais, violentos e pouco intelectuais; já aqueles nascidos no hemisfério norte e de pele clara teriam tendências para a moralidade e a intelectualidade.

A teoria da eugenia, por exemplo, foi proposta pelo naturalista e fundador da psicologia diferencial Francis Galton em 1888. Ele abertamente defendia a existência de raças humanas inferiores e superiores devida a fatores genéticos, e sua perspectiva embasou teorias de autores brasileiros como os médicos Edmur de Aguiar Whitaker2 2 O médico Edmur de Aguiar Whitaker propôs um exame psicológico cujo laudo psiquiátrico deveria incluir modos de comportamento religioso e político, e interesses estéticos e científicos. Segundo o autor, esses aspectos diriam respeito a disposições psicológicas que configurariam comportamentos comunistas, antireligiosos, supersticiosos, revolucionários, etc. (Masiero, 2002). , Raimundo Nina Rodrigues, e Arthur Ramos (Masiero, 2002Masiero, A. L. (2002). “Psicologia das raças” e religiosidade no Brasil: uma intersecção histórica. Psicologia: Ciência e Profissão , 22(1), 66-79.). No mesmo ano acontecia no Brasil a abolição da escravidão, que, mesmo conferindo liberdade institucional às populações negras, as manteve em um status de sub-humanidade, passando de “...um modo de vida a outro, mas não de uma vida a outra” (Fanon, 2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA., p. 183).

Com a instituição da República no ano seguinte, o desafio de modernização do país se intensificava. Em detrimento da tese do distanciamento entre os povos, devida a uma história secular de racismo, a tese de desigualdades naturais entre as raças patologizava as populações negras e tratava suas questões de saúde - alcoolismo, transtornos mentais, infecções sexualmente transmissíveis - como consequências naturais de sua negritude (Masiero, 2005Masiero, A. L. (2005). A Psicologia racial no Brasil (1918-1929). Estudos de Psicologia (Natal) , 10(2), 199-206.). Por meio desse raciocínio, essas pessoas seriam naturalmente degeneradas devido à cor negra.

Nessa perspectiva, as ciências psicológicas brasileiras proveram amplas contribuições para a sustentação desses paradigmas e Masiero (2005Masiero, A. L. (2005). A Psicologia racial no Brasil (1918-1929). Estudos de Psicologia (Natal) , 10(2), 199-206.) aponta alguns marcos de interseção entre a psicologia e as teorias raciais racistas no final da década de 1910, institucionalizadas por meio da Sociedade Eugênica de São Paulo (SESP). A busca por pureza racial, ou seja, pela brancura, era sinônimo de desenvolvimento nacional; nessa perspectiva, as ciências psicológicas tinham responsabilidade de educar a população para que “raças superiores” não procriassem com “raças inferiores”. As raças inferiores eram marcadas por características e comportamentos (negritude, alcoolismo, expressão sexual, transtornos mentais, tendência a criminalidade e a pobreza) que deveriam ser extintos em detrimento de preceitos morais rígidos. Nessa época, a miscigenação era condenada e devia ser evitada em prol do progresso nacional.

A psicologia nos debates raciais brasileiros

O 1º Congresso Brasileiro de Eugenia aconteceu em 1929, na cidade do Rio de Janeiro, e contou com a ampla presença de antropólogos, psiquiatras e psicólogos. O evento teve como produto a ser entregue ao poder público uma série de recomendações referentes a imigração de estrangeiros para consolidar o projeto de branqueamento do Brasil, dentre elas, “a exclusão de todas as correntes imigratórias que não sejam da raça branca” (Amaral, 1929Amaral, A. J. A. (1929). O problema eugênico da imigração. [Apresentação de trabalho] 1º Congresso Brasileiro de Eugenia. Atas e Trabalhos. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil., p. 340).

A suposta melhoria racial demandava às ciências psicológicas o desenvolvimento de instrumentos para selecionar imigrantes desejáveis a partir da aplicação de testes mentais diretos ou observações de aptidões profissionais (Masiero, 2005Masiero, A. L. (2005). A Psicologia racial no Brasil (1918-1929). Estudos de Psicologia (Natal) , 10(2), 199-206.). Buscavam-se pessoas que não tendessem a comportamentos sexuais degenerados, que estivessem livres de doenças mentais e que tendessem ao trabalho honesto, contribuindo assim para a formação de um estado nacional coeso. Nesse sentido, as populações negras teriam seus status políticos e sua integração à sociedade restringidos, e a expectativa era de que, gradativamente, o Brasil branquear-se-ia e o problema da questão racial, em algumas décadas, desapareceria.

Hasenbalg (1982Hasenbalg, C. A. (1982). Raça, classe e mobilidade. In C. A Hasenbalg & L. Gonzalez (Eds), Lugar de Negro (pp. 57-102).) discute que é justamente nessa época que o racismo, como dimensão social estruturante, é invisibilizado nas produções intelectuais em função da discriminação de classe. Isso leva à suposição de que esse pode ser um aspecto que contribuiu para que, como afirmam Tavares e Kuratani (2019Tavares, J. S. C., & Kuratani, S. M. D. A. (2019). Manejo Clínico das Repercussões do Racismo entre Mulheres que se “Tornaram Negras”. Psicologia: Ciência e Profissão, 39.), as produções científicas sobre relações étnico-raciais e saúde mental na psicologia ainda sejam reduzidas.

As autoras realizaram uma busca entre os anos de 2000 e 2016 sobre o tema, e encontraram apenas três artigos nacionais que abordavam as especificidades do racismo sobre a saúde mental da população negra (Alves et al., 2015Alves, M. C., Jesus, J. P. D., & Scholz, D. (2015). Paradigma da afrocentricidade e uma nova concepção de humanidade em saúde coletiva: reflexões sobre a relação entre saúde mental e racismo. Saúde em Debate, 39, 869-880. ; Faro & Pereira, 2011Faro, A., & Pereira, M. E. (2011). Raça, racismo e saúde: a desigualdade social da distribuição do estresse. Estudos de Psicologia (Natal), 16(3), 271-278.; Guimarães & Podkameni, 2008Guimarães, M. A. C., & Podkameni, A. B. (2008). A rede de sustentação coletiva, espaço potencial e resgate identitário: projeto mãe-criadeira. Saúde e sociedade, 17(1), 117-130.). As autoras afirmam ainda que a maioria das produções como essas estão alocadas na vertente da Psicologia Social, resultado esse também observado por Sacco e colegas (2016Sacco, A. M., Couto, M. C. P. de P., & Koller, S. H. (2016). Revisão sistemática de estudos da psicologia brasileira sobre preconceito racial. Temas em Psicologia, 24(1), 233-250.). Essa situação pode ser compreendida pelo fato de que foram algumas/uns psicólogas/os sociais que deram início a narrativas críticas sobre as relações étnico-raciais no Brasil3 3 Essa perspectiva será mais aprofundada na seção “Paradigmas dos estudos sobre as relações raciais na psicologia”. . Então, como entender essa articulação limitada na área da psicologia como um todo?

Para construir caminhos nessa reflexão, são pertinentes as considerações de DiAngelo (2018DiAngelo, R. (2018). Fragilidade branca. Revista ECO-Pós, 21(3), 35-57.), Schucman (2014Schucman, L. V. (2014). Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude paulistana. Psicologia & Sociedade, 26(1), 83-94.) e Werneck (2016Werneck, J. (2016). Racismo institucional e saúde da população negra. Saúde e Sociedade, 25, 535-549.). Em seu estudo sobre “fragilidade branca”, DiAngelo (2018)DiAngelo, R. (2018). Fragilidade branca. Revista ECO-Pós, 21(3), 35-57. considera que pessoas brancas estão constantemente protegidas das tensões e estresses relacionados às questões raciais. Assim como Schucman (2014)Schucman, L. V. (2014). Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude paulistana. Psicologia & Sociedade, 26(1), 83-94. aponta que estes sujeitos são socializados como padrão de humanidade: são essas populações que ocupam os lugares de poder econômico, cultural e estético, situação reforçada pela mídia de massa quando o protagonismo de filmes, novelas e séries é ocupado por essas pessoas. Portanto, as referências de humanização e socialização de largo alcance são brancas. A existência desse ambiente protegido se configura como privilégio racial, e dificulta o desenvolvimento de competência cultural do grupo branco para discutir a temática das relações raciais e do racismo, seus papéis na manutenção dessa estrutura social e a própria lida com experiências de tensionamentos raciais (DiAngelo, 2018DiAngelo, R. (2018). Fragilidade branca. Revista ECO-Pós, 21(3), 35-57.).

Como a grande maioria de profissionais da psicologia é de pessoas brancas, cabe também destacar o trabalho de Schucman (2014Schucman, L. V. (2014). Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude paulistana. Psicologia & Sociedade, 26(1), 83-94.): a autora buscou compreender como cidadãs/ões brancas/os paulistanas/os se apropriam do significado de raça, e observou em seus discursos a verbalização de uma hierarquização estética entre os grupos raciais, que mais se aproximam da beleza quanto mais possuem traços brancos; reconhecimento dos privilégios que essa hierarquização lhes confere (maior trânsito entre os grupos sociais; autoestima preservada; maior possibilidade de estar em relação; reconhecimento de maior representação de pessoas brancas/os em espaço de poder); e afirmação de que atitudes morais e intelectuais superiores se devem a algo intrínseco à cultura europeia.

Socializadas/os nesse esquema de pensamento e relação, profissionais brancas/os da psicologia tendem a não desenvolver uma percepção crítica sobre as relações possíveis entre as dinâmicas das relações raciais e o desenvolvimento subjetivo das pessoas, reproduzindo, desse modo, a lógica da democracia racial (Schucman, 2014Schucman, L. V. (2014). Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude paulistana. Psicologia & Sociedade, 26(1), 83-94.; Tavares & Kuratani, 2019Tavares, J. S. C., & Kuratani, S. M. D. A. (2019). Manejo Clínico das Repercussões do Racismo entre Mulheres que se “Tornaram Negras”. Psicologia: Ciência e Profissão, 39.; Tavares et al., 2013Tavares, N. O., Oliveira, L. V., & Lages, S. R. C. (2013). A percepção dos psicólogos sobre o racismo institucional na saúde pública. Saúde em Debate, 37, 580-587.;). Em perspectiva semelhante, Werneck (2016Werneck, J. (2016). Racismo institucional e saúde da população negra. Saúde e Sociedade, 25, 535-549.) postula algumas hipóteses sobre a baixa produção desse fenômeno no contexto brasileiro:

(...) não há como saber [com exatidão] as razões do baixo índice de publicações sobre o tema: se por desinteresse, falta de estímulos ou existência de restrições explícitas nas instituições de pesquisa; se devido a barreiras interpostas pelos conselhos editoriais dos diferentes periódicos; ou, ainda, se devido a combinações entre os variados elementos. Tais ausências ou insuficiências podem indicar a não consolidação da saúde da população negra e da saúde da mulher negra como campos temáticos e de pesquisa, relacionada ao baixo grau de penetração nas instituições de pesquisa dos debates sobre o racismo, seus impactos na saúde e suas formas de enfrentamento (Werneck, 2016Werneck, J. (2016). Racismo institucional e saúde da população negra. Saúde e Sociedade, 25, 535-549., p. 536).

Perspectivas de mundo e produção de saber

Fanon (2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA.) argumenta que a colonização, além de dominar e subordinar as pessoas na vida concreta - por meio da destituição de terra, negação à propriedade e imigrações forçadas - está evidente também nos métodos utilizados pelas ciências para construir o conhecimento. Esse modo de produzir saber, por sua vez, configura o colonialismo epistemológico. Collins (2018Collins, P. H. (2018). Epistemologia feminista negra. In J. Bernadino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (pp. 139-170). Autêntica.) ilustra essa discussão ao trazer as disputas em que mulheres negras, historicamente alijadas do espaço acadêmico, têm que entrar para terem suas produções científicas legitimadas nas universidades. A autora fala mais especificamente da epistemologia feminista negra, um pensamento especializado que reflete temas da vida de suas criadoras, mulheres afro-americanas.

Essa perspectiva epistemológica é fundamentada por bases experienciais e materiais que se consolidam a partir das singularidades das histórias dessas mulheres, de forma que suas experiências são mobilizadas a fim de sistematizar temas de investigação e metodologias. O uso do diálogo, que tem raízes nas tradições orais africanas, é uma ferramenta metodológica importante na epistemologia feminista negra, e para aquela/e que pesquisa, Collins (2018Collins, P. H. (2018). Epistemologia feminista negra. In J. Bernadino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (pp. 139-170). Autêntica.) descreve as chamadas éticas do cuidado e da responsabilidade pessoal, dimensões propostas nessa abordagem. Nesse sentido, a epistemologia feminista negra afirma o lugar das mulheres negras como agentes do conhecimento, criando assim outra concepção identitária sobre esse grupo.

Ao adentrarem a academia, espaço historicamente reservado para os homens brancos das elites econômicas, com essa perspectiva, frequentemente essas intelectuais têm suas formas de conhecimento invalidadas como científicas, já que o modo de fazer científico legítimo nesses ambientes é o positivista (Collins, 2018Collins, P. H. (2018). Epistemologia feminista negra. In J. Bernadino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (pp. 139-170). Autêntica.). Essa perspectiva pressupõe que os fatos humanos são como fatos da natureza, e para se determinar suas causas, são submetidos à experimentação e, em seguida, se tecem explicações generalizáveis (Laville & Dione, 1999Laville, C., & Dione, J. (1999). O nascimento do saber científico. In C. Laville & J. Dione (Eds.), A construção do saber: Manual de metodologia da pesquisa em ciências sociais (pp. 17-47). Artes Médicas. ). Collins (2018)Collins, P. H. (2018). Epistemologia feminista negra. In J. Bernadino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (pp. 139-170). Autêntica. demonstra as diferenças com as quais a realidade pode ser interpretada de acordo com o lugar social e racial que um/uma cientista ocupa:

Enquanto as mulheres negras [cientistas sociais] enfatizam sua luta contra a discriminação no mercado de trabalho, pensões alimentícias insuficientes, moradias precárias e violência urbana, demasiadas pesquisas em ciências sociais parecem hipnotizadas por imagens de “mulheres preguiçosas que dependem da ajuda do governo” (Collins, 2018Collins, P. H. (2018). Epistemologia feminista negra. In J. Bernadino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (pp. 139-170). Autêntica., p. 145).

Essa breve digressão teve o intuito de ilustrar como a produção de saber está atrelada às perspectivas de mundo adotadas pelas pessoas. No Brasil, não é diferente: diante do exposto, é possível percebermos intersecções presentes entre a mentalidade racista e colonial da elite branca brasileira e o desenvolvimento das ciências psicológicas por essas pessoas. A título de ratificação, estas contribuíram tanto no campo teórico quanto no prático para a consolidação de uma essencialização negativa do povo negro e, em contrapartida, uma essencialização positiva dos povos brancos; invisibilização das produções intelectuais e estéticas do povo negro; descaso com a saúde pública; e, posteriormente, um projeto de branqueamento do povo brasileiro.

Masiero (2002Masiero, A. L. (2002). “Psicologia das raças” e religiosidade no Brasil: uma intersecção histórica. Psicologia: Ciência e Profissão , 22(1), 66-79.) relata que as religiões de matriz africana, por exemplo, foram intensamente perseguidas por psiquiatras e psicólogos. Profissionais da psicologia, durante o século XX, através da psicometria, realizavam estudos em terreiros com babalorixás e médiuns (em sua maioria, afrodescendentes) a fim de justificar o baixo valor mental da/o negro/a e evitar “epidemias mentais de caráter religioso”. Arthur Ramos, médico alagoano discípulo de Nina Rodrigues e autor de trabalhos na área da psicologia social, afirmou que a partir do profundo conhecimento sobre ritos e rituais africanos seria possível corrigi-los de acordo com o “caminho natural da evolução”, ainda que eles não pudessem alcançar a superioridade do status das religiões brancas por sua “inferioridade natural” (Masiero, 2002Masiero, A. L. (2002). “Psicologia das raças” e religiosidade no Brasil: uma intersecção histórica. Psicologia: Ciência e Profissão , 22(1), 66-79.). Essa política de vigilância religiosa contou com a participação da psicologia nos empreendimentos de controle e higienização racial, matrizes da política de branqueamento.

O que podemos observar, portanto, é que a psicologia possuiu, também, um papel relevante na produção de saber não apenas sobre a/o negra/o, mas também sobre a/o branca/o, ao se valer de métodos de observação e aplicação de testes psicológicos para objetificar pessoas das supostas raças inferiores, produzir discursos sobre subjetividades desejáveis e não desejáveis, além de subsidiar e difundir determinadas visões de mundo sobre os grupos raciais. Atualmente, temos como desdobramento desse passado sombrio o silenciamento das questões étnico-raciais tanto na formação quanto em atuações profissionais (Benedito, 2018Benedito, M. D. S. (2018). A relação entre psicologia e racismo: As heranças da clínica psicológica. [Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo].; Khouri & Castelar, 2016Khouri, J. G. R., & Castelar, M. (2016). Percepções de Estudantes sobre o Debate das Relações Raciais na Formação em Psicologia. Psicologia Ensino & Formação, 7(2), 53-62.; Santos & Schucman, 2015Santos, A. D. O. D., & Schucman, L. V. (2015). Desigualdade, relações raciais e a formação de psicólogo(as). Revista EPOS, 6(2), 117-140.; Tavares et al, 2013Tavares, N. O., Oliveira, L. V., & Lages, S. R. C. (2013). A percepção dos psicólogos sobre o racismo institucional na saúde pública. Saúde em Debate, 37, 580-587.).

Esse silenciamento, por sua vez, tem consequências perigosas na prática profissional. Pesquisas da presente década demonstram a ignorância de psicólogas/os sobre os impactos do racismo sobre a saúde mental da população negra; e alguns dos efeitos dessa ausência no acompanhamento psicológico é a insatisfação da/o cliente com o serviço prestado, e o não se sentir compreendido/a (Benedito, 2018Benedito, M. D. S. (2018). A relação entre psicologia e racismo: As heranças da clínica psicológica. [Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo].; Meyer & Zane, 2013; Schucman, 2014Schucman, L. V. (2014). Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude paulistana. Psicologia & Sociedade, 26(1), 83-94.; Tavares et al., 2013Tavares, N. O., Oliveira, L. V., & Lages, S. R. C. (2013). A percepção dos psicólogos sobre o racismo institucional na saúde pública. Saúde em Debate, 37, 580-587.). Essa naturalização pode estar ressoando em como essas/es clientes serão escutadas/os e como as especificidades de seu sofrimento serão (ou não) cuidadas.

Enfim, compreendendo que ainda atualmente muitas/os psicólogas/os têm dificuldade de perceber as problemáticas específicas que o racismo produz nas populações negras, parece que as/os profissionais das ciências psicológicas, em geral, continuam coladas/os à ideia hegemônica de que todos os grupos racializados têm, cotidianamente, as mesmas condições de desenvolvimento subjetivo. Nesse sentido, são necessários mais estudos empíricos com profissionais para investigar esse fenômeno. Aqui, assumo a hipótese de que a ausência da percepção sobre o racismo como estruturante subjetivo na prática profissional está intimamente relacionado ao fenômeno da branquitude, pois reconhecer os privilégios de ser branca/o cria, para estas pessoas, o dilema de abrir mão deles ou mantê-los, gerando conflito psíquico (DiAngelo, 2018DiAngelo, R. (2018). Fragilidade branca. Revista ECO-Pós, 21(3), 35-57.).

Paradigmas dos estudos sobre relações raciais na psicologia

De acordo com Santos e colegas (2012Santos, A. D. O. D., Schucman, L. V., & Martins, H. V. (2012). Breve histórico do pensamento psicológico brasileiro sobre relações étnico-raciais. Psicologia: Ciência e Profissão , 32, 166-175.), em meados da década de 1940 e mais intensamente a partir da década de 1950, intelectuais como Virgínia Leone Bicudo, Aniela Ginsberg e Dante Moreira Leite dão início a uma série de publicações, especialmente no âmbito da Psicologia Social, com uma vertente mais crítica sobre as relações étnico-raciais no Brasil. Ao contrário das postulações científicas biológico-causais das décadas passadas, essas autoras e autor evidenciaram a importância dos fatores ambientais no entendimento de processos subjetivos das populações: Virgínia Bicudo (1945)Bicudo, V. L. (1945). Estudo de atitudes raciais de pretos e mulatos em São Paulo [Tese de Doutorado, Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, Universidade de São Paulo]., em sua dissertação de mestrado intitulada Estudo de Atitudes Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo, apresentou que a rejeição ao sujeito negro por causa de sua cor acontecia e o levava a empreender excessivos esforços para superar o sentimento de inferioridade; Aniela Ginsberg, em seu estudo Psicologia Diferencial, demonstrou, a partir da comparação entre diferentes povos, que as diferenças entre as populações se devem mais a fatores do ambiente (condições de renda e escolaridade, por exemplo) do que raciais; Dante Moreira Leite, em seu estudo Preconceito Racial e Patriotismo em Seis Livros Didáticos denunciou que não há fundamento científico no preconceito racial, apresentando processos que fomentam o preconceito, ou seja, uma percepção distorcida do outro.

A partir de 1990, os estudos psicológicos no campo das relações raciais ganham novo fôlego: nas figuras de Jurandir Freire Costa, Iray Calrone, Maria Aparecida Bento e Edith Piza são inaugurados os estudos sobre branqueamento e branquitude no Brasil (Santos et al., 2012Santos, A. D. O. D., Schucman, L. V., & Martins, H. V. (2012). Breve histórico do pensamento psicológico brasileiro sobre relações étnico-raciais. Psicologia: Ciência e Profissão , 32, 166-175.). Nessa outra abordagem das relações raciais, o olhar sobre a construção das identidades raciais foi deslocado dos “outros racializados” (pretos, pardos, indígenas) para o centro de onde a noção de raça foi construída: as populações brancas. Maria Aparecida Bento, por exemplo, é uma das autoras que questiona como os processos de dominação racial dos períodos de escravidão, abolição e república afetam não só as populações negras e indígenas, mas também as brancas, de formas distintas.

Os resultados desses estudos da Psicologia Social demonstram que os modos como as características fenotípicas das pessoas no Brasil são percebidas e autopercebidas, além de refletirem na construção de possibilidades materiais de vida, refletem em como vemos a nós mesmos e a outras pessoas em termos beleza, valores, e inteligência; em como damos ou recebemos afetos de amor, admiração, validação e cuidado; se nos vemos como mais ou menos capazes de perceber e utilizar recursos disponíveis dos ambientes, etc. Portanto, as reflexões que articulam raça e desenvolvimento humano não ficam restritas a determinado grupo populacional: elas são desenvolvidas, sobretudo, a partir da compreensão de que o desenvolvimento das pessoas no Brasil tem como uma de suas matrizes as relações raciais.

Uma vez que a relação é um dos instrumentos mais importantes da prática profissional da/o psicóloga/o, não é também importante que esta/e reflita sobre como ela/e se relaciona com a sua alteridade?

Rumo a uma psicologia compromissada com a igualdade racial

Fanon (2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA.) postula que racismo e colonialismo são formas de ver e viver no mundo. Para o psiquiatra martinicano, investigar como essas formas de ver, viver e se relacionar aparecem no cotidiano exige uma análise da linguagem hegemônica: como a existência de algumas pessoas é legitimada por essa e nessa linguagem; como a existência de outras pessoas é deslegitimada por essa e nessa mesma linguagem; e como essas pessoas se relacionam umas com as outras. Como foi abordado anteriormente neste artigo, a linguagem hegemônica que rege as relações ainda é uma linguagem de dominação e de controle, resquício do passado colonial institucionalizado pelas elites brancas ao redor do mundo.

Coulon (1987Coulon, A (1987). Etnometodologia. Vozes.), apoiado na corrente sociológica da etnometodologia de Harold Garfinkel, explica que o aprendizado da linguagem de uma instituição ou grupo está intimamente relacionado à afiliação das pessoas a determinados grupos sociais. Nesse sentido, se existimos, nos relacionamos e desenvolvemos nossas práticas profissionais orientadas/os pela lógica colonial anteriormente discutida, estamos fadadas/os a continuar reproduzindo o racismo na psicologia. “Um homem que possui a linguagem possui, em contrapartida, o mundo que essa linguagem expressa e que lhe é implícito” (Fanon, 2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA., p. 34).

Cada conformação social tem uma linguagem institucional específica, de forma que, para tornar-se membro de toda e qualquer organização, as pessoas precisam aprender regras, códigos e práticas cotidianas (Coulon, 1987Coulon, A (1987). Etnometodologia. Vozes.). O conceito de accountability, para Garfinkel, indica que essas regras, códigos, e práticas cotidianas, por sua vez, são reflexivas e racionais (Coulon, 1987Coulon, A (1987). Etnometodologia. Vozes.). Isso quer dizer que elas podem ser descritas, relatadas, analisadas e avaliadas. Assim, para a etnometodologia, o que importa nos relatos das pessoas são as descrições e significados construídos por elas tanto para darem sentido a suas ações, quanto para realizá-las (Coulon, 1987Coulon, A (1987). Etnometodologia. Vozes.). Esse procedimento permite pôr em evidência como as pessoas procedem, interpretam, e também inventam a realidade social, ao mesmo tempo em que abre margem para que esses mesmos sujeitos possam refletir sobre suas práticas em sociedade.

Nesse sentido, é preciso interpelar o que é aparentemente óbvio, e essa possibilidade de descrever e simultaneamente constituir o quadro social corresponde justamente à propriedade reflexiva de práticas cotidianas aparentemente óbvias (Coulon, 1987Coulon, A (1987). Etnometodologia. Vozes.). Portanto, sugere-se no presente trabalho que, assim como na prática etnometodológica, as/os profissionais da psicologia descrevam, relatem, analisem e avaliem quais são os códigos, regras e práticas que constituem tanto o pensamento psicológico sobre as relações étnico-raciais em suas práticas profissionais quanto em suas próprias vidas cotidianas - isto é, seus olhares sobre as pessoas para as quais prestam serviço e o modo pelo qual se relacionam com essas pessoas.

A partir disso, é preciso então tomar posição diante desse modus operandi colonial. Em termos de realidade concreta e cotidiana, por exemplo, Fanon (2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA.) critica as formas como pessoas brancas dirigem-se a pessoas negras, p. ex., infantilizando-as, a fim de, supostamente, “deixá-las à vontade” ou “dar-lhes segurança”.

‘- Bom dia, meu querido! Dói aqui? Hem? Deixe ver um pouco? A barriguinha? O coração...’ - com aquele sotaque que os espertinhos dos consultórios conhecem bem. Fica-se de consciência tranquila quando a resposta vem no mesmo tom: “está vendo, não é pilhéria. Eles são assim mesmo”. No caso contrário, é necessário lembrar dos próprios pseudópodos e se comportar como homem. Aí toda a construção desaba. Um negro que diz: “Senhor, não sou de modo algum seu querido” - é incomum. (Fanon, 2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA., p. 46).

O autor se refere, ainda mais especificamente, a essa forma de tratamento nos próprios consultórios médicos. À primeira vista, pode não fazer sentido devido às diferenças culturais entre França e Brasil; contudo, o que se destaca nesse exemplo é a forma cotidiana de tratamento informal e infantil dirigida a pessoas negras, ao passo que não nos dirigimos a pessoas brancas de tais modos. Fazer frente a essa prática naturalizada, cuja consequência é o aprisionamento da pessoa negra a um lugar de incapacidade, seria dirigir-se a ela não como uma infante, mas, de fato, como uma semelhante. Em outras palavras, seria recusar qualquer postura paternalista (Fanon, 2008Fanon, F. (2008). Pele negra, máscaras brancas. SciELO-EDUFBA.).

É preciso que façamos, tal qual na filosofia Sankofa, um resgate da história e das narrativas para observarmos o presente e construirmos um futuro pautado na igualdade racial. Nós vivemos em um país cuja maioria da população é negra; portanto, é um compromisso ético nos questionarmos sobre os limites de cuidar da saúde dessa população quando não compreendemos que muitas de suas questões subjetivas e objetivas podem estar permeadas pelo racismo. Por isso, afirmo aqui a necessidade de psicólogas/os se haverem com as afetações psíquicas das relações raciais também sobre si mesmas/os.

Como caminho rumo a uma psicologia comprometida com a saúde e o desenvolvimento humano, as pesquisas e práticas em psicologia devem estar assentadas sobre um olhar crítico acerca das relações raciais. Patto (2010Patto, M. H. S. (2010). Mordaças sonoras: a psicologia e o silenciamento da expressão. In M. H. S. Patto (Ed), Fracasso escolar: Histórias de submissão e rebeldia (pp. 95-106). Casa do Psicólogo.), em um trabalho sobre o silenciamento da psicologia frente ao fracasso escolar como produção da desigualdade social, denuncia que essa ciência continua a conceber tanto o ser quanto a sociedade de formas naturalizadas. Ao conceber relações de contradição como relações de dicotomia, a ciência oferta para as desigualdades sociais um caráter de fatalidade (Patto, 2010Patto, M. H. S. (2010). Mordaças sonoras: a psicologia e o silenciamento da expressão. In M. H. S. Patto (Ed), Fracasso escolar: Histórias de submissão e rebeldia (pp. 95-106). Casa do Psicólogo.). É justamente nesse sentido que revisitar os processos históricos e narrativas é necessário, pois nos oferta bases para compreender como, atualmente, as ciências psicológicas contribuem para as produções de visões de mundo e de seres humanos, e quais os efeitos disso para a vida em sociedade. Assim como tivemos e temos contribuições que fortalecem uma perspectiva colonial, tivemos e temos contribuições que fortalecem uma perspectiva compromissada com a igualdade racial.

Quando não criticamos as estruturas raciais que subordinam os sujeitos a determinadas formas de ser no mundo, quando culpabilizamos pessoas por seus “destinos” desiguais, e quando diagnosticamos as subjetividades que não estão de acordo com a brancura, não reconhecemos o racismo como produtor de adoecimento psíquico. Nós precisamos falar sobre isso.

Considerações finais

O presente trabalho teve como intuito realizar um percurso histórico acerca das narrativas teóricas construídas pelas elites intelectuais brancas brasileiras sobre as relações raciais no campo psicológico, destacando aquelas que contribuíram para uma limitação de estudos e discussões sobre saúde mental e desenvolvimento humano de forma racializada. Nesse entremeio, exploraram-se as contribuições desses sujeitos históricos brancos para a consolidação de uma hierarquia social e racial no país e de um imaginário popular, em geral, negativo sobre as populações negras e positivo sobre as próprias populações brancas. Por fim, apresentou-se um caminho metodológico para a reflexão sobre práticas cotidianas como instrumento de avaliação de práticas científicas - e vice-versa.

As bases racistas sobre as quais a psicologia assentou seu desenvolvimento enquanto ciência e profissão ainda orientam tanto produções de pesquisa quanto práticas profissionais, mas isso não significa que outras bases não vêm sendo construídas, especialmente a partir desse exercício de revisitar a história e a si própria/o.

se se quiser libertar a maioria dos psicólogos da mordaça da semiformação cientificista (...) é preciso cuidar da sua formação universitária. E a educação como formação inclui a aquisição de instrumentos intelectuais de percepção das ciladas da literalidade que nega historicidade aos significados e aos sujeitos (Patto, 2010Patto, M. H. S. (2010). Mordaças sonoras: a psicologia e o silenciamento da expressão. In M. H. S. Patto (Ed), Fracasso escolar: Histórias de submissão e rebeldia (pp. 95-106). Casa do Psicólogo., p. 104).

Nesse sentido, cabe a nós, profissionais do presente, e futuras/os profissionais, revisitarmos quais concepções de humanidade nós abarcamos em nosso olhar. Historicamente, a psicologia sempre voltou o seu olhar para o estudo do outro, e tal princípio, tanto analítico quanto metodológico, para além de dizer sobre o outro, diz muito sobre nós mesmas/os. É necessário, portanto, revisitar a história de desenvolvimento do país para pensar o próprio desenvolvimento dos diversos grupos populacionais brasileiros e o modo como nós nos relacionamos com nossa alteridade no mais ordinário cotidiano.

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  • Werneck, J. (2016). Racismo institucional e saúde da população negra. Saúde e Sociedade, 25, 535-549.
  • 1
    Cabe pontuar que, no presente trabalho, são feitas referências às populações brancas e negras em geral. Nesse sentido, não excluo as experiências individuais de cada pessoa. Como discute Schucman (2014)Schucman, L. V. (2014). Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude paulistana. Psicologia & Sociedade, 26(1), 83-94., as experiências de vida das pessoas brancas se diferem de acordo com a tonalidade de suas peles e classe social, de forma que a autora cria as categorias do “encardido”, do “branco” e do “branquíssimo”: a primeira categoria inclui pessoas que possuem traços negroides (cabelos crespos ou nariz achatado, p. ex.); a última, aquelas cujo fenótipo aproxima-se do europeu (olhos, cabelos e peles claros); e a segunda, inclui pessoas que estão no meio termo.
  • 2
    O médico Edmur de Aguiar Whitaker propôs um exame psicológico cujo laudo psiquiátrico deveria incluir modos de comportamento religioso e político, e interesses estéticos e científicos. Segundo o autor, esses aspectos diriam respeito a disposições psicológicas que configurariam comportamentos comunistas, antireligiosos, supersticiosos, revolucionários, etc. (Masiero, 2002Masiero, A. L. (2002). “Psicologia das raças” e religiosidade no Brasil: uma intersecção histórica. Psicologia: Ciência e Profissão , 22(1), 66-79.).
  • 3
    Essa perspectiva será mais aprofundada na seção “Paradigmas dos estudos sobre as relações raciais na psicologia”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    16 Jun 2021
  • Aceito
    15 Jul 2022
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