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Notas para Decolonizar os Estudos Transpessoais no Brasil: Contribuições do Pluriperspectivismo Participativo

Notes for Decolonizing Transpersonal Studies in Brazil: Contributions of Participatory Pluriperspectivism

Apuntes para la Decolonización de los Estudios Transpersonales en Brasil: Aportes del Pluriperspectivismo Participativo

Resumo

O campo dos estudos transpessoais tem avançado em diversas áreas no Brasil. Comemorou seus 40 anos com uma inserção ativa nas Instituições de Ensino Superior (IES) e uma ampliação de núcleos formativos e apoiadores de ensino, pesquisa e ações sociais, além de diálogos com o Sistema de Conselhos de Psicologia. Desafios são apresentados a partir do levantamento de uma série de questões importantes e ignoradas dentro da Psicologia Transpessoal no Brasil. Apresentamos o pluriperspectivismo participativo como possibilidade de decolonizar as matrizes eurocêntricas e estadunidenses, que dão suporte ao pensamento transpessoal brasileiro, buscando honrar nossas raízes históricas e incluir outras epistemologias e ontologias, que dão continuidade à crítica à lógica cartesiana moderna. Indicamos uma breve agenda de notas temáticas que carecem de um processo decolonizador no campo transpessoal: a) crítica às perspectivas de um pensamento hegemônico, em termos globais por meio da dominação Norte-Sul ou no campo das relações sociais; b) revisão das formas de “centrocentrismo”; c) questionamento da noção de universalismo das ciências e da ética; d) aprofundamento da análise crítica da supremacia restritiva da racionalidade formal técnico-científica em relação às formas de subjetividade, de vivências holísticas e integradoras e de valorização do corpo; e) revisão da noção de sujeito moderno desprovida da cocriação do humano com a comunidade, a história, a natureza e o cosmos.

Palavras-chave:
Psicologia transpessoal; Pluriperspectivismo; Participação; Espiritualidade; Decolonialidade

Abstract

The field of transpersonal studies has advanced in several areas in Brazil. It celebrated its 40th anniversary with an active insertion in Higher Education Institutions (HEI) and an expansion of training centers and supporters of teaching, research, and social actions, in addition to dialogues with the System of Councils of Psychology. Challenges are presented based on a survey of a series of important and ignored issues within Transpersonal Psychology in Brazil. We present participatory pluriperspectivism as a possibility to decolonize the Eurocentric and North American matrices that support Brazilian transpersonal thought, seeking to honor our historical roots and include other epistemologies and ontologies, which continue the critique of modern Cartesian logic. We indicate a brief agenda of thematic notes that lack a decolonizing process in the transpersonal field: a) criticism of the perspectives of a hegemonic thought, whether in global terms via North-South domination or in the field of social relations; b) review of the forms of “centrocentrism”; c) questioning of the notion of universalism of science and ethics; d) deepening of the critical analysis of the restrictive supremacy of the technical-scientific formal rationality in relation to the forms of subjectivity, of holistic and integrative experiences, and of valuing the body; e) review of the notion of the modern subject devoid of the co-creation of the human with the community, the history, the nature, and the cosmos.

Keywords:
Transpersonal psychology; Pluriperspectivism; Participation; Spirituality; Decoloniality

Resumen

El campo de los estudios transpersonales ha avanzado en varias áreas de Brasil. Se celebró su 40.º aniversario con una inserción activa en Instituciones de Educación Superior (IES) y una ampliación de los centros de formación y promotores de la docencia, la investigación y la acción social, además de diálogos con el Sistema de Consejos de Psicología. Los desafíos se presentan a partir de una encuesta de una serie de temas importantes e ignorados dentro de la Psicología Transpersonal en Brasil. Presentamos el pluriperspectivismo participativo como una posibilidad para decolonizar las matrices eurocéntrica y americana, que sustentan el pensamiento transpersonal brasileño, buscando honrar nuestras raíces históricas e incluir otras epistemologías y ontologías que continúan la crítica de la lógica cartesiana moderna. Indicamos una breve agenda de apuntes temáticos que carecen de un proceso decolonizador en el campo transpersonal: a) crítica de las perspectivas de un pensamiento hegemónico, ya sea en términos globales a través del dominio Norte-Sur o en el campo de las relaciones sociales; b) revisión de las formas de “centrocentrismo”; c) cuestionamiento de la noción de universalismo de la ciencia y la ética; d) profundización del análisis crítico de la supremacía restrictiva de la racionalidad formal técnico-científica en relación a las formas de subjetividad, de experiencias holísticas e integradoras y de valoración del cuerpo; e) revisión de la noción de sujeto moderno desprovisto de la cocreación de lo humano con la comunidad, la historia, la naturaleza y el cosmos.

Palabras clave:
Psicología transpersonal; Pluriperspectivismo; Participación; Espiritualidad; Decolonialidad

Introdução

Em seus 40 anos de construção de teoria, pesquisa e prática, a Psicologia Transpessoal no Brasil realizou uma autocrítica reflexiva na qual os avanços e os desafios do campo puderam ser contemplados e confrontados à luz e sombras do contexto atual. Emergente dos embates da contracultura dos anos 1960, na cultura euro-estadunidense, e reconhecida pela introdução sistemática da espiritualidade enquanto dimensão da experiência humana no campo psicológico (Bertolucci, 1986Bertolucci, E. (1986). A Psicologia Transpessoal. Ágoras.; Grof, 1975Grof, S. (1975). Realms of the human unconscious: Observations from LSD research. Viking Press.; Maslow, 1968Maslow, A. H. (1968). Toward a psychology of being. D. Van Nostrand Company.; Saldanha, 2008Saldanha, V. (2008). Psicologia transpessoal: Abordagem integrativa: Um conhecimento emergente em psicologia da consciência. Unijuí.; Sutich, 1968Sutich, A. (1968). Transpersonal psychology: An emerging force. Journal of Humanistic Psychology, 8(1), 77-78.; Tabone, 1986Tabone, M. (1986). A Psicologia Transpessoal: Introdução à nova visão da Consciência em Psicologia. Cultrix.), a Psicologia Transpessoal encontra-se num clima social e acadêmico diverso dos seus anos iniciais, tendo sua agenda de investigação, antes própria, sido integrada no campo dos estudos psicológicos mais abrangentes (Anderson & Lancaster, 2017Anderson, R., & Lancaster, L. (2017). Foreword. In L. McMullin, R. U. Hess, & M. Boucouvalas (Orgs.), Metamorphosis through conscious living: A transpersonal psychology perspective (pp. 10-13). Cambridge Scholars Publishing.; Hartelius, Krippner, & Thouin-Savard, 2017Hartelius, G., Krippner, S., & Thouin-Savard, M. I. (2017). Transpersonal and psychology: An experiment in inclusivity and rigor. International Journal of Transpersonal Studies , 36(1), 3-6.).

A meditação como técnica, por exemplo, está sendo integrada às abordagens psicoterapêuticas (Carpena & Menezes, 2018Carpena, M. X., & Menezes, C. B. (2018). Efeito da meditação focada no estresse e mindfulness disposicional em universitários. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 34, 1-12. https://doi.org/10.1590/0102.3772e3441
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; Coimbra & Vasco, 2017Coimbra, D. A., & Vasco, A. B. (2017). Mindfulness e psychological mindedness enquanto posturas terapêuticas: Relação com o processo de mudança em psicoterapia. Análise Psicológica, 35(2), 145-155. https://doi.org/10.14417/ap.1104
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; Cooper, 2020Cooper, S. P. (2020). Realizational perspectives: bion’s psychoanalysis and Dogen’s Zen. American Journal of Psychoanalysis, 80, 37-52.; Davis & Hayes, 2011Davis, D. M., & Hayes, J. A. (2011). What are the benefits of mindfulness? A practice review of psychotherapy-related research. Psychotherapy, 48(2), 198-208.; Ferreira, Acciari, Bezerra, & Tavares, 2019Ferreira, A. L., Acciari, A. S., Bezerra, M. A., & Tavares, M. de F. A. (Orgs.). (2019). Tratado de psicologia transpessoal: perspectivas atuais em psicologia. EDUFRN.; Nunes & Souza, 2020Nunes, A. L., & Souza, M. L. (2020). Meditação mindfulness e gestalt-terapia: Um encontro possível para a saúde humana. Phenomenology, Humanities and Sciences, 1(1), 164-176.; Sanders, 2010Sanders, K. M. (2010). Mindfulness and psychotherapy. Focus, 8(1), 19-24.; Zanon, Zanon, Wechsler, Fabretti, & Rocha, 2020Zanon, C., Zanon, D. L. L., Wechsler, S. M., Fabretti, R. R., & Rocha, K. N. D. (2020). Covid-19: Implicações e aplicações da Psicologia Positiva em tempos de pandemia. Estudos de Psicologia (Campinas), 37, 1-13. https://doi.org/10.1590/1982-0275202037e200072
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), e a espiritualidade, um de seus objetos de estudo, é cada vez mais reconhecida como um importante vetor de educação e saúde (Arantes, 2019Arantes, M. M. (2019). Educação emocional integral: Análise de uma proposta formativa continuada de estudantes e professores em uma escola pública de Pernambuco [Tese de doutorado, Universidade Federal de Pernambuco].; Behan, 2020Behan, C. (2020). The benefits of meditation and mindfulness practices during times of crisis such as Covid-19. Irish Journal of Psychological Medicine, 37(4), 256-258. https://doi.org/10.1017/ipm.2020.38
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; Cossia & Andrade, 2020Cossia, T., & Andrade, M. F. R. (2020). Contribuições da meditação em âmbito escolar. Interfaces da Educação, 11(31), 153-176.; Ribeiro, 2019Ribeiro, R. B. P. (2019). Cultivo da atenção em espaços educacionais: Elaboração, implementação e análise de um projeto de cultivo da atenção em uma perspectiva integral [Tese de doutorado, Universidade Federal de Pernambuco].; Santana, Kazasa, Lacerda, & Tanaka, 2020Araujo, A. C., Santana, C. L., Kazasa, E. H., Lacerda, S. S., & Tanaka, L. H. (2020). Efeitos de um curso de meditação de atenção plena em estudantes da saúde no Brasil. Acta Paulista de Enfermagem, 33, 1-9. https://doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO0170
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; Sarmiento, 2018Sarmiento, M. J. (2018). La paradoja de la conciencia plena en ausencia de afectividad ampliada: La empatía distanciada de la ética en las intervenciones basadas en midfulness y la cuestionable normalización materialista de lo que nos hace humanos [Tese de doutorado, Universidade Federal do Paraná].; Silva, 2015Silva, S. C. R. (2015). A espiritualidade na perspectiva transpessoal: contribuições para repensar o sujeito da educação [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Pernambuco].; Simão & Saldanha, 2012Simão, M. J. P., & Saldanha, V. (2012). Resiliência e Psicologia Transpessoal: Fortalecimento de valores, ações e espiritualidade. O mundo da Saúde, 36(2), 291-302.; Tavares, 2007Tavares, M. F. A. (2007). Voos de beija-flor: Rotas de uma educação para a paz. EDUFRN.; Votto & Carvalho, 2019Votto, G. G., & Carvalho, H. C. W. (2019). Bem-estar psicológico e meditação: Um estudo associativo. Estudos Interdisciplinares em Psicologia, 10(3), 60-75.).

Essa abertura e transformação no campo social e acadêmico, ao mesmo tempo que empresta reconhecimento social mais amplo para os interesses de longa data da Psicologia Transpessoal, questiona a sua relevância, vitalidade e foco (Cunningham, 2015Cunningham, P. (2015). Empirical rationalism and transpersonal empiricism: bridging the two epistemic cultures of transpersonal psychology. The Journal of Transpersonal Psychology, 47(1), 83-120.; Hartelius, Friedman, & Pappas, 2013Hartelius, G., Friedman, H. L., & Pappas, J. D. (2013). Calling to a spiritual psychology: Should transpersonal psychology convert? In H. L. Friedman & G. Hartelius (Orgs.), The Wiley-Blackwell handbook of transpersonal psychology (pp. 44-61). John Wiley & Sons.; Wade, 2019Wade, J. (2019). Transcending transpersonal: Time to join the world. The Journal of Transpersonal Psychology , 51(1), 70-88.). Indiscutivelmente, a tarefa e os desafios postos não são mais mapear e legitimar a espiritualidade e a multidimensionalidade do ser humano, mas sim como cultivar esses potenciais para o bem da vida humana e “extra-humana” (Castro, 1996Castro, E. V. (1996). Os pronomes cosmológicos e o perspectivismo ameríndio. Mana, 2(2), 115-144. https://dx.doi.org/10.1590/S0104-93131996000200005
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) e o florescimento ecológico diante da pegada antropocena que nos atropela (Hocoy, 2016Hocoy, D. (2016). Transpersonal psychology in the age of ISIS: the role of culture, social action, and personal transformation. In F. J. Kaklauskas, C. J. Clements, D. Hocoy, & L. Hoffman. (2016). Shadows & light: Theory, research, & practice in transpersonal psychology. University Professors Press.; Kopenawa & Albert, 2015Kopenawa, D., & Albert, B. (2015). A queda do céu: Palavras de um xamã yanomami. Companhia das Letras.; Rothberg & Coder, 2013Rothberg, D., & Coder, K. E. (2013). Widening circles: The emergence of transpersonal social engagement. In H. L. Friedman & G. Hartelius (Orgs.), The Wiley-Blackwell handbook of transpersonal psychology (pp. 626-639). John Wiley & Sons.). Em outras palavras, o foco deslocou-se da busca de estabelecer a importância psicológica e a validade geral da espiritualidade para promovê-la, cultivá-la ou desenvolvê-la no intuito de oferecer respostas ao enfrentamento das adversidades sociais e ambientais atuais.

A Psicologia Transpessoal no Brasil, assim como o campo dos estudos psicológicos de um modo geral, enfrenta o desafio e tem a oportunidade de ampliar o seu ethos e práxis, movendo-se para perspectivas mais participativas e decolonizadoras. Esforços importantes foram feitos a esse respeito para revigorar e redefinir o campo transpessoal do ponto de vista dos debates contemporâneos (Ferreira, Diógenes, & Bezerra, 2021Ferreira, A. L., Diógenes, C. D., & Bezerra, M. A. (Orgs.). (2021). A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva . Editora UFPE.; Hartelius et al., 2017Hartelius, G., Harrahy, M., Crouch, C., Adler, H., Thouin, M., Stamp, G., & Pardo, S. (2017). Second wave transpersonal psychology: Embodied, embedded, diverse, transforming [Manuscript submitted for publication, California Institute for Integral Studies].; Kaklauskas, Clements, Hocoy, & Hoffman, 2016aKaklauskas, F. J., Clements, C. J., Hocoy, D., & Hoffman, L. (2016a). Shadows & light: Theory, research, & practice in transpersonal psychology . University Professors Press., 2016bKaklauskas, F. J., Clements, C. J., Hocoy, D., & Hoffman, L. (2016b). Shadows & light: Theory, research, & practice in transpersonal psychology (2nd ed.). University Professors Press.; McMullin, Hess, & Boucouvalas, 2017McMullin, L. L., Hess, R. U., & Boucouvalas, M. (Orgs.). (2017). Metamorphosis through conscious living: A transpersonal psychology perspective . Cambridge Scholars Publishing.), bem como surge um série de produções que reatualizam o compromisso da agenda dos estudos transpessoais com a ampliação das fronteiras do potencial humano em relação íntima com a grande teia da vida (Ferreira et al., 2019Ferreira, A. L., Acciari, A. S., Bezerra, M. A., & Tavares, M. de F. A. (Orgs.). (2019). Tratado de psicologia transpessoal: perspectivas atuais em psicologia. EDUFRN.; Hartelius, Caplan, & Rardin, 2007Hartelius, G., Caplan, M., & Rardin, M. A. (2007). Transpersonal psychology: Defining the past, divining the future. The Humanistic Psychologist, 35(2), 135-160.; Hartelius, Rothe, & Roy, 2013Hartelius, G., Rothe, G., & Roy, P. J. (2013). A brand from the burning: defining transpersonal psychology. In H. L. Friedman & G. Hartelius (Orgs.), The Wiley-Blackwell handbook of transpersonal psychology (pp. 3-22). John Wiley & Sons.) e realizam críticas teóricas (Clements, Kaklauskas, Hocoy, & Hoffman, 2016Clements, C. J., Kaklauskas, F. J., Hocoy, D., & Hoffman, L. (2016). History, development, and contemporary perspectives of transpersonal psychology. In F. J. Kaklauskas, C. J. Clements, D. Hocoy, & L. Hoffman (Orgs.), Shadows and light: Theory, research and practice in transpersonal psychology (pp. 9-30). University Professors Press.; Ferreira et al., 2021Ferreira, A. L., Diógenes, C. D., & Bezerra, M. A. (Orgs.). (2021). A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva . Editora UFPE.; Ferrer, 2002Ferrer, N. J. (2002). Revisioning transpersonal theory: A participatory vision of human spirituality. Suny Press., 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.; Louchakova & Lucas, 2007Louchakova, O., & Lucas, M. K. (2007). Transpersonal self as a clinical category: Reflections on culture, gender, and phenomenology. The Journal of Transpersonal Psychology , 39(2), 111-136.) que esclarecem os seus desafios persistentes.

A partir de estudos de revisão sistemática das principais definições de Psicologia Transpessoal, Cunha (2017Cunha, D. P. (2017). Fundamentos multiparadigmáticos da formação humana: contribuições dos paradigmas transpessoal, intercultural e da espiritualidade para a educação no Brasil e na França [Tese de doutorado, Universidade Federal de Pernambuco] Repositório Digital da UFPE. https://bit.ly/3WESdJR
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) destacam-se três momentos bem característicos, que demarcaram o horizonte dos estudos transpessoais no âmbito internacional. No primeiro momento, de 1968 a 1991, temos um conjunto de definições sobre a Psicologia Transpessoal voltado para “além da noção de pessoa”; no segundo, de 1991 a 2001, encontramos definições que reforçam os “estados alterados de consciência” e a emergência da quarta força em Psicologia; e, no terceiro, de 2001 aos dias atuais, identificamos a transcendência, a perspectiva participativa da transpessoalidade e os esforços para deslocar os estudos transpessoais da lógica estritamente neo/perenialista e subjetivista para uma perspectiva crítica, participativa, comunitária e decolonial. No Brasil, prevaleceram os estudos apoiados no primeiro e segundo momentos e só a partir de 2011 com a criação da Associação Brasileira de Pesquisa e Ensino em Psicologia Transpessoal (Abrapet) tivemos produções que se inserem no terceiro momento da virada participativa.

Esse deslocamento nos estudos transpessoais teve influência direta das investigações do britânico Heron (1992Heron, J. (1992). Feeling and personhood: Psychology in another key. SAGE Publishing., 1996Heron, J. (1996). Co-operative inquiry: Research into the human condition. Sage., 1998Heron, J. (1998). Sacred science: Person-centered inquiry into the spiritual and the subtle. PCCS Books.), que via metodologias cooperativas os introduz no âmbito da virada participativa. Seguindo os seus passos, Ferrer (2002Ferrer, N. J. (2002). Revisioning transpersonal theory: A participatory vision of human spirituality. Suny Press., 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.) apresenta uma visão participativa da espiritualidade humana, caracterizando uma das primeiras críticas pós-modernas da teoria transpessoal convencional, revelando, desse modo, um caráter de virada participativa que complexifica o foco dos estudos transpessoais para além do intrapessoal, com seus aspectos subjetivos, incluindo as dimensões intersubjetivas com suas expressões socioculturais num processo de cocriação inativo e reconhecimento de uma epistemologia expandida (Heron, 1996Heron, J. (1996). Co-operative inquiry: Research into the human condition. Sage.; Heron & Reason, 1997Heron, J., & Reason, P. (1997). A participatory inquiry paradigm. Qualitative Inquiry, 3(3), 274-294., 2008Heron, J., & Reason, P. (2008). Extending epistemology within a co-operative inquiry. In P. Reason & H. Bradbury (Orgs.), The Sage handbook of action research: Participative inquiry and practice (2nd ed., pp. 366-380). Sage.) e outras ontologias (Cunha, Ferreira, Acioly-Régnier, Bezerra, & Santos, 2021Cunha, D. P., Ferreira, A. L., Acioly-Régnier, N. M., Bezerra, M. A., & Santos, A. A. (2021). O multiperspectivismo participativo nos estudos transpessoais. In A. L. Ferreira, D. C. Diógenes, & M. A. Bezerra (Orgs.), A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva (pp. 13-50). Editora UFPE.).

Este artigo sintetiza alguns dos avanços e desafios da Psicologia Transpessoal em seus quarenta anos no Brasil. Apresenta críticas aos desafios mais persistentes do campo e propõe uma virada participativa decolonial dos estudos transpessoais. Este trabalho se justifica porque, além de trazer e problematizar elementos históricos da Psicologia brasileira, retoma a importância de se considerar a diversidade das práticas psicológicas e sinaliza possibilidades de enfrentamento às matrizes colônias que capturam a espiritualidade, enquanto dimensão humana, em redutos de fundamentalismos religiosos, distorcendo sua função emancipatória e decolonizadora.

Quarenta anos de avanços do campo transpessoal brasileiro

O marco de introdução da Psicologia Transpessoal no Brasil foi o IV Congresso Internacional de Psicologia Transpessoal, em Belo Horizonte, em 1978, reunindo os principais representantes nacionais e internacionais dessa abordagem e de onde surgiu a ideia da criação da Associação Internacional de Transpessoal (ITA) (Grof, Friedman, Lukoff, & Hartelius, 2008Grof, S., Freidman, H., Lukoff, D., & Hartelius, G. (2008). The past and future of the International Transpersonal Association. International Journal of Transpersonal Studies , 27(1), 55-62. http://dx.doi.org/10.24972/ijts.2008.27.1.55
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; Tavares, Azevedo, & Bezerra, 2012Tavares, M. F. A., Azevedo, C. R. F., & Bezerra, M. A. (2012). Tratado de Psicologia Transpessoal: antigos ou novos saberes em psicologia?. EDUFRN.), que durante muitos anos congregou o movimento internacional transpessoal e sua relação com as instâncias formadoras e associações.

Na história da Psicologia brasileira, dois nomes destacam-se como os “pais” da Psicologia Transpessoal: Pierre Weil e Léo Matos. Além de ter sido pioneiro na introdução da teoria transpessoal no campo acadêmico, como disciplina na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Pierre Weil realizou formação nas décadas de 1980 e 1990 em várias regiões e até a sua morte, em 2008, atuou com contribuição teórica inestimável, bem como fundou centros formadores espalhados por todo o Brasil e a Universidade Internacional da Paz (Unipaz), em Brasília. Por sua vez, Léo Matos influenciou intensamente a formação das primeiras gerações de psicoterapeutas transpessoais, além de ter aberto, com seus cursos na Índia, um canal de comunicação com as epistemologias e as ontologias não lineares orientais. Ferreira, Silva e Ribeiro (2016Ferreira, A. L., Silva, S. C. R., & Ribeiro, R. I. (2016). A psicologia transpessoal no campo acadêmico brasileiro. In Conselho Regional de São Paulo (Org.), Psicologia, espiritualidade e epistemologias não-hegemônicas (pp. 271-280). CRPSP.) indicaram que a Psicologia Transpessoal teve uma inserção ativa no campo acadêmico brasileiro:

sete universidades federais que apresentam a disciplina e/ou temática transpessoal na grade curricular da formação inicial d@s psicólog@s. Aponta nove cursos de especialização reconhecidos pelo MEC que tratam da transpessoalidade e dois cursos de mestrado e doutorado com disciplinas e linhas de pesquisa em Psicologia Transpessoal. Situa três grupos de estudo cadastrados na plataforma do CNPq e afirma que foram defendidos, no período entre 1986 e 2014, 146 trabalhos no total, sendo 117 dissertações e 29 teses com a temática transpessoal. A presença da Psicologia Transpessoal na formação d@s psicólog@s indica o reconhecimento da comunidade acadêmica brasileira conforme recomendação das Resoluções CFP 010/97 e CFP 011/97. (Ferreira, Silva, & Ribeiro, 2016Ferreira, A. L., Silva, S. C. R., & Ribeiro, R. I. (2016). A psicologia transpessoal no campo acadêmico brasileiro. In Conselho Regional de São Paulo (Org.), Psicologia, espiritualidade e epistemologias não-hegemônicas (pp. 271-280). CRPSP., p. 271)

Esses números se ampliaram nos últimos anos com a criação de novos grupos de pesquisas e fortalecimento das associações regionais de formação transpessoal. Com o intuito de fortalecer a relação com a academia, entre 26 e 28 de maio de 2011, realizou-se o I Colóquio Brasileiro de Pesquisa em Psicologia Transpessoal na cidade de Natal/RN. O evento aconteceu na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a Universidade de Fortaleza (Unifor) e a Universidade de Lyon II (França). Durante o colóquio, as diversas instituições representadas criaram a Abrapet, que passou a promover ativamente encontros acerca da transpessoal, tendo estabelecido uma agenda de eventos e produções, que perduram até a atualidade.

Em 2013, a Abrapet realizou seu encontro anual no 8o Congresso Norte e Nordeste de Psicologia (Conpsi), importante evento da Psicologia brasileira. Nele, foram apresentados diversos trabalhos e mesas-redondas sobre Psicologia Transpessoal. Assim, naqueles eventos iniciais, procuramos fortalecer o reconhecimento da orientação transpessoal como uma linha teórica seguida por psicólogos(as) no exercício de sua prática, conforme destacado no Guia Psi, um pequeno livro publicado por Grisi e Figueiredo (1990Grisi, M. A-L., & Figueiredo, L. C. M. (1990). Guia psi. Marco Zero.), que indica que:

a orientação transpessoal reconhece a importância das dimensões cósmicas do homem e aceita a possibilidade de desenvolvimento do potencial humano e evolução da consciência além dos estados usuais. Nesta abordagem o foco central é a consciência, embora o psicoterapeuta trabalhe todos os níveis de desenvolvimento, experiência e preocupações do cliente. (Grisi & Figueiredo, 1990Grisi, M. A-L., & Figueiredo, L. C. M. (1990). Guia psi. Marco Zero., p. 152)

O reconhecimento acadêmico de sua inserção nas universidades e a ampliação dos centros de formações ajudaram a favorecer o acesso da transpessoal a novos profissionais. Assim como a agenda de trabalho buscou desconstruir preconceitos e equívocos históricos da relação transpessoal com os Sistemas de Conselhos de Psicologia. Em 2016, o Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-06) lançou o livro Psicologia, Espiritualidade e Epistemologias Não-Hegemônicas - Volume 3, que permitiu um diálogo profícuo com o campo transpessoal.

Nos eventos de 2015 e 2018 promovidos pela Abrapet, pesquisadores(as) que trabalhavam desde os anos 1990 com a Psicologia Transpessoal junto às periferias brasileiras passaram a provocar o campo no intuito de inclusão de perspectivas mais participativas na leitura do fenômeno transpessoal. Pesquisas no âmbito da espiritualidade e transpessoalidade avançaram com o propósito de problematizar e apontar pautas de enfrentamento das adversidades sociais e ambientais, que marcam nossa atualidade (Ferreira et al., 2018Ferreira, A. L., Acioly-Regnier, N. M., Cunha, D. P., Oliveira, V. P. B, Silva, S. C. S. R., Silva, S. C. R., & Eskinazi, P. R. V. (2018). As adolescências periféricas: uma pesquisa-ação integral/transpessoal. APRIS., 2019Ferreira, A. L., Acciari, A. S., Bezerra, M. A., & Tavares, M. de F. A. (Orgs.). (2019). Tratado de psicologia transpessoal: perspectivas atuais em psicologia. EDUFRN., 2021Ferreira, A. L., Diógenes, C. D., & Bezerra, M. A. (Orgs.). (2021). A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva . Editora UFPE.; Nardini-Bubols, Dias, Durgante, & Bronzatti, 2018Nardini-Bubols, M., Dias, S. S., Durgante, C. P., & Bronzatti, G. (2018). Mães do coração: Um relato de experiência de psicoterapia transpessoal. Diaphora - Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul, 18, 25-30.; Nardini-Bubols et al., 2019Nardini-Bubols, M., Silva, D. S., Santos-Silva, A., Stagnaro, O. K., Irigaray, T. Q., & Alminhana, L. O. (2019). The altered states of consciousness in transpersonal approach psychotherapy: Systematic review and guidelines for research and clinical practice. Journal of Religion and Health, 58(6), 2175-2194.; Rocha & Monteiro, 2018Rocha, J. R., & Monteiro, L. V. B. (2018). A dimensão espiritual na compreensão do fenômeno saúde-doença na psicologia da saúde. Caderno de Graduação - Ciências Biológicas e da Saúde, 4(2), 15.).

Desafios: entre des/conhecimento, reconhecimentos e inserção social

A Psicologia Transpessoal esteve nos embates da emergência de novas concepções de ser e saber no campo psicológico ocorridos nos anos 1990 acerca das práticas alternativas. Segundo Rozados (2010Rozados, D. (2010). Imagens de ciência na psicologia: Um estudo preliminar [Tese de doutorado, Universidade de São Paulo].), os debates acalorados levaram o Sistema de Conselhos de Psicologia a adotar medidas radicais para delimitar o que seria uma prática psicológica por meio de uma adesão a um modelo de ciência reducionista e universalista.

No debate das práticas alternativas e suas relações com a Psicologia oficial, Galvão (2000Galvão, L. F. (2000). Práticas alternativas? Uma leitura institucional da questão [Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo].) indica que o Conselho Federal de Psicologia (CFP) solicitou a um grupo de psicólogos, entre eles, Luís Cláudio Figueiredo e Marília Grisi, uma avaliação e emissão de parecer sobre essas práticas. A avaliação desse grupo indica a complexidade do fenômeno e defende a impossibilidade de apresentar um padrão universal que guie a diversidade e multiplicidade dos saberes psicológicos. Na visão de Figueiredo (1993Figueiredo, L. C. M. (1993). Sob o signo da multiplicidade. Cadernos de Subjetividade, 1, 89-95., p. 90):

Não há entre as diversas correntes consenso acerca de questões básicas; suas compreensões prévias, seus pressupostos do que sejam os objetos da psicologia, do que seja o “psicológico” e de como produzir sobre ele um conhecimento válido são muito diversos; de fato, não há entre nós muito acordo acerca do que poderiam ser os “critérios de cientificidade” com base nos quais deveríamos avaliar nossos conhecimentos e nós mesmos e esta é realmente uma questão decisiva da validação de nossas crenças e justificação de nossas práticas (Figueiredo, 1993Figueiredo, L. C. M. (1993). Sob o signo da multiplicidade. Cadernos de Subjetividade, 1, 89-95., p. 90)

E diante da tentativa de homogeneizar as Psicologias a partir de um modelo único pautado no discurso cientificista, foi questionado: “trata-se de uma psicologia com diferentes versões ou tratam-se efetivamente de múltiplas psicologias? Em diferentes oportunidades tenho defendido esta segunda alternativa.” (Figueiredo, 1993Figueiredo, L. C. M. (1993). Sob o signo da multiplicidade. Cadernos de Subjetividade, 1, 89-95., p. 90).

No parecer encomendado pelo CFP, Grisi e Figueiredo (1993Grisi, M. A-L., & Figueiredo, L. C. M. (1993). Parecer sobre técnicas alternativas. Mimeo.), quando analisam o surgimento das novas tendências em Psicologia, destacam em relação à abordagem transpessoal:

Buscam pontes entre seus pressupostos e práticas assim como interfaces com os conhecimentos existentes, marcando as diferenças. Conforme essas iniciativas vão se configurando passam a ser expostas aos demais e chegam a ganhar um nome próprio, como aconteceu com a Psicologia Transpessoal e Psicossíntese. Tais posições buscam agregar profissionais, ganhar espaço institucional e desenvolver-se como escolas psicológicas, já intitulando-se “a 4a força em Psicologia”. Alguns autores que trabalham desse modo, hoje, têm projeção internacional e várias dessas abordagens institucionalizaram-se oferecendo centros de formação e de atendimento psicológico. (Grisi & Figueiredo, 1993Grisi, M. A-L., & Figueiredo, L. C. M. (1993). Parecer sobre técnicas alternativas. Mimeo., s/p.)

Esses tensionamentos foram analisados por Ferreira, Silva e Silva (2016Ferreira, A. L., Silva, S. C. R., & Silva, S. C. R. (2016). Psicologia transpessoal: histórias, conquistas e desafios. Editora UFPE.). Enquanto Berni (2014Berni, L. E. V. (2014). Entrevista. Revista Contato, 16(93), 14-19.) e Butture e Souza (2014Butture, P., & Souza, C. M. (2014). Práticas não convencionais em Psicologia. Revista Contato , 16(93), 8-9.) tentam discutir o reconhecimento, o conhecimento e a regulamentação das práticas psicológicas, acabam por legitimar o reconhecimento da Psicologia Transpessoal. Butture e Souza (2014Butture, P., & Souza, C. M. (2014). Práticas não convencionais em Psicologia. Revista Contato , 16(93), 8-9., p. 10) apontam que: “A diferenciação entre os campos reconhecido, conhecido e regulamentado demonstra que o reconhecimento é feito antes pela sociedade e categoria do que pela autarquia da Psicologia”. Berni (2014Berni, L. E. V. (2014). Entrevista. Revista Contato, 16(93), 14-19., p. 18-19), em entrevista ao CRP-08, indica que a Psicologia Transpessoal está entre as:

Práticas reconhecidas, pouco conhecidas e não regulamentadas por Resolução do CFP, é o caso de práticas como as que, por exemplo, decorrem da Psicologia Transpessoal, que, como vimos, não são hegemônicas. Como uma abordagem minoritária, há o reconhecimento da categoria (via academia e via práxis), mas, como se trata de um grupo minoritário, tais práticas são pouco conhecidas do público e da categoria. Nesse particular, a Transpessoal sofre também um ataque por profissionais que, de maneira equivocada, atravessam o campo entre a Psicologia e a Religião e, ao serem pegos em falta ética, tentam atribuir sua ação profissional à Psicologia Transpessoal. Entretanto, essas pessoas raramente têm uma formação nessa área. (Berni, 2014Berni, L. E. V. (2014). Entrevista. Revista Contato, 16(93), 14-19., p. 18-19)

No âmbito do reconhecimento internacional, a Psicologia Transpessoal encontra-se incluída na Divisão 32 da American Psychological Association (APA), além de fazer parte da British Psychological Society desde 1996. No que diz respeito à definição de objetivos, a Sociedade de Psicologia Humanística da APA reconhece diretamente a transpessoal, quando indica que: “A sociedade representa uma constelação de ‘psicologias humanísticas’ que inclui as primeiras orientações maslowiana e rogeriana, transpessoal e existencial” (Society for Humanistic Psychology, 2011).

No Brasil, o reconhecimento deu-se inicialmente em associações transpessoais que atuam ativamente desde os anos 1970, agregando psicólogos(as) que orientam suas práticas com ajuda do referencial transpessoal, sendo destaque a Associação Brasileira de Psicologia Transpessoal (ABPT), a Associação Luso-Brasileira de Transpessoal (Alubrat) e a Unipaz.

Mais recentemente, na primeira década de 2000, a Abrapet, além das associações regionais e estaduais que mantêm ativamente parcerias com Instituições de Ensino Superior (IES) públicas e privadas para realização de especializações e outras formações na área.

Contudo, o campo dos estudos transpessoais permanece ainda à sombra do des/conhecimento, ou seja, há um conhecimento regado a preconceitos e mal-entendidos históricos, como analisaram Ferreira et al. (2016Ferreira, A. L., Silva, S. C. R., & Silva, S. C. R. (2016). Psicologia transpessoal: histórias, conquistas e desafios. Editora UFPE.), ou uma ausência de acesso a informações que permitam a superação de uma cegueira epistêmica que busca homogeneizar o campo da Psicologia por intermédio de uma universalização ontológica e epistêmica colonial.

Em decorrência das intensas críticas, desencadeadas pela maneira autoritária como foi realizado o movimento de “alerta à população” sobre as terapias alternativas, o que no “meio psi” ficou conhecido pejorativamente como “caça às bruxas”, além das reflexões acerca do ideal de cientificismo dos discursos contra o alternativo (Figueiredo, 1993Figueiredo, L. C. M. (1993). Sob o signo da multiplicidade. Cadernos de Subjetividade, 1, 89-95.), o CFP substitui o termo “alternativo” por “emergente”.

Esse novo designativo contribuiu para que a Psicologia Transpessoal passasse a ser erroneamente representada no imaginário dos conselheiros como uma abordagem emergente. Dizemos erroneamente porque, historicamente, seu surgimento é anterior ao movimento das terapias alternativas da “nova era”, como já apontado nos estudos de Tavares (2003Tavares, F. R. G. (2003). Legitimidade terapêutica no Brasil contemporâneo: As terapias alternativas no âmbito do saber psicológico. Physis: Revista de Saúde Coletiva, 13, 321-342.). Além disso, não temos nos documentos do CFP a explicitação de critérios que justifiquem seu posicionamento. (Ferreira et al., 2016Ferreira, A. L., Silva, S. C. R., & Silva, S. C. R. (2016). Psicologia transpessoal: histórias, conquistas e desafios. Editora UFPE., p. 27)

Superado o horizonte entre alternativo e emergente e liberado do estigma de “caça às bruxas”, o campo brasileiro dos estudos transpessoais manteve sua agenda nas discussões de contextos cósmicos, grupais, sociais e planetários abrangentes, próprias das suas matrizes fundacionais dos anos 1960, desengajando-se de um ethos participativo direto capaz de oferecer ferramentas para o enfrentamento das críticas feministas, queer e interculturais (Ferreira et al., 2021Ferreira, A. L., Diógenes, C. D., & Bezerra, M. A. (Orgs.). (2021). A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva . Editora UFPE.), o que lhe auxiliaria a assumir uma perspectiva participativa decolonial que reconhece a importância dos contextos socioculturais-históricos, políticos, ambientais e espirituais.

Nesse sentido, a Psicologia Transpessoal inicia um processo de indagação sobre temáticas que também vêm sendo refletidas no campo psi brasileiro (Gorjon, 2021Gorjon, M. G. (2021). Os sintomas da colonialidade na Psicologia junto ao cenário político do governo Bolsonaro. Revista Psicologia Política , 21(50), 74-86.; Oliveira & Yamamoto, 2015Oliveira, I. F., & Yamamoto, O. H. (2015). Psychology and social policies: A historical overview of psychological practice in Brazilian Public Health. Universitas Psychologica, 13, 1777-1785.; Veiga, 2019Veiga, L. M. (2019). Descolonizando a psicologia: Notas para uma Psicologia Preta. Fractal: Revista de Psicologia, 31(nspe.), 244-248. https://doi.org/10.22409/1984-0292/v31i_esp/29000
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). Silva (2021Silva, S. C. R. (2021). Favela, covid 19 e a potência dos pobres: resistindo entre a política da amizade e os laços de solidariedade. In A. L. Ferreira, D. C. Diógenes, & M. A. Bezerra (Orgs.), A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva (pp. 396-400). Editora UFPE.), Feliciano (2021Feliciano, A. J. A. (2021). Intelectualidade feminista negra e novos paradigmas de análise da sociedade. In A. L. Ferreira, D. C. Diógenes, & M. A. Bezerra (Orgs.), A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva (pp. 401-404). Editora UFPE.) e Souza (2021) endereçam questões ao campo de estudos transpessoais que sintetizam esses desafios persistentes e que necessitam ser enfrentados: falam de periferias, potência dos pobres, direitos humanos, feminismo negro, transexualidade, racismo e necropolítica, engajamento social, perspectivas queer, etc. que desafiam o viés patriarcal ocidental, já destacado pelos estudos feministas transpessoais fora do país (Brooks, Ford, & Anne, 2013Brooks, C., Ford, K., & Anne, H. (2013). Feminist and cultural contribution to transpersonal psychology. In H. L. Friedman, & H. Glenn (Orgs.), The wileyblackwell handbook of transpersonal psychology (pp. 612-625). John Wiley & Sons.; Louchakova & Lucas, 2007Louchakova, O., & Lucas, M. K. (2007). Transpersonal self as a clinical category: Reflections on culture, gender, and phenomenology. The Journal of Transpersonal Psychology , 39(2), 111-136.).

Como já indicado por Ferrer (2002Ferrer, N. J. (2002). Revisioning transpersonal theory: A participatory vision of human spirituality. Suny Press., 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.), Lahood (2016Lahood, G. A. (2016). Peer reviewed article love’s threshing floor: sifting the participatory wheat from the perennial chaff in the transpersonal psychology ‘familiar’ to Gestalt therapy. Gestalt Journal of Australia and New Zealand, 12(2), 17.) e destacado por Hocoy (2016Hocoy, D. (2016). Transpersonal psychology in the age of ISIS: the role of culture, social action, and personal transformation. In F. J. Kaklauskas, C. J. Clements, D. Hocoy, & L. Hoffman. (2016). Shadows & light: Theory, research, & practice in transpersonal psychology. University Professors Press., p. 33), “a teoria transpessoal acadêmica ocidental deriva de um contexto histórico específico e um conjunto de valores e construções distintamente de origem euro-americana. Como tal, eles implicitamente favorecem e perpetuam uma visão de mundo ocidental em sua articulação”. O ideal heteronormativo, branco, euroestadunidense, hierárquico e universalista, mesmo que paulatinamente problematizado nos diversos espaços psi (Carvalhaes, Silva, & Lima, 2020Carvalhaes, F. F.; Silva, R. B., & Lima, A. B. (2020). Reflexões sobre discursos a respeito do racismo no Brasil: Considerações de uma Psicologia Social Crítica. Revista Psicologia Política, 20(48), 311-324.; Oliveira & Yamamoto, 2015Oliveira, I. F., & Yamamoto, O. H. (2015). Psychology and social policies: A historical overview of psychological practice in Brazilian Public Health. Universitas Psychologica, 13, 1777-1785.; Silva, Silva, & Bezerra, 2019Silva, F. C., Silva, E. M. F., & Bezarra, M. A. (2019). (Trans)tornando a norma cisgênera e seus derivados. Revista Estudos Feministas, 27, 1-11.) no campo transpessoal brasileiro, carece de uma crítica mais efetiva como a realizada por Clements, Kaklauskas, Hocoy e Hoffman (2016Clements, C. J., Kaklauskas, F. J., Hocoy, D., & Hoffman, L. (2016). History, development, and contemporary perspectives of transpersonal psychology. In F. J. Kaklauskas, C. J. Clements, D. Hocoy, & L. Hoffman (Orgs.), Shadows and light: Theory, research and practice in transpersonal psychology (pp. 9-30). University Professors Press.), de maneira que tenhamos uma maior consciência entre os ideais assumidos e as práxis propostas (Costa & Mendes, 2020Costa, P. H. A., & Mendes, K. T. (2020). Colonização, Guerra e Saúde Mental: Fanon, Martín-Baró e as Implicações para a Psicologia Brasileira. Psicologia: Teoria e Pesquisa , 36(spe), 1-12. https://doi.org/10.1590/0102.3772e36nspe14
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).

Tome-se como exemplo desse alinhamento entre ideias e práxis, a instalação no Brasil do golpe de 2016 (Souza, 2016Souza, J. (2016). A radiografia do golpe: Entenda como e por que você foi enganado. Leya., 2017Souza, J. (2017). A elite do atraso: Da escravidão à Lava Jato. Leya.), no qual os direitos da população, arduamente adquiridos por lutas sociais e atuação dos profissionais nas políticas públicas, sofreram enorme revés (Marques, Roberto, Gonçalves, & Bernardes, 2019Marques, C. F., Roberto, N. L. B., Gonçalves, H. S., & Bernardes, A. G. (2019). O que significa o desmonte? Desmonte do que e para quem? Psicologia: Ciência e Profissão, 39(2), 6-18. https://doi.org/10.1590/1982-3703003225552
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). Assim, cabe a Psicologia Transpessoal também realizar sua autocrítica por tendências de “cegueira cultural” (Hocoy, 2016Hocoy, D. (2016). Transpersonal psychology in the age of ISIS: the role of culture, social action, and personal transformation. In F. J. Kaklauskas, C. J. Clements, D. Hocoy, & L. Hoffman. (2016). Shadows & light: Theory, research, & practice in transpersonal psychology. University Professors Press., p. 35) e por privilegiar uma espiritualidade desincorporada, na qual aspectos socioculturais, relações de poder, vieses de classe, raça, espécies e gênero são negligenciados, terminando por tratar as pessoas como “indivíduos descontextualizados” (Brooks, 2010Brooks, C. (2010). Unidentified aliens: Intersection of feminist and transpersonal thoughts and potential contributions to social change. International Journal of Transpersonal Studies, 29(2), 33-57., p. 35). Alinhar ideias e práxis, nesse exemplo emblemático, é retomar a potência do Zeitgeist da Psicologia Transpessoal em seus primórdios e reposicionar na atualidade o seu engajamento social e o seu comprometimento ético-espiritual com uma agenda de direitos que se contraponha às formas de opressão impostas ao povo de uma maneira geral.

Sustentar o foco em uma espiritualidade incorporada (Ferrer, 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press., 2021), isto é, alicerçada na imanência que congrega o tensionamento das diferenças e o exercício da convivialidade, é propiciar à Psicologia Transpessoal no Brasil um abraço integral com a diversidade de seu povo. Não é mais pensarmos como criaremos e/ou adaptaremos técnicas exóticas às práticas psicológicas, mas como a própria espiritualidade, enquanto dispositivo ético de bem viver, surge como elemento decolonizador (Mignolo, 2011Mignolo, W. D. (2011). The darker side of western modernity: Global futures, decolonial options. Duke University Press., 2017Mignolo, W. D. (2017). Colonialidade: O lado mais escuro da modernidade. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 32(94), 1-18. https://doi.org/10.17666/329402/2017
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) capaz de suscitar modos outros de “sentirpensar” (Acosta, 2016Acosta, A. (2016). O bem viver: Uma oportunidade para imaginar outros mundos. Autonomia Literária.) a vida, suas adversidades e soluções, para continuarmos habitando e compartilhando a Terra enquanto morada comum com humanos e extra-humanos.

Nesse sentido, apresentamos a seguir algumas das reflexões promovidas pelo grupo de pesquisa do Núcleo de Educação e Espiritualidade do PPGE da UFPE na parceria com a Abrapet, UFRN e associações regionais, como as de Pernambuco e Rio Grande do Norte, que problematizam e propõem um pluriperspectivismo participativo decolonial à Psicologia Transpessoal no Brasil.

O pluriperspectivismo epistemológico amefricano da Psicologia Transpessoal participativa no Brasil

A Psicologia Transpessoal no Brasil propõe-se pluriperspectivista em seu modo de operar. Perspectivista, no sentido proposto por Durazzo (2016Durazzo, L. (2016). A montanha oriental se move: Mestre Dogen e o perspectivismo zen no sermão das montanhas e águas. Religare: Revista do Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da UFPB, 13(2), 480-505. https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/religare/article/view/32050
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), na medida em que acolhe e intercruza diversos pontos de vista que buscam problematizar a supremacia do pensamento ocidental moderno, em especial, do cartesianismo/positivismo encarnado em mechanos1 1 O termo mechanos é empregado para situar o pensamento reducionista moderno que toma a realidade e o humano a partir da metáfora mecanicista do relógio. Sendo a complexidade do mundo e da vida reduzida a aspectos quantitativos do ideário cientificista de progresso, que não reconhece a interdependência de todos os sistemas do planeta, contribuindo com isso com a crise ecológica da atualidade. (Torbert & Reason, 2001Torbert, W. R., & Reason, P. (2001). Toward a participatory worldview. ReVision, 24(1), 1-48.), fazendo-o experimentar outras ontologias, outras epistemologias e outros modos de operar sobre si e sobre o mundo.

Incluímos o termo “pluri” para indicar as diversas formas de perspectivismos mobilizados na transpessoal no Brasil e que foram agregadas em diferentes momentos do movimento transpessoal e em diversos campos de saber, que vão das Klínicas2 2 Grafada com k para indicar noções como: estar com, mas também como desvio e cocriação. transpessoais (Ferreira et al., 2021Ferreira, A. L., Diógenes, C. D., & Bezerra, M. A. (Orgs.). (2021). A psicologia transpessoal no Brasil: 40 anos de produção acadêmica, intervenções clínicas e resiliência coletiva . Editora UFPE.; Grof, 2020Grof, S. (2020). O caminho do psiconauta: Enciclopédia para jornadas internas. Numina.; Matos, 1994Matos, L. (1994). Corpo e mente. Vozes.), dos estudos orientais não lineares (Durazzo, 2016Durazzo, L. (2016). A montanha oriental se move: Mestre Dogen e o perspectivismo zen no sermão das montanhas e águas. Religare: Revista do Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da UFPB, 13(2), 480-505. https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/religare/article/view/32050
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; Silva, 2020Silva, S. C. R. (2020). Educação e espiritualidade em Chogyam Trungpa RINPOCHE: nos rastros de uma pedagogia fantástica [Tese de doutorado, Universidade Federal de Pernambuco].; Silva, 2019Silva, S. C. R. (2019). O ponto de vista da vacuidade como experiência de pensamento: notas para uma ética da não-dualidade na educação [Tese de Doutorado, Universidade Federal de Pernambuco].), dos afroperspectivismos e amefricaperspectivismos (Asante, 2002Asante, M. K. (2002). Afrocentricity. African World Press.; González, 1988González, L. (1988). A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, 92(93), 69-82.), do perspectivismo ameríndio de Castro (1996Castro, E. V. (1996). Os pronomes cosmológicos e o perspectivismo ameríndio. Mana, 2(2), 115-144. https://dx.doi.org/10.1590/S0104-93131996000200005
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, 2002Castro, E. V. (2002). A inconstância da alma selvagem. Cosac Naify., 2008Castro, E. V. (2008). Xamanismo transversal: Lévi-Strauss e a cosmopolítica amazônica. In R. C. Queiroz & R. F. Nobre (Orgs.), Lévi-Strauss: Leituras brasileiras (pp. 79-124). UFMG., 2015Castro, E. V. (2015). Metafísicas canibais: Elementos para uma antropologia pós-estrutural. Cosac Naify.) até os perspectivismos participativos do campo transpessoal (Ferrer, 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.; Heron, 1992Heron, J. (1992). Feeling and personhood: Psychology in another key. SAGE Publishing., 1996Heron, J. (1996). Co-operative inquiry: Research into the human condition. Sage., 1998Heron, J. (1998). Sacred science: Person-centered inquiry into the spiritual and the subtle. PCCS Books.; Heron & Lahood, 2008Heron, J., & Lahood, G. (2008). Charismatic inquiry in concert: Action research in the realm of the between. In P. Reason & H. Bradbury (Orgs.), The Sage handbook of action research: Participative inquiry and practice (2nd ed., pp. 439-449). Sage.; Heron & Reason, 2008Heron, J., & Reason, P. (2008). Extending epistemology within a co-operative inquiry. In P. Reason & H. Bradbury (Orgs.), The Sage handbook of action research: Participative inquiry and practice (2nd ed., pp. 366-380). Sage.; Lahood, 2007Lahood, G. A. (2007). The participatory turn and the transpersonal movement: A brief introduction. ReVision: A Journal of Consciousness and Transformation, 29(3), 2-6.; Tarnas, 2016Tarnas, B. (2016). Iridescent infinity: Participatory theory and archetypal cosmology. Archai: The Journal of Archetypal Cosmology, 5, 87-104.).

O pluri também nos remete ao “pluriverso”, postulado por Latour (2004aLatour, B. (2004a). Politics of nature: How to bring the sciences into democracy. Harvard University Press., p. 246) para indicar a busca incessante de participação dos seres numa sociedade. O pluri nos lança no “cosmos” da noção de “cosmopolítica” de Stengers (2018Stengers, I. (2018). A proposição cosmopolítica. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, 69, 442-464. https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i69p442-464
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) e apresenta estreita relação com o conceito de “multiverso” de William James no que diz respeito à abertura para novas possibilidades de cocriação de si e do mundo. Nas palavras de Latour:

Mas se cosmos significa alguma coisa, ele precisa abranger, literalmente, tudo - incluindo todo o vasto número de entidades não humanas que permitem aos humanos agir. O sinônimo de William James para cosmos era pluriverso, construção conceitual que deixa essa multiplicidade fabulosa em evidência. (Latour, 2004bLatour, B. (2004b). Whose cosmos, which cosmopolitiques? Comments on the Peace Terms of Ulrich Beck. Common Knowledge, 10(3), 450-462., p. 454)

A Psicologia Transpessoal no Brasil repousa na Améfrica como marcador cultural e político (González, 1988González, L. (1988). A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, 92(93), 69-82.) de nossas experiências e não pretende importar as cosmopercepções africanas, tibetanas, indianas, ameríndias, etc., mas dialogar com elas, sem pretensão de perpetuá-las e enunciá-las como estruturas fixas. A presença, como condição ontológica da experiência de mundo, leva-nos a metabolizar o que aqui herdamos e a transmutar modos outros de ser, propondo desalojamentos. É a vista de um ponto e não mais o ponto de vista (Boff, 1998Boff, L. (1998). A águia e a galinha: Uma metáfora da condição humana. Vozes.; Guattari & Rolnik, 1993), por isso trata-se de algo que está em constante movimento e que não quer a representação dos valores africanos ou de outros povos fora do eixo ocidental colonizador, mas quer a consciência do que herdamos e do que fizemos com nossa herança epistêmica.

Nesse sentido, a noção de Améfrica, agregada à Psicologia Transpessoal no Brasil, propõe um processo de libertação que, como afirma Asante (2002Asante, M. K. (2002). Afrocentricity. African World Press.), deve ser encontrado em nossas experiências, em nós mesmos. Não deriva de uma localização histórica, política e cultural para além de nossa realidade. Abandonamos os referentes colonialmente construídos e adotamos uma ética do passante, conforme Mbembe (2017Mbembe, A. (2017). Políticas da inimizade. Antígona.), que nos previne da indiferença e articula presença e distância, solidariedade e desprendimento.

Quando mobiliza os perspectivismos amefricanos e os não lineares orientais, a Psicologia Transpessoal brasileira busca superar aquilo que Walsh (2009Walsh, C. (2009). Interculturalidad, estado, sociedad: Luchas (de)coloniales de nuestra época. Universidad Andina Simón Bolívar.) denominou como “colonialidade cosmogônico-espiritual”, ou seja, a negação e interdição das cosmopercepões das populações originárias, nas quais a espiritualidade está conectada e enraizada em todas as dimensões humanas. Seja por produções artísticas-culturais, corporalidade, economia, organização social, modos de cuidado, seja pelo modo de lidar com a saúde, a educação, o meio ambiente, etc.

O pluriperspectivismo mobilizado na Psicologia Transpessoal é tomado como prática epistêmica decolonial, ou melhor, como culturas estruturantes de um determinado modo de compreender a realidade e as práticas das quais se desenvolvem, o que Arias (2010Arias, P. G. (2010). Corazonar: Una antropología comprometida con la vida: Miradas otras desde Abya-Yala para la decolonización del poder, del saber y del ser. Ediciones Abya-Yala.) chama de “sabedorias insurgentes”, que brotam do permanente diálogo com a natureza e o cosmo, não somente por meio da razão, do conhecimento e da epistemologia, mas também por meio do coração, da afetividade e da ternura.

A isso achamos apropriado agregar o termo “amefricaperspectivismo” à Psicologia Transpessoal em solo brasileiro, para movimentar e se mover entre as contribuições teóricas comprometidas com uma justiça cultural, política e epistêmica que seja pautada em uma noção democrática do local. A partir do que é localizado, podemos expandir noções complexas da realidade que dialoguem entre si e que não tropecem no mito da universalidade eurocêntrica moderna. Portanto, reconhecer o lugar de enunciação e estruturar anunciação outra com ajuda dos marcadores êmicos fazem parte do pressuposto amefricaperspectivista de nossa participação em nossa realidade colonizada. E se a linguagem é epistêmica, posicionamo-nos no entre-lugar amefricaperspectivista, o lugar onde não ansiamos o paraíso colonial da planura da universalização moderna.

Prevenir-se da armadilha de postular um tipo ideal de Psicologia Transpessoal, que subordinaria práticas das populações originárias, culturas populares e movimentos sociais das periferias, leva-nos à formulação do seguinte questionamento: Quais concepções e estratégias transpessoais nascem a partir das perspectivas amefricanas, entendidas como práticas epistêmicas decoloniais?

As práticas de cuidado amefricanas e orientais não lineares decoloniais desses povos têm uma autonomia, complexidade e extensão própria que extrapolam o domínio da Psicologia e continuarão resistindo à violência epistêmica (Spivak, 2010Spivak, G. C. (2010). Pode o subalterno falar?. UFMG.) sustentada pelo neoliberalismo com as suas diferentes faces de colonialidade, pela instauração da subalterização, do indiferentismo, do aniquilamento, da invisibilidade e desqualificação de um povo no limite do rechaço a outro, em especial, contra o capitalismo, o racismo e o patriarcado, pois, como indica Mbembe:

O neoliberalismo baseia-se na visão segundo a qual “todos os acontecimentos e todas as situações do mundo vivo (podem) deter um valor no mercado”. Esse movimento caracteriza-se também pela produção da indiferença, a codificação paranoica da vida social em normas, categorias e números, assim como por diversas operações de abstração que pretendem racionalizar o mundo a partir de lógicas empresariais. (Mbembe, 2017Mbembe, A. (2017). Políticas da inimizade. Antígona., p. 13)

O campo brasileiro de estudos transpessoais contrapõe-se à redução dos sujeitos à dimensão meramente econômica neoliberal. Sujeitos regidos pelo mercado, assolados pela dívida e capturados, segundo Mbembe (2017Mbembe, A. (2017). Políticas da inimizade. Antígona., p. 15), “pela dupla inquietação exclusiva da sua animalidade (a reprodução biológica da vida) e da sua coisificação (usufruir dos bens deste mundo)”. Acossados e oprimidos pelas normas do mercado, “sem hesitar em se auto-instrumentalizar e instrumentalizar outros para optimizar a sua quota-parte de felicidade” são relegados “a sua condição de sujeito solúvio e descartável para responder à injunção que lhe é constantemente feita - tornar-se outro” (Mbembe, 2017Mbembe, A. (2017). Políticas da inimizade. Antígona., p. 15).

Propomos, então, para avançar no ato de sentirpensar a transpessoal, ampliar noções outras de nossas experiências. Não apenas em uma lógica de deslocamento, todavia de cocriação enativa (Ferrer, 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.), na qual o conhecimento não é mais considerado apenas reflexo de uma realidade predeterminada; mas o ambiente, como o vivenciamos, é trazido à existência em um processo ativo que pode ser considerado fundamentalmente transformador.

Propomos alargar a realidade que presenciamos, testemunhamos e herdamos. Em sentido ontológico, é o movimento de sair dos múltiplos centros e permitir a interação, a participação e as trocas. Saímos de uma abordagem multicêntrica e pensamos na realidade marginal. Estamos todos na margem e nisso reside a potência de não nos fixarmos em categorias, mas de nos orientarmos por marcadores epistêmicos que dialogam sem o interesse de universalizar, nem de particularizar restritivamente.

Nesse sentido, iniciamos refletindo, com ajuda de Ferrer (2002Ferrer, N. J. (2002). Revisioning transpersonal theory: A participatory vision of human spirituality. Suny Press., 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.) e Heron (2006Heron J. (2006). Participatory spirituality: A farewell to authoritarian religion. Lulu.), a necessidade de uma perspectiva participativa no campo dos estudos transpessoais. A perspectiva participativa vai do individual/subjetivo para o intersubjetivo e coletivo das relações humanas, com reverberações nas comunidades, nas formas culturais e nas estruturas sociopolíticas. Segundo Ferrer (2002Ferrer, N. J. (2002). Revisioning transpersonal theory: A participatory vision of human spirituality. Suny Press., p. 27), essa perspectiva “introduziu a abordagem participativa como uma ‘virada participativa’ nos estudos transpessoais e espirituais - uma mudança paradigmática rompendo com as estratégias epistemológicas predominantes na teoria transpessoal (empirismo interior) e pressupostos ontológicos (perenismo)”.

Assim, em vez de concebermos os fenômenos transpessoais dentro de uma ótica meramente intrapessoal, Ferrer (2002Ferrer, N. J. (2002). Revisioning transpersonal theory: A participatory vision of human spirituality. Suny Press., 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.) propõe a virada participativa, uma proposta de reformulação do campo teórico e das práticas transpessoais, visando incluir os aspectos interpessoais e transpessoais que possam promover transformações estáveis nos processos de subjetivação e nos relacionamentos com outros humanos, extra-humanos e com o mundo.

O entendimento de espiritualidade e dos demais fenômenos de estudos transpessoais, no bojo da perspectiva participativa, toma um caminho diferente das visões subjetivistas, essencialistas e individualistas que os têm como uma dimensão sutil, transcendente e dissociada da imanência. Para Ferrer (2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.), a espiritualidade, por exemplo, não é algo meramente individual, subjetiva e intrapessoal e que pode ser compreendida unicamente por meio de uma visão micro. Ao contrário, ela é cocriada a começar de uma complexa relação de aspectos intrapessoais, interpessoais e transpessoais. Assim, os fenômenos espirituais e transpessoais são frutos de uma relação dialógica e compreendem não apenas uma dimensão, mas toda a gama de faculdades epistêmicas - racional, imaginal, somática, vital e estética. Em suma, não há cisão entre aspectos imanentes e transcendentes. Todas essas faculdades são geradoras, em potencial, de eventos espirituais e transpessoais.

Dada a tradição ocidental voltada ao cognocentrismo, é um desafio a mais reconhecer a equivalência de todas as dimensões humanas, porém esse é um ponto nodal na perspectiva participativa transpessoal. Ferrer (2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press.) desenvolve críticas a respeito do nosso profundo enraizamento à educação ocidental moderna que prioriza sobremaneira uma racionalidade instrumental, sob forte influência da rígida ótica cartesiana que nega a existência de epistemologias que apresentem uma perspectiva de ser humano integral e multidimensional.

De acordo com Ferrer (2015Ferrer, N. J. (2015). Participation, metaphysics, and enlightenment: Reflections on Ken Wilber’s recent work. Approaching Religion, 5(2), 42-66.), a cocriação da fenomenologia participativa transpessoal envolve três dimensões inter-relacionadas: intrapessoal, interpessoal e transpessoal e ancoram-se respectivamente em três princípios basilares: equiprimacia, equipotencialidade e equipluralidade. Como cocriação intrapessoal, o autor defende que há uma participação colaborativa de todos os atributos humanos (corpo, energia vital, afeto, mente e consciência) que operam na enação dos fenômenos transpessoais. Essa dimensão opera pelo princípio da equiprimacia, indicando que não há hierarquia entre os atributos, todos possuem a mesma importância na construção complexa do fenômeno humano. Essa é uma relação do humano consigo próprio, em que percebe os seus aspectos intrapessoais de forma integral. A espiritualidade intrapessoal é aquela corporificada, que reconhece a participação de todos os atributos humanos na geração de fenômenos espirituais. O resgate do corpo é uma mudança importante nessa perspectiva, pois reconhece a necessidade dos atributos não mentais e propõe a (re)descoberta do próprio corpo, integrado no processo de cocriação.

Destacamos que as práticas espirituais tradicionais no Ocidente vislumbram o acesso à espiritualidade via normatização dos corpos e de um controle da materialidade corporal por ritos e preceitos institucionalizados. Essa compreensão pode nos apresentar a espiritualidade como um caminho certo, prescrito e fixo. Na transpessoal no Brasil temos uma influência da corporalidade das espiritualidades amefricanas que produzem um deslocamento nas tentativas de dissociar o espiritual do corpo, tornando-o “incorporado” (Varela, Thompson, & Rosch, 1991Varela, J. F., Thompson, E., & Rosch, E. (1991). The embodied mind: Cognitive science and human experience. Massachusetts Institute of Technology.).

No tocante à cocriação interpessoal, ela emerge das relações cooperativas entre os seres humanos, bem como abre essa relação para entidades sutis, poderes naturais e forças arquetípicas, as quais podem ser incorporadas na psique, na natureza ou no cosmos, como podemos perceber nos estudos do perspectivismo ameríndio de Castro (1996Castro, E. V. (1996). Os pronomes cosmológicos e o perspectivismo ameríndio. Mana, 2(2), 115-144. https://dx.doi.org/10.1590/S0104-93131996000200005
https://dx.doi.org/10.1590/S0104-9313199...
)3 3 “O estímulo inicial para esta reflexão são as numerosas referências, na etnografia amazônica, a uma teoria indígena segundo a qual o modo como os humanos vêem os animais e outras subjetividades que povoam o universo - deuses, espíritos, mortos, habitantes de outros níveis cósmicos fenômenos meteorológicos, vegetais, às vezes mesmo objetos e artefatos - é profundamente diferente do modo como esses seres os veem e se veem” (Castro, 1996, p. 116-117). A aproximação à cocriação interpessoal está na abertura a interagir com as percepções da relação com os seres “não humanos” na perspectiva ocidental de pensamento, mas que podem incorporar um tipo de personificação. Apesar de a terminologia tratar de cocriação interpessoal, Ferrer (2017) abre a perspectiva para a relação com outras subjetividades “não humanas” ou extra-humanas. e na clínica transpessoal de Grof (2020Grof, S. (2020). O caminho do psiconauta: Enciclopédia para jornadas internas. Numina.). O crescimento da cocriação interpessoal acontece na relação com o outro, no espírito de solidariedade, no respeito mútuo e no confronto construtivo.

Rege-se pelo princípio da equipotencialidade, o qual aponta que “somos todos professores e alunos” (Ferrer, 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press., p. 40, tradução nossa) na medida em que temos sempre o que aprender e o que ensinar. Esse princípio provoca rupturas das colonialidades com suas hierarquizações e racismos.

A cocriação transpessoal, a qual “refere-se à interação dinâmica entre seres humanos encarnados e o mistério4 4 O uso do termo “mistério” não implica qualquer tipo de reificação essencialista de uma base ontologicamente dada de ser, como nas expressões “o sagrado”, o divino “ou o eterno” muitas vezes transmitidas na erudição clássica da religião. Usamos deliberadamente esse termo conceitualmente vago, aberto e ambíguo para nos referir à energia criativa não-determinada ou à fonte de energia, à realidade, o cosmos, à vida e à consciência. Assim entendido, o termo “mistério” obstrui reivindicações ou insinuações de certeza dogmática e exclusivismos religiosos associados, mais positivamente, convida a uma atitude de humildade intelectual e existencial e receptividade ao Grande Desconhecido. no surgimento de insights espirituais, práticas, estados e mundos” (Ferrer, 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press., p. 5, tradução nossa), é estruturada por intermédio do princípio da equipluralidade, que reconhece a diversidade das experiências de enações espirituais, sendo todas elas igualmente importantes e emancipatórias. Significa dizer que não há uma forma única de desenvolvimento espiritual, tampouco conceber que é necessário seguir um processo já trilhado por um líder espiritual na perspectiva de obter equivalente ápice na experiência espiritual. Assim, “este princípio libera a espiritualidade participativa da fidelidade a qualquer sistema espiritual único e abre o caminho para um pluralismo espiritual genuíno, ontológica e pragmaticamente fundamentado” (Ferrer, 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press., p 5, tradução nossa).

Em outras palavras, o princípio da equipluralidade aponta que a espiritualidade humana não precisa estar associada a uma religião professada, contudo à forma com que essa relação se desenvolve, reverbera e permite modos de subjetivação. É importante ressaltar que, não necessariamente, essa relação envolve uma religião explicitamente conceituada, mas a experiência pessoal com o mistério gerativo da vida.

A perspectiva participativa transpessoal dá especial relevo à individuação espiritual, em que o humano constrói gradual, criativa e pessoalmente sua singularidade espiritual. Esse processo certamente será capaz de proporcionar “uma integração de maturação espiritual e individuação psicológica que provavelmente levará a uma diversidade mais rica de expressões espirituais” (Ferrer, 2017Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press., p. 6, tradução nossa). Do ponto de vista coletivo, a abordagem participativa vislumbra a emergência de uma coletividade composta de indivíduos espiritualmente diferenciados, permitindo uma comunhão profunda com os outros, a natureza e o cosmos.

Decolonizando o campo de estudos transpessoais

A Abrapet tem realizado nos últimos anos um processo de decolonização das matrizes do “poder”, do “saber” e do “ser” (Maldonado-Torres, 2007Maldonado-Torres, N. (2007). Sobre la colonialidade del ser: Contribuciones al desarrollo de um concepto. In Castro-Gómez, S. Grosfoguel, R. (Orgs.), El giro decolonial: Reflexiones para uma diversidade epistémica más allá del capitalismo global (pp. 127-168). Iesco-Pensar-Siglo del Hombre.) embutidas nos estudos transpessoais, no intuito de ampliar os diálogos com os saberes locais favorecendo condições de promoção de bem viver (Acosta, 2016Acosta, A. (2016). O bem viver: Uma oportunidade para imaginar outros mundos. Autonomia Literária.). Assim, ao agregar o termo “decolonial” ao participativo tem se buscado enfrentar desafios teórico-práticos nos estudos transpessoais, tais como:

a) A crítica às perspectivas de um pensamento hegemônico, seja em termos globais de dominação Norte-Sul (Mignolo, 2011Mignolo, W. D. (2011). The darker side of western modernity: Global futures, decolonial options. Duke University Press.; Santos, 2010aSantos, B. S. (2010a). Pela mão de Alice: O social e o político na pós-modernidade. Cortez.) ou no campo das relações institucionais, socioculturais, coletivas, governamentais, entre outras, que regem a vida social. A perspectiva “decolonial luta por fomentar a divulgação de outra interpretação que põe em evidência uma visão silenciada dos acontecimentos” e, ao mesmo tempo, revela “os limites de uma ideologia imperial que se apresenta como a verdadeira e única interpretação” (Mignolo, 2007Mignolo, W. D. (2007). The rethoric of modernity, the logic of coloniality and the grammar of de-coloniality. Cultural Studies, 21(2-3), 449-514., p. 485) que reatualiza a lógica da “recolonialidade” com suas visões hierárquicas, interpretações e ações dicotômicas e separativistas. Ela aponta o contexto de multiplicidade, de reposicionamento das ecologias dos saberes e de relacionalidade das concepções de humanos, extra-humanos e espiritualidades que pode oferecer novas perspectivas conceituais marcadamente plurais para os estudos da transpessoalidade.

Dentro dessa lógica, a perspectiva participativa decolonial realça o cultivo da alteridade conjuntiva que engloba as relações intrapessoais, interpessoais e transpessoais; o respeito e a afirmação da diferença; o diálogo e a cooperação prática e ética em torno da busca da justiça em relação a grupos empobrecidos e subjugados pelas mais diferentes formas de dominação.

b) A tarefa decolonial de revisão das formas de “centrocentrismo” (Santos, 2010aSantos, B. S. (2010a). Pela mão de Alice: O social e o político na pós-modernidade. Cortez.) é fundamental nos estudos transpessoais. Trata-se de problematizar as visões centralistas, verticalistas e elitistas articuladas com formas de racismos, machismos, xenofobia e trans/homofobia que inibem processos de contextualização e de recontextualização de identidades culturais e se colocam como monopólio regulador das consciências e das práticas sociais, dispensando a intervenção transformadora dos contextos, das negociações culturais e dos diálogos. Ela implica a necessidade de ampliação da “desobediência epistêmica” (Mignolo, 2008Mignolo, W. D. (2008). Desobediência epistêmica: A opção descolonial e o significado de identidade em política. Gragoatá, 34, 287-324.) presente no sentirpensar dos estudos transpessoais das primeiras gerações.

c) O giro decolonial também questiona a noção de universalismo das ciências e da ética, uma vez que ela dissimula a particularidade que a produção de conhecimento e os processos de normatização de valores na sociedade possuem. A lógica de universalismo moderno, em geral, é marcadamente masculina, branca e atrelada aos interesses das elites econômicas e, quase sempre, encobre saberes locais e particulares. A perspectiva decolonial

parte da ideia de que, a partir das margens ou das periferias, as estruturas de poder e de saber são mais visíveis. Daí, o interesse desta perspectiva pela geopolítica do conhecimento, ou seja, por problematizar quem produz o conhecimento, em que contexto o produz e para quem o produz. (Santos, 2010bSantos, B. S. (2010b). A gramática do tempo: Para uma nova cultura política. Cortez., p. 28-29)

Em contraposição propositiva à noção de universalismo do pensamento científico cartesiano, delineia-se um projeto de emancipação e expansão epistêmica. Ele se estrutura na premissa de ser fundamental a coexistência de diferentes epistemes ou formas de produção de conhecimento, tanto nos espaços acadêmicos, quanto nas articulações e movimentos sociais, que evidenciem as questões da geopolítica do conhecimento pelas quais a modernidade europeia afirmou suas teorias, conhecimentos e paradigmas como verdades universais e invisibilizou e silenciou as demais culturas que produzem conhecimento fora do seu eixo ou de sua perspectiva (Candau & Oliveira, 2010Candau, V., & Oliveira, L. F. (2010). Pedagogia decolonial e educação antirracista e intercultural no Brasil. Educação em Revista, 26(1), 15-40.).

d) Aprofundamento da análise crítica da supremacia restritiva da racionalidade formal técnico-científica em relação às formas de subjetividade, de vivências holísticas e integradoras e de valorização do corpo. Essa crítica, quase sempre, desdobra-se em uma avaliação da forma meramente conceitual da produção do conhecimento em detrimento das perspectivas narrativas, enredadas no cotidiano e nas expressões da corporeidade, complexas e em conexão com saberes alternativos e de grupos subalternos.

Tais análises responderiam ao postulado do pensamento decolonial de que a colonialidade é constitutiva da modernidade e não apenas derivada. Ou seja, a produção do conhecimento moderno atende às demandas coloniais e se guia por elas. “Graças à colonialidade, a Europa pôde produzir as Ciências Humanas como modelo único, universal e objetivo na produção de conhecimentos, além de deserdar todas as epistemologias da periferia do ocidente” (Candau & Oliveira, 2010Candau, V., & Oliveira, L. F. (2010). Pedagogia decolonial e educação antirracista e intercultural no Brasil. Educação em Revista, 26(1), 15-40., p. 17). Santos (2010bSantos, B. S. (2010b). A gramática do tempo: Para uma nova cultura política. Cortez.) se refere a esse processo como “epistemicídio”.

A perspectiva participativa transpessoal decolonial, ao se fundamentar por meio de epistemologias feministas, queer, afro-indígenas, orientais não lineares e de múltiplas ecologias de saberes, realça as dimensões engajadas da vida. Além disso, como já visto, os discursos cientificistas modernos, por estarem marcados pela lógica masculina e branca, arvoram uma falsa universalidade que dissimula a particularidade que possuem.

e) A revisão da noção de sujeito moderno desprovida da cocriação do humano com a comunidade, a história, a natureza e o cosmos. A tarefa decolonial de se revisar as noções reducionistas de indivíduo refém da lógica ocidental colonial é uma tarefa intensificada na agenda transpessoal no Brasil. Tal perspectiva desafia as análises cientificistas em variados campos. Walsh (2007Walsh, C. (2007, 17-19 de abril). Interculturalidad crítica/pedagogia decolonial: Apuestas (des)de el in-surgir, reexistir y re-vivir. Seminário Internacional Diversidad, Interculturalidad y Construcción de Ciudad. Universidad Pedagógica Nacional., p. 3, tradução nossa), por exemplo, mostra que uma dimensão de colonialidade é a

cosmogônica ou mãe natureza que tem a ver com a força vital-mágica-espiritual da existência das comunidades afrodescendentes e indígenas, cada uma com suas particularidades históricas. É a que focaliza a distinção binária cartesiana entre homem/natureza, categorizando como não-modernas, “primitivas” e “pagãs” as relações espirituais e sagradas que conectam os mundos acima e abaixo com a terra e com os ancestrais como seres vivo. Assim, [a lógica colonial] visa minar visões de mundo, filosofias, religiosidades, princípios e sistemas de vida, ou seja, a continuidade civilizacional das comunidades indígenas e da diáspora africana. (Walsh, 2007Walsh, C. (2007, 17-19 de abril). Interculturalidad crítica/pedagogia decolonial: Apuestas (des)de el in-surgir, reexistir y re-vivir. Seminário Internacional Diversidad, Interculturalidad y Construcción de Ciudad. Universidad Pedagógica Nacional., p. 3, tradução nossa)

Simas e Rufino (2020Simas, L. A., & Rufino, L. (2020). Encantamento: Sobre política de vida. Mórula., p. 9-10) propõem que se realce a noção de encantamento, pois ela traz:

o princípio da integração entre todas as formas que habitam a biosfera, a integração entre o visível e o invisível (materialidade e espiritualidade) e a conexão e relação responsiva/responsável entre diferentes espaços-tempos (ancestralidade). Dessa maneira, o encantado e a prática do encantamento nada mais são que uma inscrição que comunga desses princípios. (Simas & Rufino, 2020Simas, L. A., & Rufino, L. (2020). Encantamento: Sobre política de vida. Mórula., p. 9-10)

Ampliar a noção de pessoa embutida no conceito transpessoal, de modo a incluir o aspecto relacional e não substancial, ajuda a compreensão de que a minha felicidade pessoal implica uma busca do bem viver coletivo, retomando uma ecoespiritualidade que aponta a interdependência e cooperação vital entre sujeito e mundo e a inclusão mais ativa da corporeidade e da natureza enquanto Gaia (Boff, 1999Boff, L. (1999). Saber cuidar: Ética do humano - compaixão pela terra. Vozes., 2020Boff, L. (2020). Covid-19 - a mãe terra contra-ataca a humanidade: Advertências da pandemia. Vozes.).

f) Ampliando o projeto de problematização das identidades fixas promovidas pelos estudos transpessoais em sua origem, a decolonização propõe analisá-las como processos híbridos, algumas vezes fluidas e permanentemente criadas e recriadas nos mais diferentes processos de fronteirização das experiências da vida e nos entre-lugares das culturas. Dentro do quadro das perspectivas decoloniais, Santos (2010aSantos, B. S. (2010a). Pela mão de Alice: O social e o político na pós-modernidade. Cortez.) afirma que elas:

não são rígidas nem, muito menos, imutáveis. São resultados sempre transitórios e fugazes de processos de identificação. Mesmo as identidades mais sólidas, como a de mulher, homem, país africano, país latino-americano ou país europeu, escondem negociações de sentido, jogos de polissemia, choques de temporalidades em constante processo de transformação, responsáveis em última instância pela sucessão de configurações hermenêuticas que de época para época dão corpo e vida a tais identidades. Identidades são, pois, identificações em curso. (Santos, 2010aSantos, B. S. (2010a). Pela mão de Alice: O social e o político na pós-modernidade. Cortez., p. 135)

A agenda de decolonização do campo transpessoal brasileiro encontra-se em andamento e busca contribuir com a superação de situações de opressão e violência que marcam a vida de parcelas consideráveis da população brasileira, especialmente mulheres, indígenas, negros e grupos LGBTQIA+. Despida de androcentrismos e das consequentes formas de patriarcalismos, sexismos e heteronormatividades, valoriza o corpo, a sexualidade, o cuidado e a proteção da natureza com uma consequente responsabilidade ética pela cocriação em suas múltiplas expressões. Alinhando-se com uma crítica aos modos normativos, apoia-se nas cosmopercepções amefricanas e orientais não lineares, uma vez que elas se baseiam em interrelacionalidade, solidariedade, interculturalidade e maior respeito a si, ao outro e à natureza.

Considerações finais

Desde a sua narrativa fundacional, como a quarta força da Psicologia no caldeirão da contracultura dos anos 1960, a Psicologia Transpessoal erigiu-se como um movimento de contraposição ao momento cartesiano, em especial, às lógicas reducionistas que se apoiam no positivismo e nos seus modelos de mundo e humano. A inclusão da espiritualidade em sua agenda de pesquisa tornou-se sua marca definidora ao mesmo tempo que a colocou no centro de disputas e desafios ontológicos e epistemológicos que cortam sua trajetória histórica no Brasil.

Com inserção garantida no campo acadêmico brasileiro por meio de cursos, formações e produções, seu desafio tornou-se retomar e sustentar seu caráter tensionador das lógicas universalistas, relativistas, substancialistas e niilistas, avançando para processos de decolonização do ser, do saber e do poder que sustentam a colonialidade enquanto uma estrutura de pensar e agir culturalmente, presente nas diferentes formas de organização social, imaginárias e mentalidades, que reforçam as lógicas de dominação e centralismos excludentes e a instauração da subalterização, do indiferentismo, do aniquilamento, da invisibilidade e da desqualificação de um povo em relação a outro.

A Psicologia Transpessoal participativa decolonial no Brasil pressupõe uma espiritualidade incorporada, enquanto dispositivo ético-espiritual, que nos convida à reflexão vivida sobre o cuidado com a Terra - nossa “casa comum” -, com a natureza e com os humanos e extra-humanos. A Transpessoal pode apontar problematizações, respostas e orientações para sentirpensar a (des)construção do nosso modelo civilizatório com ajuda de outros processos de produção de conhecimentos que nos leve ao cultivo do princípio do “bem viver”, que, mesmo expresso de maneira diversa por várias culturas, congrega, segundo Acosta (2016Acosta, A. (2016). O bem viver: Uma oportunidade para imaginar outros mundos. Autonomia Literária.), quatro princípios básicos: reciprocidade, relacionalidade, complementariedade e solidariedade entre indivíduos e comunidades como bases para formular visões alternativas de vida.

Nesse momento de enfrentamento dos fundamentalismos religiosos e seus impérios de jogos de papéis institucionais, é importante pontuar que, quando trazemos a espiritualidade como norteador do campo transpessoal, não nos referimos ou apoiamos qualquer tentativa de institucionalizá-la, muito menos ajudar as jogadas reducionistas de impor à Psicologia um pensamento “religioso” por parte de setores hegemônicos das igrejas cristãs - católicas e evangélicas, e, neste último grupo, particularmente os neopentecostais - ou quaisquer outras denominações religiosas que legitimem e reproduzam o sistema-mundo moderno/colonial, capitalista/patriarcal, cristão-cêntrico/ocidental-cêntrico (Grosfoguel, 2011Grosfoguel, R. (2011). Decolonizing post-colonial studies and paradigms of political-economy: Transmodernity, decolonial thinking and global coloniality. Transmodernity: Journal of Peripheral Cultural Production of the Luso-Hispanic World, 1(1), 1-38.).

A Psicologia Transpessoal no Brasil carece ampliar a sua desobediência aos cânones euro-estadunidense, incluindo no seu lócus enunciativo epistemes mais participativas. Assim, amefricanizar a Psicologia Transpessoal por meio de sua decolonização é uma prática política e epistêmica, que se contrapõe ao centrocentrismo epistemicida branco, heteronormativo predominante no silenciamento e/ou no extermínio de outros modos de ser e saber presentes nas narrativas históricas da Psicologia no Brasil.

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  • 1
    O termo mechanos é empregado para situar o pensamento reducionista moderno que toma a realidade e o humano a partir da metáfora mecanicista do relógio. Sendo a complexidade do mundo e da vida reduzida a aspectos quantitativos do ideário cientificista de progresso, que não reconhece a interdependência de todos os sistemas do planeta, contribuindo com isso com a crise ecológica da atualidade.
  • 2
    Grafada com k para indicar noções como: estar com, mas também como desvio e cocriação.
  • 3
    “O estímulo inicial para esta reflexão são as numerosas referências, na etnografia amazônica, a uma teoria indígena segundo a qual o modo como os humanos vêem os animais e outras subjetividades que povoam o universo - deuses, espíritos, mortos, habitantes de outros níveis cósmicos fenômenos meteorológicos, vegetais, às vezes mesmo objetos e artefatos - é profundamente diferente do modo como esses seres os veem e se veem” (Castro, 1996Castro, E. V. (1996). Os pronomes cosmológicos e o perspectivismo ameríndio. Mana, 2(2), 115-144. https://dx.doi.org/10.1590/S0104-93131996000200005
    https://dx.doi.org/10.1590/S0104-9313199...
    , p. 116-117). A aproximação à cocriação interpessoal está na abertura a interagir com as percepções da relação com os seres “não humanos” na perspectiva ocidental de pensamento, mas que podem incorporar um tipo de personificação. Apesar de a terminologia tratar de cocriação interpessoal, Ferrer (2017)Ferrer, N. J. (2017). Participation and the mystery: Transpersonal essays in psychology, education, and religion. State University of New York Press. abre a perspectiva para a relação com outras subjetividades “não humanas” ou extra-humanas.
  • 4
    O uso do termo “mistério” não implica qualquer tipo de reificação essencialista de uma base ontologicamente dada de ser, como nas expressões “o sagrado”, o divino “ou o eterno” muitas vezes transmitidas na erudição clássica da religião. Usamos deliberadamente esse termo conceitualmente vago, aberto e ambíguo para nos referir à energia criativa não-determinada ou à fonte de energia, à realidade, o cosmos, à vida e à consciência. Assim entendido, o termo “mistério” obstrui reivindicações ou insinuações de certeza dogmática e exclusivismos religiosos associados, mais positivamente, convida a uma atitude de humildade intelectual e existencial e receptividade ao Grande Desconhecido.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    25 Jun 2021
  • Aceito
    04 Mar 2022
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