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Processos de reflexividade dos Psicólogos do Esporte e Coaches: um estudo fenomenológico

Reflexivity processes of Sport Psychologists and Coaches: a phenomenological study

Procesos de reflexividad de Psicólogos del Deporte y Coaches: un estudio fenomenológico

Resumo

O objetivo desta pesquisa é identificar e compreender fenomenologicamente, por meio de relato de Psicólogos de Esporte (PE) e de Coaches, em sua vivência prática, como ocorrem os processos reflexivos em sua atuação, conforme apreendidos a partir de relatos de experiências. O método de investigação escolhido foi a fenomenologia, pois oferece os recursos necessários para tal mergulho junto à experiência reflexiva. A amostra intencional foi delineada por PE e Coaches (profissionais de Educação Física que recorrem ao Coaching) em atividade em esportes de alto rendimento, que tenham atuado ou estejam atuando em modalidades esportivas coletivas e/ou individuais. Realizaram-se nove entrevistas (cinco com PE, quatro com Coaches). O acesso ao objeto desse estudo se deu por meio de entrevistas em profundidade e semiestruturadas, orientadas pela escuta suspensiva. As questões disparadoras foram formuladas com base no Procedimento Estruturado de Reflexão adaptado. Para análise das entrevistas, realizou-se uma síntese de cada relato, seguindo-se de cruzamento intencional. Como resultados, percebeu-se que PE e Coaches trazem algumas similaridades no que se refere aos modos de refletir sobre sua prática. No entanto, as experiências que eles fazem desses processos reflexivos é que podem tomar rumos distintos. Os(as) PE amparam-se na regulamentação da profissão e resguardam-se em seus apontamentos, trazendo suas experiências e reflexões sobre os processos vividos. Os(as) Coaches trazem em suas explanações um trabalho coerente, organizado e compatível com o método do Coaching. Problematizar os processos reflexivos desses profissionais permite diferenciar qualitativa e eticamente suas atuações, possibilitando o fomento multiprofissional no esporte.

Palavras-chave:
Prática Reflexiva; Psicologia do Esporte; Coaching; Fenomenologia

Abstract

The aim of this study consists in phenomenologically identifying and understanding, by the report of Sport Psychologists (SP) and coaches, in their practical experience, how would be the reflexive processes that take place in their performance, as learned from reports of their experiences. The research method chosen was phenomenology, since it offers the necessary resources for such a dive along with the reflective experience. The intentional sample was outlined by SP and coaches (Physical Education professionals who use coaching) active in high performance sports, who have or are working in collective and/or individual sports. Nine interviews were conducted (five with SP, four with coaches). Access to the object of this study took place by in-depth and semi-structured interviews, guided by suspensive listening. The triggering questions were formulated based on the adapted Structured Reflection Procedure. For the analysis of the interviews, a synthesis of each report was carried out, followed by the intentional crossing. As results, it was noticed that SP and coaches bring some similarities regarding the ways of reflecting on their practice. However, their experiences of these reflective processes are that they can take different directions. The SP are based on the regulation of the profession and guard themselves in their notes, bringing their experiences and reflections on the processes experienced. Coaches bring in their explanations a coherent, organized, and compatible work with the coaching method. Problematizing the reflective processes of these professionals allows to differentiate their actuation qualitatively and ethically, making the multiprofessional phenomenon in sport possible.

Keywords:
Reflective Practice; Sport Psychology; Coaching; Phenomenology

Resumen

El objetivo de este estudio consiste en identificar y comprender fenomenológicamente, a partir de la experiencia práctica de psicólogos del deporte (PD) y coaches, cómo serían los procesos reflexivos que se llevan a cabo en su rendimiento, tal y como se desprende de los informes de experiencias. El método de investigación elegido fue la fenomenología, ya que ofrece los recursos necesarios junto con la experiencia. La muestra intencional fue delineada por PD y coaches (profesionales de la educación física que utilizan el coaching) activos en deportes de alto rendimiento, que tienen o están trabajando en deportes colectivos e/o individuales. Se realizaron nueve entrevistas (cinco con PD, cuatro con coaches). El acceso al objeto de este estudio fue entrevistas en profundidad y semiestructuradas, guiadas por escuchas suspensivas. Las preguntas se formularon desde el procedimiento de reflexión estructurado adaptado. Para el análisis de las entrevistas, se hizo una síntesis de cada informe, seguida del cruce intencional. Como resultados, se notó que los PD y coaches tienen algunas similitudes con respecto a las formas de reflexionar sobre su práctica. Sin embargo, las experiencias que hacen de estos procesos pueden tomar diferentes direcciones. Los(las) PD se basan en la regulación de la profesión y se protegen en sus notas, aportando sus experiencias y reflexiones sobre los procesos vividos. Los(las) coaches plantean en sus explicaciones un trabajo coherente, organizado y compatible con el método de Coaching. Problematizar los procesos reflexivos de estos profesionales permite diferenciar sus acciones de manera cualitativa y ética, además de posibilitar la promoción multiprofesional en el deporte.

Palabras clave:
Práctica reflexiva; Psicología del Deporte; Coaching; Fenomenología

Introdução

Esta pesquisa apresenta uma via alternativa para contribuir com o conhecimento prático e teórico em Psicologia do Esporte, evitando debates que arriscam se tornarem estéreis em torno da atuação desses profissionais. Por um lado, trata-se de escapar dos debates midiatizados que são demasiadamente afastados daquilo que a Psicologia do Esporte já produziu e segue fazendo, restando, muitas vezes, um terreno fantasioso e mistificador acerca daquilo que a especialidade poderia fazer pelo desempenho dos atletas. Por outro lado, trata-se de um esforço científico para escapar das controvérsias do meio especializado que, embora recorram lado a lado a argumentos relevantes, como a fundamentação teórica e os resultados de pesquisas tecnicamente amparadas em constructos mensuráveis, não deixam de ser suspeitas de servir a interesses corporativos ou de paradigmas psicológicos. Desse modo, nem o debate teórico nem os resultados obtidos pelas práticas profissionais serão o objeto dessa investigação, cuja amostra é composta por coaches (profissionais de Educação Física que recorrem ao Coaching) e psicólogos que trabalham no meio esportivo, mas à práxis propriamente dita, que será tematizada, acessando junto a esses profissionais os processos reflexivos que atravessam seus fazeres.

Nessa perspectiva, esta proposta investigativa não visa apenas discorrer sobre uma atuação dirigida à reflexividade do psicólogo do esporte, mas também a como tal processo reflexivo é desenvolvido pelos coaches. Para tanto, é fundamental o acesso a esses sujeitos da prática em Psicologia e Coaching, no próprio ato de narrarem e relatarem o modo como procedem e pensam a seu respeito. O método de investigação fenomenológico, com seu intuito de “voltar às coisas mesmas”, oferece os recursos necessários para tal mergulho junto à experiência reflexiva. O objetivo desta pesquisa é identificar e compreender fenomenologicamente, por meio de relato de Psicólogos de Esporte e de profissionais de Educação Física que recorrem ao Coaching em sua vivência prática, como seriam os processos reflexivos que se dão em sua atuação, conforme apreendidos a partir de relatos de experiências.

Psicologia do Esporte e Coaching: Uma discussão em torno dos processos de regulamentação da profissão

Diante da disseminação da prática do Coaching no meio esportivo, vimos a necessidade de esclarecer sobre os princípios, métodos e técnicas que são privativos do exercício da Psicologia, pautados nas normativas que balizam o âmbito de fiscalização adotado pelo Sistema Conselhos (CFP e CRPs).

Em matéria publicada no site do Conselho Federal de Psicologia ([CFP], 2016Conselho Federal de Psicologia. (2016). CFP e Apaf divulgam nota de esclarecimento sobre a Psicologia do Esporte e Coaching. https://bit.ly/3hQoU4Q
https://bit.ly/3hQoU4Q...
), informa-se que a entidade, junto do Grupo de Trabalho Nacional da Assembleia de Políticas, da Administração e das Finanças (APAF) - Psicologia e Esporte, elucidaram que o profissional de psicologia possui técnicas e métodos regulamentados nos conhecimentos teóricos e metodológicos fundamentados, seguindo o rigor científico advindo de reflexões e pesquisas referenciadas. Esses órgãos, atentos a questões sobre a prática do Coaching e da Psicologia, esclarecem que, apesar da prática do Coaching ser desempenhada por qualquer profissional, desde que seja tecnicamente habilitado, não se pode confundir com o exercício da profissão de psicólogo. Nessa mesma linha de raciocínio, pondera-se também que a atuação do psicólogo do esporte pauta-se nos objetivos, disciplinas e orientações concatenados a princípios legais, advindos do campo da ciência e da pesquisa em Psicologia.

No Brasil, a PE foi reconhecida e regulamentada pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) em 20 de dezembro de 2000, pelas resoluções nº 014/00 e nº 02/01, estando, por conseguinte, seu exercício vinculado ao Conselho Regional e Federal de Psicologia. De acordo com Rúbio e Barreira (2022Rubio, K., & Barreira, C. R. A. (2022). Um campo diverso como é o fenômeno esportivo: marcas da Psicologia do Esporte brasileira. In F. Degani-Carneiro, T. H. Lima, S. S. Fukusima, & A. V. B. Bastos (Org.), Entidades Nacionais da Psicologia Brasileira: O Fenpb e suas histórias (pp. 249-263). Conselho Federal de Psicologia.), o Conselho Federal de Psicologia (CFP), responsável pela regulamentação e compromisso ético da profissão, lança mão de entidades que representam o fazer psi, primando pela qualidade de ciência e profissão. A Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (ABRAPESP), por sua vez, corresponde à entidade que representa a Psicologia do Esporte frente ao CFP e integra, desde sua fundação, o Fórum de Entidades Nacionais da Psicologia Brasileira (FENPB), ambiente que reúne a diversidade científico-profissional da área para uma interlocução contínua acerca do comprometimento ético e de seus desdobramentos na atuação profissional.

No campo esportivo e da atividade física, a preparação psicológica esportiva relaciona-se à especialidade Psicologia do Esporte, compreendendo as questões emocionais e volitivas, o desenvolvimento técnico e tático, assim como aspectos sociais de atletas e da equipe esportiva. Em meio às atividades desempenhadas pelo psicólogo do esporte está o treinamento mental, que corresponde ao desenvolvimento de capacidades psicológicas básicas (utilização do ritmo respiratório para ativar ou relaxar, fortalecimento dos níveis de atenção voluntária, dentre outros), os quais perfazem a preparação psicológica que, como mencionado anteriormente, configura-se em um procedimento organizado e coordenado por um profissional da Psicologia (Weinberg & Gould, 2017Weinberg, R. S., & Gould, D. (2017). Fundamentos da Psicologia do Esporte e do Exercício. (6a ed). Artmed.). Diante disso, o CFP e o GT Nacional da APAF Psicologia e Esporte delineiam alguns esclarecimentos sobre as normativas que demarcam o âmbito de fiscalização, empregado pelo Sistema Conselhos:

A LEI FEDERAL 5.766, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1971, criou o Sistema Conselhos de Psicologia com a principal função de orientar, fiscalizar e disciplinar o exercício profissional tendo em vista oferecer à sociedade a qualidade técnica e ética dos serviços prestados pelos(as) Psicólogos(as). E a resolução do CFP 019/2000 instituiu o MUORF (Manual Unificado de Orientação e Fiscalização), que estabelece a metodologia para os trabalhos de orientação e fiscalização, a fim de assegurar o cumprimento da lei, decretos e resoluções que regulamentam o exercício da profissão de Psicólogos(as) e garantir que a atuação esteja dentro dos preceitos técnicos e éticos da profissão (Lei n. 5.766, 1971Brasil. (1971). Lei nº 5.766, de 20 de dezembro de 1971. Cria o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Psicologia e dá outras providências. Presidência da República., p.01).

O DECRETO Nº 79.822, DE 17 DE JUNHO DE 1977, que regulamenta a referida lei, em seu Art. 1º, expõe que: “O exercício da profissão de Psicólogo, nas suas diferentes categorias, em todo o território nacional, somente será permitido ao portador de Carteira de Identidade Profissional expedida pelo Conselho Regional de Psicologia da respectiva jurisdição”. Assim, o Conselho tem autonomia conferida pela lei 5766/71 para fiscalizar as(os) psicólogas(os), entendendo estes como inscritos e regulares junto ao CRP (Decreto n. 79.822, 1977Brasil. (1977, 17 junho). Decreto nº 79.822, de 17 de junho de 1977. Regulamenta a Lei nº 5.766, de dezembro de 1971, que criou o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Psicologia e dá outras providências. Presidência da República., p.01). Esses esclarecimentos ressaltam a legitimidade de que qualquer profissional que não esteja inscrito no CRP e que desenvolva atividades de Psicólogo pode responder por exercício ilegal da profissão. De acordo com a Lei das Contravenções Penais (Decreto Lei nº 3.688 de 03 de Outubro de 1941Brasil. (1941a). Decreto-lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941. Lei de Contravenções Penais. Presidência da República. https://bit.ly/3hMeeUR
https://bit.ly/3hMeeUR...
): “Art. 47. Exercer profissão ou atividade econômica ou anunciar que a exerce, sem preencher as condições a que por lei está subordinado o seu exercício leva a pena - prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa”. Nesse aspecto, é relevante pontuar que a Lei 4.119 (1962Brasil. (1962). Lei nº 4.119, de 27 de agosto de 1962. Dispõe sobre os cursos de formação em Psicologia e regulamenta a profissão de Psicólogo. Presidência da República.) estabelece como função privativa do Psicólogo a utilização de métodos e técnicas psicológicas com os objetivos de diagnóstico psicológico, orientação e seleção profissional, orientação psicopedagógica e solução de problemas de ajustamento.

No caso da formação e capacitação do coach, o CFP (2016Conselho Federal de Psicologia. (2016). CFP e Apaf divulgam nota de esclarecimento sobre a Psicologia do Esporte e Coaching. https://bit.ly/3hQoU4Q
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), em conjunto com o GT Nacional da APAF Psicologia e Esporte, compreendeu que muitos profissionais, provenientes de diversas formações acadêmicas, passam a adotar o termo como identidade e carreira profissional. No meio esportivo, essa nomenclatura está permeada de um significado substancial, pois na língua inglesa o termo coach significa treinador, função desempenhada por profissionais relacionados às Ciências do Esporte. No Brasil, este contíguo de práticas não é regulamentado por lei ou por algum órgão de classe, mas impetram respaldo legal no Art. 170 da Constituição Federal (1988/2016Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. (2016). Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações determinadas pelas Emendas Constitucionais de Revisão nos 1 a 6/94, pelas Emendas Constitucionais nos 1/92 a 91/2016 e pelo Decreto Legislativo no 186/2008. Senado Federal., p. 109), parágrafo único, que cita:

A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios”,

Parágrafo único. “É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei (Constituição Federal, 1988/2016Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. (2016). Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações determinadas pelas Emendas Constitucionais de Revisão nos 1 a 6/94, pelas Emendas Constitucionais nos 1/92 a 91/2016 e pelo Decreto Legislativo no 186/2008. Senado Federal., p.109).

No cenário brasileiro, considerando à expansão nacional da atividade profissional de Coaching, a Folha de S. Paulo (Mendonça, 2011Mendonça, C. (2011, julho 25). Aumenta o número de ‘coaches’ no país. Folha de S.Paulo. http://www1.folha.uol.com.br/fsp/empregos/12834-aumenta-o-numero-de-coaches-no-pais.shtml
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/emprego...
) realizou um levantamento com as maiores organizações certificadoras de profissionais coaches do país. Dentre essas, podemos listar: Associação Brasileira de Coaching Executivo e Empresarial, Sociedade Brasileira de Coaching e Sociedade Latino-Americana de Coaching. Diante dessa conjuntura, constatou-se que, entre os anos de 2005 e 2011, houve um crescimento do número de profissionais certificados de 752 para 2.310, ou seja, uma ampliação de 207%, dado esse que corrobora com a premissa de que a prática e comercialização do coaching cresceu exponencialmente no Brasil (Oliveira-Silva et al., 2018Oliveira-Silva, L. C., Werneck-Leite, C. D. D. S., Carvalho, P. S. F., Anjos, A. D. C. D., & Brandão, H. I. M. (2018). Desvendando el Coaching: Una Revisión bajo la Óptica de la Psicología. Psicologia: Ciência e Profissão, 38(2), 363-377. https://doi.org/10.1590/1982-3703000942017
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).

Mesmo com a existência do Instituto Brasileiro de Coaching (IBC), pode-se verificar a necessidade de uma regulamentação da qualidade técnica para a formação e/ou capacitação desses profissionais, haja vista que sua atuação não está sujeita ao crivo de um órgão fiscalizador ou regulamentador, com base em códigos de normas e condutas legalmente constituído. A tentativa de legalização da prática de Coaching, por meio da PL 5554/2009Brasil. Projeto de Lei nº 5554, de 7 de julho de 2009 (2009). Dispõe sobre a profissão de coaching (coach) e dá outras providências. Câmara dos Deputados. https://bit.ly/3yCVrBp
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, não obteve êxito, o que deu margem a uma ampliação de profissionais no mercado nacional que se intitulam coaches, mas não contam com respaldo legal que garanta a segurança, tanto na formação quanto no conhecimento veiculado e aplicado.

No entanto, de acordo com a Classificação Brasileira do Código de Ocupações (CBO) do Ministério do Trabalho e Emprego (2010Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. (2010). Classificação Brasileira de Ocupações: Códigos, títulos e descrições (3a ed). Ministério do Trabalho. https://bit.ly/2ThI35p
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), Coaching corresponde a uma atividade profissional cuja descrição visa “Propiciar condições para o aprimoramento da equipe (coaching)”.

Assumindo responsabilidade como instituição precursora de coaches no Brasil, a SBC organizou, em 7 de fevereiro de 2018, o Código de Ética e de Conduta do Coach, com os seguintes objetivos:

1 Orientar a conduta e as relações profissionais do Coach para contribuir para a boa prática do Coaching. 2 Informar os clientes quanto aos critérios éticos que eles devem buscar ao contratar um Coach. 3 Disseminar e reforçar a confiabilidade, credibilidade e a aceitação do Coaching junto à sociedade e ao público em geral. 4 Estabelecer e unificar as normas referentes ao exercício responsável e digno da profissão (SBC, 2021, seção de introdução).

De acordo com a International Coach Federation (ICF) (2015International Coach Federation. (2015). Código de Ética. https://www.icfbrasil.org/codigo-de-etica/
https://www.icfbrasil.org/codigo-de-etic...
), Coaching refere-se a um processo de acompanhamento reflexivo e criativo, realizado em parceria com os clientes, com objetivo de inspirá-los a elevar ao máximo o seu potencial pessoal e profissional. O coach da ICF compromete-se a praticar as Competências Essenciais da ICF e promete prestação de contas ao Código de Ética da ICF, que diz:

Os Coaches da ICF estão comprometidos com confiabilidade, transparência, aceitação, congruência e consideram todas as partes, de toda a comunidade ICF, mutuamente responsáveis para defender os seguintes valores:

Integridade: Nós defendemos os mais elevados padrões tanto para a profissão de Coaching quanto para a nossa organização.

Excelência: Definimos e demonstramos padrões de excelência para a qualidade, qualificação e competência do coaching profissional.

Colaboração: Nós valorizamos a conexão social e construção da comunidade que acontece através da parceria colaborativa e realização co-criada.

Respeito: Somos inclusivos e valorizamos a diversidade e riqueza dos nossos parceiros globais. Nós colocamos as pessoas em primeiro lugar, sem comprometer os padrões, políticas e a qualidade (IFC, 2015, seção Principais Valores ICF).

Por não se tratar de uma abordagem única, mas sim de caráter multidisciplinar, o processo de formação não conflui para uma área específica. Em geral, as formações em Coaching contemplam de maneira genérica conceitos de administração, filosofia e psicologia. No entanto, entidades como o Instituto Brasileiro de Coaching defendem que todo aquele que tenha o interesse em se desenvolver pelo método Coaching, deve fazê-lo em uma instituição que ofereça uma formação condizente com a metodologia do processo.

Diante dos argumentos apresentados, verifica-se que a prática de técnicas aplicadas pelo profissional que se denomina coach não é um conhecimento da Psicologia ou pertence a qualquer uma das suas especialidades. Faz-se necessário salientar que, ao exercer o Coaching enquanto psicóloga(o), a(o) profissional está sujeita(o) à totalidade do Código de Ética (Res. CFP n. 010/2005Conselho Federal de Psicologia. (2005). Resolução CFP n° 010/2005. Aprova o Código de Ética Profissional do Psicólogo.), necessitando respeitar seus princípios basilares, admitir e cumprir com suas responsabilidades, garantindo que seu trabalho seja fundamentado no respeito, na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano. Essa diferenciação se faz necessária para que a categoria e a sociedade civil estejam informadas sobre a efetividade da Psicologia como fundamento na formação de seus profissionais. No entanto, essas considerações se prestam a situar e delimitar formalmente o Coaching como nova área de atuação, o que não se configura como objeto deste estudo.

Procedimentos metodológicos

Na busca por conhecer o processo de reflexividade de psicólogos do esporte e coaches ativos na sua prática interventiva, este estudo pretende tematizar um recorte de suas práxis. Compreender o processo reflexivo, não a partir de categorias prévias, mas do modo como se manifestarem numa “produção intersubjetiva de relatos de experiências” (Barreira, 2017bBarreira, C. R. A. (2017b). Análise fenomenológica aplicada à Psicologia: recursos operacionais para a pesquisa empírica. In M. Mahfoud & J. S. Filho (Org.), Diálogos com Edith Stein. Filosofia, Psicologia e Educação (pp. 317-368). Paulus.), que remonta aos próprios momentos em que se sucederam, corresponde a desvelar um recorte central do próprio engendramento da atuação desses profissionais.

Para o recuo junto à experiência, além de questões apropriadas ao objeto, vale-se do uso da “escuta suspensiva”, que almeja cumprir uma “coleta de dados” equivalente, mais precisamente, a uma “produção intersubjetiva de relatos de experiência” a ser submetida a um processo analítico denominado “cruzamento intencional” (Barreira, 2017bBarreira, C. R. A. (2017b). Análise fenomenológica aplicada à Psicologia: recursos operacionais para a pesquisa empírica. In M. Mahfoud & J. S. Filho (Org.), Diálogos com Edith Stein. Filosofia, Psicologia e Educação (pp. 317-368). Paulus., 2018Barreira, C. R. A. (2018, Junho). Escuta suspensiva [Apresentação de trabalho]. V Seminário Internacional de Pesquisa e Estudos Qualitativos: Pesquisa Qualitativa na Educação e na Ciência em Debate. Foz do Iguaçú, Paraná, Brasil.). Conforme o autor, a operacionalização da escuta suspensiva equivale a um processo dinâmico e eminentemente intersubjetivo, pautado num ir e vir dialógico entre entrevistador e entrevistado. Embora se possam supor várias qualidades de escuta suspensiva, como versões hermenêuticas, a que se efetivou aqui é orientada pela compreensão empática, isto é, almeja compreender a experiência relatada pelo entrevistado, aprofundando-se nesta experiência junto ele, por meio de questões que favoreçam sua expressão. O entrevistador se abstém de interpretar, de dar o sentido da fala por presumido, de explicar e de aplicar as próprias ideias à fala do entrevistado, atitude que, na análise posterior, se estende tanto na síntese da entrevista como no decorrer do cruzamento intencional. A abstenção de juízos interpretativos, explicativos ou conceituais por parte do entrevistador equivale à suspensão da atitude natural, o que favorece, consequentemente, uma suspensão similar por parte do entrevistado, que pode assumir a atitude personalista - pela qual sua experiência pessoal vem à tona rompendo-se a camada de uma fala natural (Barreira, 2018Barreira, C. R. A. (2018, Junho). Escuta suspensiva [Apresentação de trabalho]. V Seminário Internacional de Pesquisa e Estudos Qualitativos: Pesquisa Qualitativa na Educação e na Ciência em Debate. Foz do Iguaçú, Paraná, Brasil.). Essas novas possibilidades de investigação empírico-fenomenológica abrem-se nesta pesquisa para a tematização de um objeto de experiência mais abstrato que os usualmente pesquisados, uma vez que visa identificar e compreender os processos reflexivos prevalentes junto a dois grupos de profissionais que recorrem a conhecimentos de Psicologia para fazerem suas intervenções no contexto esportivo. Diferente de outras pesquisas em que este modelo foi aplicado, não se trata de enfocar um objeto perceptivo, mas, como será detalhado, o objeto “processo reflexivo” é uma “percepção” de percepções, uma “percepção segunda”.

O universo da pesquisa constituiu uma amostra composta por psicólogos do esporte em atividade no momento da coleta, que estavam intervindo em esportes de alto rendimento, pertencentes a diferentes confederações brasileiras de modalidades esportivas coletivas e/ou individuais. Também nesse universo, estão os coaches que desenvolvem trabalhos em clubes, agremiações e/ou equipes desportivas.

O acesso e contato com os participantes realizou-se diretamente entre o(a) pesquisador(a) e o(a) entrevistado(a), não havendo, portanto, a necessidade de obter autorizações institucionais para o recrutamento deles(as). Outra via de recrutamento relaciona-se aos psicólogos do esporte, associados da Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (ABRAPESP). Os relacionamentos e contatos estabelecidos nesse período viabilizaram a ágil identificação e o acesso a profissionais que puderam compor a amostra intencional.

Para os coaches, o acesso se deu por meio de indicações dos psicólogos do esporte e de outros coaches que conheciam ou já haviam trabalhado com esses profissionais. O convite para participação nas entrevistas ocorreu pessoalmente ou por meio de e-mails, redes sociais, sites e telefones.

As entrevistas ocorreram in loco, nos locais de trabalhos desses profissionais, assim como em outras localidades sugeridas pelos entrevistados. Aqueles que concordaram em participar foram informados dos objetivos e conteúdos da pesquisa, a partir de um termo de Consentimento Livre e Esclarecido, compreendendo os pormenores sobre a gravação e transcrição do material, bem como a garantia do sigilo de sua identidade e do local de suas instituições, seguindo os preceitos éticos de confirmação de sua total privacidade. Esta pesquisa obteve a aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo, para dar início às entrevistas.

Neste estudo, o objeto é o processo de reflexividade ativo na prática interventiva do psicólogo do esporte e de profissionais pautados no Coaching. A questão disparadora foi: “Relate em sua trajetória profissional como Coach ou como Psicólogo do Esporte, uma experiência na sua atuação que, para você, foi significativa”.

A questão disparadora contribuiu para nortear a entrevista, no entanto, optou-se, também pela utilização, no ato da entrevista, do Procedimento Estruturado e Adaptado de Reflexão. Proposto originalmente por Anderson, Knowles e Gilbourne (2004Anderson, A. G., Knowles, Z., & Gilbourne, D. (2004). Reflective pratice for sport on psychologists: concepts, models, pratical implications and thoughts on disseminations. The Sport Psychologist, 18(118), 188-203.), esse roteiro de supervisão para Psicólogos do Esporte é utilizado para ter acesso às experiências desses profissionais. Este procedimento divide-se em cinco categorias e sua seleção pautou-se na amplitude de aspectos da experiência relacional em contexto do atendimento.

Foram realizadas um total de nove entrevistas, sendo cinco com psicólogos(as) do esporte e quatro com coachs - profissionais de Educação Física. As entrevistas foram expostas como relatos e analisadas cumprindo o método científico do estudo.

Cada entrevista por si só não é satisfatória para se realizar a análise fenomenológica pretendida, sendo necessário analisá-las comparativamente como conjunto. Essa análise corresponde ao cruzamento intencional, uma espécie de “variação eidética ou imaginária destinada ao uso em pesquisa empírica” (Barreira & Ranieri, 2013Barreira, C. R. A., & Ranieri, L. P. (2013). Aplicação de contribuições de Edith Stein à sistematização de pesquisa fenomenológica em Psicologia: a entrevista como fonte de acesso às vivências. In: M. Mahfoud & M. Massimi (Org.), Edith Stein e a Psicologia: teoria e pesquisa (pp. 449-446). Artesã., p. 464).

A perspectiva de análise fenomenológica se dispõe no âmbito do método qualitativo de pesquisa em Psicologia e se propõe como base filosófico-epistemológica para sistematizar um caminho de reflexão em torno da experiência humana. Ales Bello (1998Ales Bello, A. (1998). Culturas e religiões: uma leitura fenomenológica (A. Angonese, Trad.). Edusc. (Trabalho original publicado em 1997)), bem como Mahfoud e Massimi (2013Mahfoud, M., & Massimi, M. (Org.). (2013). Edith Stein e a Psicologia: teoria e pesquisa. Artesã.) propõem esse procedimento como arqueologia fenomenológica das culturas, cuja finalidade é identificar e descrever os sentidos que constituem essencialmente o objeto estudado. Isso quer dizer que se deve focar nos interesses das experiências vivenciais, lançando mão do fenômeno a ser estudado a partir de situações peculiares dos relatos dos sujeitos, com a finalidade de apreendê-los no modo como aparecem para aqueles que os vivenciam.

Os resultados se organizam, ancorados nos relatos dos sujeitos, o que permite a análise intencional. Por meio dessas análises, foi possível iniciar a descrição das práticas reflexivas prevalentes de psicólogos do esporte e coaches. Sobre o processo reflexivo entre psicólogos do esporte, os cinco relatos de experiência produzidos intersubjetivamente por cada um dos entrevistados na interlocução junto à pesquisadora estão agrupados pela partilha da mesma condição profissional desses colaboradores, a de psicólogos do esporte.

Resultados e discussão

Certamente seria possível encontrar particularidades que, para além dos fatos narrados, tangem à maneira como cada um processa suas reflexões. Todavia, proceder assim significaria perder de vista, pela impossibilidade de delinear seus contornos, aquilo que é buscado como objeto da pesquisa. Este objeto consiste em algo que se almeja conhecer e que se desoculta pela descrição de um processo reflexivo a ser identificado por contraste, revelando um modo comum, prevalente, que mostre suas adjacências à medida em que evidencia aspectos operativos da experiência reflexiva profissional. Estes aspectos não poderiam ser identificados somente por relatos individuais, já que isso os faria suspeitos de, em sua individualidade, mostrar apenas particularidades, não um modo de fazer que, por atravessar as distintas experiências individuais, possa ser característico da condição que as agrupa, a de psicólogos do esporte.

Neste item, faz-se uma primeira aproximação em que o objeto é destituído dessa condição nominal - processo reflexivo - para revelar-se, em seu aparecer, como fenômeno ou acontecimento. Desse modo, o fenômeno não deve mais se confundir com os fatos relatados por cada sujeito, mas precisa se evidenciar naquilo sem o quê não se encontra o desencadeamento de operações reflexivas e, sim, apenas se constata que elas ajam de modo subjacente a cada acontecimento, justificativa e avaliação de um episódio, todavia, enquanto fato, sem revelarem-se em seu modo próprio. Caso os fatos fossem suficientes para tal revelação, bastaria a reprodução dos relatos. Trata-se aqui de empreender a análise fenomenológica por contraste de relatos empíricos colocados sob a epoché ou, em outros termos, por via do cruzamento intencional.

O primeiro aspecto a se sobressair no cruzamento dos relatos é a diversificação de contextos e situações em que cada experiência marcante solicitada aconteceu, o que se justifica também por motivos diferentes, como a história de trabalho junto a um atleta, ou um episódio desencadeado por uma demanda social ou institucional. Em todos os casos, entretanto, confere-se a narrativa de um desenvolvimento que é mutuamente do profissional e da situação da(s) pessoa(s) por ele atendida(s). Seja quando a vulnerabilidade de crianças prostituídas é reduzida graças a um trabalho que se vale do gancho das atividades lúdicas para promover o desenvolvimento humano, seja quando os recursos psicológicos de um atleta são potencializados, aperfeiçoando seu desempenho, cada relato confere a história de um desenvolvimento que nunca é apenas para quem é atendido pelo trabalho, mas é também o aperfeiçoamento da prática profissional do psicólogo. Assim, se há algo que subjaz à eleição de cada episódio marcante na carreira dos entrevistados nesse grupo profissional, isso comparece como o sentido de um desenvolvimento constatável na atividade empreendida e no próprio fazer profissional, sempre tendo havido destaque para como essas experiências foram construtivas para suas identidades como psicólogos do esporte.

A construção da identidade profissional dos entrevistados também é ressaltada por eles, os episódios trazem a maneira como eles se perceberam psicólogos do esporte ou perceberam sua atuação como sendo mais própria e competentemente a de um profissional da área. Essa percepção não é uma interpretação de algo implícito aos relatos, mas aparece de modo explícito, constituindo tematicamente as percepções elencadas e refletidas. Profissionalmente, os episódios marcantes ensinaram algo a eles, pois o que os lança a narrá-los parece ser o valor desse aprendizado. Há ampla diversidade temática entre os relatos, mas a mobilização pessoal para narrar o caso parece sempre habitar na mudança e no desenvolvimento promovidos pela experiência. Essa diversidade temática é compatível com a diferença de atuação em Psicologia do Esporte, ainda que atividades nos esportes de alto rendimento componham a maioria das situações contadas, fazendo-se presentes nos depoimentos dos cinco entrevistados.

As narrativas dos episódios marcantes abrangem as pessoas atendidas, bem como as instituições em que as circunstâncias se passaram. A partir de uma demanda institucional ou, ainda, de uma expectativa teórica de atuar seguindo certo padrão previamente aprendido, em todos os relatos vem à tona certo tensionamento que, no decorrer do trabalho contado, se desloca mais direta e comprometidamente para junto das pessoas atendidas. Esse deslocamento se baseia numa consideração progressivamente mais alargada pelos atletas ou jovens acompanhados, o que passa por uma atenção clínica e pelo estabelecimento de um vínculo mais pessoal entre psicólogo e pessoa atendida, assim como por uma consideração ética, face a condutas abusivas - como o caso que levou um profissional a interceder junto ao técnico em busca de alternativas sensíveis à dignidade de seus atletas. Portanto, entre aquilo que as narrativas deixam entrever como as demandas institucionais iniciais e a conduta profissional há uma atenção e abertura para lidar com aspectos latentes, isto é, não presentes objetivamente nas demandas iniciais, que incidem na maneira como os atletas se relacionam com suas atividades esportivas, suas metas de desempenho, a equipe, a família e a sociedade.

As insuficiências ou falhas de atuação, como a omissão inicial a abusos relatados por um depoente, são vistas como problemas que deslocam enfoques, mudam a atuação, constroem a compreensão e a prática que cada entrevistado entende serem próprias à Psicologia do Esporte.

Com relação aos processos reflexivos entre coaches, os quatro profissionais de Educação Física entrevistados têm trajetórias que os aproximaram da Psicologia do Esporte enquanto área do conhecimento, munindo-os de um repertório conceitual consolidado em certas abordagens e em diferentes laboratórios de pesquisa em Psicologia em faculdades de Educação Física. Um deles cursou uma pós-graduação lato sensu em Gestão e Marketing Esportivo, outro, além de uma especialização em treinamento esportivo fez um Mestrado. Dois entrevistados têm trajetórias que se estenderam do Mestrado ao Doutorado e um deles cursava graduação em Psicologia na ocasião em que foi entrevistado. Trata-se, portanto, de um grupo de profissionais com sólida formação acadêmica. Entretanto, o que os reúne nessa amostra é o fato de serem profissionais que se utilizam do Coaching em suas intervenções. Como não existe profissão de coach regulamentada no Brasil, é importante frisar que essa atuação se define como uma estratégia que, no caso deste enfoque, aplica-se no campo esportivo, valendo-se de conhecimentos relacionados à Psicologia do Esporte, sem, contudo, confundir-se com esta. Na prática, a não regulamentação do coach como profissão significa que não há condição prévia, como a necessidade de uma formação específica, para alguém atuar como tal. Nesse sentido, pode-se frisar que a amostra de coaches dessa pesquisa tem um status privilegiado no que tange à formação profissional e acadêmica.

As experiências marcantes, trazidas nos quatro relatos concedidos, ocorreram no esporte de alto rendimento. Todos os casos narrados obedecem a uma linearidade que começa na demanda institucional, passa pela estratégia para atingi-la e apresenta êxito conforme previsto no planejamento. O enfoque maior de suas narrativas é colocado nos procedimentos que levam aos resultados esperados. Os procedimentos abordados diferem, mas compartilham um aspecto comum e compatível com a lógica hegemônica nas ciências naturais, o raciocínio explicativo-causal. Assim, desde o modo de narrar os episódios, até o modo de justificar o sucesso das intervenções, empregam o raciocínio explicativo, procurando ou fornecendo os porquês de um rendimento abaixo ou compatível com o desejado. No decorrer das narrativas, cada entrevistado recorre a um conceito central que media explicativamente a saída de uma condição indesejável para uma condição exitosa, respondendo às demandas das instituições esportivas e que tinham como alvo as melhoras individuais de atletas ou a melhora coletiva de uma equipe. Os conceitos recrutados foram autorregulação, crenças limitantes, motivação e sistematização.

É interessante observar que o emprego desses conceitos, em todos os quatro relatos, ilustrou o episódio marcante elegido, mas também foi generalizado como descritor privilegiado do trabalho realizado por cada coach. Em um dos relatos, comparece a questão a respeito “do que ele (o atleta) precisa para se autorregular” e a ponderação de que nem sempre, num tempo determinado - como o ciclo olímpico - “eu vou conseguir regular uma pessoa” e, “dependendo com quem eu vou trabalhar, quatro anos eu não consigo fazer essa pessoa aprender a se regular”. Por avaliar que nem todo atleta precisa de acompanhamento psicológico, uma vez que há quem já saiba se autorregular e tenha êxito no esporte, confere-se que esse constructo ocupa, para esse coach, a própria razão de ser do trabalho, definindo o objetivo da intervenção como o encontro da combinação ideal de regulação para haver sucesso esportivo. Como constructo privilegiado em outro relato, as “crenças limitantes” aparecem como conceito que ilustra o trabalho de “ajudá-los a entrar em campo com um nível de performance, ou nível de excelência deles”, sem ser, contudo, apresentado como o único fator a ser trabalhado junto aos atletas. A motivação é também empregada em outro para destacar aquilo que este coach mais valoriza em seu trabalho, “pegar um atleta desmotivado (...) e você restaurar ele, você trazer ele de volta”. O planejamento e a sistematização, com uma problematização que passe por diferentes áreas das Ciências do Esporte, são destacados em outro relato como modo de ter um rendimento exitoso, com base no engajamento e comprometimento de um atleta com sua melhora.

No que se refere aos métodos usados para planejar e executar a estratégia, sobressai-se uma escuta que pode ser classificada como socrática, uma noção de mapeamento e de ensino, valendo-se de mensurações que sugerem o emprego de escalas e outros instrumentos para monitorar a efetividade do aprendizado. A menção a outros recursos científicos, como a periodização de treinamento, lembra que esses coaches são profissionais de Educação Física, mesclando a definição de metas com a prescrição de treinos. Nos relatos em que há maior pormenorização acerca dos métodos, nota-se como seu emprego se mantém rente à demanda inicial. A escuta, por exemplo, é prescrita para conduzir o atleta na definição de metas por si próprio, assumindo a responsabilidade por elas. Essa escuta é orientada para o ajuste de novas perguntas que induzam a esse fim. O mapeamento procura os fatores que possam agir e fazer diferença para a finalidade de um planejamento de ação. Há também uma tarefa pedagógica, de ensino e aprendizagem. As narrativas deixam entrever também que a articulação da situação a ser trabalhada recorre a fatores objetivos e outras áreas da ciência que não a Psicologia, sinalizando para a dificuldade de se apreender aspectos da pessoa e da sua subjetividade. No que tange a uma eventual insuficiência do trabalho, além da reiterada menção a um aumento dos conhecimentos a serem adquiridos e aplicados, destaca-se a descrição de quando o coach falha por dizer pelo atleta o que ele deve almejar, pois, uma vez que isso não seja alcançado, a responsabilidade pode ser atribuída a ele quando deveria ser atribuída unicamente às escolhas dos atletas, cabendo ao primeiro apenas facilitar o planejamento para atingi-la.

Uma fenomenologia dos processos reflexivos prevalentes nas práticas interventivas de psicólogos do esporte e coaches

Buscando sua conversão como fenômeno, além de suspender conhecimentos teóricos prévios a respeito da atuação e pensamentos dos dois grupos estudados, o recorte tematizando processos reflexivos tem sua peculiaridade em relação ao modo como os objetos são usualmente definidos nas pesquisas em Psicologia Fenomenológica. Como objetos de experiência (Barreira & Ranieri, 2013Barreira, C. R. A., & Ranieri, L. P. (2013). Aplicação de contribuições de Edith Stein à sistematização de pesquisa fenomenológica em Psicologia: a entrevista como fonte de acesso às vivências. In: M. Mahfoud & M. Massimi (Org.), Edith Stein e a Psicologia: teoria e pesquisa (pp. 449-446). Artesã.; Barreira 2017bBarreira, C. R. A. (2017b). Análise fenomenológica aplicada à Psicologia: recursos operacionais para a pesquisa empírica. In M. Mahfoud & J. S. Filho (Org.), Diálogos com Edith Stein. Filosofia, Psicologia e Educação (pp. 317-368). Paulus.), o ponto de partida dessas investigações costuma ser uma experiência bem delineada, a maneira como se vive a percepção de algo (Telles et al., 2018Telles, T. C. B, Vaittinen, A., & Barreira, C. R. A. (2018). Karate, capoeira and MMA: a phenomenological approach to the process of starting a fight. Revista de Artes Marciales Asiáticas, 13(2), 114-130. http://dx.doi.org/10.18002/rama.v13i2.5119
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; Barreira, 2017bBarreira, C. R. A. (2017b). Análise fenomenológica aplicada à Psicologia: recursos operacionais para a pesquisa empírica. In M. Mahfoud & J. S. Filho (Org.), Diálogos com Edith Stein. Filosofia, Psicologia e Educação (pp. 317-368). Paulus.; Valério & Barreira, 2016Valério, P. H. M., & Barreira, C. R. A. (2015). Arqueologia fenomenológica, fenomenologia genética e Psicologia: rumo à gênese das manifestações culturais. Psicologia USP, 26(3), 430-440. https://doi.org/10.1590/0103-656420140075
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; Salomão et al., 2014Salomão, R. L., Ottoni, G. P., & Barreira, C. R. A. (2014). Atletas de base de futebol: a experiência de viver em alojamento. Psico-USF, 19(3), 443-455.; Ranieri & Barreira, 2010Ranieri, L. P., & Barreira, C. R. A. (2010, Outubro). A entrevista fenomenológica [Apresentação de trabalho]. 4 Seminário Internacional de Pesquisa e Estudos Qualitativos. Rio Claro, São Paulo, Brasil.; Barreira et al., 2009Barreira, C. R. A., Ranieri, L. P., & Carbinatto, M. V. (2009, Maio). O mundo circundante na atividade física: uma investigação fenomenológica [Apresentação de Trabalho]. IV Congresso Internacional de Psicologia e X Semana de Psicologia da UEM, Maringá, Paraná, Brasil.; Ottoni et al., 2008Ottoni, G. P., Ranieri, L. P., & Barreira, C. R. A. (2008). O posicionamento existencial frente à dor: uma aproximação fenomenológica às experiências de atletas lesionados em tratamento. Revista Brasileira de Psicologia e Esportes, 2(2), 1-32.; Barreira, 2019Barreira, C. R. A. (2019). Da violência no combate: o que dizem os lutadores de MMA. Psicologia & Sociedade, 31, e218158. https://dx.doi.org/10.1590/1807-0310/2019v31218158
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, 2017aBarreira, C. R. A. (2017a). A norma sensível à prova da violência: o corpo a corpo em disputa sob a ótica fenomenológica em Psicologia do Esporte. Phenomenological Studies: Revista da abordagem gestáltica, 22(3), 278-292., 2013Barreira, C. R. A. (2013). Fenomenologia do combate: da ética da luta a luta pela vida ética. In M. Mahfoud & M. Massimi (Org.), Edith Stein e a Psicologia: teoria e pesquisa (pp. 449-466). Artesã., 2010Barreira, C. R. A. (2010, Outubro). Uma análise fenomenológica da luta corporal e da arte marcial [Apresentação de trabalho]. Seminário Internacional de Pesquisas e Estudos Qualitativos. Rio Claro, São Paulo, Brasil. , 2006Barreira, C. R. A. (2006). A alteridade subtraída: o outro no esvaziamento do karate e na redução fenomenológica. Mnemosine, 2(2), 106-118.; Barreira & Massimi, 2008Barreira, C. R. A., & Massimi, M. (2008). O combate subtrativo: a espiritualidade do esvaziamento como norte da filosofia corporal no Karate-Do. Psicologia: Reflexão e Crítica, 21(2), 283-292. https://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722008000200014
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, 2006Barreira, C. R. A., & Massimi, M. (2006). O caminho espiritual do corpo: a dinâmica psíquica no karate-do shotokan. Memorandum, 11, 85-101.). Já o objeto “processo reflexivo” não é a percepção de algo, mas uma “percepção” de percepções. Essa “percepção segunda” consiste na atividade reflexiva e não se define propriamente como um objeto, mas como um modo de acessar objetos, como uma maneira de fazer, articulando ação, motivação e avaliação. Trata-se de uma camada operativa correspondente ao que, segundo a antropologia fenomenológica de Husserl (2012Husserl, E. (2012). A crise das ciências européias e a Fenomenologia Transcendental. Uma introdução à Filosofia Fenomenológica (D. F. Ferrer, Trad.). Forense Universitária. (Trabalho original publicado em 1935)) e Edith Stein (1999Stein, E. (1999). Psicologia e scienze dello spirito: contributi per una fondazione filosófica (A. M. Pezzella, Trad.). Città Nuova. (Trabalho original publicado em 1922)), se denomina por atividade espiritual, o que contempla as ações intelectivas e volitivas (Stein, 1999Stein, E. (1999). Psicologia e scienze dello spirito: contributi per una fondazione filosófica (A. M. Pezzella, Trad.). Città Nuova. (Trabalho original publicado em 1922); Ales Bello, 2004Ales Bello, A. (2004). Fenomenologia e ciências humanas: Psicologia, história e religião (M. Mahfoud & M. Massimi, Org., Trad.). Edusc., 2006Ales Bello, A. (2006). Introdução à fenomenologia. Edusc., 2015Ales Bello, A. (2015). Pessoa e comunidade: comentários: Psicologia e Ciências do Espírito de Edith Stein (M. Mahfoud & J. T. Garcia, Trad.). Artesã. (Trabalho original publicado em 2015); Coelho Júnior & Mahfoud, 2006Coelho Júnior, A. G., & Mahfoud, M. (2006). A relação pessoa-comunidade na obra de Edith Stein. Memorandum, 11, 8-27.; Coelho Júnior & Barreira, 2018, 2023Coelho Júnior, A. G., & Barreira, C. R. A. (2023). Autenticidade e corporeidade na psicologia fenomenológica de Edith Stein. Pedro & João Editores.; Barreira, 2007Barreira, C. R. A. (2007, Novembro). A fenomenologia como ciência das dimensões existenciais da atividade física: uma abordagem em Psicologia do esporte [Apresentação de trabalho]. XIV Encontro Nacional da ABRAPSO. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.).

A reflexão é um processo mediante o qual um objeto é tematizado, sendo situado num horizonte que implica seu antes e depois, suas iniciativas e perspectivas, ou mesmo abstraído desse horizonte original, num recorte que o concebe cognitivamente como separado da concretude em que se manifesta na percepção mundana. Deve-se pontuar, também, que o próprio objeto tematizado comparece sob o prisma do processo reflexivo, participando desse processo tanto na maneira de perceber quanto na que é percebido. Assim, embora se possa apelidar a reflexão de “percepção segunda”, como se fez anteriormente, esse segundo momento participa ativa e entrelaçadamente da maneira como as percepções primárias são apreendidas, organizadas e expressas nos relatos de experiência. Isso significa que a participação íntima de um momento e outro - percepções (do episódio narrado) e “percepção das percepções” (reflexão) - não autoriza sua separação plena. Mais do que isso, em grande medida, a reflexão retrospectiva que ocorre durante a entrevista retoma o processo reflexivo ocorrido durante a ação do profissional no episódio relatado. Na presente análise, não há interesse em diferenciar o processo reflexivo ocorrido no episódio daquele que se passa no ato da entrevista, ou seja, entre reflexão retrospectiva e reflexão atual. A aparente exceção é na questão que demanda uma avaliação atual sobre como o entrevistado agiria na mesma situação, o que o provoca a pensar se poderia agir melhor do que fez. Com efeito, considerar a reflexão como um mesmo processo, haja ou não continuidades e descontinuidades, permite apreender seu engendramento no ato, sendo um processo simultaneamente retrospectivo e atual. Nesse sentido, embora a literatura dedicada aos processos reflexivos opere com diferenciações como o conhecimento na ação - a reflexão na ação e a reflexão sobre a ação (Schön, 1987Schön, D. (1987). Educating the reflective practitioner. Jossey Bass., 2000/1998Schön, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem (R. C. Costa, Trad.). Artes Médicas Sul. (Trabalho original publicado em 1998)) -, estas análises dispensam tais categorizações, suspendendo-as para privilegiar o processo como uma unidade.

O objeto examinado nesta investigação é como psicólogos e coaches refletem acerca de e em suas práticas interventivas, de acordo com o recorte delineado pela amostra apresentada e pelos procedimentos empreendidos, isto é, como esses profissionais articulam ações motivos e avaliação. Constatou-se que os psicólogos têm uma abertura a variados contextos práticos de intervenção, recrutando episódios que se mobilizam pela constatação de como suas ações fomentaram um desenvolvimento que é contemporaneamente das pessoas atendidas e de sua própria potência interventiva, o que participa da formação de sua identidade profissional.

As pessoas atendidas pelos psicólogos estão sempre posicionadas sob o fundo institucional ou social em que comparecem. Essa relação entre pessoa e instituição, diretamente ligada à demanda pela intervenção psicológica, é tensionada num território de valores que concorrem, conjugada ou contrariamente, numa oscilação cujos desequilíbrios demonstram o comprometimento ético dos psicólogos entrevistados com as pessoas, sua dignidade e bem-estar. Diferentemente do que possa soar, esse comprometimento ético com as pessoas não se dá por oposição, afastamento ou separação da instituição e de suas exigências, mas equivale a um enfoque prioritário na pessoa, em sua lida institucional, havendo um exercício de mediação que contemple vias de otimização entre exigências institucionais e respostas pessoais. A atenção às pessoas atendidas passa pelas demandas, desenvolvendo-se por um vínculo e uma atenção clínica que abrange aspectos latentes irredutíveis às demandas iniciais1 1 Atenção clínica não deve ser confundida com o setting clínico tradicional (o consultório), nem com a noção antiquada e vulgarizada por diferenciações correntes internacionalmente e importadas ao Brasil de um atendimento destinado às psicopatologias. No Brasil, há tempos a noção de clínica ampliada leva a práticas psicológicas um “olhar” informado pelas reflexões a respeito dos processos de subjetivação a contextos muito diferentes do estritamente terapêutico. .

Já os coaches, a considerar pela análise do recorte delineado pela amostra intencional que concedeu entrevista, operam com um processo reflexivo fechado na seara do esporte de alto rendimento e seguindo um raciocínio notadamente técnico. A linearidade exitosa e suas intervenções, que vai das demandas, passa pelos procedimentos e chega aos resultados conquistados, é explicada por fatores causais objetivos e, eventualmente, mensuráveis. O recurso a outras áreas do conhecimento científico é mencionado frequentemente, em especial ao treinamento esportivo. O foco dos Coaches é clara e objetivamente o desempenho e o resultado pretendido pelos atletas2 2 Ainda que um coach entrevistado tenha mencionado o valor do desenvolvimento da pessoa, deve-se pontuar que sua problematização compareceu na tangência de questões que emergem em seu curso de graduação em Psicologia, momento da entrevista no qual a insuficiência do conhecimento objetivo veio à tona, sendo declarado por ele mesmo. .

Alinhado com a fenomenologia, Bondia (2002Bondia, Jorge L. (2002). Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de Educação, (19), 20-28.) considera que experiência é tudo aquilo que nos acontece, mas seu entendimento relaciona-se com o modo como se elabora o sentido do ocorrido. Assim, a compreensão da experiência constitui um entendimento particular, subjetivo, relativo, contingente e pessoal. Refletir sobre uma experiência é um processo subjetivo, no qual mesmo que duas pessoas vivenciem acontecimentos similares, não têm a mesma experiência dessas circunstâncias. A partir disso, sob operação das reduções fenomenológicas, mais especificamente do cruzamento intencional (Barreira, 2017bBarreira, C. R. A. (2017b). Análise fenomenológica aplicada à Psicologia: recursos operacionais para a pesquisa empírica. In M. Mahfoud & J. S. Filho (Org.), Diálogos com Edith Stein. Filosofia, Psicologia e Educação (pp. 317-368). Paulus.), é possível colher os elementos essenciais constitutivos do que se apreende como vivências intencionais de experiências de diferentes pessoas. Nesse sentido, a comparação entre as análises dos dois grupos evidencia que seus processos reflexivos são muito diferentes, desde a maneira como percebem as pessoas atendidas, até a maneira como concebem os fins de seus trabalhos, passando, notadamente, pelo modo como operacionalizam suas intervenções. Embora não haja detalhamento dessa operacionalização, pois não era o foco da pesquisa, os processos reflexivos prevalentes nos grupos estudados são diferentes o suficiente para se constatar que as mínimas sobreposições que possam existir em suas atuações estão longe de sugerir que os grupos façam trabalhos semelhantes.

A análise mostra que psicólogos do esporte mantêm uma abertura para explorar as situações vividas pelos atletas, algo que desdobra as demandas iniciais a partir do próprio trabalho com as pessoas. Focados na demanda inicial, coaches acessam as pessoas atendidas para levantar dados que possibilitem o planejamento objetivo de uma estratégia para atingir metas. Disso participa, por exemplo, a prescrição de treinos baseada em periodização, tarefa que os psicólogos não realizam3 3 Psicólogos não prescrevem periodização de treinamento esportivo, tarefa exclusiva dos profissionais de Educação Física e Esporte, o que não quer dizer que não haja uma periodização da preparação psicológica. A rigor, essa última periodização seria correlata àquela prescrita para o treinamento esportivo. . O método usado pelos Coaches não é questionado por eles em seus relatos, mas assumido seguramente como correto e certeiro. Por outro lado, falhas em sua aplicação se traduzem em resultados ruins e podem refletir negativamente na reputação do coach. Quando o método é corretamente aplicado, o eventual insucesso é de responsabilidade exclusiva do atleta.

De algum modo, pode-se ver aí que a compreensão da experiência relatada pelos coaches, tal qual descrita por Bondia (2002Bondia, Jorge L. (2002). Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de Educação, (19), 20-28.), é tão atravessada pela narrativa idealizada e objetiva do método usado que fica encoberta. Não seria exagero dizer que, em boa medida, a experiência (o que aconteceu com cada entrevistado) se alinha e se reduz aos elementos que se encaixam na narrativa prescrita pelo método e em seus critérios objetivos, tanto os de tomada de decisão como os de resultados, sucesso e insucessos. Nesse sentido, grande parte da experiência dos entrevistados parece se camuflar pela narrativa inerente ao método, preenchendo-a apenas com os acontecimentos próprios à especificidade da intervenção feita por cada um.

Já os psicólogos - de modo radicalmente diverso - questionam e problematizam o que foi aprendido e a maneira como procedem a partir de suas experiências, considerando-as em seu próprio processo de formação4 4 Os coachs, diferentemente, num raciocínio cumulativo, mencionaram a importância de somar conhecimentos e contar com diferentes áreas da Ciência dos Esportes, mas não questionaram ou problematizaram o conhecimento de que se valem a ponto de expressar mudança em sua intervenção, com base nessa reflexão questionadora. . Para eles, sua própria atuação e a consequência pessoal para quem é atendido se conjugam, vinculando-se num processo que as faz menos apreciadas pelo resultado objetivo do que pelo desenvolvimento pessoal para o atleta, como o ganho de recursos deste para lidar com seu desempenho e atingir metas.

Problematizações éticas estiveram inteiramente ausentes dos relatos concedidos por coaches, enquanto se repetiram nos relatos dos psicólogos. Dois dos quatro coaches entrevistados referiram-se negativamente ao trabalho de psicólogos do esporte, sugerindo que lhes falta conhecimento específico das Ciências do Esporte, como o trabalho com periodização, ou que os psicólogos procurariam problemas ou dificuldades para justificarem a necessidade de seu trabalho. Dos cinco entrevistados, um(a) psicólogo(a) referiu-se ao trabalho do coach, tecendo elogios à maneira clara como, em comparação aos próprios colegas de profissão, eles apresentam o trabalho que desenvolvem. O teor das críticas e do elogio, longe de serem estritamente pessoais, refletem o tensionamento histórico que situa a Psicologia do Esporte entre a área da Educação Física e das Ciências do Esporte e a área da Psicologia, merecendo pontuações.

Para tanto, é importante resgatar, em termos históricos, uma polarização a respeito do espaço ocupado pela PE, afirmada por um lado como sendo uma área da Psicologia, por outro como uma subárea das Ciências do Esporte. Ambas as perspectivas confluem, entretanto, no que se refere ao ponto de partida: conceitos e objetos de estudo da Psicologia (personalidade, motivação, traço, facilitação social, assertividade) aplicados à busca pela produção de um conhecimento singular da Psicologia do Esporte. A consequência desses empenhos pela ocupação de espaços culminou em teorias e métodos inacabados, pelo fato de as Ciências do Esporte não contemplarem de modo integral o sujeito ou o fenômeno estudado, esquivando-se, pela própria concepção de ciência que os norteava, do tema da subjetividade e da pessoa, por exemplo. Isso pode ter dificultado o início das criações e ampliações de referenciais teóricos para a área, adiando o progresso e o crescimento da Psicologia do Esporte (Rubio, 2004Rubio, K. (2004) Rendimento esportivo ou rendimento humano? O que busca a Psicologia do esporte. Psicologia para América Latina. (1), 1-7.).

Pode-se considerar que, como subárea das Ciências do Esporte, a ancoragem em conceitos objetivos ajudou a formular uma linguagem que, articulada com o método Coaching, comunica muito prontamente seus meios e fins. A cultura esportiva contemporânea é bastante apegada a uma linguagem assertiva, eco da efetividade esperada em sua prática e dos anseios por resultados que encontram ressonância nesse linguajar. Essa objetividade também é congruente ao método das ciências naturais, predominante no campo mais prático do esporte de alto rendimento, em que esses métodos socorrem o desenvolvimento de prescrições de treinamento e afins5 5 Deve-se esclarecer, contudo, que as Ciências do Esporte são bem mais amplas e irrestritas ao modelo natural, contemplando a sociologia e antropologia, por exemplo, que se pautam no modelo das ciências sociais e humanas. O impacto delas junto aos profissionais que atuam no esporte de alto rendimento é bem menos aplicado do que o domínio objetivo informado pelas ciências da natureza. . Isso justifica o elogio de um(a) entrevistado(a) psicólogo(a) à clareza da apresentação dos coaches, aspecto inteiramente compatível com os processos de reflexividade evidenciados nesta investigação. Por outro lado, os psicólogos, abertos à subjetividade, a considerar pela razão do elogio, apresentam seu trabalho de modo menos assertivo e objetivo, o que também é compatível com as problematizações inerentes aos processos de reflexividade constatados junto ao PE’s entrevistados.

As críticas direcionadas aos psicólogos por parte de coaches entrevistados, por sua vez, ecoam posições presentes na literatura. Isso é bem ilustrado em recente publicação internacional sobre a história da Psicologia do Esporte no Brasil. Vinculados à extinta Sociedade Brasileira de Psicologia do Esporte (SOBRAPE) e à atual Associação Brasileira de Estudos em Psicologia do Esporte e do Exercício (ABEPEEx), os autores concluem um parágrafo mencionando que: “Em relação à prática profissional, é evidente um maior envolvimento de profissionais da Psicologia; no entanto, esses profissionais não possuem conhecimentos esportivos e requerem treinamento complementar” (Noce et al., 2016Noce, F., Vieira, L. F., & Costa, V. T. (2016). Brazil. In R. J. Schinke, K. R. McGannon & B. Smith (Org.), Routledge International Handbook of Sport Psychology (pp. 56-64). Routledge., p. 67)6 6 “Regarding professional practice, a greater involvement of professionals from psychology is evident; however, these professionals lack sports knowledge and require complementary training” (Noce et al., 2016, p. 67). . O parágrafo seguinte, por outro lado, é iniciado informando que “Muitos professores de Educação Física já fizeram esse treinamento complementar em Psicologia” (Noce et al., 2016Noce, F., Vieira, L. F., & Costa, V. T. (2016). Brazil. In R. J. Schinke, K. R. McGannon & B. Smith (Org.), Routledge International Handbook of Sport Psychology (pp. 56-64). Routledge., p. 67)7 7 “Many physical education teachers have already pursued this complementary training in psychology” (Noce et al., 2016, p. 67). . Curiosamente, algumas páginas antes, a publicação cita textualmente os requisitos do Conselho Federal de Psicologia, informados pela Resolução 02/01 (2001Conselho Federal de Psicologia. Resolução CFP nº 02/01. (2001). Altera e regulamenta a Resolução CFP nº 014/00 que institui o título profissional de especialista em Psicologia e o respectivo registro nos Conselhos Regionais. Conselho Federal de Psicologia. https://bit.ly/3bSvBPV
https://bit.ly/3bSvBPV...
), para o profissional da área ter o título de especialista em PE, que envolvem nitidamente o domínio de conhecimentos sobre esporte.

Ao negligenciar o fato precisamente na conclusão do capítulo, o trecho citado é sintomático não apenas da tensão pontuada, mas de como a crítica dos coaches a respeito da atuação dos psicólogos segue institucionalizada, mesmo vinte anos após a Resolução 02/01 (Conselho Federal de Psicologia [CFP], 2001Conselho Federal de Psicologia. Resolução CFP nº 02/01. (2001). Altera e regulamenta a Resolução CFP nº 014/00 que institui o título profissional de especialista em Psicologia e o respectivo registro nos Conselhos Regionais. Conselho Federal de Psicologia. https://bit.ly/3bSvBPV
https://bit.ly/3bSvBPV...
)8 8 Naquele mesmo ano, De Rose (2000, p. 30) afirmava que “há psicólogos desprovidos do conhecimento específico do esporte que se aventuram a utilizar técnicas de intervenção não compatíveis para se ‘tratar’ um paciente tão diferenciado quanto um atleta que está acostumado à vida à beira de um campo, pista, quadra ou piscina”. . Afinal, se é verdade que “professores de Educação Física já fizeram esse treinamento complementar em Psicologia”, o contrário não é menos válido9 9 Se, diferentemente, a mensagem implícita dos autores é de que Psicólogos dominem conhecimentos específicos do esporte como o fazem os profissionais de Educação Física e Esporte, estamos diante de uma confusão entre papéis e funções profissionais que tangem à esfera da legalidade e que também foi amplamente discutida décadas atrás (veja-se o mesmo De Rose, 2000). Da mesma maneira, se, por formação complementar, os autores se referem à Graduação em Psicologia por parte de profissionais de Educação Física, caso da primeira autora desse artigo, deve-se alertar para os riscos de mistura de papéis entre técnico e psicólogo: o técnico depreciaria sua autoridade prescritiva quando tentasse continuamente exercer a função de psicólogo, posição na qual a relação de abertura compreensiva é essencial; o psicólogo depreciaria o acesso à subjetividade do atleta quando dele cobrasse com frequência que seguisse rigorosamente suas instruções técnicas. A especificidade relacional de cada um destes papéis deve ser resguardada, o que não significa que técnicos não possam ser compreensivos nem que psicólogos não possam dar instruções objetivas aos atletas, ao contrário, estas são qualidades bem-vindas a ambos os papéis. O que muda é a extensão e o alcance dessas qualidades como atividades determinantes de todo o horizonte relacional entre técnico e atleta e psicólogo e atleta/equipe. . Ao mesmo tempo, profissionais que não tenham feito formação complementar, por seu turno, não são exclusividade de uma profissão ou de outra. Os paralelos entre conteúdos das entrevistas, história da área e tensões que se refletem institucionalmente em publicações como as citadas permitem um alargamento das reflexões e consequências dessa análise fenomenológica.

Face a uma temática - processo de reflexividade - que pode aparentar ser tão volúvel e abstrata, passível de ser afetada por tantas forças, como o histórico de cada pessoa, as instituições em que se formaram, o momento histórico, a continuidade na academia, por exemplo, é importante seguir situando o recorte pelo qual a investigação se acerca do objeto. O fato de que os processos reflexivos podem variar a depender de suas influências, contudo, não reduz o valor ou precisão desses achados, ao contrário, mostra a consistência entre fenômenos reflexivos e fatos históricos, recordando, por essa congruência, que os processos reflexivos são situados socio-historicamente. E como tais, estes resultados alcançados expressam processos reflexivos típicos. Isso significa que permitem considerar a relevância e a diferenciação de processos reflexivos que devem, pela institucionalização da Psicologia e do coach, ser correlacionados a seus processos formativos institucionais. Isso porque os processos reflexivos descritos são coerentes tanto com o procedimento metódico do Coaching - e com as insuficiências deste comparativamente à ciência psicológica, insuficiência também acusada por um coach entrevistado - como com a complexidade inerente à pessoa humana, bem refletida na complexidade da própria Psicologia.

O comprometimento com essa complexidade parece se estender ainda com as dificuldades que os psicólogos encontram para apresentarem seu trabalho com a simplicidade que a sociedade pode requerer, conforme considerou um(a) do(a)s psicólogo(a)s entrevistado(a)s, ao notar a assertividade com que a proposta do coach atinge um público que poderia se beneficiar mais do trabalho de um psicólogo do esporte. Assim, se por um lado os trabalhos de psicólogos do esporte e coaches são muito diferentes e não se sobrepõem, por outro lado as necessidades destes trabalhos podem parecer se sobrepor.

Considerações finais

O objetivo deste estudo foi identificar e compreender as experiências reflexivas de psicólogos do esporte e coaches em sua atuação profissional. Entrar nesse movimento reflexivo pode não ser uma tarefa fácil, requerendo disposição para expor aspectos caros da própria identidade pessoal e profissional.

Para além dos resultados e de sua discussão específica, todavia, conclusivamente, tecemos algumas considerações acerca das atuações profissionais, em especial a partir da Psicologia. A formação em Psicologia envolve disciplinas de ciências biológicas, mas tende a ser hegemonicamente baseada em disciplinas das ciências humanas e sociais. A formação em Educação Física tende a ser, hegemonicamente, o contrário, especialmente quando lida com alto rendimento - caso de todos os coaches entrevistados. É fácil constatar como o conhecimento de Psicologia do Esporte de ambos os grupos se submete aos horizontes de suas formações. Os recursos conceituais da área operados pelos Coaches não os abrem à subjetividade dos atletas, mas lhes serve para colher as informações que alimentarão um processo motivacional pré-estabelecido e objetivo. Seu trabalho não é de psicólogo, embora, muitas vezes, tenham e se apresentem com a aparência de algo que substitui esse profissional. Sem dúvida o prejuízo é para a área esportiva e para os atletas, uma vez que deixam de contar com recursos profissionais cuja habilitação não é fornecida pela graduação em Educação Física, por uma especialização, por um Mestrado, nem por um Doutorado. Esta é uma constatação objetiva dos resultados produzidos com base numa amostra de coaches portadora de vários desses títulos e que coloca em prática um processo reflexivo incompatível com o dos psicólogos e com, acrescentemos, o que a Psicologia presume.

Portanto, constata-se como, para os coaches, os recursos de seu método e da PE vêm em socorro da aplicação de seus conhecimentos de periodização e treinamento esportivo para lidar com a motivação do atleta. A objetividade é anterior à subjetividade, o método motivacional é prescrito e não integra esses profissionais em tudo aquilo que envolve, antecede e sucede, o conteúdo volitivo explícito para a tarefa esportiva. Nesse sentido, eles fazem a tarefa de uma espécie de assessor técnico acionado para coordenar metas, treinamento e motivação do atleta/equipe. Seu trabalho profissional seria, assim, qualificado com base nesses recursos, o que, sob alguns cuidados, pode ser louvável. Entretanto, quando rejeitam o trabalho do psicólogo, presumem implicitamente que estejam atuando no lugar desse profissional, além de não terem a competência para compreensão das pessoas como os psicólogos, cuja formação problematiza o sujeito em sua complexidade, visando atendê-lo eticamente, há incompatibilidade relacional entre os papéis profissionais de técnico e psicólogo, com prejuízo para ambas as funções sempre que alguém se predispuser a executá-las sozinho10 10 Trata-se aqui exclusivamente do alto rendimento, único setor esportivo em que os Coaches mencionaram atuar. . Esse posicionamento se enche de gravidade quando é reforçado institucionalmente, impedindo que mais de duas décadas de páginas da Psicologia do Esporte brasileira sejam viradas em favor da atuação multiprofissional no Esporte.

Espera-se que esse trabalho, evidenciando não os resultados concretos das práticas profissionais, os antagonismos da história ou as instituições que a construíram, mas o próprio modo de refletir de duas categorias profissionais, favoreça um trabalho multiprofissional mais colaborativo e frutífero, em favor do esporte e de seus protagonistas.

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  • Weinberg, R. S., & Gould, D. (2017). Fundamentos da Psicologia do Esporte e do Exercício. (6a ed). Artmed.
  • 1
    Atenção clínica não deve ser confundida com o setting clínico tradicional (o consultório), nem com a noção antiquada e vulgarizada por diferenciações correntes internacionalmente e importadas ao Brasil de um atendimento destinado às psicopatologias. No Brasil, há tempos a noção de clínica ampliada leva a práticas psicológicas um “olhar” informado pelas reflexões a respeito dos processos de subjetivação a contextos muito diferentes do estritamente terapêutico.
  • 2
    Ainda que um coach entrevistado tenha mencionado o valor do desenvolvimento da pessoa, deve-se pontuar que sua problematização compareceu na tangência de questões que emergem em seu curso de graduação em Psicologia, momento da entrevista no qual a insuficiência do conhecimento objetivo veio à tona, sendo declarado por ele mesmo.
  • 3
    Psicólogos não prescrevem periodização de treinamento esportivo, tarefa exclusiva dos profissionais de Educação Física e Esporte, o que não quer dizer que não haja uma periodização da preparação psicológica. A rigor, essa última periodização seria correlata àquela prescrita para o treinamento esportivo.
  • 4
    Os coachs, diferentemente, num raciocínio cumulativo, mencionaram a importância de somar conhecimentos e contar com diferentes áreas da Ciência dos Esportes, mas não questionaram ou problematizaram o conhecimento de que se valem a ponto de expressar mudança em sua intervenção, com base nessa reflexão questionadora.
  • 5
    Deve-se esclarecer, contudo, que as Ciências do Esporte são bem mais amplas e irrestritas ao modelo natural, contemplando a sociologia e antropologia, por exemplo, que se pautam no modelo das ciências sociais e humanas. O impacto delas junto aos profissionais que atuam no esporte de alto rendimento é bem menos aplicado do que o domínio objetivo informado pelas ciências da natureza.
  • 6
    “Regarding professional practice, a greater involvement of professionals from psychology is evident; however, these professionals lack sports knowledge and require complementary training” (Noce et al., 2016Noce, F., Vieira, L. F., & Costa, V. T. (2016). Brazil. In R. J. Schinke, K. R. McGannon & B. Smith (Org.), Routledge International Handbook of Sport Psychology (pp. 56-64). Routledge., p. 67).
  • 7
    “Many physical education teachers have already pursued this complementary training in psychology” (Noce et al., 2016Noce, F., Vieira, L. F., & Costa, V. T. (2016). Brazil. In R. J. Schinke, K. R. McGannon & B. Smith (Org.), Routledge International Handbook of Sport Psychology (pp. 56-64). Routledge., p. 67).
  • 8
    Naquele mesmo ano, De Rose (2000, p. 30) afirmava que “há psicólogos desprovidos do conhecimento específico do esporte que se aventuram a utilizar técnicas de intervenção não compatíveis para se ‘tratar’ um paciente tão diferenciado quanto um atleta que está acostumado à vida à beira de um campo, pista, quadra ou piscina”.
  • 9
    Se, diferentemente, a mensagem implícita dos autores é de que Psicólogos dominem conhecimentos específicos do esporte como o fazem os profissionais de Educação Física e Esporte, estamos diante de uma confusão entre papéis e funções profissionais que tangem à esfera da legalidade e que também foi amplamente discutida décadas atrás (veja-se o mesmo De Rose, 2000). Da mesma maneira, se, por formação complementar, os autores se referem à Graduação em Psicologia por parte de profissionais de Educação Física, caso da primeira autora desse artigo, deve-se alertar para os riscos de mistura de papéis entre técnico e psicólogo: o técnico depreciaria sua autoridade prescritiva quando tentasse continuamente exercer a função de psicólogo, posição na qual a relação de abertura compreensiva é essencial; o psicólogo depreciaria o acesso à subjetividade do atleta quando dele cobrasse com frequência que seguisse rigorosamente suas instruções técnicas. A especificidade relacional de cada um destes papéis deve ser resguardada, o que não significa que técnicos não possam ser compreensivos nem que psicólogos não possam dar instruções objetivas aos atletas, ao contrário, estas são qualidades bem-vindas a ambos os papéis. O que muda é a extensão e o alcance dessas qualidades como atividades determinantes de todo o horizonte relacional entre técnico e atleta e psicólogo e atleta/equipe.
  • 10
    Trata-se aqui exclusivamente do alto rendimento, único setor esportivo em que os Coaches mencionaram atuar.
  • Os resultados apresentados são parte do escopo do Auxílio Regular à Pesquisa FAPESP (2019/11527-6). Este estudo está vinculado ao Grupo de Trabalho de Psicologia do Esporte da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (GT 56 - Psicologia do Esporte da ANPEPP), de que participam os autores.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2021
  • Aceito
    23 Maio 2022
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