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“Somos a Terra Lutando para Sobreviver”: Histórias de Vida de Mulheres Agroecologistas

“We are the Earth struggling to survive”: Life Stories of Female Agroecologists

“Somos la Tierra Luchando por Sobrevivir”: Historias de Vida de Mujeres Agroecólogas

Resumo

A luta pela terra e seu uso incide na forma como as subjetividades têm sido produzidas no Brasil. No contexto capitalista, patriarcal e machista, vive-se um processo de exploração da mão de obra de mulheres e de recursos naturais da Terra. Este estudo objetivou conhecer histórias de vida de mulheres agricultoras rurais que participam de movimentos sociais agroecológicos no Rio Grande do Sul. Participaram do estudo três mulheres agricultoras, com idades entre 21 e 53 anos, residentes e trabalhadoras em zonas rurais das cidades de Viamão e Rolante, escolhidas por conveniência. Os instrumentos utilizados foram: questionário sociodemográfico, entrevista de história de vida e observação participante, os quais foram, posteriormente, submetidos à análise temática. Os resultados demonstram que as histórias de vida das mulheres relatadas são marcadas por lutas e formas de resistência. Para além das situações de conflitos e falta de recursos, avistam-se questões próprias de gênero, como a invisibilidade feminina e a desigualdade no acesso à terra por mulheres. A construção de base e o fortalecimento do papel político das mulheres nos movimentos sociais permite inferir que existem melhorias significativas nas desigualdades e injustiças no meio rural. Contudo, pontua-se a necessidade de se promover o diálogo entre os movimentos sociais, as mulheres e a sociedade política sobre os modelos atuais de políticas públicas existentes, possibilitando, assim, avançar nas discussões a respeito da promoção da equidade de gênero nos espaços rurais, bem como potencializar o avanço das práticas agroecológicas em direção à superação do capitalismo.

Palavras-chave:
Estudos de Gênero; Agroecologia; Meio Rural; Mulheres; Psicologia Social

Abstract

The struggle for land and its use affects the way subjectivities have been produced in Brazil. In the capitalist, patriarchal, and male-chauvinist context, women’s labor and the Earth’s natural resources are strongly exploited. This study aimed to know the life stories of female farmers who participate in agroecological social movements in the state of Rio Grande do Sul. Three female farmers, aged from 21 to 53, residents and workers in rural areas of the municipalities of Viamão and Rolante, chosen by convenience, participated in the study. The instruments used were: sociodemographic questionnaire, a life story interview, and participant observation, which were later subjected to thematic analysis. The results show that the participants’ life stories are marked by struggles and means of resistance. In addition to conflicts and lack of resources, there are specific gender issues, such as female invisibility and inequality in women’s access to land. The grassroots construction and the strengthening of the political role of women in social movements allow us to infer that there are significant improvements in inequalities and injustices in rural areas. However, it is necessary to promote dialogue between social movements, women, and political society about the current models of existing public policies, thus making it possible to advance in discussions about gender equity in rural spaces, as well as to enhance the advancement of agroecological practices to overcoming capitalism.

Keywords:
Gender Studies; Agroecology; Countryside; Women; Social Psychology

Resumen

La lucha por la tierra y su uso afecta a la forma en que se han producido las subjetividades en Brasil. En el contexto capitalista, patriarcal y machista, hay un proceso de explotación del trabajo de las mujeres y de los recursos naturales de la tierra. Este estudio tuvo como objetivo conocer las historias de vida de agricultoras rurales que participan en movimientos sociales agroecológicos en Rio Grande do Sul (Brasil). Participaron en el estudio tres agricultoras, de entre 21 y 53 años, residentes y trabajadoras en áreas rurales de las ciudades de Viamão y Rolante, elegidas por conveniencia. Los instrumentos utilizados fueron: cuestionario sociodemográfico, entrevista de historia de vida y observación participante, cuyos datos posteriormente se sometieron a análisis temático. Los resultados muestran que las historias de vida de las mujeres relatadas están marcadas por luchas y formas de resistencia. A las situaciones de conflicto y falta de recursos se suman cuestiones específicas de género, como la invisibilidad femenina y la desigualdad en el acceso de las mujeres a la tierra. La construcción popular y el fortalecimiento del papel político de las mujeres en los movimientos sociales permiten inferir que hay mejoras significativas en las desigualdades e injusticias en las zonas rurales. Sin embargo, es necesario promover el diálogo entre los movimientos sociales, las mujeres y la sociedad sobre los modelos actuales de las políticas públicas existentes, para posibilitar avances en las discusiones sobre la promoción de la equidad de género en los espacios rurales y potenciar el avance de las prácticas agroecológicas hacia la superación del capitalismo.

Palabras clave:
Estudios de Género; Agroecología; Campo; Mujer; Psicología Social

Introdução

A luta pela terra e suas formas de uso incidem direta ou indiretamente na maneira como as subjetividades dos brasileiros e brasileiras têm sido produzidas (Ieno, 2013Ieno, G. (2013). Prefácio. In J. F. Leite & M. Dimenstein, M. (Orgs.), Psicologia e Contextos Rurais. (pp. 8-27). EDUFRN.). Pensando nos processos identitários específicos do meio rural, deve-se levar em conta as questões de gênero, as formas de organização no trabalho, as constituições familiares, as percepções dos habitantes a respeito da ecologia e do desenvolvimento sustentável, as políticas públicas e a forma de organização social. Ressalta-se ainda a especificidade do último item, dando ênfase aos movimentos sociais como forma de organização social (Albuquerque, 2002Albuquerque, F. J. B. (2002). Psicologia Social e Formas de Vida Rural no Brasil. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 18(1), 37-42. doi: 10.1590/S0102-37722002000100005
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).

Considerando tais aspectos, falar sobre histórias de vida no Brasil, principalmente buscando compreender seus aspectos subjetivos, implica, necessariamente, compreender as bases sociais e históricas nas quais as subjetividades dos povos foram constituídas. O Brasil vive, desde seu processo de colonização, um período de guerras, mesmo que não abertamente declaradas. A constituição histórica do país é de base colonial escravocrata. Os invasores ocuparam as terras do país e dizimaram os povos originários, escravizaram povos trazidos de outros continentes e daqui exploraram bens e pessoas com a finalidade de sanar suas necessidades mercantis e econômicas, através de processos conflitivos que seguem acontecendo até os dias atuais (Costa & Mendes, 2020Costa, P. H. A., & Mendes, K. T. (2020). Colonização, Guerra e Saúde Mental: Fanon, Martín-Baró e as Implicações para a Psicologia Brasileira. Psicologia: Teoria e Pesquisa , 36(e36nspe14), 1-12. doi: 10.1590/0102.3772e36nsp
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). Exemplo disso foram os movimentos de desmonte das políticas ambientais e protetivas dos povos tradicionais e indígenas articuladas nos últimos anos no Brasil. Dentre eles podem ser citados o Projeto de Lei nº 191/2020, que regulamenta a exploração de recursos minerais em reservas indígenas, a redução de investimentos públicos nos setores de fiscalização ambiental, a fragilização do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), além do aumento das políticas de estímulo ao agronegócio (Rocha & Porto, 2020Rocha, D. F. D., & Porto, M. F. S. (2020). A vulnerabilização dos povos indígenas frente ao COVID-19: Autoritarismo político e a economia predatória do garimpo e da mineração como expressão de um colonialismo persistente. Observatório Covid-19. Fiocruz.).

Compreender as histórias de vida de mulheres agricultoras rurais remete, portanto, à necessidade de reflexão sobre produções de subjetividades que se estruturam em um sistema capitalista, patriarcal e machista, em um país onde as trabalhadoras e trabalhadores vendem suas forças de trabalho por meio de um processo de exploração não somente da mão de obra, como também de recursos naturais da Terra.

Neste cenário encontra-se uma das mais importantes atividades econômicas do país: a agricultura. Atualmente, essa tem como principal modelo o agronegócio, um sistema de produção que privilegia somente seus agentes e desencadeia uma série de dificuldades por conta das explorações das relações de trabalho e do uso da terra (Santos et al., 2014Santos, C. F., Siqueira, E. S., Araújo, I. T., & Maia, Z. M. G. (2014). A agroecologia como perspectiva de sustentabilidade na agricultura familiar. Ambiente & Sociedade, 17(2), 33-52. doi: 10.1590/S1414-753X2014000200004
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). No modelo do agronegócio maximiza-se o lucro e a produção, sem levar em conta aspectos sociais e ecológicos (Graziano, 1985Graziano, F. (1985). Questão Agrária e ecologia: Crítica da moderna agricultura (2a ed.). Brasiliense.). A devastação dos ecossistemas causada pelo agronegócio pode ser um dos fatores que propiciam um ambiente favorável ao desenvolvimento e proliferação de diferentes vírus (Dourado & Grade, 2020Dourado, N. P., & Grade, M. (2020). Decrescimento e bem viver: Paradigmas para o mundo pós pandemia? Revista Brasileira de Educação Ambiental, 15(4), 380-401. https://doi.org/10.34024/revbea.2020.v15.10801
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). De acordo com Marques (2020Marques, L. (2020). A pandemia incide no ano mais importante da história da humanidade: Serão as próximas zoonoses gestadas no Brasil?. Unicamp. https://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2020/05/05/pandemia-incide-no-ano-mais-importante-da-historia-da-humanidade-serao-proximas
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), é possível que ocorram novas pandemias tal qual a pandemia por covid-19 que assolou o cenário mundial recentemente, caso não haja significativa mudança no sistema agroalimentar mundial.

Como contraponto ao modelo do agronegócio, tem-se a agricultura familiar, que, de acordo com o último Censo Agropecuário realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2017Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2017). Censo Agropecuário 2017: Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. IBGE. https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/agricultura-e-pecuaria/21814-2017-censo-agropecuario.html?=&t=destaques
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), corresponde a 77% dos estabelecimentos agropecuários no Brasil, equivalente a 23% de toda a produção agropecuária brasileira. Em 2019, a agricultura familiar foi responsável por abastecer cerca de 75% dos alimentos consumidos em todo o Brasil (Bosco, 2019Bosco, J. (2019). Agricultura familiar produz 75% dos alimentos consumidos pelo brasileiro. Canal Rural. https://www.canalrural.com.br/programas/informacao/rural-noticias/agricultura-familiar-produz-75-dos-alimentos-consumidos-pelo-brasileiro/
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).

Diferentemente da lógica do agronegócio, a agroecologia é uma prática que aponta como possibilidade de intervenção nas práticas da agricultura familiar, que tem sua importância pautada na possibilidade de uma visão sustentável de produção. As práticas agroecológicas buscam a permanência das famílias no campo, bem como o “manejo sustentável dos solos, a conservação dos recursos naturais, a valorização dos saberes locais e a independência dos pequenos agricultores que comercializam seus produtos” (Santos et al., 2014Santos, C. F., Siqueira, E. S., Araújo, I. T., & Maia, Z. M. G. (2014). A agroecologia como perspectiva de sustentabilidade na agricultura familiar. Ambiente & Sociedade, 17(2), 33-52. doi: 10.1590/S1414-753X2014000200004
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, p. 34).

De acordo com Sevilla-Guzmán (2002Sevilla-Guzmán, E. (2002). A perspectiva sociológica em Agroecologia. Agroecologia e desenvolvimento rural sustentável, 3(1), 1-68. http://www.emater.tche.br/site/sistemas/administracao/tmp/958934218.pdf
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), a agroecologia surge não somente como uma proposição técnica que os agricultores familiares podem adotar, mas também como uma proposição política a ser refletida, uma vez que é mais que somente uma forma de produção. Trata-se também de um modelo que questiona a atual lógica produtiva e a hegemonia de poder no meio rural. Ao que consta na Declaração do Encontro Nacional Unitário dos Trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas (2012Declaração do Encontro Nacional Unitário de Trabalhadores e Trabalhadoras, Povos do Campo, das Águas e das Florestas. (2012). Encontro unitário dos trabalhadores, trabalhadoras e povos dos campos, das águas e das florestas. https://mst.org.br/download/declaracao-do-encontro-nacional-unitario-de-trabalhadores-e-trabalhadoras-povos-do-campo-das-aguas-e-das-florestas/
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) a agroecologia pressupõe um modo de se relacionar e de produzir na agricultura, “que preserva a biodiversidade, os ecossistemas e o patrimônio genético, que produz alimentos saudáveis, livres de transgênicos e agrotóxicos, que valoriza saberes e culturas dos povos do campo, das águas e das florestas e defende a vida” (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, 2012Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (2012). Declaração do Encontro Nacional Unitário dos Trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas. https://agroecologia.org.br/2012/08/22/declaracao-do-encontro-nacional-unitario-dos-trabalhadores-e-trabalhadoras-e-povos-do-campo-das-aguas-e-das-florestas/
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).Neste sentido, entende-se que a agroecologia é a aplicação de conceitos e princípios ecológicos no manejo de agrossistemas. Esses podem ser definidos como ecossistemas nos quais acontecem atividades agrícolas por meio de ação humana. São, portanto, espaços delimitados onde o ecossistema original se relaciona com as práticas agrícolas (Gliessman, 2000Gliessman, S. R. (2000). Agroecologia: Processos ecológicos em agricultura sustentável. UFRGS.). Essas relações devem ser observadas não somente no âmbito ecológico, mas também no âmbito das interações humanas, na sua história e na sua cultura (Siliprandi, 2015Siliprandi, E. (2015). Mulheres e Agroecologia: Transformando o campo, as florestas e as pessoas. UFRJ.).

No contexto da agroecologia, destacam-se os movimentos sociais do Brasil, que buscam construir um modelo novo de sociedade, baseado nos princípios de equidade e justiça social, reivindicando a agricultura de base ecológica como meio principal para que este novo modelo social possa ser construído (Abreu, Lamine & Bellon, 2009Abreu, L. S., Lamine, C. & Bellon, S. (2009). Trajetórias da Agroecologia no Brasil: Entre Movimentos Sociais, Redes Científicas e Políticas Públicas. Revista Brasileira de Agroecologia, 4(2), 1611-1614. https://www.embrapa.br/busca-de-publicacoes/-/publicacao/577707/trajetorias-da-agroecologia-no-brasil-entre-movimentos-sociais-redes-cientificas-e-politicas-publicas
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). Um dos movimentos sociais mais conhecidos no Brasil é o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que nasceu a partir da articulação das lutas pela terra realizadas no final da década de 1970. Seus principais objetivos são a luta pela terra, através da proposta de Reforma Agrária, bem como a construção de uma sociedade mais justa, sem que haja exploração das comunidades camponesas e dos bens da natureza (Caldar, 2001Caldar, R. S. (2001). O MST e a formação dos sem terra: O movimento social como princípio educativo. Estudos Avançados, 15(43), 207-224. doi: 10.1590/S0103-40142001000300016
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).

Recentemente, surgiu também a Teia dos Povos, que pode ser considerada uma articulação entre comunidades, povos, territórios e organizações em luta por terra e território. A Teia dos Povos pode ser definida não como uma organização política em si, mas como uma experiência em rede para que se conquiste a autonomia dos territórios. As tarefas principais relatadas dizem respeito à destruição do capitalismo, do racismo e do patriarcado. A Teia dos Povos nasceu através de um elo da história e saberes de Joelson Ferreira, que, em 2012, junto com os povos Tupinambá, Pataxó Hã-hã-hãe, quilombolas e outros movimentos campesinos, criou a 1ª Jornada de Agroecologia da Bahia (Ferreira & Felício, 2021Ferreira, J., & Felício. E. (2021). Por terra e território: Caminhos da revolução dos povos no Brasil. Teia dos Povos.).

Há uma multiplicidade de temas que permeiam o meio rural, entre eles a relação gêneroXruralidades. Essas questões, somadas à recente presença de profissionais da área da saúde mental inseridos no meio, e a pouca difusão da temática no processo formativo, fazem com que o debate sobre ruralidades seja algo urgente e necessário para a Psicologia (Silva & Macedo, 2017Silva, S. A. (2017). Ecofeminismo: Em defesa da dignidade das mulheres e da natureza. In XXII Semana de Teologia (pp. 279-286). Recife, PE.). Dentre os estudos em saúde mental já realizados, aponta-se a necessidade de se pensar o cuidado e a escuta das mulheres agricultoras, englobando não somente os aspectos biológicos dos agravos em saúde, mas também os aspectos psicológicos, ambientais e sociais (Silva et al., 2019Silva, B. I. D. B. D. M., Barros, J. F. D. C. L., Freire, S. E. D. A., Negreiros, F., & Macedo, J. P. (2019). Produção da Psicologia no Brasil sobre mulheres rurais: Revisão sistemática. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 71(2), 163-178. http://dx.doi.org/10.36482/1809-5267.ARBP2019v71i2p.163-178
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).

De acordo com estudos anteriores, os principais desafios enfrentados pelas mulheres no cotidiano rural têm relação com situações de desigualdade vivenciadas em relação aos homens, uma vez que elas relatam serem constantemente violentadas, oprimidas, excluídas e sobrecarregadas (Silva & Macedo, 2017Silva, S. A. (2017). Ecofeminismo: Em defesa da dignidade das mulheres e da natureza. In XXII Semana de Teologia (pp. 279-286). Recife, PE.). As vivências das mulheres no meio rural estão atreladas aos papéis historicamente atribuídos às mulheres, como por exemplo, aquela que realiza os cuidados da casa. Contudo, a participação política, sobretudo em movimentos sociais, vem permitindo que as mulheres possam romper com esses papéis pré-definidos e possam desenvolver outras atividades, constituindo mudanças sociais importantes (Silva et al., 2019Silva, B. I. D. B. D. M., Barros, J. F. D. C. L., Freire, S. E. D. A., Negreiros, F., & Macedo, J. P. (2019). Produção da Psicologia no Brasil sobre mulheres rurais: Revisão sistemática. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 71(2), 163-178. http://dx.doi.org/10.36482/1809-5267.ARBP2019v71i2p.163-178
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).

Siliprandi (2015Siliprandi, E. (2015). Mulheres e Agroecologia: Transformando o campo, as florestas e as pessoas. UFRJ.) explica que vários textos que definem as premissas básicas da agroecologia citam a relevância da discussão de gênero nesse contexto. Para a autora, há ainda a existência de desigualdades de gênero no que diz respeito também à elaboração de programas de pesquisa e propostas de intervenção no âmbito da agroecologia. Porém, não existem estudos aprofundados sobre essa problemática, que é fundamental para entender como as relações de poder são expressas no meio rural. Gomes et al. (2016Gomes, R. C. M., Nogueira, C., & Toneli, M. J. F. (2016). Mulheres em contextos rurais: Um mapeamento sobre gênero e ruralidade. Psicologia & Sociedade, 28(1), 115-124. https://doi.org/10.1590/1807-03102015v28n1p115
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) corroboram o debate e apontam para a necessidade de os estudos sobre a temática de gênero nos espaços rurais utilizarem teorias feministas em suas abordagens teóricas e metodológicas, possibilitando a ampliação da problematização das desigualdades de gênero nesse contexto.

Diante dessa questão, esse estudo objetiva conhecer as histórias de vida de mulheres agricultoras rurais que participam de movimentos sociais agroecológicos no Rio Grande do Sul, buscando entender as motivações que levaram as participantes a atuar no âmbito da agroecologia, apreender os sentidos da agroecologia em suas histórias e identificar seus principais desafios nos meios rurais.

Método

Delineamento e participantes

O estudo teve caráter qualitativo/exploratório (Minayo, 2009Minayo, M. C. S. (2009). Trabalho de campo: Contexto de observação, interação e descoberta. In M. C. S. Minayo, S. F. Deslandes & R. Gomes (Orgs.), Pesquisa social: Teoria, método e criatividade (pp. 61-77). Vozes.), com delineamento de estudo de casos múltiplos (Yin, 2014Yin, R. K. (2014). Estudos de caso: Planejamento e métodos. Bookman.). Participaram deste estudo três mulheres agricultoras, com idades entre 21 e 53 anos, residentes e trabalhadoras em zonas rurais dos municípios de Viamão e Rolante, no Rio Grande do Sul. Todas são participantes ativas de movimentos sociais agroecológicos e concordaram em participar voluntariamente da pesquisa, através da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Instrumentos e procedimentos

No período de junho a agosto de 2021, foram realizados contatos com responsáveis por movimentos sociais agroecológicos no Rio Grande do Sul, a fim de explicitar os objetivos e a natureza da pesquisa e obter indicações de possíveis participantes para este estudo. A partir deste momento inicial, foram contactadas oito mulheres indicadas, buscando contextualizar o projeto de pesquisa e identificar se as participantes se adequavam aos critérios de inclusão, delimitados por: pessoas do sexo feminino, agricultoras, com idade entre 18 e 65 anos, residentes e trabalhadoras em zonas rurais do estado do Rio Grande do Sul, e participantes ativas de movimentos sociais agroecológicos. Dentre as indicadas, duas mulheres não cumpriram o critério de serem residentes em zonas rurais, duas não se consideravam participantes ativas de movimentos sociais agroecológicos e uma disse não ter disponibilidade de tempo para participar da pesquisa, sendo o número final de participantes, portanto, três mulheres.

A fim de obter maior proximidade com a vida cotidiana e estabelecer vínculo com as participantes, inicialmente realizou-se uma visita ao local de trabalho e na moradia das mulheres. Esse processo pode ser definido como observação-participante, a qual é definida por Minayo (2009Minayo, M. C. S. (2009). Trabalho de campo: Contexto de observação, interação e descoberta. In M. C. S. Minayo, S. F. Deslandes & R. Gomes (Orgs.), Pesquisa social: Teoria, método e criatividade (pp. 61-77). Vozes.) como “um processo pelo qual o pesquisador se coloca como observador de uma situação social” (p. 70). O instrumento utilizado como forma de registrar as anotações feitas através da observação participante foi o diário de campo (Minayo, 2009Minayo, M. C. S. (2009). Trabalho de campo: Contexto de observação, interação e descoberta. In M. C. S. Minayo, S. F. Deslandes & R. Gomes (Orgs.), Pesquisa social: Teoria, método e criatividade (pp. 61-77). Vozes.).

Após as visitas no trabalho e nas casas das participantes, agendou-se as entrevistas, as quais aconteceram entre os meses de agosto e setembro de 2021. Antes das entrevistas, e com o objetivo de caracterizar as participantes, aplicou-se um questionário sociodemográfico. Esse instrumento foi composto pelas autoras a fim de mapear a idade, os dados familiares, os dados relativos ao trabalho e as informações objetivas sobre a participação das participantes em movimentos sociais agroecológicos. Em seguida, aplicou-se uma entrevista, com base no método história de vida. De acordo com Nogueira et al. (2017Nogueira, M. L. M., Barros, V. A., Araujo, A. D., & Pimenta, D. A. O. (2017). O método de história de vida: A exigência de um encontro em tempos de aceleração. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 12(2), 466-485. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S1809-89082017000200016#:~:text=ISSN%201809%2D8908.,e%20os%20limites%20que%20carrega
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), no método de história de vida, o pesquisador escuta, por meio de entrevistas não diretivas, que podem ser gravadas ou não, o relato de vida das pessoas as quais está em contato. Neste estudo, as entrevistas versaram sobre o histórico e os desafios percebidos pelas mulheres na prática da agricultura agroecológica, a vinculação aos movimentos agroecológicos, além de questões relacionadas aos vínculos familiares e a questão feminina nos espaços rurais. As entrevistas tiveram duração média de uma hora e quinze minutos, foram gravadas em áudio e, posteriormente, transcritas.

Análise de dados e aspectos éticos

Os dados obtidos através dos questionários, das entrevistas e dos diários de campo foram submetidos à análise temática. Essa consiste em delimitar os núcleos de sentido que integram o processo de comunicação, haja visto que a sua presença e frequência com que aparecem significa algo visado para o objeto analítico (Minayo, 2014Minayo, M. C. S. (2014). Apresentação. In R. Gomes (Org.), Pesquisa qualitativa em saúde (pp. 5-16). Instituto Sírio Libanês.). Essa análise possui três etapas principais: a) pré-análise; b) exploração do material; c) tratamento e interpretação dos dados (Minayo, 2014Minayo, M. C. S. (2014). Apresentação. In R. Gomes (Org.), Pesquisa qualitativa em saúde (pp. 5-16). Instituto Sírio Libanês.). A partir deste procedimento analítico, foram geradas quatro categorias, que serão apresentadas a seguir. Os dados foram interpretados tomando como base as transcrições das entrevistas e o relato do diário de campo, analisadas sob a luz da literatura correspondente.

Esta pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade, a qual as pesquisadoras estão vinculadas através do parecer de número CAAE: 27288719.2.0000.5348. Destaca-se que o estudo seguiu as diretrizes do Conselho Nacional de Saúde (2016Conselho Nacional de Saúde. (2016). Resolução nº 510/2016. http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Reso510.pdf
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) na Resolução nº 510/2016, e com as Normas do Conselho Federal de Psicologia (2012Conselho Federal de Psicologia. (2012). Resolução CFP nº 10/2012. https://atosoficiais.com.br/cfp/resolucao-de-fiscalizacao-e-orientacao-n-10-2012-revoga-a-resolucao-cfp-n-0162000-publicada-no-dou-n-246-secao-1-pagina-91-no-dia-22-de-dezembro-de-2000-que-dispoe-sobre-a-realizacao-de-pesquisa-em-psicologia-com-seres-humanos
https://atosoficiais.com.br/cfp/resoluca...
) na Resolução CFP nº 10/2012. Cabe ressaltar que os nomes das entrevistadas foram alterados para nomes fictícios a fim de preservar suas identidades.

Resultados e discussão

Os resultados do estudo foram divididos em quatro categorias, quais sejam: a) sementes: as participantes do estudo; b) sobre(vivências): histórias de vida, luta e resistência; c) os sentidos da agroecologia; e d) o fluir das águas: um mundo possível.

Sementes: as participantes do estudo

“Antes de tombar, nosso jatobá sagrado lançou tantas sementes, mas tantas, que agora o mundo está repleto de mudas vigorosas, prontas a enfrentar as barreiras que a impediriam de crescer. Essas mudas somos todos nós” (Knabben, 2020Knabben. V. (2020). Ana Maria Primavesi virou semente: Em solo vivo. Estadão. https://emais.estadao.com.br/blogs/alimentos-organicos/ana-maria-primavesi-virou-semente-em-solo-vivo/
https://emais.estadao.com.br/blogs/alime...
). Buscou-se, não por acaso, iniciar esta categoria com um recorte breve de uma fala de Ana Primavesi, uma das principais agroecologistas do mundo. Sua fala, reverenciando as sementes lançadas pelos jatobás que se transformaram em mudas vigorosas, possui forte ligação com os perfis das participantes desta pesquisa, que serão apresentados a seguir. Essa relação acontece na medida em que as entrevistadas, além de trabalharem diretamente com sementes, também podem ser consideradas sementes, a partir da definição deste substantivo, que por si só é feminino, como tudo que se lança à terra para germinar.

A primeira entrevistada foi Vandana, 41 anos, mãe de dois filhos, divorciada. Em relação à sua escolaridade, referiu ter completado o ensino médio. Vandana relatou que trabalha desde os 15 anos como agricultora rural e que participa do MST desde seus 10 anos de idade. Suas principais tarefas relatadas foram o cultivo de hortaliças e frutas. Dentro do movimento social MST, explicou que representa seu assentamento e coordena os grupos de mulheres. Vandana destacou seu papel de militância e reforçou este lugar de fala durante vários momentos da entrevista. Por esse motivo, associamos a ela, o nome da filósofa e ativista ambiental indiana Vandana Shiva.

Emma, a segunda entrevistada, possui 21 anos, é casada e não possui filhos. Em relação à escolaridade, relatou estar cursando ensino superior na área das ciências sociais. Emma trabalha há um ano e meio como agricultora rural e relatou participar da Teia dos Povos há nove meses. Suas principais tarefas de trabalho relatadas foram o manejo da horta e das roças coletivas, o cultivo e a proteção de sementes e a manutenção da organização da casa. Seu nome fictício foi escolhido como Emma, para representar Emma Siliprandi, uma das autoras cujos trabalhos foram base desta escrita.

A terceira entrevistada foi Ana Terra, 53 anos, mãe de três filhos, casada. No que se refere à escolaridade, Ana Terra formou-se no ensino médio e técnico. Ana Terra relatou trabalhar como agricultora há 23 anos e participa do movimento social MST há 24 anos. Suas principais atividades de trabalho relatadas foram os processamentos alimentícios desde o momento da colheita até a entrega aos consumidores. Seu nome foi associado ao da personagem de Érico Veríssimo, Ana Terra, que na história O tempo e o vento, dizia que em todos os momentos que aconteciam coisas importantes, estava ventando. O dia da entrevista com Ana Terra foi marcado pelo nascimento de um dos seus netos e nesse dia ventava muito no assentamento, daí a associação.

Sobre(vivências): histórias de vida, luta e resistência

As vidas das entrevistadas foram marcadas por lutas e diversas formas de resistência. A participação de mulheres em movimentos sociais de luta agroecológica exige muita determinação, pois os obstáculos vivenciados nesse contexto perpassam situações de conflito e falta de recursos. Além disso, somam-se a esses fatores questões próprias de gênero, como o descrédito sobre sua capacidade, por serem mulheres (Siliprandi, 2015Siliprandi, E. (2015). Mulheres e Agroecologia: Transformando o campo, as florestas e as pessoas. UFRJ.).

Vandana vivia no campo em sua infância, em uma propriedade dos patrões de seus pais, e a partir da luta no movimento social agroecológico, deslocou-se para outra propriedade para, em conjunto com seus familiares, trabalharem na terra de forma autônoma. Dessa maneira, a agroecologia surge como um importante vetor para a reconstrução e ressignificação do que é viver no meio rural, permitindo que o poder não se concentre apenas nas mãos de apenas alguns, e sim haja o compartilhamento de decisões e ações coletivamente (Ferreira et al., 2007Ferreira, A. D. D., Brandenburg, A., Silva, O. H., Rodrigues, A. S., Santos, E. B., & Pinheiro, G. (2007). Resistência e empoderamento no mundo rural. Estudos Sociedade e Agricultura, 15(1), 123-159.https://revistaesa.com/ojs/index.php/esa/article/view/284
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).

A entrevistada relata que foi somente ao final de sua infância que começou a viver de forma digna. Neste sentido, é possível pensar que a agroecologia, além de potencializar a participação entre os sujeitos, também faz com que os indivíduos possam se reconhecer como tais e reconhecer seus territórios (Moreira & Carmo, 2004Moreira, R. M., & Carmo, M. S. (2004). Agroecologia na construção do desenvolvimento rural sustentável. Revista Agricultura Em São Paulo, 51(2), 37-56. http://www.iea.sp.gov.br/out/publicacoes/pdf/asp-2-04-4.pdf
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). As palavras da entrevistada explicitam essa questão:

Eu digo que comecei a viver mesmo aos 10 anos, que foi a época que eu entrei para o MST, né? Que foi a partir dali que meu pai e minha mãe começaram a ver que precisavam dar uma vida melhor para os filhos… quando eles decidiram entrar pro acampamento e lutar por uma vida melhor pra família e que hoje tá aí o resultado né? . . . É um orgulho muito forte fazer parte desse movimento, pois foi o que nos deu dignidade de vida (Vandana, comunicação pessoal, 29 ago. 2021).

Vandana cita também que no processo de fixação da família no assentamento, através do acampamento, muitos foram os processos de resistência até que finalmente as terras fossem regulamentadas. Fernandes (2000Fernandes, B. M. (2000). A formação do MST no Brasil. Vozes.) menciona que, usualmente, até o momento da regulamentação da área aos ocupantes, são necessárias negociações políticas mediadas por diferentes forças, demandando o enfrentamento das opressões dos latifundiários, que agem por meio da violência, uso de armas e fazem diversas investidas para reintegração de posse. A respeito disso, a entrevistada cita que, no início, a rejeição dos governantes e da sociedade ao MST era ainda mais evidente do que se tem atualmente, sendo frequente os confrontos com a polícia militar e com os latifundiários.

O processo de estabelecimento no acampamento deixa a comunidade em situação de vulnerabilidade, pois o local ocupado normalmente não possui estrutura física para comportar as famílias, nem condições mínimas para o trabalho. Inicialmente, utilizam-se barracas feitas de lona preta, contudo os indivíduos ficam expostos a intempéries e precisam de doações vindas de outros espaços para conseguirem se manter estabilizados até que as propriedades sejam regulamentadas, um processo que pode durar muitos anos. Vandana cita o termo jagunço, que é um termo usado para designar pessoas contratadas pelos latifundiários para fazer as investidas contra os acampados. Em seu relato exemplifica:

Aí vinha os “jagunço”, muitas noites a gente nem dormia e ficavam dando tiro por cima do acampamento, por exemplo. Então, além de que, muitas vezes tu não podia sair do acampamento porque corria risco de não voltar. Os “jagunço” pegavam, “cagavam a pau”. Então foi um período bem difícil.

Diferentemente de Vandana, Emma e Ana Terra vivenciaram suas infâncias em contexto urbano com seus familiares, e a partir de suas trajetórias na cidade encontraram sentido para suas vidas ao se deslocarem para o campo. As vivências de Emma em movimentos sociais começaram muito cedo, desde que participou pela primeira vez de movimentos secundaristas na escola, aos 13 anos. A partir dali procurou estudar ciências sociais aplicadas ao contexto rural. Nesse momento cultivou experiências com a terra em comunidades distintas, e encontrou no campo uma forma de colocar em prática seus conhecimentos em busca de um bem viver. De acordo com seu relato, foi a partir do reconhecimento da cidade enquanto espaço individualista, aliado ao desejo de contribuir para a construção de um mundo mais comunitário, que viver no campo passou a se configurar como uma possibilidade real.

Ana Terra fez sua transição para o meio rural aos 29 anos, com seu companheiro, filho de agricultores. Após quatro anos de casamento, ela conta que o casal resolveu acampar, embora ressalte que a decisão não tenha sido fácil de ser tomada. Uma das razões foi, segundo ela, justamente o preconceito que a sociedade tem contra o MST. Em suas palavras: “até hoje tem gente que diz que somos ladrões, que vamos chegar na casa de alguém e tomar a propriedade da pessoa, e nós já estamos há 23 anos aqui” (Ana Terra, comunicação pessoal, 29 ago. 2021).

Emma e Ana Terra relatam que, somado ao difícil processo de escolha, também surgiu como dificuldade a ida à terra sem experiência anterior, tal como fica evidente nos relatos a seguir:

Como viemos da cidade pro campo, nossa família não vem do campo, a gente não tem muita estrutura, máquinas, bichos, então a gente tem que começar tudo do zero, a gente tem muito esse trabalho de levar a estruturas, então eu diria que faço de tudo um pouco. E levantar estruturas também significa levantar redes, né? (Emma, comunicação pessoal, 5 set. 2021).

O meu principal desafio foi trabalhar na terra, eu vim pra cá e já tinha 26 anos… nascida e criada na cidade, muitas coisas eu tive que aprender. Não são práticas difíceis, mas requer uma força. Então eu fiz um trato com o [companheiro de Ana], pra ele não exigir que eu fosse direto pra lavoura, capinar, virar canteiro. Mas tirando isso aí, de resto eu aprendi tudo. Toda a parte de tratar dos animais, tirar leite, colher… (Ana Terra, comunicação pessoal, 28 ago. 2022).

Um aspecto importante de se mencionar no processo de ida para o campo, são os empecilhos ocasionados pelas questões de gênero, tal qual relatado por Ana Terra (comunicação pessoal, 28 ago. 2021): “eu, como mulher, precisava estar sempre provando que era capaz, inclusive dentro da gestão”. Da mesma forma, Emma (comunicação pessoal, 5 set. 2021) utiliza-se de uma metáfora para exemplificar a invisibilidade da sua presença no meio rural: “ao mesmo tempo que o trabalho da capina vai moldando nosso corpo e cada dia vai ficando mais fácil, também é em relação a isso, todo dia tem que estar mostrando que eu estou aqui também. Uma mudança lenta, eu diria”.

Outra questão pertinente, e que o debate ainda se faz presente, é a questão da desigualdade no acesso à terra. Segundo Korol e Castro (2006Korol, C., & Castro, G. C. (2016). Feminismos populares: Pedagogías y políticas. El Colectivo.), apenas cerca de 2% das terras no mundo tem como proprietária uma mulher. O relato de Emma exemplifica as dificuldades referentes à essa questão:

Mas a propriedade é uma questão na nossa vida enquanto agricultora mulher, porque as propriedades normalmente estão no nome dos homens. Na cidade sempre fui notada como mulher, respeitada ou desrespeitada como tal, quando eu vim pra cá e os vizinhos não olhavam para mim, olhavam só para o [companheiro de Emma], eu me sentia invisibilizada. Eu nunca tinha sentido isso, e foi muito ruim. Não é igual ser mulher na cidade e ser mulher no campo. É importante a gente deixar bem nítido para todo mundo (Emma, comunicação pessoal, 5 set. 2021).

Apesar da cultura machista e patriarcal que ainda se percebe presente no meio rural, Vandana ressalta a importância das construções internas nos movimentos sociais para uma possível mudança de paradigma. Sem desconsiderar a existência do machismo, ela faz um contraponto:

Tem muita questão de machismo, isso existe, mas tem muitas mulheres que também se posicionam, e isso a gente construiu no MST, né? Nós ficamos dois anos e nove meses num acampamento, que tu não podia sair do acampamento, então tu tinha que trabalhar formação, e na formação se trabalhava muito essas questões de gênero, tanto é que por exemplo, os dirigentes sempre se trabalhou em casal, um homem e uma mulher, pra ter igualdade (Vandana, comunicação pessoal, 29 ago. 2021).

Vandana e Ana Terra também explicam que, além das formações que construíram as bases do movimento durante o acampamento, também existem atualmente grupos de mulheres dentro dos assentamentos. Os grupos são divididos conforme as necessidades daquela comunidade assentada. No caso das mulheres entrevistadas, foram observados dois grupos: um que possui o objetivo de fomentar as vendas e trocas de conhecimentos agroecológicos entre mulheres, e outro de formações e discussões políticas, dentre elas os papéis de gênero no meio rural, como pode-se observar no relato a seguir:

Se escuta muito dizer que mulher não discute política, mas o grupo de mulheres do assentamento discute política, porque nós vivemos isso também. Então se nós vamos discutir, por exemplo, direito à saúde, educação, acesso às estradas, como não vamos discutir política? (Vandana, comunicação pessoal, 29 ago. 2021).

Ferreira (2009Ferreira, A. P. L. (2009). A importância da perspectiva agroecológica no empoderamento das mulheres camponesas: Processo Mulheres e Agroecologia como Estudo de Caso. Revista Brasileira de Agroecologia , 4(2), 2114-2117.) ressalta a importância do fortalecimento do papel político das mulheres camponesas, valorizando sua visibilidade e seus conhecimentos para construção da agroecologia. A construção do saber agroecológico, por não se limitar somente à dimensão da agricultura em si, e englobar também dimensão social, permitiu que as agricultoras pudessem repensar as posições de superioridade masculina e questionar as relações de poder. Contudo, a autora cita que esse processo de empoderamento só foi possível por conta de uma abordagem emancipatória que garantisse o entendimento de que as desigualdades de gênero no campo também dificultavam o processo de avanço da agroecologia.

Durante as visitas às casas e ao espaço de trabalho das mulheres participantes desta pesquisa, foi possível identificar diversas situações de divisão equânime de tarefas entre as mulheres e os homens dos núcleos familiares. Corroborando Siliprandi (2015Siliprandi, E. (2015). Mulheres e Agroecologia: Transformando o campo, as florestas e as pessoas. UFRJ.), conclui-se que, mesmo que a situação das mulheres siga marcada por profundas desigualdades e injustiças, existem melhoras significativas, como consequência das articulações e mobilizações nacionais de movimentos de mulheres no campo.

Os sentidos da agroecologia

Somos a terra lutando para sobreviver” (Diário de Campo, comunicação pessoal, 28 ago. 2021). Iniciar a terceira categoria com essa frase possui a intenção de apreender os diferentes significados propostos pelas participantes da pesquisa no que se refere ao sentido do trabalho agroecológico. De acordo com Shiva (2000Shiva, V. (2000). Deixem-nos sobreviver: Mulheres, ecologia e desenvolvimento. In R. R. Ruether (Org.), Mulheres curando a terra: Mulheres do terceiro mundo na ecologia, no feminismo e na religião (pp. 34-52). Paulinas.), as mulheres observam em algum momento que os mecanismos convencionais no trabalho do campo são prejudiciais à saúde de suas famílias e que o uso de insumos químicos e de maquinário pesado tendem a destruir e degradar o ambiente, ao invés de desenvolvê-lo. Corroborando essa ideia, Siliprandi (2006Siliprandi, E. (2006). Políticas de Segurança Alimentar e Papéis de Gênero: Desafios para a mudança de modelos de produção e consumo. Revista Brasileira de Agroecologia , 1(1), 1417-1421. https://legacy.agroecologiaemrede.org.br/acervo/arquivos/P265_2005-08-05_102341_367.pdf
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) ressalta que é comum mulheres rurais buscarem nos seus trabalhos modelos capazes de garantir soberania e segurança alimentar dos seus núcleos.

Em relação ao sentido do trabalho agroecológico, alguns significados se sobressaíram nos relatos das participantes, quais sejam: aprendizado; promoção de vida; reflorestamento; coletividade; e resgate ancestral. Emma (comunicação pessoal, 5 set. 2021) anuncia a dimensão de aprendizado com a terra quando elucida que “a terra te ensina às vezes de um jeito bem rápido, às vezes é bem devagarzinho”. Para Vandana (comunicação pessoal, 29 ago. 2021), a agricultura é “a base de tudo, é dali que saem os principais alimentos para a população”.

Ana Terra e Vandana trazem em seus discursos o sentido de produção de vida que o trabalho agroecológico permite experienciar. No caso de Ana Terra, há um enfoque muito significativo no tratamento igualitário entre todos os seres vivos da propriedade, conforme relato a seguir:

Aqui tudo tem vida e, às vezes, a gente esquece disso, acha que só a gente vive, só a gente sente, e não é, tudo aqui sente, as borboletas, as flores, tudo. . . . Ganho menos recursos, sim, mas é isso que me faz feliz, é isso que me faz ver tanta vida abundante! (Ana Terra, comunicação pessoal, 28 ago. 2021).

Ao que consta na Declaração do Encontro Nacional Unitário dos Trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas (2012Declaração do Encontro Nacional Unitário de Trabalhadores e Trabalhadoras, Povos do Campo, das Águas e das Florestas. (2012). Encontro unitário dos trabalhadores, trabalhadoras e povos dos campos, das águas e das florestas. https://mst.org.br/download/declaracao-do-encontro-nacional-unitario-de-trabalhadores-e-trabalhadoras-povos-do-campo-das-aguas-e-das-florestas/
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), a agroecologia promove a preservação da biodiversidade, dos ecossistemas e do patrimônio genético, produzindo alimentos saudáveis, livres de transgênicos e agrotóxicos. A busca da população rural pela autogestão dos recursos ambientais seria uma forma de mudar a visão existente de prevenção dos processos de degradação socioambientais, para a construção de um processo sólido em que a base da produção seja a equidade e a sustentabilidade (Leff, 2006Leff, E. (2006). Racionalidade Ambiental: A reapropriação social da natureza. Civilização Brasileira.). O resultado de uma experiência com agricultura convencional, uso de agrotóxicos e outros insumos, contrário à lógica da agroecologia, pode ser percebido pela fala de Ana Terra:

Os pais do [companheiro de Ana Terra] tiveram problemas com o uso de agrotóxico. Então começaram a perceber que isso não tava certo, a água que vinha da nascente tu podia beber e depois não podia mais, os animais começaram a morrer (Ana Terra, comunicação pessoal, 28 ago. 2021).

Como benefício, a agroecologia pode reorganizar a forma de uso e manejo de recursos naturais também com a finalidade de obter segurança alimentar e ofertar alimentos com maior qualidade (Caporal, 2008Caporal, F. R. (2008). Agroecologia: Uma nova ciência para apoiar a transição de agriculturas sustentáveis. In F. G. Fakeiro, & A. L. Farias (Orgs.), Savanas: Desafios e estratégias para o equilíbrio entre sociedade, agronegócio e recursos naturais (pp. 1-27). Embrapa.). Nos relatos há que se pontuar a presença da ideia de que não há lucro financeiro que supere a experiência de se alimentar, e alimentar pessoas, com alimentos vindos da produção agroecológica:

E aí tu vê por exemplo o [filho de Vandana] com quatro anos, ele vai ali na estufa, pega o tomate e sai comendo. Isso é vida, é saúde. Isso é algo que não tem dinheiro que pague, tu ver uma criança crescendo no meio da horta, colhendo e comendo brócolis cru! Isso é vida! (Vandana, comunicação pessoal, 29 de agosto de 2021).

Segundo defensores da agroecologia, o lucro e produtividade não devem ser as principais preocupações de uma produção agrícola. Deve-se, primeiramente, garantir a sobrevivência digna das pessoas que vivem dessas atividades, bem como garantir a sobrevivência do planeta. Nesse sentido, propõe-se a construção de uma sociedade sustentável, que pressupõe a necessidade de redefinições em vários âmbitos, dentre eles o mercado, o consumo e a produção de conhecimentos (Siliprandi, 2015Siliprandi, E. (2015). Mulheres e Agroecologia: Transformando o campo, as florestas e as pessoas. UFRJ.).

Diante do cenário exposto anteriormente, em que se vislumbram as possibilidades de promoção de saúde na produção de alimentos nutritivos e na construção de ecossistemas mais equilibrados, destaca-se que a produção agroecológica é motivo de orgulho entre as mulheres agricultoras entrevistadas. Siliprandi (2015Siliprandi, E. (2015). Mulheres e Agroecologia: Transformando o campo, as florestas e as pessoas. UFRJ.) cita que este orgulho é atribuído não somente à possibilidade da oferta de alimentação de qualidade para as famílias e comunidade, mas também à possibilidade de valorização da riqueza que o trabalho com a terra oferta, como podemos observar nos seguintes trechos:

Decidi ser agricultora e amo muito, tenho maior orgulho de dizer: sou agricultora!” (Ana Terra, comunicação pessoal, 28 ago. 2021).

Pra mim como agricultora, é um orgulho muito grande né, saber que eu contribuo com a alimentação de boa parte da população. Então é um pouco isso né, questão de ter amor por aquilo que tu faz né? Produzir alimento orgânico é uma coisa que não tem preço. Mesmo que eu produzisse só pra me alimentar já seria um grande feito né? Então, além disso, conseguir repassar para outras pessoas . . . é muito orgulhoso trabalhar com a terra (Vandana, comunicação pessoal, 29 ago. 2021).

Durante a entrevista, a agricultora Emma cita um terceiro sentido empregado no trabalho agroecológico, que diz respeito ao “reflorestamento”, e aqui pontua-se não somente o reflorestamento do solo, como também das mentes. Esse reflorestamento de mentes diz respeito a uma mudança de paradigma sobre a relação entre humanos e natureza. De acordo com Silva (2017Silva, S. A. (2017). Ecofeminismo: Em defesa da dignidade das mulheres e da natureza. In XXII Semana de Teologia (pp. 279-286). Recife, PE.), é necessária uma quebra do pensamento dualista entre ambos, que só é possível a partir de uma compreensão sistêmica da realidade, para que haja o desenvolvimento humano e o cuidado com a natureza. Esse processo visa recuperar e valorizar tanto os ecossistemas, como as histórias das mulheres (Angelin, 2014Angelin, R. (2014). Mulheres, ecofeminismo e desenvolvimento sustentável diante das perspectivas de redistribuição e reconhecimento de gênero: Estamos preparados? Revista Direito e Políticia, 9(3), 1569-1597. doi: 10.14210/rdp.v9n3.p1569-1597
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). Emma exemplifica o caso da sua propriedade, em que está sendo realizada a transformação de uma região degradada por uma nova forma de cultivo:

São milhares de técnicas pra gente cuidar da terra, da gente, do ar, do solo e da água. A gente entende que faz agroecologia aqui e nunca precisamos fazer uma transição agroecológica, porque nunca usamos veneno nem nada, a gente já veio para terra com noção de agroecologia. A gente pensou em pegar um lugar degradado para poder recuperar. Aqui estamos derrubando pinus para implantar agrofloresta né? (Emma, comunicação pessoal, 5 set. 2021).

Além destes sentidos, também surgem nas falas alguns pontos importantes, como o senso de coletividade e o trabalho como uma forma de garantir a autonomia das comunidades e a soberania alimentar. Vasconcellos (2015Vasconcellos, B. M. (2015). Mulheres rurais, trabalho associado e agroecologia. In H. N. Novaes, D. Mazin, & L. Santos. (Orgs.), Questão agrária, cooperação e agroecologia (pp. 54-68). Outras Expressões.) afirma que desde o princípio, nos primórdios da organização do movimento social, existem condições que contribuem para a superação das desigualdades em relação à organização de tarefas cotidianas de sobrevivência, entre outras, pois neste momento privilegia-se a organização de forma coletiva. A autora cita que nestas condições as mulheres passam a ganhar espaço de atuação política, ganham visibilidade e começam a se engajar contra outras situações de opressão e injustiça. Esse processo de coletivização é descrito nas seguintes falas: “Aqui o alimento é coletivo, se faltar pra um, faltou para todos. É um processo diferente, né? É um processo de vida coletiva” (Ana Terra, comunicação pessoal, 28 ago. 2021) e “Esse projeto não é só para a gente né? É muito maior, que é um projeto de multiplicação das sementes crioulas” (Emma, comunicação pessoal, 5 set. 2021).

O trabalho e a vivência na terra podem significar uma forma de resgate da ancestralidade. Isto porque as mulheres foram as precursoras dos modelos de agricultura de base ecológica ou sustentável (Shiva, 2000Shiva, V. (2000). Deixem-nos sobreviver: Mulheres, ecologia e desenvolvimento. In R. R. Ruether (Org.), Mulheres curando a terra: Mulheres do terceiro mundo na ecologia, no feminismo e na religião (pp. 34-52). Paulinas.). Portanto, ao construírem seus projetos de vida de acordo com a agroecologia, resgatam antigas formas de relação com a natureza. Vandana (comunicação pessoal, 29 de agosto de 2021) exemplifica esse processo através de seu relato: “com a implementação de hortas e pequenos pomares, a nossa mulherada tá voltando para trabalhar, porque elas sentiram necessidade de voltar a trabalhar com a terra. E isso foi muito bom assim. A agricultura trouxe esse resgate para as mulheres”. Esse resgate ancestral também pode ter o sentido de retomar as histórias e conhecimento de antecessoras familiares, como foi o caso de Ana Terra e valorização de saberes e culturas que as pessoas da comunidade local têm a ensinar, como é o caso de Emma. Ambos os casos se encontram exemplificados a seguir:

Eu digo assim, que eu optei por ser agricultora rural. Eu tive contato com a agricultura quando conheci o [companheiro de Ana Terra], ele é filho de agricultores. . . . Então eu decidi ser agricultora, voltando pra minha ancestralidade, porque a minha vó era do interior, a minha bisavó era indígena (Ana Terra, comunicação pessoal, 28 ago. 2021).

Valorizo muito o que as pessoas mais velhas têm para nos passar, seja de conhecimento, seja de sementes principalmente, que é o que gera essa conexão assim né? Porque querendo ou não tem pouca gente no campo hoje em dia, menos ainda pessoas jovens, menos ainda pessoas jovens que tão tipo, cuidando dessas sementes crioulas (Emma, comunicação pessoal, 5 set. 2021).

Para Hecht (2002Hecht, S. (2002). A evolução do pensamento agroecológico. In M. Altieri (Org.), Agroecologia: Bases científicas para uma agricultura sustentável (pp. 24-42). Agropecuária.), a agroecologia retoma tradições antigas, que remetem ao início da própria agricultura e, assim, atua em todos os processos que envolvem as relações entre homens, mulheres e natureza, levando a essas gradativas mudanças conforme seus contextos. Outra premissa da agroecologia é de que os agricultores tradicionais (indígenas e camponeses) são detentores de um conhecimento cuja característica é a aproximação do meio ambiente e do fazer na terra, ao contrário do conhecimento produzido pela hegemonia da ciência agronômica, que acabou por afastar as pessoas do meio ambiente, produzindo assim desastres tecnológicos (Siliprandi, 2015Siliprandi, E. (2015). Mulheres e Agroecologia: Transformando o campo, as florestas e as pessoas. UFRJ.).

Histórias de origens distintas, mas que em algum momento se encontram em suas transformações. Contestando a ideia de naturalização dos papéis femininos, Beauvoir (2009Beauvoir, S. (2009). O segundo sexo (2a ed.). Nova Fronteira.) atenta ao fato de que não se nasce mulher, torna-se mulher. Da mesma forma, podemos pensar as vivências das mulheres entrevistadas, retratada na fala de Emma (comunicação pessoal, 5 set. 2021): “Hoje eu me visto de manhã pra trabalhar na terra, todo meu dinheiro vem de trabalhar na terra, toda minha vivência é de trabalhar na terra, então é isso, tornei-me agricultora!”. Tornar-se agricultora é uma construção que emprega sentidos distintos nos diferentes modos de vida e concepções de mundo de cada mulher do campo. Não há, portanto, o determinante do sexo biológico para designar a forma que esta identidade se apresentará.

O fluir das águas: um mundo possível

A partir das vivências relatadas em diário de campo, nota-se a potência de transformação do trabalho das mulheres agroecologistas, nas mais diversas dimensões. O resultado das práticas agroecológicas prevê estratégias a curto, médio e longo prazo para que se construam não somente processos de desenvolvimento rural sustentáveis, como também sociedades sustentáveis (Altieri & Toledo, 2011Altieri, M., & Toledo, V. M. (2011). The agroecological revolution in Latin America: Rescuing nature, ensuring food sovereignty and empowering peasants. Journal of Peasant Studies, 3(38), 587-612. doi: 10.1080/03066150.2011.582947
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).

É fato que a pandemia do novo coronavírus tornou evidente a grande crise estrutural provocada pelo capitalismo. De acordo com Marques (2020Marques, L. (2020). A pandemia incide no ano mais importante da história da humanidade: Serão as próximas zoonoses gestadas no Brasil?. Unicamp. https://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2020/05/05/pandemia-incide-no-ano-mais-importante-da-historia-da-humanidade-serao-proximas
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), essa é “uma consequência, reiteradamente prevista, de um sistema socioeconômico crescentemente disfuncional e destrutivo”. Dourado e Grade (2020Dourado, N. P., & Grade, M. (2020). Decrescimento e bem viver: Paradigmas para o mundo pós pandemia? Revista Brasileira de Educação Ambiental, 15(4), 380-401. https://doi.org/10.34024/revbea.2020.v15.10801
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, p. 381) citam que “os vírus são organismos incapazes de se autorreproduzir, pois necessitam de outras vidas (hospedeiros) para isso; também o capitalismo, como tal, não se reproduz/sobrevive sem explorar outras vidas (natureza e trabalho)”. As consequências dessas explorações poderão ser sentidas no Brasil nos próximos anos de forma intensa. De acordo com o relatório Groundswell, feito pelo Banco Mundial, até 2050 o aquecimento global pode forçar a migração de cerca de 17 milhões de pessoas na América Latina, pois as mudanças climáticas impactam sobre os meios de subsistência das comunidades, dificultando as condições de vida (Clement et al., 2021Clement, V., Rigaud, K. K., Sherbinin, A., Jones, B., Adamo, S., Schewe, J., Sadiq, N., & Shabahat, E. (2021). Groundswell Part 2 Acting on Internal Climate Migration. World Bank. https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/36248
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).

Na contramão do capitalismo, é observando as histórias citadas neste estudo que se pode vislumbrar novas possibilidades para um mundo pós-pandemia, em que há a urgência da mudança do paradigma de desenvolvimento rural, buscando-se uma transição de um modelo de impacto altamente negativo para a vida humana e para os ecossistemas, para sistemas agroalimentares socialmente justos e ecologicamente resilientes.

Os indivíduos implicados nessa transformação somente se realizarão como sujeitos quando assumirem maior autonomia na implementação de seus projetos individuais, que são construídos coletivamente. Esse processo culmina em práticas que estimulam um novo tipo de organização social, descentralizada e participativa, que devem ser constantemente questionadas e discutidas a fim de se avaliar as possibilidades próprias dos seus tempos de vida (Ferreira et al., 2007Ferreira, A. D. D., Brandenburg, A., Silva, O. H., Rodrigues, A. S., Santos, E. B., & Pinheiro, G. (2007). Resistência e empoderamento no mundo rural. Estudos Sociedade e Agricultura, 15(1), 123-159.https://revistaesa.com/ojs/index.php/esa/article/view/284
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). Como destacado na fala de Emma (comunicação pessoal, 5 set. 2021): “Uma palavra que é bem importante aqui é autonomia. Autonomia dos povos e autonomia dos territórios”.

Nessa busca, muitos agricultores rurais se unem através dos movimentos sociais, pela reapropriação “da natureza, de suas culturas, de seus saberes, de suas práticas e de seus processos produtivos, abrindo-se caminho através da instauração de novos direitos ambientais, culturais e coletivos” (Leff, 2006Leff, E. (2006). Racionalidade Ambiental: A reapropriação social da natureza. Civilização Brasileira., p. 486). Os movimentos sociais têm, então, papel fundamental na construção e na implementação de políticas públicas de defesa de um projeto popular agroecológico, pois, através do controle social, garante-se maior proximidade com a realidade vivida, ao passo que esta mobilização também tem sua importância em um desenvolvimento social democrático (Silva, 2012Silva, A. S. (2012). Psicologia Política, Movimentos Sociais e Políticas Públicas. Psicologia Política, Movimentos Sociais e Políticas Públicas [Tese de Livre Docência]. Universidade de São Paulo.).

No decorrer das escutas realizadas nesta pesquisa, pôde-se observar a importância dos movimentos sociais nas trajetórias de vida das entrevistadas, uma vez que é a partir das (des)construções produzidas nesses movimentos que abriu-se espaço para repensar a forma como as mulheres se organizam e como elas podem compartilhar suas experiências com outras mulheres a fim de superar a estrutura machista patriarcal dominante. Essa ideia pode ser observada na fala de Vandana, descrita a seguir:

Eu acredito que nós não podemos esquecer a história. Tem muita gente que cai no comodismo, mas eu não, eu consegui a terra, melhorei e quero que as outras melhorem também, para isso é preciso ter alguém pra dizer que é possível fazer (Vandana, comunicação pessoal, 29 ago. 2021).

De acordo com Emma (comunicação pessoal, 5 set. 2021) “temos uma jornada de superação do capitalismo” pela frente, e mais do que isso, urge a necessidade de construção de um projeto emancipador, que, somado às histórias de lutas e de resistência, se estabelece como ponto de partida para a construção democrática de sociedades possíveis. Do ponto de vista nacional, um elemento importante que contribui para este avanço é a transição do governo federal em 2023. Essa mudança tem impulsionado a retomada de investimentos nas políticas públicas ambientais e o fortalecimento do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, destacando-se o combate ao desmatamento, a reativação do Fundo Amazônia e do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), o aumento da fiscalização e a regulamentação dos espaços de mineração, entre outros importantes aspectos.

Nesse sentido, ressalta-se a relevância de políticas públicas que caminhem nessa direção, oferecendo subsídios e fomentando o trabalho de agricultoras rurais, pois embora a agroecologia disponha de mecanismos capazes de promover diversas mudanças a nível microssocial, é a partir da facilitação do acesso à terra, às sementes crioulas, à água, ao crédito e, posteriormente, da destinação dos produtos oriundos da terra para a população que dela necessite, que o êxito desse saber se dará.

Considerações finais

Este estudo objetivou conhecer as histórias de vida de mulheres agricultoras rurais que participam de movimentos sociais agroecológicos no Rio Grande do Sul. Com base nas entrevistas e no convívio com as mulheres agroecologistas, foi possível identificar que suas trajetórias de vida são marcadas por lutas e diversas formas de resistência. Além disso, pôde-se perceber que a agroecologia apresenta diferentes sentidos para cada participante.

Para além das situações de conflitos e falta de recursos que marcam a transição para o meio rural, avistam-se questões próprias de gênero, como a invisibilidade feminina e a desigualdade no acesso à terra por mulheres agricultoras rurais. Esses aspectos geram implicações diretas para o campo político-emancipatório das mulheres agroecologistas, como por exemplo, a desigualdade e a dependência financeira, as dificuldades de acesso e de decisão sobre o uso das terras, além das disparidades nas relações de poder. Contudo, cabe pontuar que, apesar da existência de uma cultura machista de estrutura patriarcal no meio rural, a construção de base e o fortalecimento do papel político das mulheres nos movimentos sociais permite inferir que existem melhorias significativas nas desigualdades e injustiças no meio rural.

Em relação ao sentido do trabalho agroecológico, assinala-se a presença de diferentes significados nos relatos das participantes, entre eles estão o aprendizado, a produção de vida, o reflorestamento (de ecossistemas e de mentes), o senso de coletividade e o resgate ancestral. No sentido da promoção de vida, destaca-se a possibilidade da agroecologia prevenir a degradação socioambiental, bem como garantir a segurança alimentar e ofertar alimentos com maior qualidade.

Salienta-se também a presença da concepção de reflorestamento de ecossistemas e de mentes como importantes vetores de uma necessária mudança de paradigma entre humanos e natureza. Ademais, surgiram nos relatos das entrevistadas o senso de coletividade e o trabalho como forma de garantir a autonomia das comunidades que a agroecologia permite engendrar. Além disso, o trabalho e a vivência na terra também podem significar uma forma de resgate da ancestralidade, tanto de antigas formas de relação das mulheres com a natureza, como também de histórias e conhecimentos das antecessoras familiares das entrevistadas.

A partir das vivências estudadas, nota-se a potência de transformação do trabalho de mulheres agroecologistas, nas mais diversas dimensões. Os movimentos sociais possuem papel fundamental na construção e na implementação de políticas públicas em defesa de um projeto popular agroecológico. Além disso, esses espaços se constituem como importantes vetores de superação da estrutura machista patriarcal dominante, bem como se estabelecem como ponto de partida para a construção democrática de modelos sociais possíveis, através da transposição do capitalismo.

Do ponto de vista do processo de pesquisa, vale sinalizar que a principal dificuldade encontrada diz respeito ao período de pandemia do coronavírus, que limitou a amostra de participantes e a permanência prolongada no território investigado. Os resultados e limitações incentivam a construção de novas pesquisas científicas que possibilitem avançar nas discussões a respeito da promoção da equidade de gênero nos espaços rurais, bem como potencializar o avanço das práticas agroecológicas em direção à superação do capitalismo. Sugere-se, também, que novos estudos integrem ao debate a categoria da justiça ambiental e suas interfaces com a saúde mental.

Por fim, pontua-se a necessidade de se promover o diálogo entre os movimentos sociais, as mulheres e a sociedade política sobre os modelos atuais de políticas públicas existentes, como por exemplo, as estratégias de promoção do acesso à alimentação e o incentivo à agricultura familiar instituídas através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Embora a agroecologia detenha dispositivos capazes de promover mudanças a nível microssocial, evidencia-se a necessidade de ampliação das ações governamentais que subsidiem e fomentem o trabalho e a participação ativa das mulheres agroecologistas, combatendo as desigualdades de gênero. Esse tensionamento incentiva a construção de novas pesquisas científicas que possibilitem avançar nas discussões a respeito da promoção da equidade de gênero nos espaços rurais, bem como potencializar o avanço das práticas agroecológicas em direção à superação do capitalismo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    12 Maio 2022
  • Aceito
    04 Jul 2023
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