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CONTRIBUIÇÕES DA IMAGINAÇÃO AO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO E À EDUCAÇÃO: UMA ANÁLISE A PARTIR DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

Contribuciones de la Imaginación al proceso de desarrollo y a la educación: un análisis desde la Psicología Histórico-Cultural

RESUMO

Este artigo, de natureza teórica, tem como objetivo apresentar a compreensão de um grupo de pesquisa acerca do conceito de imaginação na perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural, focalizando, sobretudo, as ideias desenvolvidas por Vigotski e alguns de seus interloculores. Com base nesta perspectiva, compreende-se a imaginação como uma função psicológica superior responsável por criar horizontes, libertando o sujeito de sua realidade concreta. Por possibilitar, imbricada ao pensamento, que o sujeito alcance formas abstratas de pensar, a imaginação assume grande relevância no processo de ensino/aprendizagem, sendo fundamental, portanto, às ações desenvolvidas na escola. Intenta-se, ainda, neste artigo, refletir sobre o conceito de liberdade na relação com a imaginação, visando destacar a importância dos processos imaginativos para o desenvolvimento do sujeito. Ainda, é realizad uma análise com relação ao conceito de liberdade, tal como proposto pela Psicologia Histórico-Cultural e sua relação com a imaginação. O artigo se encerra destacando-se a necessidade de avanços na compreensão da imaginação e sua importância na promoção do desenvolvimento de adolescentes e para a apropriação do conhecimento escolarizado.

Palavras-chave:
imaginação; liberdade; psicologia histórico-cultural

RESUMEN

En este artículo, de naturaleza teórica, se tiene como objetivo presentar la comprensión de un grupo de investigación acerca del concepto de imaginación en la perspectiva de la Psicología Histórico-Cultural, centrando, sobre todo, en las ideas desarrolladas por Vygotsky y algunos de sus interlocutores. Con base en esta perspectiva, se comprende la imaginación como una función psicológica superior responsable por crear horizontes, libertando el sujeto de su realidad concreta. Por posibilitar, imbricada al pensamiento, que el sujeto alcance formas abstractas de pensar, la imaginación tiene gran relevancia en el proceso de enseñanza/aprendizaje, y es fundamental, por lo tanto, a las acciones desarrolladas en la escuela. Se intenta, aún, en este artículo, pensar sobre el concepto de libertad en la relación con a la imaginación, con objetivo de destacar la importancia de los procesos imaginativos para el desarrollo del sujeto. Aún, se realiza un análisis con relación al concepto de libertad, tal como propuesto por la Psicología Histórico-Cultural y su relación con la imaginación. El artículo se clausura destacándose la necesidad de avances en la comprensión de la imaginación y su importancia en la promoción del desarrollo de adolescentes y para la apropiación del conocimiento escolarizado.

Palabras clave:
imaginación; libertad; psicología histórico-cultural

ABSTRACT

This theoretical article aims to present a research group’s understanding about the concept of imagination from the perspective of Historical-Cultural Psychology, focusing, above all, on the ideas developed by Vigotski and some of his interlocutors. Based on this perspective, imagination is understood as a higher psychological function responsible for creating horizons, freeing the subject from his concrete reality. By enabling, intertwined with thought, the subject reaches abstract ways of thinking, the imagination assumes great relevance in the teaching/learning process, being fundamental, therefore, to the actions developed at school. It is also intended, in this article, to reflect about the concept of freedom in relation to the imagination, aiming to highlight the importance of imaginative processes for the subject’s development. Furthermore, an analysis is carried out in relation to the concept of freedom, as proposed by Historical-Cultural Psychology and its relationship with imagination. The article ends by highlighting the need for advances in the understanding of imagination and its importance in promoting the adolescents’ development and in appropriating school knowledge.

Keywords:
imagination; freedom; historical-cultural psychology

INTRODUÇÃO

Este artigo, de natureza teórica, apresenta nossa compreensão sobre o conceito de imaginação na obra de Lev Semionovitch Vigotski, destacando sua contribuição para o campo da Psicologia Escolar/Educacional. Sendo assim, tem-se como objetivo discutir o conceito de imaginação a partir da Psicologia Histórico-Cultural, destacando sua relação com o processo de aprendizagem, apropriação de conhecimento e a liberdade. Com relação a sua organização, primeiramente apresenta-se um breve panorama das pesquisas voltadas ao estudo da imaginação com o objetivo de situar o campo de investigação; em seguida discorre-se sobre a concepção de imaginação na Psicologia Histórico-Cultural, inserindo-a como Função Psicológica Superior de grande relevância ao processo de desenvolvimento do sujeito e, por fim, discute-se a relação entre imaginação e liberdade, tomando-a como função que possibilita ao sujeito ir e vir em tempos e espaços diferentes, mesmo aqueles que ele nunca acessou empiricamente. O artigo se encerra apontando-se a importância do processo imaginativo para o desenvolvimento do sujeito e a necessidade da educação considerar a potência da imaginação nas práticas educativas.

No desenvolvimento da humanidade, a imaginação teve um papel fundamental na transformação dos produtos da natureza em artefatos culturais. Segundo Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).), as invenções das antigas civilizações, como os hieróglifos por exemplo, até as formas mais avançadas de escrita e as produções científicas, religiosas, artísticas, enfim derivam, sem nenhuma exceção, da imaginação humana.

O estudo da imaginação é tema de interesse desde a Grécia Antiga. Platão, por exemplo, compreendia a imaginação como pertencente à alma, sendo passiva e receptiva em relação aos fenômenos do meio, aproximando-a enquanto características dos órgãos dos sentidos. Já a compreensão de Aristóteles segue a direção oposta ao considerá-la potência ativa e integrada à dinâmica psíquica, que move os afetos, a razão e a vontade humana (Massimi, 2011Massimi, M. (2011). Imagens e imaginação nas traduções filosóficas transmitidas no Brasil Colonial. Arquivos brasileiros de psicologia, 63(3), 117-129. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672011000400010
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; Tateo, 2016Tateo, L. (2016). What imagination can teach us about higher mental functions. In: J. Valsiner; G. Marsico; N. Chaudhary; T. Sato; V. Dazzani. Psychology as the science of human being (pp. 149-164). Annals of theoretical psychology: Springer.), visão que se assemelha àquela que iremos apresentar e que são fundamentadas nos estudos de Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).).

No ocidente, Agostinho de Hipona, mais conhecido como Santo Agostinho, desenvolveu grandes reflexões sobre a imaginação e, segundo o filósofo cristão, cada homem reteria em sua memória as imagens do mundo externo, de modo que, ao ouvir uma palavra, é possível reconhecer o objeto por meio de sua imagem. Isso é o que constituiria o pensamento humano, pois para Agostinho, o ato de pensar requeria a presença de imagens depositadas na memória, prontas para serem disponibilizadas à imaginação. Nesse sentido, para conhecer ou pensar sobre um assunto ou objeto não seria necessário estar presente na situação empírica (Massimi, 2011Massimi, M. (2011). Imagens e imaginação nas traduções filosóficas transmitidas no Brasil Colonial. Arquivos brasileiros de psicologia, 63(3), 117-129. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672011000400010
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). E, por muito tempo, compreendeu-se desse modo a imaginação - separadamente da razão, como capacidade de produzir imagens da realidade que exigiria somente a função da memória, visão que favoreceu sua cisão com a racionalidade (Tateo, 2016Tateo, L. (2016). What imagination can teach us about higher mental functions. In: J. Valsiner; G. Marsico; N. Chaudhary; T. Sato; V. Dazzani. Psychology as the science of human being (pp. 149-164). Annals of theoretical psychology: Springer.).

Entretanto, na atualidade, em produções científicas dos últimos cinco anos, o tema vem sendo foco de reflexões de diferentes áreas e campos do conhecimento, destacando-se a educação e a psicologia, parecendo haver certo consenso de que a imaginação é uma função indispensável no processo educativo, fundamental para o aprendizado e também para o desenvolvimento da criatividade. Essa última, em especial, tem estado no centro das atenções de vários pesquisadores do campo da psicologia, em abordagens e práticas diversas (Arruda & Martínez, 2012Arruda, T, S.; Martínez, A. M. (2012). Criatividade do professor e criatividade no trabalho pedagógico: os estudos realizados no Brasil. Linguagem, educação e sociedade, 17(27), 179-208.; Maheirie et al., 2007 Maheirie, K; Zanella, A.V.; Ros, S. Z.; Titon, A. P.; Werner, F. W.; Urnau, L. C.; Cabra, M. G. (2007). Processos de criação em educadores: uma experiência e suas implicações. Revista do Departamento de Psicologia UFF, 19, 145-154. https://doi.org/10.1590/S0104-80232007000100011
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; Mozzer & Borges, 2008Mozzer, G. N. S.; Borges. F. T. (2008). A criatividade infantil na perspectiva de Lev Vigotski. Interação, 33(2), 1-14. https://doi.org/10.5216/ia.v33i2.5269
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; Silva & Nakano, 2012Silva, T. F.; Nakano, T, C. (2012). Criatividade no contexto educacional: análise de publicações periódicas e trabalhos de pós-graduação na área da psicologia. Educação e Pesquisa, 38(3), 743-759. https://doi.org/10.1590/S1517-97022012005000013
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; Montezi & Souza, 2013Montezi, A. V. & Souza, V. L. T. (2013). Era uma vez um sexto ano: estudando imaginação adolescente no contexto escolar. Psicologia Escolar e Educacional, 17(1), 77-85. Recuperado de: https://www.scielo.br/j/pee/a/kkKY7J8cbqTHKgDTvDCG48x/?format=pdf⟨=pt
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).

Dentre essas pesquisas, uma se propôs especialmente a analisar a produção bibliográfica sobre criatividade. Silva e Nakano (2012Silva, T. F.; Nakano, T, C. (2012). Criatividade no contexto educacional: análise de publicações periódicas e trabalhos de pós-graduação na área da psicologia. Educação e Pesquisa, 38(3), 743-759. https://doi.org/10.1590/S1517-97022012005000013
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) destacaram que a maioria dos estudos no campo da psicologia, que focaliza este tema e o da imaginação, tem como objetivo o desenvolvimento de instrumentos de avaliação que visam conferir parâmetros à criatividade como habilidade ou capacidade. Constatam, ainda, que boa parte dos estudos desenvolvidos sobre o tema tem como sujeitos crianças e adultos, sendo os adolescentes a população menos pesquisada. Essa abordagem do tema da imaginação afasta-se da concepção de Vigotski, que a compreende como uma função psicológica que se atrela às demais funções no movimento permanente que caracteriza o sistema psicológico.

Aproximando-se da concepção que ora se apresenta, Castro, Mano e Ferreira (2011Castro, C. M.; Mano, M., Ferreira, S. (2011). Contribuições da cultura, imaginação e arte para a formação docente. Educação e filosofia, 25(50), 539-556. https://doi.org/10.14393/REVEDFIL.issn.0102-6801.v25n50a2011-06
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) afirmam que a imaginação está presente em toda atividade humana e é resultado da inadaptação dos seres humanos à realidade existente. Tal inadaptação funciona como força motriz para dinamizar a atividade criadora, responsável por materializar o que foi imaginado, impulsionando o sujeito a buscar melhores condições de existência. Nas palavras dos autores, “aqueles que estão adaptados à realidade e em relação harmônica com o mundo nada podem criar” (p. 545), ou seja, a alienação é uma das dimensões que limitam o desenvolvimento da imaginação em prol da emancipação humana, e a educação escolar, com sua função e estrutura, poderia produzir um pensar crítico sobre a realidade, gerando necessidades que impulsionam o sujeito para práticas criativas e emancipatórias.

No âmbito internacional, encontramos alguns artigos sobre imaginação que partem das ideias de Vigotski (Andrée & Lager-Nyqvist, 2013Andrée, M.; Lager-Nyqvist, L. (2013). Spontaneous play and imagination in everyday Science classroom practice. Res. Sci. Educ., 43, 1735-1750. https://doi.org/10.1007/s11165-012-9333-y
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; Fleer, 2013Fleer, M. (2013). Affective imagination in Science education: determining the emotional nature of scientific and technological learning of Young children. Science educaction, 43, 2085-2106. https://doi.org/10.1007/s11165-012-9344-8
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; Lindqvist, 2003Lindqvist, G. (2003). Vygotski’s theory of creativity. Creativity Research Journal, 15(2), 245-251. https://doi.org/10.1080/10400419.2003.9651416
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; Tateo, 2016Tateo, L. (2016). What imagination can teach us about higher mental functions. In: J. Valsiner; G. Marsico; N. Chaudhary; T. Sato; V. Dazzani. Psychology as the science of human being (pp. 149-164). Annals of theoretical psychology: Springer.; Zittoun & Cerchia, 2013Zittoun, T.; Cerchia, F. (2013). Imagination as expansion of experience. Integr Psychol Behav Sci. 47(3), 305-324. doi: 10.1007/s12124-013-9234-2.
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;). A maioria desses estudos é de natureza teórica e propõe uma releitura do conceito de imaginação do autor, sendo que dois referem-se a estudos empíricos que visam contribuir para a compreensão do papel da imaginação no desenvolvimento humano, dentre eles, o de Zittoun e Cerchia (2013). Os autores defendem que a imaginação não deve ser compreendida apenas como uma reprodução da realidade, mas também como uma possibilidade de enriquecimento e expansão desta. Isso porque com o auxílio da imaginação, o sujeito consegue pensar sobre objetos e fenômenos cuja visualização não é possível. Foi constatado que situações fictícias, em que o sujeito precisa recorrer à imaginação, podem ser um caminho de desenvolvimento do pensamento e ampliação da experiência de crianças e adolescentes.

Já o segundo estudo empírico encontrado, realizado por Fleer (2013Fleer, M. (2013). Affective imagination in Science education: determining the emotional nature of scientific and technological learning of Young children. Science educaction, 43, 2085-2106. https://doi.org/10.1007/s11165-012-9344-8
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), investigou a influência de situações imaginárias na apropriação dos conceitos científicos por crianças de 3 e 4 anos de idade. Para isso, foram analisadas experiências de três professoras que utilizavam narrativas de contos de fadas para ensinar aos alunos tais conceitos. Durante os encontros de contação de histórias, os alunos apresentaram vivências que lhes possibilitaram a compreensão de diversos fenômenos, favoreceram a aprendizagem e o desenvolvimento da consciência, tendo sido possível a configuração de tais vivências pela via da imaginação. Verificou-se ainda que as crianças reconfiguraram sentidos da vida por meio do engajamento em conversas científicas, mediadas pela narrativa dos contos de fadas, ou seja, pela mobilização da imaginação atrelada ao pensamento por conceitos, que leva ao aprendizado de conceitos científicos. Nesse processo, a mediação do professor contribuiu para que as crianças regulassem sua atenção desenvolvendo um novo olhar ao se voltarem a aspectos de sua vida cotidiana, porém propondo uma forma do perceber e saber científicos, ampliando seus modos de ver a si próprias e ao mundo.

Para nós, ambos os estudos empíricos são de estimada relevância, pois revelam que a imaginação, longe de estar dissociada da razão, quando compreendida atrelada a ela, pode ser favorecedora de práticas escolarizadas que promovem conhecimento, desenvolvimento, e enriquecem vivências voltadas ao aprendizado de conteúdos escolarizados. Neste artigo, traremos nossas compreensões desenvolvidas a partir de estudos do grupo de pesquisa PROSPED (Processos de Constituição do Sujeito em Práticas Educativas), a partir da Psicologia Histórico-Cultural, sobre o modo como compreendemos a imaginação e sua relação com o processo de aprendizagem, apropriação de conhecimentos e a ideia de liberdade.

A CONCEPÇÃO DE IMAGINAÇÃO NA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

A compreensão do conceito de imaginação em Vigotski não é tarefa fácil, à semelhança do que ocorre com o estudo das demais funções psicológicas superiores que o autor postula como constituintes do sistema psicológico. A imaginação na obra de Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).) pode ser compreendida como uma função psicológica superior e, portanto, sua natureza e origem emanam das experiências do sujeito e se sustentam nas inter-relações de outras funções psicológicas (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).).

Portanto, para compreender a imaginação é necessário refletir sobre sua origem, e o estudo de outras funções, tais como a percepção, a memória, o pensamento e a fala, oferece subsídios para acessar sua gênese. Isso porque, segundo Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).), a imaginação tem em sua base a experiência e o desenvolvimento de algumas funções psicológicas, ainda que em nível não tão elaborado, e é premissa para que as informações do meio sejam significadas ou acessadas pelo sujeito, compondo, portanto, o repertório de sua experiência.

Nesse sentido, é importante considerar que a experiência é diferente em cada faixa etária ou a depender do nível de conhecimento da realidade e, em assim sendo, um adulto que possui certo conhecimento sobre arte ou história, por exemplo, terá uma experiência totalmente diferente ao entrar na Capela Sistina, se comparado a uma pessoa que nunca ouviu falar de Michelangelo ou do Vaticano. O contexto externo é o mesmo, porém as possibilidades de significação e atribuição de sentido são totalmente diferentes e, portanto, a experiência também será diferente (Vigotski, 2010Vigotski, L. S. (2010). Quarta aula: a questão do meio na pedologia. (M. P. Vinha, Trad.). Psicologia USP, 21(4), 681-701. (Trabalho original publicado em 1931). https://doi.org/10.1590/S0103-65642010000400003
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).

Compreender a experiência a partir dessa perspectiva significa considerar que a imaginação “tiene siempre una larga historia tras de sí” (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930)., p. 14) e, portanto, a imaginação na criança, no adolescente e no adulto atua de modos muito diferentes, visto que está em jogo o repertório de experiências. Ou seja, o adolescente tem mais possibilidades de imaginar do que a criança, no entanto, comumente, a criança é tida como aquela de imaginação mais disponível para agir na realidade, o que pode ser explicado pela espontaneidade presente nela, e ausente no adolescente que se importa com os juízos alheios (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).).

Segundo Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).), a imaginação ao longo do processo de desenvolvimento do sujeito, o integra à realidade de quatro formas ou níveis, que devem ser compreendidos como processos permanentes que integram sujeito e meio, envolvendo desde as formas mais simples até as mais complexas. Quanto mais desenvolvidas as funções psicológicas, maiores serão as possibilidades de o sujeito acessar a realidade, e o contrário também é correto, pois a imaginação está integrada a todo o sistema psicológico, e o desenvolvimento de uma função psicológica implica na reestruturação do sistema como um todo.

A primeira relação entre a imaginação e a realidade é a fusão de ambas. Todo conteúdo que elucida a imaginação tem sua origem em elementos tomados da realidade, deriva e depende da experiência direta do sujeito. Nesse primeiro nível, que geralmente é característico da criança pequena, a imaginação é sustentada pela tríade: percepção, fala e memória (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).).

A percepção é responsável por captar as informações e objetos externos, os quais são significados com a ajuda da fala e armazenado na memória. Esses processos constituem tanto a imaginação como o pensamento da criança. Dessa forma, na criança pequena, memória, percepção, imaginação e pensamento atuam de modo conjunto e fundido, para mais tarde se diferenciarem.

Neste sentido, para a criança imaginar é pensar por meio de imagens, processo que se refere à internalização dos objetos com o auxílio da memória, da percepção e da fala. A criança necessita de elementos externos para imaginar, o que pode ser notado facilmente durante as atividades de brincadeira.

Ao longo do desenvolvimento humano, a base da imaginação será sempre concreta, no sentido de emanar das necessidades e interesses que são construídos a partir da relação sujeito-meio, mas sua ação não será sempre dependente da dimensão visual-direta, como ocorre neste primeiro estágio descrito por Vigotski. A partir da adolescência, a imaginação não pode ser definida como um reflexo da situação concreta em que o sujeito vive, visto que seu funcionamento se complexifica e é ampliado em função do salto que ocorre no desenvolvimento do psiquismo nesse momento da vida. Isso porque os principais pilares que sustentam a imaginação (percepção, memória, fala, entre outras) são internalizados pelo sujeito e o predomínio é da ordem do semântico, do sentido, do significado e do conceito (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).).

Esse avanço da imaginação amplia, consideravelmente, a experiência do sujeito, que consegue perceber fatos e fenômenos que estão além da observação-direta e constitui o segundo nível de relação da imaginação e realidade (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).). Esse nível é mais complexo que o anterior, visto que a relação entre imaginação e realidade não é interdependente, ou só ocorre na presença de objetos externo-visuais. O sujeito acessa a experiência a partir de conceitos transmitidos e aprendidos pela narrativa de outro(s). Como por exemplo, posso não ter vivido no período da Roma Antiga, mas ao acessar suas características históricas, conhecer alguns de seus artistas e suas obras, tal conhecimento passa a compor minha experiência e constituir-se, portanto, como conteúdo para a imaginação.

O terceiro nível de vinculação da imaginação com a realidade proposto por Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).), tem como central a dimensão afetiva - emoção - pois o autor entende que todo sentimento e emoção interferem no modo como apreendemos a realidade, ao ponto de nossos afetos tornarem-se congruentes às imagens, impressões e ideias da realidade. Nas palavras de Vigotski (2009)Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).: “bien buen sabido es que, cuando estamos alegres vemos com ojos totalmente distintos de cuando estamos melancólicos” (p. 9).

O contrário também é facilmente observado, quando fatores ou objetos externos nos causam sentimentos e emoções de natureza parecida. Para exemplificar tal ideia, Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).) dá o exemplo das cores: “El hombre simboliza com el color negra al dolor y al luto; com el blanco a la alegría; com el azul la tranquilidade; la insurreccín com el rojo” (p. 10). Tal fato é conhecido e denominado de Signo Emocional Comum, que se refere a uma combinação de imagens e eventos que possuem a mesma base afetiva. Assim, existe um intenso vínculo entre imaginação, emoção e pensamento. Sua essência concentra-se na seguinte ideia: tudo que constrói a imaginação influencia reciprocamente os nossos sentimentos e pensamentos e vice-versa, e essa estrutura não concorda com uma lógica externa, mas interna ao sujeito.

Neste sentido, a partir da terceira forma relatada por Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).), é possível afirmar que a separação entre os aspectos intelectuais e os afetivos na constituição do pensamento é um dos principais erros da psicologia. Quando essa cisão ocorre, encerra-se a possibilidade de explicar as causas do pensamento e dos processos imaginativos, porque uma análise que adota a totalidade do fenômeno leva em consideração que, na base de toda ação, há um motivo, uma necessidade e interesses. O mesmo ocorre no processo inverso, as bases afetivas são o caminho para a compreensão de como a imaginação é constituída e atua em cada sujeito (Vigotski, 1991Vigotski, L. S. (1991). Obras Escogidas I. Madrid: Vysor Aprendizaje y Ministerio de Cultura y Ciencia.; 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).).

A quarta e última forma destacada por Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).) como relação da imaginação com a realidade refere-se ao conteúdo da imaginação, que pode ser objetivado como algo novo, formado a partir da associação e dissociação dos elementos da realidade. Essa relação pode ser compreendida como a mais avançada, que fecha e abre, ao mesmo tempo, o movimento dialético do singular-particular-universal na produção do ato criativo que, por sua vez, envolve um processo complexo de elaboração e internalização dos fenômenos possíveis de serem apreendidos da realidade. Apreendem-se determinados aspectos ou características do meio, que são armazenados na memória, e outros se perdem por não serem passíveis de significação e atribuição de sentido.

Dessa forma, o processo consiste na dissociação dos objetos ou fenômenos apreendidos da realidade, de acordo com as possibilidades de atribuição de significados e sentidos pelo sujeito, e o agrupamento das informações acessadas, que são integradas ao repertório de conhecimentos do sujeito. Em geral, esse processo produz novas associações que, ao serem objetivadas transformam o meio e o sujeito. Logo, a imaginação atua na transformação do homem, é criadora, parte do abstrato, cria e transforma o concreto em um processo permanente que ascende a níveis mais elaborados e complexos, conforme o sujeito avança no desenvolvimento.

Acreditamos que o conhecimento ocupa um papel fundamental nesse processo, não no sentido de proporcionar certezas, respostas, mas de provocar questionamentos, dúvidas, mal-estar, desequilíbrios, entre outros sentimentos que colocam a imaginação e a criatividade em movimento. Nesse sentido, para promover o desenvolvimento do processo criativo não basta ampliar e enriquecer a experiência do sujeito, é necessária a criação de situações em que o sistema conceitual seja exercitado, desafiado, posto em movimento e objetivado na realidade.

Muitas vezes, essa dimensão criadora é compreendida de modo naturalizado, como característica de algumas pessoas, limitando-se aos grandes gênios que marcaram nossa história. No entanto, segundo Vigotski (2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).), toda pessoa tem condições de criar, não estando a criação relacionada apenas às grandes invenções, mas relativa a toda ação combinatória de elementos pré-existentes no meio físico e social e nasce da necessidade constante do homem de desenvolver novas formas de pensar e agir na realidade. Afirma, ainda, o autor, que a ação criadora exige a transmissão do pensamento em palavras, envolve consciência e domínio do próprio pensamento. Assim, criar é trabalho.

Explicitados os quatro níveis ou formas de relação entre imaginação e realidade, importa ressaltar que esses devem ser compreendidos não como processos isolados, que evoluem em um contínuo crescente, mas que atuam conjunta e simultaneamente, podendo, em alguns momentos, haver prevalência de um determinado aspecto, o que não exclui de modo algum a participação dos demais. E compreendê-los nos ajuda a entender a função da imaginação no desenvolvimento humano.

Estudando as obras de Vigotski (1998Vigotski, L. S. (1998). Psicologia da Arte. São Paulo: Martins Fontes. (Trabalho Original publicado em 1925).; 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).) em que trata da imaginação, evidencia-se a importância que ele confere a essa Função Psicológica Superior no desenvolvimento do psiquismo. A imaginação se vincularia a todas as funções psicológicas ao se tornarem superiores, ou seja, é ela que lhes confere o caráter de mediada, visto que a qualidade de superior equivale ao processo de significação que as constituem. Exemplo dessa compreensão é a explicação de Vigotski (2001Vigotski, L. S. (2001). Obras Escogidas II. Madrid: Vysor Aprendizaje y Ministerio de Cultura y Ciencia.) de que a palavra é a primeira forma de generalização da criança, ou seja, ao nomear determinado objeto a criança atribui-lhe significados que utilizará para reconhecê-lo em outras situações e, ao fazê-lo, precisa imaginar que as características que identifica no objeto real equivalem à palavra que utiliza para nomeá-lo. Esse processo, ainda preso ao mundo material, avança gradativamente, à medida que a criança se insere em novos contextos interativos, em que acessa outras produções da cultura. Nesse movimento, as relações entre as funções psicológicas se ampliam, construindo nexos que vão constituindo maior complexidade ao funcionamento psicológico, enquanto o pensamento por conceito por exemplo, que tem como base a abstração, se torna possível ao sujeito.

A abstração, por sua vez, só se realiza pela ação da imaginação, ou seja, o desenvolvimento do pensamento por conceito só se efetiva quando o sujeito é capaz de se desprender de objetos do mundo real para pensar, explicar, compreender princípios e conceitos. Por exemplo, uma coisa é compreender o crescimento de uma planta observando-a, medindo-a e registrando sua evolução; outra é compreender os movimentos de rotação e translação da Terra sem que se possa percebê-los ou observá-los, ou com a percepção de que se está parado no espaço e no tempo. Ou ainda, compreender a velocidade da luz, ou a teoria da relatividade, que exige grande esforço imaginativo à sua compreensão. Quanto mais abstrato e complexo o conceito, mais se exige do psiquismo o trabalho da imaginação.

É claro que o pensamento por conceito, ou pensamento abstrato, demanda, também, outras funções que produzem novas relações caracterizando o funcionamento complexo de todo psiquismo, ou seja, o psiquismo, tal como o entende Vigotski (2001Vigotski, L. S. (2001). Obras Escogidas II. Madrid: Vysor Aprendizaje y Ministerio de Cultura y Ciencia.), é um sistema e uma vez alterada uma função, todas as demais se alteram como resultado de novas relações entre elas. É neste sentido que o autor vai dizer que a estrutura das funções psicológicas superiores não se altera, pois o que se modifica são as relações que elas estabelecem, conferindo nova qualidade ao funcionamento psicológico.

Destarte a importância de todas as funções psicológicas na promoção do desenvolvimento do sujeito, é possível afirmar que a imaginação, na adolescência, assume prevalência, atuando no desenvolvimento do pensamento abstrato e favorecendo processos criativos. Daí a importância de se investir na mobilização da imaginação em contextos educativos, visto que ela é fundamental à apropriação de conhecimentos, sobretudo daqueles que são ensinados nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, que se caracterizam pela abstração e complexidade.

O movimento dialético que caracteriza o funcionamento psicológico permite afirmar que nesse sentido, quanto mais conceitos o sujeito tiver domínio, mais desenvolvida será sua imaginação. Uma segunda proposição incorpora a primeira, visto que na apreensão de conceitos, sobretudo aqueles mais abstratos e complexos, é necessária a articulação e relação entre os conceitos já apreendidos pelo sujeito. E cada vez que ele se apropria de novos conceitos, novas relações são estabelecidas, promovendo novas sínteses entre o sistema conceitual (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).). Ainda, outra ideia que nos interessa defender relaciona-se à emoção e diz respeito às necessidades e sentimentos que perpassam a adolescência. Muitas vezes, desejos ou necessidades que não são possíveis de serem concretizados, encontram na imaginação uma forma de expressão.

Fleer (2013Fleer, M. (2013). Affective imagination in Science education: determining the emotional nature of scientific and technological learning of Young children. Science educaction, 43, 2085-2106. https://doi.org/10.1007/s11165-012-9344-8
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), estudiosa do conceito de imaginação em Vigotski, desenvolveu o conceito de imaginação afetiva referindo-se a um processo que denomina de empático em que o sujeito consegue pensar e refletir sobre sentimentos e emoções alheios, destacando-se o papel das histórias em despertar tal processo em crianças pequenas. Podemos ampliar tal conceito e generalizar para o mundo das artes em geral como uma possibilidade de despertar esse tipo de imaginação.

Ainda, e por fim, defendemos a ideia da imaginação como mobilizadora da possibilidade de o sujeito projetar-se para o futuro, na medida em que favorece a produção de horizontes aos quais se dirigir (Tateo, 2016Tateo, L. (2016). What imagination can teach us about higher mental functions. In: J. Valsiner; G. Marsico; N. Chaudhary; T. Sato; V. Dazzani. Psychology as the science of human being (pp. 149-164). Annals of theoretical psychology: Springer.). Suas aspirações e motivos materializam-se em determinadas imagens e significados e produzem o devir. Ou seja, a imaginação também presentifica o futuro, o que eleva ainda mais sua importância nos processos de escolarização, visto que neste processo de materialização e significação do futuro concorrem aspectos positivos e também negativos. Logo, é urgente refletir com educadores sobre o potencial da imaginação na produção de significações e a relação das significações com a produção de devires.

Tais funcionalidades que perpassam o desenvolvimento da imaginação podem ser sintetizadas e contempladas em uma característica de extrema importância na constituição do humano e que é um dos principais pilares da teoria Histórico-Cultural: a liberdade. Quanto mais desenvolvida for a imaginação do sujeito maiores serão suas possibilidades de ser livre.

IMAGINAÇÃO E LIBERDADE

O conceito de liberdade é compreendido, muitas vezes, a partir de uma visão liberal, referindo-se à desvinculação do sujeito com o social, como se ela - a liberdade - a vontade e o interesse emanassem do próprio sujeito. Neste modo de compreensão, a liberdade associa-se a um rompimento com as regras e determinações sociais que, muitas vezes, têm em sua base apenas a sensação gerada pela transgressão de tais leis. Em contrapartida, outras teorias da psicologia têm como concepção que o social determina o desenvolvimento humano e que, portanto, a liberdade seria algo inalcançável, uma utopia, pois sempre estaríamos submetidos às amarras sociais (Sawaia, 2009Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia & Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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).

Essa concepção de liberdade é criticada por Sawaia (2009Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia & Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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), pois anula o que o homem tem de mais importante: sua singularidade. Em suas palavras:

O psicólogo, muitas vezes por medo do psicologismo e da redução do indivíduo a si mesmo, isolado do social, tende a abandonar o sujeito, suas alegrias e seus sofrimentos, tudo o que representa o singular, e volta-se exclusivamente à análise e à atuação nas determinações sociais. Cria, assim, uma cilada mortífera a sua práxis: se o sujeito é um objeto que não pode se defender das determinações sociais, não há lugar para a ideia de transformação da sociedade; ou, uma vez que a subjetividade é efeito mecânico da presença do capitalismo e a individuação é exclusivamente a subjetivação de processos sócio-históricos de submissão, resta-nos apenas conhecer e criticar os mecanismos de adestramento (p. 365).

A autora critica o fato de que nesse processo toma-se o social como determinante do desenvolvimento e se esquece de dimensões importantes para a compreensão da liberdade como os afetos, o pensamento e a imaginação. Corrobora, portanto, o conceito de liberdade em Vigotski (2006Vigotski, L. S. (2006). Obras Escogidas IV - Psicología Infantil (2ª ed.). Madrid: A. Machado Libros.), que não parte da concepção liberal, tampouco do determinismo social, mas busca romper com a cisão individual/social, propondo uma compreensão dialética dessa relação. Para o autor, o conceito de liberdade está relacionado à apropriação do social pelo sujeito, partindo da lógica de que quanto mais o sujeito se conhece, maiores serão suas possibilidades de liberdade. Essa acepção se filia à ideia de Espinosa (1957Espinosa, B. (1957). Ética (L. Xavier, Trad., 3ª ed.). São Paulo: Atenas. (Trabalho original publicado em 1677).), filósofo que estudou em profundidade ainda na juventude, para quem ser livre equivale a conhecer as causas das afecções alegres ou tristes que nos tomam em nossas vidas. Ou seja, se conheço as causas de minhas afecções, posso agir sobre elas e então me libertar de seu jugo. Movimento, no entanto, que depende da imaginação como possibilidade de ultrapassar os limites do real, de minha condição geográfica e temporal, para me projetar em situações que ainda que fictícias podem ser vividas com emoções reais.

Este tipo de vivência envolve tanto as condições do meio, quanto os afetos, necessidades e interesses do sujeito. Diante disso, reside, aqui, nossa preocupação com a aprendizagem e desenvolvimento dos adolescentes.

Assim sendo, o alcance da liberdade deve ser compreendido sempre como um longo processo que envolve a cooperação, pois só se efetiva no e com o coletivo. Segundo Delari Junior (2013Delari Junior, A. (2013). Princípios Éticos em Vigotski: perspectivas para a psicologia e a educação. Nuances: estudo sobre educação, 24(1), pp. 45-63. http://dx.doi.org/10.14572/nuances.v24i1.2153
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), a cooperação, a superação e a emancipação seriam os princípios éticos da teoria de Vigotski e estariam na base da ideia de liberdade. A superação refere-se à crença na capacidade do sujeito em se desenvolver, ultrapassando seus próprios limites uma vez que estejam presentes situações sociais que a favoreçam. Em outras palavras, a superação não se efetiva pela ação individual, mas necessita da cooperação de outras pessoas, que pode se constituir como motivo para o sujeito cooperar consigo mesmo.

É pela união desses dois princípios - superação e cooperação - que se torna possível a emancipação, compreendida por nós como a capacidade humana de pensar para além da realidade dada, que tem em sua base a consciência sobre si e sobre o mundo circundante. A emancipação, no entanto, só pode ser conquistada no e com o coletivo, pois se emancipar nessa perspectiva demanda construir com os outros das relações as condições mesmas de superação e cooperação. Ou seja, ninguém se emancipa sozinho, sem que o coletivo também alcance essa condição.

Nessa perspectiva, a liberdade pode ser compreendida como a capacidade do sujeito de guiar suas ações e escolhas com base no conhecimento das razões dessas ações e escolhas, por isso, Vigotski (2006Vigotski, L. S. (2006). Obras Escogidas IV - Psicología Infantil (2ª ed.). Madrid: A. Machado Libros.) afirma que o único modo de conquistar a liberdade é pelo desenvolvimento do pensamento por conceitos, o qual é favorecedor de modos de compreender o mundo de forma crítica e complexa, a partir de abstrações e generalizações que possibilitam a significação mais ampliada do mundo.

A liberdade adquirida através do conhecimento possibilita ao sujeito imaginar outros modos de relação, favorecendo a superação e facilitando a cooperação, por lhe permitir entender as necessidades e emoções próprias e alheias. Assim, a imaginação é condição para a liberdade, pois é por meio dela que conseguimos recriar nosso passado, projetar nosso futuro, colocar nossas necessidades e interesses em ação e, portanto, assumir o protagonismo de nossas histórias.

Sawaia (2009Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia & Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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), ao adotar os pressupostos da filosofia de Espinosa e da teoria de Vigotski, destaca o importante papel da imaginação na liberdade humana, que tem como base as emoções e o pensamento. Segundo a autora, toda emoção faz uso da imaginação, pois é ela que possibilita ampliar a experiência humana, compreender as emoções próprias e alheias. Somente com a integração entre pensamento, afeto e imaginação torna-se possível a liberdade, no sentido de colocar o sujeito como autor de sua história, capaz de projetar-se em diversas situações, reconhecendo-se, ou estranhando-se, antes de fazer suas escolhas e tomar suas decisões. Vale dizer que quanto maior a liberdade do sujeito, maiores serão suas possibilidades de imaginação.

Por isto a questão da imaginação é tão importante e merece ser estudada e trabalhada na articulação com os contextos educativos, pois é ela que irá permitir a ampliação da experiência do sujeito, oferecendo maiores possibilidades de pensar sobre si e o mundo, guiando o desenvolvimento rumo à liberdade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos itens precedentes buscou-se refletir sobre a imaginação como Função Psicológica Superior e sua contribuição à apropriação de conhecimentos, dando ênfase ao pensamento por conceito, necessário ao domínio de conhecimentos abstratos, ao processo de desenvolvimento do sujeito e à conquista da liberdade como horizonte de uma vida consciente de si, do outro e de seu papel no mundo.

Essa compreensão, assentada nas postulações de Vigotski sobre a constituição e funcionamento do psiquismo humano, conduz à reflexão sobre a importância dos contextos sociais no oferecimento de condições promotoras do desenvolvimento do sujeito. Dentre esses contextos, é dado destaque à escola, justamente por constituir-se como espaço coletivo favorecedor de interações com a diversidade de normas e valores, e o acesso a novos conhecimentos, que vão se complexificando conforme o sujeito avança na escolarização.

A imaginação possibilita ao homem se apropriar e transformar sua realidade concreta, criar e recriar formas de existência, favorecendo, assim, o avanço das produções humanas - materiais e simbólicas (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). La imaginación y el arte em la infancia (9ª ed.). Madrid: Ediciones Akal (Trabalho original publicado em 1930).). Esta compreensão torna indispensável a vinculação entre a imaginação e a educação escolar, pois a maioria dos conceitos nela ensinados são abstratos e requer a imaginação para sua apropriação, acesso e compreensão (Barbosa & Souza, 2015Barbosa, E. T.; Souza, V. L. T. (2015). Sentidos do respeito para alunos: uma análise na perspectiva da Psicologia Histórico-cultural. Psicologia: ciência e profissão, 35(2), 255-270. https://doi.org/10.1590/1982-370300462013
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). Quanto maior a complexidade dos conceitos, maior a necessidade de mobilização da imaginação (Souza, 2016Souza, V. L. T. (2016). Arte, Imaginação e Desenvolvimento Humano; aportes à atuação do Psicólogo na escola. In: M. V. Dazzani; V. L. T. de Souza (Eds.), Psicologia Escolar Crítica: teoria e prática nos contextos educacionais(pp. 77-94). Campinas, SP: Alínea.), e reside nessa acepção nossa compreensão de que a psicologia pode, em muito, contribuir para a explicitação da relação entre a imaginação e a aprendizagem.

O conceito de imaginação em Vigotski nos possibilita pensar diversas ações e caminhos na educação escolar, em especial na atuação do psicólogo escolar. Em nossas pesquisas e intervenções trabalhando com o conceito de imaginação, constatamos seu importante papel na produção de horizontes e devires que promovem o desenvolvimento. O que constatamos é que não apenas os meios físico e social se concretizam como fonte de desenvolvimento, mas também o meio imaginado. Tal constatação foi possível a partir de nossos estudos e propostas de intervenção em escolas com adolescentes, desenvolvendo atividades de contação e produção de histórias, em parceria com professores de Língua Portuguesa (Barbosa, 2012Barbosa, E. T. (2012). Os sentidos do respeito na escola: um estudo da perspectiva da psicologia histórico-cultural (Dissertação de Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas-SP. Recuperado de:http://tede.bibliotecadigital.puc-campinas.edu.br:8080/jspui/handle/tede/305
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; Souza, 2016Souza, V. L. T. (2016). Arte, Imaginação e Desenvolvimento Humano; aportes à atuação do Psicólogo na escola. In: M. V. Dazzani; V. L. T. de Souza (Eds.), Psicologia Escolar Crítica: teoria e prática nos contextos educacionais(pp. 77-94). Campinas, SP: Alínea.; Barbosa & Souza, 2010Barbosa, E. T.; Souza, V. L. T. (2010). A vivência de professores sobre o processo de inclusão: um estudo da perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural. Psicopedagogia, 27, 352-362. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862010000300005
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).

Neste artigo, destacamos a necessidade de a imaginação ser considerada em todas as esferas da educação básica, como condição para a formação do aluno. No entanto, para além do aluno, a imaginação, entendida como função psicológica que favorece a visualização de horizontes, não seria um elemento importante para se pensar a formação de professores, suas condições de trabalho e possibilidades de superação de condições de ensino e de conflitos? Quais seriam os horizontes dos professores em relação à sua profissão? Será que não radica neste horizonte, ou ausência dele, a falta de atratividade da profissão, ou mesmo os altos índices de adoecimento e desistência? Como os professores imaginam os horizontes dos alunos?

Essas são questões que apontam para as limitações desse estudo, mas que justificam a plausibilidade de se investir em outros estudos sobre o tema da imaginação na educação e acena para novos temas de investigação que superem a centralidade da imaginação apenas na educação infantil. Assim, muitos são os caminhos que precisam ser pensados e contemplados para a imaginação ter seu merecido lugar na escola e na compreensão do desenvolvimento humano, oferecendo muitas possibilidades e desafios práticos e teóricos para a psicologia escolar.

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  • Trabalho realizado com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    06 Maio 2019
  • Aceito
    23 Set 2019
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