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Monitoramento e avaliação dos planos municipais de educação: coordenação federativa e poder local 1 1 Editor responsável: Cristiane Machado https://orcid.org/0000-0002-3522-4018 2 2 Normalização, preparação e revisão textual: Piero Kanaan (Tikinet) revisao@tikinet.com.br 3 3 Apoio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Produtividade em pesquisa. Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (FUNDECT).

Resumo

O objetivo deste artigo é analisar a elaboração, o monitoramento e a avaliação de planos municipais de educação, no período entre 2015 e 2020. Trata-se de uma pesquisa quanti-qualitativa desenvolvida por meio de dados disponibilizados na página eletrônica do Plano Nacional de Educação (PNE). Os resultados apresentados evidenciam um percentual elevado de planos elaborados pelos municípios (99%) em detrimento de relatórios de monitoramento e avaliação, que não ultrapassou os 35%. Observa-se que a adesão dos municípios à elaboração de planos foi promovida pela indução do Ministério da Educação, movimento enfraquecido em razão do desmonte das estruturas nacionais de coordenação federativa a partir de 2017, o que impactou diretamente no planejamento educacional em nível local.

Palavras-clave
Planejamento Educacional; Poder Local; Coordenação Federativa; Política Educacional

Abstract

This study aims at analyzing the elaboration, monitoring, and assessment of municipal education plans in the period from 2015 to 2020. The research is qualitative and quantitative carried out from data available on the National Education Plan (PNE) website. The findings made evident a high percentage of plans elaborated by municipalities (99%), to the detriment of monitoring and assessment reports, which have not overcome 35%. It is observed that adhesion of municipalities to the elaboration of plans was promoted by Ministry of Education induction, movement weakened due to the dismantling of national federative coordination structures from 2017, which directly impacted the educational planning at the local level.

Keywords
Educational Planning; Local Power; Federative Coordination; Educational Policy

Introdução

Um plano de educação pretende ser a linha de frente para que os princípios educacionais se traduzam em políticas consistentes com base em uma rigorosa radiografia dos problemas da educação e, portanto, atende tanto a princípios quanto a regras dentro de uma normatividade jurídica posta (Cury, 2013Cury, C. R. J. (2013). Planos Nacionais de Educação no Brasil. In E. B. Ferreira & M. Fonseca (Orgs.), Política e Planejamento educacional no Brasil do século 21. Liber Livro.).

Tal preceito foi estabelecido na Constituição Federal de 1988, que determina a exigência de um Plano Nacional de Educação (PNE), de duração plurianual. A Emenda Constitucional no 59, de 11 de novembro de 2009Emenda Constitucional no 59. (2009, 11 de novembro). Acrescenta § 3º ao art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para reduzir, anualmente, a partir do exercício de 2009. Congresso Nacional. https://bit.ly/3CaCnxp
https://bit.ly/3CaCnxp...
(Brasil, 2009Brasil. (2010). Documento Final da Conae. Ministério da Educação. https://bit.ly/45zDpjT
https://bit.ly/45zDpjT...
), no Art. 214, altera a condição do plano, estabelecendo a duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração. Também buscou “definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas (. . .)” (Brasil, 1988Brasil. [Constituição (1988)]. (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/con...
).

Em decorrência desse dispositivo legal, o PNE 2014-2024 foi resultado de construção coletiva efetivada por meio da Conferência Nacional de Educação (Conae), em 2010, precedida por debates municipais, estaduais e do Distrito Federal (Brasil, 2010Brasil. (2010). Documento Final da Conae. Ministério da Educação. https://bit.ly/45zDpjT
https://bit.ly/45zDpjT...
). Esse processo que compreendeu, em conjunto, a participação da sociedade política e de organismos representativos da sociedade civil na tramitação do projeto no Congresso Nacional, favoreceu o amplo debate e confronto de ideias, além de consensos historicamente possíveis, sendo, por fim, aprovado pela Lei nº 13.005 (2014)Lei n° 13.005, de 25 de julho de 2014. (2014, 25 de julho). Aprova o Plano Nacional de Educação – PNE e dá outras providências. Casa Civil. http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm
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, sem vetos, no governo de Dilma Vana Rousseff (2011-2014).

O Art. 8º da referida lei estabeleceu que os entes federados que compõem a organização político-administrativa do Estado federativo – os estados, os municípios e o Distrito Federal – deverão elaborar seus correspondentes planos de educação, ou adequar os planos já aprovados em lei, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas no PNE, estabelecendo o prazo de um ano contado a partir da publicação da Lei nº 13.005 (2014)Lei n° 13.005, de 25 de julho de 2014. (2014, 25 de julho). Aprova o Plano Nacional de Educação – PNE e dá outras providências. Casa Civil. http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm
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.

Consulta realizada à página eletrônica PNE em Movimento (Brasil, 2020Brasil. Ministério da Educação. (2020). PNE em Movimento. https://pne.mec.gov.br/
https://pne.mec.gov.br/...
) indica que mais de 99% dos municípios aprovaram o Plano Municipal de Educação (PME) até 2018, com exceção de três municípios do estado de São Paulo. Essa informação remete a outro elemento importante, qual seja, o monitoramento e a avaliação dos planos de educação com vistas ao cumprimento das suas metas e estratégias. Conforme o Art. 5o da Lei no 13.005, de 25 de junho de 2014,

A execução do PNE e o cumprimento de suas metas serão objeto de monitoramento contínuo e de avaliações periódicas, realizadas pelo Ministério da Educação (MEC), pelas comissões de educação da Câmara e do Senado, pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e pelo Fórum Nacional de Educação

(Lei no 13.005, 2014Lei n° 13.005, de 25 de julho de 2014. (2014, 25 de julho). Aprova o Plano Nacional de Educação – PNE e dá outras providências. Casa Civil. http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm
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).

Em consonância com este artigo, a Lei estabelece, em seu Art. 7º, § 3o, que “Os sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios criarão mecanismos para o acompanhamento local da consecução das metas deste PNE e dos planos previstos no Art. 8o” (Lei no 13.005, 2014Lei n° 13.005, de 25 de julho de 2014. (2014, 25 de julho). Aprova o Plano Nacional de Educação – PNE e dá outras providências. Casa Civil. http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm
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).

O acompanhamento, nesse contexto, baseia-se no monitoramento de um conjunto sistemático de dados e informações para o cumprimento das metas e estratégias dos planos de educação, dos dispositivos legais e da materialização de políticas educacionais. Assim, “monitorar e avaliar tornam-se partes constantes de um único processo, ou seja, etapas distintas e complementares que não se realizam isoladamente. Por essa ótica, a avaliação compreende o monitoramento como parte constitutiva e constituinte”, conforme assinalam Dourado, Grossi Junior e Furtado (2016, p. 456)Dourado, L. F., Grossi Junior, G., & Furtado, R. A. (2016). Monitoramento e avaliação dos planos de educação: breves contribuições. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 32(2), 449-461. https://doi.org/10.21573/vol32n22016.67198
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.

Se um plano pressupõe um esforço consciente e sistemático de limites, possibilidades e recursos (Cury, 2013Cury, C. R. J. (2013). Planos Nacionais de Educação no Brasil. In E. B. Ferreira & M. Fonseca (Orgs.), Política e Planejamento educacional no Brasil do século 21. Liber Livro.), cada ente federado responsável pela oferta da educação deverá estabelecer uma estrutura própria de acompanhamento e avaliação, a fim de contribuir para maior organicidade das políticas educacionais. A marca dessa proposta é a participação dos interessados em sua materialização, por exemplo os movimentos sociais e os demais segmentos da sociedade civil organizada, além da sociedade política por meio de instâncias colegiadas, tais quais os conselhos de educação, dentre outros espaços de participação e mobilização (Brasil, 2014Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino. (2014). Planejando a próxima década: alinhando os planos de educação. SASE; MEC. http://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_alinhando_planos_educacao.pdf
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).

Com base nessas considerações, este artigo analisa o processo de elaboração e, principalmente, de monitoramento e avaliação de planos de educação dos municípios brasileiros, entre os anos de 2015 e 2020. O levantamento de dados foi realizado por meio do portal do PNE em Movimento (Brasil, 2020Brasil. Ministério da Educação. (2020). PNE em Movimento. https://pne.mec.gov.br/
https://pne.mec.gov.br/...
), mantido pelo Ministério da Educação (MEC), o qual disponibiliza os planos municipais de educação, bem como relatórios de monitoramento e avaliação de todos os municípios. Utilizou-se também da Biblioteca de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) para identificar teses e dissertações produzidas sobre a temática em discussão neste artigo.

Sendo assim, trata-se de uma pesquisa quanti-qualitativa, que busca identificar a relação entre o número de planos elaborados e de relatórios de monitoramento e avaliação produzidos pelos municípios, analisando esses processos com ajuda dos conceitos de coordenação federativa e poder local.

A coordenação federativa é compreendida na perspectiva do papel da União na indução dos demais entes federativos ao fortalecimento do planejamento educacional contínuo, que seja tomado como referência durante o desenvolvimento das políticas públicas em nível local. Para tanto, compreende-se o poder local em sentido amplo, abrangendo a participação dos mais diversos segmentos sociais representativos da sociedade civil e política nos processos de elaboração, monitoramento e avaliação dos planos em nível municipal. Remetendo a Dowbor (2016)Dowbor, L. (2016). O que é poder local? Ética., o poder local é um eixo estratégico de transformação da forma em que se tomam as decisões que concernem o desenvolvimento econômico e social de um espaço local (Dowbor, 2016Dowbor, L. (2016). O que é poder local? Ética., p. 11). “Esses processos participativos que constroem gradualmente uma âncora de bom senso no conjunto dos processos políticos, a partir da base da sociedade, estão no centro do que aqui chamamos poder local” (Dowbor, 2016Dowbor, L. (2016). O que é poder local? Ética., p. 24). Contudo, é preciso lembrar que se trata de um movimento complexo diante de limites estruturais e conjunturais a que estão sujeitos a autonomia e o poder local.

O recurso metodológico utilizado constitui-se de pesquisa documental composta por fontes primárias e secundárias. Como fontes primárias foram considerados os relatórios produzidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e pelas comissões de monitoramento e avaliação dos planos municipais de educação, divulgados na página eletrônica do PNE/MEC. Dada a dimensão territorial desta pesquisa, também foram utilizadas fontes secundárias compostas por teses, dissertações e artigos que tratam da participação social na elaboração, monitoramento e avaliação de planos municipais de educação. Dessa forma, constituiu-se um conjunto de estudos desenvolvidos em municípios das cinco regiões brasileiras após a aprovação dos planos.

Coordenação federativa e poder local na elaboração dos planos decenais no Brasil (2014-2018)

Historicamente, no Brasil, o poder local tem sido associado às práticas conservadoras regidas pelo “coronelismo, patrimonialismo e personalismo no exercício do poder político”, conforme analisa Vieira (2011, p. 78)Vieira, S. L. (2011). Poder local e educação no Brasil: dimensões e tensões. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 27(1), 123-133. https://doi.org/10.21573/vol27n12011.19972
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. No entanto, sob circunstâncias democráticas, esse entendimento “requer novos olhares, de modo a incorporar a participação da sociedade civil e dos movimentos sociais, que ressignificam as formas de articulação com a sociedade política” (Vieira, 2011Vieira, S. L. (2011). Poder local e educação no Brasil: dimensões e tensões. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 27(1), 123-133. https://doi.org/10.21573/vol27n12011.19972
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, p. 127).

Esse movimento se fortalece especialmente no período de abertura democrática do país, subsequente à Ditadura Civil-Militar (1964-1985). A Constituição Federal de 1988, ao atribuir aos municípios o status de ente federativo, mudou a relação entre a esfera federal e as subnacionais, consoante analisa Souza (1996)Souza, C. (1996). Reinventando o poder local: limites e possibilidades do federalismo e da descentralização. São Paulo em Perspectiva, 10(3), 103-112.. Para a autora, “A política e a federação brasileiras, assim como as relações intergovernamentais, apresentam hoje um caráter difuso, gerador de uma fragmentação de poder” (Souza, 1996Souza, C. (1996). Reinventando o poder local: limites e possibilidades do federalismo e da descentralização. São Paulo em Perspectiva, 10(3), 103-112., p. 106). Nessa conjuntura, o poder local torna-se uma das questões fundamentais da organização social, conforme analisa Dowbor (2016)Dowbor, L. (2016). O que é poder local? Ética.. Segundo o autor

Referido como local authority em inglês, communautés locales em francês, ou, ainda, como “espaço local”, o poder local está no centro do conjunto de transformações que envolvem a descentralização, a desburocratização e a participação (. . .). No caso dos países em desenvolvimento, a questão se reveste de particular importância na medida em que o reforço do poder local permite, ainda que não assegure, criar equilíbrios mais democráticos frente ao poder absurdamente centralizado nas mãos das grandes oligarquias nacionais e transnacionais

(Dowbor, 2016Dowbor, L. (2016). O que é poder local? Ética., pp. 13-14).

Considerando tal acepção, a configuração do poder local exercido nos municípios e estados brasileiros torna-se elemento fundamental para a compreensão das políticas públicas, em especial, as de educação, sem, no entanto, deixar de considerar o papel estratégico da coordenação federativa. Isso porque, conforme estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei no 9.394 (1996)Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. (1996, 20 de dezembro). Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm
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, no Art. 8º, § 1º, caberá à União a coordenação da política nacional de educação, de modo a articular os diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa, redistributiva e supletiva em relação às demais instâncias educacionais, porém, o § 2º específica que “Os sistemas de ensino terão liberdade de organização nos termos desta Lei” (Lei no 9.394, 1996Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. (1996, 20 de dezembro). Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
).

Tomando o recente processo de planejamento educacional analisado neste artigo, podemos observar que a elaboração dos planos decenais de educação pelos municípios realizou-se em um cenário de fortalecimento do papel coordenador da União. Esse movimento se fortaleceu nas primeiras décadas dos anos 2000, por meio da formulação de políticas, programas e planos nacionais que visavam à integração das ações dos diferentes entes governamentais (Lotta, Gonçalves, & Bitelman, 2014Lotta, G. S., Gonçalves, R., & Bitelman, M. F. (2014). A Coordenação Federativa de Políticas Públicas: uma análise das políticas brasileiras nas últimas décadas. Cadernos Gestão Pública e Cidadania, 19(64), 1-18. https://doi.org/10.12660/cgpc.v19n64.5817
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).

O PNE (2014-2024), instituído pela Lei n° 13.005/2014 (Brasil, 2014Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino. (2014). Planejando a próxima década: alinhando os planos de educação. SASE; MEC. http://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_alinhando_planos_educacao.pdf
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), é um exemplo de coordenação federativa da União, uma vez que imputou aos demais entes federativos brasileiros a obrigatoriedade de elaborar ou reformular seus respectivos planos estaduais e/ou municipais, alinhados ao plano nacional com ajuda de uma metodologia participativa. Tal indução se explicitou por meio de ações que vão desde a criação de uma secretaria específica dentro do MEC, a Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (Sase), até a elaboração de textos de apoio, normas e manuais, além da garantia de financiamento das ações desenvolvidas por estados, municípios e Distrito Federal para a cumprimento desse propósito.

Resultou desse movimento de coordenação federativa a aprovação de planos decenais de educação em mais de 99% dos entes federativos brasileiros, no período entre 2014 e 2018, com registros de importante participação social, de acordo com as orientações emanadas pela União, conforme evidenciam estudos desenvolvidos sobre o tema.

Silva (2015)Silva, M. A. (2015). Plano Municipal de Educação de Rio Claro – SP: desafios e perspectivas na garantia do direito à educação [Dissertação de mestrado, Universidade Estadual Paulista]. Repositório Institucional UNESP. https://repositorio.unesp.br/handle/11449/139303
https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
, em estudo sobre o Plano Municipal de Educação de Rio Claro – SP, sinalizou para a ampla participação da sociedade na elaboração do plano, por meio da mobilização desenvolvida pela Secretaria Municipal de Educação. No entanto, “os períodos subsequentes representaram um retrocesso nesse aspecto” (Silva, 2015Silva, M. A. (2015). Plano Municipal de Educação de Rio Claro – SP: desafios e perspectivas na garantia do direito à educação [Dissertação de mestrado, Universidade Estadual Paulista]. Repositório Institucional UNESP. https://repositorio.unesp.br/handle/11449/139303
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, p. 179).

Em análise sobre a elaboração do PME do município de Marília – SP, Benicasa (2019)Benicasa, E. I. (2019). Elaboração do Plano Municipal de Educação de Marília como elemento para a gestão democrática [Dissertação de mestrado, Universidade Estadual Paulista]. Repositório Institucional UNESP. https://bit.ly/3MDCoPe
https://bit.ly/3MDCoPe...
apontou um amplo e democrático processo de participação.

Para além da vasta previsão constitucional e infraconstitucional, a ampla participação política na elaboração do PME está muito bem documentada nas Atas do CME, uma vez que ela foi estendida à toda a comunidade local, com a colaboração de vários segmentos da sociedade”, afirma a autora

(Benicasa, 2019Benicasa, E. I. (2019). Elaboração do Plano Municipal de Educação de Marília como elemento para a gestão democrática [Dissertação de mestrado, Universidade Estadual Paulista]. Repositório Institucional UNESP. https://bit.ly/3MDCoPe
https://bit.ly/3MDCoPe...
, p. 93).

Nascimento (2018)Nascimento, T. O. S. (2018). O Plano Nacional de Educação e os desafios para a elaboração dos Planos Municipais de Educação [Dissertação de mestrado, Universidade do Oeste Paulista]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações Unoeste. bit.ly/3WGE5zP, ao analisar a elaboração do PME em dois municípios paulistas, considerou que o processo foi participativo e autônomo, destacando a “expressiva e importante experiência democrática dos membros dos sindicatos nesse processo” (Nascimento, 2018Nascimento, T. O. S. (2018). O Plano Nacional de Educação e os desafios para a elaboração dos Planos Municipais de Educação [Dissertação de mestrado, Universidade do Oeste Paulista]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações Unoeste. bit.ly/3WGE5zP, p. 99).

A pesquisa de Braga (2019, p. 66)Braga, M. S. (2019). O Planejamento educacional em Mazagão-AP: um olhar sobre o Plano Municipal de Educação no triênio (2015-2017) [Dissertação de mestrado, Universidade Estadual do Ceará]. Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações. https://bdtd.ibict.br/vufind/Record/UECE-0_b3802b227bde1aa3f4cbc47b5d2b2bd6
https://bdtd.ibict.br/vufind/Record/UECE...
, que abrange o município de Mazagão (Mz) – AP, considera que o PME/Mz “foi construído de maneira democrática, envolvendo os mais diversos atores, assim, há representações na participação, deliberação e efetividade destas instituições”.

No estado do Pará, a elaboração do PME do município de Bragança foi analisada por Silva (2020)Silva, K. H. S. R. (2020). Plano Municipal de Educação de Bragança-PA: o trabalho do Conselho Municipal de Educação na efetivação da meta 19 [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará]., que identificou, no texto do plano, a indicação de realização de conferências e fóruns municipais de educação. Para a autora, embora o texto registre “a intenção de fazer com que a proposta fosse construída com a participação dos variados segmentos da sociedade bragantina” (Silva, 2020Silva, K. H. S. R. (2020). Plano Municipal de Educação de Bragança-PA: o trabalho do Conselho Municipal de Educação na efetivação da meta 19 [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará]., p. 67), a pesquisa evidenciou, na composição da comissão organizadora, maioria de representantes do poder executivo. Para a autora, isso “representa a fragilidade no processo de mobilização de mais associações de participação civil” (Silva, 2020Silva, K. H. S. R. (2020). Plano Municipal de Educação de Bragança-PA: o trabalho do Conselho Municipal de Educação na efetivação da meta 19 [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará]., p. 70).

Ens, Costa, Bueno e Nagel (2016)Ens, R. T., Costa, C. S., Bueno, E. D. L., & Nagel, J. S. O. (2016). Política Educacional: Participação Democrática no Plano Municipal de Educação de Curitiba. Interacções, 40, 89-109. https://bit.ly/3qiNfGH
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, em pesquisa sobre a participação democrática no PME de Curitiba, concluíram que “a participação democrática por meio da representatividade, foi o caminho escolhido pelo governo municipal para dar voz às entidades do segmento da educação e do setor da sociedade civil” (Ens et al., 2016Ens, R. T., Costa, C. S., Bueno, E. D. L., & Nagel, J. S. O. (2016). Política Educacional: Participação Democrática no Plano Municipal de Educação de Curitiba. Interacções, 40, 89-109. https://bit.ly/3qiNfGH
https://bit.ly/3qiNfGH...
, p. 106).

Estudo desenvolvido por Alves (2020)Alves, E. F. (2020). Estado e planejamento educacional no contexto do federalismo: o processo de elaboração dos planos municipais de educação em Goiás [Tese de doutorado, Universidade Federal de Goiás]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFG. https://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/tede/10416
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, em cinco municípios do estado de Goiás, indicou que a “ação cooperativa empreendida pela Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino/Ministério da Educação (Sase/MEC), foi o motivador para que os municípios elaborassem seus PMEs” (Alves, 2020Alves, E. F. (2020). Estado e planejamento educacional no contexto do federalismo: o processo de elaboração dos planos municipais de educação em Goiás [Tese de doutorado, Universidade Federal de Goiás]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFG. https://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/tede/10416
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, p. IX). No entanto, quanto à metodologia utilizada nos municípios, o autor identifica:

(. . .) processo sistemático e organizado, com distintas dinâmicas efetivadas em cada caso, mas com um padrão semelhante de encaminhamentos e operacionalização, concentrando-se as coordenações nas mãos de representantes das Secretarias Municipais de Educação, ou seja, da sociedade política, porém com indicativos democráticos e participativos, em que pesem seus limites e contradições

(Alves, 2020Alves, E. F. (2020). Estado e planejamento educacional no contexto do federalismo: o processo de elaboração dos planos municipais de educação em Goiás [Tese de doutorado, Universidade Federal de Goiás]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFG. https://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/tede/10416
https://repositorio.bc.ufg.br/tede/handl...
, p. IX).

A construção coletiva dos planos municipais de educação de Recife e de Olinda foi examinada por Silva (2018)Silva, A. V. (2018). O Plano Municipal de Educação e sua repercussão em escolas públicas de Recife e Olinda [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Pernambuco]. Repositório Digital da UFPE. https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/30009
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, que apontou formas diferentes de participação nos municípios pesquisados. Identificou um envolvimento social mais efetivo em Olinda, onde “Os profissionais participantes sinalizaram que esse momento se deu de forma democrática, ouvindo todos os integrantes e discutindo as ideias e as propostas para o plano” (Silva, 2018Silva, A. V. (2018). O Plano Municipal de Educação e sua repercussão em escolas públicas de Recife e Olinda [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Pernambuco]. Repositório Digital da UFPE. https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/30009
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, p. 96). Já em Recife, os gestores entrevistados consideraram a participação limitada, pois embora tenha se registrado a atuação do Fórum Municipal de Educação (FME), de profissionais da educação pública e privada e dos diversos movimentos e entidades sociais, a aprovação pelo poder legislativo ocorreu mediante muitos conflitos, embates, discussões, entraves e discordâncias, sendo impedida a participação dos profissionais da educação.

Processo semelhante foi registrado em Dourados – MS, cujo texto encaminhado pela comissão de elaboração do PME, aprovado após amplas discussões realizadas com participação dos mais diversos segmentos sociais e educacionais, foi completamente alterado no projeto de lei encaminhado pelo Prefeito à Câmara Municipal. Scaff, Oliveira e Aranda (2018)Scaff, E. A. S., Oliveira, M. S.,; & Aranda, F. P. N. (2018). Planejamento educacional e poder local na elaboração dos planos municipais de educação. Quaestio, 20(1), 133-147. https://doi.org/10.22483/2177-5796.2018v20n1p133-147
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registraram que o poder executivo retirou 20% das propostas aprovadas e modificou 80% das demais, o que gerou protestos por parte da comunidade envolvida durante a sessão de aprovação da lei pela Câmara Municipal, mas não reverteu o quadro de retrocesso instaurado. As autoras concluíram que

Em que pesem as limitações constatadas no resultado final desse processo, o fato de congregar parcela significativa da comunidade em torno da discussão da educação municipal corrobora para o fortalecimento do poder local e contribui na construção e desenvolvimento de espaços e práticas que, ainda de forma incipiente, promovem o aprendizado da participação social no planejamento das políticas educacionais

(Scaff, Oliveira, & Aranda, 2018Scaff, E. A. S., Oliveira, M. S.,; & Aranda, F. P. N. (2018). Planejamento educacional e poder local na elaboração dos planos municipais de educação. Quaestio, 20(1), 133-147. https://doi.org/10.22483/2177-5796.2018v20n1p133-147
https://doi.org/10.22483/2177-5796.2018v...
, p. 145).

Também no estado de Mato Grosso do Sul, no município de Corumbá, a pesquisa de Monje (2019)Monje, M. A. O. (2019). Plano Municipal de Educação de Corumbá, MS: o processo de materialização da Meta 7 – qualidade da educação básica (2015-2018) [Tese de doutorado, Universidade Católica Dom Bosco]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
https://redeplanejamento.wixsite.com/rep...
registrou comissão designada por meio de decreto do governo municipal para adequação do PME, uma vez que o último plano havia sido aprovado para o período de 2009 a 2015. A referida comissão foi constituída por representantes do aparelho governamental, entre eles, da Secretaria Municipal de Educação, do gabinete do prefeito, de outras secretarias e subsecretarias do município, da Delegacia da Infância e Juventude, da Promotoria da Infância e Adolescência, de conselhos e fundações. Também houve participação da sociedade civil, como do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Corumbá, do Fórum Municipal de Educação e de instituições públicas e privadas de ensino, “composição essa majoritariamente governamental” (Monje, 2019Monje, M. A. O. (2019). Plano Municipal de Educação de Corumbá, MS: o processo de materialização da Meta 7 – qualidade da educação básica (2015-2018) [Tese de doutorado, Universidade Católica Dom Bosco]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
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, p. 92).

Os resultados das pesquisas acima arroladas permitem considerar, de forma geral, que a elaboração dos planos municipais de educação, nas mais diferentes regiões brasileiras, seguiu orientações emanadas da Sase/MEC, com vistas a congregar a participação de diversos segmentos sociais, mas com arranjos locais específicos, seja mais centralizado no poder executivo, seja com alterações significativas no texto da lei que seria aprovada, entre outras. Nesse cenário, a coordenação federativa exercida pelo governo federal por meio da Sase/MEC foi essencial na configuração participativa desse processo, cumprindo importante papel no sistema federativo brasileiro. Conforme afirma Souza (1996)Souza, C. (1996). Reinventando o poder local: limites e possibilidades do federalismo e da descentralização. São Paulo em Perspectiva, 10(3), 103-112., esse processo “implica cooperação política e financeira entre o governo federal e as demais esferas da federação (. . .) sem, contudo, significar a perda de identidades individuais” (Souza, 1996Souza, C. (1996). Reinventando o poder local: limites e possibilidades do federalismo e da descentralização. São Paulo em Perspectiva, 10(3), 103-112., p. 104).

Esses movimentos, se por um lado sinalizam a fragilidade da participação social no cenário local, por outro lado evidenciam a complexidade implícita nos processos de elaboração de políticas públicas, que não podem se resumir a uma participação pontual em determinadas reuniões e dinâmicas oficialmente estabelecidas, mas precisa se estruturar de forma permanente, de modo a conferir sustentação a tais políticas. Nessa conjuntura, a participação na elaboração dos planos decenais requer o acompanhamento da construção do texto da lei, da sua aprovação pelo legislativo, bem como das políticas implantadas para o atendimento das suas metas e estratégias. Essa é a imprescindível necessidade de continuidade das metodologias participativas no monitoramento e na avaliação dos planos.

Coordenação federativa e poder local no monitoramento e avaliação dos planos decenais no Brasil (2016-2020)

Em relação ao monitoramento e avaliação dos planos municipais, a página eletrônica do PNE indica que os primeiros relatórios foram depositados no sistema em 2017, ainda que timidamente, mas, em 2018, aumentaram de forma substancial, caindo vertiginosamente em 2019 e 2020.

Figura 1
Percentual de municípios brasileiros com relatório de monitoramento e avaliação do PME divulgados na página eletrônica do PNE/MEC (2017-2020)

Os dados apresentados na Figura 1 indicam que 35% dos municípios brasileiros tinham relatórios de monitoramento do PME em 2018, o que corresponde, em números absolutos, a 2009 municípios. Já em relação aos relatórios de avaliação, 20% dos municípios, isto é, somente 1180 haviam elaborado esse documento, quantitativo que caiu drasticamente entre 2019 e 2020.

Elemento importante sobre os dados apresentados é que nem sempre se referem ao ano de elaboração do relatório, uma vez que a página eletrônica registra a data de postagem dos planos, independentemente do ano de sua preparação. Importa ressaltar, também, que quantidade nem sempre se revela como qualidade, já que muitos relatórios protocolados pelos municípios indicam apenas a ausência de dados para consubstanciar o relatório.

Diante do cenário apresentado, foi considerada a possibilidade de que outros municípios tenham realizado os processos de monitoramento e avaliação e não protocolaram no sistema do PNE/MEC. Para elucidar essa questão, consultamos as páginas eletrônicas das secretarias de educação e dos conselhos municipais de educação de alguns municípios, como Curitiba, Belém e Recife, e não foi possível identificar qualquer ação nessa direção.

Figura 2
Percentual de relatórios divulgados pelos municípios em cada estado brasileiro

Os dados da Figura 2 permitem constatar que apenas cinco estados brasileiros tiveram mais de 50% de municípios com relatórios postados no site do PNE – Paraná, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina e Tocantins. Entre eles, destaca-se o estado de Mato Grosso do Sul (MS), com mais relatórios postados do que municípios. A hipótese para tal discrepância reside na duplicidade da publicação dos relatórios, aspecto a ser investigado com maior detalhamento em outras pesquisas. Identifica-se, ainda, que três municípios com maior número de habitantes do estado realizaram audiências públicas em 2018, coordenadas pelas comissões de monitoramento e avaliação do PME (Oliveira, 2020Oliveira, R. T. C. de. (2020). Planos de Educação: direito à qualidade da educação e gestão democrática [Relatório de pesquisa]. CNPq.).

Também o Rio de Janeiro, único estado em que não há plano estadual aprovado em forma de lei, registra mais de 50% de municípios com relatórios apresentados em 2017. Esse fato pode reforçar o papel da Sase na orientação desses municípios em uma relação direta de coordenação federativa da União.

É possível entender que essa coordenação consiste no procedimento que busca um resultado comum, apesar de reconhecer a atuação independente e separada dos entes federados (Araujo, 2018Araujo, G. C. (2018). Federalismo cooperativo e educação no Brasil: 30 Anos de omissões e ambivalências. Educação & Sociedade, 39(145), 908-927. https://www.scielo.br/j/es/a/VD5yTPBvV3Hbpgn9STMzKYP/?format=pdf⟨=pt
https://www.scielo.br/j/es/a/VD5yTPBvV3H...
), cujas bases são as competências concorrentes do artigo 24 da Constituição Federal de 1988, entre outras, a de legislar sobre “IX – educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação” (Brasil, 1988Brasil. [Constituição (1988)]. (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/con...
).

Como diretrizes básicas para acompanhamento e avaliação dos resultados obtidos, a Sase apresentou as seguintes orientações: criação, em cada ente federativo, de um sistema de monitoramento e avaliação do plano de educação e estabelecimento dos mecanismos necessários à sua execução; estabelecimento de estrutura própria para a sistemática de produção de indicadores em articulação com o sistema de monitoramento e de avaliação previstos no plano, e com os mecanismos avaliativos do PNE; realização de avaliações periódicas das metas e estratégias constantes do plano; e encaminhamento de relatórios de monitoramento da execução do plano ao poder Legislativo, por intermédio de suas comissões, e ao Ministério Público, por meio de suas estruturas e agentes (Brasil, 2014Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino. (2014). Planejando a próxima década: alinhando os planos de educação. SASE; MEC. http://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_alinhando_planos_educacao.pdf
http://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_ali...
).

Apesar desses encaminhamentos, os estados do Amapá, Rondônia e Roraima tiveram uma participação irrisória de municípios no monitoramento e avaliação de seus planos, o que reforça o argumento da fragilidade administrativa de municípios pequenos, que constituem 93% do estado de Roraima, 68% do estado do Amapá e 67% do estado de Rondônia. Essa tese, contudo, não se sustenta, caso considerarmos o Tocantins entre os estados com maior quantidade de relatórios apresentados, constituído por 92% de municípios com menos de 25 mil habitantes.

Também é significativa a quantidade de municípios pequenos com registro de relatórios de monitoramento e avaliação dos seus planos, como Buriti dos Montes (PI), Chopinzinho (PR), Aparecida do Rio Doce (GO), Aral Moreira (MS), Jordão (AC), entre outras dezenas, em contraposição às grandes capitais, como Belém, Recife e Curitiba, que não apresentaram qualquer relatório.

Esses dados mostram que a descontinuidade das políticas na esfera municipal se vincula às questões relativas à dinâmica do poder local, assim como à relação entre este e o poder central (Vieira, 2011Vieira, S. L. (2011). Poder local e educação no Brasil: dimensões e tensões. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 27(1), 123-133. https://doi.org/10.21573/vol27n12011.19972
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). Logo, fica sujeita a contradições, que podem estar associadas à centralização do poder econômico e político, como às formas de organização dos setores representativos da sociedade local (sindicatos, representações profissionais, associações, conselhos) voltados para os interesses públicos e para o controle social. Pesquisas sobre o monitoramento e a avaliação dos planos decenais de educação desenvolvidas em municípios brasileiros também auxiliam na elucidação dessa questão.

Analisando o monitoramento e a avaliação dos planos decenais de educação de sete municípios do estado de Mato Grosso do Sul, Corrêa (2019) apontou que as orientações da comissão de apoio técnico e orientações da Sase/MEC foram imprescindíveis na organização dos trabalhos nesses municípios. No entanto, a carência de pessoal técnico, quando somada à complexidade do trabalho com indicadores, inviabilizou a conclusão dos relatórios na maior parte desses municípios, e apenas um deles protocolou relatório no Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle (SIMEC). A pesquisa registrou, ainda, baixa participação social e pouco envolvimento da própria administração municipal nos municípios pesquisados.

Santos e Scaff (2021)Santos, R., & Scaff, E. A. S. (2021). Monitoramento e avaliação dos planos decenais de educação dos municípios da zona da mata mineira. Revista Exitus, 11, 1-22. https://doi.org/10.24065/2237-9460.2015v1n1ID1659
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, em levantamento documental sobre os 142 (cento e quarenta e dois) municípios que pertencem à Zona da Mata mineira, identificaram que todos elaboraram seus planos municipais de educação dentro do prazo estabelecido pelo PNE, ou seja, um ano após a aprovação do referido plano. Em se tratando da confecção de relatórios de monitoramento e avaliação, as autoras identificaram, até o ano de 2019, na plataforma eletrônica do PNE/MEC, relatórios de 37 municípios, dos quais 31 (PNE), utilizaram algum instrumento legal para instituir a Comissão Coordenadora e Equipe Técnica.

Tais dados indicam que 26% dos municípios pesquisados protocolaram relatórios de monitoramento e avaliação de seus planos no Simec, e pouco mais de 20% explicitaram informações sobre as comissões instituídas para a elaboração desses relatórios. As autoras apontaram, ainda, a descontinuidade das atividades de monitoramento e avaliação nesses municípios a partir de 2017, com queda de 25% na quantidade de relatórios apresentados. Evidenciaram, também, a discrepância entre a participação do poder público e a participação da sociedade civil nas comissões instauradas nos municípios analisados. Concluíram, por fim, que,

Se por um lado a participação de sujeitos sociais coletivos, em maior ou menor número de comissões, pode ser decorrente da autonomia e peculiaridade da conjuntura política de cada município, por outro lado também evidencia que a participação da sociedade civil no monitoramento e avaliação dos PME tem se configurado de forma insuficiente e bastante fragmentada. Essa ausência de sujeitos sociais coletivos no monitoramento e avaliação do PME dos referidos municípios denota um hiato acerca do que ocorreu entre a formulação dos planos e o seu monitoramento

(Santos & Scaff, 2021Santos, R., & Scaff, E. A. S. (2021). Monitoramento e avaliação dos planos decenais de educação dos municípios da zona da mata mineira. Revista Exitus, 11, 1-22. https://doi.org/10.24065/2237-9460.2015v1n1ID1659
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, p. 20).

Bizzon (2021)Bizzon, C. A. M. C. (2021). Planejamento educacional nos municípios do litoral paranaese: o poder local e a participação da sociedade no monitoramento e avaliação dos PME [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Paraná]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
https://redeplanejamento.wixsite.com/rep...
, ao investigar o monitoramento e a avaliação dos planos decenais de educação em sete municípios do litoral do Paraná, identificou que todos aprovaram seus respectivos planos municipais no período definido pelo PNE 2014-2024, e apresentam agenda de trabalho relativa aos processos de monitoramento e avaliação. Não foram encontrados, todavia, relatórios de monitoramento e/ou avaliação de três entre os sete municípios investigados (Bizzon, 2021Bizzon, C. A. M. C. (2021). Planejamento educacional nos municípios do litoral paranaese: o poder local e a participação da sociedade no monitoramento e avaliação dos PME [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Paraná]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
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).

Todos os relatórios identificados pela autora datam de 2018, sendo quatro relatórios de monitoramento e um relatório de avaliação. Com relação à participação social, o poder legislativo é representado como principal integrante das comissões de elaboração de relatórios de monitoramento e avaliação dos PME, sendo a única instância mencionada em dois municípios.

Castilho (2021)Castilho, E. (2021). Planejamento educacional em contextos municipais: o monitoramento e a avaliação do Plano Municipal de Taubaté [Dissertação de mestrado, Universidade Cruzeiro do Sul]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
https://redeplanejamento.wixsite.com/rep...
, em estudo sobre o monitoramento e a avaliação do PME de Taubaté – SP, identificou a publicação de relatórios em 2017 e 2018, mas não constam desses relatórios as formas de atuação e participação dos membros do Conselho Municipal de Educação e do Fórum Municipal de Educação, o que indica a falta de “consolidação de espaços participativos que promovam uma discussão qualificada sobre os dados contidos nos relatórios, visando a contínua reavaliação das metas e estratégias” (Castilho, 2021Castilho, E. (2021). Planejamento educacional em contextos municipais: o monitoramento e a avaliação do Plano Municipal de Taubaté [Dissertação de mestrado, Universidade Cruzeiro do Sul]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
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, p. 125).

Considerando o município de Jataí – GO, Raimann (2020)Raimann, E. G. (2020). Avaliando o Plano Municipal de Educação: monitoramento e controle social. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, 15(1), 810-824. https://doi.org/10.21723/riaee.v15iesp.1.13351
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relatou dificuldades da comissão de monitoramento e avaliação do PME no acesso aos dados estatísticos do município. Segundo a autora,

A Secretaria Municipal de Educação, mesmo que tenha assumido a sua responsabilidade junto ao monitoramento e avaliação do PME, não o fez nos moldes de uma gestão democrática. A comissão de monitoramento em alguns momentos ficou à margem das decisões como, por exemplo, na promoção da audiência pública para avaliar o PME

(Raimann, 2020Raimann, E. G. (2020). Avaliando o Plano Municipal de Educação: monitoramento e controle social. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, 15(1), 810-824. https://doi.org/10.21723/riaee.v15iesp.1.13351
https://doi.org/10.21723/riaee.v15iesp.1...
, p. 822).

Conde (2021)Conde, E. I. L. M. (2021). Movimentos do Conselho Municipal de Educação no processo de materialização da meta 19 do Plano Municipal de Educação de Campo Grande/MS (2014-2018) [Tese de doutorado, Universidade Católica Dom Bosco]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
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, ao analisar as ações do Conselho Municipal de Educação (CME) de Campo Grande – MS no processo de materialização do PME, especificamente da Meta 19, identificou relatórios de monitoramento e avaliação divulgados por comissão oficialmente designada, em 2017 e 2018, composta por representantes da sociedade política e por segmentos representativos da sociedade civil. No entanto, destacou que, no ciclo 2016/2017, de acordo com o posicionamento de conselheira integrante da comissão, o CME teve pouco espaço e oportunidade para deliberações propositivas à gestão democrática “em razão da característica tecnicista e, por vezes, autoritária, presente na dinâmica da Comissão, ao dispor os relatórios de monitoramento e avaliação prontos para conferência, sem proposições às políticas educacionais” (Conde, 2021Conde, E. I. L. M. (2021). Movimentos do Conselho Municipal de Educação no processo de materialização da meta 19 do Plano Municipal de Educação de Campo Grande/MS (2014-2018) [Tese de doutorado, Universidade Católica Dom Bosco]. https://redeplanejamento.wixsite.com/replag/dissertacoes-e-teses
https://redeplanejamento.wixsite.com/rep...
, p. 228).

A distância entre a quantidade de planos decenais aprovados e de relatórios de monitoramento e avaliação protocolados possibilita analisar que, se por um lado a ação indutora da União pode ser questionada pela limitação à autonomia municipal, por outro lado corrobora para a construção de políticas mais homogêneas entre os entes subnacionais, como afirmam Lotta et al. (2014)Lotta, G. S., Gonçalves, R., & Bitelman, M. F. (2014). A Coordenação Federativa de Políticas Públicas: uma análise das políticas brasileiras nas últimas décadas. Cadernos Gestão Pública e Cidadania, 19(64), 1-18. https://doi.org/10.12660/cgpc.v19n64.5817
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. Em análise sobre a relação entre centralização e descentralização no Estado federativo brasileiro, Abrucio (2002)Abrucio, L. F. (2002). Descentralização e coordenação federativa no Brasil: lições dos anos FHC. In L. F. Abrucio & M. R. Loureiro (Orgs.), O Estado Numa Era de Reformas: Os Anos FHC. MP; SEGES. https://acervo.enap.gov.br/cgi-bin/koha/opac-detail.pl?biblionumber=37076
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alerta que

(. . .) a interdependência federativa não pode ser alcançada pela mera ação impositiva e piramidal de um Governo Central, tal qual num Estado Unitário, pois uma Federação supõe uma estrutura mais matricial, sustentada por uma soberania compartilhada – aliás, como dito antes, é por isso que no federalismo há União (ou o Governo Federal) e não Governo Central

(Abrucio, 2002Abrucio, L. F. (2002). Descentralização e coordenação federativa no Brasil: lições dos anos FHC. In L. F. Abrucio & M. R. Loureiro (Orgs.), O Estado Numa Era de Reformas: Os Anos FHC. MP; SEGES. https://acervo.enap.gov.br/cgi-bin/koha/opac-detail.pl?biblionumber=37076
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, p. 21).

Nesse cenário, a coordenação federativa se constitui em elemento-chave na construção de políticas públicas, o que depende muito da ação do Governo Federal (Abrucio, 2002Abrucio, L. F. (2002). Descentralização e coordenação federativa no Brasil: lições dos anos FHC. In L. F. Abrucio & M. R. Loureiro (Orgs.), O Estado Numa Era de Reformas: Os Anos FHC. MP; SEGES. https://acervo.enap.gov.br/cgi-bin/koha/opac-detail.pl?biblionumber=37076
https://acervo.enap.gov.br/cgi-bin/koha/...
). Tratando particularmente da educação, Saviani (2010)Saviani, D. (2010). Sistema Nacional de Educação articulado ao Plano Nacional de Educação. Revista Brasileira de Educação, 15(44), 380-412. https://doi.org/10.1590/S1413-24782010000200013
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considera a coordenação federativa da União como elemento imprescindível na articulação dos entes federativos em direção à consolidação do sistema nacional de educação. O autor defende uma intrínseca relação entre planejamento e sistema. Para ele, “(...) o plano educacional é exatamente o instrumento que visa introduzir racionalidade na prática educativa como condição para se superar o espontaneísmo e as improvisações que são o oposto da educação sistematizada e de sua organização na forma de sistema” (Saviani, 2010Saviani, D. (2010). Sistema Nacional de Educação articulado ao Plano Nacional de Educação. Revista Brasileira de Educação, 15(44), 380-412. https://doi.org/10.1590/S1413-24782010000200013
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, p. 389).

A coordenação federativa da União na elaboração dos planos decenais de educação, na segunda década dos anos 2000, incorpora os preceitos defendidos por Saviani, ao determinar como tema orientador dos debates a construção do Sistema Nacional Articulado de Educação (Brasil, 2010Brasil. (2010). Documento Final da Conae. Ministério da Educação. https://bit.ly/45zDpjT
https://bit.ly/45zDpjT...
). A metodologia para organização de tais debates foi definida pelo Governo Federal por meio de conferências nacionais, as quais se constituem na mais importante e abrangente política participativa do Brasil após a CF/1988, conforme sinalizou Avritzer (2012)Avritzer, L. (2012). Conferências nacionais: ampliando e redefinindo os padrões de participação social no Brasil. IPEA. https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/td_1739.pdf
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.

Tal organização parece se constituir em resposta às práticas conservadoras que caracterizam o poder local no Brasil, viabilizando meios para a efetivação do controle social por intermédio da representatividade de diferentes instâncias na elaboração, monitoramento e avaliação dos planos em todos os entes federativos brasileiros.

Outro aspecto que merece destaque na Figura 2 é a quantidade superior de relatórios de monitoramento em detrimento dos relatórios de avaliação, o que permite inferir que o preenchimento de tabelas com dados de monitoramento tem sido realizado com maior diligência do que a análise desses dados, por meio da avaliação, com inferências e sugestões de políticas e ações que deem materialidade às ações propostas nas metas.

Ainda que os municípios registrem dificuldades no levantamento de dados, a análise exige, para além de capacidade técnica, a autonomia da equipe de monitoramento e avaliação dos planos, com participação de instâncias como conselhos, universidades, fóruns de educação, câmara de vereadores, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e comunidade em geral. Tal configuração, com garantia de um certo distanciamento dos poderes locais estabelecidos, é fundamental para que essas etapas se efetivem de forma integral, crítica e propositiva.

Essa constatação leva à reflexão de Fernandes (1992)Fernandes, A. T. (1992). Poder local e democracia. Sociologia: Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2, 29-59., ao analisar a questão do poder local em Portugal, de que “Saber como a comunidade local pode alargar o espaço social e convertê-lo em espaço democrático e em base de uma participação política alargada é uma questão que à colectividade cabe responder” (Fernandes, 1992Fernandes, A. T. (1992). Poder local e democracia. Sociologia: Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2, 29-59., p. 46). Tratando do caso brasileiro, Secchin e Caliman (2008, p. 4)Secchin, C. F., & Caliman, N. F. (2008). Poder Local no Brasil: o Papel do Estado e Participação da Sociedade Civil na Gestão Municipal [Apresentação de trabalho]. 32º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. ponderaram que a articulação de forças sociais locais é um grande desafio lançado aos municípios, visto que “o poder local tem sido visto como um espaço privilegiado para a realização da democracia a qual pode trazer a equidade nos resultados de políticas públicas e na participação cidadã”. Nesse cenário, trata-se de resgatar a funcionalidade política e a racionalidade da gestão pública.

Considerações Finais

O movimento de coordenação federativa desenvolvido durante a elaboração do PNE 2014-2024 desencadeou uma mobilização em todos os estados e municípios brasileiros em torno da aprovação de planos decenais de educação. Todavia, considerando o planejamento como um processo, o monitoramento e a avaliação se constituem em elementos fundamentais para a efetivação das metas e estratégias, especialmente com a participação da sociedade política e de diferentes segmentos da sociedade civil, no âmbito de um regime normativo e político, plural e descentralizado, em que se cruzam novos mecanismos de participação social, opção da Constituição Federal de 1988 (Cury, 2002Cury, C. R. J. (2002). Gestão democrática da educação: exigências e desafios. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 18(2), 163-174. https://doi.org/10.21573/vol18n22002.25486
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).

Os dados levantados nesta pesquisa assinalam, diante da heterogeneidade dos municípios brasileiros, por um lado, a ausência de relatórios de monitoramento e avaliação dos planos municipais de educação em mais de 2/3 dos municípios, o que representa sério risco à materialização das metas em nível local. Por outro lado, importa considerar a existência de tais relatórios em mais de 1/3 dos municípios brasileiros, o que possibilita constatar a materialização do monitoramento e da avaliação dos planos em nível local, processo que, na maioria das vezes, prescinde da participação social.

As pesquisas desenvolvidas sobre o tema são enfáticas em evidenciar a participação social que marcou o desenvolvimento dos planos pelos entes federativos municipais, mediante rigoroso mecanismo de indução, orientação e financiamento do MEC, executado em grande parte por meio da Sase. Constatou-se, ainda, que a participação social foi mobilizada quando também o Fórum Nacional de Educação (FNE) e os fóruns estaduais e municipais se configuraram como integrantes essenciais dos processos de formulação dos planos de educação do Brasil, consoante destacam Scaff e Oliveira (2019)Scaff, E. A. S., & Oliveira, R. T. C. (2019). Fóruns de educação: instrumentos de participação e representação na gestão educacional brasileira. In R. T. C. Oliveira (Org.), Educação e democracia: políticas e direitos sociais. Oeste.. Já as pesquisas realizadas sobre os processos de monitoramento e avaliação evidenciam movimento contrário, de concentração da confecção desses relatórios nas secretarias municipais de educação, com eventual participação de algumas representações sociais.

A extinção da Sase, em 2018, bem como a desarticulação do Fórum Nacional de Educação (Scaff & Oliveira, 2019Scaff, E. A. S., & Oliveira, R. T. C. (2019). Fóruns de educação: instrumentos de participação e representação na gestão educacional brasileira. In R. T. C. Oliveira (Org.), Educação e democracia: políticas e direitos sociais. Oeste.) apontam para a redução do movimento de coordenação federativa pelo Governo Federal em relação ao planejamento educacional dos entes federativos locais. A expressão desse movimento pode ser identificada em janeiro de 2022, quando a página eletrônica do PNE/MEC acusou a falta de comunicação com os dados do Simec, extinguindo a publicização dos dados que pautaram esta pesquisa.

Nesse cenário, o desmonte das estruturas nacionais de coordenação federativa, como a Sase e o FNE, parece ter impacto decisivo na desmobilização dos entes federativos locais, o que implica em considerar a fragilidade na organização do poder local enquanto instância estruturada de participação e controle social, a ser exercido pelos diversos segmentos que compõem a educação nos estados e municípios. O fortalecimento de tais instâncias ainda se apresenta como desafio para a consolidação do seu protagonismo nos processos de elaboração e acompanhamento das políticas públicas, em particular no campo da educação.

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    Normalização, preparação e revisão textual: Piero Kanaan (Tikinet) revisao@tikinet.com.br
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    Apoio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Produtividade em pesquisa. Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (FUNDECT).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    15 Abr 2022
  • Revisado
    27 Jun 2022
  • Aceito
    23 Set 2022
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