Acessibilidade / Reportar erro

Laços que Criam Nós: Como Trabalhadores de Aplicativos Coconstroem suas Identidades em Contextos Precários de Trabalho

RESUMO

Objetivo:

o objetivo deste trabalho foi compreender como trabalhadores independentes, mais especificamente trabalhadores de aplicativos, coconstroem suas identidades no trabalho.

Marco teórico:

teoria da identidade social.

Método:

o estudo foi realizado pelo método da teoria fundamentada nos dados (grounded theory), por meio da realização de 40 entrevistas com trabalhadores independentes brasileiros que atuam por meio de plataformas de aplicativos.

Resultados:

nosso modelo apresenta as seguintes proposições: (1) existe uma associação entre gestão identitária e ambiente estruturados para interações interpessoais, não necessariamente ambiente formal; (2) quando existe uma coletividade, um sentimento de pertencimento através das relações mais estáveis entre os grupos e os indivíduos, há uma maior facilidade na construção do self; (3) a inserção do trabalhador nos grupos proporciona redução de ansiedade pela construção da identidade e aumenta motivação e segurança; (4) é de iniciativa dos próprios trabalhadores de aplicativos a criação dos grupos que convergem para um pertencimento personalizado - identidade grupal e precarizado - identidade individual.

Conclusões:

o coletivo construído pelos trabalhadores independentes de aplicativos vem de uma integração cuja iniciativa parte dos próprios trabalhadores, a princípio com uma finalidade produtiva, mas consequentemente sendo uma fonte de facilitadores para a construção da identidade.

Palavras-chave:
economia gig; trabalhador independente; gestão identitária

ABSTRACT

Objective:

the aim of this paper was to understand how self-employed workers, more specifically app workers, co-construct their identities at work.

Theoretical framework:

social identity theory.

Method:

we used the grounded theory method, through 40 interviews conducted with Brazilian independent app workers.

Results:

our model presents the following propositions: (1) there is an association between identity management and structured environment, not necessarily formal environment; (2) when there is a collectivity, a feeling of belonging through the more stable relationships between groups and individuals, there is an easier construction of the self; (3) the insertion of the worker in the groups provide a reduction of anxiety for the identity construction and increase motivation and security; (4) it is of the initiative of the app workers themselves the creation of the groups that converge to a personalized belonging - group identity and a precarious belonging - individual identity.

Conclusions:

the collective constructed by independent application workers comes from an integration whose initiative comes from the workers themselves, at first with a productive purpose, but consequently being a source of facilitators for the construction of an identity.

Keywords:
gig economy; independent worker; identity management

INTRODUÇÃO

Há algumas décadas, pesquisadores têm se dedicado a compreender como indivíduos constroem suas identidades no trabalho. A gestão da identidade, que se refere aos processos pelos quais indivíduos constroem, abandonam, revisam e aderem a identidades no trabalho (Nobrega & Felix, 2021Nobrega, M. R., & Felix, B. (2021). Managing the boundaries between work and home: A study with expatriates. Cadernos EBAPE. BR, 19, 582-594.; Watson, 2008Watson, T. J. (2008). Managing identity: Identity work, personal predicaments and structural circumstances. Organization, 15(1), 121-143. https://doi.org/10.1177/1350508407084488
https://doi.org/10.1177/1350508407084488...
), tem sido amplamente estudada. Tais estudos tradicionalmente direcionam a atenção para os processos culturais, normativos e de redes que estão envolvidos na definição de um ‘quem sou’ no ambiente de trabalho que levam o indivíduo a se inserir em seu contexto laboral, ao mesmo tempo que preserva sua identidade (Gomes & Felix, 2019Gomes, R., & Felix, B. (2019). In the closet: a grounded theory of the silence of gays and lesbians in the workplace. Cadernos EBAPE. BR, 17, 375-388. https://doi.org/10.1590/1679-395174796
https://doi.org/10.1590/1679-395174796...
; Ibarra & Barbulescu, 2010Ibarra, H., & Barbulescu, R. (2010). Identity as narrative: Prevalence, effectiveness, and consequences of narrative identity work in macro work role transitions. Academy of management review, 35(1), 135-154. https://doi.org/10.5465/amr.35.1.zok135
https://doi.org/10.5465/amr.35.1.zok135...
; Rodrigues & Felix, 2021Rodrigues, G. R., & Felix, B. (2021). Broches, bugigangas e penduricalhos: como trabalhadores remotos utilizam símbolos para representar suas identidades. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, 20(1), 171-193. https://www.periodicosibepes.org.br/index.php/recadm/article/view/3163/1118
https://www.periodicosibepes.org.br/inde...
).

Até o presente momento, pesquisas sobre a gestão da identidade no trabalho têm mostrado, em geral, que definições identitárias mais duradouras dependem da existência de vínculos estruturados e intensos com uma organização (Brown, 2022Brown, A. D. (2022). Identities in and around organizations: Towards an identity work perspective. Human Relations, 75(7), 1205-1237. https://doi.org/10.1177/0018726721993910
https://doi.org/10.1177/0018726721993910...
; Li et al., 2021Li, Q., Zhao, X., & Liang, J. (2021). Effects of organizational identification and job satisfaction on voluntary turnover intentions: Evidence from China. Human Resource Management Review, 31(1), 100715.; Liao et al., 2019Liao, S. H., Liu, C. T., & Loi, R. (2019). Linking organizational identification and innovation behavior in R&D teams: A moderated mediation model. Journal of Business Research, 98, 365-373.). Por exemplo, Frandsen (2017Frandsen, S. (2017). The silver bullet of branding: Fantasies and practices of organizational identity work in organizational identity change process. Scandinavian Journal of Management, 33(4), 222-234. https://doi.org/10.1016/j.scaman.2017.10.001
https://doi.org/10.1016/j.scaman.2017.10...
) apresentou evidências de que a identidade de indivíduos no trabalho tende a ser influenciada por mudanças na cultura organizacional. Huber e Brown (2017Huber, G., & Brown, A. D. (2017). Identity work, humour and disciplinary power. Organization Studies, 38(8), 1107-1126. https://doi.org/10.1177/0170840616677632
https://doi.org/10.1177/0170840616677632...
) identificaram que o humor frequentemente é usado como um veículo para comunicar que identidades são ou não aceitáveis em um contexto organizacional.

Apesar de relevantes, esses estudos possibilitam a identificação de uma lacuna de pesquisa. Embora todos eles discutam sobre o papel de normas e estruturas sociais de organizações no processo pelo qual indivíduos constroem suas identidades no trabalho, eles deixam a desejar no que se refere à necessidade de compreender como a gestão de identidades ocorre em contextos menos estruturados para interações sociais. Trabalhadores independentes parecem não mais contar com os vínculos antes vistos como necessários para construir suas identidades profissionais (Felix et al., 2023Felix, B., Dourado, D., & Nossa, V. (2023). Algorithmic management, preferences for autonomy/security and gig-workers’ wellbeing: A matter of fit? Frontiers in Psychology, 14. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2023.1088183
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2023.10881...
; Kyratsis et al., 2017Kyratsis, Y., Atun, R., Phillips, N., Tracey, P., & George, G. (2017). Health systems in transition: Professional identity work in the context of shifting institutional logics. Academy of Management Journal, 60(2), 610-641. https://doi.org/10.5465/amj.2013.0684
https://doi.org/10.5465/amj.2013.0684...
). Em contextos de tamanha ambiguidade, é possível sustentar que esses indivíduos encontrem orientações para suas autodefinições no trabalho em alguma outra fonte (Petriglieri et al., 2019Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
https://doi.org/10.1177/0001839218759646...
). Assim, faz-se necessário compreender onde esses indivíduos encontram guias que orientam a construção de suas identidades no trabalho.

De forma a preencher essa lacuna, buscamos com este estudo compreender como trabalhadores independentes, mais especificamente trabalhadores de aplicativos, gerenciam suas identidades no trabalho. Embora estudos anteriores (Bellesia et al., 2019Bellesia, F., Mattarelli, E., Bertolotti, F., & Sobrero, M. (2019). Platforms as entrepreneurial incubators? How online labor markets shape work identity. Journal of Managerial Psychology. http://dx.doi.org/10.1108/JMP-06-2018-0269
http://dx.doi.org/10.1108/JMP-06-2018-02...
; Caza et al., 2022Caza, B. B., Reid, E. M., Ashford, S. J., & Granger, S. (2022). Working on my own: Measuring the challenges of gig work. Human Relations, 75(11), 2122-2159. https://doi.org/10.1177/00187267211030098
https://doi.org/10.1177/0018726721103009...
) sugiram que trabalhadores independentes com atuação fora de estruturas organizacionais estáveis tendem a não construir identidades estáveis no trabalho, essa tese é contestada no presente trabalho. Defendemos aqui que, mesmo sem uma estrutura organizacional que imponha uma rotina coletiva ao trabalhador e sem uma definição clara de papéis laborais inter-relacionados (Caza et al., 2022; Wood et al., 2019Wood, A. J., Graham, M., Lehdonvirta, V., & Hjorth, I. (2019). Good gig, bad gig: autonomy and algorithmic control in the global gig economy. Work, Employment and Society, 33(1), 56-75. https://doi.org/10.1177/0950017018785616
https://doi.org/10.1177/0950017018785616...
), trabalhadores independentes desenvolvem uma identidade no trabalho por meio de rotinas coconstruídas em interações interpessoais, formação autônoma de subgrupos, propósitos coletivos e rivalidade entre tais subgrupos (Petriglieri et al., 2019Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
https://doi.org/10.1177/0001839218759646...
; Wittman, 2019Wittman, S. (2019). Lingering identities. Academy of Management Review, 44(4), 724-745. https://doi.org/10.5465/amr.2015.0090
https://doi.org/10.5465/amr.2015.0090...
). Esses processos possibilitam a criação de identidades no trabalho, mesmo em condições relacionais precarizadas (Antunes, 2020cAntunes, R. (2020c). Trabalho intermitente e uberização do trabalho no limiar da Indústria 4.0. Uberização, trabalho digital e indústria, 4(1).; 2020d; Kahancová et al., 2020Kahancová, M., Meszmann, T. T., & Sedláková, M. (2020). Precarization via Digitalization? Work Arrangements in the On-Demand Platform Economy in Hungary and Slovakia. Frontiers in Sociology, 5, 3. https://doi.org/10.3389/fsoc.2020.00003
https://doi.org/10.3389/fsoc.2020.00003...
).

O presente trabalho apresenta contribuições teóricas e práticas. Em termos teóricos, contribui para a literatura sobre gestão de identidades no trabalho ao explorar as particularidades do processo de formação de identidade de trabalhadores independentes que se sentem órfãos organizacionais, mostrando os caminhos que eles percorrem para burlar a ausência dos guias de ação e da interação grupal. Alguns estudos relacionados a trabalhadores independentes relatam um sentimento de solidão no mercado de trabalho, além das incertezas e ausências de direitos, deveres e representatividades (Caza et al., 2022Caza, B. B., Reid, E. M., Ashford, S. J., & Granger, S. (2022). Working on my own: Measuring the challenges of gig work. Human Relations, 75(11), 2122-2159. https://doi.org/10.1177/00187267211030098
https://doi.org/10.1177/0018726721103009...
; Fleming et al., 2017Fleming, T. M., Bavin, L., Stasiak, K., Hermansson-Webb, E., Merry, S. N., Cheek, C., … & Hetrick, S. (2017). Serious games and gamification for mental health: Current status and promising directions. Frontiers in Psychiatry, 7, 215. https://doi.org/10.3389/fpsyt.2016.00215
https://doi.org/10.3389/fpsyt.2016.00215...
; Wentrup et al., 2019Wentrup, R., Nakamura, H. R., & Ström, P. (2019). Uberization in Paris-the issue of trust between a digital platform and digital workers. Critical Perspectives on International Business, 15(1), 20-41. https://doi.org/10.1108/cpoib-03-2018-0033
https://doi.org/10.1108/cpoib-03-2018-00...
), mas não explicam sua formação identitária em tais contextos. Assim, a principal contribuição teórica apresentada por este estudo se refere ao ‘como’ pelo qual o fenômeno, já explorado na literatura, ocorre.

Já em termos práticos, o estudo possui implicações tanto para trabalhadores como para gestores de plataformas de prestação de serviços característicos da gig economy. Para os trabalhadores, mostramos evidências de que a organização em grupos informais, ainda que fora da estrutura da gestora da plataforma, minimiza suas ansiedades, tensões emocionais e favorece a criação das conexões para concretização de suas identidades laborais de forma satisfatória. Desta forma, nossos resultados nos levam a incentivar tais trabalhadores a se organizarem desta forma. Para os gestores das plataformas, os resultados revelam a importância de facilitar tal organização social dos trabalhadores, de maneira que relações mais justas e sustentáveis possam ser construídas. Esta sugestão não apenas possui motivação social, dados os impactos positivos que tendem a causar na saúde do trabalhador, mas também mercadológica, dado o surgimento de diferentes plataformas e a crescente competição entre elas pela adesão de trabalhadores.

REVISÃO DA LITERATURA

A identidade no contexto do trabalho independente de trabalhadores de aplicativos

A literatura sobre identidades é ampla, assim como as definições para o termo. Neste trabalho, em acordo com a teoria da identidade social (Ashforth & Mael, 1989Ashforth, B. E., & Mael, F. (1989). Social identity theory and the organization. Academy of Management Review, 14(1), 20-39. https://doi.org/10.1177/0149206308316059
https://doi.org/10.1177/0149206308316059...
), definimos identidade como os significados associados ao eu, que podem se referir a atributos pessoais (p.e., pontual, inteligente e honesto), relacionais (líder, parceiro ou pai) ou coletivos (funcionário da empresa específica, brasileiro ou praticante de uma dada religião) (Leavitt & Sluss, 2015Leavitt, K., & Sluss, D. M. (2015). Lying for who we are: An identity-based model of workplace dishonesty. Academy of Management Review, 40(4), 587-610. https://doi.org/10.5465/amr.2013.0167
https://doi.org/10.5465/amr.2013.0167...
). Esses significados geram oportunidades e restrições para o self (definição do ‘eu’), uma vez que sua manifestação tende a ocorrer de forma relativamente estável e coerente com as definições que sujeitos traçam para si. Assim, se um indivíduo desenvolve uma identidade de líder honesto de um dado partido político, isso tende a gerar oportunidades de ação e limites comportamentais para que tal identidade se sustente ao longo do tempo. O resultado disso é que identidades tendem a gerar estabilidade, no aspecto intrapessoal, e sociabilidade, no aspecto interpessoal (Felix, 2020Felix, B. (2020). Analyzing the formation of a paradoxical organizational identity. International Journal of Organizational Analysis, 28(6), 1227-1241. https://doi.org/10.1108/IJOA-08-2019-1849
https://doi.org/10.1108/IJOA-08-2019-184...
).

Apesar de ser relativamente estável, o self é frequentemente permeado por dilemas entre o desejo por ser ou interagir de formas opostas (p.e., honesto vs. desonesto; egoísta vs. altruísta) (Brewer, 1991Brewer, M. B. (1991). The social self: On being the same and different at the same time. Personality and Social Psychology Bulletin, 17(5), 475-482. https://doi.org/10.1177/0146167291175001
https://doi.org/10.1177/0146167291175001...
). Diante de tais dilemas, uma identidade tende a manifestar para o self significados relativamente estáveis, os quais promovem redução de incerteza, autoestima e pertencimento aos indivíduos (Gomes & Felix, 2019Gomes, R., & Felix, B. (2019). In the closet: a grounded theory of the silence of gays and lesbians in the workplace. Cadernos EBAPE. BR, 17, 375-388. https://doi.org/10.1590/1679-395174796
https://doi.org/10.1590/1679-395174796...
). Dessa forma, uma identidade pode ser entendida como “um equilíbrio resultante de um processo de reflexão que leva à atração e à repulsão em relação a um ou mais significados” relativos a uma identidade (Ashforth & Schinoff, 2016Ashforth, B. E., & Schinoff, B. S. (2016). Identity under construction: How individuals come to define themselves in organizations. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, 3, 111-137. https://doi.org/10.5465/amr.1989.4278999
https://doi.org/10.5465/amr.1989.4278999...
, p. 120).

Tal movimento entre atração e repulsa a determinadas identidades valorizadas tende a levar a sentimentos danosos de ansiedade e rejeição de si (Gill, 2015Gill, M. J. (2015). Elite identity and status anxiety: An interpretative phenomenological analysis of management consultants. Organization, 22(3), 306-325. https://doi.org/10.1177/1350508413514287
https://doi.org/10.1177/1350508413514287...
), que por sua vez tendem a ameaçar a estabilidade e a coerência do self (Petriglieri et al., 2019Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
https://doi.org/10.1177/0001839218759646...
). Para se preservar desses sentimentos indesejados, indivíduos criam processos de defesa em diferentes níveis do self. No nível individual, a autoestima faz com que mesmo vivenciando uma atração por ser desonesto em um dado momento, um sujeito permaneça emocionalmente confortável em razão de um apreço a si advindo de um histórico de escolhas honestas (Petriglieri, 2011). Nos níveis relacional e coletivo, é o sentimento de pertencimento à relação e ao grupo, respectivamente, que proporcionam a indivíduos uma forma de evitar a ansiedade quando se sentem inclinados a violar significados associados a uma interação ou a uma coletividade (Gomes & Felix, 2019Gomes, R., & Felix, B. (2019). In the closet: a grounded theory of the silence of gays and lesbians in the workplace. Cadernos EBAPE. BR, 17, 375-388. https://doi.org/10.1590/1679-395174796
https://doi.org/10.1590/1679-395174796...
).

Em um mundo em que vínculos ocupacionais trabalhistas têm se tornado mais fluidos, organizações não cumprem mais o mesmo papel no sentido de serem fontes de definições autoidentitárias para os indivíduos (Bauman, 2013Bauman, Z. (2013). Liquid modernity. John Wiley & Sons.). Se no passado organizações e ocupações eram algumas das principais fontes para a criação de uma identidade, hoje tais relações são menos estáveis e, por isso, acadêmicos têm buscado compreender como indivíduos lidam, constroem e mantêm identidades nesse novo contexto (Alvesson & Willmott, 2002Alvesson, M., & Willmott, H. (2002). Identity regulation as organizational control: Producing the appropriate individual. Journal of management studies, 39(5), 619-644. https://doi.org/10.1111/1467-6486.00305
https://doi.org/10.1111/1467-6486.00305...
; Petriglieri et al., 2019Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
https://doi.org/10.1177/0001839218759646...
). Diante desse cenário, tem crescido a literatura sobre gerenciamento de identidades (Araujo et al., 2015Araujo, B. F. V. B., Tureta, C. A., & de Araujo, D. A. V. B. (2015). How do working mothers negotiate the work-home interface?. Journal of Managerial Psychology. https://doi.org/10.1108/JMP-11-2013-0375
https://doi.org/10.1108/JMP-11-2013-0375...
; Felix & Bento, 2018Felix, B., & Bento, M. S. (2018). Individual and organizational identities in merger contexts: A boundary perspective. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 19(4). https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg170104
https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg1...
; Zheng et al., 2020Zheng, W., Meister, A., & Caza, B. B. (2020). The stories that make us: Leaders’ origin stories and temporal identity work. Human Relations, 74(8), 1178-1210. https://doi.org/10.1177/0018726720909864
https://doi.org/10.1177/0018726720909864...
), que se refere ao processo pelo qual indivíduos buscam se adaptar a expectativas externas e internas e se tornar mais autênticos ao mesmo tempo que legitimam sua estrutura interna de distintividade (Eller et al., 2016Eller, A., Araujo, B. F. V. B. D., & Araujo, D. A. V. B. D. (2016). Balancing work, study and home: A research with master’s students in a Brazilian university. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 17(3), 60-83. https://doi.org/10.1590/1678-69712016/administracao.v17n3p60-83
https://doi.org/10.1590/1678-69712016/ad...
; Kreiner et al., 2015Kreiner, G. E., Hollensbe, E., Sheep, M. L., Smith, B. R., & Kataria, N. (2015). Elasticity and the dialectic tensions of organizational identity: How can we hold together while we are pulling apart?. Academy of Management Journal, 58(4), 981-1011. https://doi.org/10.5465/amj.2012.0462
https://doi.org/10.5465/amj.2012.0462...
). Alguns estudos têm explorado, mais especificamente, como pessoas têm negociado suas definições a respeito de ‘quem sou eu’ em organizações com as quais possuem vínculos permanentes (Kreiner et al., 2015) e temporários (Petriglieri et al., 2018; Petriglieri et al., 2019).

Em geral, a literatura sobre gerenciamento de identidades tem mostrado que o processo de identificação com organizações tende a amenizar as ansiedades relativas à construção de uma identidade (Petriglieri et al., 2018Petriglieri, G., Petriglieri, J. L., & Wood, J. D. (2018). Fast tracks and inner journeys: Crafting portable selves for contemporary careers. Administrative Science Quarterly, 63(3), 479-525. https://doi.org/10.1177/0001839217720930
https://doi.org/10.1177/0001839217720930...
). Enquanto alguns mostram evidências de que organizações limitam a expressão de identidades do nível individual (Greil & Rudy, 1984Greil, A. L., & Rudy, D. R. (1984). Social cocoons: Encapsulation and identity transformation organizations. Sociological Inquiry, 54(3), 260-278. https://doi.org/10.1111/j.1475-682X.1984.tb00060.x
https://doi.org/10.1111/j.1475-682X.1984...
), outros enfatizam que elas possibilitam a criação e expressão de identidades desejadas (Fiol et al., 2009Fiol, C. M., Pratt, M. G., & O’Connor, E. J. (2009). Managing intractable identity conflicts. Academy of Management Review, 34(1), 32-55. https://doi.org/10.5465/amr.2009.35713276
https://doi.org/10.5465/amr.2009.3571327...
; Thornborrow & Brown, 2009Thornborrow, T., & Brown, A. D. (2009). Being regimented’: Aspiration, discipline and identity work in the British parachute regiment. Organization Studies, 30(4), 355-376. https://doi.org/10.1177/0170840608101140
https://doi.org/10.1177/0170840608101140...
) e segurança psicológica (Kahn, 1990Kahn, W. A. (1990). Psychological conditions of personal engagement and disengagement at work. Academy of Management Journal, 33(4), 692-724. https://doi.org/10.5465/256287
https://doi.org/10.5465/256287...
). No entanto, identificamos uma necessidade de melhor compreender como indivíduos lidam com a criação e manutenção de suas identidades em organizações que se mostram menos estruturadas e mais instáveis no processo de assegurar aos indivíduos um espaço para a existência de um eu coletivo (Felix & Cavazotte, 2019Felix, B., & Cavazotte, F. (2019). When a calling goes unanswered: exploring the role of workplace personalizations as calling enactments. Frontiers in Psychology, 10, 1940. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940...
; Ibarra & Obodaru, 2016Ibarra, H., & Obodaru, O. (2016). Betwixt and between identities: Liminal experience in contemporary careers. Research in Organizational Behavior, 36, 47-64. https://doi.org/10.1016/j.riob.2016.11.003
https://doi.org/10.1016/j.riob.2016.11.0...
; Petriglieri et al., 2019), o que parece ser o caso dos trabalhadores independentes.

Trabalho independente

No mercado laboral contemporâneo, mudanças tecnológicas, geopolíticas e o aumento da integração econômica entre países levaram a um movimento de reformulação das relações de trabalho (Berlato & Correa, 2017Berlato, H., & Corrêa, K. F. (2017). A reformulation of the dual career conceptual model for analysis in an organizational scope: Revealing new aspects. BBR. Brazilian Business Review, 14, 225-246. https://doi.org/10.15728/bbr.2017.14.2.5
https://doi.org/10.15728/bbr.2017.14.2.5...
; Cattani et al., 2014Cattani, A., Abbot‐Smith, K., Farag, R., Krott, A., Arreckx, F., Dennis, I., & Floccia, C. (2014). How much exposure to English is necessary for a bilingual toddler to perform like a monolingual peer in language tests? International Journal of Language & Communication Disorders, 49(6), 649-671. https://doi.org/10.1111/1460-6984.12082
https://doi.org/10.1111/1460-6984.12082...
; Franco & Faria, 2013Franco, T. M. A., & Faria, M. G. D. (2013). A terceirização/subcontratação do trabalho no Brasil e sua interconexão com a saúde mental no trabalho. Saúde mental no trabalho: coletânea do fórum de saúde e segurança no trabalho do estado de Goiás, 469-486.; Vallas & Schor, 2020Vallas, S., & Schor, J. B. (2020). What do platforms do? Understanding the gig economy. Annual Review of Sociology, 46, 273-294. https://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev-soc-121919-054857
https://www.annualreviews.org/doi/abs/10...
). Tal movimento levou também a uma transformação na maneira como pessoas constroem suas trajetórias profissionais (Felix & Cavazotte, 2019Felix, B., & Cavazotte, F. (2019). When a calling goes unanswered: exploring the role of workplace personalizations as calling enactments. Frontiers in Psychology, 10, 1940. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940...
; Fraga et al., 2020Fraga, A. M., Antunes, E. D. D., & Rocha-de-Oliveira, S. (2020). The female and the male professional: gender, career and expatriation interfaces in trajectory for female expatriates. BBR. Brazilian Business Review, 17, 192-210. https://doi.org/10.15728/bbr.2020.17.2.4
https://doi.org/10.15728/bbr.2020.17.2.4...
), assim como nos tipos de trabalhos disponíveis aos indivíduos (Stanford, 2017Stanford, J. (2017). The resurgence of gig work: Historical and theoretical perspectives. The Economic and Labour Relations Review, 28(3), 382-401. https://doi.org/10.1177/1035304617724303
https://doi.org/10.1177/1035304617724303...
). Esse movimento se intensificou entre 2005 e 2015 (Katz & Krueger, 2019Katz, L. F., & Krueger, A. B. (2019). The rise and nature of alternative work arrangements in the United States, 1995-2015. ILR review, 72(2), 382-416. https://www.nber.org/papers/w22667
https://www.nber.org/papers/w22667...
) e levou a um cenário em que cerca de um quinto dos trabalhadores estadunidenses passou a trabalhar sem um vínculo de longo prazo com uma organização específica, índice que tende a ser ainda superior em outros países (Petriglieri et al., 2019Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
https://doi.org/10.1177/0001839218759646...
). Assim, identificamos uma crescente necessidade de estudar o fenômeno dos trabalhadores independentes, uma vez que tal modalidade de trabalho carrega consigo uma elevada promessa de liberdade e autonomia aliada a níveis mais elevados de risco e precarização do trabalho (Antunes, 2020cAntunes, R. (2020c). Trabalho intermitente e uberização do trabalho no limiar da Indústria 4.0. Uberização, trabalho digital e indústria, 4(1).; 2020d; Kahancová et al., 2020Kahancová, M., Meszmann, T. T., & Sedláková, M. (2020). Precarization via Digitalization? Work Arrangements in the On-Demand Platform Economy in Hungary and Slovakia. Frontiers in Sociology, 5, 3. https://doi.org/10.3389/fsoc.2020.00003
https://doi.org/10.3389/fsoc.2020.00003...
; Kellogg et al., 2020Kellogg, K. C., Valentine, M. A., & Christin, A. (2020). Algorithms at work: The new contested terrain of control. Academy of Management Annals, 14(1), 366-410. https://angelechristin.com/wp-content/uploads/2020/01/Algorithms-at-Work_Annals.pdf
https://angelechristin.com/wp-content/up...
).

Estudos recentes têm buscado compreender as estruturas dos trabalhos independentes, assim como suas consequências, mas há uma necessidade de melhor compreender as experiências dos indivíduos nesse contexto emergente (Antunes, 2020aAntunes, R. C. (2020a). Qual é o futuro do trabalho na Era Digital? Laborare, 3(4), 6-14.; Petriglieri et al., 2019Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
https://doi.org/10.1177/0001839218759646...
; Spurk & Straub, 2020Spurk, D., & Straub, C. (2020). Flexible employment relationships and careers in times of the COVID-19 pandemic. Journal of Vocational Behavior, 119, 103435. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0001879120300609
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
). Anos após Arthur e Rousseau (2001Arthur, M. B., & Rousseau, D. M. (Eds.). (2001). The boundaryless career: A new employment principle for a new organizational era. Oxford University Press on Demand.) haverem apontado uma transformação na natureza do trabalho que passava a contestar a duração e a natureza dos vínculos entre organizações e trabalhadores, alguns seguem apontando a necessidade de melhor compreender as nuances das relações laborais que se criaram desde então (Antunes, 2020b; Ashforth et al., 2020Ashforth, B. E., Schinoff, B. S., & Brickson, S. L. (2020). My company is friendly,”“Mine’sa Rebel”: anthropomorphism and shifting organizational identity from “What” to “Who. Academy of Management Review, 45(1), 29-57. https://doi.org/10.5465/amr.2016.0496
https://doi.org/10.5465/amr.2016.0496...
; Wittman, 2019Wittman, S. (2019). Lingering identities. Academy of Management Review, 44(4), 724-745. https://doi.org/10.5465/amr.2015.0090
https://doi.org/10.5465/amr.2015.0090...
). Com o declínio das relações mais rígidas e previsíveis de trabalho e com a emergência da economia gig (Duggan et al., 2020Duggan, J., Sherman, U., Carbery, R., & McDonnell, A. (2020). Algorithmic management and app‐work in the gig economy: A research agenda for employment relations and HRM. Human Resource Management Journal, 30(1), 114-132. https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258
https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258...
; Filgueiras & Antunes, 2020Filgueiras, V., & Antunes, R. (2020). Plataformas digitais, uberização do trabalho e regulação no capitalismo contemporâneo. Revista Contracampo, 39(1). https://periodicos.uff.br/contracampo/article/view/38901
https://periodicos.uff.br/contracampo/ar...
; Veen et al., 2020Veen, A., Barratt, T., & Goods, C. (2020). Platform-capital’s ‘app-etite’ for control: A labour process analysis of food-delivery work in Australia. Work, Employment and Society, 34(3), 388-406. https://doi.org/10.1177/0950017019836911
https://doi.org/10.1177/0950017019836911...
), faz-se necessário um melhor entendimento das experiências que têm sido vivenciadas por trabalhadores contemporâneos. Estudos sobre identidade e identificação, por exemplo, construídos por décadas sob o alicerce de relações de trabalho tradicionais e de longo prazo, devem passar, portanto, por um momento de atualização à realidade presente na vida dessas formas mais recentes de trabalho.

Neste trabalho, exploramos uma faceta específica do trabalho independente: a maneira como esses trabalhadores lidam como suas identidades no contexto laboral. Pretendemos compreender melhor como, ao performarem suas atividades profissionais sem a existência de um vínculo com uma estrutura organizacional que estabeleça uma rotina coletiva ao trabalhador e sem um estabelecimento de papéis laborais conectados hierarquicamente entre si (DeRue & Ashford, 2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. Academy of Management Review, 35(4), 627-647. https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627...
; Jarrahi et al., 2021Jarrahi, M. H., Newlands, G., Lee, M. K., Wolf, C. T., Kinder, E., & Sutherland, W. (2021). Algorithmic management in a work context. Big Data & Society, 8(2). https://doi.org/10.1177/20539517211020332
https://doi.org/10.1177/2053951721102033...
), esses trabalhadores independentes desenvolvem suas identidades no trabalho. Mais especificamente, desenvolvemos um foco no caso de um tipo emergente de trabalhadores independentes: os trabalhadores de aplicativos.

Trabalhadores de aplicativos (app workers)

Há anos, plataformas de mídias digitais têm buscado gerenciar e influenciar o consumo de seus usuários (Moodley et al., 2019Moodley, R., Chiclana, F., Caraffini, F., & Carter, J. (2019). A product-centric data mining algorithm for targeted promotions. Journal of Retailing and Consumer Services, 54, 101940. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2019.101940
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
). Tais plataformas têm utilizado algoritmos, fórmulas computacionais que geram decisões de forma automatizada fundamentadas em modelos estatísticos e regras sem uma interferência humana direta (Agung & Darma, 2019Agung, N. F. A., & Darma, G. S. (2019). Opportunities and challenges of Instagram algorithm in improving competitive advantage. International Journal of Innovative Science and Research Technology, 4(1), 743-747. https://ijisrt.com/wp-content/uploads/2019/03/IJISRT19JA125.pdf
https://ijisrt.com/wp-content/uploads/20...
). Trata-se de instruções com aprendizagem autônoma que orientam um computador a seguir passos designados a cumprir objetivos (Anwar & Graham, 2021Anwar, M. A., & Graham, M. (2021). Between a rock and a hard place: Freedom, flexibility, precarity and vulnerability in the gig economy in Africa. Competition & Change, 25(2), 237-258. https://doi.org/10.1177/1024529420914473
https://doi.org/10.1177/1024529420914473...
; Mann & O’Neil, 2016Mann, G., & O’Neil, C. (2016). Hiring algorithms are not neutral. Harvard Business Review, 9, 2016. https://hbr.org/2016/12/hiring-algorithms-are-not-neutral
https://hbr.org/2016/12/hiring-algorithm...
). Por serem apresentados como objetivos e de natureza matemática, algoritmos tendem a ser vistos como confiáveis e impessoais e serem pouco contestados (Duggan et al., 2020Duggan, J., Sherman, U., Carbery, R., & McDonnell, A. (2020). Algorithmic management and app‐work in the gig economy: A research agenda for employment relations and HRM. Human Resource Management Journal, 30(1), 114-132. https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258
https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258...
).

Mais recentemente, algoritmos também passaram a ser aplicados para gerir não apenas a maneira como indivíduos consomem serviços na internet, mas seu próprio trabalho (Bucher et al., 2021Bucher, E. L., Schou, P. K., & Waldkirch, M. (2021). Pacifying the algorithm-Anticipatory compliance in the face of algorithmic management in the gig economy. Organization, 28(1), 44-67. https://doi.org/10.1177/1350508420961531
https://doi.org/10.1177/1350508420961531...
; Schildt, 2017Schildt, H. (2017). Big data and organizational design-the brave new world of algorithmic management and computer augmented transparency. Innovation, 19(1), 23-30. https://doi.org/10.1080/14479338.2016.1252043
https://doi.org/10.1080/14479338.2016.12...
). Em plataformas como o Uber, algoritmos são usados para conectar consumidores e trabalhadores (Jabagi et al., 2019Jabagi, N., Croteau, A. M., Audebrand, L. K., & Marsan, J. (2019). Gig-workers’ motivation: Thinking beyond carrots and sticks. Journal of Managerial Psychology, 34(4), 192-213. https://doi.org/10.1108/JMP-06-2018-0255
https://doi.org/10.1108/JMP-06-2018-0255...
; Rosenblat & Stark, 2016Rosenblat, A., & Stark, L. (2016). Algorithmic labor and information asymmetries: A case study of Uber’s drivers. International Journal Of Communication, 10, 27. http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2686227
http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2686227...
), assim como para avaliar o trabalho realizado e determinar a remuneração bonificada dos indivíduos (Duggan et al., 2020Duggan, J., Sherman, U., Carbery, R., & McDonnell, A. (2020). Algorithmic management and app‐work in the gig economy: A research agenda for employment relations and HRM. Human Resource Management Journal, 30(1), 114-132. https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258
https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258...
). Tal uso tende a levar o trabalhador a altos níveis de engajamento com o trabalho, embora sem uma conexão tradicional formalmente estabelecida com a organização.

No entanto, dada a natureza fragmentada das relações estabelecidas entre trabalhador e organização promovedora da plataforma, a reciprocidade relacional dos vínculos mais tradicionais tende a não ser encontrada em tal forma laboral (Sherman & Morley, 2020Sherman, U. P., & Morley, M. J. (2020). What do we measure and how do we elicit it? The case for the use of repertory grid technique in multi-party psychological contract research. European Journal of Work and Organizational Psychology, 29(2), 230-242. https://doi.org/10.1080/1359432X.2019.1668844
https://doi.org/10.1080/1359432X.2019.16...
). Práticas de designação do trabalho, avaliação de desempenho e feedback também existem no contexto do trabalhador de aplicativo (Duggan et al., 2020Duggan, J., Sherman, U., Carbery, R., & McDonnell, A. (2020). Algorithmic management and app‐work in the gig economy: A research agenda for employment relations and HRM. Human Resource Management Journal, 30(1), 114-132. https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258
https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258...
). Entretanto, a impessoalidade na relação com a organização e com colegas de trabalho cria um cenário no qual não ficam claros os fundamentos essenciais que levam ao equilíbrio de contratos sociais (Wood et al., 2019Wood, A. J., Graham, M., Lehdonvirta, V., & Hjorth, I. (2019). Good gig, bad gig: autonomy and algorithmic control in the global gig economy. Work, Employment and Society, 33(1), 56-75. https://doi.org/10.1177/0950017018785616
https://doi.org/10.1177/0950017018785616...
). Assim, possíveis abusos não são percebidos tão facilmente, uma vez que cálculos automatizados e impessoais, e não pessoas, são vistos como os responsáveis pelas decisões contidas nas relações de trabalho. Nesse contexto de abundante impessoalidade, as relações com colegas de trabalho e os sensos de cultura, identidade e identificação tornam-se vagos (Panteli et al., 2019Panteli, N., Rapti, A., & Scholarios, D. (2019). ‘If he just knew who we were’: microworkers’ emerging bonds of attachment in a fragmented employment relationship. Work, Employment and Society, 34(3), 476-494. https://doi.org/10.1177/0950017019897872
https://doi.org/10.1177/0950017019897872...
), o que justifica a realização da presente pesquisa.

MÉTODO

Materiais e método

Nós realizamos o presente estudo sob uma perspectiva qualitativa, mais especificamente utilizando o método da grounded theory (teoria fundamentada nos dados) (Charmaz, 2009Charmaz, K. (2009). A construção da teoria fundamentada: Guia prático para análise qualitativa. Bookman.). A escolha por esse método deveu-se ao fato de que o fenômeno da identidade em grupos de trabalhadores independentes, que se conectam entre si de forma menos estruturada (Duggan et al., 2020Duggan, J., Sherman, U., Carbery, R., & McDonnell, A. (2020). Algorithmic management and app‐work in the gig economy: A research agenda for employment relations and HRM. Human Resource Management Journal, 30(1), 114-132. https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258
https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258...
), não se encontra explorado previamente em suas particularidades em estudos anteriores. Assim, ainda que a teoria da identidade social (Ashforth & Mael, 1989Ashforth, B. E., & Mael, F. (1989). Social identity theory and the organization. Academy of Management Review, 14(1), 20-39. https://doi.org/10.1177/0149206308316059
https://doi.org/10.1177/0149206308316059...
) e achados recentes sobre trabalhadores independentes e trabalhadores de aplicativos tenham sido empregados neste estudo como conceitos sensibilizadores (Bowen, 2006Bowen, G. A. (2006). Grounded theory and sensitizing concepts. International Journal Of Qualitative Methods, 5(3), 12-23. https://doi.org/10.1177/160940690600500304
https://doi.org/10.1177/1609406906005003...
), adotamos aqui uma postura de visitar o campo sem que esse processo seja orientado por alguma teoria prévia (Glaser et al., 1968Glaser, B. G., Strauss, A. L., & Strutzel, E. (1968). The discovery of grounded theory; strategies for qualitative research. Nursing research, 17(4), 364. https://doi.org/10.1097/00006199-196807000-00014
https://doi.org/10.1097/00006199-1968070...
). Assim, buscamos desenvolver uma teoria substantiva sobre o fenômeno proposta que seja fundamentada nos dados obtidos no campo.

Amostras iniciais e expandidas

Inicialmente, selecionamos e entrevistamos uma amostra de trabalhadores independentes tendo como base um protocolo de entrevistas construído a partir dos objetivos do estudo e dos conceitos sensibilizadores apresentados na revisão da literatura. Tal processo levou, inicialmente, à realização de 10 entrevistas com trabalhadores independentes que atuam em plataformas de aplicativos. A priori, realizamos essas entrevistas iniciais sem critério determinado para esse quantitativo; apenas iniciamos essa onda de entrevistas a partir da rede de relacionamentos dos pesquisadores. A partir da primeira onda de entrevistados, utilizamos o método bola de neve, segundo o qual solicitamos a indicação de outros possíveis entrevistados, ressaltando que a única restrição fosse sua atuação em aplicativos.

Após essa etapa, analisamos os dados iniciais por meio de memorandos e códigos de primeira ordem, geralmente representados por meio de verbos no gerúndio que transmitissem significados próximos à ação contida nos dados (Charmaz, 2009Charmaz, K. (2009). A construção da teoria fundamentada: Guia prático para análise qualitativa. Bookman.), com uma natureza mais descritiva (Felix & Cavazotte, 2019Felix, B., & Cavazotte, F. (2019). When a calling goes unanswered: exploring the role of workplace personalizations as calling enactments. Frontiers in Psychology, 10, 1940. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940...
). Em seguida, realizamos um segundo nível de análise, no qual buscamos agrupar códigos de primeira ordem com significados similares e nomeá-los com termos mais abstratos e de cunho teórico (códigos de segunda ordem). Estes, por sua vez, foram também agrupados em códigos ainda mais abstratos e analíticos, chamados dimensões agregadas, que revelaram as categorias centrais apresentadas no estudo.

De acordo com o método empregado, nessa etapa inicial de coleta e análise dos dados, esperamos que novos questionamentos de cunho teórico emergissem, e isso nos levou a ajustes no protocolo de entrevistas e à busca por novos participantes que apresentassem características distintas as quais permitissem explorar essas questões emergidas até então (por exemplo: trabalhadores mais jovens, mais velhos, homens, mulheres, que possuem outro emprego e que trabalham apenas por aplicativos). A partir desse momento, realizamos uma visita mais estruturada à literatura de maneira a identificar linhas de estudos que permitissem dialogar com a teoria substantiva gerada neste trabalho e alcançar uma discussão a qual insira a teoria derivada no debate acadêmico contemporâneo sobre o tema.

O processo de ondas de coleta e análise de dados orientado por questões que levassem à construção de uma teoria, chamado amostragem teórica (Fontanella et al., 2011Fontanella, B. J. B., Luchesi, B. M., Saidel, M. G. B., Ricas, J., Turato, E. R., & Melo, D. G. (2011). Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cadernos de Saúde Pública, 27, 388-394. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200020
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201100...
), ocorreu por seis vezes, até que novas idas ao campo não levaram mais ao surgimento de novas categorias ou dimensões agregadas (suficiência teórica) (Charmaz, 2009Charmaz, K. (2009). A construção da teoria fundamentada: Guia prático para análise qualitativa. Bookman.). Tal processo iterativo levou à realização de 40 entrevistas com trabalhadores independentes atuantes em plataformas de aplicativos.

Seleção dos participantes

Para o alcance do objetivo da pesquisa nos limitamos a contatar profissionais que fossem atuantes nos aplicativos (app work), sendo aplicativos de transporte urbano e entrega de refeições. Na primeira onda de coleta de dados, entrevistamos um total de 10 trabalhadores, dos quais seis eram trabalhadores por aplicativo de transporte urbano e outros quatro eram de entrega de refeições. Todos eles eram homens, tinham em sua atividade como trabalhadores independentes na plataforma por aplicativo sua única ocupação e estavam na faixa etária entre 25 e 36 anos. Assim, em nossa segunda onda de coleta de dados, na qual entrevistamos outros nove trabalhadores, buscamos incluir também mulheres. Na terceira, também entrevistamos profissionais acima de 36 e abaixo de 25 anos e que tivessem outra ocupação. Da quarta até a sexta e última onda de coleta de dados, entrevistamos sujeitos com essas diferentes características, de maneira a buscar múltiplas perspectivas que permitissem maior variabilidade aos dados (Gomes & Felix, 2019Gomes, R., & Felix, B. (2019). In the closet: a grounded theory of the silence of gays and lesbians in the workplace. Cadernos EBAPE. BR, 17, 375-388. https://doi.org/10.1590/1679-395174796
https://doi.org/10.1590/1679-395174796...
).

Os participantes da pesquisa foram, dominantemente, homens (33) e que trabalhavam em pelo menos duas atividades profissionais (quatro). A faixa etária foi variada, quatro possuíam menos de 25 anos, 22 entre 25 e 34 anos, 11 entre 35 e 44, dois entre 45 e 54 anos e um possuía 55 anos ou mais. Todos os entrevistados atuavam, no momento da realização da entrevista, em pelo menos uma organização no modelo de app work. A maioria trabalhava em uma empresa de transporte público (21), enquanto alguns desempenhavam suas atividades na área de entrega de alimentos (19).

Protocolo de entrevistas

O protocolo final que orientou a realização das entrevistas foi iniciado com perguntas as quais envolveram aspectos de idade, gênero, escolaridade e estado civil, assim como perguntas gerais sobre a trajetória de carreira dos participantes da pesquisa. Em seguida, realizamos perguntas a respeito da motivação para atuar no trabalho independente em aplicativos, e sobre sua identidade no trabalho. Além disso, indagamos sobre ações organizacionais que promovessem um senso coletivo, de pertença ou alguma forma de visão grupal entre os trabalhadores atuantes na plataforma. Outras perguntas foram dedicadas a compreender como ocorre a existência de eventuais formas autônomas de criação, manutenção e descontinuidade de grupos informais dentre os trabalhadores da plataforma. Conforme os preceitos da teoria fundamentada, a condução das entrevistas foi feita de forma flexível, visto que no decorrer das entrevistas novas indagações podem ser necessárias, fazendo com que o protocolo não seja um roteiro literal, mas uma orientação semiestruturada para a condução das entrevistas (Charmaz, 2009Charmaz, K. (2009). A construção da teoria fundamentada: Guia prático para análise qualitativa. Bookman.). Como nós utilizamos o método da grounded theory, o roteiro das entrevistas não partiu de um modelo teórico prévio, mas sim de questionamentos levantados inicialmente pelos conceitos sensibilizadores centrais apresentados na revisão na literatura e, posteriormente, de perguntas de cunho teórico que emergiram durante o próprio processo de análise.

Assim, construímos um total de 10 perguntas, conforme exposto abaixo:

  1. Fale-me sobre sua experiência profissional, sua trajetória de carreira. O que o levou a trabalhar com aplicativo [nome do aplicativo]?

  2. De que você gosta e de que não gosta em seu trabalho?

  3. O que o motiva a trabalhar? O que faz você ter vontade de trabalhar?

  4. Como você se identifica hoje profissionalmente?

  5. Você cria rotina de trabalho, usa vestes específicas para trabalhar, tem horários preestabelecidos? Se sim, o que o fez criar essa rotina?

  6. Algumas pessoas quando trabalham em uma organização trocam informações com seus colegas de trabalho e interagem com eles. Isso ocorre no seu trabalho? Se sim, como?

  7. Em que momentos você se sente sozinho no trabalho pela plataforma [nome do aplicativo]? E em que momentos você se sente participando de uma coletividade, de um grupo? Explique detalhadamente esses momentos em que você se sente fazendo parte de uma coletividade/grupo.

  8. Quando você se depara com alguma situação conflitante ou desconfortável no seu trabalho, como você costuma resolver? Apenas por suas ações pessoais? Há alguma colaboração com a organização ou algum colega de trabalho? Poderia citar um exemplo?

  9. Você se sente membro do grupo de trabalhadores do [nome do aplicativo]? Se sim, o que o faz se sentir parte desse grupo? Se não, o que faz que você não se sinta parte desse grupo?

Findada a primeira etapa, analisamos os dados coletados que deram suporte para desenvolver a primeira categoria, e percebemos que houve a necessidade de uma reformulação do foco da entrevista. Passamos a aprofundar mais os critérios comportamentais relacionados à formação da identidade e a inter-relação dos trabalhadores independentes enquanto grupo formado. Esse processo de visita ao campo foi considerado findado quando notamos uma suficiência dos dados, ou seja, quando as respostas dos entrevistados já se assimilaram ou quando o material coletado foi considerado suficiente para responder aos objetivos propostos pelo trabalho.

Análise dos dados

Inicialmente, construímos documentos amplos que nos dessem uma visão generalizada da posição do profissional relacionado à falta de uma estrutura organizacional que facilite as interações entre os trabalhadores, o que denominamos de órfãos organizacionais, para identificarmos alguma ligação com a construção identitária.

Posteriormente, pudemos construir os códigos de primeira ordem, com os primeiros resultados em mãos, aplicando a teoria fundamentada nos dados (grounded theory) (Charmaz, 2009Charmaz, K. (2009). A construção da teoria fundamentada: Guia prático para análise qualitativa. Bookman.), e usando o princípio da comparação constante. Alguns significados que se repetiram nos dados serviram como base para construirmos esses códigos de primeira ordem, tais quais o ambiente organizacional, gestão da identidade, preocupação com a produtividade e sentimento de pertencimento a um grupo.

Essas dimensões de segunda ordem foram agrupadas e conectadas às dimensões de primeira ordem, conforme sintetizado na Figura 1, na qual apresentamos a estrutura das categorias encontradas. Em seguida, esses códigos foram comparados entre si e, sempre que encontramos suporte nos dados, buscamos estabelecer proposições teóricas que os conectassem. Assim, as proposições geradas não foram construídas a partir de intuições dos pesquisadores, mas sim de confrontações teóricas que realizamos entre as categorias geradas a partir dos dados (Charmaz, 2009Charmaz, K. (2009). A construção da teoria fundamentada: Guia prático para análise qualitativa. Bookman.).

Figura 1
Estrutura dos códigos derivados na análise.

RESULTADOS

Nesta seção, apresentamos os resultados encontrados nesta pesquisa. A estrutura analítica apresentada, conforme o modelo teórico, é fruto das interações com os dados, e isso gerou categorias, e correlacionando-as, sustentamos algumas proposições:

  1. Proposição 1 (P1): a falta de um ambiente organizacional estruturado para interações entre trabalhadores leva a uma precarização da gestão da identidade e a uma personalização da gestão da identidade;

  2. Proposição 2 (P2): a precarização e a personalização da gestão da identidade levam a uma maior ênfase na produtividade;

  3. Proposição 3 (P3): a ênfase na produtividade conduz a um ambiente organizacional estruturante personalizado, o que ocorre por meio da união de pessoas, propósitos e rotinas;

  4. Proposição 4 (P4): um ambiente organizacional estruturante personalizado possibilita a criação de um senso de pertencimento personalizado;

  5. Proposição 5 (P5): um ambiente organizacional estruturante personalizado possibilita a criação de um senso de pertencimento despersonalizado.

A figura a seguir ilustra o modelo construído e proposto nesta pesquisa.

Figura 2
Modelo sobre a coconstrução de identidades no trabalho por trabalhadores independentes.

Entendendo as consequências da falta de um ambiente estruturado

Os dados coletados nos deram suporte para identificar que os trabalhadores de aplicativos entrevistados, quando adentraram esse trabalho, depararam-se com um ambiente organizacional pouco estruturado em termos de interações pessoais, e isso por um lado provocou um sentimento de liberdade, e por outro instigou uma sensação de isolamento e invisibilidade. Apresentamos abaixo exemplos de relatos que fundamentaram essa categoria inicial do nosso modelo. “Eu acho que a gente não consegue sentir muito a empresa no dia a dia, e isso acontece porque não tem alguém com quem a gente possa falar lá. É tudo por meio do aplicativo, então meio que a empresa existe, mas não existe (E1).” “Assim que me cadastrei no aplicativo, já senti um peso sendo retirado, aquele da cobrança do dia a dia por parte do meu chefe, pois acordar todo dia e não ser cobrado de chegar na hora, o medo de chegar atrasado, não tem sensação melhor, mas por outro lado a gente que sai de um emprego formal sente falta daquela estrutura formal, de cobrança (E2).”

Notamos que na primeira fala existe uma ausência percebida, não só em relação à estrutura organizacional no que se refere ao físico, ao local para onde se dirigir e ter como base, mas também em relação à ausência de pessoas, da relação interpessoal. Já no segundo relato, percebemos as benesses da liberdade do app work, experienciada nos primeiros momentos de inserção, passando a se esvair com o tempo e retornando à necessidade de controle e formalidade.

Em alguns casos, a noção da falta de um ambiente organizacional estruturante se deu apenas quando houve necessidade de o trabalhador buscar auxílio junto à administração do aplicativo. No primeiro relato a seguir, o entrevistado cita a expressão ‘caiu a ficha’, no momento em que percebe a situação de invisibilidade perante a empresa e a necessidade de personalizar a gestão do ‘quem eu sou’ no trabalho. Outro fato que identificamos foi que a inexistência de recursos para a criação de uma camada identitária coletiva mais palpável é gerada justamente pela ausência de um ambiente organizacional formal. Diante de tal ausência, eles acabam improvisando e criando formas de personalizar em grupo o próprio carro de forma a criar uma identidade. Assim, criam pequenas ilhas de identidade coletiva entre outros motoristas da categoria. “Tive um problema com um passageiro que me fez perceber que eu tinha que resolver meus problemas sozinho, não tinha amparo nenhum da organização, ainda recorri ao aplicativo, mas recebi uma mensagem que eles não se responsabilizavam pelas ocorrências de trabalho, que eu que tinha que resolver meus problemas, aí me vi sozinho, caiu a ficha que eu era o dono de mim mesmo (E3).” “Essa falta, essa coisa meio invisível, meio que é tudo pelo algoritmo, faz com que a gente acabe meio que tenha que se sentir meio perdido em relação a quem nós somos e dar o nosso jeito. Um dia desses eu comprei uma plaquinha com LEDs e dei para uns oito amigos que também trabalham pra poder meio que criar uma sensação de que a gente é um grupo. Resolveu, mas fica feio, porque é coisa que a gente compra barato na internet, meio mal feito, seria mais bacana se fosse algo oficial. Fica com uma cara meio de pirata, sabe? (E7)”

Assim, uma forma para burlar a ausência de estrutura organizacional coletiva para interações físicas entre os trabalhadores e proporcionar o processo de construção identitária é a formação de grupos informais e, ao tempo que identificam a precarização na gestão da identidade, criam estratégias de personalização do grupo, e consequentemente a personalização da gestão da identidade. O relato a seguir ilustra essa ideia: “A gente tem estratégia de trabalho, sempre a gente faz rodízio para trabalhar em horários perigosos e em lugares perigosos também, é uma forma da gente sempre tá se ajudando, porque assim todo mundo ganha mais um pouco e também se protege. Tem grupo até que está imitando a gente (E12)”.

Uma das questões principais da nossa pesquisa se refere ao processo de coconstrução identitária do trabalhador de aplicativos. Inicialmente nos deparamos com a necessidade de determinar o início desse processo, e os relatos anteriores demonstraram que ele se inicia com a conscientização da falta de estrutura formal para interações físicas entre os trabalhadores nessa modalidade de trabalho. Os trabalhadores de aplicativos se deparam com grupos construídos que se personalizam com a prática de estratégias as quais os diferenciem uns dos outros, mostrando uma personalização da gestão da identidade, ao tempo que percebem a ausência de mecanismos para personalização identitária, precarização, vinda do aplicativo. Essas evidências nos levaram à primeira proposição deste estudo.

Proposição 1: a falta de um ambiente organizacional estruturado para interações entre trabalhadores leva a uma precarização da gestão da identidade e a uma personalização da gestão da identidade.

Compreendendo a ênfase na produtividade

A precarização e a personalização da gestão da identidade apresentadas anteriormente mostraram haver implicações sobre a ênfase dos trabalhadores de apresentarem um elevado nível de produtividade. O ambiente de instabilidade e insegurança direcionou o foco dos trabalhadores para a produtividade, mas era necessário, conforme o posicionamento dos entrevistados, criar uma forma de minimizar as intempéries através da união de esforços, mesmo que de maneira informal. Na maioria dos casos, os entrevistados expuseram sentir maior motivação e segurança para o trabalho quando inseridos em grupos informais, mas por outro lado também expuseram uma maior pressão para aumentar a produtividade em decorrência da inserção nos grupos, mesmo que o sentimento positivo da coletividade e o resultado da produção gerassem resultados positivos individualmente. Codificamos esses casos como “preocupando-se constantemente com a produtividade”. A seguir, apresentamos um relato que mostra os aspectos sobre foco da produtividade, tanto em âmbito individual como coletivo e suas nuances. “Como a gente está o tempo todo pensando em como produzir, vai formando coletividades, grupos de apoio, que fazem com que a gente sinta que existe sim uma cola que nos faz ser um, mesmo que não haja a organização atuando por trás. A organização somos nós mesmos. É um laço que se cria, mas que é fruto da necessidade de se organizar coletivamente pra poder ganhar um gás, se sentir mais motivado, produzir mais (E26).” “A empresa não dá um jeito, um local, para a gente conversar, trocar ideia. É assim, a gente não tem o lugar do cafezinho, não se conhece por meio da empresa mesmo, algo que ela faça, nada. Então a gente dá um jeito, porque a gente gosta de fazer a amizade, a gente precisa conversar sobre o que dá certo, sobre os jeitos de ganhar mais dinheiro nesse trabalho. Tem uns macetes. Mas não tem espaço pra conversar (E9).”

As falas sugerem que a precarização e a personalização da gestão identitária são os fatores os quais levaram a formas razoavelmente improvisadas e informais de organização. Entretanto, como essa associação possui como ênfase a necessidade de aumentar a capacidade de extrair resultados financeiros da atividade laboral, notamos que ela aumenta a ênfase na produtividade. Desta forma, propomos que:

Proposição 2: a precarização e a personalização da gestão da identidade levam a uma maior ênfase na produtividade.

Diante da ênfase em produzir, os entrevistados relataram que, informalmente, criam grupos para lidar com suas necessidades de possuir um ambiente organizacional estruturante personalizado. Esse ambiente permite que eles interajam circunscritos em uma atmosfera mais propícia a suprir as deficiências da inexistência de um ambiente formal da organização. Os relatos mostraram três tipos de objetivos principais desses elementos que criam esse ambiente estruturante que os ajuda a enfrentar a necessidade de produzir melhor: a união de pessoas (possibilita que indivíduos se conectem), propósitos (tornam possível que indivíduos com objetivos comuns se organizem) e rotinas (possibilitam que indivíduos com atividades regulares comuns se conectem). Os exemplos a seguir ilustram essa ideia: “A gente teve que se organizar, e os grupos se formam meio que pelas pessoas que estão juntas em um determinado momento e acabam virando um grupo mesmo pra todo mundo produzir mais. Os ‘Guardiões’, grupo que participo mesmo, foi assim (E35) (unem pessoas)”. “Tem grupo feito por mulheres, e o objetivo é proteger as mulheres de passageiros que sejam inconvenientes, para ajudar a ter estratégias para mulheres escolherem corridas, então às vezes é de acordo com o objetivo (E31) (unem propósitos).” “Eu participo de um grupo que é do pessoal do futebol de domingo, então acho que pode ser isso também, uma atividade de rotina, que descontrai para a gente produzir mais depois (E38) (unem rotinas).”

Assim, propomos que:

Proposição 3: a ênfase na produtividade conduz a um ambiente organizacional estruturante personalizado, o que ocorre por meio da união de pessoas, propósitos e rotinas.

As identidades: os laços que criam nós

De acordo com a análise realizada, apesar de trabalharem em uma organização com baixo nível de estruturação organizacional para o desenvolvimento de relações interpessoais com colegas de trabalho, a criação de um ambiente organizacional estruturante personalizado possibilitou a criação da identidade dos app workers em dois níveis: grupal e individual. No nível grupal, notamos que as personalizações realizadas conferem aos que as adotam um senso de que pertencimento a uma coletividade possui significado para os que dela participam. Esse pertencimento comunica expectativas de comportamento e papéis que passam a se constituir como partes integrantes do self dos participantes. Os relatos a seguir exemplificam tal ideia. “A gente cria essas coisas de caveira, de faca na caveira, mas no fim é tudo pra fazer a gente produzir mais. De um lado, a gente se sente mais conectado àquele grupo que está usando a mesma personalização, é meio que a nossa tribo, que quer ser bem vista, tem que mostrar que está produzindo. De outro, pra criar esses grupos, a gente investe dinheiro nosso, símbolo pra colocar no carro, essas coisas. Vai colocando mais e mais pressão pra gente ter que ser produtivo. Tem o grupo que aceita qualquer corrida, o nosso da caveira é conhecido pela estratégia de pegar aquelas com preço dinâmico mais alto. Isso significa horários alternativos, lugares mais perigosos. Por isso a gente é o caveira! (E29).” “Todo trabalho que eu passei tinha mesa pros funcionários, lugar pra almoçar, mesmo que não fossem todos os dias. Na última empresa de ônibus tinha os uniformes, os encontros mensais. Aqui é tudo muito individual, cada um faz o seu. Só que aí a gente se organiza, coloca os adesivos nos carros, faz os grupos de Zap. Eu me sinto mais do grupo do ‘Os careca’ do que da empresa mesmo (E1).”

Assim, mesmo na ausência de um ambiente estruturado pela empresa em termos de interações entre os trabalhadores, encontramos evidências de que os app workers entrevistados se associam a coletividades das quais passam a se sentir parte, desenvolvendo, assim, sua identidade no nível grupal de análise. Desta forma, propomos que:

Proposição 4: um ambiente organizacional estruturante personalizado possibilita a criação de um senso de pertencimento personalizado.

No entanto, não é somente no nível grupal e voltado para um pertencimento personalizado que identificamos elementos de formação identitária. Alguns entrevistados também revelaram uma formação de identidade no nível individual de análise, ao mostrarem um senso de pertencimento despersonalizado, ou seja, que ocorreu independentemente da formação de grupos, focado no próprio indivíduo. Esse pertencimento não se refere a qualquer coletividade e fornece ao indivíduo um sentimento de ser único e distinto. As falas a seguir ilustram essa forma de identidade identificada. “Ah, esse ambiente me dá a base para que eu me sinta sendo alguém único, porque eu sou visto. Eu estou em um grupo, mas dentro desse grupo, eu sou o mais tranquilo. Então se você me perguntar quem eu sou, eu sou o tranquilo, é assim que eu me vejo. Sem esse grupo, se fosse como era no começo, que era só eu e o aplicativo, ninguém me veria, seria até difícil eu desenvolver uma forma de responder a esse ‘quem sou eu’ (E40).” “Eu faço parte do grupo “Os careca”. E nesse grupo, eu sou o que organiza os churrascos, que anima o grupo, que faz as figurinhas, que faz todo mundo rir. Então esse grupo que a gente criou, a nossa panela, me faz sim me sentir o brincalhão, o que junta todo mundo. Todo mundo fala: ‘O gordinho é o cara que faz acontecer!’ … Então sim, ali eu passei a me ver como o que anima, se a gente não tivesse o grupo, eu não ia conseguir me ver assim (E23).”

Ao ‘ser único’, o indivíduo passa a ‘ser visto’, elemento essencial para a formação identitária (Ibarra, 1999Ibarra, H. (1999). Provisional selves: Experimenting with image and identity in professional adaptation. Administrative science quarterly, 44(4), 764-791.). Este trabalho tem o mérito de mostrar que isso ocorre dentro de organizações informais constituídas em um ambiente organizacional com reduzida estrutura para a ocorrência de interações interpessoais. Assim, sugerimos que:

Proposição 5: um ambiente organizacional estruturante personalizado possibilita a criação de um senso de pertencimento despersonalizado.

DISCUSSÃO

Alguns estudos defendem que quando há referência a trabalhadores independentes, logo vêm à tona os aspectos da ausência de direitos, deveres e representatividade (Fleming et al., 2017Fleming, T. M., Bavin, L., Stasiak, K., Hermansson-Webb, E., Merry, S. N., Cheek, C., … & Hetrick, S. (2017). Serious games and gamification for mental health: Current status and promising directions. Frontiers in Psychiatry, 7, 215. https://doi.org/10.3389/fpsyt.2016.00215
https://doi.org/10.3389/fpsyt.2016.00215...
; Wentrup et al., 2019Wentrup, R., Nakamura, H. R., & Ström, P. (2019). Uberization in Paris-the issue of trust between a digital platform and digital workers. Critical Perspectives on International Business, 15(1), 20-41. https://doi.org/10.1108/cpoib-03-2018-0033
https://doi.org/10.1108/cpoib-03-2018-00...
). Isso ocorre porque a exiguidade desses aspectos jurídicos ou legais é consequência de uma ausência de um ambiente organizacional estruturado para interações entre trabalhadores (o que provoca um sentimento de solidão), os quais já denominamos de órfãos organizacionais. Essa falta de referência, devido principalmente à ausência de um ambiente estruturado para interações entre trabalhadores e de conexões estáveis, acarreta aumento de ansiedade, sentimento de isolamento e insegurança, dificultando a construção identitária (Wentrup et al., 2019). Tais aspectos também foram encontrados nesta pesquisa, que, portanto, corrobora a literatura que já expressava relatos de situações relacionais entre indivíduo e ambiente organizacional na construção da identidade no mercado laboral contemporâneo (Kahn, 1990Kahn, W. A. (1990). Psychological conditions of personal engagement and disengagement at work. Academy of Management Journal, 33(4), 692-724. https://doi.org/10.5465/256287
https://doi.org/10.5465/256287...
; Thornborrow & Brown, 2009Thornborrow, T., & Brown, A. D. (2009). Being regimented’: Aspiration, discipline and identity work in the British parachute regiment. Organization Studies, 30(4), 355-376. https://doi.org/10.1177/0170840608101140
https://doi.org/10.1177/0170840608101140...
).

Em meio a divergências teóricas sobre o papel dos grupos na formação identitária, inclinamo-nos a explorar a importância da coletividade na construção da identidade. A formação identitária se deu com a existência de grupos com relações mais estáveis e o indivíduo (no caso, o trabalhador independente). Esses grupos são construídos para criar um sentimento de pertencimento que favorece a construção do ‘eu indivíduo’ e ‘eu coletivo’. Adentrando o processo de coconstrução da identidade dos trabalhadores independentes, partindo de uma ausência de ambiente organizacional estruturado para que trabalhadores interajam, e indo além da necessidade de criar conexões para consciência do ‘eu’ indivíduo e ‘eu’ indivíduo no grupo, acrescentamos uma visão mais holística sobre a gestão da identidade dos trabalhadores de aplicativos, unificando estudos que abordam aspectos pessoais, sociais, estruturais e culturais (DeRue & Ashford, 2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. Academy of Management Review, 35(4), 627-647. https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627...
; Huber & Brown, 2017Huber, G., & Brown, A. D. (2017). Identity work, humour and disciplinary power. Organization Studies, 38(8), 1107-1126. https://doi.org/10.1177/0170840616677632
https://doi.org/10.1177/0170840616677632...
). Identificamo-nos com pesquisas que adotam a necessidade das conexões e vínculos (Araujo et al., 2015Araujo, B. F. V. B., Tureta, C. A., & de Araujo, D. A. V. B. (2015). How do working mothers negotiate the work-home interface?. Journal of Managerial Psychology. https://doi.org/10.1108/JMP-11-2013-0375
https://doi.org/10.1108/JMP-11-2013-0375...
; Bauman, 2013Bauman, Z. (2013). Liquid modernity. John Wiley & Sons.; Felix & Bento, 2018Felix, B., & Bento, M. S. (2018). Individual and organizational identities in merger contexts: A boundary perspective. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 19(4). https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg170104
https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg1...
; Gomes & Felix, 2019Gomes, R., & Felix, B. (2019). In the closet: a grounded theory of the silence of gays and lesbians in the workplace. Cadernos EBAPE. BR, 17, 375-388. https://doi.org/10.1590/1679-395174796
https://doi.org/10.1590/1679-395174796...
; Zheng et al., 2020Zheng, W., Meister, A., & Caza, B. B. (2020). The stories that make us: Leaders’ origin stories and temporal identity work. Human Relations, 74(8), 1178-1210. https://doi.org/10.1177/0018726720909864
https://doi.org/10.1177/0018726720909864...
), para construção identitária, mas não apenas com ambiente arquitetado dentro de uma formalidade, pois mesmo em meio a um ambiente precarizado, existem estratégias emergentes de coconstrução identitária.

O trabalho independente e suas nuances tendem a quebrar os laços sociais existentes nos trabalhos considerados formais trazendo como consequência principal a insegurança e a incerteza laborais (Petriglieri et al., 2019Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
https://doi.org/10.1177/0001839218759646...
). Agregamos a esse achado a ideia de que existe a necessidade de um sentimento de pertencimento a um grupo, para burlar o eufemismo organizacional e suavizar ou erradicar essas consequências maléficas, e identificamos que os vínculos aumentam a motivação e a segurança reduzindo incertezas e facilitando o posicionamento identitário. Isso se deve aos laços sociais construídos, mesmo que informais, e reduz a ansiedade na formação da identidade. Assim, a interação informal construída entre os participantes dos aplicativos visa a preencher lacunas, não só de rotinas e padrões, mas também de parâmetros que sirvam de suporte para identificar semelhanças e dissemelhanças na definição do self.

No entanto, é a ênfase na produção que faz criar ambientes os quais convergem esforços e propósitos, que fazem aflorar ao mesmo tempo um sentimento de pertencimento personalizado, quando o próprio grupo constrói identidade grupal, e pertencimento precarizado, quando o indivíduo constrói suas características distintas das dos demais, assim criando uma identidade e uma delimitação clara do ‘eu’. Esses ambientes de conversão são grupos criados pela iniciativa dos próprios trabalhadores independentes que a princípio priorizam a produção, gerando um ambiente de segurança e motivação ao trabalho, aumentando o engajamento, mas passam a ser vistos como laços que criam nós (Felix & Bento, 2018Felix, B., & Bento, M. S. (2018). Individual and organizational identities in merger contexts: A boundary perspective. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 19(4). https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg170104
https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg1...
; Zheng et al., 2020Zheng, W., Meister, A., & Caza, B. B. (2020). The stories that make us: Leaders’ origin stories and temporal identity work. Human Relations, 74(8), 1178-1210. https://doi.org/10.1177/0018726720909864
https://doi.org/10.1177/0018726720909864...
).

Em geral, ao explorar o processo de construção de identidade dos trabalhadores de aplicativos, trilhamos vias teóricas que nos fizeram reforçar resultados antes já encontrados, como a necessidade de ambiente estruturado para a construção identitária, importância de conexões que minimizem as tensões, o sentimento de incertezas e solidão, baseados em autores já referenciados neste trabalho. Por outro lado, foi possível também enveredar por vias que detalharam como esse processo de construção da identidade ocorre, revelando o processo de pertencimento coletivo construído pelos próprios trabalhadores independentes para burlar a falta de estrutura para interações interpessoais, para promover segurança e motivação, para se diferenciar e ser diferente, para abraçar uma identidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Implicações teóricas

As implicações teóricas deste trabalho se referem a uma agregação sobre a temática de construção identitária de trabalhadores independentes, em especial aos trabalhadores de aplicativos. Nosso estudo está voltado para uma análise e discussão sobre o processo de construção e gestão da identidade, possibilitando exceder os limites das visões convencionais e trilhando uma complementação dos vieses de uma nova modalidade de trabalho e suas especificidades. Além disso, ao analisarmos a construção do ambiente estruturado pelos próprios trabalhadores, identificamos como estes subsidiam a construção identitária, levando à construção de um pertencimento personalizado ou despersonalizado que favorece a gestão da identidade organizacional e pessoal. Adicionalmente, atentamos ao fato de que o coletivo construído pelos trabalhadores independentes, mais especificamente os de aplicativos, vem de uma integração cuja iniciativa parte dos próprios trabalhadores, a princípio com uma finalidade produtiva, mas consequentemente sendo uma fonte de facilitadores para a construção da identidade.

Limitações e pesquisas futuras

Este estudo possui limitações que podem ser sanadas por pesquisas futuras. A princípio, consideramos uma limitação o fato de termos realizado nossa pesquisa apenas com trabalhadores independentes de aplicativos de transporte e entrega, na sua maioria homens, e que atuassem no Brasil. Sugerimos que estudos futuros explorem outras modalidades de aplicativos por poder existirem diferentes especificidades, assim como explorar o aspecto de gênero dando uma ênfase maior a pesquisas com mulheres, pela visão diferenciada do papel da mulher na sociedade (Biasoli-Alves, 2000Biasoli-Alves, Z. M. M. (2000). Continuidades e rupturas no papel da mulher brasileira no século XX. Psicologia: Teoria e pesquisa, 16(3), 233-239. https://doi.org/10.1590/S0102-37722000000300006
https://doi.org/10.1590/S0102-3772200000...
).

Um aspecto identificado como limitação é o fato de a pesquisa ter sido realizada em um momento específico, não oferecendo uma visão longitudinal, cuja aplicação poderia adentrar de forma mais aprofundada, entendendo desde o momento em que se tem consciência da necessidade de formação dos grupos até sua formação. Estudos futuros podem se utilizar das proposições teóricas geradas por esta pesquisa, construídas em especial pela característica qualitativa adotada, testando-as através de estudos quantitativos e verificando se as relações propostas possuem suporte.

Outro aporte para pesquisas futuras é a possibilidade de detalhar os comportamentos e manutenção dos grupos identificados, detalhando a estrutura grupal, as regras existentes, a hierarquia e comando. Por exemplo, um participante relatou que não era fácil participar do grupo, principalmente dos primeiros criados, e que havia possibilidade da exclusão, deixando claro que existem critérios para entrar e permanecer nesse grupo. Pesquisas futuras podem explorar a dinâmica desses grupos.

Implicações práticas

Este estudo oferece implicações práticas para os trabalhadores independentes e para as plataformas de app work. Para os trabalhadores independentes de aplicativos, o estudo mostra a existência de grupos que ajudam na produção e na facilitação da construção identitária, além de mostrar a necessidade da estrutura interacional coletiva, da inserção em grupos para facilitar o desenvolvimento do trabalho e o posicionamento e a definição identitária, e isso pode favorecer a procura por inserção nos grupos ou o incentivo para criá-los.

No processo de opção pelo trabalho independente em aplicativos, o medo do isolamento e a ansiedade pela construção do ‘eu’ podem reduzir predileção por essa modalidade de trabalho. Por isso, sugerimos aos aplicativos de entrega e de transporte que adotem condições apropriadas para criação de estruturas de grupos, dando todo suporte em relação a ferramentas adequadas e a treinamentos aos participantes dos grupos.

REFERÊNCIAS

  • Agung, N. F. A., & Darma, G. S. (2019). Opportunities and challenges of Instagram algorithm in improving competitive advantage. International Journal of Innovative Science and Research Technology, 4(1), 743-747. https://ijisrt.com/wp-content/uploads/2019/03/IJISRT19JA125.pdf
    » https://ijisrt.com/wp-content/uploads/2019/03/IJISRT19JA125.pdf
  • Alvesson, M., & Willmott, H. (2002). Identity regulation as organizational control: Producing the appropriate individual. Journal of management studies, 39(5), 619-644. https://doi.org/10.1111/1467-6486.00305
    » https://doi.org/10.1111/1467-6486.00305
  • Antunes, R. C. (2020a). Qual é o futuro do trabalho na Era Digital? Laborare, 3(4), 6-14.
  • Antunes, R. (2020b). Rumo à uberização do trabalho1. DIREITOS HUMANOS NO BRASIL 2020, 117. https://doi.org/10.33637/2595-847x.2020-46
    » https://doi.org/10.33637/2595-847x.2020-46
  • Antunes, R. (2020c). Trabalho intermitente e uberização do trabalho no limiar da Indústria 4.0. Uberização, trabalho digital e indústria, 4(1).
  • Antunes, R. (2020d). Uberização, trabalho digital e indústria 4.0. Boitempo Editorial.
  • Anwar, M. A., & Graham, M. (2021). Between a rock and a hard place: Freedom, flexibility, precarity and vulnerability in the gig economy in Africa. Competition & Change, 25(2), 237-258. https://doi.org/10.1177/1024529420914473
    » https://doi.org/10.1177/1024529420914473
  • Araujo, B. F. V. B., Tureta, C. A., & de Araujo, D. A. V. B. (2015). How do working mothers negotiate the work-home interface?. Journal of Managerial Psychology. https://doi.org/10.1108/JMP-11-2013-0375
    » https://doi.org/10.1108/JMP-11-2013-0375
  • Arthur, M. B., & Rousseau, D. M. (Eds.). (2001). The boundaryless career: A new employment principle for a new organizational era. Oxford University Press on Demand.
  • Ashforth, B. E., & Mael, F. (1989). Social identity theory and the organization. Academy of Management Review, 14(1), 20-39. https://doi.org/10.1177/0149206308316059
    » https://doi.org/10.1177/0149206308316059
  • Ashforth, B. E., & Schinoff, B. S. (2016). Identity under construction: How individuals come to define themselves in organizations. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, 3, 111-137. https://doi.org/10.5465/amr.1989.4278999
    » https://doi.org/10.5465/amr.1989.4278999
  • Ashforth, B. E., Schinoff, B. S., & Brickson, S. L. (2020). My company is friendly,”“Mine’sa Rebel”: anthropomorphism and shifting organizational identity from “What” to “Who. Academy of Management Review, 45(1), 29-57. https://doi.org/10.5465/amr.2016.0496
    » https://doi.org/10.5465/amr.2016.0496
  • Bauman, Z. (2013). Liquid modernity. John Wiley & Sons.
  • Bellesia, F., Mattarelli, E., Bertolotti, F., & Sobrero, M. (2019). Platforms as entrepreneurial incubators? How online labor markets shape work identity. Journal of Managerial Psychology. http://dx.doi.org/10.1108/JMP-06-2018-0269
    » http://dx.doi.org/10.1108/JMP-06-2018-0269
  • Berlato, H., & Corrêa, K. F. (2017). A reformulation of the dual career conceptual model for analysis in an organizational scope: Revealing new aspects. BBR. Brazilian Business Review, 14, 225-246. https://doi.org/10.15728/bbr.2017.14.2.5
    » https://doi.org/10.15728/bbr.2017.14.2.5
  • Biasoli-Alves, Z. M. M. (2000). Continuidades e rupturas no papel da mulher brasileira no século XX. Psicologia: Teoria e pesquisa, 16(3), 233-239. https://doi.org/10.1590/S0102-37722000000300006
    » https://doi.org/10.1590/S0102-37722000000300006
  • Bowen, G. A. (2006). Grounded theory and sensitizing concepts. International Journal Of Qualitative Methods, 5(3), 12-23. https://doi.org/10.1177/160940690600500304
    » https://doi.org/10.1177/160940690600500304
  • Brewer, M. B. (1991). The social self: On being the same and different at the same time. Personality and Social Psychology Bulletin, 17(5), 475-482. https://doi.org/10.1177/0146167291175001
    » https://doi.org/10.1177/0146167291175001
  • Brown, A. D. (2022). Identities in and around organizations: Towards an identity work perspective. Human Relations, 75(7), 1205-1237. https://doi.org/10.1177/0018726721993910
    » https://doi.org/10.1177/0018726721993910
  • Bucher, E. L., Schou, P. K., & Waldkirch, M. (2021). Pacifying the algorithm-Anticipatory compliance in the face of algorithmic management in the gig economy. Organization, 28(1), 44-67. https://doi.org/10.1177/1350508420961531
    » https://doi.org/10.1177/1350508420961531
  • Cattani, A., Abbot‐Smith, K., Farag, R., Krott, A., Arreckx, F., Dennis, I., & Floccia, C. (2014). How much exposure to English is necessary for a bilingual toddler to perform like a monolingual peer in language tests? International Journal of Language & Communication Disorders, 49(6), 649-671. https://doi.org/10.1111/1460-6984.12082
    » https://doi.org/10.1111/1460-6984.12082
  • Caza, B. B., Reid, E. M., Ashford, S. J., & Granger, S. (2022). Working on my own: Measuring the challenges of gig work. Human Relations, 75(11), 2122-2159. https://doi.org/10.1177/00187267211030098
    » https://doi.org/10.1177/00187267211030098
  • Charmaz, K. (2009). A construção da teoria fundamentada: Guia prático para análise qualitativa. Bookman.
  • DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. Academy of Management Review, 35(4), 627-647. https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
    » https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
  • Duggan, J., Sherman, U., Carbery, R., & McDonnell, A. (2020). Algorithmic management and app‐work in the gig economy: A research agenda for employment relations and HRM. Human Resource Management Journal, 30(1), 114-132. https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258
    » https://doi.org/10.1111/1748-8583.12258
  • Eller, A., Araujo, B. F. V. B. D., & Araujo, D. A. V. B. D. (2016). Balancing work, study and home: A research with master’s students in a Brazilian university. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 17(3), 60-83. https://doi.org/10.1590/1678-69712016/administracao.v17n3p60-83
    » https://doi.org/10.1590/1678-69712016/administracao.v17n3p60-83
  • Felix, B. (2020). Analyzing the formation of a paradoxical organizational identity. International Journal of Organizational Analysis, 28(6), 1227-1241. https://doi.org/10.1108/IJOA-08-2019-1849
    » https://doi.org/10.1108/IJOA-08-2019-1849
  • Felix, B., & Bento, M. S. (2018). Individual and organizational identities in merger contexts: A boundary perspective. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 19(4). https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg170104
    » https://doi.org/10.1590/1678-6971/eramg170104
  • Felix, B., & Cavazotte, F. (2019). When a calling goes unanswered: exploring the role of workplace personalizations as calling enactments. Frontiers in Psychology, 10, 1940. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940
    » https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01940
  • Felix, B., Dourado, D., & Nossa, V. (2023). Algorithmic management, preferences for autonomy/security and gig-workers’ wellbeing: A matter of fit? Frontiers in Psychology, 14. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2023.1088183
    » https://doi.org/10.3389/fpsyg.2023.1088183
  • Filgueiras, V., & Antunes, R. (2020). Plataformas digitais, uberização do trabalho e regulação no capitalismo contemporâneo. Revista Contracampo, 39(1). https://periodicos.uff.br/contracampo/article/view/38901
    » https://periodicos.uff.br/contracampo/article/view/38901
  • Fiol, C. M., Pratt, M. G., & O’Connor, E. J. (2009). Managing intractable identity conflicts. Academy of Management Review, 34(1), 32-55. https://doi.org/10.5465/amr.2009.35713276
    » https://doi.org/10.5465/amr.2009.35713276
  • Fleming, T. M., Bavin, L., Stasiak, K., Hermansson-Webb, E., Merry, S. N., Cheek, C., … & Hetrick, S. (2017). Serious games and gamification for mental health: Current status and promising directions. Frontiers in Psychiatry, 7, 215. https://doi.org/10.3389/fpsyt.2016.00215
    » https://doi.org/10.3389/fpsyt.2016.00215
  • Fontanella, B. J. B., Luchesi, B. M., Saidel, M. G. B., Ricas, J., Turato, E. R., & Melo, D. G. (2011). Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cadernos de Saúde Pública, 27, 388-394. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200020
    » https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200020
  • Fraga, A. M., Antunes, E. D. D., & Rocha-de-Oliveira, S. (2020). The female and the male professional: gender, career and expatriation interfaces in trajectory for female expatriates. BBR. Brazilian Business Review, 17, 192-210. https://doi.org/10.15728/bbr.2020.17.2.4
    » https://doi.org/10.15728/bbr.2020.17.2.4
  • Franco, T. M. A., & Faria, M. G. D. (2013). A terceirização/subcontratação do trabalho no Brasil e sua interconexão com a saúde mental no trabalho. Saúde mental no trabalho: coletânea do fórum de saúde e segurança no trabalho do estado de Goiás, 469-486.
  • Frandsen, S. (2017). The silver bullet of branding: Fantasies and practices of organizational identity work in organizational identity change process. Scandinavian Journal of Management, 33(4), 222-234. https://doi.org/10.1016/j.scaman.2017.10.001
    » https://doi.org/10.1016/j.scaman.2017.10.001
  • Gill, M. J. (2015). Elite identity and status anxiety: An interpretative phenomenological analysis of management consultants. Organization, 22(3), 306-325. https://doi.org/10.1177/1350508413514287
    » https://doi.org/10.1177/1350508413514287
  • Glaser, B. G., Strauss, A. L., & Strutzel, E. (1968). The discovery of grounded theory; strategies for qualitative research. Nursing research, 17(4), 364. https://doi.org/10.1097/00006199-196807000-00014
    » https://doi.org/10.1097/00006199-196807000-00014
  • Gomes, R., & Felix, B. (2019). In the closet: a grounded theory of the silence of gays and lesbians in the workplace. Cadernos EBAPE. BR, 17, 375-388. https://doi.org/10.1590/1679-395174796
    » https://doi.org/10.1590/1679-395174796
  • Greil, A. L., & Rudy, D. R. (1984). Social cocoons: Encapsulation and identity transformation organizations. Sociological Inquiry, 54(3), 260-278. https://doi.org/10.1111/j.1475-682X.1984.tb00060.x
    » https://doi.org/10.1111/j.1475-682X.1984.tb00060.x
  • Huber, G., & Brown, A. D. (2017). Identity work, humour and disciplinary power. Organization Studies, 38(8), 1107-1126. https://doi.org/10.1177/0170840616677632
    » https://doi.org/10.1177/0170840616677632
  • Ibarra, H. (1999). Provisional selves: Experimenting with image and identity in professional adaptation. Administrative science quarterly, 44(4), 764-791.
  • Ibarra, H., & Obodaru, O. (2016). Betwixt and between identities: Liminal experience in contemporary careers. Research in Organizational Behavior, 36, 47-64. https://doi.org/10.1016/j.riob.2016.11.003
    » https://doi.org/10.1016/j.riob.2016.11.003
  • Ibarra, H., & Barbulescu, R. (2010). Identity as narrative: Prevalence, effectiveness, and consequences of narrative identity work in macro work role transitions. Academy of management review, 35(1), 135-154. https://doi.org/10.5465/amr.35.1.zok135
    » https://doi.org/10.5465/amr.35.1.zok135
  • Jabagi, N., Croteau, A. M., Audebrand, L. K., & Marsan, J. (2019). Gig-workers’ motivation: Thinking beyond carrots and sticks. Journal of Managerial Psychology, 34(4), 192-213. https://doi.org/10.1108/JMP-06-2018-0255
    » https://doi.org/10.1108/JMP-06-2018-0255
  • Jarrahi, M. H., Newlands, G., Lee, M. K., Wolf, C. T., Kinder, E., & Sutherland, W. (2021). Algorithmic management in a work context. Big Data & Society, 8(2). https://doi.org/10.1177/20539517211020332
    » https://doi.org/10.1177/20539517211020332
  • Kahancová, M., Meszmann, T. T., & Sedláková, M. (2020). Precarization via Digitalization? Work Arrangements in the On-Demand Platform Economy in Hungary and Slovakia. Frontiers in Sociology, 5, 3. https://doi.org/10.3389/fsoc.2020.00003
    » https://doi.org/10.3389/fsoc.2020.00003
  • Kahn, W. A. (1990). Psychological conditions of personal engagement and disengagement at work. Academy of Management Journal, 33(4), 692-724. https://doi.org/10.5465/256287
    » https://doi.org/10.5465/256287
  • Katz, L. F., & Krueger, A. B. (2019). The rise and nature of alternative work arrangements in the United States, 1995-2015. ILR review, 72(2), 382-416. https://www.nber.org/papers/w22667
    » https://www.nber.org/papers/w22667
  • Kellogg, K. C., Valentine, M. A., & Christin, A. (2020). Algorithms at work: The new contested terrain of control. Academy of Management Annals, 14(1), 366-410. https://angelechristin.com/wp-content/uploads/2020/01/Algorithms-at-Work_Annals.pdf
    » https://angelechristin.com/wp-content/uploads/2020/01/Algorithms-at-Work_Annals.pdf
  • Kreiner, G. E., Hollensbe, E., Sheep, M. L., Smith, B. R., & Kataria, N. (2015). Elasticity and the dialectic tensions of organizational identity: How can we hold together while we are pulling apart?. Academy of Management Journal, 58(4), 981-1011. https://doi.org/10.5465/amj.2012.0462
    » https://doi.org/10.5465/amj.2012.0462
  • Kyratsis, Y., Atun, R., Phillips, N., Tracey, P., & George, G. (2017). Health systems in transition: Professional identity work in the context of shifting institutional logics. Academy of Management Journal, 60(2), 610-641. https://doi.org/10.5465/amj.2013.0684
    » https://doi.org/10.5465/amj.2013.0684
  • Leavitt, K., & Sluss, D. M. (2015). Lying for who we are: An identity-based model of workplace dishonesty. Academy of Management Review, 40(4), 587-610. https://doi.org/10.5465/amr.2013.0167
    » https://doi.org/10.5465/amr.2013.0167
  • Li, Q., Zhao, X., & Liang, J. (2021). Effects of organizational identification and job satisfaction on voluntary turnover intentions: Evidence from China. Human Resource Management Review, 31(1), 100715.
  • Liao, S. H., Liu, C. T., & Loi, R. (2019). Linking organizational identification and innovation behavior in R&D teams: A moderated mediation model. Journal of Business Research, 98, 365-373.
  • Mann, G., & O’Neil, C. (2016). Hiring algorithms are not neutral. Harvard Business Review, 9, 2016. https://hbr.org/2016/12/hiring-algorithms-are-not-neutral
    » https://hbr.org/2016/12/hiring-algorithms-are-not-neutral
  • Moodley, R., Chiclana, F., Caraffini, F., & Carter, J. (2019). A product-centric data mining algorithm for targeted promotions. Journal of Retailing and Consumer Services, 54, 101940. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2019.101940
    » https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2019.101940
  • Nobrega, M. R., & Felix, B. (2021). Managing the boundaries between work and home: A study with expatriates. Cadernos EBAPE. BR, 19, 582-594.
  • Panteli, N., Rapti, A., & Scholarios, D. (2019). ‘If he just knew who we were’: microworkers’ emerging bonds of attachment in a fragmented employment relationship. Work, Employment and Society, 34(3), 476-494. https://doi.org/10.1177/0950017019897872
    » https://doi.org/10.1177/0950017019897872
  • Petriglieri, G., Ashford, S. J., & Wrzesniewski, A. (2019). Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, 64(1), 124-170. https://doi.org/10.1177/0001839218759646
    » https://doi.org/10.1177/0001839218759646
  • Petriglieri, G., Petriglieri, J. L., & Wood, J. D. (2018). Fast tracks and inner journeys: Crafting portable selves for contemporary careers. Administrative Science Quarterly, 63(3), 479-525. https://doi.org/10.1177/0001839217720930
    » https://doi.org/10.1177/0001839217720930
  • Petriglieri, J. L. (2011). Under threat: Responses to and the consequences of threats to individuals’ identities. Academy of Management Review, 36(4), 641-662. https://doi.org/10.5465/AMR.2011.65554645
    » https://doi.org/10.5465/AMR.2011.65554645
  • Rodrigues, G. R., & Felix, B. (2021). Broches, bugigangas e penduricalhos: como trabalhadores remotos utilizam símbolos para representar suas identidades. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, 20(1), 171-193. https://www.periodicosibepes.org.br/index.php/recadm/article/view/3163/1118
    » https://www.periodicosibepes.org.br/index.php/recadm/article/view/3163/1118
  • Rosenblat, A., & Stark, L. (2016). Algorithmic labor and information asymmetries: A case study of Uber’s drivers. International Journal Of Communication, 10, 27. http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2686227
    » http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2686227
  • Schildt, H. (2017). Big data and organizational design-the brave new world of algorithmic management and computer augmented transparency. Innovation, 19(1), 23-30. https://doi.org/10.1080/14479338.2016.1252043
    » https://doi.org/10.1080/14479338.2016.1252043
  • Sherman, U. P., & Morley, M. J. (2020). What do we measure and how do we elicit it? The case for the use of repertory grid technique in multi-party psychological contract research. European Journal of Work and Organizational Psychology, 29(2), 230-242. https://doi.org/10.1080/1359432X.2019.1668844
    » https://doi.org/10.1080/1359432X.2019.1668844
  • Spurk, D., & Straub, C. (2020). Flexible employment relationships and careers in times of the COVID-19 pandemic. Journal of Vocational Behavior, 119, 103435. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0001879120300609
    » https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0001879120300609
  • Stanford, J. (2017). The resurgence of gig work: Historical and theoretical perspectives. The Economic and Labour Relations Review, 28(3), 382-401. https://doi.org/10.1177/1035304617724303
    » https://doi.org/10.1177/1035304617724303
  • Thornborrow, T., & Brown, A. D. (2009). Being regimented’: Aspiration, discipline and identity work in the British parachute regiment. Organization Studies, 30(4), 355-376. https://doi.org/10.1177/0170840608101140
    » https://doi.org/10.1177/0170840608101140
  • Vallas, S., & Schor, J. B. (2020). What do platforms do? Understanding the gig economy. Annual Review of Sociology, 46, 273-294. https://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev-soc-121919-054857
    » https://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev-soc-121919-054857
  • Veen, A., Barratt, T., & Goods, C. (2020). Platform-capital’s ‘app-etite’ for control: A labour process analysis of food-delivery work in Australia. Work, Employment and Society, 34(3), 388-406. https://doi.org/10.1177/0950017019836911
    » https://doi.org/10.1177/0950017019836911
  • Watson, T. J. (2008). Managing identity: Identity work, personal predicaments and structural circumstances. Organization, 15(1), 121-143. https://doi.org/10.1177/1350508407084488
    » https://doi.org/10.1177/1350508407084488
  • Wentrup, R., Nakamura, H. R., & Ström, P. (2019). Uberization in Paris-the issue of trust between a digital platform and digital workers. Critical Perspectives on International Business, 15(1), 20-41. https://doi.org/10.1108/cpoib-03-2018-0033
    » https://doi.org/10.1108/cpoib-03-2018-0033
  • Wittman, S. (2019). Lingering identities. Academy of Management Review, 44(4), 724-745. https://doi.org/10.5465/amr.2015.0090
    » https://doi.org/10.5465/amr.2015.0090
  • Wood, A. J., Graham, M., Lehdonvirta, V., & Hjorth, I. (2019). Good gig, bad gig: autonomy and algorithmic control in the global gig economy. Work, Employment and Society, 33(1), 56-75. https://doi.org/10.1177/0950017018785616
    » https://doi.org/10.1177/0950017018785616
  • Zheng, W., Meister, A., & Caza, B. B. (2020). The stories that make us: Leaders’ origin stories and temporal identity work. Human Relations, 74(8), 1178-1210. https://doi.org/10.1177/0018726720909864
    » https://doi.org/10.1177/0018726720909864
  • Classificação JEL:

    J460.
  • Pareceristas:

    Ana Cristina Batista-dos-Santos (Universidade Estadual do Ceará, Brasil)
    Um(a) revisor(a) não autorizou a divulgação de sua identidade.
  • Relatório de Revisão por Pares:

    A disponibilização do Relatório de Revisão por Pares não foi autorizada pelos revisores.

  • # de revisores convidados até a decisão:
  • Financiamento

    Os autores informaram que não houve suporte financeiro para a realização deste trabalho.
  • Direitos Autorais

    Os autores detêm os direitos autorais relativos ao artigo e concederam à RAC o direito de primeira publicação, com a obra simultaneamente licenciada sob a licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0).
  • Método de Revisão por Pares

    Este conteúdo foi avaliado utilizando o processo de revisão por pares duplo-cego (double-blind peer-review). A divulgação das informações dos pareceristas constantes na primeira página e do Relatório de Revisão por Pares (Peer Review Report) é feita somente após a conclusão do processo avaliativo, e com o consentimento voluntário dos respectivos pareceristas e autores.
  • Verificação de Plágio

    A RAC mantém a prática de submeter todos os documentos aprovados para publicação à verificação de plágio, mediante o emprego de ferramentas específicas, e.g.: iThenticate.
  • Disponibilidade dos Dados

    Os autores afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:
    Eliana Pires Conde; Bruno Felix; Nadia Cardoso Moreira, 2023, "Replication Data for: "Laços que Criam Nós: como trabalhadores independentes coconstroem suas identidades no trabalho" published by RAC-Revista de Administração Contemporânea", Harvard Dataverse, V1.
    A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.

Editado por

Editor-chefe:

Marcelo de Souza Bispo (Universidade Federal da Paraíba, PPGA, Brasil)

Editora Associada:

Keysa M. C. de Mascena (Universidade de Fortaleza, Brasil)

Disponibilidade de dados

Os autores afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:

Eliana Pires Conde; Bruno Felix; Nadia Cardoso Moreira, 2023, "Replication Data for: "Laços que Criam Nós: como trabalhadores independentes coconstroem suas identidades no trabalho" published by RAC-Revista de Administração Contemporânea", Harvard Dataverse, V1.

https://doi.org/10.7910/DVN/Q71TN6

A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    22 Maio 2022
  • Revisado
    05 Abr 2023
  • Aceito
    07 Jul 2023
  • Retratado
    06 Set 2023
  • Publicado
    24 Nov 2023
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração Av. Pedro Taques, 294,, 87030-008, Maringá/PR, Brasil, Tel. (55 44) 98826-2467 - Curitiba - PR - Brazil
E-mail: rac@anpad.org.br