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Usos e abusos de relações públicas

RESENHA BIBLIOGRAFICA

Usos e abusos de relações públicas

Por José Xavier de Oliveira. Rio de Janeiro, Fudação Getúlio Vargas, 1971.

Ousamos vaticinar que, daqui por diante e talvez por muito tempo, não se falará em relações públicas no Brasil sem citar - para defender ou atacar - este trabalho que nasce destinado a ser um clássico (cumgrano salis).

José Xavier de Oliveira faz uma abordagem bastante original do tema que se propôs, o "fenômeno errepeano, particularmente no tocante a suas peculiaridades no Brasil", combinando o método rigorosamente científico para pesquisar e analisar a matéria, com altas doses de malícia para comentá-la.

O autor adverte, de saída, que o livro não tem pretensões didáticas, "mas sim polêmicas". No entanto, será bem difícil estudar a gênese, evolução e prática de relações públicas em nosso País sem recorrer a este livro que praticamente esgota o assunto, tão minucioso é êle, e sério.

De fato, o prefaciador do livro, jornalista Wladir Dupont, revela que "Xavier, pelos meus cálculos, deve ter levado quase oito anos escrevendo e burilando o livro". Usos e abusos de relações públicas é em verdade um livro minucioso, mas não enfadonho, sério, mas não pedante. Ao contrário, a cada página nos traz o autor um riso aos lábios, pelo senso de humor, irreverência e até mordacidade com que critica os aspectos menos louváveis da prática de RP, ou os que pretenderam estudá-la sem a devida base científica.

Este livro, ao contrário, tem como fundamento, além da vastíssima bibliografia esmiuçada pelo autor, os dados metodicamente pesquisados em amostra colhida em São Paulo, que abrangeu 516 empresas assim distribuídas: 177 indústrias, 146 bancos, 97 empresas comerciais, 48 divulgadoras, 46 seguradoras e duas agências de consultoria de RP. Esta pesquisa, e a publicação da presente monografia, contaram com o patrocínio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, da Fundação Ford, e do Centro de Pesquisas e Publicações da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas.

Mas a obra não consiste na mera apresentação e análise de resultados de investigação. O autor se demora em profundas considerações sobre relações públicas em si - arte? ciência? técnica? - e os profissionais desse campo.

Estudando as origens dessa atividade, esclarece o autor que ela só poderá ser bem compreendida "na medida em que se reconheça sua íntima vinculação ao capitalismo e ao way of life americanos".

O autor não abre seu trabalho com a costumeira definição; antes, parte da observação dos fatos com o intuito de definir a posteriori , para só então tratar de questões como, por exemplo, a conveniência ou não da atividade de RP tornar-se efetivamente profissional.

O livro é um convite à meditação sobre as contradições que cercam a atividade errepeana, à libertação dos "preconceitos ancilosados" que a seu respeito se insinuaram na mente de muitos.

A história e a bibliografia de RP, o que se disse, o que se pensa, o que se faz, o que não se faz e o que se deveria fazer neste setor - tudo isto é estudado longamente. O autor alinha, por exemplo, 64 das mais citadas definições de RP (parece que existem cerca de mil!).

A questão da profissionalização de RP e as tentativas de sua regulamentação no Brasil merecem alguns comentários acrimoniosos bem ao gosto do autor, mas nem por isso menos pertinentes: "Só as profissões de que a gente desconfia precisam ser regulamentadas: a do advogado, do médico, do engenheiro, do economista, do psicólogo, do pulicitário e assim por diante. Hoje em dia ninguém pensaria em regulamentar, por exemplo, a nobre profissão do sapateiro. (...) Todos sabemos que ninguém pode camuflar-se sapateiro, porque sapateiro só o é aquele que sabe fazer ou consertar sapatos, e isso é fácil pôr à prova".

Na terceira parte da obra, José Xavier de Oliveira detém-se na apresentação, interpretação e comentários da pesquisa propriamente dita, a qual representou esforço inédito entre nós, no setor privado. Mesmo no exterior, iniciativas semelhantes parecem ter sido levadas a efeito somente nos Estados Unidos. A explanação da metodologia adotada e dos problemas encontrados é feita de maneira particularmente útil para quem aventure a futuros estudos similares.

Como conclusão, o autor constrói um modelo teórico que constitui a sua definição de RP no plano filosófico, ainda que factível, ou seja, o enunciado do que RP deveria ser, como profissão e técnica social de comunicação, exercida com o objetivo último de "tornar cada vez mais favoráveis as condições ambientes de subsistência do organismo empresário".

O autor não se furta a propor seriamente nomes que lhe parecem mais condizentes, para substituir as expressões "relações públicas", que lhe parece "desmoralizada", e "relator público" ou "homem de relações públicas", bastante inadequadas.

Complementa-se Usos e abusos de relações públicas com apêndices contendo os questionários em foco e outras matérias de interesse específico, inclusive generosas indicações bibliográficas, nacionais e estrangeiras, referentes a RP e campos correlatos: ciências sociais, propaganda e publicidade, jornalismo, comunicações, psicologia social.

WALDÍVIA M. PORTINHO

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Set 1971
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