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Editorial

Editorial

Matéria publicada na seção de ciência e tecnologia da revista britânica The Economist, no mês de junho de 2004, comenta o trabalho de Emili Garca-Berthou e Carles Alcaraz. Os dois pesquisadores da Universidade de Gerona, na Espanha, investigaram 44 artigos publicados nos periódicos Nature e British Medical Journal (BMJ), que estão entre os mais respeitados do mundo. O foco da investigação foi a consistência metodológica: eles procuraram verificar se os dados apresentados realmente levavam às conclusões advogadas pelos autores. Para isso, utilizaram técnicas estatísticas.

Como se sabe, revistas médicas e científicas constituem a referência máxima em termos de processo de avaliação por pares e checagem de dados. Porém, Garca-Berthou e Alcaraz descobriram que nada menos que 38% de sua amostra de artigos da revista Nature e 25% de sua amostra de artigos do BMJ continham um ou mais erros estatísticos. Os próprios pesquisadores advertem que nem todos os erros detectados levam a interpretações ou conclusões erradas. Supõe-se que não se trata de fraudes deliberadas, porém a pesquisa lança sombras sobre as imperfeições do processo de desenvolvimento e publicação de artigos científicos. Talvez pergunte o nosso leitor: se as melhores revistas científicas do mundo estão sujeitas a tais problemas, o que acontecerá no campo da Administração, metodologicamente mais frágil?

O domínio de técnicas de investigação, sejam elas quantitativas ou qualitativas, exige dos pesquisadores tempo e dedicação. A maior parte deles, entretanto, tem visão restrita das alternativas disponíveis. Erros podem ocorrer tanto em função da escolha inadequada da abordagem, quanto em função da aplicação mal conduzida. Com isso, parece razoável supor que muito do que lemos em nossos periódicos científicos também contém falhas não declaradas, sendo que algumas delas talvez coloquem em dúvida a validade das conclusões.

Soluções? Primeiro, é preciso reconhecer que a maioria dos pesquisadores têm idéia vaga dos métodos que usam. Muitos adotam uma ou outra abordagem com base em preferência pessoal ou tradição do centro de pesquisas ao qual estão afiliados. Para contrapor tal condição, é preciso ampliar os cursos de formação em metodologia. Segundo, é preciso continuar o esforço de melhoria do trabalho de revisão por pares, um trabalho árduo de diálogo entre autores e avaliadores. Terceiro, é preciso combater a mentalidade formalista, de atendimento (de fachada) a requisitos de produção, e fomentar a mentalidade de cientista, que foca o desenvolvimento de contribuições de impacto sobre a teoria e a prática da Administração.

ALIMENTO PARA A MENTE E PARA A ALMA

Nesta edição, a RAE traz temas emergentes e, em parceria com a RAE-eletrônica, uma inovação editorial.

No campo de Organizações, Sylvia Constant Vergara, José Luis Felício dos Santos de Carvalho e Ana Paula Cortat Zambrotti Gomes tratam da questão do controle. Os autores baseiam-se em uma analogia que tem como contraponto a evolução da "espacialidade" no teatro. Dentro do mesmo domínio, e também da mesma tradição crítica, Mario Aquino Alves e Luis Guilherme Galeão-Silva apresentam uma análise do conceito de diversidade nas organizações.

No campo de Comportamento Organizacional, Arménio Rego e Solange Souto tratam da questão do comprometimento em um novo tipo de organização, denominada "autentizótica". O trabalho investiga organizações brasileiras e portuguesas.

No campo da Gestão de Pessoas, Isa Aparecida de Freitas e Jairo Eduardo Borges-Andrade apresentam estudo acerca do impacto de um programa de desempenho gerencial sobre indivíduos e organização. Um estudo de caso ilustra a proposta dos autores.

No campo de Gestão Pública, Bill Cooke discute princípios e pressupostos que fundamentam os processos de intervenção apoiados por organizações internacionais em países em desenvolvimento. O artigo é introduzido por Marta Ferreira Santos Farah, que ressalta pontos de interesse para o contexto brasileiro.

No campo da Mercadologia, Marcelo Gattermann Perin e Cláudio Hoffmann Sampaio testam a hipótese de que a orientação para o mercado é fator determinante para o desempenho da empresa, comparando essa variável com o porte da organização. O estudo compreende uma investigação sobre a indústria eletroeletrônica no Brasil. No mesmo domínio, Tânia Modesto Veludo de Oliveira, Ana Akemi Ikeda e Rubens da Costa Santos analisam, com suporte de uma pesquisa exploratória de campo, a relação do comportamento de compra compulsiva e o cartão de crédito.

Nesta edição, a seção RAE-documento procura estimular

o debate. No "artigo-âncora", Miguel P. Caldas e Tatiana Tinoco apresentam uma análise bibliométrica da produção brasileira no campo de Recursos Humanos. Na RAE-eletrônica (www.rae.com.br/eletrônica), os leitores poderão ler os comentários de Pedro Lincoln C. L. de Mattos e Allan Claudius Queiroz Barbosa, e uma tréplica dos autores. Poderão também enviar seus comentários sobre o tema.

Em Pensata, Gesner Oliveira apresenta um ensaio sobre a questão da regulação pós-concorrencial e o novo ciclo de abertura comercial no Brasil. Completam esta edição duas resenhas e duas indicações bibliográficas.

CONVITE

Frisamos aqui, uma vez mais, o foco desta publicação, de apresentar perspectivas críticas e inovadoras sobre os mais importantes temas da Administração. Reforçamos o convite para que todos enviem seus trabalhos para a RAE.

Boa leitura!

Thomaz Wood Jr.

Diretor e editor

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Set 2004
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