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Boss: Richard J. Daley of Chicago

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Boss: Richard J. Daley of Chicago

Manoel Tosta Berlinck

Boss: Richard J. Daley of Chicago

Por Mike Royko. Nova York, The New American Library, Inc., 1971, 224 p.

Richard J. Daley é prefeito de Chicago há 15 anos. Mike Royko é um jornalista "radical". Daley atraiu o ódio dos jovens "radicais" norte-americanos quando, em 1968, durante a convenção do Partido Democrático, autorizou a polícia a usar de violência para dispersar os jovens radicais que protestavam contra o envolvimento norte-americano no Vietnã. Mike Royko escreveu este livro para "denunciar as maneiras antidemocráticas" utilizadas por Daley para se manter na Prefeitura de Chicago e obter o apoio da elite partidária nacional. O livro, portanto, pretende ser uma crítica ao estilo político de Daley, e o leitor deve, ao terminá-lo estar detestando o prefeito de Chicago e a "máquina partidária" que ele comanda. Para Royko, o prefeito de Chicago é um bandido; a democracia norteamericana, o sheriff. E, como em todo o western produzido em Hollywood, o mocinho, no fim, deve vencer o bandido (ainda que a vitória demore mais de 15 anos).

Entretanto, nada disso acontece com o leitor. A gente termina o livro sem detestar Daley. Acho até que desenvolvi um sentimento de respeito e admiração pelo prefeito de Chicago graças ao livro de Royko.

Por que, então, o livro de Royko não atinge seus objetivos? Creio que a resposta pode ser encontrada na maneira como Royko concebe a política. Para ele, a política é uma atividade executada por atores, sem qualquer conexão com a estrutura mais ampla em que tais atores estão inseridos e da qual fazem parte. Por isso, Daley é o bandido, o homem que comanda a "máquina" de Chicago, que possui, enfim, os destinos da cidade em sua mãos.

Em nenhum momento do livro Royko consegue superar essa visão idealista da política nem responder a pergunta que o leitor está interessado em ver discutida e analisada, ou seja, quais as forças socioeconómicas e políticas que garantem o sucesso de Daley? Em outras palavras, por que Daley, com todos os defeitos que Royko aponta, conseguiu ser eleito prefeito de Chicago cinco vezes, com os votos da maioria esmagadora da população? Por que Daley, sendo o político corrupto que Royko retrata, possui um tremendo poder junto à cúpula do Partido Democrático? Por que Daley precisa ser consultado e cortejado pelos candidatos do Partido à presidência da República? No momento em que esta resenha está sen/Jo escrita, George McGovern, candidato do Partido Democrático à presidência da República, corteja Daley e solicita o seu apoio e é lógico que não é simplesmente porque Daley controla a "máquina" de Chicago que McGovern precisa de seu apoio.

Royko não percebe que Daley é um político muito bem sucedido tanto no nível das massas de Chicago como no nível da política partidária norte-americana. Royko não percebe, enfim, que Daley é, ao mesmo tempo, um produto da democracia norte-americana e um "tipo" de político dessa mesma democracia.

É claro que não pretendo sugerir que a democracia norteamericana produz apenas políticos corruptos. O que pretendo sugerir é que a democracia norteamericana é capaz de produzir também políticos corruptos pois ela não depende da honestidade (ou desonestidade) dos políticos para subsistir.

O que faz com que Daley seja um político bem sucedido é, por um lado, a sua capacidade de satisfazer às demandas da elite socioeconómica de Chicago e, por outro, a sua capacidade de fornecer oo partido os recursos financeiros e políticos de que. necessita para eleger seus candidatos.

Chicago é um dos maiores centros industriais dos Estados Unidos e, portanto, um dos maiores do mundo. As organizações industriais de Chicago (as indústrias, os sindicatos, etc.) possuem demandas políticas que Daley é capaz de satisfazer. Por isso, as indústrias, os industriais, as classes médias e os líderes sindicais não só apoiam Daley como fornecem enormes quantias de dinheiro ao Partido. Além disso, a polícia de Chicago consegue controlar os negros, os porto-riquenhos e outras minorias étnicas pobres que fornecem seu trabalho para as indústrias e o comércio da região. Daley consegue manter essas minorias relativamente isoladas das classes alta e média, em enormes guetos de onde só saem para trabalhar. Por outro lado, Daley possui uma rede de contatos e relações sociais que distribuem empregos, favores e serviços para aqueles que estão necessitando ou estão "insatisfeitos". Finalmente, nas épocas de eleições Daley não só fornece recursos financeiros como também votos ao Partido Democrático. Por isso, Daley possui tanto o apoio da elite econômica de Chicago como a "confiança" da elite partidária. Daley é, em resumo, um político que satisfaz às demandas do capitalismo norte-americano e, portanto, não interessa se ele é honesto ou desonesto. Interessa, isso sim, a sua integração com um sistema que possui demandas que ele é capaz de satisfazer.

Tudo isto Royko deixa de observar, e o livro se transforma em análise semelhante a que os redatores políticos de O Estado de São Paulo faziam de Ademar de Barros.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1972
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