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O trabalho do grupo de desenvolvimento de tecnologia intermediária

ARTIGOS

O trabalho do grupo de desenvolvimento de tecnologia intermediária* * Original em inglês publicado na International Labour Review, v. 16, n. 1, July 1972.

E. F. Schumacher

Economista, fundador e diretor-presidente do ITDG - Intermediate Technology Development Group, Londres, Reino Unido

1. ORIGENS E OBJETIVOS

A criação do Grupo de Desenvolvimento de Tecnologia Intermediária em 1966 resultou de uma iniciativa de profissionais e industriais do Reino Unido, todos com vasta experiência de além-mar, que encontraram uma base comum para ação na abordagem de "tecnologia intermediária". Esse Grupo, muito consciente dos perigos inerentes à expansão do desemprego que ocorre em praticamente todos os países pobres, formou uma companhia limitada sem fins lucrativos, empenhada em fornecer aos pobres e aos desempregados em países em desenvolvimento os meios de conseguir vencer a pobreza com seu próprio esforço.1 1 O autor achou oportuno publicar este artigo na International Labour Review, pois a ILO preocupa-se mais com pessoas do que com os equipamentos de produção em massa; porque constantemente advoga e promove programas para a criação de empregos em países em desenvolvimento; porque, enfim, foi um dos primeiros a reconhecer a significância das idéias defendidas pelo ITDG, desde a criação desse Grupo. Ver, por exemplo, Marsden, Keith. Towards a synthesis of economic growth and social justice. international Labour Review, v. 100, n. 5, Nov. 1969. Progressive technologies for developing countries, ibid. v. 101, n. 5, May 1970.

O conceito "tecnologia intermediária" foi introduzido, inicialmente, pelo autor num relatório preparado para a Indian Planning Comission, em 1963 e depois apresentado num trabalho à Cambridge Conference on Rural Industrialization, em 1964.2 2 Ver, também Social and economic problems calling for the development of intermediate technology. Este trabalho e outro material básico foi incorporado num IT Kit, que pode ser obtido nos escritórios centrais do ITDG. A "razão de ser" do grupo foi, e continua sendo: a) o fato de que a origem e o centro da pobreza e do subdesenvolvimento mundial situam-se principalmente nas áreas rurais dos países pobres, os quais são esquecidos pelos programas de ajuda e de desenvolvimento, realizados correntemente; b) que as áreas rurais continuarão a ser esquecidas e que o desemprego continuará a crescer, a não ser que a tecnologia da auto-ajuda seja posta ao alcance dos países pobres, com assistência para a sua utilização; c) que os países doadores e as agências não possuem no momento o conhecimento sistemático necessário sobre tecnologias e comunicações adaptadas, para assistir efetivamente o desenvolvimento rural nas dimensões necessárias.

Atualmente, é de conhecimento geral que a necessidade "mais urgente do mundo em desenvolvimento são empregos - empregos produtivos medidos em milhões de novas oportunidades de trabalho a cada ano. Reconhece-se também, cada vez mais, que, para criar atividades novas na escala necessária, as tecnologias e os métodos de produção têm que ser apropriados às condições de pessoas pobres em países pobres, isto é, eles devem ser de baixo custo para providenciar empregos em grande número e suficientemente simples para serem usados e praticados pela população das áreas rurais e de cidades pequenas, sem aptidões técnicas e organizacionais sofisticadas e com uma renda muito baixa. Por conseguinte, equipamento dessa natureza terá que ser fornecido principalmente por fontes internas e empregado de maneira a ir de encontro às necessidades locais.

As tecnologias dos países ricos e industrializados, que visam poupar mão-de-obra e são de capital-intensivo, não satisfazem essas exigências. Mesmo no simples teste de custo-capital por emprego,3 3 Isto é, o custo de equipar um operário, excluindo o custo da terra e dos edifícios. deixando de lado todas as outras considerações, a tecnologia de alto custo dos países ricos condenaria o Terceiro Mundo a um desemprego em massa numa escala inimaginável. A escolha entre novas oportunidades de trabalho custando £ 1 500 cada, ou digamos, £ 150 ou 100 cada, pode significar a escolha entre meio milhão de empregos e 5 ou 7,5 milhões de empregos. Não é exagero afirmar, como o Grupo insistiu desde o início, que a escolha da tecnologia é a maior decisão coletiva a ser enfrentada por qualquer país em desenvolvimento. Foi - e em grande parte ainda é - a negação dessa escolha para os países em desenvolvimento que deu origem e incentivo a esse Grupo para pesquisar e divulgar a existência de opções tecnológicas e para ajudar a introduzir técnicas que comunidades pobres consigam usar e operar sozinhas. Resumindo, o que o Grupo identificou foi uma grande falha nos programas de assistência ao desenvolvimento; a ausência, na prática, de esforços organizados e sistemáticos para prover os países pobres de opções tecnológicas de baixo custo e de auto-ajuda, adaptadas às suas necessidades de desenvolvimento mediante técnicas trabalho-intensivas e empresas em pequena escala. Esta deficiência não pode ser remediada por uma aceleração dos programas de assistência convencionais, assim como, tampouco, a falta de moradias não pode ser aliviada pela construção de aviões supersônicos em número maior.

O Grupo, portanto, iniciou a compilação de dados práticos sobre tecnologias intermediárias, para testá-las em condições de operação e torná-las conhecidas largamente, colocando-as ao livre alcance de todos. Começou produzindo Ferramentas para o progresso, um guia para ferramentas e equipamentos simples, produzidos no Reino Unido. Desde 1968 empenhou-se em pesquisas mais detalhadas das tecnologias exigidas para o desenvolvimento rural - aquelas que se referem à construção, equipamento agrícola, água, tecnologia alimentícia, saúde rural, pequena indústria, energia, educação e treinamento, cooperativas e atividades femininas. Cada programa de trabalho procura identificar as necessidades básicas para tecnologias simples, documentar as técnicas e o equipamento apropriados e demonstrar sua aplicação prática, por intermédio de projetos de campo no além-mar.

Cada assunto é tratado por um grupo de peritos - engenheiros, cientistas, arquitetos, tecnólogos de construção civil e outros com grande experiência no além mar, que trabalham gratuitamente, aconselhando e supervisionando equipes de pesquisa e de desenvolvimento técnico, em tempo integral. Esta organização conseguiu mobilizar não só os 100 ou mais profissionais experientes, mas também muitas empresas industriais para a tarefa de preencher a lacuna de uma tecnologia intermediária. Também foram criados estreitos laços com instituições especializadas nos mais diversos ramos da tecnologia.4 4 Por exemplo: o projeto de equipamento agrícola está alocado no National College of Agricultural Engineering, Silsoe; a tecnologia alimentícia no National College of Food Technology, Weyebridge. Outras pesquisas são feitas pelo Department of Applied Physical Sciences, University of Beading e o Boyal College of Art.

Desde o início o objetivo do Grupo não foi apenas de suplementar os programas de desenvolvimento e de assistência existentes, mas de modificar sua ênfase: não tratar os países pobres como se já fossem ricos, mas avaliar e agir de acordo com suas necessidades para desenvolver métodos de auto-ajuda e auto-suficiência. Um fato surgido nos poucos anos de existência do Grupo é a demonstração de como essa mudança pode ser feita e o que se deve fazer para descobrir, analisar e tornar conhecida uma nova gama de técnicas de auto-ajuda adaptadas às condições e aos recursos atuais dos países em desenvolvimento: tecnologias ao seu alcance, que possibilitem a mobilização de seu potencial de mão-de-obra para atividades produtivas.

Uma segunda conclusão da experiência do grupo é a de que, para que esse tipo de empreendimento seja útil, grande parte do trabalho tem de ser feito necessariamente nos países desenvolvidos. Para isto há várias razões. O trabalho básico de reunir e sistematizar o conhecimento de tecnologias de baixo custo pode ser iniciado e promovido mais facilmente em centros, onde: a) o conhecimento necessário e as instalações existem ou podem ser facilmente mobilizados; b) as comunicações - internas e externas - apresentam poucos obstáculos; c) a cobertura mundial é facilmente obtida; d) não há pressões sobre o "projeto".

As três primeiras razões requerem pouca elaboração. Os países industrializados possuem o conhecimento técnico necessário e instalações de pesquisa. A direção de pesquisa e desenvolvimento requer uma mudança de ênfase e de escala, mas os conhecimentos fundamentais e o esforço são facilmente dispensáveis para serem mobilizados. A necessidade de comunicação eficiente, entre centros de conhecimento dentro de um país ou fora dele, é a condição prévia para a organização sistemática desses conhecimentos e sua aplicação;5 5 Assim como as Nações Unidas e suas agências especializadas estão localizadas em Genebra, Nova York, Roma e outras metrópoles. A necessidade de descentralizar suas atividades, uma vez constituídos os quadros de especialistas e os conhecimentos relevantes, reforça o argumento. e o mesmo vale para facilitar o acesso e o contato com o mundo em desenvolvimento, quando é preciso adquirir conhecimentos adequados e difundi-los. A quarta razão pode ser menos óbvia, mas é crucial; a tarefa de produzir informação generalizada requer liberdade das pressões geradas por projetos do "país". Para exemplificar, a Equipe Cooperativas do Grupo recentemente produziu um manual sobre técnicas simples de contabilidade para cooperativas. Este manual já foi adotado por Serra Leoa e pode muito bem servir para outros países carentes de um sistema estabelecido de contabilidade cooperativista. Existe a necessidade, portanto, de divulgar as diversas opções existentes antes que o trabalho detalhado de adaptação local possa ser elaborado. O mesmo pode-se dizer com relação aos perfis industriais, atualmente preparados pelo Grupo para trabalhos em madeira, metal e equipamento agrícola, capazes de ser manufaturados no local.

Uma pergunta muito freqüente é a seguinte: a demanda por tecnologia intermediária realiza-se em escala suficientemente ampla? Para isto há outra pergunta decisiva: as pessoas podem requerer algo, de cuja existência não têm conhecimento? Em outras palavras, a tarefa primária é a de reunir informações detalhadas e experiência prática sobre técnicas simples e tornar público o fato de que tais informações e práticas existem ("tornar público" aqui significa tanto comunicar a informação como demonstrar de que forma ela pode ser utilizada vantajosamente).

O argumento para atribuir a tarefa de mobilização de informações sistemáticas sobre tecnologias intermediárias aos centros de conhecimentos técnicos existentes - e sociedades semelhantes ao Grupo, no Reino Unido, e VITA (Voluntários para Assistência Técnica Internacional), nos Estados Unidos, existem ou se esboçam na Austrália, no Canadá, na República Federal Alemã e na índia - é pouco afetado pela possibilidade de alguma superposição inicial; o campo de trabalho potencial é tão amplo que um certo grau de especialização internacional poderia ser introduzido facilmente. Tampouco - é preciso frisar - este é um argumento contra a criação de centros de tecnologia intermediária ou apropriada, nos próprios países em desenvolvimento. Esses centros incumbir-se-iam, primeiramente, da coleta de informações sobre as opções disponíveis, tornando conhecidas as necessidades específicas e adaptando técnicas aos seus próprios ambientes e, se os. recursos permitirem, ao desenvolvimento de suas próprias equipes de pesquisa e de desenvolvimento. Isto está acontecendo agora na índia, que já tem um considerável setor industrial e instalações bem dotadas de pesquisa, com uma Unidade de Tecnologia Apropriada que foi instalada dentro do Ministério de Desenvolvimento Industrial. O mesmo tem sucedido - tanto quanto é possível saber-se e de uma maneira um pouco mais descentralizada talvez - na República Popular da China, já há alguns anos.

O ponto principal, entretanto, é que o impulso inicial - a mudança de ênfase, a mobilização de conhecimento científico-técnico para o aperfeiçoamento de técnicas de auto-ajuda - tem que vir dos países que possuem estes conhecimentos agora. Somente quando isto acontecer, será possível desenvolver um diálogo útil sobre tecnologia.

O relatório do programa de trabalho do Grupo que se segue deveria talvez ser considerado como uma indicação do que pode - e deveria - ser feito em escala muito maior.

2. O PROJETO DE CONSTRUÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO

O primeiro projeto iniciado tratou da construção civil - parte básica do processo de desenvolvimento. Na medida em que o desenvolvimento prossegue, as normas dos edifícios e das obras necessárias em países em desenvolvimentos transformam-se. Maior variedade de "tipos" de edifícios é- exigida em maior quantidade e distribuição, em áreas mais extensas. A demanda tradicional por simples abrigos torna-se uma demanda de escolas e clínicas, edifícios administrativos e correios, estradas e pontes. A capacidade interna das indústrias construtoras em países em desenvolvimento poderá atender a esta demanda crescente e mutante.

Porque a construção civil abrange uma variedade de qualificações e atividades, incluindo desenho, manufatura e montagem de componentes, direção de homens, materiais e plantas, ela também fornece um rico campo de treinamento e experiência para grande número de pessoas que lutam para elevar seu nível de vida. Construção civil em geral é o segundo maior setor de emprego em qualquer economia, precedido apenas pela indústria manufatureira em países desenvolvidos e pela agricultura em países em desenvolvimento.

O campo para investimentos, tanto públicos como privados, em infra-estrutura física é tão vasto que deveria contribuir mais ao processo de desenvolvimento, em vez de limitar-se apenas aos trabalhos em edifícios e construções. Deveria contribuir para a formação de uma indústria que pode expandir, renovar e conservar esses edifícios; e assim deveria, portanto, ser planejada com a meta específica de desenvolver a indústria de construção local.

A construção civil pode oferecer às pessoas treinamento e experiência nesse setor, ajudando-as na transição necessária de trabalho agrícola para o industrial. Nesse sentido, pode providenciar empregos intermediários valiosos entre agricultura e manufatura na proporção de 1/10 e até 1/5 da mão-de-obra de um país.

Enquanto que na formação de capital bruto, na maioria dos países, a metade desse capital é destinada para a construção, os países em desenvolvimento são forçados a importar a maioria da capacidade construtora necessária. Planos de desenvolvimento muitas vezes são pouco mais do que "listas de compras" para projetos de edifícios e de engenharia civil e não levam em consideração aquilo que poderia ser feito no local. O Grupo de Construção Civil, portanto, preocupou-se com a questão de como auxiliar as indústrias de construção locais. Esse trabalho foi iniciado em 1969 com um projeto de construção para o desenvolvimento; tem como objetivo melhorar a eficiência das operações de construção em países em desenvolvimento, tornando acessível às empresas construtoras uma orientação no emprego de tecnologias apropriadas e de métodos de negócios. A equipe do projeto - um arquiteto, um engenheiro e um economista - verificou que os problemas do pequeno empreiteiro demandavam cuidados especiais. Existe treinamento adequado para os profissionais, como arquitetos e engenheiros, e para a equipe técnica dos ministérios de obras. Entretanto, eles dependem de empreiteiros e construtores locais em número cada vez maior e estes construtores geralmente não recebem treinamento, orientação ou assistência de desenvolvimento. Em toda parte, a brecha é a mesma: programas de construção cada vez maiores, sem a correspondente habilidade local para executá-los.

No início, o Grupo concentrou-se na Nigéria e no Quênia. Na Nigéria começou por identificar as necessidades dos construtores registrados pelo governo nos estados do norte. Com a cooperação dos governos estaduais organizou uma série de seis convenções de quatro dias cada para empreiteiros e oficiais técnicos governamentais, no começo de 1970, na Politécnica de Kaduna. Material didático cobrindo as qualificações elementares de organização para pequenas empresas de construção foi distribuído aos empreiteiros por intermédio de conferências, seminários, recursos audiovisuais, dramatização. As convenções foram um teste tanto para a própria equipe, no que concerne à compreensão das necessidades dos construtores e das técnicas de ensino, quanto à habilidade e entusiasmo no aprender, por parte dos empreiteiros.

As convenções demonstraram claramente que a maior carência poderia ser sanada pela orientação em administração e métodos de negócios. Ficou evidente também que os empreiteiros, homens sem instrução formal, "podem" ser adestrados nessas habilidades, sem as quais poucas organizações locais podem tornar-se firmas de construção eficientes.

Utilizando a experiência das convenções de Kaduna, a equipe começou a trabalhar no Quênia para ajudar a Corporação Nacional de Construção e estabelecer programas de treinamento para empreiteiros africanos. A equipe produziu uma série de programas didáticos que podem ser adaptados ao nível exato dos participantes. A idéia básica desses programas está no fato de que a principal barreira para as informações na situação africana não está tanto no relacionamento entre professores e alunos, mas sim entre aqueles que elaboram o material didático e os professores. Os programas estão sendo elaborados para uma série elementar completa de administração e são úteis aos professores em muitos países e em muitas situações diferentes das da África. A equipe está no momento estudando, juntamente com vários governos da África Central e Ocidental, novas oportunidades para a aplicação e extensão de suas experiências no treinamento de empreiteiros.

3. PROJETOS HIDRÁULICOS

Um dos fatores principais que influenciam o desenvolvimento no nível de aldeias é a disponibilidade de água para o consumo humano, animal e agrícola. Na maioria das áreas tropicais e subtropicais, a queda de chuva é sazonal e rege o tipo e a escala de agricultura tradicional e da criação de gado.

Antes que se possam especificar as formas apropriadas do uso das terras e das práticas agrícolas, é preciso identificar as técnicas simples existentes para o armazenamento e manuseio da água e avaliar esses fatores em termos de custo-benefício, eficiência e conhecimentos técnicos necessários.

O Grupo começou por reunir os dados disponíveis no Reino Unido sobre tecnologia hidráulica em pequena escala e de baixo custo. Este trabalho foi terminado e os resultados publicados no início de 1970.6 6 ITDG. Bibliografia sobre tecnologias de água de baixo custo. London, 1970. Em resumo, o Grupo chegou à conclusão de que existe uma grande brecha nos conhecimentos registrados sobre o que pode ser chamado de teoria e prática de suprimento de água, em pequena escala, para as áreas rurais, ou seja, projetos e construção de diferentes dispositivos para a obtenção, elevação, transporte, purificação e, especialmente, armazenamento de água, que seriam úteis para as aldeias, sítios e mesmo casas individuais. Esses dispositivos incluem os meios de captação da água de chuva no local, de sua condução para tanques ou cisternas, de armazenamento seguro, de retirada em caso de necessidade e de purificação, se necessária, conforme os fins a que se destinar.

Ao mesmo tempo, o projeto revelou a existência de muita experiência e informações sobre o traçado e a construção de diques e reservatórios que comportam alguns milhões de galões de água, que normalmente são cheios pelo fluxo dos rios na estação das chuvas, de maneira que haja água durante os longos períodos de seca. Essa informação está bem documentada e dispensa comentários. Contudo, por sua natureza, esses tipos de reservatórios quase sempre situam-se longe das aldeias. Muitas vezes - quase que comumente - essas fontes consideráveis servem para as necessidades de várias aldeias, e os aldeões e seus animais têm de carregar cada gota de sua água, para uso doméstico, da fonte até suas casas. Isto impõe uma árdua tarefa diária, especialmente às mulheres, porque são elas que carregam a água e que muitas vezes são também as responsáveis pelo trabalho de cultivo; os aldeões são obrigados a executar o trabalho com muito menos água do que precisariam normalmente. A distância da fonte não só impede que consigam o pouco de água, mas também subtrai o tempo necessário para o cultivo de mudas em sua horta caseira; diminuiu a eficiência dos animais utilizados para o transporte, para puxar o arado e para outros serviços, pois muito do seu tempo é gasto na caminhada até a barragem ou reservatório para beber, tempo este que poderia ser utilizado em trabalho produtivo. Não há dúvida alguma de que a tão almejada melhora na produtividade agrícola das fazendas, nas zonas providas de chuvas, poderia ser obtida se as técnicas para a coleta e conservação das águas pluviais fossem levadas às pequenas aldeias, sítios e até mesmo às moradias.

Em vista das poucas informações escritas sobre essas técnicas, o grupo lançou-se no campo das experiências e investigações. Uma investigação foi feita em colaboração com o Departamento de Economia Agrícola da Universidade de Reading, que está conduzindo pesquisas sobre o desenvolvimento em aldeias ao redor de Ho, em Ghana. O propósito era o de proceder-se a um estudo detalhado das necessidades de água e de encontrar meios para saná-las.

O Grupo publicou também, em 1969,7 7 ITDG. A introdução de tanques de captação de água pluvial a micro-irrigação em Botswana. London 1969. um relatório pormenorizado de um outro projeto que se originou do trabalho do ITDG sobre tanques de captação em Botswana. Um oficial encarregado do projeto, com experiência prática no trabalho feito em Botswana, foi à Tanzânia, Quênia, Malawi e Swaziland para proceder à execução do projeto e, ao voltar, demonstrou 137 a aplicação no campo de técnicas de captação de água. Como resultado de seu trabalho em Swaziland, seus serviços foram recrutados oficialmente para executar um amplo programa de captação de água em pequena escala naquele país e para treinar também outros técnicos de campo para trabalhos semelhantes na África Oriental.

Esses programas de trabalho ilustram bem a tecnologia intermediária em ação. A idéia de captação em tanques naturalmente não é nova; a construção de tanque ou cisterna no solo, com um lençol de captação ao lado, é um método antigo de reservar água para a estação seca que esteve abandonado durante muito tempo; agora, porém, está sendo usado novamente, por dois motivos. O primeiro é a necessidade - existem grandes áreas de território semi-árido onde o crescimento da população está causando pressão sobre o fornecimento de água potável, o qual, para ser satisfatório, requer um grande número de tanques de captação a fim de assegurar que a água esteja à disposição no lugar exato, ou seja, na fazenda, na escola, no lar. O segundo motivo é o da oportunidade propícia. Durante as últimas décadas a ciência produziu novos materiais revolucionários na forma de membranas impermeáveis baratas. Esses materiais abrem o caminho para um ataque maciço de um problema, que se está tornando cada vez mais agudo no decorrer dos anos. As técnicas são baratas, simples, trabalho-intensivas e servem para transformar a mão-de-obra ociosa em capital produtivo.

Trabalhos de sustentação em pesquisa e desenvolvimento estão sendo feitos no Reino Unido para descobrir várias técnicas e vários materiais que possam ser empregados com pouco custo e muita utilidade para melhorar os métodos tradicionais, a fim de obter-se mais água de boa qualidade. Grande parte do trabalho consiste em experimentar novos materiais à prova de água, como diferentes tipos de "membranas impenetráveis", emulsões derivadas do carvão e do óleo e revestimentos repelentes de água. Isto foi programado como um projeto para dois anos e iniciado em meados de 1971.

4. FERRAMENTAS E EQUIPAMENTO AGRÍCOLA

A aplicação de uma tecnologia adaptada à agricultura apresenta grandes oportunidades 138 para a diversificação e elevação do nível de vida rural. Muitos insumos novos e melhorados - especialmente instrumentos e equipamentos de cultivo, meios de transporte e instalações para o armazenamento das colheitas - podem e devem ser manufaturados no local em número cada vez maior. Entretanto, a tecnologia do desenvolvimento agrícola, - do ponto de vista das necessidades e dos recursos locais, ou seja, aquilo que o agricultor precisa e o tipo de seus recursos - são muito diferentes do que os peritos estrangeiros pensam que deveria ser.

O programa do Grupo de Agricultura foi estabelecido a fim de identificar as necessidades de equipamento agrícola aperfeiçoado e para promover a manufatura desse equipamento no local. O programa está sendo executado em colaboração com o Wye College, Universidade de Londres, o National College of Agricultural Engineering em Silsoe e os governos de Zâmbia, Nigéria e Tanzânia.

O primeiro dos projetos de campo iniciado em Zâmbia está sediado na Agricultural Research Station em Magoye. Dois outros estão sendo preparados na Nigéria e Tanzânia. O objetivo principal é identificar os obstáculos ao aumento da produção agrícola e introduzir uma mecanização seletiva. Há épocas no calendário agrícola da maioria das comunidades agrárias em que todas as mãos disponíveis estão plenamente ocupadas; a falta de mão-de-obra para a execução de tarefas importantes durante esse período age como fator de constrangimento da produção agrícola. A mecanização seletiva das tarefas em questão poderia, portanto, aumentar a produtividade sem causar desemprego. Essa mecanização poderia envolver o desenvolvimento de equipamento para necessidades específicas, a adaptação dos tipos de equipamento existentes e a utilização de equipamento já desenvolvido e apropriado para a tarefa. Esse caminho não eliminaria, entretanto, a introdução de tratores ou de outras formas de mecanização - o teste deve sempre ser: quais as tarefas a serem executadas? Como é que a comunidade local pode fazê-las de maneira permanentemente melhorada?

A equipe agrícola esboçou um projeto para identificar os obstáculos socioeconômicos à produção, como primeiro passo para a introdução de inovações apropriadas às circunstâncias locais. A meta é introduzir essas inovações e elevar a capacidade da comunidade local para produzir e manter o equipamento melhorado por meio de treinamento no trabalho de artesãos e artífices locais.

Um programa de apoio, por meio de documentação - especificações detalhadas, fluxogramas e a construção de protótipos - está sendo executado por uma unidade do Grupo situada no National College of Agricultural Engineering. Entre as inovações já desenvolvidas em Silsoe está uma semeadeira melhorada - redesenhada para eliminar peças fundidas e possibilitando sua manufatura local, sendo agora testada em Botswana, e uma máquina de dobrar metal, operada manualmente e de funções múltiplas. Houve contato com cerca de 50 instituições engajadas nos vários aspectos da pesquisa de maquinaria agrícola no mundo todo, e a compilação sistemática de documentação de equipamento produzido no local e testado no campo está disponível. A utilidade dessa "câmara de compensação" de informações técnicas já está-se tornando evidente.

A equipe de pesquisa agrícola está também compilando um guia de implementos manuais e equipamento de tração animal, que ainda são produzidos e negociados no Reino Unido e em outros países da Europa.

Muitas novas ferramentas e peças de equipamento, bem como várias formas de pecuária cooperativa mais aprimorada foram projetadas e testadas em diversos sistemas de cultivo, apenas porque se pensava que determinada tarefa constituía um impecilho ou era onerosa, ou ainda que a produção poderia ser aumentada. Muitas vezes essas experiências falharam. O ponto de partida do trabalho do Grupo em Zâmbia, executado sob os auspícios do Zambian Ministry of Rural Development, constitui-se no fato de que a inovação tem que se basear no conhecimento detalhado dos problemas e das necessidades do agricultor e num quadro acurado do calendário e da seqüência das colheitas da localidade, tomando em consideração os hábitos e as obrigações da comunidade e o padrão econômico no qual se baseia o sistema de cultivo atual.

O trabalho de levantamento das necessidades e da construção de uma manufatura local está sendo feito por dois dos técnicos de campo do Grupo, ligados à Magoye Research Station. Está-se procedendo a uma investigação dos insumos de mão-de-obra nas colheitas de pequenos produtores - 5 a 20 acres - em três sítios da localidade.

Nesse meio tempo o oficial engenheiro de campo investiga a disponibilidade e a qualidade dos suprimentos locais de madeira, de aço, a qualificação atual dos artesãos e o desenvolvimento de ferramentas básicas apropriadas para os ferreiros rurais.

Embora esse projeto ainda esteja no estágio inicial, certos tipos de equipamento já foram verificados como apropriados para a manufatura e submetidos a testes locais. Entre eles está uma plantadeira de milho puxada por boi, de um trilho, com implemento de fertilizador em forma de funil; plantadeiras simples e duplas de milho, de amendoim e de outras sementes comuns, utilizando o princípio de rodas entalhadas; equipamentos para separar o amendoim da casca, ferramentas de baixo custo para ferreiros e carros de boi aperfeiçoados.

Constatou-se a utilidade de ligar a base de Silsoe no Reino Unido aos projetos de campo, pois quando o projeto de Zâmbia foi lançado no fim de 1971, a primeira pôde fornecer-lhe aproximadamente 40 especificações obtidas na índia, Nigéria, Tanzânia, VITA e outras fontes.8 8 Ver a nota suplementar sobre documentação no fim deste artigo.

A medida que procedem os projetos de campo, a técnica de levantamentos de pesquisas rápidas, já testada, será encaminhada para as equipes governamentais de serviços de extensão, para uma aplicação em escala mais ampla, e os artesãos locais serão instruídos nas técnicas de trabalhos de metal e de madeira, necessárias para a confecção de equipamento agrícola em cada localidade. Os núcleos de unidades de maquinaria agrícola criados dessa maneira deveriam oferecer boas perspectivas para o estabelecimento de um certo número de centros de desenvolvimento rural e estender suas operações para permitir a produção de um número maior de instalações de estocagem da colheita, processamento e outras formas de manufatura local.

Experiências no campo, demonstrações e o envolvimento dos interesses locais desde o início, são, na opinião do Grupo, partes essenciais do processo de disseminação de conhecimentos e de técnicas de baixo custo. Os programas em vista para o norte da Nigéria e Tanzânia (os quais, assim como os de Zâmbia, são orientados e apoiados pela base doméstica no Reino Unido) são muito similares, se bem que em ambos os casos muito trabalho já tenha sido realizado pelas agências governamentais, sobretudo quanto ao levantamento de necessidades específicas. Assim, a contribuição do Grupo pode concentrar-se no desenvolvimento de equipamentos, na promoção de seu uso e sua produção local.

5. A PEQUENA INDÚSTRIA

No princípio de 1969 foi formada uma unidade de coordenação industrial, com o propósito de associar projetos viáveis para o desenvolvimento industrial em pequena escala no além-mar, com tecnologias apropriadas adaptadas da indústria britânica. O terminal de além-mar desse projeto está na Nigéria, onde o engenheiro do Grupo identificou produtos e processos adequados para a manufatura local e estabeleceu uma pequena oficina para a execução de equipamento protótipo. A base doméstica está preparando uma série de perfis industriais, começando com trabalhos em madeira e metal, para prover um certo número de tecnologias de vários níveis de custo e de sofisticação técnica. Isto está sendo feito em colaboração com universidades, colégios técnicos, organizações de pesquisa industrial e firmas particulares. O trabalho da Unidade de Coordenação Industrial é um exercício prático de transferência de tecnologia. Este é um assunto sobre o qual a literatura está crescendo rapidamente. Muito é de natureza teórica, e a prática está mal dirigida e não alcança o objetivo, pois ocupa-se com o problema insolúvel de como transferir técnicas de produção em massa com as tecnologias capital-intensivas dos países ricos para os pobres. Certamente é mais prático e mais merecedor de atenção dos pesquisadores começar por considerar as necessidades dos países pobres, adaptar as tecnologias para essas necessidades e ajudar a introduzir técnicas novas.

No outono de 1970, o Grupo tinha entrevistado mais de 100 companhias do Reino Unido nos diversos ramos de engenharia, tecnologia alimentícia, couro, têxteis, etc, que demonstraram interesse em ajudar a desenvolver maquinaria e equipamento apropriados. O primeiro perfil industrial para fundição de ferro está quase terminado. Compreende, primeiro, um perfil da forma mais simples possível de fundição em cadinhos com aquecimento a carvão, que requer apenas mão-de-obra e muito pouco capital. Apresenta, em seguida, uma alternativa entre a fundição em cadinho tendo como combustível óleo ou coque; e, finalmente, uma unidade mais aprimorada para avaliar as possibilidades de expansão. Manuais de treina140 mento simples acompanharão esses perfis, bem como guias para as fontes de obtenção do equipamento.

Além de responder a mais de 200 pedidos de informações técnicas por ano, a Unidade está agora proporcionando orientação específica sobre a criação de indústrias - por exemplo, a instalação de produção em pequena escala de arame farpado, em Swaziland; produção especializada de janelas e portas metálicas na Nigéria e uma serraria em Botswana e está também aceitando encomendas de pesquisas e de trabalhos de desenvolvimento para ir de encontro a requisitos técnicos específicos. Um exemplo simples é o redesenho do equipamento utilizado para a pesagem de criancinhas nas áreas rurais da África Oriental. Um caso muito mais complexo, que surgiu em numerosos países africanos, exigiu o desenho completo e a fabricação de uma máquina protótipo para embalagem de materiais. Isto envolveu o trabalho da própria Unidade, do Royal College of Art, de Londres e do Department of Applied Physical Sciences na Universidade de Reading.

6. TECNOLOGIA ALIMENTÍCIA

No fim de 1970 o Grupo instalou uma Unidade de Tecnologia de Alimentos. Isto começou com a assistência a um projeto de armazenagem de arroz na Libéria e está agora continuando com a pesquisa e o desenvolvimento de um programa destinado à utilização mais eficiente dos alimentos tradicionais. Existem entendimentos para conduzir experiências de campo, num grupo de aldeias da Tanzânia. A base doméstica está no National College of Food Technology, em Weybridge, que providenciará pesquisa e instalações para o desenvolvimento técnico do projeto.

7. CONSULTORIA

Durante os últimos dois anos o Grupo assumiu o serviço de consultoria na África para a ILO, a United Nations Economic Comission for África (ECA) e a United Nations Industrial Development Organization (UNIDO). Esse serviço foi feito pelo ramo de consultoria do Grupo, Inter-Technology Services (ITS), uma subsidiária de propriedade do Grupo.

Na última parte de 1970, o Grupo ajudou a aparelhar uma missão a Botswana, Lesotho e Swaziland para investigar e relatar sobre pequenas empresas e empreendimentos inovatórios em desenvolvimento. Nessa atividade trabalhou em colaboração com o Research Institute for Management Science, Delft. Foi feito um pedido à ECA por Botswana, Lesotho e Swaziland para uma missão de especialistas que ajudasse a acelerar o desenvolvimento de empresas locais e na criação de empregos, particularmente para identificar as exigências industriais, de administração e treinamento necessários. O conjunto da equipe que esteve nesta missão publicou um relatório e espera-se que, ao completar suas recomendações, o Grupo possa formar relações estreitas com os programas de pequenas empresas que são assistidas pela ILO em Swaziland e que estão abrindo novas áreas no campo de transferência tecnológica.

A pedido da ECA e da UNIDO, o Grupo recentemente assumiu novas tarefas na África Ocidental. Uma está centralizada na Kumasi University of Science and Technology em Ghana, onde, durante os dois anos anteriores, um grupo da equipe universitária, já havia voluntariamente orientado e aconselhado o pequeno comércio local. A Universidade queria expandir esse serviço e a equipe do ITS trabalhou junto para investigar como um centro de consultoria tecnológica permanente poderia ser organizado e operado. O resultado imediato foi que um engenheiro experiente, um lente da School of Engineering Science da Universidade de Edinburgh e um membro do Grupo Energia foram enviados às custas do Inter-University Council para Kumasi, onde pemaneceram por seis meses, para auxiliar na instalação do novo centro.

Outra tarefa relacionava-se com a produção de equipamento hospitalar, manufaturado no local, no norte da Nigéria. O Grupo analisou a viabilidade técnica e econômica de instalar unidades de fabricação para o fornecimento de equipamento hospitalar em escala operacional nos estados do norte, e essas unidades estão sendo instaladas no momento. O objetivo do estudo de viabilidade foi de, em primeiro lugar, seguir de perto o trabalho já realizado no Instituto de Saúde, em Zaria, onde já se tinha obtido considerável progresso no desenho e na fabricação de equipamento hospitalar no local.9 9 Um relatório deste trabalho está no ITDG. Boletim n.º 4. London, Feb. 1969.

Verificou-se que havia um crescente potencial de mercado para produtos de boa qualidade feitos no local. Sua fabricação foi alentada pelas autoridades federais e estatais como meios de promover a substituição de produtos importados, dando oportunidade à participação local no desenvolvimento industrial e fazendo uma contribuição importante à criação de empregos.

No estudo dessa indústria especificamente considerou-se o treinamento de pessoal de gerência e de outras funções, métodos de projeção e de produção e os aspectos vitais de financiamento e marketing locais. As pesquisas mostraram que já existia um bom potencial a esse respeito e que, com ajuda técnica inicial para a instalação de unidades de produção, poderia desenvolver-se no local uma pequena indústria viável. Considerou-se importante que esta deveria ser iniciada no nível dos conhecimentos e qualificações técnicos financeiros já existentes no país, atualmente. Na medida em que se desenvolveram a habilidade e a competência do pessoal por meio de experiência e treinamento, podiam encarar-se empreendimentos, sempre em pequena escala, mais ambiciosos. O método de instalar e desenvolver uma indústria dessas é tão importante quanto o know-how técnico e o financiamento, e essa iniciativa poderá tornar-se o protótipo para muitos outros empreendimentos.

Esse tipo de empreendimento encoraja o máximo uso de materiais, mão-de-obra e recursos financeiros locais num programa tão necessário de auto-ajuda e de desenvolvimento industrial em pequena escala, que está sendo elaborado para os seis estados do norte, para os quais o estudo de viabilidade foi encomendado. Todavia, seus resultados podem também ser relevantes para situações semelhantes em outros países em desenvolvimento.

O trabalho feito em colaboração com a ILO resultou na instalação de dois postos-chave de tecnologia intermediária na Tanzânia (financiados pela ILO) : um para um oficial técnico ligado à Tanzanian Agricultural Machinery Testing Unit, e outro para um oficial de ligação permanente entre o Grupo e o governo da Tanzânia.

8. GRUPOS DE TRABALHO E DOCUMENTAÇÃO

Os programas de pesquisa e desenvolvimento do Grupo dependem de verbas e doações fornecidas por organizações de assistência e caridade. As atividades descritas acima conseguiram, todas, verbas de curto prazo dessas fontes. Mesmo outras equipes que ainda não receberam assistência financeira já produziram trabalho valioso. Assim o Grupo Energia, criado para investigar e produzir dados sobre fontes simples de energia, já publicou uma bibliografia detalhada sobre um motor de combustível múltiplo.10 10 ITDG. Sterling engine bibliography. London, 1971. Pretende produzir um perfil de pequenas fontes de energia já existentes, analisar suas capacidades técnicas e tipos de utilização para os quais são apropriadas e depois investigar especificamente fontes de energia derivada do vento, da água e da luz solar. A distribuição desigual no mundo de recursos comercialmente aproveitáveis de carvão e óleo e a não muito distante escassez de óleo11 11 O presente trabalho foi publicado em 1972 - um ano antes da "crise de petróleo" (N. do T.). (mesmo na razão do consumo atual), tornam muito importante a tarefa de estudar meios simples, baratos e em pequena escala de utilização inconvencional (mas permanente e não-poluente) das fontes de energia. Aqui outra vez - e isto vale para todo o campo de tecnologia intermediária - o Grupo decididamente não preconiza a volta para a maquinaria do século XIX; a necessidade é de incorporar a ciência e a tecnologia modernas nos métodos, que podem ter origem em princípios antigos, mas surgem como técnicas novas quanto à qualidade e ao desempenho.

Como exemplo do tipo de problema apresentado ao Grupo Energia, este foi recentemente solicitado a encontrar ou projetar um método de processamento de cana na Nigéria do Norte (excluíram-se terminantemente máquinas operadas com óleo diesel) para substituir o equipamento primitivo movido por animais, que ainda está sendo usado atualmente. Para esses problemas pode haver uma solução relativamente simples - alguma coisa apropriada já pode existir - mas também pode exigir bastante trabalho de projeção e fabricação no Reino Unido antes que se possam fazer experiências no campo.

A Equipe Cooperativas está pesquisando meios pelos quais elas podem funcionar mais eficientemente, especialmente porque elas mesmas são veículos para a modificação e inovação rural. Recentemente ela completou uma série de três manuais sobre métodos de contabilidade simples para cooperativas. O primeiro deles,12 12 ITDG. Thrift and credit co-operatives. London Overseas Development Administration, 1970. publicado pela Overseas Development Administration em 1970, trata de cooperativa de poupança e de crédito e suscitou grande interesse nos países africanos.

A Equipe de Saúde Rural, estabelecida para pesquisar meios eficientes de levar cuidados médicos à população rural nos países em desenvolvimento, produziu seu primeiro trabalho de documentação sobre mão-de-obra sanitária e as funções do auxiliar médico.13 13 Idem. Health manpower and the medical auxiliary. London, 1971. Este inclui a primeira bibliografia jamais publicada sobre o assunto, e o texto, escrito por três membros do Grupo, é um manual sobre as vantagens econômicas e médicas do auxiliar de medicina. Tomando como exemplo os dados de muitos países africanos, bem como de outras partes do mundo em desenvolvimento, mostra que os sistemas de cuidados médicos nos países ricos não servem de modo algum para as necessidades e os recursos dos países em desenvolvimento e descreve uma alternativa que é mais barata e eficiente.

Outras equipes, cujo trabalho será importante para as necessidades da África Rural e que ainda estão no estágio de formação ou começando a delinear suas tarefas, são aquelas dedicadas às atividades femininas, à educação, ao florestamento e aos produtos florestais.

O método de operação em equipes está sendo muito bem sucedido como meio de reunir os três elementos suscetíveis de ser influenciados pelo trabalho de: a) identificar as brechas que podem ser preenchidas pela tecnologia intermediária; b) de reunir os dados práticos necessários ; c) de promover testes de campo para demonstrar seu uso. Chamamos de ABC de desenvolvimento os administradores, a comunidade de negócios e os comunicadores ou a fraternidade acadêmica. Na rotina convencional de projetos de assistência e de pesquisas associadas, esses três elementos raramente ou nunca trabalham em colaboração. Acreditamos que o trabalho das equipes, multiplicado e ampliado, poderá reerguer a presente falta de equilíbrio em pesquisa e desenvolvimento, pela qual uns 95% dos esforços envidados nesse sentido no mundo todo beneficiam apenas os países ricos.

Uma atividade importante de apoio foi recentemente iniciada pelo Grupo e consiste na implementação de projetos para estudantes. Esses foram iniciados principalmente em resposta ao crescente interesse demonstrado por estudantes e por professores universitários, para empreender atividades que poderiam ser de utilidade para o mundo em desenvolvimento. Por intermédio desses projetos o Grupo espera alargar consideravelmente o alcance de informação técnica disponível para experiências no campo e documentação ulterior.

Todas as equipes mencionadas foram criadas e seu trabalho formulado nos últimos três anos. Suas experiências demonstraram que a brecha em informação a ser preenchida é muito grande. A necessidade para informações sobre técnicas simples pode ser encarada como existente nos três níveis seguintes, uitlizados pelo Grupo como orientação geral, se bem que, obviamente, até mesmo esses critérios amplos têm que ser modificados de acordo com a situação real:

1. Indústria caseira: recursos locais, ferramentas manuais, membros da família, empregos com remuneração de até £ 20, artigos feitos manualmente para uso local.

2. Indústria em aldeias: mais caracterizada por atividades comunitárias, pequenos grupos de artesãos, cooperativas, termos técnicos básicos que podem ser traduzidos para o vernáculo, materiais adquiridos no local, maquinaria manual e simples, remuneração de até £ 100 por emprego, produção para a localidade e comunidades vizinhas.

3. Pequena indústria: companhias locais, cooperativas maiores, terminologia técnica normal, material local ou importado, maquinaria movida por energia, mão-de-obra relativamente qualificada, remuneração de até £ 500 por emprego, produtos industriais para mercados distritais ou nacionais.

Tendo em mente essas categorias, os planos para documentação do Grupo visam, de modo geral, o seguinte:

a) perfis técnicos que cobrem uma gama de escolhas tecnológicas nas categorias intermediárias, até o nível da pequena indústria. Esses perfis destinam-se aos departamentos de indústria, planejadores governamentais, agências internacionais. Fornecerão um esquema dos investimentos e das operações necessárias, digamos, para as três categorias acima, ilustrando as opções técnicas à disposição de cada uma;

b) manuais de instrução, contendo a informação detalhada (inclusive desenhos técnicos) e necessária para pôr em prática as opções disponíveis;

c) listas e catálogos de equipamentos nas categorias intermediárias. Podem ser catálogos de equipamento disponível comercialmente ou de equipamentos e ferramentas produzidos no local;

d) bibliografias explicativas sobre a aplicação de tecnologia intermediária em assuntos como água e saúde rural;

e) projetos especiais, cujos relatórios forneçam instruções, passo a passo, de técnicas particulares para demonstração no campo.

9. CONCLUSÃO

A importância da escolha tecnológica, mais particularmente a necessidade de tornar tecnologias de baixo custo mais acessíveis, está lentamente penetrando na consciência e nas mentes de economistas e planejadores de desenvolvimento. Parece haver quatro estágios no processo, julgando pelas reações ao trabalho do Grupo de Desenvolvimento de Tecnologia Intermediária: a) uma reação negativa à idéia; b) em voga agora, grande aceitação, mas com pouco apoio ou ação programada; c) engajamento ativo em escala considerável para a mobilização do conhecimento e de opções tecnológicas; d) a aplicação prática e ativa desses conhecimentos, novamente em escala considerável.

Existem sinais esperançosos no horizonte. O fato de que empregos são necessários aos milhões no mundo em desenvolvimento é agora de conhecimento universal. A questão inevitável de quanto pode ser despendido para providenciar cada emprego, quando são precisos milhões, logo terá que merecer a mesma atenção. Existem programas extensivos de agências internacionais para encontrar métodos trabalhointensivos para obras públicas. Estes são importantes não apenas em si, mas também pelas oportunidades que podem apresentar - aumentando a renda rural - de servir também para outros tipos de empregos rurais. Existem núcleos de ação crescentes em alguns países para a obtenção de tecnologias de baixo custo, aos quais já nos referimos. A única crítica que pode ser feita aos esforços do Grupo para preencher as brechas tecnológicas é que são feitos em escala pequena demais em relação às necessidades. Representam uma fração insignificante no total de ajuda despendida. (O orçamento do Grupo é de mais ou menos £ 3 000 por mês, além de aproximadamente £ 70 000 por ano para projetos no campo - menos do que 1/20 de 1% do montante gasto em assistência pelo Reino Unido.) Entretanto, a não ser que o trabalho prático e útil seja ampliado, intensificado e multiplicado rapidamente, não haverá muita esperança para os pobres e desempregados; e talvez, tampouco, para os ricos.

10. NOTA SUPLEMENTAR SOBRE DOCUMENTAÇÃO

Além das publicações mencionadas, o Grupo produziu a seguinte documentação a respeito de seu projeto "Construção para o desenvolvimento".

The Nigerian building contractor: practices, problems and needs; An educational strategy for the Nigerian building contractor; Construction and reconstruction: towards a policy for the Nigerian construction industry contractor development: report of the Conference on the Training of Nigerian Building Contractors; A management handbook for the Nigerian building Contractor; The Kenyan building contractor: practices, problems and needs; Bradford Seminars I and II (report on the study seminars on the construction industry held at the University of Bradford's Centre for Project Planning for Developing Countries).

Teaching manuals for the construction industry (in five kits): How to decide business policy; How to do accouting; Contracting and the client; How to estimate and tender; Planning for the contractor.

A lista seguinte de especificações técnicas fornecidas pelo Grupo de várias fontes do projeto de campo em Zâmbia dá uma idéia de seus serviços de documentação:

Indian standards: 3-tined cultivator, animal-drawn (S:3342); V-brade hand-hoe (IS:3185); Soil-scoop, animal-drawn (IS:3360); Single-row cotton seed drill, animal-draw (IS:3310).

Do Centro de Desenvolvimento Industrial na Nigéria (os números entre parênteses referemse a relatórios especiais do IDC) : The plough bolt (70-6); Blacksmith entrepreneurs and their capabilities; The IDC singletree (70-5); The IDC single ox-yoke (70-4); The IDC Clarkson ox-yoke (69-3.1); The IDC Bornu groundnut lifter (69-5).

De outras fontes: Workshop designs; Hand and workshop tool lists; East Áfrican timbers list; Blacksmith's hearth, COSIRA design; Blacksmith's forge, Pearson design; Home-made anvil; "Thought starters" on welded design; Steel fabricated vee pulleys; Manufacture of harrow tines; All-welded steel vice; All-welded M.S. vice; VITA footpowered wood lathe; Drawings and specifications - "Animal-drawn equipment and basic tools for farmers, suitable for local construction"; The Samaru bicycle cart; The Samaru ox-cart; The Shinyanga lift pump; Chitedze multipurpose ox-drawn tool bar; Hand-operated flap-valve water pump; Animal-drawn tool bar. Technical drawings of animal-cart wheel and axle jig assembly, universal welding jig, ploygbshare welding jig.

  • 1 O autor achou oportuno publicar este artigo na International Labour Review, pois a ILO preocupa-se mais com pessoas do que com os equipamentos de produção em massa; porque constantemente advoga e promove programas para a criação de empregos em países em desenvolvimento; porque, enfim, foi um dos primeiros a reconhecer a significância das idéias defendidas pelo ITDG, desde a criação desse Grupo. Ver, por exemplo, Marsden, Keith. Towards a synthesis of economic growth and social justice. international Labour Review, v. 100, n. 5, Nov. 1969.
  • 6 ITDG. Bibliografia sobre tecnologias de água de baixo custo. London, 1970.
  • 7 ITDG. A introdução de tanques de captação de água pluvial a micro-irrigação em Botswana. London 1969.
  • 10 ITDG. Sterling engine bibliography. London, 1971.
  • 12 ITDG. Thrift and credit co-operatives. London Overseas Development Administration, 1970.
  • *
    Original em inglês publicado na International Labour Review, v. 16, n. 1, July 1972.
  • 1
    O autor achou oportuno publicar este artigo na
    International Labour Review, pois a ILO preocupa-se mais com pessoas do que com os equipamentos de produção em massa; porque constantemente advoga e promove programas para a criação de empregos em países em desenvolvimento; porque, enfim, foi um dos primeiros a reconhecer a significância das idéias defendidas pelo ITDG, desde a criação desse Grupo. Ver, por exemplo, Marsden, Keith. Towards a synthesis of economic growth and social justice.
    international Labour Review, v. 100, n. 5, Nov. 1969. Progressive technologies for developing countries, ibid. v. 101, n. 5, May 1970.
  • 2
    Ver, também
    Social and economic problems calling for the development of intermediate technology. Este trabalho e outro material básico foi incorporado num
    IT Kit, que pode ser obtido nos escritórios centrais do ITDG.
  • 3
    Isto é, o custo de equipar um operário, excluindo o custo da terra e dos edifícios.
  • 4
    Por exemplo: o projeto de equipamento agrícola está alocado no National College of Agricultural Engineering, Silsoe; a tecnologia alimentícia no National College of Food Technology, Weyebridge. Outras pesquisas são feitas pelo Department of Applied Physical Sciences, University of Beading e o Boyal College of Art.
  • 5
    Assim como as Nações Unidas e suas agências especializadas estão localizadas em Genebra, Nova York, Roma e outras metrópoles. A necessidade de descentralizar suas atividades, uma vez constituídos os quadros de especialistas e os conhecimentos relevantes, reforça o argumento.
  • 6
    ITDG.
    Bibliografia sobre tecnologias de água de baixo custo. London, 1970.
  • 7
    ITDG.
    A introdução de tanques de captação de água pluvial a micro-irrigação em Botswana. London 1969.
  • 8
    Ver a nota suplementar sobre documentação no fim deste artigo.
  • 9
    Um relatório deste trabalho está no ITDG.
    Boletim n.º 4. London, Feb. 1969.
  • 10
    ITDG.
    Sterling engine bibliography. London, 1971.
  • 11
    O presente trabalho foi publicado em 1972 - um ano antes da "crise de petróleo" (N. do T.).
  • 12
    ITDG.
    Thrift and credit co-operatives. London Overseas Development Administration, 1970.
  • 13
    Idem.
    Health manpower and the medical auxiliary. London, 1971.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 1974
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