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A capacidade transformativa do governo federal brasileiro na construção de uma burocracia da assistência social nos municípios

Resumo

O artigo analisa a capacidade transformativa do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) de moldar mudanças estruturais nos municípios brasileiros. O estudo baseia-se nos conceitos de aprendizagem organizacional e institucional e em uma combinação de categorias analíticas da abordagem neoinstitucional e dos meios tradicionais de controle governamental. Utiliza-se de process tracing, de entrevistas em profundidade e de análise documental das normativas, decretos e resoluções que criam incentivos diretos e indiretos para adesão e pactuação dos municípios. Identificamos dois mecanismos causais importantes, processos de aprendizagem organizacional e institucional e cooperação interfederativa que, em conjunto, geraram mudanças significativas na capacidade burocrática municipal. Os resultados mostram a importância da capacidade de transformação da União no processo de descentralização das políticas públicas no Brasil.

Palavras-chave:
bem-estar social; capacidade burocrática municipal; capacidade do Estado; políticas públicas.

Abstract

The article analyzes the transformative capacity of the Ministry of Social Development and Fight against Hunger (MDS) in shaping structural change in Brazilian municipalities. The study is based on the concepts of organizational and institutional learning, on a combination of analytical categories of the institutional and neo-institutional approaches and on traditional means of government control. As for methodology, this study used process tracing, in-depth interviews, and documentary analysis of regulations, decrees, and resolutions that create direct and indirect incentives to induce agreements and cooperation of municipalities with the Ministry. We identified two important causal mechanisms: a) organizational and institutional learning processes; and b) inter-federative cooperation that, combined, generated significant changes in municipal bureaucratic capacity. The findings show the importance of the Union’s transformative capacity in the process of public policy decentralization in Brazil.

Keywords:
social welfare; municipal bureaucratic capacity; state capacity; public policy

Resumen

El artículo analiza la capacidad transformadora del Ministerio de Desarrollo Social y Lucha contra el Hambre (MDS) en la conformación del cambio estructural en los municipios brasileños. El estudio se basa en los conceptos de aprendizaje organizacional e institucional y en una combinación de categorías analíticas del enfoque nuevo institucionalismo y los medios administrativos de control gubernamental. Mediante el uso de rastreo de procesos, entrevistas en profundidad y un análisis documental de reglamentos, decretos y resoluciones fueran analizados incentivos directos e indirectos para la firma y acuerdo de los municipios. Identificamos dos importantes mecanismos causales, el aprendizaje organizacional e institucional y la cooperación inter-federativa que, combinados, generaron cambios significativos en la capacidad burocrática municipal. Los resultados demuestran la importancia de la capacidad transformadora de la Unión en el proceso de descentralización de las políticas públicas en Brasil.

Palabras clave:
bienestar social; capacidad burocrática municipal; capacidad del Estado; política pública

1. Introdução

A política de assistência social, instituída na Constituição Federal de 1988 (CF-88) e que se efetiva por meio de transferências monetárias diretas aos cidadãos e de serviços socioassistenciais que devem ser ofertados, principalmente, pelo nível municipal de governo, nos parece propícia para compreender a capacidade do governo federal brasileiro de induzir a construção de uma burocracia no nível municipal. Por um lado, os dados existentes apresentam um expressivo crescimento tanto das ofertas de serviços e benefícios como dessa burocracia com a contratação de mais de 100 mil servidores diretos em menos de cinco anos. De outro lado, a literatura aponta para a relevância da centralização da autoridade normativa no nível federal, no Brasil, Estado federativo marcado por desigualdades nos governos subnacionais, especialmente os locais (Arretche, 2012ARRETCHE, Marta. Democracia, federalismo e centralização no Brasil. Rio de Janeiro: Press Fiocruz, 2012.:174). Questionamos se os resultados apresentados pela política, no que se refere à construção da estrutura burocrática no nível local bem como dos equipamentos públicos para a oferta dos serviços, estariam associados à capacidade do governo federal de induzir a construção dessa burocracia. Haveria uma efetiva capacidade transformativa daquele governo incidindo nos municípios e, portanto, na capacidade do nível subnacional de ofertar essa política? Tendo essa questão em mente, nosso objetivo foi analisar o papel da União, especificamente do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), na indução da criação de uma burocracia local que permitisse promover a institucionalização da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), considerando sua autoridade normativa, os recursos administrativos de que dispunha e os pactos formulados entre os entes federados.

Trabalhamos com a hipótese de que a capacidade transformativa do MDS ocorreu por um processo incremental, que denominamos de aprendizagem organizacional, tanto do seu próprio aparato burocrático como das estratégias administrativas para a indução de municípios à ação, com a produção de normas específicas associadas a incentivos financeiros. Essa capacidade transformativa foi potencializada pelos pactos firmados entre os entes federados nos espaços de coordenação federativa da política (Conselho Nacional de Assistência Social — CNAS e Comissão Intergestores Tripartite — CIT), onde eram estabelecidos as metas e os meios para alcançá-las, nesse caso, em um processo de aprendizagem institucional.

Essa hipótese é sustentada por uma combinação teórica que, de um lado, considera o clássico meio de controle da administração pública pela imposição de normas, uso de estruturas hierarquizadas e procedimentos padronizados e, de outro lado, aporta o uso de espaços deliberativos como meio para a formulação de pactos federativos que visam à implementação da política de forma coordenada (Evans, 2002EVANS, Peter B. Hybridity as an administrative strategy: combining bureaucratic capacity with market signals and deliberative democracy. In: CONGRESO INTERNACIONAL DEL CLAD SOBRE LA REFORMA DEL ESTADO Y DE LA ADMINISTRACIÓN PÚBLICA, 7., 2002. Anais… Lisboa: Clad, 2002.). Considerando o legado inexistente (naquele momento) de estruturas estatais no nível local para a prestação de serviços socioassistenciais e de transferências monetárias, bem como a baixa capacidade burocrática da maior parte dos 5.570 municípios brasileiros, a estruturação dessa burocracia só foi possível a partir de uma sinergia entre o modelo clássico e o espaço deliberativo de pactuação dos entes federados (Evans, 2002).

Esse estudo de caso se estruturou pelo uso de process tracing (Beach e Pedersen, 2013BEACH, Derek; PEDERSEN, Rasmus Brun. Process-tracing methods: foundations and guidelines. Ann Arbor: University of Michigan Press, 2013.; Bennett e Checkel, 2014BENNETT, Andrew; CHECKEL, Jeffrey T. Process tracing. Cambridge: Cambridge University Press, 2014.), uma vez que ele permite a identificação e a análise dos mecanismos causais possibilitando a inferências das ligações entre ações e reações, ou seja, dos elos causais existentes entre a produção das normas e dos pactos e a construção da estrutura burocrática municipal. As evidências levantadas para tal análise focaram o período de 2004 a 2012 e foram coletadas por meio de análise documental de sete leis, quatro decretos, 236 portarias, duas normativas, 141 resoluções da CIT e cinco resoluções do CNAS, bem como de relatórios de monitoramento do MDS, além de entrevistas em profundidade. Esses documentos permitem observar a criação de incentivos diretos e indiretos de adesão e de pactuação dos municípios a metas nacionais que não necessariamente eram as suas, bem como o efeito desses incentivos na construção de uma burocracia própria.

Inicialmente apresentamos, brevemente, algumas reflexões teóricas que nos fornecem o marco analítico e orientam a análise dos dados. Em seguida, analisamos o aprendizado organizacional do MDS e sua capacidade de induzir a ação de outro ente federativo. Logo depois, analisamos os resultados das pactuações e as ações que mostram a aprendizagem institucional ocorrida na troca entre MDS e espaços deliberativos e, por fim, apresentamos nossas considerações sobre o processo analisado.

2. Capacidades estatais e aprendizados organizacional e institucional: reflexões teóricas

As capacidades estatais variam no tempo e no espaço (Gomide, 2016GOMIDE, Alexandre A.; BOSCHI, Renato R. Capacidades estatais em países emergentes: o Brasil em perspectiva comparada. Rio de Janeiro: Ipea, 2016.) e funções diferentes do Estado demandam a mobilização de capacidades distintas — provisão de bem-estar social demanda habilidades diversas daquelas requeridas para gerar superávit, por exemplo (Hanson e Sigman, 2011 apud Cingolani, 2013CINGOLANI, Luciana; THOMSSON, Kaj; CROMBRUGGHE, Denis. Minding Weber more than ever? The impacts of state capacity and bureaucratic autonomy on development goals. UNU-Merit Working paper series. 2013. Available at:<Available at:https://cris.maastrichtuniversity.nl/portal/en/publications/minding-weber-more-than-ever-the-impacts-of-state-capacity-and-bureaucratic-autonomy-on-development-goals(09f0b131-84a9-47f4-820c-b193090f518c)/export.html >. Accessed on: 23 Jan. 2015.
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). A multidimensionalidade do conceito e sua relação com as diversas funções estatais ampliam sobremaneira seu alcance, o que é pouco útil para a análise (Weiss, 1999WEISS, Linda. The myth of powerless state. London: Great Britain: Polity Press, 1999.), fazendo com que um conceito amplo como este se constitua num background conceitual, sendo necessário optar por um conceito sistematizado, mais restrito, para que os estudos sejam operacionalizáveis (Adckok e Collier, 2001ADCOCK, Robert; COLLIER, David. Measurement validity: a shared standard for qualitative and quantitative research. American Political Science Association, v. 95, n. 3, p. 529-546, 2001.). Há autores que mostram como sua operacionalização tem sido mais difícil do que o robustecimento no âmbito conceitual (Enriquez e Centeno, 2012ENRIQUEZ, Elaine; CENTENO, Miguel Angel. State capacity: utilization, durability, and the role of wealth vs. history. International and Multidisciplinary Journal of Social Sciences, v. 1, n. 2, p. 130-62, 2012.). Não se pode falar, portanto, de capacidade do Estado em geral, mas em arenas ou dimensões específicas desta capacidade (Weiss, 1999WEISS, Linda. The myth of powerless state. London: Great Britain: Polity Press, 1999.:4; Cárdenas et al., 2015CÁRDENAS, Mauricio et al. Capacidades estatales. Diez textos fundamentales. Buenos Aires: CAF - Banco de Desarrollo de América Latina, 2015. (Série: Estado, Gestión Pública y Desarrollo en América Latina).). Aqui, optou-se por utilizar o conceito de capacidade estatal em duas dimensões: uma relacionada com a variável dependente e outra com os processos, os mecanismos (que são o nosso foco) para se chegar à primeira. Vejamos.

No contexto brasileiro, a execução de políticas sociais foi descentralizada para municípios que apresentam diferentes níveis de capacidade administrativa, mas que devem igualmente organizar e ofertar serviços sociais públicos, conforme padrão estabelecido nacionalmente. Além disso, estabeleceu-se certa concentração da autoridade normativa na União (Arretche, 2012ARRETCHE, Marta. Democracia, federalismo e centralização no Brasil. Rio de Janeiro: Press Fiocruz, 2012.). Há que se considerar que a autonomia política dos municípios não necessariamente corresponde à sua capacidade real de formular e de implementar políticas públicas, na medida em que pode não haver capacidade administrativa, nem orçamentária, nem fiscal para tal no nível municipal (Arretche, 2012ARRETCHE, Marta. Democracia, federalismo e centralização no Brasil. Rio de Janeiro: Press Fiocruz, 2012.; Pierson, 1996PIERSON, Paul. The new politics of the welfare state. World politics, v. 48, p. 143-179, 1996.; Evans et al., 1985).

Nessas condições, defendemos que o estudo sobre capacidade estatal municipal, ou mesmo um conceito mais restrito como o de capacidade burocrática municipal, deve levar em conta a análise da capacidade transformativa do governo federal, entendida como seu potencial de mobilizar consentimento e de institucionalizar a cooperação, mas também a relação entre os entes federados. O termo “capacidade transformativa” foi inicialmente cunhado por Evans (1995EVANS, Peter B. Embedded autonomy: states and industrial transformation. Chichester, West Sussex: Princeton University Press, 1995.) para explicar o papel dos Estados recém-industrializados em moldar mudanças estruturais, ocorridas na economia e na industrialização, e que favoreceram o desenvolvimento industrial. Esse conceito foi sendo aperfeiçoado posteriormente, pelo próprio autor, mas também por outros, como Weiss (1999WEISS, Linda. The myth of powerless state. London: Great Britain: Polity Press, 1999.). Concordamos com Evans (1995) e Weiss (1999), que defendem que o nível de intervenção do Estado por si só não é informativo de seu poder, mas sua capacidade transformativa o é (Cingolani, Thomsson e Crombrugge, 2013CINGOLANI, Luciana; THOMSSON, Kaj; CROMBRUGGHE, Denis. Minding Weber more than ever? The impacts of state capacity and bureaucratic autonomy on development goals. UNU-Merit Working paper series. 2013. Available at:<Available at:https://cris.maastrichtuniversity.nl/portal/en/publications/minding-weber-more-than-ever-the-impacts-of-state-capacity-and-bureaucratic-autonomy-on-development-goals(09f0b131-84a9-47f4-820c-b193090f518c)/export.html >. Accessed on: 23 Jan. 2015.
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).

Weiss, ao distinguir capacidade transformativa e intervenção, considera que a primeira é a capacidade de coordenar mudanças, a segunda não necessariamente as induz. Os agentes de um Estado transformativo buscam dar forma e coordenar recursos num amplo espectro, tendo o papel central de “orquestrar cooperação dos principais parceiros organizados e coordenar recursos essenciais para a barganha” (Weiss, 1999WEISS, Linda. The myth of powerless state. London: Great Britain: Polity Press, 1999.:14). Sua capacidade transformativa inclui prover infraestrutura, socializar os riscos e encorajar a cooperação.

Por sua vez, em Estados democráticos e federativos, nos quais políticas são implementadas descentralizadamente e os parceiros são entes federados autônomos, com competências comuns e complementares, a capacidade transformativa não se sustenta apenas pela utilização de estratégias de controle próprias do modelo clássico de administração, baseado na imposição de normas, no uso de estruturas hierarquizadas e em procedimentos padronizados. Faz-se necessária a institucionalização de processos democráticos de decisão pública, dos quais participem atores que possam também controlar a alocação de recursos públicos (Evans, 2002EVANS, Peter B. Hybridity as an administrative strategy: combining bureaucratic capacity with market signals and deliberative democracy. In: CONGRESO INTERNACIONAL DEL CLAD SOBRE LA REFORMA DEL ESTADO Y DE LA ADMINISTRACIÓN PÚBLICA, 7., 2002. Anais… Lisboa: Clad, 2002.). Esses processos deliberativos dão a sustentação política necessária para que ocorra a cooperação e para que sejam formuladas e implementadas as medidas administrativas que incidem nos entes federados.

Ademais, a dinamicidade da política e da conjuntura na qual ela se realiza enuncia que a capacidade transformativa do Estado depende de um conjunto de instrumentos que devem estar em constante mudança e adequação, pois novas questões pedem novas ferramentas, ou seja, escopo e alvos devem ser redefinidos para serem compatíveis com o contexto dinâmico (Weiss, 1999WEISS, Linda. The myth of powerless state. London: Great Britain: Polity Press, 1999.:8). Portanto, a capacidade transformativa está relacionada com o aprendizado institucional e o aprendizado organizacional, que ocorrem de maneira incremental, na maior parte do tempo, e que possibilitam ajustes na própria política. A aprendizagem se constitui por meio de interação e de desenvolvimento do conhecimento no contexto em curso, ou seja, é processo interativo entre atores inseridos em determinados arranjos institucionais (North, 1990NORTH, Douglass C. Institutions, institutional change and economic performance (political economy of institutions and decisions). Cambridge: Cambridge University Press, 1990.; Morgan, 1997MORGAN, Kevin. The learning region: institutions, innovation and regional renewal. Regional Studies, v. 31, p. 491-503, 1997.). Para Van Brabant (1997VAN BRABANT, Koenraad. Organisational and institutional learning in the humanitarian sector: opening the dialogue. Active Learning Network on Accountability and Performance in Humanitarian Action. 1997. Available at:<Available at:http://www.alnap.org/pool/files/kvblearn.pdf >. Accessed on: 15 Nov. 2015.
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:2), a aprendizagem organizacional se diferencia da institucional, uma vez que a primeira “refere-se a um processo coletivo dentro de uma organização” e a segunda refere-se a um aprendizado observável num sistema mais amplo, entre agências distintas. Esse aprendizado é incremental na medida em que novos conhecimentos são gerados a partir daqueles adquiridos e testados nas interações ocorridas anteriormente, seja internamente nas organizações, seja entre instituições.

3. Metodologia

A abordagem metodológica do rastreamento do processo permite a análise de mecanismos causais e essa é nossa principal contribuição: a primeira foi sobre os vínculos causais entre a produção de regulamentos e os atos administrativos e as mudanças na estrutura burocrática municipal, e a segunda foi sobre a relações federativas e sua importância para esse processo.

Basicamente, rastreamos a construção da burocracia municipal observando a instalação de equipamentos públicos e a contratação de recursos humanos nos municípios e os fatores que determinaram isso. A hipótese é que esse processo é um efeito da capacidade de transformação do MDS, bem como da cooperação interfederativa. Como visto, a literatura sugere que as aprendizagens organizacional e institucional são mecanismos centrais para explicar esse processo, na medida em que descobrem as interações que moldaram as decisões.

Para alcançar o objetivo proposto, a análise foi realizada em dois momentos: uma observando evidências internas do MDS e sua relação com os municípios e outra, a evidência de observação das interações entre as entidades federativas. Para o primeiro, foram analisados três fatores: a estruturação de uma burocracia federal, as aprendizagens organizacional e institucional dessa burocracia e sua relação com outros órgãos bem como os incentivos indutivos por decretos e decretos capitaneados pelo MDS. Analisamos cada um desses fatores como condição necessária para a instalação de equipamentos públicos e para a contratação de recursos humanos nos municípios. O segundo mecanismo causal tem foco na relação interfederativa necessária na política de assistência social brasileira. Assim, observamos várias evidências de acordos e cooperação na CIT, a arena política onde os convênios são feitos. Lá, os acordos com os municípios, por um lado, e a conexão entre a burocracia do SNAS com o CIT, por outro, estavam ligados aos efeitos sobre a instalação de equipamentos públicos e a contratação de recursos humanos nos municípios.

A evidência levantada para esta análise centra-se no período de 2004 a 2012 e é coletada por meio de análise documental de sete leis, quatro decretos, 236 portarias, dois regulamentos, 141 resoluções do CIT e cinco resoluções do CNAS, além dos relatórios de monitoramento do MDS e entrevistas em profundidade. Esses documentos nos permitem observar a criação de incentivos diretos e indiretos para a assinatura e acordo dos municípios com metas nacionais que não eram necessariamente as suas e o efeito desses incentivos na construção de suas próprias burocracias.

Classificamos as resoluções por natureza: as relacionadas com o PBF, com o CadÚnico, com o financiamento, com a integração entre transferência de renda e serviços, e com outras questões, mostrando sua distribuição ao longo do tempo, correlacionando-se com a contratação de recursos humanos nos municípios. No entanto, é importante ressaltar que apenas a análise documental não permitiria a conexão de todos os elos da cadeia. As entrevistas com quem ocupou posições estratégicas na Senarc e na SNAS foram essenciais para o processo e o rastreamento de mecanismos porque preencheram lacunas informativas.

Finalmente, o Diagrama de Venn foi usado com o objetivo explícito de representar cada um desses fatores como condição necessária ou suficiente, mostrando a equifinalidade desse processo; não houve nenhum fator que tenha se apresentado sozinho como condição suficiente. A condição suficiente foi devido à sequência e conjunção de fatores.

4. A capacidade burocrática construída nos municípios

A organização federativa brasileira e o processo de descentralização na área indicaram o nível municipal de governo como o responsável pela prestação dos serviços socioassistenciais, mas a estrutura municipal não estava preparada para assumir essas funções. De que estamos falando? Qual é o fenômeno a que os processos analisados estão levando? Num período de 10 anos, uma mudança muito significativa ocorreu e aponta para uma efetiva construção de estrutura administrativa e burocrática no nível local na área de assistência social. Essa é a base do que estamos chamando de capacidade e será aqui tratada pelo número de funcionários que se distribuem em equipamentos públicos (e também a construção dos próprios equipamentos) que prestam serviços socioassistenciais. Essa contratação de pessoal e instalação e montagem de equipamentos públicos são, portanto, a expressão do que chamamos de estrutura burocrática dos municípios, utilizada como proxy do conceito de capacidade burocrática a que nos referimos.

Os dados impressionam: até 2004, quando entra um novo governo de esquerda e instala-se o MDS, não havia unidades físicas públicas específicas e apropriadas para a oferta da assistência social, bem como não havia recursos humanos estatais correspondentes. Em 2013 já havia 7.883 Centros de Referência da Assistência Social (Cras) em 5.394 municípios com 75.241 trabalhadores, 2.249 Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) com 20.938 trabalhadores e 131 Centros de Atendimento à População de Rua (Centros POP) com 1.914 trabalhadores, totalizando 98.093 trabalhadores responsáveis pela entrega de serviços socioassistenciais. Além desses, havia os que exerciam funções de gestão e/ou administrativas e os que trabalhavam em unidades de acolhimento, somando 245.239 trabalhadores lotados em secretarias municipais de assistência social. O gráfico 1 mostra essas contratações no tempo.

Gráfico 1
Número de trabalhadores por equipamentos da assistência social

Além disso, em 2013, 99,7% dos municípios operavam o Cadastro Único, instrumento de identificação de famílias em situação de vulnerabilidade de renda que demandam proteção social do Estado. Este, apesar de ser gerido pelo MDS, é operacionalizado pelos governos locais. Naquele ano, havia 25,3 milhões de famílias cadastradas, e em 2010 eram 18 milhões. Por sua vez, 13.872.243 famílias recebiam os benefícios do Programa Bolsa Família, e 50,4% delas eram oriundas da Região Nordeste (Camargo et al., 2013CAMARGO, Camila et al. Perfil socioeconômico dos beneficiários do Programa Bolsa Família: o que o Cadastro Único revela? In: CAMPELLO, Maria T.; NERI, Marcelo (Org.). Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. Brasília: Ipea, 2013. p. 35-37.).

O rastreamento proposto é para verificar em que medida a produção de normas no nível central (tanto administrativas, que induziriam os municípios à ação, como as associadas a incentivos financeiros) incidiu sobre a contratação de recursos humanos, ou seja, sobre a base da capacidade municipal para a oferta dos serviços, bem como observar se esse processo denotava um aprendizado organizacional e institucional e se os espaços deliberativos, que promovem decisões coordenadas, potencializariam essa construção.

Dado que os municípios têm autonomia política para aderir ou não a uma política nacional, fica a pergunta: por que os municípios aceitaram a transferência da responsabilidade pela gestão e oferta dos serviços socioassistenciais que dependem basicamente de recursos humanos? Afinal, a instalação de capacidades administrativas envolve custos elevados para a maior parte dos 5.570 municípios brasileiros que têm menos de 20 mil habitantes e que, além de baixa capacidade administrativa instalada, também têm baixa capacidade fiscal.

Trabalhamos com duas hipóteses: primeira, que a capacidade transformativa do MDS de induzir comportamentos se mostra relevante para entender as mudanças que foram sendo processadas no nível municipal de governo a partir de 2004. Segundo, que isso somente não seria suficiente para a cooperação dos municípios e, portanto, as pactuações ocorridas nas instâncias deliberativas também foram condição necessária para tal processo.

A capacidade estatal deve ser pensada não só em suas dimensões administrativa e transformativa, mas também em termos relacionais, ou seja, deve levar em conta a relação estabelecida entre os entes federados. Nesse sentido, a capacidade transformativa do governo federal, o processo de aprendizagem organizacional e institucional e a cooperação negociada em ambientes deliberativos podem incidir diretamente na construção da estrutura burocrático-administrativa dos municípios. Sustentamos, portanto, que a capacidade transformativa em um Estado federativo com entes autônomos não se dá sem processos relacionais, que associam ações administrativas (como normas e incentivos) e cooperação negociada em ambientes deliberativos.

5. O ator MDS: condição necessária

Inicialmente, um aspecto a ser observado é o crescimento da estrutura burocrática do MDS em relação às suas atribuições. Criado em 2004, ele nasce sem quadro técnico suficiente para realizar suas funções, mas tem aumento substantivo (256,13%), passando de 383 funcionários da administração direta para 981 em meados de 2014. Ainda assim, tem cerca de 20% a menos do que ministérios como o da Previdência e da Educação, que tinham àquela época 1.231 e 1.209 funcionários, respectivamente.

Um segundo aspecto destacado é que o MDS, ao estabelecer sua estrutura organizacional, distinguiu quatro áreas de atuação — política nacional de desenvolvimento social; política nacional de segurança alimentar e nutricional; política nacional de assistência social; política nacional de renda de cidadania — organizadas de modo próprio, com públicos, financiamento e modelos de gestão específicos, e as duas últimas são objeto de análise deste trabalho. Essa estrutura descolou, em um primeiro momento, as ações de transferência de renda, situadas na Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (Senarc), da estrutura responsável pelos serviços e benefícios socioassistenciais, situada na Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS) e refletiu como a assistência social tem sido institucionalizada e implementada.

Em decorrência dessa estruturação, nascem duas principais burocracias no Ministério, com distintas características e habilidades. Inicialmente, as ações eram desenvolvidas por técnicos terceirizados e por consultores com atribuições específicas (entrevista 1). Parcerias com organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Banco Mundial possibilitaram construir quadros, a partir de 2005, para a realização das funções institucionais da Senarc (Dutra, 2014DUTRA, Ricardo R. A institucionalização federativa do campo de política da assistência social (2004-2012): um enfoque na convergência de serviços e transferências de renda através dos índices de gestão descentralizada do Programa Bolsa Família e do Sistema Único de Assistência Social. 2014. Thesis (PhD) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.), que passou a contar com uma burocracia profissional, recrutada especialmente para as funções que passava a desempenhar. A condução da política naquela secretaria atraiu uma grande quantidade de gestores de políticas públicas do nível federal, altamente qualificados, os chamados especialistas em políticas públicas e gestão governamental. Já na SNAS, a burocracia que assumia as funções era oriunda de uma longa trajetória na área da assistência social, com reconhecimento político pelo seu envolvimento. Na prática, a SNAS apresentava fragilidades de recursos humanos, dificultando significativamente o cumprimento de suas atribuições (entrevista 2). Essa distinção organizacional, a princípio, não seria fonte de problemas para a institucionalização da assistência social se houvesse preocupação de se criar organicidade entre as secretarias, mas isso não aconteceu (entrevista 1) e teve consequências para a política, de modo geral, e para a integração entre transferência de renda e serviços socioassistenciais, de modo particular, como será apontado à frente.

Soma-se a isso a distinta natureza das áreas. Um primeiro aspecto que deve ser destacado é a incidência de regulação sobre a transferência de renda e sobre os serviços socioassistenciais e suas consequências sobre a institucionalização da política. Até 2004 não havia regulação específica para a transferência de renda, normatizada com a Lei no 10.835/2004, que institui a Renda Básica de Cidadania, mas que não estabelecia a estrutura formal para sua organização, nem sua vinculação à assistência social. Assim, a Senarc teve relativa liberdade para criar regras para sua área de atuação, inclusive mantendo uma relação direta com municípios e posteriormente com estados, estabelecendo uma forma centralizada de coordenação (entrevista 1).

Já a SNAS orientava-se por normas preexistentes (como a Lei Orgânica da Assistência Social, de 1993, e Normas Operacionais Básicas) e organizava-se a partir de uma descentralização coordenada, numa relação mediada com estados e municípios por meio da CIT e do CNAS, devendo pactuar as regras nessas instâncias. As características da SNAS demandavam intensas articulações federativas, exigindo de sua burocracia uma significativa capacidade política e relacional, enquanto a área de transferência de renda se constrói a partir de decisões governamentais top down, exigindo da burocracia uma capacidade prioritariamente técnica (entrevista 2).

Portanto, ainda que pertencentes à mesma estrutura ministerial, a transferência de renda e os serviços e benefícios socioassistenciais foram tratados como políticas separadas e, incialmente, pouco se fez para criar organicidade entre elas. Na prática, elas competiam entre si pela atenção presidencial e por orçamento, tendo esses pendidos claramente para a transferência naquele momento (entrevista 2).

Observa-se, portanto, uma clara diferença entre as burocracias das áreas de transferência de renda e de serviços e benefícios socioassistenciais — a primeira com um perfil mais administrativo-gerencial, decorrente do maior insulamento e da qualidade de sua burocracia especializada, tomando iniciativas de regulação de cunho mais técnico-operacional; a segunda, com um perfil mais político, inserida em espaços que demandam relações institucionais intensas, tendo que negociar as regulações com os entes federados e a sociedade civil. O processo de interação, nem sempre amigável, produziu um aprendizado organizacional que foi relevante para a construção da capacidade transformativa do MDS: a necessidade de fortalecimento técnico-operacional da SNAS e a relevância do debate político para a Senarc (entrevista 1).

A partir desse processo, o que pode ser observado é que o governo federal agiu como um indutor de comportamento em outros níveis de governo. Vejamos. Ainda que tenha se estruturado com burocracias de características tão distintas, logo depois de criado, o MDS iniciou movimentos na direção das transformações que pretendia. Um deles foi utilizar sua autoridade normativa para instituir fluxos e procedimentos, bem como padronizar ofertas de serviços e de transferência de renda, inclusive adotando incentivos de financiamento associados a essas mudanças. O Ministério regulamentou sistematicamente as transferências de recursos federais incentivando a adesão dos governos locais. A capacidade transformativa do Ministério, portanto, pode ser verificada por meio de atos normativos e administrativos que, além de regularem suas próprias atividades, também incidiram nos demais níveis de governo, especialmente nos municípios. Essa estratégia foi consubstanciada em portarias editadas pelo MDS, seguindo o mesmo caminho utilizado pela Saúde (Arretche, 2002ARRETCHE, Marta. Federalismo e relações intergovernamentais no Brasil: a reforma de programas sociais. Dados - Revista de Ciências Sociais, v. 45, n. 3, p. 431-458, 2002., 2004), o que se configura como aprendizado institucional por parte do governo federal.

O Gráfico 2 mostra a atividade reguladora do MDS no período estudado, distinguindo as áreas de transferência de renda e de serviços e benefícios socioassistenciais. Ao todo, foram 236 portarias emitidas em nove anos, tratando especificamente da política de assistência social (aqui não constam as portarias interministeriais). Destacam-se seu pico em 2006 e uma diminuição mais forte depois de 2009.

Gráfico 2
Portarias do MDS — 2004-2012

Todavia, a capacidade transformativa do MDS só pode ser analisada a partir do que consubstancia a política estudada, no caso, a operacionalização das transferências de renda e dos serviços. Vejamos.

5.1 A transferência de renda

O ano de 2004 é o marco inicial para nossa análise, pois foi quando foram formulados dois instrumentos normativos importantes para a área: o Programa Bolsa Família (PBF) e a Política Nacional de Assistência Social (Resolução CNAS no 145/2004) que detalha e regula aspectos normativos e operacionais da Loas, não realizados anteriormente. A partir dessas regulações, pode-se verificar a ação do MDS no sentido de efetivá-las, ali considerando a imprescindível gestão intergovernamental, abrangendo os três entes da federação.

Importante ressaltar o Decreto no 5.209/2004 que regulou o PBF e definiu sua forma descentralizada e intersetorial, com a participação comunitária e o controle social. Nele foi estipulado que os demais níveis de governo que desejassem integrar o Programa deveriam aderir a ele formalmente, e os gestores locais teriam até o final de 2005 para fazerem as adequações necessárias para desenvolvê-lo no município. Para efetivar a adesão, foi estabelecida a Portaria no 246/2005, que definiu os instrumentos de adesão dos municípios ao PBF e ao Cadastro Único (CadÚnico), prorrogou a validade dos termos assinados anteriormente para o Bolsa Escola e o Bolsa Alimentação, estabeleceu a designação de um gestor local para o PBF e a constituição de uma instância formal de controle social para acompanhar sua execução. Esse período foi, sem dúvidas, de forte aprendizado organizacional em um Ministério que estava no início de sua estruturação.

Do total de portarias anteriormente referido, 49 estão relacionadas com a transferência de renda, editadas pela Senarc. Classificamos essas portarias por sua natureza entre: relativas ao PBF, ao CadÚnico, ao financiamento, à integração entre transferência de renda e serviços e outras temáticas. O gráfico 3 apresenta sua distribuição no decorrer do tempo e nos permite visualizar a intensidade da regulação do PBF.

Gráfico 3
Portarias do MDS exclusivamente para a área de transferência de renda

Ainda em 2005 foram editadas mais três Portarias relacionadas ao PBF: a de no 360, que estabelecia os critérios e os procedimentos para a transferência de recursos financeiros destinados aos entes federados para a implementação e desenvolvimento do PBF e para a manutenção e aprimoramento do CadÚnico; a Portaria no 551, que regulamentava a gestão de condicionalidades do PBF; e a Portaria no 555, que estabelecia as normas e os procedimentos para a gestão de benefícios do PBF. Além dessas, há a Portaria no 666, que regulava a integração entre o PBF e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), previamente existente e com legislação específica, o que também levou à integração no CadÚnico, um importante indutor de mudanças na gestão municipal (Mostafa e Sátyro, 2014SÁTYRO, Natália G. D.; CUNHA, Eleonora S. M. The path of Brazilian social welfare policy post-1988: the significance of institutions and ideas. Brazilian Political Science Review, v. 8, n.1, p. 80-108, 2014.).

O CadÚnico foi um importante indutor de mudanças na gestão municipal, sendo o segundo tema mais tratado no período em análise. O primeiro processo de auditoria na base de dados, realizado em 2005 após denúncias de irregularidades no PBF, possibilitou à Senarc identificar as fragilidades municipais que geravam as inconsistências identificadas. Com isso, ela pôde estabelecer uma série de ações voltadas aos municípios, no sentido de orientá-los e capacitá-los para a adequada utilização do Cadastro (entrevista 2). Esse foi um momento de um aprendizado intenso, não só organizacional do MDS, no sentido de compreender como fazia, mas também institucional de entender as estratégias que de fato alcançavam resultados no nível municipal. De acordo com entrevistados, o diálogo com municípios parceiros se dava de forma sistemática nesse processo. Alguns municípios serviam quase como laboratórios e, na medida em que compartilhavam suas experiências com o Ministério, ajudavam os técnicos federais a entender determinados processos no âmbito local e, em especial, no nível de rua (entrevista 3).

Esse processo levou à atualização cadastral realizada pelos municípios, instituída pela Portaria no 360, bem como introduziu transferências intergovernamentais diretas da União para os municípios que já haviam aderido ao Suas e ao PBF, via Fundo Nacional de Assistência Social, objetivando apoiar a gestão local do Programa. Os municípios que não houvessem aderido ao Suas receberiam recursos financeiros federais por meio de convênio e a gestão seria por meio dos estados. O processo de recadastramento ganhou centralidade nas ações municipais e evidenciou suas fragilidades institucionais, levando grande parte dos municípios a reverem sua organização e infraestrutura (Suárez e Libardoni, 2007 apud Dutra, 2014DUTRA, Ricardo R. A institucionalização federativa do campo de política da assistência social (2004-2012): um enfoque na convergência de serviços e transferências de renda através dos índices de gestão descentralizada do Programa Bolsa Família e do Sistema Único de Assistência Social. 2014. Thesis (PhD) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.; Mostafa e Sátyro, 2014SÁTYRO, Natália G. D.; CUNHA, Eleonora S. M. The path of Brazilian social welfare policy post-1988: the significance of institutions and ideas. Brazilian Political Science Review, v. 8, n.1, p. 80-108, 2014.). Esse momento é central nessa cadeia, pois é quando o governo federal aprende efetivamente a forma mais eficaz de interlocução com os municípios (entrevista 3).

O que vemos, portanto, são as normas iniciais que regulam o PBF incidindo diretamente nos municípios na medida em que aderiam ao Programa, especialmente nos aspectos de gestão, pois, além de demandar a designação de um gestor e a constituição de instância de controle social local, regulavam o financiamento destinado à sua implementação e definiam procedimentos para a gestão do benefício e suas condicionalidades. Dutra (2014DUTRA, Ricardo R. A institucionalização federativa do campo de política da assistência social (2004-2012): um enfoque na convergência de serviços e transferências de renda através dos índices de gestão descentralizada do Programa Bolsa Família e do Sistema Único de Assistência Social. 2014. Thesis (PhD) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.) destaca que o Termo de Adesão (obrigatório) assinado pelos municípios revela a dimensão e a complexidade de suas novas funções. Esse termo gera um pacto de responsabilidade pelo cadastramento de possíveis beneficiários, pela gestão dos benefícios, pelo acompanhamento das condicionalidades junto às escolas municipais e estaduais e pela articulação com programas complementares que possam ser ofertados pelo município ou pelo estado, inclusive condicionando a expansão do programa ao desempenho da gestão municipal. Ao contrário do que a literatura destaca quanto à resistência dos municípios em aderir a esse tipo de política, em que a execução e os serviços serão todos no nível local, a adesão foi rápida: entre julho e dezembro de 2005, 4.991 municípios (89,7%) já haviam assinado o termo e no decorrer de 2006, outros 547 (9,8%), restando apenas 25 para 2007, o que mostra a forte capacidade de indução do governo federal.

Assim, incidiam sobre os municípios que integravam a rede de oferta do PBF os padrões de gestão, fluxos e procedimentos estabelecidos pela coordenação nacional, o que os obrigava a construir uma capacidade antes inexistente para organizar a gestão e assumir novas funções. Portanto, houve a necessidade de construção de uma área administrativa voltada para a gestão municipal na área da assistência social, com impactos diretos nas estruturas existentes. Interessante observar que essas determinações, especialmente o cadastramento e o acompanhamento das condicionalidades, tinham o potencial de integrar transferência de renda e serviços socioassistenciais no nível local, mas, na prática, a organização das duas instâncias se deu de forma sectária e competitiva por recursos.

Após o sucesso da adesão dos municípios, havia a preocupação em estabelecer padrões mais regulares e menos discricionários para o financiamento do PBF no nível municipal, teor da Portaria no 148/2006, que instituiu o Índice de Gestão Descentralizada Municipal (IGD-M). Esse, sem dúvida, um dos maiores instrumentos de indução utilizados pelo MDS. Esse índice determinava os parâmetros de qualidade para a gestão do PBF pelos municípios (indicadores relacionados com o cadastro único, com a certificação do cadastro, com o acompanhamento das condicionalidades da educação e da saúde), por meio do qual seriam calculados os recursos federais a serem transferidos de forma direta pela União, com apurações mensais, a partir das atualizações realizadas no nível local. O índice foi o instrumento indutor da qualidade de resposta dos municípios ao determinar que o montante do repasse financeiro dependeria da quantidade e da qualidade dos cadastros apresentados. Ainda que a implementação desse processo tenha apresentado dificuldades iniciais, decorrentes da incapacidade administrativa de muitos municípios (Lindert et al., 2007; Dutra, 2014DUTRA, Ricardo R. A institucionalização federativa do campo de política da assistência social (2004-2012): um enfoque na convergência de serviços e transferências de renda através dos índices de gestão descentralizada do Programa Bolsa Família e do Sistema Único de Assistência Social. 2014. Thesis (PhD) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.), o IGD-M passou a ser o parâmetro para o financiamento da gestão municipal do PBF.

A instituição do IGD-M gerou a transferência de 2,2 bilhões de reais para os municípios, entre 2006 e 2013, e de 2010 a 2012 houve aumento nominal de 60% dos recursos (Paiva, Falcão e Bartholo, 2013PAIVA, Luis Henrique; FALCÃO, Tiago; BARTHOLO Leticia. Do Bolsa Família ao Brasil sem Miséria: um resumo do percurso brasileiro recente na busca da superação da pobreza extrema. In: CAMPELLO Maria T.; NERI, Marcelo (Org.). Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. Brasília: Ipea, 2013. p. 15-17.). Esse modelo de aporte de recursos, que visava ao fortalecimento da gestão municipal, sustentava-se na regularidade dos repasses e estimulava a existência de burocracia própria, inclusive fortalecendo a área da assistência social no nível local, mais um elo nessa cadeia aqui apontada. O IGD-M induziu os municípios a constituírem equipes para acompanhamento de famílias beneficiárias e operacionalização do CadÚnico, a efetivamente utilizarem os saldos das transferências federais, a constituírem organismos de controle. Nesse sentido, o Decreto no 7.322/2010 e a Portaria no 754/2010 instituem importantes alterações no IGD-M, entre elas a adesão do município ao Suas e o efetivo papel dos conselhos municipais de assistência social como instâncias de controle do PBF. Esse processo de integração culmina com a Lei no 12.435/2011, que altera a Loas e define a forma organizativa do Suas, claramente um passo após o outro na construção da estrutura municipal, a partir do processo de aprendizagem aqui ressaltado.

Em 2010 houve alterações importantes no cálculo do IGD (que passa a ser chamado de IGD-PBF) por meio do Decreto no 7.322/2010 e da Portaria no 754/2010. Há a transformação dos indicadores em um fator (Fator de Operação do PBF), que inclui a comprovação dos gastos dos recursos repassados aos municípios por meio de transferência direta, uma vez que foi diagnosticado que muitos dos municípios não executavam o orçamento que é relativamente livre dentro da área. Essa inovação evidencia a baixa capacidade de execução financeira dos municípios e aponta para a indução do governo federal no sentido de que os governos locais efetivamente gastassem os recursos repassados fundo a fundo (Sátyro e Cunha, 2016SÁTYRO, Natália G. D.; CUNHA, Eleonora S. M.; CAMPOS, Járvis. Análise espacial da burocracia da assistência social nos municípios brasileiros: notas para uma reflexão sobre a capacidade de implementação dessa política. Opinião Pública, v. 22, p. 286-317, 2016.).

5.2 Os serviços socioassistenciais

No que se refere aos serviços, primeiramente, é importante ressaltar o legado: eles tinham um histórico marcado pela fragmentação da oferta conforme níveis de governo, tipos de ações e ofertantes, bem como ausência de regulação que efetivamente determinasse o papel de cada ente federado na provisão dos serviços e na condução da política. Esse legado revela o desafio de se efetivar a montagem de um sistema, acrescido da própria concepção de gestão da política que resultasse em unidade no escopo da proteção (Dutra, 2014DUTRA, Ricardo R. A institucionalização federativa do campo de política da assistência social (2004-2012): um enfoque na convergência de serviços e transferências de renda através dos índices de gestão descentralizada do Programa Bolsa Família e do Sistema Único de Assistência Social. 2014. Thesis (PhD) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.).

Se os municípios precisavam de recursos para implantar o PBF, que é uma transferência de renda direta para o beneficiário e, portanto, seria de se supor de menor complexidade para a gestão no nível local, é possível inferir as dificuldades de se implantar uma rede de serviços. Para isso, o papel indutivo do nível federal foi essencial, apesar de não suficiente por si só, como veremos. Como mostrado no gráfico 1, a maioria das portarias ministeriais foi no âmbito da SNAS. No gráfico 3, a seguir, estão 85 portarias classificadas conforme sua natureza: financiamento, Suas, BPC e um conjunto heterogêneo classificado como “outros”. Interessante notar que 52,94% (45) delas referem-se a financiamento.

Dois fatores são relevantes para compreender o processo de indução à construção da capacidade burocrática municipal. Um primeiro é a formulação da Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Suas (NOB-RH), pactuada na CIT e expressa na Resolução do CNAS no 269/2006, onde estão especificadas as bases infraestruturais relacionadas com os recursos humanos necessários para a efetivação da PNAS de modo geral e para os municípios. Essa NOB estabelece a composição básica das equipes de referência conforme níveis de gestão e porte dos municípios, bem como as relaciona com as ações a serem desenvolvidas. Ela evidencia a consciência de que a construção do Suas precisava de recursos humanos no âmbito local, um elo forte nessa cadeia. Mostraremos à frente como ela impacta diretamente a contratação no nível municipal.

As NOB-Suas (de 2005 e 2012) tiveram um impacto significativo na relação entre o governo federal e os governos locais por alterarem a sistemática de financiamento por parte da União, introduzindo critérios de partilha dos recursos federais. Com isso, a transferência direta fundo a fundo passa a seguir critérios não discricionários e adquire regularidade, passo fundamental para a consolidação do processo em curso, pois isso deu segurança ao gestor local para contratar pessoal. Uma medida inicial foi o estabelecimento de níveis de gestão, condizentes com capacidades municipais, que introduziu incentivos seletivos positivos para que os municípios viessem a se adequar às normas e cumprissem com os requisitos mínimos para a gestão. Também foram estabelecidas regras de transição para que os municípios pudessem se adequar às novas orientações. Esses critérios foram alterados posteriormente, mas tiveram um importante papel indutor na construção das capacidades municipais.

Um segundo fator é a edição da Lei no 12.435/2011, que altera a Loas e organiza o Suas. No seu artigo 12-A é criado o Índice de Gestão Descentralizada do Suas (IGD-Suas), que se estrutura a partir do Índice de Desenvolvimento do Cras (IDCRAS), ou seja, a lei reforça o papel da gestão municipal na efetivação dos serviços socioassistenciais e fortalece os Centros de Referência da Assistência Social (Cras) como unidades públicas centrais para a política de assistência social. Ressaltamos aqui um aprendizado organizacional: na medida em que os gestores do MDS aprenderam o funcionamento do IGD-M, depois renomeado para IGD-PBF, usam a mesma estratégia para o IDCRAS e agora para o IGD-Suas. O Decreto no 7.636/2011 que regulamenta o IGD-Suas, por sua vez, é um importante passo para a integração das transferências e dos serviços no âmbito da Assistência Social, pois institui o índice como referência para monitorar e avaliar o Sistema como um todo — transferências monetárias e serviços.

Gráfico 4
Portarias do MDS exclusivamente para a área de serviços e benefícios socioassistenciais

Mas o rastreamento de processo a que nos referimos como método só pode se completar quando ligarmos essa cadeia de eventos anteriormente relatados à contratação de pessoal para tais serviços. Os serviços socioassistenciais precisam, basicamente, de recursos humanos qualificados, não necessitando de equipamentos sofisticados como no caso da Saúde. Portanto, o que observamos é que a NOB-RH tem um impacto imediato na contratação de pessoal. O gráfico 5 mostra a trajetória das portarias e a evolução dos trabalhadores desses equipamentos recém-criados, evidenciando a força dos elos aqui apontados. Por meio do rastreamento do processo, foi possível verificar como essas portarias foram moldando a ação municipal e, em decorrência, o número de trabalhadores contratados. Observa-se que o número de portarias é substantivamente alto nos anos iniciais de 2006 e 2007, destacando-se as relativas a financiamento em 2006 no sentido claro de criação de incentivos diretos para os municípios; soma-se a isso a NOB-RH, nesse mesmo ano. O gráfico 5 apresenta a evolução do número de trabalhadores e possibilita inferir os elos causais sobre os quais falamos. Desde 2006 as portarias relativas a serviços começam a se destacar, apresentando números significativos nos anos seguintes, com redução em 2011. Por sua vez, o número de trabalhadores no nível local, especialmente nos Cras, cresce cerca de 290% no período.

Gráfico 5
Evolução das portarias e dos trabalhadores nos equipamentos do Suas

Não resta dúvida de que o governo federal dispôs de recursos institucionais para influenciar as escolhas dos governos locais, afetando sua agenda, condicionando as transferências de recursos federais aos municípios à adesão aos objetivos da política nacional e, para isso, utilizou da sua autoridade normativa. Como na Saúde (Arretche, 2002ARRETCHE, Marta. Federalismo e relações intergovernamentais no Brasil: a reforma de programas sociais. Dados - Revista de Ciências Sociais, v. 45, n. 3, p. 431-458, 2002., 2004), a política tem sido financiada fortemente pelo governo federal, pois desde sua implementação o cofinanciamento federal da política foi de 75,5% em 2004, chegando a 79,9% em 2011 (Mesquita et al., 2012MESQUITA, Ana C. S.; MARTINS, Ricardo de F.; CRUZ, Tânia M. E. Cofinanciamento e responsabilidade federativa na política de assistência social. Texto para Discussão 1724. Rio de Janeiro: Ipea , 2012.).

Esse processo de aprendizagem organizacional e institucional gerou a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, por meio da Resolução MDS/CNAS no 109/2009, que padroniza os serviços específicos da assistência social. O passo seguinte foi o reordenamento desses serviços nos níveis estadual e local, ou seja, os gestores passaram a adequar as ações previamente existentes à tipificação. Naquele mesmo ano, foi pactuado o Protocolo de Gestão Integrada de Serviços, Benefícios e Transferência de Renda, expresso na Resolução MDS/CIT no 07/2009, que explicita a integração entre transferência de renda e serviços socioassistenciais como uma estratégia de gestão, necessária para a efetiva garantia dos direitos socioassistenciais. Importante destacar que tanto a tipificação como o protocolo não foram iniciativas exclusivas do MDS, mas negociadas e pactuadas nas devidas instâncias.

Dada a autonomia política dos municípios, eles podem aderir ou não a projetos nacionais. Isso torna a capacidade de indução do governo federal aspecto central para o alcance de metas nacionais. No caso aqui analisado, primeiro foi necessário fazer com que os municípios aderissem ao programa, depois pensar formas de indução para padronizar as ações, garantir pisos qualitativos e quantitativos, além de garantir o orçamento para isso. O fenômeno que se observa aqui é necessariamente processual e mostra o aprendizado institucional no percurso, cada passo dado gerando resultados que levam a outro, ou seja, são realizadas mudanças incrementais que possibilitam novos passos. Os atos normativos (leis, decretos, portarias, resoluções) funcionaram como uma engrenagem, sendo editados sucessivamente e após a verificação dos resultados alcançados, demonstrando um verdadeiro aprendizado institucional na relação intergovernamental. A cada ação do MDS, geraram-se reações nos municípios, e a cada meta alcançada, outra ação do MDS era necessária, promovendo a criação e o desenvolvimento de capacidades no nível local. Nesse processo, foi significativo que o MDS fosse flexível na definição da “meta alcançada”, na medida em que os 5.570 municípios apresentavam capacidades de resposta muito distintas.

A análise das portarias juntamente com as entrevistas nos permitiu rastrear a dinâmica incremental desse processo de indução e de transformação da capacidade municipal relacionados com a adesão ao programa. Se antes foi possível observar um aprendizado organizacional pelo MDS, o que se nota é que, a cada meta alcançada, o próximo gatilho foi acionado em um processo de aprendizagem relacional. Os municípios tinham dois grandes motivos para aderir e prestar mais serviços: os repasses financeiros, que não mais dependiam da discricionariedade dos convênios e passaram a ser fundo a fundo, bem como os créditos recebidos da população no âmbito local pela implementação de mais serviços.

Logo a seguir apresentamos um diagrama de Venn que mostra a relação (de necessidade e de suficiência) de cada um dos fatores e processos analisados com a estruturação de uma burocracia especializada no nível local. Ainda que os fatores e processos apresentados até aqui tenham sido relevantes para demonstrar a atuação do MDS, seu aprendizado institucional e organizacional, bem como seu papel normativo na coordenação nacional da política, é possível pensar que nenhum deles, sozinho, seria suficiente para induzir os municípios a contratar pessoal e oferecer serviços socioassistenciais. Talvez o financiamento tivesse um papel forte, mas ainda assim consideramos todos os aspectos elencados como condições necessárias para esse resultado, mas não suficientes para, sozinhos, explicá-lo. No entanto, é possível inferir que a ausência desses fatores seria condição suficiente para a negação do resultado, ou seja, para a não estruturação de um sistema de prestação de serviços no nível local por uma burocracia própria, o que tem como caso real contrafactual a própria política de assistência social desenvolvida no governo FHC (Sátyro e Cunha, 2014SÁTYRO, Natália G. D.; CUNHA, Eleonora S. M. The path of Brazilian social welfare policy post-1988: the significance of institutions and ideas. Brazilian Political Science Review, v. 8, n.1, p. 80-108, 2014.).

Figura 1
Diagrama de Venn (1) dos testes básicos dos fatores e processos analisados relativos ao MDS

6. O papel da CIT

A estruturação da política de assistência social constituiu dois espaços importantes de deliberação quanto ao Suas: as comissões intergestores (estaduais e nacional), especialmente a nacional (CIT), e os conselhos de assistência social (CNAS no âmbito federal). Essas duas instâncias são distintas entre si, especialmente em razão de sua composição e de sua natureza. As comissões têm o papel de promover as negociações e a pactuação federativa no escopo da política, necessárias para a unidade da proteção, são compostas por gestores representantes da União, dos estados e dos municípios e não possuem autoridade normativa. Os conselhos são espaços de deliberação que possibilitam a participação da sociedade civil e dos entes federados na formulação e no controle social da política e possuem autoridade para normatizar sobre a política. Portanto, decisões sobre a gestão da política são tomadas na CIT e quando demandam normatização são enviadas ao CNAS. Esses espaços de negociação e deliberação entre entes federados e sociedade civil indicam a importância da existência e do desenvolvimento da capacidade relacional desses entes.

O papel da CIT no processo de gestão intergovernamental é muito importante, especialmente se considerarmos que a política deve ser ofertada por meio de serviços minimamente padronizados em todo o país, o que depende de capacidade administrativa, estrutura burocrática, atenção a demandas locais, entre outros aspectos. Em respeito à autonomia dos entes federados, o regimento interno da CIT determina que suas decisões devam ser consensuais, ou seja, devem obter o consentimento de todos os representantes, ainda que os temas levem mais tempo no debate. Essas decisões são transmutadas em resoluções e desde sua criação, em 1999, até meados de 2014, a CIT emitiu 141 resoluções, que expressam tais decisões.

O alcance das decisões da CIT evidencia-se pelos seus destinatários: a maioria é endereçada aos municípios (47,5% — 67), o que passa para 82% quando somadas àquelas que tratam de mais de um ente federado incluídos os municípios. Das demais, 19,15% (27) são resoluções direcionadas para o nível nacional, 16,31% (23) aos estados, DF e municípios conjuntamente, 13,47% (19) a estados e DF, 2,84% (4) ao nível federal de governo e 0,71% (1) somente ao DF. Entre os temas dessas resoluções destacam-se os da gestão e do financiamento, que somam (61,7%): gestão com 33% do total de resoluções, e 28,37% para financiamento.

As resoluções relativas a serviços e benefícios totalizam 9,22%, organização interna com 9,93%, enquanto planejamento, monitoramento, avaliação e temas muito específicos são menos expressivos. Interessante notar que a discussão específica sobre os serviços socioassistenciais não tem expressividade. Adicionalmente, procuramos compreender se as decisões tomadas na CIT são potencialmente geradoras de conflitos ou de cooperação entre os entes federados. Encontrando que 57% (81) delas são potencialmente geradoras de cooperação, 16,31% (23) tratam de matéria claramente conflitiva de interesses interfederativos e 26,24% (37) tratam de assuntos outros que não reportam a ideias de potenciais conflitos ou cooperação.

Quando afirmamos que mais de 80% das resoluções têm o município como destinatário e que 57% geram ideia de cooperação, verificamos que as resoluções tomadas no âmbito da CIT reforçam o foco nos municípios como atores relevantes para a implementação das ações do Suas, tendo os temas da gestão e do financiamento como os mais incidentes nos debates e decisões, bem como apontam para um maior potencial de cooperação do que de conflito intergovernamental. Muitas das pactuações ocorridas no âmbito da CIT estão relacionadas com normativas que regulam a gestão da política de assistência social apontadas anteriormente. Entre elas destacam-se a Norma Operacional Básica do Suas, a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Suas, o Protocolo de Gestão Integrada de Serviços e Benefícios, a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais e, mais recentemente, o Pacto de Aprimoramento da Gestão do Suas. Essa regulação foi objeto de intenso debate na CIT e os acordos ali produzidos foram normatizados pelo CNAS (que os publicou como resoluções). Outros acordos, que não demandavam normatização, foram publicados como portarias ministeriais, para que tivessem efeito regulador sobre todos os entes federados.

Esses instrumentos normativos tratam de aspectos que incidem diretamente nos municípios, especialmente sobre a gestão e o financiamento da política, como a organização dos níveis de atenção e da estrutura do órgão gestor e dos equipamentos que ofertam serviços (inclusive recursos humanos), tipo de serviços a ser ofertado (inclusive os obrigatórios), o formato que deve ter a integração entre esses serviços e os benefícios, as metas que devem ser alcançadas pelos municípios e os prazos correspondentes. A CIT, portanto, se apresenta não só como um espaço importante na promoção da relação entre os entes, com forte potencial de indução à cooperação, mas também como um lócus em que pactuam decisões que incidem diretamente na gestão do Suas.

Esse processo negociado e pactuado de produção de decisões, que por sua vez geram normas e regulação que efetivamente incidem sobre o conjunto dos entes federados e impactam a gestão da política, aponta para a relevância da dimensão relacional entre as capacidades estatais necessárias para a condução democrática da política em estados federativos. Produzir cooperação não decorre apenas da existência de diretrizes constitucionais ou de normas administrativas, mas principalmente da construção de espaços e de procedimentos que possibilitem a expressão e a resolução de conflitos, bem como a pactuação das regras que regulam as relações intergovernamentais. No caso da assistência social, a CIT mostra-se como um importante mecanismo para o desenvolvimento dessa capacidade, inclusive com a produção de decisões que foram absolutamente relevantes para a estruturação da política em nível nacional. Essas características da produção de decisões no Suas possibilitam inferir a relevância da diferença de perfil dos burocratas da Senarc e da SNAS. No caso, o perfil mais político dos burocratas da SNAS permitia que essa costura fosse sendo realizada.

Vejamos no diagrama de Venn como é a relação de cada um desses processos com a montagem de equipamentos e contratação de pessoal no que se refere à sua condição de necessidade ou de suficiência. Podemos pensar que uma relação totalmente top-down com os municípios tenha funcionado no início da implantação do Bolsa Família quando se necessitava de uma estrutura menor, apesar de imprescindível. No entanto, tanto para a implantação de serviços socioassistenciais como para sustentar o tamanho que alcançou o Bolsa Família, era necessária uma cooperação real dos entes federados. O espaço da CIT permitiu a pactuação que possibilitou isso. Sem a articulação entre CIT, CNAS e MDS não seriam possíveis os resultados no tempo dado.

O que podemos inferir dos processos analisados é que seu conjunto foi condição suficiente para contratação de pessoal e construção de equipamentos no nível local. Separadamente, cada um desses fatores e processos não produziria o resultado, mas todos foram necessários para produzi-lo, tornando-se uma condição suficiente. Ter uma instituição responsável pela coordenação de uma política no nível nacional com uma burocracia especializada no âmbito do MDS é precondição para induzir comportamentos no nível local. Mas, dado que a política em análise é caracterizada por diferentes “entregas”, no caso dois grandes pilares — transferência monetária e serviços e benefícios socioassistenciais —, foi necessário um processo de aprendizado ao longo do tempo sobre como fazer a indução para a construção da capacidade burocrática municipal, ou seja, a implantação de equipamentos públicos e a contratação de pessoal nos municípios para oferta de serviços e efetivação das transferências de renda.

Figura 2
Diagrama de Venn (2) dos testes básicos dos fatores e processos analisados relativos à CIT

Além disso, argumentamos que essa indução não se sustentaria se fosse simplesmente um processo top-down. O que ficou evidente, nesse processo, foi a centralidade das pactuações na CIT possibilitando a legitimidade e, portanto, a adesão de entes autônomos. Esses fatores não agiram ao acaso, foi uma ação concertada por atores envolvidos nas instâncias (MDS, CNAS e CIT). O relacionamento entre eles e seus efeitos suficientes sobre a montagem de uma estrutura burocrático-administrativa no nível local podem ser visualizados na figura 3.

Sumarizando, retomamos o que foi colocado por Evans (2002EVANS, Peter B. Hybridity as an administrative strategy: combining bureaucratic capacity with market signals and deliberative democracy. In: CONGRESO INTERNACIONAL DEL CLAD SOBRE LA REFORMA DEL ESTADO Y DE LA ADMINISTRACIÓN PÚBLICA, 7., 2002. Anais… Lisboa: Clad, 2002.) quanto à necessidade de institucionalização de processos democráticos de decisão pública que envolvem os diferentes atores interessados para o alcance do resultado pretendido, no caso, oferta de serviços que necessitam contratação de recursos humanos. A capacidade transformativa do MDS encontra sua força no diálogo fino feito pelos seus burocratas, aqui, mais especificamente os da SNAS junto ao CNAS e à CIT. Foram esses processos deliberativos dentro da CIT que sustentaram politicamente a cooperação.

Figura 3
Diagrama de Venn 3: X1xX2xX3xX4xX5 como condição suficiente

7. Considerações finais

A escolha da política de assistência social como o caso a ser estudado para a verificação da capacidade transformativa do Estado brasileiro mostrou-se bastante propícia, assim como o método process tracing nos permitiu o rastreamento dos mecanismos que foram sendo utilizados pelo MDS nesse processo, construindo a cadeia causal. Seu legado institucional demonstra a fragilidade de sua estruturação em todos os níveis de governo, com uma baixa capacidade administrativa em geral. Soma-se a isso o fato de ela ser estruturada num sistema nacional, que articula os três entes da federação, e que visa a ofertar ações de forma padronizada entre eles, alcançando os usuários igualmente em todo o país, o que aponta a necessidade de que haja, em alguma medida, padrões comuns que orientem a ação dos municípios.

O estudo da capacidade transformativa do MDS nos permitiu, primeiramente, verificar a importância do aprendizado tanto organizacional como institucional do Ministério, juntamente com municípios e CIT, nesse processo de constituição de capacidades estatais. Foi possível perceber, por meio das decisões expressas nos atos normativos, que o próprio Ministério aprendia no processo, revendo as regras quando necessário, inclusive adequando-as às especificidades que foram sendo reveladas no processo de implantação das próprias normas, como nos casos em que prazos de adesão foram revistos para que municípios fossem se ajustando às regras. Esse processo de aprendizado também pode ser verificado na própria forma como ocorreu a indução: se, num primeiro momento, transferência de renda e serviços foram tomados separadamente, ao longo do processo essas ações foram se aproximando, gerando normas que as integram, especialmente na sua oferta, no âmbito municipal.

Também é importante ressaltar a importância, para a construção da capacidade transformativa do MDS, do fim da competição entre SNAS e Senarc, cada uma com seu aprendizado específico, apontando para a necessidade de fortalecimento técnico-operacional da SNAS, de um lado, e a centralidade do debate político na Senarc, de outro lado. O reflexo desse aprendizado pode ser verificado na redução do número de portarias emitidas pelo MDS relativas à assistência social concomitantemente ao aumento das resoluções da CIT no mesmo período, mostrando que, em alguma medida, a arena do debate político ganha relevância para a discussão de questões de gestão e de financiamento, o que também indica o aumento da capacidade política dos entes federados nesse processo.

O objetivo de verificar a capacidade transformativa do MDS tendo como parâmetro sua habilidade em induzir comportamentos dos municípios, especialmente quanto à construção de suas capacidades administrativas próprias, nos permitiu identificar dois importantes resultados. O MDS, por meio de atos normativos diversos, que incluíam principalmente incentivos seletivos relacionados com o financiamento público federal (mas não só), foi capaz de induzir os municípios à adesão ao PBF e ao Suas, bem como a assumirem importantes aspectos da gestão dessa política no nível local. Por outro lado, os municípios foram, a partir dessa adesão, construindo suas estruturas burocráticas que lhes permitiriam gerir transferência de renda e ofertar serviços socioassistenciais, bem como efetivamente realizar as ações que lhes cabiam a partir da adesão. São indicadores dessa construção a existência efetiva de equipamentos públicos de âmbito municipal, o aumento do número de profissionais (ainda que muitos deles com relações trabalhistas frágeis), o aumento significativo no número de famílias cadastradas no CadÚnico e beneficiárias do PBF. Por fim, cabe destacar que a capacidade transformativa do MDS, verificada por meio da construção da estrutura burocrática dos municípios, tem sido exercida de modo a mobilizar consentimentos e a institucionalizar a cooperação, evidenciando o papel central do MDS nessa mudança. É possível concluir a centralidade das portarias como instrumento indutor desse processo e, em especial, a centralidade da capacidade de financiamento da política pelo governo federal. No entanto, o que se observou é que só o financiamento não seria capaz de criar esses consentimentos, principalmente no que se refere à gestão e aos serviços e, nesse sentido, o papel das instâncias de pactuação foi crucial. Na CIT foram construídos os acordos que instruíram muitas das portarias analisadas.

Ao analisarmos o caso brasileiro da política de assistência social, portanto, é possível verificar que a capacidade transformativa do MDS não decorreu de uma intervenção, mas de uma ação orquestrada, onde o governo federal assumiu um papel efetivo na coordenação da mudança dessa arena no nível local, mas isso só foi possível dadas as pactuações que ocorreram no espaço de articulação e interação federativa, a CIT. Ou seja, essa ação orquestrada é a consolidação do que chamamos capacidade transformativa, derivada de aprendizagem organizacional dentro do MDS e aprendizagem institucional dele e das demais agências envolvidas nesse processo, e que gerou o resultado da construção de estruturas burocráticas municipais: equipamentos públicos e contratação de pessoal.

Agradecemos o apoio financeiro do CNPq no âmbito da Chamada MCTI-CNPq/MDS-SAGI No 24/2013 — Desenvolvimento Social. Registramos a contribuição valiosa dos/as pareceristas para que o artigo chegasse à versão aqui apresentada. Obviamente, são isentos de responsabilidade por quaisquer imprecisões, mas devem saber que nós agradecemos o trabalho sério e comprometido.

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  • Errata

    DOI - http://dx.doi.org/10.1590/0034-761242018
    No artigo “A capacidade transformativa do governo federal brasileiro na construção de uma burocracia da assistência social nos municípios”, com número de DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7612151018, publicado no periódico Revista de Administração Pública, 52(3):363-385, maio/jun. 2018, na página 363 e na página 385:
    Onde se lia:
    “Eleonora Martins Schettini Cunha”
    Leia-se:
    “Eleonora Schettini Martins Cunha”

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    17 Jun 2015
  • Aceito
    16 Jan 2018
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