Resumo
Neste artigo oferecemos um novo método para a obtenção do propagador da Eletrodinâmica. Para atingir esse objetivo faremos uso de alguns teoremas importantes da álgebra linear tais como o teorema de Cayley-Hamilton e alguns teoremas relacionados a operadores de projeção; fornecendo desta maneira uma aplicação da teoria de subespaços lineares na teoria quântica de campos.
Palavras-chave:
álgebra linear; teorema de Cayley-Hamilton; eletrodinâmica
Abstract
In this article we offer a new method to obtain the Propagator of Electrodynamics. In order to achieve this goal we will use some important theorems of linear algebra such as the Cayley-Hamilton theorem and some theorems related to projection operators; thus providing an application of linear subspace theory in quantum field theory.
Keywords:
linear algebra; Cayley-Hamilton's Theorem; electrodynamics
1. Introdução
Na Teoria Quântica de Campos (TQC) o cálculo do propagador é essencial para o desenvolvimento perturbativo na obtenção de seções de choque [1[1] C. Itzykson e J.B. Zuber, Quantum Field Theory (Mcgraw-hill, New York, 1980), p. 705.
[2] L.H. Ryder, Quantum Field Theory (Cambridge University Press, Cambridge, 1996).
[3] M.D. Schwartz, Quantum Field Theory and the Standard Model (Cambridge University Press, Cambridge, 2013).-4[4] M.E. Peskin e D.V. Schroeder, An Introduction to quantum field theory (Addison-Wesley Publishing Company, Boston, 1995).], assim como também para elucidar a natureza das excitações que surgem na interação entre partículas e campos [5[5] A. Accioly, J. Helayel-Neto, B. Pereira-Dias e C. Hernaski, Phys. Rev. D 86, 105046 (2012).
[6] A.P. Baeta Scarpelli, H. Belich, J.L. Boldo and J.A. Helayel-Neto, Phys. Rev. D 67, 085021 (2003).-7[7] J.L. Boldo, J.A. Helayel-Neto, L.M. Moraes, C.A.G. Sasaki e V.J. Vasquez Otoya, Phys. Lett. B 689, 112 (2010).]. Por essa razão, torna-se importante o conhecimento de diferentes métodos para calcular estes propagadores.
Neste trabalho apresentamos um método alternativo para o cálculo de propagadores, e o aplicamos para o caso da Eletrodinâmica. O método proposto é uma aplicação do Teorema de Cayley-Hamilton, no entanto, o conceito de projetores, e sua estreita relação com decomposição em soma direta, é muito útil no caso da Eletrodinâmica; fornecendo desta forma uma aplicação da Álgebra Linear [8[8] S. Lang, Linear Algebra (Springer-Verlag, New York, 2002).
[9] E.L. Lima, Álgebra Linear (IMPA, Rio de Janeiro, 2014).-10[10] S.J. Axler, Linear Algebra Done Right (Springer-Verlag, New York, 2015).] à TQC.
Iniciaremos apresentando o problema na seção (2) exemplificado pelo caso da Eletrodinâmica, tomando como ponto de partida a Lagrangiana e obtendo as equações de campo correspondente em termos do operador de onda. Na seção seguinte (3) faremos uma breve revisão de alguns conceitos e teoremas da Álgebra Linear, cujas demonstrações se encontram no Apêndice. Isto nos permite introduzir o método e apresentar suas implicações imediatas, além da sua aplicação. Dando continuidade, solucionaremos o problema para um operador de onda geral em (4); finalmente, em (5) aplicaremos o método para a obtenção do propagador da Eletrodinâmica.
2. Definição do Problema
Partiremos da Lagrangiana da Eletrodinâmica
sendo o potencial vetor, o tensor do campo eletromagnético e uma corrente externa. O termo de fixação de calibre, com o parâmetro , deve ser incluído para que seja possível realizar o cálculo do propagador. De fato, como será mostrado, sem este termo o operador de onda não seria inversível.
Podemos reescrevê-la como
onde é o operador de onda, dado por
As equações de campo se escrevem da forma
cuja solução é dada por
em que é a solução da equação homogênea associada a (1) e são as funções de Green do operador de onda, isto é, são as soluções do seguinte sistema de equações
Para solucionar (2) usamos as transformadas de Fourier
que ao serem substituídas em (2) nos fornece uma equação algébrica, cuja solução será dada pela inversão do operador de onda no espaço de momentos, dado por
ou, em termos dos operadores transverso T e longitudinal L,
Portanto, o cálculo das funções de Green se reduz basicamente ao problema de inversão de (3), sendo portanto o objetivo deste trabalho.
Para isso precisamos entender algumas definições matemáticas e um pouco mais sobre projetores.
3. Formalismo matemático
Como vimos, a obtenção das funções de Green se reduz à inversão de operadores lineares, sendo portanto um problema de Álgebra Linear. Tendo isto em mente, faremos uma revisão de alguns conceitos e teoremas da álgebra linear que serão usados para a inversão, os principais sendo o Teorema de Cayley-Hamilton e alguns resultados sobre Projetores e sua relação com decomposição em soma direta. As demonstrações dos teoremas enunciados nesta seção se encontram no Apêndice.
Dado um operador linear , onde V é um espaço vetorial de dimensão finita, seu polinômio característico é definido por
onde I é a matriz identidade (usaremos a mesma notação para o operador identidade) e é a matriz de T na base definida por
Como sabemos, o polinômio característico p de T nos fornece seus autovalores (raízes de p), e em particular nos permite saber se T é inversível, já que este é o caso se, e somente se, Além disso, como veremos a seguir, o polinômio característico também nos permite determinar o inverso T-1 de T.
Teorema 1.(teorema de Cayley-Hamilton) Sejaum operador linear e p o seu polinômio característico. Então p anula o operador T, isto é,
Teorema 2 (Polinômio Minimal) Seja um operador linear. Então existe um único polinômio de grau
mônico o qual é o polinômio mônico de menor grau dentre aqueles que anulam T, sendo denominado o polinômio minimal de T. Além disso, divide o polinômio característico de T e possui as mesmas raízes.
3.1. Consequência do Teorema de Cayley-Hamilton
Seja o polinômio característico de T, pelo teorema 1 temos
Agora, supondo que T seja inversível, ou seja, det e multiplicando ambos os membros da igualdade por T-1 obtemos donde
Assim, se T é inversível, então T-1 é uma combinação linear das potências de T e da identidade I, com coeficientes determinados pelo polinômio característico de T. Devemos observar que podemos utilizar qualquer polinômio que anule T, como por exemplo seu polinômio minimal p0, este tendo a possível vantagem de diminuir a ordem das potências que aparecem em (5), porém, encontrar p0 pode não ser uma tarefa fácil. Feita esta observação, discutiremos algumas implicações decorrentes de (5), que são relevantes em geral, e em particular para o caso de operadores de onda.
Suponhamos que T seja dado por uma combinação linear
o que ocorre com operadores de onda, como em (3), vemos que T-1, caso exista, será uma combinação linear de I e produtos dos operadores Ti. Temos assim a motivação para determinar os produtos
Um caso particular interessante ocorre quando pertencem a Lin (subespaço gerado pelos operadores Ti, isto é De fato, se for inversível, então ou seja, será uma combinação linear de I e dos Ti. Notemos que, neste caso, o subespaço Lin será uma subálgebra, ou seja, se T, sendo T inversível, então TU,
Definicao 1. Seja um operador linear. Dizemos que P é um projetor se, e somente se, Operadores deste tipo são ditos Idempotentes.
Uma consequência imediata é que todo vetor na imagem de um projetor P é seu autovetor com autovalor 1. De fato, se então ou seja, .
Teorema 3. Seja um projetor, então têm-se
Ou seja, um projetor P decompõe V como soma direta da sua imagem e do seu núcleo ker Além disso, (V) (ker P)+ dim(ImgP).
Teorema 4. Seja P um projetor, então I-P também é projetor. Além disso
Teorema 5. Seja a soma direta dos subespaços Wi. Se, para cada i, Bi é uma base de Wi, então a união delas é uma base do subespaço W, e portanto
4. Solução do Problema
Visto que o operador de onda no espaço de momentos (3) é escrito de forma semelhante a seguinte
onde Nosso objetivo principal será usar (9) para obter o operador inverso de (3) da forma mais geral possível. Para isso iniciaremos um estudo mais profundo dos operadores definidos por a fim de mostrar que são projetores e obtermos o núcleo e a imagem de cada um deles.
4.1. Operador L
Primeiro mostraremos que L é projetor, e para isto basta mostrar que o mesmo é idempotente, ou seja, De fato, temos
Dando continuidade, encontraremos as dimensões do núcleo e da imagem de L. Considere um vetor qualquer, assim temos
ou seja, mostrando que a imagem de L é o subespaço gerado pelo vetor Logo
uma vez que , pois estamos considerando o caso , e pelo teorema 3, segue-se que
4.2. Operador T
Da mesma forma que fizemos para L vamos mostrar que T é projetor. De fato, basta notar que , e a conclusão segue do teorema 4. Além disso, pelo teorema 3, concluímos que
Observação: como e , temos então assim, pela discussão da seção anterior, concluímos que caso seja inversível, então será uma combinação linear de I, L e T.
4.3. Polinômio Característico de M
Agora mostraremos como obter o polinômio característico do operador a partir dos resultados encontrados sobre L e . O ponto crucial para isto é a decomposição em soma direta
fato que decorre de L ser um projetor. De fato, levando em conta os resultados (10) e (11), escolhemos bases de ker L e de ImgL, obtendo assim uma base de , conforme o teorema 5. Como e , segue-se é uma base de autovetores comuns a L e T, de maneira explícita,
Aplicando M a e a , temos
Logo a matriz de M na base B é dada por
portanto, o polinômio característico de é
Logo M é inversível se, e somente se, , o que equivale a dizer que , .
4.4. Polinômio Minimal de M
Agora, obteremos o polinômio minimal de M, notando que existem duas possibilidades, a saber, e .
Consideremos primeiramente , neste caso mostraremos que é o polinômio minimal de M. Como é o polinômio mônico de menor grau que possui as mesmas raízes que o polinômio característico de M, basta mostrar que anula M. De fato, aplicando aos vetores da base B, obtemos
e de forma análoga,
Portanto, conclui-se que é mesmo o polinômio minimal de M para .
Já para , o polinômio minimal de M é . Com efeito, neste caso tal polinômio mônico é o de menor grau que possui as mesmas raízes que o característico de M, e como temos .
5. Cálculo do Propagador
Por fim, vamos aplicar o método e obter partindo do polinômio minimal de M, para o caso . Como
então
multiplicando ambos os membros por , temos
como ,
portanto,
Notemos que este resultado também é válido para , pois neste caso temos . Diante do resultado (13) é evidente que para encontrarmos o inverso de (3) basta invertermos os termos que acompanham os operadores L e T, assim obtemos
6. Conclusão e Perspectivas
Neste artigo foi abordado o problema da obtenção do propagador da Eletrodinâmica de forma alternativa obtendo o resultado já conhecido na literatura [5[5] A. Accioly, J. Helayel-Neto, B. Pereira-Dias e C. Hernaski, Phys. Rev. D 86, 105046 (2012).
[6] A.P. Baeta Scarpelli, H. Belich, J.L. Boldo and J.A. Helayel-Neto, Phys. Rev. D 67, 085021 (2003).-7[7] J.L. Boldo, J.A. Helayel-Neto, L.M. Moraes, C.A.G. Sasaki e V.J. Vasquez Otoya, Phys. Lett. B 689, 112 (2010).].
Embora o método seja um pouco trabalhoso, este nos oferece uma forma mais rica de realizar este cálculo, uma vez que faz amplo uso dos métodos da álgebra linear, permitindo assim a sua utilização nas matérias de Física ou Matemática elementares como um exemplo de aplicação.
Visto que o método nos oferece uma separação em soma direta de subespaços; será interessante saber se o método pode ter utilidade prática, sendo, por isso, necessário generalizá-lo para obter o propagador do graviton, onde sabe-se que aparecem setores não diagonais no cálculo do propagador [5[5] A. Accioly, J. Helayel-Neto, B. Pereira-Dias e C. Hernaski, Phys. Rev. D 86, 105046 (2012).
[6] A.P. Baeta Scarpelli, H. Belich, J.L. Boldo and J.A. Helayel-Neto, Phys. Rev. D 67, 085021 (2003).-7[7] J.L. Boldo, J.A. Helayel-Neto, L.M. Moraes, C.A.G. Sasaki e V.J. Vasquez Otoya, Phys. Lett. B 689, 112 (2010).].
Referências
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[1]C. Itzykson e J.B. Zuber, Quantum Field Theory (Mcgraw-hill, New York, 1980), p. 705.
-
[2]L.H. Ryder, Quantum Field Theory (Cambridge University Press, Cambridge, 1996).
-
[3]M.D. Schwartz, Quantum Field Theory and the Standard Model (Cambridge University Press, Cambridge, 2013).
-
[4]M.E. Peskin e D.V. Schroeder, An Introduction to quantum field theory (Addison-Wesley Publishing Company, Boston, 1995).
-
[5]A. Accioly, J. Helayel-Neto, B. Pereira-Dias e C. Hernaski, Phys. Rev. D 86, 105046 (2012).
-
[6]A.P. Baeta Scarpelli, H. Belich, J.L. Boldo and J.A. Helayel-Neto, Phys. Rev. D 67, 085021 (2003).
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[7]J.L. Boldo, J.A. Helayel-Neto, L.M. Moraes, C.A.G. Sasaki e V.J. Vasquez Otoya, Phys. Lett. B 689, 112 (2010).
-
[8]S. Lang, Linear Algebra (Springer-Verlag, New York, 2002).
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[9]E.L. Lima, Álgebra Linear (IMPA, Rio de Janeiro, 2014).
-
[10]S.J. Axler, Linear Algebra Done Right (Springer-Verlag, New York, 2015).
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
2019
Histórico
-
Recebido
26 Jul 2018 -
Revisado
05 Nov 2018 -
Aceito
07 Nov 2018