Acessibilidade / Reportar erro

Os 40 anos do descobrimento do bóson Z0: o mediador de correntes neutras

Forty years of the discovery of the Z0 boson: the mediator of neutral current interactions

Resumos

A descoberta dos bósons vetoriais massivos Z0 e W foi um marco na construção do Modelo Padrão das Partículas Elementares e permitiu a compreensão de uma gama de mecanismos de produção medidos em laboratório. Este artigo apresenta os aspectos gerais sobre teoria e instrumentação que levaram à descoberta do bóson vetorial massivo Z0 em 1983, uma das partículas mediadoras da Força Fraca e responsável pelas interações de correntes neutras. Uma breve contextualização histórica da construção da Teoria das Interações Fracas é feita, desde a descoberta da radioatividade até a proposta de sua unificação com a Eletrodinâmica Quântica, bem como a descrição dos principais experimentos envolvidos e discussão dos resultado obtidos. Por fim, os resultados obtidos nos experimentos UA1 e UA2 do Spp¯S são apresentados, os quais levaram ao Prêmio Nobel de 1984.

Palavras-chave:
Física de partículas; bóson vetorial massivo neutro; teoria eletrofraca; física experimental de altas energias


The discovery of the massive vectorial bosons Z0 and W was a milestone in the development of the Standard Model of Elementary Particles and provided a comprehension of a wide range of experimentally measured production mechanisms. This article presents an overview of the theory and instrumentation which led to the discovery of the massive vector boson Z0 in 1983, one of the mediators of the weak force and responsible for neutral current interactions. A brief historical context of the the development of the Theory of Weak Interactions is done, from the discovery of radioactivity to its unification with the Quantum Electrodynamics, as well as a description of the key experiments involved and a discussion of the obtained results. Finally, the results obtained by the UA1 and UA2 experiments at Spp¯S are presented, which resulted in the 1984 Nobel Prize.

Keywords:
Particle physics; neutral massive vector boson; electroweak theory; high energy experimental physics


1. Introdução

Há mais de quarenta anos, em 1º de junho de 1983, físicos do Super Síncrotron de Próton–Antipróton (do inglês, Super Proton-Antiproton SynchrotronSpp¯S) anunciaram a descoberta do bóson vetorial massivo Z0, uma das partículas mediadoras da Força Fraca, caracterizada pelas ditas interações de corrente neutra (CN) [1[1] E.C.F.S. Fortes, M.C. Tijero e V. Pleitez, Rev. Bras. Ens. Fis. 29, 415 (2007).]. A ideia da existência dessa partícula surgiu das previsões da Teoria Eletrofraca (do inglês, Electroweak Theory – EWT) proposta por Glashow, Salam e Weinberg na década de 1960, que unificou as teorias da Eletrodinâmica Quântica (do inglês, Quantum Electrodynamics – QED)1 1 Para uma introdução sobre os conceitos da interação eletromagnética a nível quântico, veja a Ref. [2]. e das Interações Fracas. Assim como o bóson W, é chamado de bóson vetorial por possuir spin unitário, e tem a característica de ser também a sua antipartícula. Os bósons Z0 e W, diferentemente dos outros mediadores de força, como o fóton e o glúon, são partículas massivas, o que nos remete à teoria de Hideki Yukawa para as interações fortes nucleares mediadas por mésons massivos [3[3] H. Yukawa, Proc. Phys. Math. Soc. Jap. 17, 48 (1935).]. Essa foi a conclusão de uma longa história que começou no final do século XIX com a descoberta do decaimento β e culminou na corroboração da Teoria Eletrofraca através da medida da massa dos bósons Z0 e W no acelerador Spp¯S.

No Universo, todas as interações entre as partículas podem ser dividas em quatro tipos fundamentais [4[4] M.A. Moreira, Rev. Bras. Ens. Fis. 31, 1 (2009)., 5[5] F. Ostermann, Partículas elementares e interações fundamentais (Instituto de Física-UFRGS, Porto Alegre, 2001).]: eletromagnética, fraca, forte e gravitacional. Cada uma dessas interações está associada a um “gerador”, uma propriedade física responsável por gerar a interação correspondente, dando origem a uma força. Do ponto de vista subatômico, onde as partículas interagem através de campos, a transmissão da interação ocorre através de uma partícula mediadora. A interação eletromagnética, que atua em partículas eletricamente carregadas, é mediada pelo fóton (γ). A interação fraca, responsável pelo decaimento radioativo, é mediada pelos bósons W e Z0. A interação forte, que mantém a estrutura de prótons e nêutrons, é mediada pelos glúons. Quanto à interação gravitacional, é previsto teoricamente que o gráviton seja sua partícula mediadora, mas ainda não há evidências experimentais que corroborem essa hipótese [6[6] F. Dyson, Int. J. Mod. Phys. A 28, 1330041 (2013).].

A história das Interações Fracas começa nos primeiros indícios da existência do fenômeno da radioatividade, no final do século XIX, por Henri Becquerel2 2 Para uma discussão resumida, veja https://spark.iop.org/henri-becquerel-discovers-radioactivity. ao observar que sais de Urânio fluorescentes emitiam radiação sem estímulo externo. Anos mais tarde, trabalhos de Marie Curie, Pierre Curie e Ernest Rutherford contribuíram para a caracterização da radiação nuclear em α (núcleos de Hélio), β (elétrons e pósitrons) e γ (fótons). Dois tipos de decaimento β eram observados:

(1) Y Z A Y Z 1 A + e + (decaimento β + ), Y Z A Y Z + 1 A + e (decaimento β ) ,

onde A é a massa atômica, Z é o número atômico, X é o nuclídeo antes do decaimento e Y é o nuclídeo após o decaimento. Vemos diretamente da Equação 1 duas inconsistências que indicam que a interpretação do decaimento não era ainda totalmente compreendida. A primeira delas era a violação da conservação do momento angular. No decaimento, o número total de núcleons (prótons e nêutrons) do elemento filho se mantinha o mesmo que o do elemento pai. Assim, esperava-se que a diferença entre os spins fosse um número inteiro (ℏ), contudo o elétron possui spin semi-inteiro (ℏ/2). A segunda era a violação da conservação de energia, pois evidências experimentais, como na Figura 1, apontavam para um espectro de energia contínuo dos elétrons. Na tentativa de resolver essas questões, Wolfgang Pauli [7[7] W. Pauli, Pauli letter collection (Springer, Londres, 1930).] propôs uma nova partícula, o neutrino3 3 Originalmente, Pauli nomeou essa nova partículas como nêutron, contudo, com a descoberta do nêutron, Fermi propôs chamá-lo de neutrino como forma de indicar uma partícula neutra mais leve. Veja detalhes na Ref. [8]. , de spin ℏ/2, leve e neutra, que também participava do decaimento, de forma que podemos reescrever a Equação 1:

(2) Y Z A Y Z 1 A + e + + v , Y Z A Y Z + 1 A + e + ν ¯ ,
Figura 1
Espectro de energia dos elétrons produto do decaimento β de B83210iP84210o+e+ν¯e. Ajuste dos dados da Ref. [10[10] G.J. Neary, Proc. R. Soc. Lond. A 175, 71 (1940).] empregando a teoria de Fermi introduzida na Seção 2 2. Descrição Teórica 2.1. Interações Fracas Enrico Fermi foi o primeiro a teorizar sobre as transições do decaimento β no núcleo [14]. Incorporando a ideia do neutrino de Pauli, Fermi fez uma analogia com o decaimento γ, pois, se o núcleo podia emitir e criar um fóton, também poderia ser possível criar um elétron e um neutrino (do elétron4) desde que houvesse energia suficiente para tal. Além disso, a interação acontecia em um único ponto, como mostra o diagrama do decaimento de um nêutron na Figura 2. Utilizando a Mecânica Quântica em segunda quantização para descrever estados dos elétrons e neutrinos, Fermi modelou que o processo de decaimento se dá através da aniquilação e criação dessas partículas por meio de um Hamiltoniano de interação, onde foi considerado que a velocidade das partículas do núcleo são muitos menores que a da luz [15]: (4) H int = g Q ψ ˜ * δ φ + Q * ψ ˜ δ φ * , Figura 2 Diagrama do decaimento β− no modelo de Fermi. onde ψ, ψ˜, φ e φ˜ são as amplitudes de probabilidade do elétron e do neutrino e seus respectivos complexos conjugados, Q é o operador de transição do próton para o nêutron e Q* o oposto, g é uma constante e δ é uma matriz dada por: (5) δ = 0 − 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 0 0 − 1 0 . O primeiro termo da Equação 4 corresponde à transição de próton para nêutron e a aniquilação de elétron e neutrino. Já o segundo termo é a mudança de nêutron para próton e a criação um elétron e um neutrino. Pela teoria de perturbação dependente do tempo, a taxa de transição de um estado inicial para um estado final é dado pela Regra de Ouro de Fermi [16]: (6) Γ i → f = 2 π ℏ | Ψ f | H ′ | Ψ i | 2 ρ ( E f ) , onde Ψi e Ψf são os estados inicial e final, respectivamente, H′ é o Hamiltoniano de perturbação e ρ(Ef) é a densidade de estados com a energia do estado final. Aplicando para o caso de um decaimento β, tal que n→p+ν¯+e−, calculando a matriz de perturbação e a densidade de estados, chegamos à taxa de decaimento β [11]: (7) Γ i → f = G F 2 c 2 π 3 ℏ | M | 2 ( E 0 − K e ) 2 ( K e + m e c 2 ) p e F ( Z D , T e ) , onde GF = g é a constante universal de Fermi5, M é o elemento de matriz nuclear, E0 é a energia total, Ke é a energia cinética do elétron, pe é o momento do elétron e F(ZD, Te) é o fator de Fermi, que leva em conta interações Coulombianas. O grande trunfo de Fermi foi explicar o espectro contínuo de energia do elétron, como mostrado na Figura 2, porém sua teoria tinha limitações, como não prever a violação de paridade, observada anos mais tarde no decaimento do Cobalto [17], e divergir em processos de mais alta ordem. Mesmo com posteriores correções ao modelo, não houve, até meados da década de 1960, uma teoria que explicasse as Interações Fracas de forma satisfatória. 2.2. Teoria Eletrofraca A primeira tentativa de unificação da QED com a Força Fraca foi inicialmente proposta em 1961 por Sheldon Glashow [18] ao fazer uso do trabalho de seu orientador, Julian Schwinger [19], que introduziu a existência de “bósons vetoriais intermediários” nas Interações Fracas e, junto com fóton, eles faziam parte da mesma família de partículas [20]. Glashow propôs a unificação da interação eletromagnética e fraca baseado em uma simetria de calibre do tipo Yang-Mills, isto é, não-abeliana [21], e um grupo de calibre SU(2) × U(1). Pela primeira vez foi introduzido um bóson vetorial neutro, que seria posteriormente chamado de bóson Z0, junto com dois bósons vetoriais carregados e o fóton. Entretanto, a simetria das teorias do tipo Yang-Mills impõe que os bósons não podem ter massa, o que fez com que Glashow forçasse uma quebra de simetria para resolver o problema. Posteriormente, em 1964, tentativas semelhantes foram feitas por Abdus Salam e John Ward [22], contudo o responsável por resolver essa questão foi Steven Weinberg, em 1967, ao inserir a quebra espontânea de simetria através do Mecanismo de Brout-Englert-Guralnik-Hagen-Higgs-Kibble [23,24,25] como responsável por prover massa aos bósons vetoriais [26]. A massa das partículas é resultado da interação delas com um campo escalar, o campo de Higgs [27], que permeia todo o Universo. Antes da quebra espontânea de simetria, o valor do ponto de equilíbrio ⟨ϕ⟩ do sistema no campo de Higgs é nulo e todas as partículas não possuíam massa. Após a quebra, o ponto de equilíbrio adquire um valor diferente de zero, como mostra a Figura 3, e as partículas adquirem massa após interagir com esse campo. Logo, ao assumir um valor mínimo, o potencial de Higgs quebra sua simetria. A massa da partícula relacionada ao campo escalar é escrita como [11]: (8) M H = 1 c 2 g H ε 0 ℏ c ϕ , Figura 3 Processo de quebra de espontânea de simetria. (Esquerda) O estado em que o valor esperado do vácuo é nulo e todas as partículas não possuem massa. (Direita) Após a quebra espontânea de simetria, o valor esperado do vácuo é não-nulo e as partículas adquirem massa. onde gH é a constante de acoplamento da partícula com o campo de Higgs. Na Teoria Eletrofraca, as interações podem ocorrer por corrente carregada (CC), mediadas pelos vetoriais bósons W±, e por CNs, mediadas pelo bóson vetorial Z0[28] (para uma revisão, veja Ref. [21]). Em interações com CC, ocorre a mudança de carga, como exemplificado pelo decaimento β−, descrito por n→p+ν¯e−+e− e ilustrado à esquerda na Figura 4, onde observa-se que o quark d se torna o quark u ao interagir com o bóson W−. Por outro lado, não há mudança quando a interação ocorre por intermédio do bóson Z0, como mostra a imagem à direita na Figura 4, onde a interação do bóson Z0 mantém inalterada a carga das partículas. Aplicando o Mecanismo de Higgs, as massas dos bósons W e Z0 foram previstas teoricamente [28, 29] como sendo: (9) m W = π α 2 G F 1 / 2 1 sin θ W = 92 ± 2GeV/ c 2 , m Z = M W cos θ W = 82 ± 2GeV/ c 2 , Figura 4 (Esquerda) Diagrama de Feynman do decaimento β− do nêutron. O nêutron emite um ν¯e e um e− por meio da interação do quark down via CC. (Direita) Diagrama de Feynman do processo e− + νμ → e− + νμ. A interação das partículas νμ e e− com o bóson Z0 não altera suas cargas, dado que a partícula mediadora é neutra. Para uma discussão sobre estes tipos de diagramas, veja a Ref. [31]. onde α = 1/137 é a constante de estrutura fina e θW é o ângulo de Weinberg, que é um parâmetro da Teoria Eletrofraca. Uma vez em posse de uma teoria unificada que pretende descrever os fenômenos envolvendo tanto as interações eletromagnética e fraca a nível quântico simultaneamente, precisamos testar suas predições em laboratório. Desta forma, diferentes grupos em laboratórios de pesquisa ao redor do mundo se dedicaram a testar os diferentes parâmetros da teoria, sendo o mais relevante a obtenção da medida da massa das partículas mediadores das interações. Um grande passo neste sentido foi a observação do bóson de Higgs em 2012 no CERN, comemorando no ano de 2022 os seus 10 anos de sua descoberta [30]. e deduzida na Ref. [11[11] A. Belyaev e D. Ross, The Basics of Nuclear and Particle Physics (Springer International Publishing, Nova York, 2021).]. O espectro é dado em unidades de elétron-volt (eV), correspondendo à energia cinética adquirida por um elétron acelerado do repouso por uma diferença de potencial de 1 V no vácuo: 1 eV = 1,602 176 634 × 10−19 J [9[9] Particle Data Group, R.L. Workman, V.D. Burkert, V. Crede, E. Klempt, U. Thoma, L. Tiator, K. Agashe, G. Aielli, B.C. Allanach et al., Progress of Theoretical and Experimental Physics 2022, 083C01 (2022).]. No caso acima, MeV corresponde a megaelétron-volt, ou 106 eV.

onde ν e v¯ são os neutrino e o antineutrino, respectivamente. Nos anos 1950 e 1960 é descoberto que existia, na verdade, três tipos de neutrinos: do elétron, do múon e do tau, e suas antipartículas associadas. Logo, no caso da Equação 2, ν e v¯ dizem respeito ao neutrino e antineutrino do elétron. Inicialmente tidos como partículas sem massa, atualmente sabe-se que os neutrinos devem possuir uma pequeníssima massa [9[9] Particle Data Group, R.L. Workman, V.D. Burkert, V. Crede, E. Klempt, U. Thoma, L. Tiator, K. Agashe, G. Aielli, B.C. Allanach et al., Progress of Theoretical and Experimental Physics 2022, 083C01 (2022).]. Outro fato intrigante era a origem do elétron do decaimento, pois o modelo atômico de Niels Bohr [12[12] N. Bohr, Phil. Mag. Ser. 26, 1 (1913).] previa orbitas eletrônicas sem elétrons no núcleo. A descoberta do nêutron por James Chadwick em 1932 [13[13] J. Chadwick, Proc. R. Soc. Lond. A 136, 692 (1932).] trouxe um entendimento mais claro de que o elétron emitido era produzido no núcleo a partir da transformação do nêutron para o próton e, de forma análoga, para o pósitron. O processo de decaimento β do próton pode ser descrito como:

(3) p n + e + + ν e , n p + e + ν ¯ e .

A descoberta do nêutron e uma melhor compreensão do decaimento β permitiram o desenvolvimento dos primeiros modelos teóricos na tentativa de explicar de forma mais robusta como esses processos ocorriam. Esses avanços foram fundamentais para a posterior unificação da Força Fraca com a Força Eletromagnética na Teoria Eletrofraca e na previsão da existência de um bóson massivo responsável pelas interações de CN. Neste artigo descreveremos os aspectos experimentais e históricos envolvidos na descoberta do bóson Z0, anunciada há mais de 40 anos atrás, desde os primeiros indícios de sua existência nas fotos do experimento Gargamelle até a medida direta de sua massa no acelerador Spp¯S. Na Seção 2 2. Descrição Teórica 2.1. Interações Fracas Enrico Fermi foi o primeiro a teorizar sobre as transições do decaimento β no núcleo [14]. Incorporando a ideia do neutrino de Pauli, Fermi fez uma analogia com o decaimento γ, pois, se o núcleo podia emitir e criar um fóton, também poderia ser possível criar um elétron e um neutrino (do elétron4) desde que houvesse energia suficiente para tal. Além disso, a interação acontecia em um único ponto, como mostra o diagrama do decaimento de um nêutron na Figura 2. Utilizando a Mecânica Quântica em segunda quantização para descrever estados dos elétrons e neutrinos, Fermi modelou que o processo de decaimento se dá através da aniquilação e criação dessas partículas por meio de um Hamiltoniano de interação, onde foi considerado que a velocidade das partículas do núcleo são muitos menores que a da luz [15]: (4) H int = g Q ψ ˜ * δ φ + Q * ψ ˜ δ φ * , Figura 2 Diagrama do decaimento β− no modelo de Fermi. onde ψ, ψ˜, φ e φ˜ são as amplitudes de probabilidade do elétron e do neutrino e seus respectivos complexos conjugados, Q é o operador de transição do próton para o nêutron e Q* o oposto, g é uma constante e δ é uma matriz dada por: (5) δ = 0 − 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 0 0 − 1 0 . O primeiro termo da Equação 4 corresponde à transição de próton para nêutron e a aniquilação de elétron e neutrino. Já o segundo termo é a mudança de nêutron para próton e a criação um elétron e um neutrino. Pela teoria de perturbação dependente do tempo, a taxa de transição de um estado inicial para um estado final é dado pela Regra de Ouro de Fermi [16]: (6) Γ i → f = 2 π ℏ | Ψ f | H ′ | Ψ i | 2 ρ ( E f ) , onde Ψi e Ψf são os estados inicial e final, respectivamente, H′ é o Hamiltoniano de perturbação e ρ(Ef) é a densidade de estados com a energia do estado final. Aplicando para o caso de um decaimento β, tal que n→p+ν¯+e−, calculando a matriz de perturbação e a densidade de estados, chegamos à taxa de decaimento β [11]: (7) Γ i → f = G F 2 c 2 π 3 ℏ | M | 2 ( E 0 − K e ) 2 ( K e + m e c 2 ) p e F ( Z D , T e ) , onde GF = g é a constante universal de Fermi5, M é o elemento de matriz nuclear, E0 é a energia total, Ke é a energia cinética do elétron, pe é o momento do elétron e F(ZD, Te) é o fator de Fermi, que leva em conta interações Coulombianas. O grande trunfo de Fermi foi explicar o espectro contínuo de energia do elétron, como mostrado na Figura 2, porém sua teoria tinha limitações, como não prever a violação de paridade, observada anos mais tarde no decaimento do Cobalto [17], e divergir em processos de mais alta ordem. Mesmo com posteriores correções ao modelo, não houve, até meados da década de 1960, uma teoria que explicasse as Interações Fracas de forma satisfatória. 2.2. Teoria Eletrofraca A primeira tentativa de unificação da QED com a Força Fraca foi inicialmente proposta em 1961 por Sheldon Glashow [18] ao fazer uso do trabalho de seu orientador, Julian Schwinger [19], que introduziu a existência de “bósons vetoriais intermediários” nas Interações Fracas e, junto com fóton, eles faziam parte da mesma família de partículas [20]. Glashow propôs a unificação da interação eletromagnética e fraca baseado em uma simetria de calibre do tipo Yang-Mills, isto é, não-abeliana [21], e um grupo de calibre SU(2) × U(1). Pela primeira vez foi introduzido um bóson vetorial neutro, que seria posteriormente chamado de bóson Z0, junto com dois bósons vetoriais carregados e o fóton. Entretanto, a simetria das teorias do tipo Yang-Mills impõe que os bósons não podem ter massa, o que fez com que Glashow forçasse uma quebra de simetria para resolver o problema. Posteriormente, em 1964, tentativas semelhantes foram feitas por Abdus Salam e John Ward [22], contudo o responsável por resolver essa questão foi Steven Weinberg, em 1967, ao inserir a quebra espontânea de simetria através do Mecanismo de Brout-Englert-Guralnik-Hagen-Higgs-Kibble [23,24,25] como responsável por prover massa aos bósons vetoriais [26]. A massa das partículas é resultado da interação delas com um campo escalar, o campo de Higgs [27], que permeia todo o Universo. Antes da quebra espontânea de simetria, o valor do ponto de equilíbrio ⟨ϕ⟩ do sistema no campo de Higgs é nulo e todas as partículas não possuíam massa. Após a quebra, o ponto de equilíbrio adquire um valor diferente de zero, como mostra a Figura 3, e as partículas adquirem massa após interagir com esse campo. Logo, ao assumir um valor mínimo, o potencial de Higgs quebra sua simetria. A massa da partícula relacionada ao campo escalar é escrita como [11]: (8) M H = 1 c 2 g H ε 0 ℏ c ϕ , Figura 3 Processo de quebra de espontânea de simetria. (Esquerda) O estado em que o valor esperado do vácuo é nulo e todas as partículas não possuem massa. (Direita) Após a quebra espontânea de simetria, o valor esperado do vácuo é não-nulo e as partículas adquirem massa. onde gH é a constante de acoplamento da partícula com o campo de Higgs. Na Teoria Eletrofraca, as interações podem ocorrer por corrente carregada (CC), mediadas pelos vetoriais bósons W±, e por CNs, mediadas pelo bóson vetorial Z0[28] (para uma revisão, veja Ref. [21]). Em interações com CC, ocorre a mudança de carga, como exemplificado pelo decaimento β−, descrito por n→p+ν¯e−+e− e ilustrado à esquerda na Figura 4, onde observa-se que o quark d se torna o quark u ao interagir com o bóson W−. Por outro lado, não há mudança quando a interação ocorre por intermédio do bóson Z0, como mostra a imagem à direita na Figura 4, onde a interação do bóson Z0 mantém inalterada a carga das partículas. Aplicando o Mecanismo de Higgs, as massas dos bósons W e Z0 foram previstas teoricamente [28, 29] como sendo: (9) m W = π α 2 G F 1 / 2 1 sin θ W = 92 ± 2GeV/ c 2 , m Z = M W cos θ W = 82 ± 2GeV/ c 2 , Figura 4 (Esquerda) Diagrama de Feynman do decaimento β− do nêutron. O nêutron emite um ν¯e e um e− por meio da interação do quark down via CC. (Direita) Diagrama de Feynman do processo e− + νμ → e− + νμ. A interação das partículas νμ e e− com o bóson Z0 não altera suas cargas, dado que a partícula mediadora é neutra. Para uma discussão sobre estes tipos de diagramas, veja a Ref. [31]. onde α = 1/137 é a constante de estrutura fina e θW é o ângulo de Weinberg, que é um parâmetro da Teoria Eletrofraca. Uma vez em posse de uma teoria unificada que pretende descrever os fenômenos envolvendo tanto as interações eletromagnética e fraca a nível quântico simultaneamente, precisamos testar suas predições em laboratório. Desta forma, diferentes grupos em laboratórios de pesquisa ao redor do mundo se dedicaram a testar os diferentes parâmetros da teoria, sendo o mais relevante a obtenção da medida da massa das partículas mediadores das interações. Um grande passo neste sentido foi a observação do bóson de Higgs em 2012 no CERN, comemorando no ano de 2022 os seus 10 anos de sua descoberta [30]. , realizaremos um breve desenvolvimento da descrição teórica da interação fraca e sua posterior unificação com a QED. Na Seção 3 3. Introdução aos Aceleradores de Partículas Acelerar partículas é um procedimento de utilidade para diversas áreas, desde as mais acadêmicas, como a Física Experimental de Altas Energias no estudo dos constituintes fundamentais da matéria, até as mais aplicadas, como a Medicina no tratamento do câncer [32] e a Ciência dos Materiais na caracterização de novos materiais. No contexto da Física de Partículas, busca-se acelerar partículas até uma energia suficiente para que uma reação entre elas produza outras partículas advindas de processos de interação que sejam de interesse de estudo. Um exemplo relacionado às Interações Fracas é o decaimento de um bóson Z0, que foi produzido por uma colisão de um próton (p) e um antipróton (p¯), em um par elétron-pósitron: (10) p + p ¯ → ( u u d ) + ( u ¯ u ¯ d ¯ ) → Z + X → e + + e − + X , onde o próton e o antipróton são caracterizados pelos seus quarks constituintes6. Após a aniquilação do quark u do próton e um antiquark u¯ do antipróton, a estrutura de ambos se quebra gerando um estado hadrônico X como resultado da dissociação do próton e do antipróton. Uma vez que se detecta o produto do decaimento do bóson Z0, conseguimos inferir informações sobre a partícula original utilizando cinemática, conservação de energia e momento linear, massa e entre outros. Para que seja possível produzir o bóson Z0 pelo processo descrito na Equação 10, é necessário que a energia da colisão seja grande o suficiente para gerar uma partícula com a massa do bóson Z0. Para tratar da energia da colisão em aceleradores, costuma-se utilizar o referencial do centro de massa (CM), no qual as partículas têm momentos de mesmo módulo e direções opostas. Usa-se muito na Física de Partículas a variável de Mandelstam s [35] para representar o quadrado da energia da colisão: (11) s = ∑ i = 1 2 E i 2 − ∑ i = 1 2 p → i 2 = ( E 1 + E 2 ) 2 − ( p → 1 + p → 2 ) 2 , onde E1 e E2 é a energia das partículas 1 e 2 da colisão, respectivamente. Tomando que o CM das partículas em colisão está em repouso no ponto de colisão, teremos p→1=−p→2: (12) s ≡ E C M 2 = ( E 1 + E 2 ) 2 , onde ECM é a energia total de centro de massa do sistema, o qual é tipicamente tomado como a origem do sistema de coordenadas de um experimento. Dessa forma, s é a energia total da colisão no referencial do CM. A frequência com que ocorrem os eventos de produção e decaimento de partículas impacta de forma significativa no tempo de funcionamento do acelerador e na estatística dos dados. Define-se a grandeza Luminosidade (L), que depende única e exclusivamente das características do acelerador, para determinar o número de colisões por unidade de tempo e unidade de área, de forma que a taxa de eventos de um processo i é escrito como: (13) d N i d t = σ i ⋅ L , onde Ni é o número de eventos i e σi é a seção de choque do processo i. Assim, dependendo da luminosidade atingida com um dado acelerador, espera-se produzir um certo número de eventos da partícula de interesse relacionada ao processo determinado pela seção de choque σi. Tipicamente se utiliza a chamada luminosidade integrada, L=∫Ldt, onde o período de 1 ano de operação de um acelerador é tomado como 107 s7. De modo geral, o processo de aceleração envolve a interação de partículas carregadas com campos eletromagnéticos, sendo essencialmente o mesmo, independente do tipo de acelerador. Há dois tipos de aceleradores: linear, onde a partícula atravessa apenas uma vez a linha de aceleração, e circular, onde a partícula realiza trajetórias circulares devido a ação de um campo magnético até atingir a energia almejada. No regime de altas energias, quando a partícula atinge velocidade relativística, o cálculo da sua energia cinética precisa ser corretamente ajustado visto que a velocidade da partícula está limitada à velocidade da luz. Como mostrado na Figura 5, a expressão usual da energia cinética obtida da Mecânica Clássica levaria a um resultado não-físico. Em termos relativísticos, o aumento de velocidade das partículas se torna cada vez mais custoso: pequenos incrementos de velocidade das partículas necessitam de grandes quantidades de energia dado que a velocidade da partícula tende assintoticamente à velocidade da luz, como mostra a linha sólida na Figura 5. Logo, isso impõe que os aceleradores lineares tenham um comprimento muito grande, geralmente sendo utilizados para acelerar prótons até energias da ordem de GeV. Por outro lado, conseguimos atingir energias muito maiores, na escala do TeV, em aceleradores circulares devido à trajetória circular que permite acelerar as partículas inúmeras vezes. Figura 5 Fator de Lorentz do próton (β = v/c) nos regimes clássico e relativístico. O primeiro acelerador do tipo cíclico foi o cíclotron construído e patenteado por Ernest Lawrence em 1931 [36, 37]. Neste acelerador, a partícula era acelerada num campo magnético obtendo uma trajetória em espiral dentro de uma câmara à vácuo. Contudo, a trajetória espiral sem raio fixo dificultava o alcance de maiores energias, limitação que pode ser superada com o advento dos aceleradores do tipo síncrotron. 3.1. Síncrotron O síncrotron é um tipo de acelerador cíclico caracterizado por manter a partícula em uma trajetória circular de raio fixo com um campo magnético que aumenta em função do tempo. A relação que envolve o raio da trajetória com o momento da partícula carregada em movimento num campo magnético é dada por [38]: (14) 1 R = e B c p = constante, onde R é o raio da trajetória, e é a carga elementar, B é o módulo do campo magnético externo, c é a velocidade da luz e p é o momento da partícula. Assim, à medida que a partícula vai acelerando dentro do síncrotron, o campo magnético gerado pelos dipolos magnéticos deve crescer de forma proporcional para manter o raio constante. O processo de aceleração ocorre pelo método de cavidades de rádio-frequência ressonantes, que consistem em tubos de arraste (do inglês, drift tubes) com um campo elétrico gerado por um campo magnético oscilante sincronizados de forma que a partícula atravesse o tubo no momento em que campo elétrico aponta no sentido do movimento da partículas, caso contrário ela será desacelerada. Para que a sincronização ocorra, a frequência de oscilação do campo magnético deve ser um múltiplo inteiro da frequência de revolução da partícula no síncrotron. Como pode-se observar pela Equação 14, uma das maiores limitações desse tipo de acelerador está no ímã, que deve gerar um campo magnético de módulo cada vez maior devido ao aumento do momento da partícula. Outra limitação está relacionada com a perda de energia por efeito Joule, que diminui a eficácia do ímã pela perda de suas propriedades magnéticas. Em aceleradores mais modernos, o uso de supercondutores permitiu um aumento significativo na energia de colisão. A radiação síncrotron, onde fótons são emitidos pelas partículas aceleradas, é também uma importante limitação do acelerador, pois ela aumenta com o velocidade da partícula. Devido à sua menor massa, o elétron perde cerca de 103 mais energia por este tipo de radiação se comparado ao próton [11]. Na Figura 6 é possível observar uma representação esquemática simplificada da montagem de um síncrotron, onde ímãs (dipolos e quadrupolos magnéticos) estão em vermelho e as cavidades de radio-frequência estão em verde. Os imãs atuam para desviar o feixe nas curvas e as cavidade efetuam a aceleração das partículas nos trechos em linha reta. Figura 6 Ilustração simplificada de um acelerador do tipo síncrotron. As partículas são primeiramente aceleradas em um acelerador linear e entram no síncrotron pelo injetor. Os ímãs, em vermelho, são responsáveis pela alteração da trajetória e focalização do feixe e as cavidades de radiofrequência, em verde, fazem a aceleração das partículas. , faremos uma introdução à física dos aceleradores lineares e circulares. Na Seção 4 4. Acelerando Prótons com um Síncrotron O Síncrotron de Prótons (do inglês, Proton Synchrotron – PS) foi o primeiro acelerador do tipo síncrotron da história da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (do francês, Conseil Européen pour la Recherche Nucléaire – CERN) e o mais poderoso acelerador construído há época da década de 1950. Ele é o acelerador mais antigo em funcionamento no CERN, tendo iniciado suas operações em 24 de novembro de 1959, com uma energia de 26 GeV [39]. O PS é composto de 100 ímãs intercalados com 100 regiões retas, que continham ímãs auxiliares, elementos de injeção e extração do feixe e cavidades de radio-frequência. Durante o funcionamento do PS, o uso de câmaras de bolhas como detectores de partículas estava em alta e o acelerador era a linha de feixe para duas câmaras de bolhas de Hidrogênio (Saclay e CERN [40]), que tinham o objetivo de estudar os espalhamentos K−p, K−n, π−p, π+p e p¯p em energias de poucos GeV [41]. Além disso, a primeira câmara de faíscas do CERN também foi utilizada no PS, sendo mais rápida e permitindo que eventos fossem pré-selecionados, o que a tornou amplamente utilizada na Física de Altas Energias, iniciando a “era dos detectores eletrônicos” [41]. A descoberta mais impactante do PS, no entanto, aconteceu nos anos 70, com a construção da câmara de bolhas Gargamelle, que confirmou a existência de interações de CNs, como será melhor discutido na próxima seção. Embora não participe diretamente nos experimentos mais atuais, o PS ainda é de grande utilidade para a Física de Partículas, pois faz parte do complexo de aceleração do CERN: um conjunto de aceleradores que atuam de forma coordenada na aceleração de prótons e íons pesados. Como mostra a Figura 7, íons H− são inicialmente acelerados no Acelerador Linear 4 (do inglês, Linear Accelerator 4 – LINAC4) até 160 MeV. Durante a injeção, apenas os prótons são enviados para o Impulsionador do Síncrotron de Prótons (do inglês, Proton Synchrotron Booster – PSB) onde alcançam 2 GeV. Após essa etapa, os prótons seguem para o PS, onde atingem uma energia de 28 GeV, e são direcionados para o SPS, que os acelera até 450 GeV. Esses prótons são, então, injetados no maior acelerador de partículas do mundo, o Grande Colisor de Hádrons (do inglês, Large Hadron Collider – LHC), onde são acelerados até a escala de TeV. Para uma discussão sobre os aspectos relevantes do LHC, veja a Ref. [42]. Figura 7 Ilustração do complexo de aceleração do CERN [43]. O processo de aceleração começa no LINAC 4, acelerando íons H− até 160 MeV, que envia os prótons (p) para o PSB (elipse anterior ao PS). No PSB, os prótons atingem uma energia de 2 GeV e são injetados no PS, que os acelera até 28 GeV antes de os direcionar ao SPS. No SPS, os prótons alcançam uma energia de 450 GeV, e são injetados no LHC, onde chegam a escala de TeV. Para uma versão mais detalhada, veja a Ref. [44]. Da mesma forma, íons de Chumbo (Pb) são acelerados neste mesmo complexo. Os pontos indicados com CMS, ATLAS, LHCb e ALICE são os atuais detectores operando no LHC. , detalharemos os aceleradores empregados à época das descobertas. Por fim, nas Seção 5 5. Experimento Gargamelle Construído em 1970, o experimento Gargamelle8 foi o primeiro a confirmar a existência de interações mediadas por CN. Consistiu em uma câmara em formato cilíndrico de 4,8 m de comprimento e 1,8 m de diâmetro envolta por uma bobina de Cobre para blindagem de partículas, ambos imersos em um campo magnético de 2 T mantido por uma culatra magnética. Para impedir que múons secundários contaminassem os dados, um absorvedor de Ferro e blocos de concreto foram colocados a frente da câmara. Na Figura 8 temos uma ilustração da visão lateral do experimento. O objetivo principal era o estudo da interação de neutrinos com o conteúdo da câmara. Figura 8 Desenho esquemático do corte transversal (side view) do experimento Gargamelle. A câmara de bolhas (chamber) é envolta por uma bobina de Cobre (coils) para gerar um campo de 2 T e mantido por uma culatra (yoke) magnética, e um bloco de 1 m de espessura de Ferro é usado como escudo (shield) para impedir a entrada de múons na câmara [45, 46]. Do ponto de vista físico, a câmara de bolhas funciona de forma semelhante à câmara de nuvens, no entanto, tem-se um líquido superaquecido submetido a uma alta pressão, com sua temperatura abaixo do ponto de ebulição. Durante a passagem da partícula carregada, a pressão é reduzida, assim como o ponto de ebulição, gerando uma trilha de bolhas facilmente identificada em uma fotografia. No caso específico do Gargamelle, usou-se freon (CF3Br) [47], um líquido mais denso (1,5 g/cm3[46]) para que os neutrinos interagissem mais com o meio, aumentando a probabilidade de produção de hádrons. Buscou-se identificar eventos semi-leptônicos neutros, que consistem em processos da seguinte forma: (15) ν μ / ν ¯ μ + N → ν μ / ν ¯ μ + hádrons, o qual se caracteriza na interação por CNs. O desafio experimental era diferenciá-los das reações de CC, que são identificadas pelo decaimento do neutrino em um múon: (16) ν μ / ν ¯ μ + N → μ + / μ − + hádrons . Outra linha de pesquisa era concentrada nos eventos de corrente neutra leptônicos, constituídos pelos seguintes processos [48]: (17) ν μ + e − → v μ + e − , (18) ν ¯ μ + e − → v ¯ μ + e − . No dia 19 de julho de 1973, há pouco mais de 50 anos, foi observado o primeiro evento de CNs, cuja foto encontra-se na Figura 9. Ao todo, foram feitas 83 mil fotos de neutrinos e 207 mil fotos de antineutrinos, com a conclusão de que o número de eventos em que há produção de hádrons sem múons ou elétrons só podia ser explicada se houvesse interações com CN. A partir das medidas, obteve-se o número de eventos de CN e CC para neutrinos e anti-neutrinos. Com isso, foi possível estimar o ângulo de Weinberg, como na Figura 10, que permitiu prever o intervalo de massa do bóson Z0 como sendo 75 GeV < mz < 92 GeV [49], de forma que era impossível, com os aceleradores disponíveis à época, realizar uma medida direta da sua massa. Figura 9 Foto do primeiro evento de CN observado no experimento Gargamelle [50, 51]. Ao lado, um diagrama esquemático de um evento de CN. O neutrino incidente (incoming neutrino), representado pela linha tracejada, não é diretamente observado, mas detecta-se o produto de sua interação com o material no ponto de colisão (collision point), que gera chuveiros de partículas devido à irradiação (shower of particles due to bremsstrahlung10), indicados nas linhas sólidas. Após a interação, o neutrino se afasta (outgoing neutrino). Figura 10 Comparação entre o valor teórico (linha sólida) e pontos experimentais do ângulo de Weinberg com as medidas do Gargamelle (cruz com círculo fechado) e HPWF (cruz com círculo aberto) [52]. As grandezas R¯=NCCCν¯ e R=NCCCν são a razão entre o número de eventos de CN e CC de antineutrinos e neutrinos, respectivamente. O outro ponto experimental advém do experimento Harvard, Pennsylvania, Wisconsin, Fermilab (HPWF) localizado à época no Laboratório Nacional Fermi (Fermi National Laboratory – FNAL), em Chicago, Estados Unidos. e Seção 6 6. Super Síncrotron de Prótons e Antiprótons (Spp¯S) Na busca pela observação das partículas mediadores da Teoria Eletrofraca, o Super Síncrotron de Prótons (do inglês, Super Proton Synchrotron – SPS) foi um acelerador do CERN que operou durante dez anos, entre 1981 e 1991. Inicialmente era um acelerador circular do tipo síncrotron de prótons a 450 GeV, contudo, dada a relevância de medir os bósons W e Z0 depois dos resultados bem sucedidos de Gargamelle e na indisposição de esperar pela construção de um novo acelerador elétron-pósitron, esperado a operar somente em 1989, foi modificado para acelerar um feixe de próton e outro de antipróton, ambos a 270 GeV de energia, para operar como o colisor Spp¯S[49], sendo o primeiro acelerador do CERN a utilizar bunches de partículas. No que tange à produção de bósons Z0, esperava-se que isso ocorreria, principalmente, pela aniquilação quark-antiquark da forma uu¯→Z0 e dd¯→Z0, partícula que, por sua vez, possui como canal de decaimento pares elétron-pósitron ou múon-antimúon, que são observados pelos detectores. O acelerador era composto por cinco experimentos: Underground Area11 1 (UA1), Underground Area 2 (UA2), Underground Area 3 (UA3), Underground Area 4 (UA4) e Underground Area 5 (UA5). Os dois primeiros eram os principais experimentos e eram responsáveis pelas medidas do bóson Z0, de forma que mais detalhes sobre eles serão abordados nas próximas seções. A Figura 11 mostra o complexo de aceleradores à época, seus tamanhos relativos e as posições do UA1 e UA2. Figura 11 Complexo de aceleradores do CERN à época do acelerador Spp¯S[53]. A figura mostra o tamanho do SPS – operando como Spp¯S com feixes de próton (P) e antipróton (P¯) – em relação ao PS e ao Coletor de Antiprótons (Antiproton Collector – ACOL), bem como a posição dos experimentos UA1 e UA2. O PS e o Spp¯S possuem 200 e 2200 metros de diâmetro, respectivamente. Atualmente ambos operam como estágios iniciais da aceleração dos prótons no Grande Colisor de Hádrons. Para uma revisão detalhada, veja a Ref. [54]. A figura inferior mostra a colisão dos feixes de próton e antipróton com momento de 270 GeV/c cada, resultando nas colisões do Spp¯S ocorrendo a 540 GeV. 6.1. Underground Area 1 O experimento UA1 foi um detector de propósito geral que levou dois anos para ser construído após a sua aprovação em 1979. Grande parte dos cientistas da época viam com ceticismo o tempo previsto, imaginando que não seria possível construir e operar um detector de tamanha complexidade. Contudo, no verão de 1981, o detector estava praticamente concluído. O experimento contava com um dipolo magnético que gerava um campo magnético de 7 kG perpendicular à linha do feixe. A região de colisão era cercada por uma câmara de arraste (do inglês, drift chamber) feita de Argônio e Etano, que fazia o rastreamento de partículas com uma precisão semelhante a de uma câmara de bolhas [55]. Essa região, chamada de traçador central (do inglês, central tracker) era envolta por calorímetros eletromagnético e hadrônico. O primeiro, feito de Chumbo e cintiladores, era útil para detectar os elétrons provenientes do decaimento dos bósons W e Z0. O calorímetro hadrônico, responsável por medir partículas constituídas de quarks, como prótons, nêutrons e mésons, consistia de cintiladores colocados entre duas paredes de Ferro posicionadas simetricamente nas extremidades do retorno da culatra magnética. Por fim, na parte mais externa, as câmaras de arraste muônicas faziam o traçamento de múons, outra medida de suma importância devido a um dos canais de decaimento do bóson Z0 ser um par múon-antimúon. A Figura 12 apresenta um corte transversal do experimento UA1 ilustrando seus subsistemas. Figura 12 Corte transversal do experimento UA1. O traçador central era envolto pela bobina de Alumínio (Aluminum coil) e contadores de cascatas (shower counter) tanto de grande ângulo (large-angle) quanto na tampa (end-cap) e calorímetros eletromagnético e hadrônico, novamente de grande ângulo (large-angle) quanto de tampas (end-cap), intercalado com a culatra magnética (magnetic yoke). Na região mais externa do experimento, o traçamento de múons era feito por câmaras de arraste muônicas (muon detector) [56, 57]. 6.2. Underground Area 2 O experimento UA2, diferentemente do UA1, não era um detector de propósito geral, mas construído para medir, de forma bastante precisa, os decaimentos em elétrons dos bósons W e Z0, tanto que nesse experimento não há um detector de múons. O foco estava em calorímetros muito granularizados12 em geometria esférica para estimar, de forma muito precisa, a energia depositada. A Figura 13 mostra uma ilustração do experimento. O detector de vértice (do inglês, vertex detector) era composto por um conjunto de detectores de rastreamento em formato cilíndrico, que, por sua vez, era envolto pelo calorímetro central (do inglês, central calorimeter), que cobria toda a região azimutal (300◦, inicialmente). O calorímetro era tanto eletromagnético, feito de Ferro, quanto hadrônico, feito de Chumbo13. Após o último detector de rastreamento do detector de vértice, havia um cilindro de Tungstênio com uma câmara de fios, crucial na identificação dos elétrons ao permitir o casamento espacial entre as trilhas e os clusters. Bobinas toroidais geravam o campo magnético do experimento, contudo, este ficava restrito apenas aos detectores frontais, portanto, não havia campo na região central. Os detectores frontais eram compostos de câmaras de arraste, câmaras de proporcionais de tubos múltiplos (do inglês, multitube proportional chambers – MTPC) para contagem e, por fim, um calorímetro eletromagnético [49, 55]. Figura 13 Corte transversal do experimento UA2. O detector de vértice (vertex detector) cobria a região de colisão, que era envolto pelo calorímetro central e bobinas toroidais (toroid coils). Câmara de arraste, câmaras de proporcionais de tubos múltiplos (MTPC) e um calorímetro eletromagnético frontal (forward calorimeter) compunham os detectores frontais, que estavam imersos em um campo magnético gerado por bobinas toroidais. [55, 49]. 6.3. Medidas do bóson Z Medidas de Z0 → e+e− e Z0 → μ+μ− foram feitas no UA1, mostradas na Figura 14 em eventos individuais registrados pelo experimento. Durante a operação do acelerador, entre 1982 e 1983, 152 eventos de e+e− satisfaziam as condições necessárias para serem provenientes de um decaimento do bóson Z0, enquanto que apenas 1 evento de μ+μ− seria originado do bóson Z0. Na Figura 15 a massa invariante de todos os pares de léptons registrados durante a operação no UA1 foi contabilizada, resultando em uma massa de: (19) m Z = 95,2 ± 2,5 (estat .) ± 3,0 (sist .) GeV/ c 2 . Figura 14 Eventos medidos no UA1: (esquerda) Evento de Z0 → e+e− e (direita) Evento de Z0 → μ+μ− no UA1. [49]. Figura 15 Massa invariante de todos os pares de léptons detectados no UA1 [49], onde o valor médio (mean) corresponde ao valor apresentado na Equação 19, indicados os valores limiares (threshold) para eventos de e+e− e μ+μ−. No experimento UA2, devido ao fato de não haver um detector de múons, o objetivo principal era detectar, com grande precisão, os pares de elétrons resultantes do decaimento do bóson Z0. A Figura 16 mostra os eventos registrados, onde a metade superior corresponde à deposição de energia dos pares de elétrons que possuem energia transversa ET > 25 GeV, enquanto que a metade inferior seleciona apenas as trilhas de elétrons que apontam para pelo menos um cluster dos calorímetros. A área hachurada diz respeito aos pares de elétrons que apontam para dois clusters do calorímetro eletromagnético. Com isso, foi possível estimar uma massa de: (20) m Z = 91,9 ± 1 ,3 (estat .) ± 1 ,4 (sist .) GeV/ c 2 . Figura 16 (Esquerda) Eventos de Z0 → e+e− no experimento UA2. O gráfico superior corresponde à deposição de energia dos pares de elétrons que possuem energia transversa ET > 25 GeV. No parte inferior, são selecionados apenas as trilhas isoladas de elétrons compatíveis com pelo menos um cluster dos calorímetros. A parte hachurada corresponde às trilhas filtradas onde há correspondência com dois clusters[49]. (Direita) Histograma da massa invariante de e+e− de 100 mil eventos produzidos a partir de uma colisão pp¯ com s=540 GeV no MadGraph5[58]. Todos os processos de produção pp¯→e++e−ppee, tido como ruído, estão na cor preta e o processo pp¯→Z→e++e−ppzee na cor vermelha. Importante notar a baixa quantidade de eventos na época, como pode-se ver pela parte hachurada da Figura 16: apenas três eventos de trilhas de elétrons foram selecionados. Para fins de comparação, um histograma da massa invariante de pares elétron-pósitron produzidos com energia de colisão igual ao Spp¯S feito com o gerador de eventos MadGraph5 [58] é mostrado na Figura 16, mostrando o pico de ressonância bem definido na região de massa do bóson Z0. Uma medida mais atual do bóson Z0 pode ser vista na Figura 17, que mostra a massa invariante de pares de μ+μ− medidos no experimento CMS do LHC entre 2015 a 2018 produzidos a partir de uma colisão próton-próton de s=13 TeV. Neste caso, tem-se uma análise muito mais precisa da medida da massa do bóson Z0, em que processos de dibósons, Drell-Yan, jatos e multijatos da Cromodinâmica Quântica foram contabilizados no ruído [59]. Figura 17 Massa invariante de dimúons medidos pelo experimentos CMS do LHC de colisões pp com s=13 TeV entre 2015 e 2018. O termo “Misid.” (misidentified) são W + jatos e multijatos da QCD que são erroneamente identificados pela eletrônica do detector como contendo decaimento em múons. O termo “EW” (electroweak) são processos eletrofracos Drell-Yan e dibóson em τ+τ− de produção eletrofraca [59]. são abordados os detalhes experimentais e as medidas do Experimento Gargamelle e Spp¯S, respectivamente.

2. Descrição Teórica

2.1. Interações Fracas

Enrico Fermi foi o primeiro a teorizar sobre as transições do decaimento β no núcleo [14[14] E. Fermi, Nuovo Cim. 11, 1 (1934).]. Incorporando a ideia do neutrino de Pauli, Fermi fez uma analogia com o decaimento γ, pois, se o núcleo podia emitir e criar um fóton, também poderia ser possível criar um elétron e um neutrino (do elétron4 4 No momento desta formulação, Fermi ainda não sabia dos sabores distintos para os neutrinos. ) desde que houvesse energia suficiente para tal. Além disso, a interação acontecia em um único ponto, como mostra o diagrama do decaimento de um nêutron na Figura 2. Utilizando a Mecânica Quântica em segunda quantização para descrever estados dos elétrons e neutrinos, Fermi modelou que o processo de decaimento se dá através da aniquilação e criação dessas partículas por meio de um Hamiltoniano de interação, onde foi considerado que a velocidade das partículas do núcleo são muitos menores que a da luz [15[15] F.L. Wilson, American Journal of Physics 36, 1150 (1968).]:

(4) H int = g Q ψ ˜ * δ φ + Q * ψ ˜ δ φ * ,
Figura 2
Diagrama do decaimento β no modelo de Fermi.

onde ψ, ψ˜, φ e φ˜ são as amplitudes de probabilidade do elétron e do neutrino e seus respectivos complexos conjugados, Q é o operador de transição do próton para o nêutron e Q* o oposto, g é uma constante e δ é uma matriz dada por:

(5) δ = 0 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 0 0 1 0 .

O primeiro termo da Equação 4 corresponde à transição de próton para nêutron e a aniquilação de elétron e neutrino. Já o segundo termo é a mudança de nêutron para próton e a criação um elétron e um neutrino. Pela teoria de perturbação dependente do tempo, a taxa de transição de um estado inicial para um estado final é dado pela Regra de Ouro de Fermi [16[16] E. Fermi, Nuclear Physics: A Course Given by Enrico Fermi at the University of Chicago (University of Chicago Press, Chicago, 1974).]:

(6) Γ i f = 2 π | Ψ f | H | Ψ i | 2 ρ ( E f ) ,

onde Ψi e Ψf são os estados inicial e final, respectivamente, H′ é o Hamiltoniano de perturbação e ρ(Ef) é a densidade de estados com a energia do estado final. Aplicando para o caso de um decaimento β, tal que np+ν¯+e, calculando a matriz de perturbação e a densidade de estados, chegamos à taxa de decaimento β [11[11] A. Belyaev e D. Ross, The Basics of Nuclear and Particle Physics (Springer International Publishing, Nova York, 2021).]:

(7) Γ i f = G F 2 c 2 π 3 | M | 2 ( E 0 K e ) 2 ( K e + m e c 2 ) p e F ( Z D , T e ) ,

onde GF = g é a constante universal de Fermi5 5 Essa constante tem valor conhecido como GF /(ℏc)3 = 1,166 378 7(6) × 10−5 GeV−2 [9]; GeV corresponde a 109 eV. , M é o elemento de matriz nuclear, E0 é a energia total, Ke é a energia cinética do elétron, pe é o momento do elétron e F(ZD, Te) é o fator de Fermi, que leva em conta interações Coulombianas.

O grande trunfo de Fermi foi explicar o espectro contínuo de energia do elétron, como mostrado na Figura 2, porém sua teoria tinha limitações, como não prever a violação de paridade, observada anos mais tarde no decaimento do Cobalto [17[17] C.S. Wu, E. Ambler, R.W. Hayward, D.D. Hoppes e R.P. Hudson, Phys. Rev. 105, 1413 (1957).], e divergir em processos de mais alta ordem. Mesmo com posteriores correções ao modelo, não houve, até meados da década de 1960, uma teoria que explicasse as Interações Fracas de forma satisfatória.

2.2. Teoria Eletrofraca

A primeira tentativa de unificação da QED com a Força Fraca foi inicialmente proposta em 1961 por Sheldon Glashow [18[18] S.L. Glashow, Nucl. Phys. 22, 579 (1961).] ao fazer uso do trabalho de seu orientador, Julian Schwinger [19[19] J.S. Schwinger, Annals Phys. 2, 407 (1957).], que introduziu a existência de “bósons vetoriais intermediários” nas Interações Fracas e, junto com fóton, eles faziam parte da mesma família de partículas [20[20] K. Karaca, Stud. Hist. Phil. Sci. B 44, 1 (2013).]. Glashow propôs a unificação da interação eletromagnética e fraca baseado em uma simetria de calibre do tipo Yang-Mills, isto é, não-abeliana [21[21] M. Costa e I.L. Batista, Ens. Mult. 7, 57 (2021).], e um grupo de calibre SU(2) × U(1). Pela primeira vez foi introduzido um bóson vetorial neutro, que seria posteriormente chamado de bóson Z0, junto com dois bósons vetoriais carregados e o fóton. Entretanto, a simetria das teorias do tipo Yang-Mills impõe que os bósons não podem ter massa, o que fez com que Glashow forçasse uma quebra de simetria para resolver o problema. Posteriormente, em 1964, tentativas semelhantes foram feitas por Abdus Salam e John Ward [22[22] A. Salam e J.C. Ward, Nuovo Cim. 11, 568 (1959).], contudo o responsável por resolver essa questão foi Steven Weinberg, em 1967, ao inserir a quebra espontânea de simetria através do Mecanismo de Brout-Englert-Guralnik-Hagen-Higgs-Kibble [23[23] F. Englert e R. Brout, Phys. Rev. Lett. 13, 321 (1964).,24[24] G.S. Guralnik, C.R. Hagen e T.W.B. Kibble, Phys. Rev. Lett. 13, 585 (1964).,25[25] P.W. Higgs, Phys. Rev. Lett. 13, 508 (1964).] como responsável por prover massa aos bósons vetoriais [26[26] F. Close, Birth of a symmetry, disponível em: https://cerncourier.com/a/birth-of-a-symmetry/
https://cerncourier.com/a/birth-of-a-sym...
]. A massa das partículas é resultado da interação delas com um campo escalar, o campo de Higgs [27[27] J.J.M. Pimenta, L.F.B. Belussi, É.R.T. Natti e P.L. Natti, Rev. Bras. Ens. Fis. 35, 2306.1 (2013).], que permeia todo o Universo. Antes da quebra espontânea de simetria, o valor do ponto de equilíbrio ⟨ϕ⟩ do sistema no campo de Higgs é nulo e todas as partículas não possuíam massa. Após a quebra, o ponto de equilíbrio adquire um valor diferente de zero, como mostra a Figura 3, e as partículas adquirem massa após interagir com esse campo. Logo, ao assumir um valor mínimo, o potencial de Higgs quebra sua simetria. A massa da partícula relacionada ao campo escalar é escrita como [11[11] A. Belyaev e D. Ross, The Basics of Nuclear and Particle Physics (Springer International Publishing, Nova York, 2021).]:

(8) M H = 1 c 2 g H ε 0 c ϕ ,
Figura 3
Processo de quebra de espontânea de simetria. (Esquerda) O estado em que o valor esperado do vácuo é nulo e todas as partículas não possuem massa. (Direita) Após a quebra espontânea de simetria, o valor esperado do vácuo é não-nulo e as partículas adquirem massa.

onde gH é a constante de acoplamento da partícula com o campo de Higgs.

Na Teoria Eletrofraca, as interações podem ocorrer por corrente carregada (CC), mediadas pelos vetoriais bósons W±, e por CNs, mediadas pelo bóson vetorial Z0[28[28] D. Griffiths, Introduction to Elementary Particles (Wiley-VCH, Weinheim, 2008).] (para uma revisão, veja Ref. [21[21] M. Costa e I.L. Batista, Ens. Mult. 7, 57 (2021).]). Em interações com CC, ocorre a mudança de carga, como exemplificado pelo decaimento β, descrito por np+ν¯e+e e ilustrado à esquerda na Figura 4, onde observa-se que o quark d se torna o quark u ao interagir com o bóson W. Por outro lado, não há mudança quando a interação ocorre por intermédio do bóson Z0, como mostra a imagem à direita na Figura 4, onde a interação do bóson Z0 mantém inalterada a carga das partículas. Aplicando o Mecanismo de Higgs, as massas dos bósons W e Z0 foram previstas teoricamente [28[28] D. Griffiths, Introduction to Elementary Particles (Wiley-VCH, Weinheim, 2008)., 29[29] U. Dore, P.F. Loverre E.L. Ludovici, Eur. Phys. J. H. 41, 137 (2016).] como sendo:

(9) m W = π α 2 G F 1 / 2 1 sin θ W = 92 ± 2GeV/ c 2 , m Z = M W cos θ W = 82 ± 2GeV/ c 2 ,
Figura 4
(Esquerda) Diagrama de Feynman do decaimento β do nêutron. O nêutron emite um ν¯e e um e por meio da interação do quark down via CC. (Direita) Diagrama de Feynman do processo e + νμe + νμ. A interação das partículas νμ e e com o bóson Z0 não altera suas cargas, dado que a partícula mediadora é neutra. Para uma discussão sobre estes tipos de diagramas, veja a Ref. [31[31] A.C. Aguilar, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e4205 (2018).].

onde α = 1/137 é a constante de estrutura fina e θW é o ângulo de Weinberg, que é um parâmetro da Teoria Eletrofraca.

Uma vez em posse de uma teoria unificada que pretende descrever os fenômenos envolvendo tanto as interações eletromagnética e fraca a nível quântico simultaneamente, precisamos testar suas predições em laboratório. Desta forma, diferentes grupos em laboratórios de pesquisa ao redor do mundo se dedicaram a testar os diferentes parâmetros da teoria, sendo o mais relevante a obtenção da medida da massa das partículas mediadores das interações. Um grande passo neste sentido foi a observação do bóson de Higgs em 2012 no CERN, comemorando no ano de 2022 os seus 10 anos de sua descoberta [30[30] R. Rosenfeld, Rev. Bras. Ens. Fis. 44, e20220251 (2022).].

3. Introdução aos Aceleradores de Partículas

Acelerar partículas é um procedimento de utilidade para diversas áreas, desde as mais acadêmicas, como a Física Experimental de Altas Energias no estudo dos constituintes fundamentais da matéria, até as mais aplicadas, como a Medicina no tratamento do câncer [32[32] M. Silari, Rad. Prot. Dosym. 146, 440 (2011).] e a Ciência dos Materiais na caracterização de novos materiais. No contexto da Física de Partículas, busca-se acelerar partículas até uma energia suficiente para que uma reação entre elas produza outras partículas advindas de processos de interação que sejam de interesse de estudo. Um exemplo relacionado às Interações Fracas é o decaimento de um bóson Z0, que foi produzido por uma colisão de um próton (p) e um antipróton (p¯), em um par elétron-pósitron:

(10) p + p ¯ ( u u d ) + ( u ¯ u ¯ d ¯ ) Z + X e + + e + X ,

onde o próton e o antipróton são caracterizados pelos seus quarks constituintes6 6 Para uma introdução sobre os constituintes do próton, veja as Refs. [33, 34]. . Após a aniquilação do quark u do próton e um antiquark u¯ do antipróton, a estrutura de ambos se quebra gerando um estado hadrônico X como resultado da dissociação do próton e do antipróton. Uma vez que se detecta o produto do decaimento do bóson Z0, conseguimos inferir informações sobre a partícula original utilizando cinemática, conservação de energia e momento linear, massa e entre outros.

Para que seja possível produzir o bóson Z0 pelo processo descrito na Equação 10, é necessário que a energia da colisão seja grande o suficiente para gerar uma partícula com a massa do bóson Z0. Para tratar da energia da colisão em aceleradores, costuma-se utilizar o referencial do centro de massa (CM), no qual as partículas têm momentos de mesmo módulo e direções opostas. Usa-se muito na Física de Partículas a variável de Mandelstam s [35[35] S. Mandelstam, Phys. Rev. 112, 1344 (1958).] para representar o quadrado da energia da colisão:

(11) s = i = 1 2 E i 2 i = 1 2 p i 2 = ( E 1 + E 2 ) 2 ( p 1 + p 2 ) 2 ,

onde E1 e E2 é a energia das partículas 1 e 2 da colisão, respectivamente. Tomando que o CM das partículas em colisão está em repouso no ponto de colisão, teremos p1=p2:

(12) s E C M 2 = ( E 1 + E 2 ) 2 ,

onde ECM é a energia total de centro de massa do sistema, o qual é tipicamente tomado como a origem do sistema de coordenadas de um experimento. Dessa forma, s é a energia total da colisão no referencial do CM. A frequência com que ocorrem os eventos de produção e decaimento de partículas impacta de forma significativa no tempo de funcionamento do acelerador e na estatística dos dados. Define-se a grandeza Luminosidade (L), que depende única e exclusivamente das características do acelerador, para determinar o número de colisões por unidade de tempo e unidade de área, de forma que a taxa de eventos de um processo i é escrito como:

(13) d N i d t = σ i L ,

onde Ni é o número de eventos i e σi é a seção de choque do processo i. Assim, dependendo da luminosidade atingida com um dado acelerador, espera-se produzir um certo número de eventos da partícula de interesse relacionada ao processo determinado pela seção de choque σi. Tipicamente se utiliza a chamada luminosidade integrada, L=Ldt, onde o período de 1 ano de operação de um acelerador é tomado como 107 s7 7 1 ano = (365 dias)·(24 h/dia)·(60 min/h)·(60 s/min) ≈ 3,15×107 s ∼ 107 s. .

De modo geral, o processo de aceleração envolve a interação de partículas carregadas com campos eletromagnéticos, sendo essencialmente o mesmo, independente do tipo de acelerador. Há dois tipos de aceleradores: linear, onde a partícula atravessa apenas uma vez a linha de aceleração, e circular, onde a partícula realiza trajetórias circulares devido a ação de um campo magnético até atingir a energia almejada. No regime de altas energias, quando a partícula atinge velocidade relativística, o cálculo da sua energia cinética precisa ser corretamente ajustado visto que a velocidade da partícula está limitada à velocidade da luz. Como mostrado na Figura 5, a expressão usual da energia cinética obtida da Mecânica Clássica levaria a um resultado não-físico. Em termos relativísticos, o aumento de velocidade das partículas se torna cada vez mais custoso: pequenos incrementos de velocidade das partículas necessitam de grandes quantidades de energia dado que a velocidade da partícula tende assintoticamente à velocidade da luz, como mostra a linha sólida na Figura 5. Logo, isso impõe que os aceleradores lineares tenham um comprimento muito grande, geralmente sendo utilizados para acelerar prótons até energias da ordem de GeV. Por outro lado, conseguimos atingir energias muito maiores, na escala do TeV, em aceleradores circulares devido à trajetória circular que permite acelerar as partículas inúmeras vezes.

Figura 5
Fator de Lorentz do próton (β = v/c) nos regimes clássico e relativístico.

O primeiro acelerador do tipo cíclico foi o cíclotron construído e patenteado por Ernest Lawrence em 1931 [36[36] E.O. Lawrence e M.S. Livingston, Phys. Rev. 40, 19 (1932)., 37[37] E.O. Lawrence, Method and apparatus for the acceleration of ions, disponível em: https://patents.google.com/patent/US1948384A
https://patents.google.com/patent/US1948...
]. Neste acelerador, a partícula era acelerada num campo magnético obtendo uma trajetória em espiral dentro de uma câmara à vácuo. Contudo, a trajetória espiral sem raio fixo dificultava o alcance de maiores energias, limitação que pode ser superada com o advento dos aceleradores do tipo síncrotron.

3.1. Síncrotron

O síncrotron é um tipo de acelerador cíclico caracterizado por manter a partícula em uma trajetória circular de raio fixo com um campo magnético que aumenta em função do tempo. A relação que envolve o raio da trajetória com o momento da partícula carregada em movimento num campo magnético é dada por [38[38] H. Wiedemann, Particle Accelerator Physics I: Basic Principles and Linear Beam Dynamics (Springer, Berlin, 1999).]:

(14) 1 R = e B c p = constante,

onde R é o raio da trajetória, e é a carga elementar, B é o módulo do campo magnético externo, c é a velocidade da luz e p é o momento da partícula. Assim, à medida que a partícula vai acelerando dentro do síncrotron, o campo magnético gerado pelos dipolos magnéticos deve crescer de forma proporcional para manter o raio constante. O processo de aceleração ocorre pelo método de cavidades de rádio-frequência ressonantes, que consistem em tubos de arraste (do inglês, drift tubes) com um campo elétrico gerado por um campo magnético oscilante sincronizados de forma que a partícula atravesse o tubo no momento em que campo elétrico aponta no sentido do movimento da partículas, caso contrário ela será desacelerada. Para que a sincronização ocorra, a frequência de oscilação do campo magnético deve ser um múltiplo inteiro da frequência de revolução da partícula no síncrotron.

Como pode-se observar pela Equação 14, uma das maiores limitações desse tipo de acelerador está no ímã, que deve gerar um campo magnético de módulo cada vez maior devido ao aumento do momento da partícula. Outra limitação está relacionada com a perda de energia por efeito Joule, que diminui a eficácia do ímã pela perda de suas propriedades magnéticas. Em aceleradores mais modernos, o uso de supercondutores permitiu um aumento significativo na energia de colisão. A radiação síncrotron, onde fótons são emitidos pelas partículas aceleradas, é também uma importante limitação do acelerador, pois ela aumenta com o velocidade da partícula. Devido à sua menor massa, o elétron perde cerca de 103 mais energia por este tipo de radiação se comparado ao próton [11[11] A. Belyaev e D. Ross, The Basics of Nuclear and Particle Physics (Springer International Publishing, Nova York, 2021).]. Na Figura 6 é possível observar uma representação esquemática simplificada da montagem de um síncrotron, onde ímãs (dipolos e quadrupolos magnéticos) estão em vermelho e as cavidades de radio-frequência estão em verde. Os imãs atuam para desviar o feixe nas curvas e as cavidade efetuam a aceleração das partículas nos trechos em linha reta.

Figura 6
Ilustração simplificada de um acelerador do tipo síncrotron. As partículas são primeiramente aceleradas em um acelerador linear e entram no síncrotron pelo injetor. Os ímãs, em vermelho, são responsáveis pela alteração da trajetória e focalização do feixe e as cavidades de radiofrequência, em verde, fazem a aceleração das partículas.

4. Acelerando Prótons com um Síncrotron

O Síncrotron de Prótons (do inglês, Proton Synchrotron – PS) foi o primeiro acelerador do tipo síncrotron da história da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (do francês, Conseil Européen pour la Recherche Nucléaire – CERN) e o mais poderoso acelerador construído há época da década de 1950. Ele é o acelerador mais antigo em funcionamento no CERN, tendo iniciado suas operações em 24 de novembro de 1959, com uma energia de 26 GeV [39[39] D. Cundy e S. Gilardoni, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 27, 39 (2017).]. O PS é composto de 100 ímãs intercalados com 100 regiões retas, que continham ímãs auxiliares, elementos de injeção e extração do feixe e cavidades de radio-frequência.

Durante o funcionamento do PS, o uso de câmaras de bolhas como detectores de partículas estava em alta e o acelerador era a linha de feixe para duas câmaras de bolhas de Hidrogênio (Saclay e CERN [40[40] L. Weiss, Report Number: CERN-CHS-26 (CERN, Geneva, 1988).]), que tinham o objetivo de estudar os espalhamentos Kp, Kn, πp, π+p e p¯p em energias de poucos GeV [41[41] V. Ruhlmann-Kleider, M. Neveu e S. Palanque, CERN and Saclay: 40 years of cooperation, disponível em:https://cerncourier.com/a/cern-and-saclay-40-years-of-co-operation/.
https://cerncourier.com/a/cern-and-sacla...
]. Além disso, a primeira câmara de faíscas do CERN também foi utilizada no PS, sendo mais rápida e permitindo que eventos fossem pré-selecionados, o que a tornou amplamente utilizada na Física de Altas Energias, iniciando a “era dos detectores eletrônicos” [41[41] V. Ruhlmann-Kleider, M. Neveu e S. Palanque, CERN and Saclay: 40 years of cooperation, disponível em:https://cerncourier.com/a/cern-and-saclay-40-years-of-co-operation/.
https://cerncourier.com/a/cern-and-sacla...
]. A descoberta mais impactante do PS, no entanto, aconteceu nos anos 70, com a construção da câmara de bolhas Gargamelle, que confirmou a existência de interações de CNs, como será melhor discutido na próxima seção.

Embora não participe diretamente nos experimentos mais atuais, o PS ainda é de grande utilidade para a Física de Partículas, pois faz parte do complexo de aceleração do CERN: um conjunto de aceleradores que atuam de forma coordenada na aceleração de prótons e íons pesados. Como mostra a Figura 7, íons H são inicialmente acelerados no Acelerador Linear 4 (do inglês, Linear Accelerator 4 – LINAC4) até 160 MeV. Durante a injeção, apenas os prótons são enviados para o Impulsionador do Síncrotron de Prótons (do inglês, Proton Synchrotron Booster – PSB) onde alcançam 2 GeV. Após essa etapa, os prótons seguem para o PS, onde atingem uma energia de 28 GeV, e são direcionados para o SPS, que os acelera até 450 GeV. Esses prótons são, então, injetados no maior acelerador de partículas do mundo, o Grande Colisor de Hádrons (do inglês, Large Hadron Collider – LHC), onde são acelerados até a escala de TeV. Para uma discussão sobre os aspectos relevantes do LHC, veja a Ref. [42[42] F.K. Nóbrega e L.F. Mackedanz, Rev. Bras. Ens. Fis. 35, 1301 (2013).].

Figura 7
Ilustração do complexo de aceleração do CERN [43[43] WIKIMEDIA COMMONS, File:LHC.svg, disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:LHC.svg
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:...
]. O processo de aceleração começa no LINAC 4, acelerando íons H até 160 MeV, que envia os prótons (p) para o PSB (elipse anterior ao PS). No PSB, os prótons atingem uma energia de 2 GeV e são injetados no PS, que os acelera até 28 GeV antes de os direcionar ao SPS. No SPS, os prótons alcançam uma energia de 450 GeV, e são injetados no LHC, onde chegam a escala de TeV. Para uma versão mais detalhada, veja a Ref. [44[44] CERN Document Server, The CERN accelerator complex, layout in 2022: Complexe des accélérateurs du CERN en janvier 2022, disponível em: https://cds.cern.ch/record/2800984
https://cds.cern.ch/record/2800984...
]. Da mesma forma, íons de Chumbo (Pb) são acelerados neste mesmo complexo. Os pontos indicados com CMS, ATLAS, LHCb e ALICE são os atuais detectores operando no LHC.

5. Experimento Gargamelle

Construído em 1970, o experimento Gargamelle8 8 Apesar deste nome remeter ao vilão do desenho animado Smurfs, o nome deriva dos livros de François Rabelais, onde Gargamelle era a mãe do gigante Gargântua. foi o primeiro a confirmar a existência de interações mediadas por CN. Consistiu em uma câmara em formato cilíndrico de 4,8 m de comprimento e 1,8 m de diâmetro envolta por uma bobina de Cobre para blindagem de partículas, ambos imersos em um campo magnético de 2 T mantido por uma culatra magnética. Para impedir que múons secundários contaminassem os dados, um absorvedor de Ferro e blocos de concreto foram colocados a frente da câmara. Na Figura 8 temos uma ilustração da visão lateral do experimento. O objetivo principal era o estudo da interação de neutrinos com o conteúdo da câmara.

Figura 8
Desenho esquemático do corte transversal (side view) do experimento Gargamelle. A câmara de bolhas (chamber) é envolta por uma bobina de Cobre (coils) para gerar um campo de 2 T e mantido por uma culatra (yoke) magnética, e um bloco de 1 m de espessura de Ferro é usado como escudo (shield) para impedir a entrada de múons na câmara [45[45] F.J. Hasert, S. Kabe, W. Krenz, J. Von Krogh, D.Lanske, J. Morfin, K. Schultze, H. Weerts, G. Bertrand-Coremans, J. Sacton et al., Nucl. Phys. B 73, 1 (1974)., 46[46] D. Haidt, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 165 (2015).].

Do ponto de vista físico, a câmara de bolhas funciona de forma semelhante à câmara de nuvens, no entanto, tem-se um líquido superaquecido submetido a uma alta pressão, com sua temperatura abaixo do ponto de ebulição. Durante a passagem da partícula carregada, a pressão é reduzida, assim como o ponto de ebulição, gerando uma trilha de bolhas facilmente identificada em uma fotografia. No caso específico do Gargamelle, usou-se freon (CF3Br) [47[47] M. Haguenauer, em: Gargamelle Experiment, editado por J.R. Smith (Rutherford Laboratory, Chilton, 1974).], um líquido mais denso (1,5 g/cm3[46[46] D. Haidt, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 165 (2015).]) para que os neutrinos interagissem mais com o meio, aumentando a probabilidade de produção de hádrons.

Buscou-se identificar eventos semi-leptônicos neutros, que consistem em processos da seguinte forma:

(15) ν μ / ν ¯ μ + N ν μ / ν ¯ μ + hádrons,

o qual se caracteriza na interação por CNs. O desafio experimental era diferenciá-los das reações de CC, que são identificadas pelo decaimento do neutrino em um múon:

(16) ν μ / ν ¯ μ + N μ + / μ + hádrons .

Outra linha de pesquisa era concentrada nos eventos de corrente neutra leptônicos, constituídos pelos seguintes processos [48[48] D. Perkins, em: Gargamelle and the Discovery of Neutral Currents editado por L. Hoddeson, L. Brown, M. Riordan e M. Dresden (Cambridge University Press, Cambridge, 1997).]:

(17) ν μ + e v μ + e ,
(18) ν ¯ μ + e v ¯ μ + e .

No dia 19 de julho de 1973, há pouco mais de 50 anos, foi observado o primeiro evento de CNs, cuja foto encontra-se na Figura 9. Ao todo, foram feitas 83 mil fotos de neutrinos e 207 mil fotos de antineutrinos, com a conclusão de que o número de eventos em que há produção de hádrons sem múons ou elétrons só podia ser explicada se houvesse interações com CN. A partir das medidas, obteve-se o número de eventos de CN e CC para neutrinos e anti-neutrinos. Com isso, foi possível estimar o ângulo de Weinberg, como na Figura 10, que permitiu prever o intervalo de massa do bóson Z0 como sendo 75 GeV < mz < 92 GeV [49[49] L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015).], de forma que era impossível, com os aceleradores disponíveis à época, realizar uma medida direta da sua massa.

Figura 9
Foto do primeiro evento de CN observado no experimento Gargamelle [50[50] CERN Document Server, Gargamelle: first neutral current, disponível em: https://cds.cern.ch/record/39468, acessado em: 10/12/2023
https://cds.cern.ch/record/39468...
, 51[51] M. Chalmers, 50 years of giant electroweak discoveries, disponível em: https://home.cern/news/news/physics/50-years-giant-electroweak-discoveries
https://home.cern/news/news/physics/50-y...
]. Ao lado, um diagrama esquemático de um evento de CN. O neutrino incidente (incoming neutrino), representado pela linha tracejada, não é diretamente observado, mas detecta-se o produto de sua interação com o material no ponto de colisão (collision point), que gera chuveiros de partículas devido à irradiação (shower of particles due to bremsstrahlung10 10 A radiação emitida por um elétron acelerado quando adentra o campo elétrico de um partículas carregadas ou núcleos de átomos; traduzido do alemão para o inglês, braking radiation. ), indicados nas linhas sólidas. Após a interação, o neutrino se afasta (outgoing neutrino).
Figura 10
Comparação entre o valor teórico (linha sólida) e pontos experimentais do ângulo de Weinberg com as medidas do Gargamelle (cruz com círculo fechado) e HPWF (cruz com círculo aberto) [52[52] D. Perkins, Neutral currents, disponível em: https://cerncourier.com/a/neutral-currents/
https://cerncourier.com/a/neutral-curren...
]. As grandezas R¯=NCCCν¯ e R=NCCCν são a razão entre o número de eventos de CN e CC de antineutrinos e neutrinos, respectivamente. O outro ponto experimental advém do experimento Harvard, Pennsylvania, Wisconsin, Fermilab (HPWF) localizado à época no Laboratório Nacional Fermi (Fermi National Laboratory – FNAL), em Chicago, Estados Unidos.

6. Super Síncrotron de Prótons e Antiprótons (Spp¯S)

Na busca pela observação das partículas mediadores da Teoria Eletrofraca, o Super Síncrotron de Prótons (do inglês, Super Proton Synchrotron – SPS) foi um acelerador do CERN que operou durante dez anos, entre 1981 e 1991. Inicialmente era um acelerador circular do tipo síncrotron de prótons a 450 GeV, contudo, dada a relevância de medir os bósons W e Z0 depois dos resultados bem sucedidos de Gargamelle e na indisposição de esperar pela construção de um novo acelerador elétron-pósitron, esperado a operar somente em 1989, foi modificado para acelerar um feixe de próton e outro de antipróton, ambos a 270 GeV de energia, para operar como o colisor Spp¯S[49[49] L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015).], sendo o primeiro acelerador do CERN a utilizar bunches de partículas. No que tange à produção de bósons Z0, esperava-se que isso ocorreria, principalmente, pela aniquilação quark-antiquark da forma uu¯Z0 e dd¯Z0, partícula que, por sua vez, possui como canal de decaimento pares elétron-pósitron ou múon-antimúon, que são observados pelos detectores. O acelerador era composto por cinco experimentos: Underground Area11 11 O termo se refere à área subterrânea (underground area) onde o acelerador Spp¯S estava localizado. 1 (UA1), Underground Area 2 (UA2), Underground Area 3 (UA3), Underground Area 4 (UA4) e Underground Area 5 (UA5). Os dois primeiros eram os principais experimentos e eram responsáveis pelas medidas do bóson Z0, de forma que mais detalhes sobre eles serão abordados nas próximas seções. A Figura 11 mostra o complexo de aceleradores à época, seus tamanhos relativos e as posições do UA1 e UA2.

Figura 11
Complexo de aceleradores do CERN à época do acelerador Spp¯S[53[53] L.S. Cittolin, Trigger and data-acquisition techniques overview, disponível em: https://cds.cern.ch/record/319677
https://cds.cern.ch/record/319677...
]. A figura mostra o tamanho do SPS – operando como Spp¯S com feixes de próton (P) e antipróton (P¯) – em relação ao PS e ao Coletor de Antiprótons (Antiproton Collector – ACOL), bem como a posição dos experimentos UA1 e UA2. O PS e o Spp¯S possuem 200 e 2200 metros de diâmetro, respectivamente. Atualmente ambos operam como estágios iniciais da aceleração dos prótons no Grande Colisor de Hádrons. Para uma revisão detalhada, veja a Ref. [54[54] M. Jacob, Czech. J. Phys. 34, 751 (1984).]. A figura inferior mostra a colisão dos feixes de próton e antipróton com momento de 270 GeV/c cada, resultando nas colisões do Spp¯S ocorrendo a 540 GeV.

6.1. Underground Area 1

O experimento UA1 foi um detector de propósito geral que levou dois anos para ser construído após a sua aprovação em 1979. Grande parte dos cientistas da época viam com ceticismo o tempo previsto, imaginando que não seria possível construir e operar um detector de tamanha complexidade. Contudo, no verão de 1981, o detector estava praticamente concluído. O experimento contava com um dipolo magnético que gerava um campo magnético de 7 kG perpendicular à linha do feixe. A região de colisão era cercada por uma câmara de arraste (do inglês, drift chamber) feita de Argônio e Etano, que fazia o rastreamento de partículas com uma precisão semelhante a de uma câmara de bolhas [55[55] D. Denegri, Physics Reports 403–404, 107 (2004).]. Essa região, chamada de traçador central (do inglês, central tracker) era envolta por calorímetros eletromagnético e hadrônico. O primeiro, feito de Chumbo e cintiladores, era útil para detectar os elétrons provenientes do decaimento dos bósons W e Z0. O calorímetro hadrônico, responsável por medir partículas constituídas de quarks, como prótons, nêutrons e mésons, consistia de cintiladores colocados entre duas paredes de Ferro posicionadas simetricamente nas extremidades do retorno da culatra magnética. Por fim, na parte mais externa, as câmaras de arraste muônicas faziam o traçamento de múons, outra medida de suma importância devido a um dos canais de decaimento do bóson Z0 ser um par múon-antimúon. A Figura 12 apresenta um corte transversal do experimento UA1 ilustrando seus subsistemas.

Figura 12
Corte transversal do experimento UA1. O traçador central era envolto pela bobina de Alumínio (Aluminum coil) e contadores de cascatas (shower counter) tanto de grande ângulo (large-angle) quanto na tampa (end-cap) e calorímetros eletromagnético e hadrônico, novamente de grande ângulo (large-angle) quanto de tampas (end-cap), intercalado com a culatra magnética (magnetic yoke). Na região mais externa do experimento, o traçamento de múons era feito por câmaras de arraste muônicas (muon detector) [56[56] M. Pimiä, em: Physics in Collision: High-Energy ee/ep/pp Interactions, editado por P. Carlson e W. Peter Trower (Springer US, Boston, 1983), v. 2., 57[57] J. Timmer, em: The UA1 Detector, editado por T.T. Van (Frontières, Gif-Sur-Yvette, 1984).].

6.2. Underground Area 2

O experimento UA2, diferentemente do UA1, não era um detector de propósito geral, mas construído para medir, de forma bastante precisa, os decaimentos em elétrons dos bósons W e Z0, tanto que nesse experimento não há um detector de múons. O foco estava em calorímetros muito granularizados12 12 Em instrumentação de Física de Altas Energias, a granularidade se refere aos sensores individuais do detector. em geometria esférica para estimar, de forma muito precisa, a energia depositada. A Figura 13 mostra uma ilustração do experimento. O detector de vértice (do inglês, vertex detector) era composto por um conjunto de detectores de rastreamento em formato cilíndrico, que, por sua vez, era envolto pelo calorímetro central (do inglês, central calorimeter), que cobria toda a região azimutal (300◦, inicialmente). O calorímetro era tanto eletromagnético, feito de Ferro, quanto hadrônico, feito de Chumbo13 13 O material mais denso permite incrementar a perda de energia dos hádrons, o que possibilita a determinação mais precisa de sua energia. . Após o último detector de rastreamento do detector de vértice, havia um cilindro de Tungstênio com uma câmara de fios, crucial na identificação dos elétrons ao permitir o casamento espacial entre as trilhas e os clusters. Bobinas toroidais geravam o campo magnético do experimento, contudo, este ficava restrito apenas aos detectores frontais, portanto, não havia campo na região central. Os detectores frontais eram compostos de câmaras de arraste, câmaras de proporcionais de tubos múltiplos (do inglês, multitube proportional chambers – MTPC) para contagem e, por fim, um calorímetro eletromagnético [49[49] L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015)., 55[55] D. Denegri, Physics Reports 403–404, 107 (2004).].

Figura 13
Corte transversal do experimento UA2. O detector de vértice (vertex detector) cobria a região de colisão, que era envolto pelo calorímetro central e bobinas toroidais (toroid coils). Câmara de arraste, câmaras de proporcionais de tubos múltiplos (MTPC) e um calorímetro eletromagnético frontal (forward calorimeter) compunham os detectores frontais, que estavam imersos em um campo magnético gerado por bobinas toroidais. [55[55] D. Denegri, Physics Reports 403–404, 107 (2004)., 49[49] L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015).].

6.3. Medidas do bóson Z

Medidas de Z0e+e e Z0μ+μ foram feitas no UA1, mostradas na Figura 14 em eventos individuais registrados pelo experimento. Durante a operação do acelerador, entre 1982 e 1983, 152 eventos de e+e satisfaziam as condições necessárias para serem provenientes de um decaimento do bóson Z0, enquanto que apenas 1 evento de μ+μ seria originado do bóson Z0. Na Figura 15 a massa invariante de todos os pares de léptons registrados durante a operação no UA1 foi contabilizada, resultando em uma massa de:

(19) m Z = 95,2 ± 2,5 (estat .) ± 3,0 (sist .) GeV/ c 2 .
Figura 14
Eventos medidos no UA1: (esquerda) Evento de Z0e+e e (direita) Evento de Z0μ+μ no UA1. [49[49] L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015).].
Figura 15
Massa invariante de todos os pares de léptons detectados no UA1 [49[49] L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015).], onde o valor médio (mean) corresponde ao valor apresentado na Equação 19, indicados os valores limiares (threshold) para eventos de e+e e μ+μ.

No experimento UA2, devido ao fato de não haver um detector de múons, o objetivo principal era detectar, com grande precisão, os pares de elétrons resultantes do decaimento do bóson Z0. A Figura 16 mostra os eventos registrados, onde a metade superior corresponde à deposição de energia dos pares de elétrons que possuem energia transversa ET > 25 GeV, enquanto que a metade inferior seleciona apenas as trilhas de elétrons que apontam para pelo menos um cluster dos calorímetros. A área hachurada diz respeito aos pares de elétrons que apontam para dois clusters do calorímetro eletromagnético. Com isso, foi possível estimar uma massa de:

(20) m Z = 91,9 ± 1 ,3 (estat .) ± 1 ,4 (sist .) GeV/ c 2 .
Figura 16
(Esquerda) Eventos de Z0e+e no experimento UA2. O gráfico superior corresponde à deposição de energia dos pares de elétrons que possuem energia transversa ET > 25 GeV. No parte inferior, são selecionados apenas as trilhas isoladas de elétrons compatíveis com pelo menos um cluster dos calorímetros. A parte hachurada corresponde às trilhas filtradas onde há correspondência com dois clusters[49[49] L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015).]. (Direita) Histograma da massa invariante de e+e de 100 mil eventos produzidos a partir de uma colisão pp¯ com s=540 GeV no MadGraph5[58[58] J. Alwall, R. Frederix, S. Frixione, V. Hirschi, F. Maltoni, O. Mattelaer, H.S. Shao, T. Stelzer, P. Torrielli e M. Zaro, arXiv:1405.0301 (2014).]. Todos os processos de produção pp¯e++eppee, tido como ruído, estão na cor preta e o processo pp¯Ze++eppzee na cor vermelha.

Importante notar a baixa quantidade de eventos na época, como pode-se ver pela parte hachurada da Figura 16: apenas três eventos de trilhas de elétrons foram selecionados. Para fins de comparação, um histograma da massa invariante de pares elétron-pósitron produzidos com energia de colisão igual ao Spp¯S feito com o gerador de eventos MadGraph5 [58[58] J. Alwall, R. Frederix, S. Frixione, V. Hirschi, F. Maltoni, O. Mattelaer, H.S. Shao, T. Stelzer, P. Torrielli e M. Zaro, arXiv:1405.0301 (2014).] é mostrado na Figura 16, mostrando o pico de ressonância bem definido na região de massa do bóson Z0. Uma medida mais atual do bóson Z0 pode ser vista na Figura 17, que mostra a massa invariante de pares de μ+μ medidos no experimento CMS do LHC entre 2015 a 2018 produzidos a partir de uma colisão próton-próton de s=13 TeV. Neste caso, tem-se uma análise muito mais precisa da medida da massa do bóson Z0, em que processos de dibósons, Drell-Yan, jatos e multijatos da Cromodinâmica Quântica foram contabilizados no ruído [59[59] B. Bilin, arXiv:2101.00896 (2021).].

Figura 17
Massa invariante de dimúons medidos pelo experimentos CMS do LHC de colisões pp com s=13 TeV entre 2015 e 2018. O termo “Misid.” (misidentified) são W + jatos e multijatos da QCD que são erroneamente identificados pela eletrônica do detector como contendo decaimento em múons. O termo “EW” (electroweak) são processos eletrofracos Drell-Yan e dibóson em τ+τ de produção eletrofraca [59[59] B. Bilin, arXiv:2101.00896 (2021).].

7. Conclusões

Este artigo realizou uma revisão histórica acerca do descobrimento do bóson Z0 pelos experimentos UA1 e UA2 do acelerador Spp¯S do CERN. A primeira teoria que tentou explicar as Interações Fracas foi proposta em 1934 por Fermi ao estender a ideia de Pauli, que propôs a existência de uma nova partícula, o neutrino. Trabalhos posteriores de adequação da teoria à descoberta da violação de paridade levaram à previsão de bósons massivos mediadores das Interações Fracas, porém apenas os de CC. Após os estudos de quebra de simetria por meio do mecanismo de Brout-Englert-Guralnik-Hagen-Higgs-Kibble, a teoria de unificação das Interações Fracas com a QED previu também interações de CNs, mediadas pelo bóson Z0. A primeira evidência experimental da existência de interações de CN foi observada no experimento Gargamelle, a qual consistia em uma câmara de bolhas com o objetivo de detectar neutrinos. Posteriormente, a massa do bóson Z0 foi medida nos experimentos UA1 e UA2, que operavam no acelerador Spp¯S, obtendo ótima concordância com as predições teóricas e, assim, confirmando o sucesso da Teoria Eletrofraca. Trata-se não só de uma vitória da Física Teórica, mas também da Física Experimental de Altas Energias. A inovadora ideia de Rubbia, McIntyre e Cline de transformar o então SPS, acelerador ainda em construção no CERN, para um colisor de próton e antipróton, permitia produzir bósons W e Z0 diretamente, dispensando a construção de um novo acelerador de partículas. Portanto, a confirmação da validade da Teoria Eletrofraca aconteceu muito antes do esperado e foi um importante passo para o estabelecimento do Modelo Padrão das Partículas Elementares.

Referências

  • [1]
    E.C.F.S. Fortes, M.C. Tijero e V. Pleitez, Rev. Bras. Ens. Fis. 29, 415 (2007).
  • [2]
    M. Novaes, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e4209 (2018).
  • [3]
    H. Yukawa, Proc. Phys. Math. Soc. Jap. 17, 48 (1935).
  • [4]
    M.A. Moreira, Rev. Bras. Ens. Fis. 31, 1 (2009).
  • [5]
    F. Ostermann, Partículas elementares e interações fundamentais (Instituto de Física-UFRGS, Porto Alegre, 2001).
  • [6]
    F. Dyson, Int. J. Mod. Phys. A 28, 1330041 (2013).
  • [7]
    W. Pauli, Pauli letter collection (Springer, Londres, 1930).
  • [8]
    P. Teixeira-Dias, Pauli’s letter of the 4th of December 1930, disponível em: http://www.pp.rhul.ac.uk/ ptd/TEACHING/PH2510/pauli-letter.html
    » http://www.pp.rhul.ac.uk/ ptd/TEACHING/PH2510/pauli-letter.html
  • [9]
    Particle Data Group, R.L. Workman, V.D. Burkert, V. Crede, E. Klempt, U. Thoma, L. Tiator, K. Agashe, G. Aielli, B.C. Allanach et al., Progress of Theoretical and Experimental Physics 2022, 083C01 (2022).
  • [10]
    G.J. Neary, Proc. R. Soc. Lond. A 175, 71 (1940).
  • [11]
    A. Belyaev e D. Ross, The Basics of Nuclear and Particle Physics (Springer International Publishing, Nova York, 2021).
  • [12]
    N. Bohr, Phil. Mag. Ser. 26, 1 (1913).
  • [13]
    J. Chadwick, Proc. R. Soc. Lond. A 136, 692 (1932).
  • [14]
    E. Fermi, Nuovo Cim. 11, 1 (1934).
  • [15]
    F.L. Wilson, American Journal of Physics 36, 1150 (1968).
  • [16]
    E. Fermi, Nuclear Physics: A Course Given by Enrico Fermi at the University of Chicago (University of Chicago Press, Chicago, 1974).
  • [17]
    C.S. Wu, E. Ambler, R.W. Hayward, D.D. Hoppes e R.P. Hudson, Phys. Rev. 105, 1413 (1957).
  • [18]
    S.L. Glashow, Nucl. Phys. 22, 579 (1961).
  • [19]
    J.S. Schwinger, Annals Phys. 2, 407 (1957).
  • [20]
    K. Karaca, Stud. Hist. Phil. Sci. B 44, 1 (2013).
  • [21]
    M. Costa e I.L. Batista, Ens. Mult. 7, 57 (2021).
  • [22]
    A. Salam e J.C. Ward, Nuovo Cim. 11, 568 (1959).
  • [23]
    F. Englert e R. Brout, Phys. Rev. Lett. 13, 321 (1964).
  • [24]
    G.S. Guralnik, C.R. Hagen e T.W.B. Kibble, Phys. Rev. Lett. 13, 585 (1964).
  • [25]
    P.W. Higgs, Phys. Rev. Lett. 13, 508 (1964).
  • [26]
    F. Close, Birth of a symmetry, disponível em: https://cerncourier.com/a/birth-of-a-symmetry/
    » https://cerncourier.com/a/birth-of-a-symmetry/
  • [27]
    J.J.M. Pimenta, L.F.B. Belussi, É.R.T. Natti e P.L. Natti, Rev. Bras. Ens. Fis. 35, 2306.1 (2013).
  • [28]
    D. Griffiths, Introduction to Elementary Particles (Wiley-VCH, Weinheim, 2008).
  • [29]
    U. Dore, P.F. Loverre E.L. Ludovici, Eur. Phys. J. H. 41, 137 (2016).
  • [30]
    R. Rosenfeld, Rev. Bras. Ens. Fis. 44, e20220251 (2022).
  • [31]
    A.C. Aguilar, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e4205 (2018).
  • [32]
    M. Silari, Rad. Prot. Dosym. 146, 440 (2011).
  • [33]
    C.O. Escobar, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e4214 (2018).
  • [34]
    M.A. Moreira, Rev. Bras. Ens. Fis. 29, 161 (2007).
  • [35]
    S. Mandelstam, Phys. Rev. 112, 1344 (1958).
  • [36]
    E.O. Lawrence e M.S. Livingston, Phys. Rev. 40, 19 (1932).
  • [37]
    E.O. Lawrence, Method and apparatus for the acceleration of ions, disponível em: https://patents.google.com/patent/US1948384A
    » https://patents.google.com/patent/US1948384A
  • [38]
    H. Wiedemann, Particle Accelerator Physics I: Basic Principles and Linear Beam Dynamics (Springer, Berlin, 1999).
  • [39]
    D. Cundy e S. Gilardoni, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 27, 39 (2017).
  • [40]
    L. Weiss, Report Number: CERN-CHS-26 (CERN, Geneva, 1988).
  • [41]
    V. Ruhlmann-Kleider, M. Neveu e S. Palanque, CERN and Saclay: 40 years of cooperation, disponível em:https://cerncourier.com/a/cern-and-saclay-40-years-of-co-operation/
    » https://cerncourier.com/a/cern-and-saclay-40-years-of-co-operation/
  • [42]
    F.K. Nóbrega e L.F. Mackedanz, Rev. Bras. Ens. Fis. 35, 1301 (2013).
  • [43]
    WIKIMEDIA COMMONS, File:LHC.svg, disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:LHC.svg
    » https://commons.wikimedia.org/wiki/File:LHC.svg
  • [44]
    CERN Document Server, The CERN accelerator complex, layout in 2022: Complexe des accélérateurs du CERN en janvier 2022, disponível em: https://cds.cern.ch/record/2800984
    » https://cds.cern.ch/record/2800984
  • [45]
    F.J. Hasert, S. Kabe, W. Krenz, J. Von Krogh, D.Lanske, J. Morfin, K. Schultze, H. Weerts, G. Bertrand-Coremans, J. Sacton et al., Nucl. Phys. B 73, 1 (1974).
  • [46]
    D. Haidt, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 165 (2015).
  • [47]
    M. Haguenauer, em: Gargamelle Experiment, editado por J.R. Smith (Rutherford Laboratory, Chilton, 1974).
  • [48]
    D. Perkins, em: Gargamelle and the Discovery of Neutral Currents editado por L. Hoddeson, L. Brown, M. Riordan e M. Dresden (Cambridge University Press, Cambridge, 1997).
  • [49]
    L. Di Lella e C. Rubbia, Adv. Ser. Direct. High Energy Phys. 23, 137 (2015).
  • [50]
    CERN Document Server, Gargamelle: first neutral current, disponível em: https://cds.cern.ch/record/39468, acessado em: 10/12/2023
    » https://cds.cern.ch/record/39468
  • [51]
    M. Chalmers, 50 years of giant electroweak discoveries, disponível em: https://home.cern/news/news/physics/50-years-giant-electroweak-discoveries
    » https://home.cern/news/news/physics/50-years-giant-electroweak-discoveries
  • [52]
    D. Perkins, Neutral currents, disponível em: https://cerncourier.com/a/neutral-currents/
    » https://cerncourier.com/a/neutral-currents/
  • [53]
    L.S. Cittolin, Trigger and data-acquisition techniques overview, disponível em: https://cds.cern.ch/record/319677
    » https://cds.cern.ch/record/319677
  • [54]
    M. Jacob, Czech. J. Phys. 34, 751 (1984).
  • [55]
    D. Denegri, Physics Reports 403–404, 107 (2004).
  • [56]
    M. Pimiä, em: Physics in Collision: High-Energy ee/ep/pp Interactions, editado por P. Carlson e W. Peter Trower (Springer US, Boston, 1983), v. 2.
  • [57]
    J. Timmer, em: The UA1 Detector, editado por T.T. Van (Frontières, Gif-Sur-Yvette, 1984).
  • [58]
    J. Alwall, R. Frederix, S. Frixione, V. Hirschi, F. Maltoni, O. Mattelaer, H.S. Shao, T. Stelzer, P. Torrielli e M. Zaro, arXiv:1405.0301 (2014).
  • [59]
    B. Bilin, arXiv:2101.00896 (2021).
  • 1
    Para uma introdução sobre os conceitos da interação eletromagnética a nível quântico, veja a Ref. [2[2] M. Novaes, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e4209 (2018).].
  • 2
  • 3
    Originalmente, Pauli nomeou essa nova partículas como nêutron, contudo, com a descoberta do nêutron, Fermi propôs chamá-lo de neutrino como forma de indicar uma partícula neutra mais leve. Veja detalhes na Ref. [8[8] P. Teixeira-Dias, Pauli’s letter of the 4th of December 1930, disponível em: http://www.pp.rhul.ac.uk/ ptd/TEACHING/PH2510/pauli-letter.html
    http://www.pp.rhul.ac.uk/ ptd/TEACHING/P...
    ].
  • 4
    No momento desta formulação, Fermi ainda não sabia dos sabores distintos para os neutrinos.
  • 5
    Essa constante tem valor conhecido como GF /(ℏc)3 = 1,166 378 7(6) × 10−5 GeV−2 [9[9] Particle Data Group, R.L. Workman, V.D. Burkert, V. Crede, E. Klempt, U. Thoma, L. Tiator, K. Agashe, G. Aielli, B.C. Allanach et al., Progress of Theoretical and Experimental Physics 2022, 083C01 (2022).]; GeV corresponde a 109 eV.
  • 6
    Para uma introdução sobre os constituintes do próton, veja as Refs. [33[33] C.O. Escobar, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e4214 (2018)., 34[34] M.A. Moreira, Rev. Bras. Ens. Fis. 29, 161 (2007).].
  • 7
    1 ano = (365 dias)·(24 h/dia)·(60 min/h)·(60 s/min) ≈ 3,15×107 s ∼ 107 s.
  • 8
    Apesar deste nome remeter ao vilão do desenho animado Smurfs, o nome deriva dos livros de François Rabelais, onde Gargamelle era a mãe do gigante Gargântua.
  • 10
    A radiação emitida por um elétron acelerado quando adentra o campo elétrico de um partículas carregadas ou núcleos de átomos; traduzido do alemão para o inglês, braking radiation.
  • 11
    O termo se refere à área subterrânea (underground area) onde o acelerador Spp¯S estava localizado.
  • 12
    Em instrumentação de Física de Altas Energias, a granularidade se refere aos sensores individuais do detector.
  • 13
    O material mais denso permite incrementar a perda de energia dos hádrons, o que possibilita a determinação mais precisa de sua energia.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    26 Jul 2023
  • Revisado
    27 Dez 2023
  • Aceito
    29 Fev 2024
Sociedade Brasileira de Física Caixa Postal 66328, 05389-970 São Paulo SP - Brazil - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: marcio@sbfisica.org.br