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Um aparato experimental para o estudo da força de empuxo

An experimental apparatus to study the buoyant force

Resumos

Este trabalho apresenta uma proposta didática voltada para alunos do Ensino Médio que visa abordar qualitativamente e quantitativamente a força de empuxo. O objetivo desta proposta é utilizar um experimento de baixo custo, feito com materiais simples, para mostrar e explorar a existência e causa do empuxo, além de estruturar um modelo matemático para o cálculo de tal força. Este experimento é útil também para reforçar e demonstrar conceitos sobre hidrostática como pressão e lei de Stevin, que são importantes para o entendimento e análise da força de empuxo. Esta proposta faz parte de um projeto apresentado pelos autores na disciplina Projetos Integrados de Ensino de Física 1, do curso de Licenciatura em Física da Universidade Federal do Paraná.

Palavras-chave:
Princípio de Arquimedes; força de empuxo; empuxoscópio; lei de Stevin; pressão


This work presents a didactic proposal aimed at high school students that aims to approach qualitatively and quantitatively the buoyant force. The objective of this proposal is to use a low-cost experiment, made with simple materials, to show and explore the existence and cause of the buoyancy, in addition to structuring a mathematical model for the calculation of such force. This experiment is also useful to reinforce and demonstrate concepts about hydrostatics such as pressure and Stevin’s law, which are important for understanding and analyzing the buoyant force. This proposal is part of a project presented by the authors in the discipline Integrated Projects of Physics Teaching 1, of the licentiate degree course in Physics at the Federal University of Paraná.

Keywords:
Archimedes’ principle; buoyant force; buoyancescope; Stevin’s law; pressure


1. Introdução

Por que icebergs e navios podem flutuar nos oceanos? Por que uma pessoa parece ficar mais leve dentro da água? Por que balões podem subir e descer pelos ares? Essas perguntas podem ser respondidas com base no princípio de Arquimedes. Arquimedes enunciou seu princípio no século III a.C. Segundo a lenda contada pelo historiador Vitruvius, Hiero II, rei de Siracusa, mandou que uma coroa votiva de ouro fosse colocada em certo templo para os deuses imortais, que fosse feita de grande valor, e designou para este fim um peso apropriado do metal para o fabricante. A coroa confeccionada pelo fabricante parecia ter o peso correspondente com aquele do ouro que havia sido designado para isto, entretanto, surgiram rumores de que parte do ouro havia sido retirado e que uma quantidade correspondente de prata havia sido substituída. Hiero desconfiou do ouvires e solicitou que Arquimedes verificasse se a coroa era de ouro puro ou não, mas sem causar nenhum dano à ela. Segundo a estória, enquanto Arquimedes pensava sobre o problema, chegou por acaso ao banho público, e lá, sentado na banheira, notou que a quantidade de água que transbordava dela era igual a porção imersa de seu corpo. Isto lhe sugeriu um método para resolver o problema, que sem demora, saltou alegremente da banheira e, correndo nu para casa, gritava bem alto que tinha achado o que procurava. Enquanto corria, gritava repetidamente em grego ‘eureka, eureka’ (achei, achei). Segundo o historiador, medindo os volumes de água deslocados por ouro e prata, e pela coroa, Arquimedes teria comprovado a fraude1 1 Há uma certa discussão sobre a veracidade desse método e outras histórias aparecem para justificar a descoberta. [1[1] R.A. Martins, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 17, 115 (2000).].

Segundo o princípio de Arquimedes, todo corpo parcial, ou completamente imerso num fluido, sofre a influência de uma força exercida pelo fluido, na direção vertical e dirigida de baixo para cima, cujo o módulo é igual ao peso do volume do líquido deslocado pelo corpo. Essa força, exercida pelo fluido sobre o corpo, é chamada empuxo e age no centro de gravidade da porção de líquido substituída pelo corpo. Assim, dependendo da relação entre a força de empuxo e o peso do corpo imerso no fluido, este pode boiar ou afundar, ou, como no caso de um balão, subir ou descer [2[2] F. Ramalho, N.G. Ferraro e P.A.T. Soares, Os Fundamentos da Física (Moderna, São Paulo, 2009), v. 1., 3[3] F. Sears, M.W. Zemansky e H.D. Young, Física (Pearson Education, São Paulo, 2003), v. 2., 4[4] A.K.T. Assis, Rev.da Soc. Bras. de História da Ciência 16, 69 (1996).].

Visando ir além de uma aula tradicional sobre este assunto e inspirados em outros trabalhos [5[5] V.C. Barbosa e A.M.S. Breitschaft, Revista Brasileira de Ensino de Física 28, 115 (2006)., 6[6] F.M.S. Lima, G.M. Venceslau e G.T. Brasil, Revista Brasileira de Ensino de Física 36, 2309 (2014)., 7[7] F.C Santos, W.M.S. Santos e S.C. Berbat, Revista Brasileira de Ensino de Física 29, 295 (2007)., 8[8] A.V. Gomes, E.M.S. Amaral e R.J. Prado, Revista Brasileira de Ensino de Física 41, 3 (2019)., 9[9] M.N.S. Montanheiro, Caderno Catarinense de Ensino de Física 7, 2 (1990).], elaboramos um projeto didático (uma proposta de aula para uma turma do Ensino Médio) que faz parte do sistema avaliativo da disciplina de Projetos Integrados de Ensino de Física 1, obrigatória para os discentes do curso de Licenciatura em Física da Universidade Federal do Paraná. Essa proposta é composta de um experimento que visa explorar de forma experimental e intuitiva a força de empuxo. Para isso, considerando um contexto onde os alunos já tenham conhecimento de conceitos de hidrostática, montamos um aparato experimental simples que chamamos de empuxoscópio, cujo propósito é demonstrar a existência e causa da força de empuxo, além de proporcionar uma forma de chegar à equação matemática para o cálculo de tal força, interpretá-la e analisar qual a influência das características do corpo (massa, volume, forma etc.) e do fluido (densidade) sobre o empuxo.

O texto está estruturado da seguinte maneira: inicialmente, apresentamos os materiais necessários para o experimento e um guia para a montagem experimental. Em seguida, exibimos os procedimentos experimentais e algumas discussões sobre como coletar e explorar as informações. Posteriormente, trazemos os dados obtidos no nosso experimento e mostramos uma forma de explorar os dados para chegar à equação geral do empuxo. Por fim, discutimos as condições para um corpo afundar ou boiar e concluímos com nossas considerações finais. Nos materiais suplementares se encontra um guia de aula para o aluno ir acompanhando e preenchendo no decorrer da exposição do professor.

2. Materiais

Vamos inicialmente guiar os passos para a montagem do experimento, juntamente com o empuxoscópio, dispositivo formado por um tubo com duas membranas (levemente esticadas) nas extremidades, com uma mangueira acoplada no seu interior (Figura 1).

Os materiais utilizados neste experimento foram:

  • Recipiente retangular transparente com água, com cerca de 25 cm de profundidade e largura, e 50 cm de comprimento2 2 Utilizamos uma caixa organizadora de plástico. ;

  • Cilindro, ou outro recipiente análogo, de plástico transparente ou vidro3 3 Utilizamos uma caneca de chope de plástico. ;

  • Duas luvas cirúrgicas ou qualquer membrana elástica;

  • Cerca de 30 cm de mangueira de aquário;

  • Cola, fita adesiva e estilete;

  • Dinamômetro;

  • Suporte para dinamômetro;

  • Proveta graduada;

  • Seis corpos de forma geométrica comum, que cabiam dentro da proveta, sendo dois deles com massas iguais e volumes diferentes e dois com volumes iguais e massas diferentes e todos com densidade maior do que a da água4 4 Utilizamos pedaços de metal (cilindros, cubos e paralelepípedos) encontrados no laboratório de usinagem da universidade. ;

  • Aproximadamente 1 m de fio de nylon.

Figura 1:
Empuxoscópio.

3. Montagem Experimental

Inicialmente, cortamos o fundo do cilindro de plástico deixando-o com dois orifícios. Em seguida, fizemos um furo no cilindro de diâmetro igual ao da mangueira de aquário. Acoplamos uma das pontas da mangueira dentro do cilindro e vedamos com ajuda da cola e da fita adesiva. Finalmente, cortamos as duas luvas cirúrgicas em forma de círculo, de tal forma que o diâmetro seja um pouco maior que o diâmetro do cilindro e com ajuda da cola e fita adesiva, fixamos cada pedaço nas extremidades do cilindro, deixando a membrana levemente esticada, conforme indica a Figura 1.

De posse do fio de nylon, fixamos um pedaço de cerca de 20 cm de comprimento em cada massa, a fim de facilitar a interação delas com o dinamômetro. O suporte para o dinamômetro foi feito utilizando pedaços de uma cadeira de madeira quebrada, conforme indica a Figura 2.

Figura 2:
Suporte para o dinamômetro.

4. Procedimento Experimental

O experimento foi dividido em duas partes, a parte demonstrativa da existência da força de empuxo (parte 1) e a parte matemática para o cálculo de tal força (parte 2).

4.1. Parte 1

Após o aparato experimental da Figura 1 estar montado, mergulhamos o empuxoscópio na horizontal no recipiente com água, mantendo sempre a extremidade livre da mangueira para fora da água, e analisamos o que acontecia com as membranas, conforme ilustrado na Figura 3.

Figura 3:
Esquema experimental de mergulho horizontal do empuxoscópio.

Repetimos o mesmo procedimento citado anteriormente, porém, agora mergulhamos devagar o aparato, na posição vertical, mantendo novamente a extremidade livre da mangueira para fora da água e analisando o que acontecia com as membranas superior e inferior à medida que afundávamos o empuxoscópio, conforme ilustrado na Figura 4.

Figura 4:
Esquema experimental de mergulho vertical do empuxoscópio.

4.2. Parte 2

Escolhemos uma das massas e utilizando o dinamômetro, medimos seu peso no ar, que denominaremos de peso real (Preal) (Figura 5 à esquerda). Em seguida, mergulhamos totalmente esse corpo na proveta com água e medimos a nova indicação do dinamômetro, a qual denominamos peso aparente (Paparente) (Figura 5 à direita). Para o cálculo do volume, anotamos a indicação inicial de água na proveta. Após mergulhar totalmente o corpo, verificamos a nova indicação. Fazendo a diferença entre o volume final e o inicial obtivemos o volume do corpo, que será o volume submerso (volume imerso na água), já que mergulhamos totalmente os corpos. Repetimos o mesmo procedimento para as demais massas, anotando todos os dados medidos e calculados.

Figura 5:
Configuração para medir o peso real (à esquerda) e o peso aparente (à direita).

4.3. Discussões

Quando mergulhamos o empuxoscópio na horizontal é perceptível que as membranas elásticas se deformam para dentro, pelo fato de a água exercer pressão sobre as membranas. No interior do empuxoscópio há pressão atmosférica (por isso a mangueira com extremidade livre para fora do recipiente com água), como a pressão exercida pela água é maior que a pressão no interior do cilindro, as membranas se deformam para dentro (Figura 3). É importante destacar que as membranas se deformam igualmente em ambos os lados, não importa o quanto deslocamos o cilindro na horizontal, demonstrando o fato de que a pressão num fluido, ao mesmo nível, deve ser igual, consequência da lei de Stevin. A parte mais interessante para nossa análise é quando mergulhamos o cilindro na vertical. Percebemos que nessa configuração as membranas se deformam gradativamente à medida que mergulhamos cada vez mais o cilindro no recipiente com água. Com o empuxoscópio da Figura 1 totalmente imerso, ficou evidente que a membrana inferior se deforma mais que a superior (Figura 4). Isso se deve ao fato de a pressão num fluido aumentar linearmente com a variação de altura da coluna de líquido (lei de Stevin). Como a parte de baixo está a uma altura maior, em relação à superfície, que a parte de cima, esta fica sujeita a uma pressão maior, considerando que as áreas de contato analisadas são iguais (bases do cilindro). Devido a essa diferença (gradiente) de pressão, surge uma força resultante atuando sobre o corpo imerso, dirigida na vertical de baixo para cima, a chamada força de empuxo. Intuitivamente, fica claro que o fluido exerce uma força maior no corpo na parte inferior, demonstrando de forma qualitativa a existência e origem da força de empuxo, além de frisar a relevância da lei de Stevin.

A parte 2 é uma análise quantitativa. Utilizando as leis de Newton, fazemos um diagrama de corpo livre, representando as forças que agem na massa quando medimos seu peso no ar e na água, conforme a Figura 6.

Figura 6:
Forças atuantes no dinamômetro e na massa quando esta está imersa no ar (à esquerda) e na água (à direita). Nestes diagramas, Fd e Fd são as tensões no fio ligando a massa e o dinamômetro, E é a força de empuxo e Preal e Paparente são os pesos da massa medidos pelo dinamômetro em cada situação.

Sabendo que a massa encontra-se em equilíbrio estático, a resultante das forças sobre ela deve ser nula. Dessa forma, no ar temos que o dinamômetro indica o peso do corpo no ar (Fd=Preal). Já quando imerso na água, percebemos que a indicação do dinamômetro diminui (devido ao empuxo). A nova indicação do dinamômetro é o peso aparente da massa (Fd=Paparente). Sendo ainda satisfeita a condição de equilíbrio e sabendo que o peso real de um corpo não pode variar, concluímos que surge uma força na vertical dirigida de baixo para cima, que foi evidenciada na parte 1, a força de empuxo. Assim, temos que, no caso da massa em equilíbrio na água:

(1) E + P aparente = P real E = P real - P aparente

Com ajuda da equação (1), calculamos facilmente o empuxo para cada massa, a partir das indicações do dinamômetro para o peso do objeto no ar e na água. Essa equação já nos informa o valor da força de empuxo, porém, essa não é a equação que gostaríamos de chegar, pois ela não nos diz qual a dependência dessa força com as características do corpo e do fluido. Dessa forma, vamos utilizar os dados obtidos para a força de empuxo e o volume submerso de cada corpo e tentar estabelecer alguma relação entre essas duas grandezas. Nossa proposta para realizar tal análise será apresentada na próxima seção, na qual analisamos os dados obtidos na apresentação do projeto na universidade.

5. Análise Dos Dados

Na apresentação do projeto para a turma e para o professor da disciplina na faculdade, realizamos o experimento de acordo com a seção de procedimentos experimentais e obtivemos dados para a força de empuxo e volume submerso (Vs) de cada corpo escolhido. Organizamos os dados obtidos experimentalmente conforme a Tabela 1.

Tabela 1:
Dados experimentais.

Note que corpos de mesma massa apresentaram empuxos diferentes, assim como corpos de massas diferentes. Também, corpos de mesmo volume forneceram empuxos aproximadamente iguais (considerando a incerteza dos instrumentos). Em contrapartida, corpos de volumes diferentes resultaram em indicações de empuxo diferentes. Além disso, na forma como os dados foram apresentados, é perceptível que o empuxo aumenta conforme o volume submerso aumenta. Em linguagem matemática, isso nos informa que o empuxo e volume submerso são grandezas diretamente proporcionais. Todas essas conclusões nos levam a pensar que o empuxo não depende da massa, mas sim do volume submerso do corpo mergulhado. Com o objetivo de encontrar essa relação, construímos um gráfico (Figura 7) do empuxo em função do volume submerso (E×Vs), com os dados da Tabela 1. Durante a apresentação, esboçamos o gráfico no quadro negro, pois essa proposta de aula considera que os alunos vão seguir os passos do professor desde a coleta até a análise de dados, preenchendo o roteiro de aula do material suplementar. Dessa forma, ao mesmo tempo que o professor constrói o gráfico no quadro negro, os alunos o fazem na área destinada a isso no roteiro. Os gráficos, que vamos mostrar aqui, foram feitos num programa de computador, a fim de facilitar a visualização e exposição da proposta de abordagem do professor.

Figura 7:
Gráfico do empuxo em função do volume submerso.

Note que a linha de tendência dos pontos experimentais é uma reta, a qual podemos expressar por y=ax+b. Podemos ajustar a melhor reta aos pontos experimentais. Vale a pena frisar que por se tratar de uma proposta de aula destinada a alunos do Ensino Médio, vamos apresentar a maneira mais simples de analisar o gráfico, ou seja, traçando a reta com o método do bom senso e calculando os coeficientes matematicamente, sem usar o MMQ [10[10] R.N. Almeida, O Método dos Mínimos Quadrados: Estudo e Aplicações para o Ensino Médio. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual do Norte Fluminense (2015).]. Aconselhamos que o professor utilize uma régua de comprimento suficiente ou qualquer outro objeto semelhante e tente traçar a melhor reta possível, guiando os alunos a fazerem o mesmo em seus roteiros. O gráfico da reta ajustada aos pontos encontrados no nosso experimento é mostrado na Figura 8.

Figura 8:
Reta ajustada aos pontos experimentais.

Como quando o volume submerso do corpo é zero o empuxo é nulo (se o corpo não está parcialmente ou totalmente imerso no fluido, este não exerce força sobre o corpo), o coeficiente linear b da reta tende a zero, logo, só precisamos calcular e interpretar o coeficiente angular a da reta ajustada. Utilizando a definição matemática de coeficiente angular e reconhecendo que no nosso caso yE e xVs, temos que:

(2) a = Δ y Δ x = Δ E Δ V s

Pegando dois pontos do gráfico, que melhor se ajustam à reta, podemos calcular facilmente o valor do coeficiente angular a. No nosso caso, escolhemos os valores correspondentes para os corpos 5 e 6 da Tabela 1.

(3) a = Δ E Δ V s = 0 , 44 N - 0 , 24 N 45 ml - 25 ml = 0 , 01 N / ml

Como no eixo y expressamos o empuxo e no eixo x o volume submerso, substituindo essas grandezas na equação y=ax+b e de posse do coeficiente angular calculado com a equação (3), podemos escrever:

(4) E = a . V s + 0 E = ( 0 , 01 N / ml ) V s

Partindo da lei de Stevin, podemos chegar à equação geral do empuxo e comparar o valor do coeficiente angular calculado. A diferença de pressão entre dois pontos em um líquido é dada por:

(5) Δ P = ρ g Δ h

Onde ρ representa a densidade do líquido, g a aceleração da gravidade local e Δh a diferença de altura entre os pontos analisados. Partindo da consideração de que Δh seja a altura do corpo imerso vamos multiplicar ambos os lados da equação (5) pela área A da base do corpo.

(6) A Δ P = ρ g Δ h A

Sabe-se que a pressão é definida pela razão entre a força perpendicular F pela área A que ela se distribui. Assim, uma diferença de pressão multiplicada por uma área é igual à uma força causada devido a essa diferença de pressão, que mostramos ser a força de empuxo E. Também, a altura Δh de um corpo multiplicado por sua área da base A é justamente o volume desse corpo. Nesse ponto, entra a importância de escolhermos objetos com formas geométricas cujos volumes são dados por essa relação entre área da base e altura, visto que para generalizarmos precisaríamos recorrer ao Cálculo Diferencial e Integral, um assunto com o qual a maioria das turmas do Ensino Médio não têm contato. Sendo assim, a equação (6) se resume em:

(7) E = ρ g V

Onde V representa o volume do corpo, no caso deste estar totalmente imerso. Essa é a relação entre o empuxo e o volume submerso do corpo no caso particular em que o corpo está totalmente imerso. Podemos ainda explorar o caso mais geral, no qual o volume submerso pode corresponder apenas à uma porção do corpo ou ele todo. Voltando para os dados obtidos experimentalmente, sabemos que a densidade da água é ρa=1×103kg/m3, que a aceleração local da gravidade é g10m/s2 e que 1ml=1cm3=1×10-6m3 para a água, além de que 1N=1kgm/s2. Dessa forma, podemos escrever:

(8) 1 N ml = 1 kg m / s 2 10 - 6 m 3 = 10 6 kg m 3 m s 2

Por conveniência, podemos reescrever a equação (8) como:

(9) 1 N ml = 10 2 10 3 kg m 3 p a 10 m S 2 g

Identificando as grandezas:

(10) 1 N / ml = 10 2 ρ a g

Substituindo na equação (4), tem-se:

(11) E = ( 0 , 01 × 10 2 ρ a g ) V s = ρ a g V s

Para um caso geral, temos que o empuxo é dado pela equação:

(12) E = ρ g V s

Onde ρ é a densidade do fluido no qual o corpo será imerso, g a aceleração local da gravidade e Vs o volume submerso do corpo.

Agora fica mais claro que o empuxo depende apenas do volume submerso do corpo que estamos mergulhando e da densidade do fluido utilizado. Como a densidade volumétrica de um corpo é dada por ρ=mVm=ρV, podemos interpretar o produto ρVs que aparece na equação (12) como sendo a massa de fluido (mf) deslocado pelo copo imerso, uma vez que o volume submerso corresponde ao volume de fluido deslocado. Portanto, podemos escrever o empuxo como:

(13) E = m f g = P f

Concluímos que o empuxo corresponde, em módulo, ao peso da massa de fluido deslocado pelo corpo submerso (Pf).

6. Boia ou Afunda?

Nesta seção, trazemos uma discussão extra sobre corpos flutuantes no caso em que o corpo não está em contato com as paredes do recipiente. Uma discussão mais detalhada pode ser encontrada na referência [7[7] F.C Santos, W.M.S. Santos e S.C. Berbat, Revista Brasileira de Ensino de Física 29, 295 (2007).].

Para saber se um corpo boia ou afunda num determinado fluido, devemos comparar sua densidade com a densidade do fluido. No primeiro caso, as forças atuando sobre ele são representadas na Figura 9.

Figura 9:
Diagrama de forças de um corpo flutuante em equilíbrio.

Estando o corpo em equilíbrio, temos que FR=0, e assim:

(14) E = P ρ f g V s = m g

Usando o fato de que m=ρV, tem-se que:

(15) ρ f V s = ρ c V c ρ f ρ c = V c V s

Onde ρc representa a densidade do corpo imerso e Vc o volume total do corpo. Como o volume do corpo é sempre maior ou igual ao volume submerso (VcVs), temos que o quociente Vc/Vs1, e daí:

(16) ρ f ρ c 1 ρ f ρ c

Concluímos que para um corpo boiar, ele precisa ter densidade no máximo igual a do fluido imerso. Caso contrário, o empuxo será menor que o peso e o corpo vai afundar. No caso analisado, o empuxo é no mínimo igual ao peso e portanto o corpo, sendo colocado na superfície, boia. Com isso, explicamos porque corpos de grande massa conseguem boiar, o segredo está na densidade média do corpo (quando esse é formado por vários materiais) em relação à do fluido, como por exemplo, um navio.

7. Considerações Finais

Com este experimento, foi possível mostrar de forma didática, que quando mergulhamos um corpo num líquido (ou num fluido, em geral) este fica sujeito à uma força exercida pelo líquido dirigida de baixo para cima, na vertical. Tal força chamamos de empuxo, e independe da massa, densidade ou tipo de material do corpo mergulhado. Do corpo, apenas o volume submerso (o quanto do corpo vamos mergulhar) é relevante. O empuxo também depende da densidade do líquido no qual estamos mergulhando o corpo. Assim, líquidos de diferentes densidades produzem forças de empuxo diferentes. Essa força exercida pelo líquido corresponde, em módulo, ao peso da massa de líquido deslocado pelo corpo mergulhado e varia de acordo com a aceleração da gravidade local, ou seja, se realizássemos esse mesmo experimento na Lua, por exemplo, os dados seriam outros, pois lá o valor da gravidade é diferente (menor) que daqui, embora a relação boia ou afunda seja invariante com a aceleração da gravidade, como mostra a equação (16).

Esta proposta de aula serve também para reforçar e demonstrar alguns conceitos de hidrostática anteriores ao estudo da força de empuxo, que estamos considerando que os alunos já tenham visto em aula. Com auxilio do empuxoscópio, é possível explorar, além da existência e causa da força de empuxo, a lei de Stevin e o conceito de pressão. O experimento num todo revisa assuntos de mecânica como leis de Newton e reforça a importância de interpretação de dados e gráficos. Esta proposta de aula foi pensada para ser aplicada numa turma do Ensino Médio, mas pode ser facilmente adaptada para um roteiro de experimento para uma aula de física experimental do Ensino Superior.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao professor Mauro Gomes Rodbard pelas sugestões e orientações para a construção desta proposta.

Material Suplementar

O seguinte material suplementar está disponível online: Apêndice A– Estudo da força de empuxo

Referências

  • [1]
    R.A. Martins, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 17, 115 (2000).
  • [2]
    F. Ramalho, N.G. Ferraro e P.A.T. Soares, Os Fundamentos da Física (Moderna, São Paulo, 2009), v. 1.
  • [3]
    F. Sears, M.W. Zemansky e H.D. Young, Física (Pearson Education, São Paulo, 2003), v. 2.
  • [4]
    A.K.T. Assis, Rev.da Soc. Bras. de História da Ciência 16, 69 (1996).
  • [5]
    V.C. Barbosa e A.M.S. Breitschaft, Revista Brasileira de Ensino de Física 28, 115 (2006).
  • [6]
    F.M.S. Lima, G.M. Venceslau e G.T. Brasil, Revista Brasileira de Ensino de Física 36, 2309 (2014).
  • [7]
    F.C Santos, W.M.S. Santos e S.C. Berbat, Revista Brasileira de Ensino de Física 29, 295 (2007).
  • [8]
    A.V. Gomes, E.M.S. Amaral e R.J. Prado, Revista Brasileira de Ensino de Física 41, 3 (2019).
  • [9]
    M.N.S. Montanheiro, Caderno Catarinense de Ensino de Física 7, 2 (1990).
  • [10]
    R.N. Almeida, O Método dos Mínimos Quadrados: Estudo e Aplicações para o Ensino Médio Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual do Norte Fluminense (2015).
  • 1
    Há uma certa discussão sobre a veracidade desse método e outras histórias aparecem para justificar a descoberta.
  • 2
    Utilizamos uma caixa organizadora de plástico.
  • 3
    Utilizamos uma caneca de chope de plástico.
  • 4
    Utilizamos pedaços de metal (cilindros, cubos e paralelepípedos) encontrados no laboratório de usinagem da universidade.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Dez 2022
  • Revisado
    23 Jan 2023
  • Aceito
    03 Fev 2023
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