Open-access Redefinições do ensino da medicina preventiva e social

Resumo:

Reexaminando as principais modificações introduzidas no ensino da Medicina Preventiva e Social nos últimos anos, o trabalho indica que tais modificações revelam não só os limites impostos a esse ensino pela atual organização dos serviços de saúde, mas, sobretudo, o caráter profundo do “dilema preventivista”. Analisa as bases conceituais de uma estratégia que permita a aproximação do ensino de Medicina Preventiva e Social das instituições e programas de saúde. Esta proposta é exemplificada pelo programa da disciplina Saúde Pública e Medidas de Profilaxia, do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da UFBA, que é discutido desde os seus antecedentes, em 19 75, até a elaboração do novo programa de 1980.

Summary:

Reexamining the principal changes introduced in teaching Preventive and Social Medicine in the last years, the study shows that these modifications reveal not only the limits imposed to this teaching by the present organization of health services, but mostly the profound meaning of the “preventive dilemma”. It analyzes the theorical basis of a strategy which permits the approximation of Preventive and Social Medicine teaching and the institutions and health programs. Examples of this proposal are shown by the outline of the discipline Public Health and Prophylactic Measures, of the Department of the UFBA Medical-School, which has been discussed since its antecedents in 1975 up to 1980 when the new program was elaborated.

1. INTRODUÇÃO

O ensino da Medicina Preventiva e Social no curso médico foi implantado especialmente a partir de conferências realizadas nos Estados Unidos, França e Inglaterra, em 1952 e 1953, e dos seminários de Viña del Mar, no Chile (1955), e Tehuacán, no México (1956). Essa proposta se inspirava nas idéias da medicina integral1)-(10 da qual se esperava uma mudança das instituições de saúde a partir da mudança no médico.

Embora certos propósitos dessas reuniões fossem cumpridos, como a incorporação de novas disciplinas, enfatizando a prevenção ao nível do currículo, as dificuldades surgidas na obtenção de uma “mentalidade preventivista” nos médicos e nas instituições de saúde suscitaram novas reuniões e estudos de avaliação do projeto.1),(2),(5),(9 Em um dos relatórios do encontro de 1974, destaca-se que “quando se confrontam as metas que se lograram com os objetivos inicialmente formulados, e se conclui que estes propósitos não foram alcançados, não é possível determinar com precisão se falharam os programas, ou se o problema radicava, na realidade, na fixação de metas ideal­ mente definidas”5.

Não se conseguiu, portanto, a transformação das práticas de saúde e da assistência médica, através da formação do médico. Isto porque “a educação médica cumpre um papel fundamental na reprodução da organização dos serviços de saúde e se cristaliza na reatualização e preservação das práticas especificas tanto nas dimensões do conhecimento, quanto nas técnicas e conteúdo ideológico”5. Do mesmo modo, “é a própria estrutura de assistência médica que exerce um papel dominante sobre o processo de formação de recursos humanos”,5 especialmente através do mercado de trabalho e das condições da prática.

Chama-se ainda a atenção para o fato de que a “formulação de programas de ensino de Medicina Preventiva não tem considerado com uma perspectiva adequada o mercado de trabalho, nem tão pouco os determinantes históricos da estrutura em sociedades concretas”5. Nesse sentido, considerou o Comitê que “em vez de agregar novos conteúdos ao campo imprecisamente delimitado da Medicina Preventiva, seria preferível a delimitação deste campo, dentro de uma perspectiva mais realista das possibilidades de ensino da medicina e das limitações na sua eficácia, como determinante da forma em que as práticas da assistência médica e dá saúde assumem num momento determinado em cada formação social concreta”5.

A partir desta limitação do campo, poderia haver modificações qualitativas nos conteúdos dos programas “que se refletiriam na estruturação das atividades no âmbito das organizações dos departamentos”5.

Tais considerações se justificam diante das propostas de redefinição de disciplinas na área da Medicina Preventiva e Social. A experiência demonstra que não tem muito sentido insistir em insucessos passados de preparar “profetas de um vir a ser”. Médicos capazes de “ver” o doente numa forma integral, com uma mentalidade “preventiva”, atentos aos aspectos “bio­psicossociais” das doenças, se contrapõem à prática médica vigente. Nesta perspectiva, convém rediscutir o objeto da medicina social a partir do “estudo das instituições que proporcionam atenção à saúde e os esquemas de ação médica que delas resultam”5.

É fato conhecido que as ações diagnósticas e terapêuticas dirigidas ao consumidor individual exercem um domínio sobre os demais projetos orientados para a saúde coletiva, tais como a Saúde Pública e a Medicina Comunitária. Assim, a despeito de os Departamentos de Medicina Preventiva esforçarem-se para integrar o ensino de vários temas, com as diferentes unidades docentes das escolas, não alcançaram o sucesso esperado. Muito dos temas incluídos no ensino da Medicina Preventiva foram “influenciados pelo cursos tradicionais de saúde pública, onde o conhecimento teórico tinha uma correspondente área de aplicação”5. Muitos Departamentos tomaram a si a incumbência de transformar o estudante em médico integral, buscando a integração com outros Departamentos. Porém, como ressaltou o grupo de peritos da OPS, “a integração resultou com freqüência em contatos artificiais com as outras áreas de ensino e em sobrecarga de atividades docentes para os reduzidos professores de Medicina Preventiva”5. Mesmo assim, muitos destes professores “tiveram a preocupação de estudar métodos e técnicas de ensino e assumir posições em comissões da instituição encarregadas de planejar mudanças curriculares”5.

2. REDEFINIÇÕES DO ENSINO DE MEDICINA PREVENTIVA E SOCIAL

Em função desses pressupostos e constatações, foram apresentadas as seguintes recomendações:

  1. estudo da realidade concreta onde se situa o Departamento de Medicina Preventiva e a Faculdade num determinado momento;

  2. fixação de metas e objetivos específicos;

  3. adotar como áreas essenciais a epidemiologia, as ciências sociais e a planificação;

  4. os aspectos preventivos da Medicina, de importância para a formação dos profissionais de saúde, devem ser de responsabilidade conjunta das unidades clínicas5.

A justificativa para tais propostas reside nas características da prática profissional vigente. Diante desta, os docentes de Medicina Preventiva e Social, de um modo geral, sentem grandes dificuldades no cumprimento das suas funções, porquanto estariam ensinando assuntos pouco relevantes para a referida prática.

Como eles não podem, enquanto técnicos, transformar esta prática, restam-lhes, num dado momento histórico, as alternativas de serem eficientes e ineficazes, ou ineficientes e ineficazes. O uso proposital da palavra “ineficazes” em ambas as alternativas pressupõe que sua atividade docente será ineficaz enquanto não houver transformações significativas no exercício profissional e na estrutura dos serviços de saúde. Todavia, eles poderão ser eficientes, ou ineficientes, à medida que alcancem, ou não, os objetivos por eles definidos em função do espaço conceitual da Medicina Preventiva e Social. Conseqüentemente, a eficácia do ensino dependeria, em última análise, de modificações que não se fazem no âmbito da escola médica, enquanto que a eficiência representaria o mínimo que se poderia esperar de um ensino que se pretende inovador7.

Como propusemos noutra oportunidade, a opção que se apresenta é assumir a contradição de compreender a sua ineficácia e defender e preservar a sua eficiência.

Nesse sentido, cabe num primeiro momento a delimitação do objeto da Medicina Preventiva e Social. A partir daí, poder-se-ia privilegiar a discussão de problemas da assistência médica. Oferecer-se-iam elementos de análise para a compreensão da estrutura de saúde, problematizando o objeto do estudo, ou seja, mostrar o que se faz na assistência médica vigente e porque não é concretizada a racionalidade evocada pelos técnicos.

Contudo, o aspecto mais problemático para as disciplinas relativas à Medicina Preventiva e Social é tornar viável o ensino técnico-instrumental. Enquanto ele se concentra em atividades de investigação a situação não é bem percebida (por exemplo, levantamentos em epidemiologia). O problema surge, em extensão e profundidade, quando se necessita da aplicação de conhecimentos em termos de ações preventivas e de planejamento. Alguns motivos pode­ riam ser enumerados:

  1. inespecificidade das técnicas e dos instrumentos. As técnicas de imunização, o exame pré-natal, o seguimento em puericultura, o exame periódico de saúde etc. não são específicos das práticas dos Departamentos de Medicina Preventiva e Social.

  2. subutilização das técnicas e dos instrumentos pelas instituições de saúde. Por motivos que fogem ao escopo desse trabalho, os serviços públicos de saúde e mesmo as instituições privadas não se utilizam razoavelmente das técnicas e dos instrumentos conhecidos.

  3. inadequação da aplicação das técnicas e dos instrumentos às condições especiais do processo ensino/aprendizagem, particularmente no que se refere ao chamado “treinamento de serviço”. Por exemplo: um grupo de alunos escalado para um estágio em investigação epidemiológica pode ser surpreendido com o não aparecimento de casos durante a semana de estágio; outro grupo que acompanha a elaboração de um projeto de saúde por técnicos de instituições oficiais vê seu trabalho interrompido com o término do ano letivo, e não com a conclusão do projeto.

Obviamente, tais dificuldades não são nem únicas, nem insuperáveis. Exigem, contudo, uma reflexão crítica cuidadosa para que as propostas alternativas levem em consideração as condições concretas e não os objetivos idealmente definidos. Existe presentemente uma dissociação entre o ensino e a prestação de serviços de saúde, particularmente no setor público. Tal dissociação tem raízes estruturais, de modo que não é pela redefinição idealista dos objetivos de uma disciplina, ou de uma unidade de ensino que ela seria superada.

Conseqüentemente, o enfoque que propomos, tendo em conta as recomendações dos estudos citados, não privilegiaria a entrega de técnicas e instrumentos, acabados e prontos, para o uso dos estudantes de Medicina. Tais técnicas e instrumentos seriam adquiridos pelos indivíduos que optassem pela especialização, pela docência e investigação em Medicina Preventiva e Social. As concepções prevalentes sobre teoria e prática poderiam adjetivar esse enfoque de “teórico” e “sem sentido prático”. Ele, porém, não confunde teoria com abstração. Recusando-se abstrair-se da realidade, essa abordagem poderia esclarecer melhor ao estudante de graduação as relações entre sociedade-Estado-ensino-assistência médica e analisar o impacto das ações de saúde executadas pelos profissionais e instituições de saúde. Entende a prática médica enquanto prática social, exercida por técnicos numa formação social concreta, convivendo e trabalhando as suas contradições.

Finalmente, a participação dos Departamentos de Medicina Preventiva e Social não pretende desenvolver atividades supletivas a uma formação clínica inadequada ou insuficiente, nem suprir deficiências existentes em outras disciplinas. Também desautoriza a práticas preventivistas embasadas num suposto “contato revelador”, tais como as visitas episódicas às instituições, ou às famílias de baixa renda. Evitar-se-ia, na medida do possível, desligar-se do objeto de análise da Medicina Preventiva Social, isto é, das instituições de saúde.

3. ELABORAÇÃO DO PLANO DE ESTUDOS

Um dos pressupostos que se deve levar em conta no estabelecimento do plano de estudo das disciplinas da área de Medicina Preventiva e Social é a ineficácia do ensino inovador e problemático, enquanto forem preservadas as condições estruturais do setor saúde. Portanto, o elenco das táticas a ser acionado pode ter como referencial, em termos de conjuntura, a defesa da eficiência do ensino. Não se pode, contudo, perder de vista que a estratégia visa à eficácia, que estaria na dependência de transformações do setor a serem determinadas pelo movimento mais amplo das forças sociais.

Apreende-se daí a necessidade de analisar a incorporação dos movimentos ideológicos da reforma sanitária, da Medicina Social, da Medicina Preventiva e da Medicina Comunitária pela sociedade civil e pelo Estado. A partir dessa análise, poder-se-ia orientar o plano de estudos numa perspectiva pragmática, ou inovadora. No primeiro caso, visa-se a uma adequação máxima do ensino à situação vigente. No segundo caso, rompe-se com o pragmatismo utilitarista e se desvenda uma prática geradora de tensão. Tanto num caso como no outro, o que parece importante é explicitar no nível de política (não necessariamente no de programação) a opção assumida.

Nessa perspectiva, é que o “dilema preventivista” impõe o permanente questionamento da prática pedagógica: que conteúdo? que política e que objetivos? qual a análise dos núcleos de poder? quais as táticas e estratégias? quais as práticas relevantes? quais os recursos disponíveis? quais as limitações do tempo curricular?

A opção inovadora poderia adotar uma política que privilegiasse a vertente teórico-conceitual em vez da prático-instrumental. Todavia, a vertente menos prestigiada poderia ser incluída na programação por uma necessidade tática do processo ensino-aprendizagem. Nessa oportunidade, seriam questionados os motivos da inaplicabilidade de conceitos e técnicas aprendidos-apreendidos e problematizadas as ideologias do “sentido prático” para um dado mercado de trabalho. Assume-se, dessa maneira, a contradição de que se pode estar ensinando coisas irrelevantes para a prática profissional vigente no âmbito da saúde coletiva, porém abre-se um espaço para a elaboração, experiência e crítica de práticas alternativas.

Quanto à redefinição de objetivos e planos de estudos, pode ser entendida como um mecanismo que torna viável, no nível de graduação, uma análise crítica sobre os estudos que privilegiam a produção social das doenças, as instituições de saúde, o saber e a prática médica, através de uma metodologia mais pertinente. Nesse sentido, convém preliminarmente ressaltar as diferenças entre os marcos conceituais das propostas de Medicina Social e os do modelo prevalecente no aparelho universitário “no qual predomina o conceito de doença como acidente ou episódio mais ou menos isolado, o de homem como ser eminentemente biológico e o do exercício da medicina como uma atividade profissional de caráter liberal na qual a relação médico-paciente tem um alto sentido de compra de serviço”2.

A Medicina Social, ao contrário, procura entender a doença como um processo que se relaciona com a estrutura da sociedade, o homem como ser social e histórico, e o exercício das ações de saúde como uma prática social permeada por uma prática técnica que atua sobre o corpo, instrumento de trabalho.

Verifica-se, portanto, um marco conceituai hegemônico, condizente com a ideologia dominante do modelo vigente de organização dos serviços de saúde, enfrentando-se com um marco conceitual subalterno no âmbito de um discurso aparentemente inovador. Evidentemente, como tais conceitos relacionam-se com uma dada visão de mundo dominante, ao nível da superestrutura, a luta ideológica que se instala fica comprometida com a permanência da estrutura. Abre-se, portanto, um espaço de persistente tensão.

Desse modo, é válido chamar a atenção para o fato de o discurso preventivista não ser homogêneo, porquanto traz no seu bojo as contradições dos sujeitos que o enunciam. Apresenta-se com o predomínio de uma dimensão apologética, de uma dimensão tecnocrática, ou de uma dimensão crítica1. Em uma certa conjuntura, portanto, uma dada proposta de saúde coletiva pode ser incorporada pelo Estado e recuperada do seu “dilema”, desde quando se apresente na sua feição tecnocrática como uma panacéia para a solução dos impasses do setor saúde no seu estado de crise permanente.

4. A BUSCA DE UMA ESTRATÉGIA

Torna-se necessária a definição de uma estratégia que possibilite uma aproximação do ensino da Medicina Preventiva e Social do seu objeto - as instituições e programas de saúde. Para tanto, seria importante avaliar as experiências docentes da proposta da Medicina Comunitária e dos seus desdobramentos como programas de “integração docente-assistencial”6), (9.

À medida que a realização desses projetos se fez bastante problemática, cumpre identificar algumas alternativas que permitam uma prática associada ao complexo de saúde, mediante a inserção de alunos e docentes nas suas instituições.

O conceito de inserção reconhece os impasses político-administrativos no âmbito da integração entre o aparelho escolar e o aparelho de serviço. Para a sua operacionalização seria interessante a vinculação institucional de docentes ao aparelho de serviço, facilitando, desse modo, a prática em serviço do educando.

Este conceito rechaça a idéia do educando constituir-se em mero executor de serviços da política institucional. Também não alimenta o sonho quixotesco de “agente de mudança” no interior da instituição. Acena, porém, para a possibilidade de aprender fazendo/analisando/propondo. Busca, portanto, o exercício de uma competência técnica (fazendo), de uma competência crítica (analisando) e de uma competência criativa (propondo). Tais competências permitiriam aprender/apreender/empreender uma prática de mudança intra-institucional associada às demais práticas sociais.

Com base nesses pressupostos, cumpre elaborar um elenco de programas específicos, que operacionalizem essa proposta, e identificar as fontes de financiamento, assim como os mecanismos de coordenação, gestão e supervisão.

5. O EXEMPLO DO PROGRAMA DE SAÚDE PÚBLICA E MEDIDAS DE PRO­ FILAXIA

5.1. Experiências anteriores

Embora a disciplina Saúde Pública e Medidas de Profilaxia (SPMP) tenha sido criada em 1974 e introduzida no currículo médico em 1975, convém relatar, ainda que sucintamente, duas etapas que lhe precederam: uma anterior à Reforma Universitária (Higiene) e outra posterior (Medidas de Profilaxia).

Até 1970, alguns conteúdos teóricos e práticos de SPMP eram ministrados no âmbito da disciplina Higiene, oferecida aos alunos do 5° ano médico. Assim, até a emergência da Medicina Preventiva na Faculdade de Medicina, da UFBA, seguia-se o modelo clássico da Higiene que, embora fizesse referência a certas medidas profiláticas, caracterizava-se pela inexistência de um encontro do aluno com a prática médica e com os serviços de saúde. Com a introdução das idéias da Medicina Preventiva, algumas discussões e práticas passaram a ser desenvolvidas no chamado Ambulatório de Família, ligado a 2ª Clínica Médica do Hospital Universitário, estendidas, posteriormente, às “Clínicas de Famílias” instaladas em duas comunidades urbanas (Brotas e Federação). A partir de 1968, coma incorporação do discurso da Medicina Comunitária e o aproveitamento de uma conjuntura favorável à integração Universidade/Secretaria de Saúde do Estado, foram iniciadas algumas atividades no interior do então 2° Centro de Saúde e depois do 5° Centro de Saúde, ambos em Salvador.

Com a implantação da Reforma Universitária, a disciplina Medidas de Profilaxia foi incluída no currículo médico e teve como campo de prática a Unidade Sanitária Prof. Sabino Silva (atual 9° Centro de Saúde), inaugurado em março de 1971. O programa teórico dessa época seguia o livro de Hilleboe e Larimore4 e a prática era desenvolvida, sob a forma de estágio, nos diversos serviços da Unidade Sanitária, que apresentava uma característica especial: enquanto Centro de Saúde-Escola, os profissionais, na sua maioria, eram docentes da Universidade. Nos dois primeiros anos de experiência, apesar da resistência de parte dos alunos e de alguma insatisfação docente, o saldo parece ter sido positivo. Posteriormente, os novos problemas enfrentados na condução do programa (particularmente as dificuldades no entrosamento da UFBA/SESAB e a diminuição do entusiasmo docente devido a distintos fatores) repercutiram negativamente nas atividades didáticas.

Nesse contexto é que se implantou, em 1975, a disciplina SPMP. Caracterizou-se por uma modernização do programa teórico, particularmente através de incorporação de novos enfoques pedagógicos7. Todavia, as atividades práticas, sob a forma de estágio nos diferentes serviços da Unidade Sanitária, cada vez mais eram prejudicadas com a involução do programa comunitário. No início de 1976, a Universidade concluiu o processo de retirada gradual do 9° Centro, e este passou a desenvolver os programas normais da Secretaria de Saúde, embora mantendo na administração um servidor que também era ligado à Universidade. Após um período problemático de 2 meses no 5º Centro de Saúde, a disciplina SPMP voltou ao 9° Centro, mantendo os seus estágios até o final de 1976. Este foi o último ano em que se desenvolveram práticas de cuidado primário no âmbito da disciplina SPMP. Nesse particular, quatro fatores deveriam ser mencionados para tal decisão: a) insuficiência de pessoal docente do Departamento de Medicina Preventiva; b) deterioração do padrão de atendimento do 9° Centro; c) desmotivação dos docentes em prestar assistência médica no 9° Centro; d) aprofundamento da crítica aos modelos preventivistas e comunitários.

No 1° semestre de 1977, o Departamento foi forçado a oferecer a disciplina para mais de 200 alunos, e o curso retrocedeu qualitativamente, tanto no programa teórico como no prático. Voltaram as aulas teóricas de anfiteatro, após as experiências de seminários e discussão dirigida, sendo suprimidas, também, as atividades práticas. No 2° semestre, porém, mantiveram-se as aulas teóricas e foram introduzidos os seminários de Medicina Social e de Medidas de Profilaxia, como substitutos do estágio.

Em 1978, o curso foi repensado em relação às suas atividades teóricas e práticas. Aboliram-se novamente as aulas teóricas e adotou­se a técnica de discussão dirigida com textos de saúde pública, preparados por docentes do Departamento. Mantinham-se os seminários de Medicina Social e iniciou-se um trabalho junto ao 9° Centro de Saúde para a implantação de um programa local de vigilância epidemiológica. O desenvolvimento do curso foi prejudicado, no entanto, pela greve dos alunos na metade do 1° semestre. No semestre seguinte, o curso sofreu novo retrocesso pela descontinuidade da prática da vigilância epidemiológica e pelas deficiências materiais da Faculdade de Medicina que impossibilitavam a produção de textos do programa teórico.

Em 1979 superou-se um dos grandes problemas enfrentados pela disciplina: a inexistência de um livro básico em língua portuguesa e escrito por brasileiros. Adotou-se o livro “Saúde e Medicina no Brasil”3 e ministrou-se, em ambos os semestres, um curso teórico que privilegiava a análise da organização da assistência médica e dos programas de saúde pública. No âmbito das atividades teórico-práticas, verificou-se uma experimentação de várias alternativas escolhidas opcionalmente pelos alunos.

No 1° semestre três grandes grupos foram formados:

  1. seminários de Medicina Social;

  2. seminários de Profilaxia;

  3. análise do nível de saúde, dos condicionantes e dos programas de saúde do Estado da Bahia.

No 2° semestre, outras opções foram testadas:

  1. trabalho comunitário em saúde;

  2. estudo comparativo da prática médica em diferentes instituições;

  3. vigilância epidemiológica em Centro de Saúde;

  4. ensino médico e Medicina Social (modificado para uma investigação sobre o atendimento médico em Hospital de Ensino);

  5. seminários de Profilaxia.

A experiência de 1979 deve ser entendida a partir da avaliação de 19767 e do insucesso de 197 8. Durante a programação da disciplina admitíamos que a preservação da eficiência diante da inviabilidade da eficácia deveria merecer reparos, à medida que as condições concretas do ensino médico na Bahia e a situação crítica pela qual passava o Departamento de Medicina Preventiva obstaculizavam até mesmo a eficiência do ensino8. A opção que se apresentava, ainda que provisória, era criar o máximo de atividades opcionais autônomas e tolerantes, que afastassem a disciplina do “modelo mínimo legal”9 e que fossem relevantes para com o objeto da saúde coletiva, delineado nas discussões atuais sobre o tema. Seria, portanto, uma alternativa de “manter acesa a chama”, porém reconhecendo a heterogeneidade e o desinteresse manifesto dos alunos de graduação.

Essa opção política, apesar de parecer realista, teve as suas desvantagens. Em primeiro lugar, favoreceu o aparecimento de sérios estrangulamentos para a coordenação e administração do programa, que, em certos momentos, teve uma aparência caótica e desorganizada. Em segundo lugar, os alunos não se motivaram suficientemente, muito embora escolhessem livremente o tipo de atividade a desenvolver (diversos alunos chegaram a explicitar que no âmbito da saúde coletiva não haveria nenhuma atividade capaz de motivá-los). Em terceiro lugar, os docentes manifestavam a sua insatisfação, não somente em função do desinteresse dos alunos, mas também contra o aspecto aparentemente improvisado, desorganizado e pouco prático da disciplina.

É possível que essas atividades opcionais devessem ser fundamentadas numa inserção maior do aluno com uma prática mais palpável junto aos serviços de saúde. Nesse sentido, apesar da resistência à Medicina Preventiva não ser superada, pode ser mais viável a introdução de novas abordagens em Medicina Social.

5 .2. Elaboração do novo programa

A partir de uma reunião do Departamento de Medicina Preventiva no final de 1979, foi criado um grupo de trabalho composto de docentes e membros do Centro de Desenvolvimento de Recursos Humanos da Secretaria de Saúde, para analisar os conteúdos teórico e prático de cada disciplina. O grupo decidiu iniciar pela disciplina Saúde Pública e Medidas de Profilaxia, a qual, em consenso, foi considerada a mais problemática na sua atividade prática, devido ao grande número de alunos e a inexistência de um campo definido de prática. A disciplina SPMP é oferecida a alunos a partir do 8° semestre do curso médico, com uma carga horária de 30 horas teóricas e 90 horas práticas. O grupo examinou certos aspectos históricos do Ensino da Medicina Preventiva e Social e, após revisão de cada uma das experiências já desenvolvidas nos anos anteriores, tendo constatado inclusive os seus insucessos, discutiu a conduta a adotar para o ano de 1980.

Entre os docentes havia, desde a reunião do Departamento que gerou a formação do grupo de trabalho, uma preocupação com a busca de maior eficiência como meio, inclusive, de satisfação pessoal no trabalho, a qual vinha sendo perdida gradativamente. Esta busca não perdia de vista, também, a preocupação com a eficácia, embora reconhecesse que a mesma dependia de fatores não redutíveis à questão pedagógica. Diante, desta limitação, a preocupação foi de definir uma estratégia que tornasse viável uma aproximação do ensino da Medicina Preventiva e Social ao seu objeto - as instituições e programas de saúde. Esta foi, também, a conclusão do grupo que, a partir daí, passou a tentar identificar alternativas que permitissem a realização de uma prática associada a Secretaria Estadual de Saúde.

De início a dificuldade encontrada foi o grande número de alunos matriculados em cada semestre na disciplina (100, em média), o que levava a pensar em práticas bem abrangentes, ou seja, junto a serviços que fossem amplamente oferecidos pela Secretaria de Saúde. Daí a opção pelo cuidado primário, desenvolvido nos Centros de Saúde de Salvador. Vale ressaltar que a escolha deste tipo de prática se deu após longas discussões, que levaram em conta, por exemplo, se a atividade de cuidado primário, pela sua não especificidade, traria o risco de se transformar em atividade complementar de outras áreas deficientes da formação clínica do estudante. Acrescente-se a isto a dificuldade identificada entre os próprios docentes de assumirem esta nova prática, que não atende em grande parte aos seus interesses profissionais atuais e da qual já estão desligados há algum tempo. Considerou-se que outras atividades na área de planejamento, administração, avaliação (ou mesmo práticas como aquelas desenvolvidas no ano de 1979) poderiam ser mais relevantes. Entretanto, a não incorporação das mesmas, de forma mais ampla pelas instituições, e a dificuldade em adequá-las, onde existem, ao programa de ensino tornam-nas de difícil execução, principalmente se se consideram ainda o grande número de alunos e as dificuldades já identificadas nas experiências anteriores.

Examinada a realidade do Departamento de Medicina, Preventiva; o grupo estabeleceu os objetivos específicos para a disciplina e o respectivo programa.

O respaldo legal para a inserção de alunos e docentes nos Centros de Saúde foi o convênio assinado no início de 1980 entre a SESAB, o INAMPS e a UFBA, para a integração de suas atividades. Nesse convênio a Secretaria de Saúde facilitaria a utilização de suas unidades pelos estabelecimentos de ensino da UFBA. A operacionalização, no entanto, não foi definida, e as dificuldades já identificadas na articulação aparelho escolar - aparelho de serviço levaram a pensar em alternativas que tornassem viável a proposta e atendessem aos interesses de ambas as instituições.

A estratégia planejada foi a incorporação no Programa dos Residentes em Medicina Social, programa esse que teve início no ano de 1980, sob a coordenação do Departamento de Medicina Preventiva, em convênio com o INAMPS. Foi previsto que os residentes ficariam em tempo integral nos Centros de Saúde (dois em cada) e seriam responsáveis, nos turnos da tarde, pela supervisão das atividades práticas dos alunos de SPMP.

A escolha dos Centros levou em conta a presença de alguns requisitos básicos explicitados nas negociações com a Secretaria de Saúde: a) presença de um sanitarista; b) desenvolvimento de todas as atividades básicas; c) duas salas equipadas disponíveis para os residentes (ambulatórios de clínica geral e pediátrica); d) uma sala de reunião.

Foram escolhidos, em reunião com a Diretoria Regional de Saúde e os Diretores dos Centros, aqueles quatro que se aproximavam mais dos requisitos estabelecidos.

As informações sobre a organização do programa de 1980 encontram-se em anexo.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As redefinições no ensino da Medicina Preventiva e Social no Brasil revelam não só os limites impostos ao seu campo de prática pela atual organização dos serviços de saúde, mas sobretudo, o caráter mais profundo do “dilema preventivista”, que encontra suas raízes na estrutura social1.

Ao privilegiarmos a discussão sobre a disciplina Saúde Pública e Medidas de Profilaxia pensamos colocar novas questões para o trabalho teórico que se vem desenvolvendo nos Departamentos de Medicina Preventiva e Social e nos cursos de pós-graduação em saúde coletiva.

Superadas as fases da Higiene e da Medicina Preventiva, o Departamento incorporou a proposta da Medicina Comunitária6, dispondo inclusive de um Centro de Saúde-Escola no bairro periférico do nordeste de Amaralina, durante a primeira metade da década de 70. Este modelo focal da Medicina Comunitária parece esgotar-se nos anos seguintes com a perda de influência do Departamento sobre o Centro de Saúde, que impôs outras alternativas docentes. Estas, embora não resolvessem as contradições da Escola Médica, possibilitaram uma discussão mais ampla da questão pedagógica com base no estudo das políticas de saúde.

Assim, o Departamento não assumiu de imediato a variante expansiva da Medicina Comunitária representado pelos projetos de integração docente-assistencial9. Pelo contrário, através de programas de estudos e pesquisas em nível de pós-graduação e de atividades de graduação (internato e SPMP), promoveu no período de 76 a 79 um aprofundamento teórico-crítico que lhe estimula, presentemente, a repensar as próprias técnicas em saúde.

Nesse contexto é que se inscreve a volta aos centros de saúde como tentativa de reaproximação com as técnicas e com a política institucional. A análise desse retorno vem sendo desenvolvida e será objeto de publicação posterior, a partir da experiência docente com o programa de residência em Medicina Social e com a disciplina Saúde Pública e Medidas de Profilaxia no ano de 1980.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1 AROUCA, A. S. - O Dilema preventivista; contribuição para a compreensão e crítica da medicina preventivista. Campinas, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, 1975. Tese.
  • 2 GARCIA, J. E. - La Educación medica em la America Latina Washington, OPS/OMS, 1972 (Publicación Científica n. 255).
  • 3 GUIMARÃES, R. Org. Saúde e Medicina no Brasil; contribuição para um debate. 2.ed. 1979, 296p.
  • 4 HILLEBOE, H.; LARIMORE, G. W. - Medicina Preventiva; princípios de prevenção aplicáveis a ocorrência e à evolução das doenças. São Paulo, SERPEL, 1975, 840p.
  • 5 OPS/OMS - Enseñanza de la medicina preventiva y social; 20 anos de experiência latinoamericana. Washington, 1976, 63p. (Publicaicón Científica n.324).
  • 6 PAIM, J. S. - Medicina Comunitária; introdução a uma análise crítica. Saúde em debate, (1):out./dez. 1976. (no prelo).
  • 7 _________. Um enfoque pedagógico em Medicina Preventiva. In: CONFERÊNCIA PANAMERICANA DE EDUCAÇÃO MÉDICA, 6. e CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO MÉDICA, 14., Rio de Janeiro, 17-19 nov. 1976. Anais Rio de Janeiro, ABEM, 1977. p.321-6.
  • 8 ___________. Medicina preventiva, social no Brasil; modelos, crises e perspectivas. Saúde em Debate (11): 1980. (no prelo).
  • 9 SANTOS, R. A.; CAMPOS, F. E.; LEAL, M. de C.; RIVERA, F. J. U. - Investigação nacional sobre o ensino de medicina preventiva Rio de Janeiro, PESES - Programa de Estudos Sócio-Econômicos e Saúde, s.d. 80p.
  • 10 SILVA, G. R. da - Origens da medicina preventiva como disciplina do ensino médico. Revista do Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo, (28):91-96, 1973.

ANEXO

O curso de Saúde Pública e Medidas de Profilaxia constará de programa teórico e estágio prático em Centros de Saúde da capital, além de discussões de práticas de serviços, também em nível de Centros de Saúde.

1. OBJETIVOS
  1. Analisar as relações entre saúde e estrutura social, a partir do estudo da organização de serviços de saúde, da formulação de políticas e da implementação de programas de saúde;

  2. Identificar os condicionantes do nível de saúde da população brasileira, e explicar as limitações da eficiência e da eficácia dos programas de saúde;

  3. Descrever e discutir os elementos que configuram a chamada “crise do setor saúde” e suas repercussões sobre o trabalho médico;

  4. Discutir os determinantes histórico-estruturais que conformaram as modalidades de prestação de serviços de saúde do país e examinar as alternativas de redefinições de propostas;

  5. Relacionar as observações empíricas nos planos da morbidade, das características da demanda e das práticas de saúde desenvolvidas ao nível de Centros de Saúde, com o quadro social mais amplo;

  6. Identificar procedimentos utilizados na implantação de programas de saúde visando a desenvolver a participação comunitária, a educação da população para a saúde e a eficiência das ações;

  7. Explicar, com as próprias palavras, os cuidados para a preservação da saúde e para a profilaxia das doenças transmissíveis mais freqüentes em Centros de Saúde (infecções respiratórias, gastroenterites e doenças de pele);

  8. Analisar a estrutura e funcionamento do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica, comentando as ações empreendidas no território nacional;

  9. Estabelecer os esquemas básicos de imunizações do Programa da Secretaria de Saúde e orientar a utilização de vacinas aplicadas em circunstâncias especiais (raiva, cólera, meningite, febre tifóide, febre amarela e gripe);

  10. Explicar, com as próprias palavras, as medidas de controle adotadas em caso de coqueluche, difteria, meningite meningocócica, poliomielite, sarampo, tuberculose, febre tifóide, hepatite infecciosa e raiva;

  11. Executar a notificação de doenças segundo as recomendações e os formulários da Secretaria de Saúde;

  12. Executar em nível ambulatorial e domiciliar, sob supervisão, os programas de saúde estabelecidos pelo Ministério da Saúde e pela Secretaria de Saúde.

2. METODOLOGIA

2.1. Programa teórico.

O programa teórico, cujos objetivos podem ser encontrados nos itens 1.1 a 1.4, propõe-se, numa instância mais geral, a analisar o panorama do Setor Saúde no Brasil. O programa encontra-se em anexo, assim como a bibliografia indicada e orientações para os instrutores. O programa será ministrado através de seminários, coordenados por quatro professores, às quartas-feiras, das 16:00 h és 18:00 h, para quatro turmas de alunos.

2.2. Estágio em Centros de Saúde

O estágio se desenvolverá em quatro Centros de Saúde da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (vinte alunos por Centro). nas tardes de segundas e quintas-feiras, para uma turma de alunos, e terças e sextas-feiras, para outra turma.

Os Centros são os seguintes:

4° Centro de Saúde - Itapagipe

5° Centro de Saúde - Av. Centenário

8° Centro de Saúde - São Caetano

9° Centro de Saúde - Nordeste de Amaralina.

Os estudantes percorrerão cada serviço do Centro de Saúde, em grupos de dois, em sistema de rodízio, permanecendo cinco dias em cada serviço.

Os serviços serão os seguintes:

  • Imunização

  • Pré-natal

  • Nutrição

  • Imunização anti-rábica (5° Centro de Saúde)

  • Clínica Médica e Pediátrica

  • Puericultura.

Outras atividades poderão ser acrescentadas, como, por exemplo, Vigilância Epidemiológica, a depender das possibilidades de cada Centro de Saúde; neste caso, a duração dos demais serviços será reduzida.

O rodízio será estabelecido pelo professor de cada turma, após a distribuição dos grupos. Em cada serviço, à exceção da Clínica Médica e Pediatria, os alunos deverão apenas observar as atividades executadas pelos funcionários responsáveis, seguindo um roteiro de observação, anotando todas as dúvidas, críticas e sugestões, para discussão posterior com o professor.

Nos serviços de Clínica Médica e Pediatria, onde está se desenvolvendo o Programa de Residência em Medicina Social, os estudantes poderão realizar, sob orientação dos residentes, as atividades de anamnese e exame clínico dos pacientes.

2.3. Discussão sobre prática dos serviços.

Esta atividade será realizada uma vez por semana para cada uma das turmas, às quintas e sextas-feiras das 16:00 h às 18:00 h, ou seja, após a atividade prática. Deve ser estimulada a participação de pessoal do Centro de Saúde nesta atividade.

As discussões se propõem a desenvolver uma reflexão sobre as práticas observadas, ou executadas pelos estudantes nos serviços, tentando estabelecer relação entre esta prática e o plano teórico mais amplo apresentado nas aulas das quartas-feiras. Tendem, também, a estimular o desenvolvimento de uma abordagem crítica dos serviços, das práticas e das técnicas através de discussões que referem o problema concreto à realidade social global.

Com o fim de melhor orientar estas discussões, foi elaborado um programa específico o qual se encontra em anexo.

3. AVALIAÇÃO

A avaliação dos alunos será efetuada de duas maneiras:

  1. dois testes durante o curso, compreendendo os assuntos dados em seminários;

  2. conceito da atuação nos Centros de Saúde, fornecido pelo professor de cada turma, o qual levará em consideração um relatório individual da experiência no Centro, a freqüência no estágio e a participação nas discussões de prática de serviços. Os relatórios deverão conter uma análise das práticas observadas e realizadas, utilizando o aluno para esta análise os conteúdos do programa teórico e das próprias discussões.

O conceito final será a média aritmética dos três conceitos obtidos ao final do semestre.

PROGRAMA TEÓRICO

Apresentação e discussão do plano de estudos. Leitura e discussão em grupo da introdução do livro Saúde e Medicina no Brasil. p.07-15.

TEMAS:

  1. Introdução ao estudo sobre a organização social da prática médica. p.17-27.

  2. As atuais condições de saúde da população brasileira e seus determinantes. p.31-43; 147-154.

  3. A tuberculose no Brasil: situação atual. p.45-52.

  4. Doença de Chagas. p.53-56.

  5. Malária. p.77-91.

  6. A atenção materno-infantil como prioridade política. p.121-146.

  7. Saúde e instituições médicas no Brasil. p.157-174.

  8. Medicina Previdenciária e Medicina de Grupo. p.175-179; 181-205.

  9. O trabalho e a doença. p.93-11.

  10. A medicina comunitária, a questão urbana e a marginalidade social. p.207-224.

  11. Medicina popular. p.225-237.

  12. O planejamento e a formação de recursos humanos para a saúde. p.241-250.

  13. Estado e indústria farmacêutica. p.259-269. Apresentação e discussão dos relatórios.

Considerando as dificuldades para o acompanhamento do programa teórico, face à multiplicidade de fontes bibliográficas e à impossibilidade de reprodução de material didático, a Chefia da disciplina optou por um livro que apresenta uma visão diversificada da problemática de saúde no Brasil. Assim, o programa sofreu algumas adaptações no sentido de superpor-se às unidades contidas na referida publicação:

GUIMARÃES. R. org. - Saúde e Medicina no Brasil: Contribuição para um debate. 2.ed. Rio de Janeiro. Graal, 1979.

REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES

SINGER, P. et alii - Prevenir e curar. Rio de Janeiro. Forense Universitária, 1978.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE, 5. Brasília, 1975. Anais. Brasília, Ministério da Saúde, 1975.

___________. 6. Brasília, 1977. Anais. Brasília, Ministério da Saúde, 1977.

TEIXEIRA C.; SILVANY NETO, A.; SANO, M. - PIASS; Uma alternativa para a crise? 1980 mimeografado.

SAÚDE EM DEBATE - nºs 9 e 10, 1980.

MELLO, C. G. - Saúde e Medicina no Brasil. CEBES HUCITEC, 1977.

GUIA DO INSTRUTOR

A opção pela técnica de discussão dirigida busca suavisar as dificuldades de participação discente nas aulas expositivas, assim como estimular uma aproximação do aluno das fontes bibliográficas, em períodos anteriores às provas. Depende, no entanto, do interesse e dedicação de alunos e professores. Considerando que as resistências dos alunos aos temas a serem abordados atendem a determinações que não se limitam à Escola Médica, cabe aos instrutores reconhecer as suas limitações, mas esgotar as possibilidades das técnicas pedagógicas no sentido de preservar a eficiência do ensino.

No que se refere à discussão dirigida, é fundamental que o instrutor atente para os seguintes pontos:

  1. deve conhecer bem o texto indicado para os alunos e dispor de anotações sobre o tema, referentes a leituras complementares;

  2. deve lembrar-se que em momentos do debate há que fazer exposições breves no sentido de clarear pontos difíceis, ou sistematizar, esquematizar e sintetizar as informações;

  3. deve estar permanentemente receptivo às questões formuladas pelos alunos, ainda que não disponha de respostas definitivas. Em tais situações deve ser sugerida a pesquisa bibliográfica específica.

A seguir são apresentados alguns pontos que merece­ riam destaque durante as discussões:

TEMA 1 - Chamar atenção para as três dimensões da saúde: estado vital. setor produtivo e área do saber. Explicar as relações entre saúde e estrutura social, particularmente no que se refere ã organização dos serviços. Indicar as influências do liberalismo na saúde pública e a incorporação do sanitarismo no Brasil.

TEMA 2 - Descrever as condições de saúde através dos indicadores de mortalidade e morbidade. sublinhando as limitações dessas medidas. Mostrar as relações de saúde com as condições de vida e de trabalho (salário, renda, habitação, alimentos etc.) e particularmente com a forma de organização da produção e distribuição do poder na sociedade.

TEMAS 3, 4 e 5 - Demonstrar a falência de certas medidas de controle das chamadas endemias, quando mantidas as precárias condições de vida e a organização caótica dos serviços de saúde. Ressaltar o recrudescimento de certas doenças de massa simultânea ao modelo de desenvolvimento adotado no Brasil. Indicar os interesses econômicos. políticos e ideológicos de certos programas de saúde. Um bom exemplo pode ser o PECE.

TEMA 6 - Além dos aspectos ideológicos ressaltados no texto, direcionando a ação sobre o grupo materno­infantil como prioridade política, convém registrar a existência das atividades esparsas sobre as gestantes e crianças, ante mesmo da formulação do programa. Examina o contexto de origem do programa e analisar o caráter do diagnóstico e da explicação. Registrar a defasagem entre diagnóstico, objetivos e resultados. Considerar as discrepâncias entre programação de atividades de saúde e as políticas e práticas institucionais vigentes.

TEMAS 7 e 8 - Descrever o desenvolvimento histórico da saúde pública e da medicina previdenciária no Brasil, refletindo-a a conjunturas específicas (antes de 30, 30-64, e após 64). Apresentar esse enfoque como tentativa de identificar determinantes sociais da organização dos serviços de saúde, ou seja; a análise das políticas de saúde do Estado. Caracterizar a crise do setor de saúde nos países ocidentais e a estrutura de prestação de serviços de saúde no Brasil (componente público e privado, Lei 6.229, ambigüidades etc.). Explicar as tendências recentes do setor saúde no Brasil (privatização, tecnificação do cuidado, elevação dos custos, capitalização do setor e repercussões no mercado de trabalho médico).

TEMA 9 - Relacionar doença e processo de trabalho. Discutir a questão de saúde ocupacional, especialmente a lógica dos departamentos médicos de empresa. Referir a legislação sobre acidentes e insalubridade. Explicar a atuação do Estado através dos distintos órgãos. Discutir as medidas de prevenção propostas e adotadas e o posicionamento dos trabalhadores.

TEMAS 10 e 11 - Discutir a Medicina Comunitária como estratégia de extensão de serviços para determinados grupos sociais urbanos e rurais. Analisar a incorporação desse movimento ideológico pelo Estado no Brasil e as suas relações com o PIASS e o PREVSAÚDE. Ressaltar o seu caráter de prática paralela alternativa, e não excludente, à prática dominante. Discutir os conteúdos político-ideológicos da extensão de saúde e, particularmente, suas repercussões na cultura popular.

TEMA 12 - Conceituar recursos humanos e relacionar a formação dos mesmos com a estrutura e as políticas de saúde. Analisar o aparelho escolar como qualificador e reprodutor da ideologia dominante, assim como as suas contradições na formação do intelectual. Examinar os distintos projetos de reforma de educação médica e suas repercussões na equipe de saúde: relatório Flexner, Medicina Preventiva e Comunitária e integração docente-assistencial.

Discutir a crise e as perspectivas da formação do pessoal de saúde (trabalhadores de saúde).

TEMA 13 - Discutir o complexo médico-industrial enfatizando a participação da indústria farmacêutica no processo de medicalização. Indicar a lógica do capital na expansão do consumo de medicamentos e a instrumentalização que faz sobre a educação e a prática médica. Destacar o papel das multinacionais como fundamental na redefinição das políticas de saúde.

Tais pontos é que tenderão a orientar os debates e a sistematizar as discussões. Sobre eles, os alunos serão avaliados. Lembre-se que o fundamental para a aprendizagem não é o montante de informações supostamente transmitidas, mas a sistematização e apropriação que o aluno fará com o auxílio do professor, ou apesar dele . . .

DISCUSSÃO DE PRÁTICAS DE SERVIÇOS
  • O Centro de Saúde.

  • Avaliação quantitativa dos Centros de Salvador e utilização dos serviços.

  • Vigilância epidemiológica em Centros de Saúde; medidas de controle contra poliomielite e meningite.

  • Medidas de controle contra sarampo, difteria, tuberculose e febre tifóide.

  • Programa de Imunização nos Centros de Saúde.

  • Programa de Nutrição nos Centros de Saúde.

  • Puericultura e utilização dos serviços.

  • Pré-natal e utilização dos serviços.

  • A prática médica e as condições de trabalho nos Centros de Saúde.

  • Centro de Saúde e formação de recursos humanos para a saúde.

  • Características dos serviços prestados nos Centros de Saúde.

  • Resistência popular à extensão dos serviços de saúde; participação comunitária e educação para a saúde; necessidades de saúde da população.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 1981
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