Acessibilidade / Reportar erro

Performance e Ancestralidade: o que a cosmologia bakongo ensina sobre a infância negra brasileira?

Performance et Ascendance: qu'enseigne la cosmologie Bakongo sur l'enfance noire brésilienne?

RESUMO

Por meio de referenciais africanos e afrodiaspóricos, propõe-se o exercício de pensar as crianças negras e suas performances. A partir de estudos sobre a cosmologia bantu-kongo, busca-se uma aproximação com a infância bakongo para dar a compreender as performances da infância negra brasileira, relacionando-as com a preservação de valores civilizatórios africanos. Conclui-se, à luz do conceito ancestralidade e da noção cosmológica de tempo circular, que as crianças negras brasileiras, por intermédio da performance, são capazes de unir passado e presente, ancestral e vivo, reeditando memórias e mantendo vivos valores civilizatórios afro-brasileiros.

Palavras-chave:
Crianças Negras; Cosmologia Bakongo; Ancestralidade; Criança Performer; Performance

RÉSUMÉ

A travers des références africaines et afro-diasporiques, il est proposé l'exercice de réflexion sur les enfants noirs et leurs performances. À partir d'études de la cosmologie bantu-kongo, une approche de l'enfance bakongo est recherchée pour comprendre les performances de l'enfance noire brésilienne, en les mettant en relation avec la préservation des valeurs civilisationnelles africaines. Il est conclu, à la lumière du concept d'ascendance et de la notion cosmologique de temps circulaire, que les enfants brésiliens noirs, à travers la performance, sont capables d'unir passé et présent, ancestraux et vivants, rééditant des souvenirs et gardant vivantes les valeurs civilisatrices afro-brésiliennes.

Mots-clés:
Enfants Noirs; Cosmologie Bakongo; Ascendance; Enfant Interprète; Performance

ABSTRACT

Through African and Afro-diasporic references, it is proposed a reflexive exercise on Black children and their performances. Based on studies about Bantu-Kongo cosmology, an approach to Bakongo childhood is sought to provide an understanding of the performances of black Brazilian childhood, relating them to the preservation of African civilizational values. It is concluded, considering ancestral heritage and a cosmological notion of circular time, that Brazilian Black children, through performance, are able to bring together past and present, ancestral and living, renewing memory and keeping the values of Afro-Brazilian civilization alive.

Keywords:
Black Children; Bakongo Cosmology; Ancestral Heritage; Children and Performance; Performance

Introdução

Neste texto, buscamos discutir as crianças negras como crianças performers, apoiando nossa discussão na noção de Kindezi, trazida na obra de Fu-Kiau e Lukondo-Wamba (2000)FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000., para problematizarmos a experimentação performática das crianças negras como a presentificação de valores civilizatórios africanos e, ainda, como importante aporte para pensarmos a Educação e o combate ao racismo.

Em pesquisa anterior (Pereira, 2021PEREIRA, Gabriel Fortes. Kindezi, the kongo art of babysitting: contribuições da cosmologia bakongo de Bunseki Fu-Kiau para pensar a educação de crianças. 2021. Orientação de Gladis Elise Pereira da Silva Kaercher. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Pedagogia) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2021.), já compreendíamos kindezi como um sistema de educação comunitário muito antigo no continente africano, cujo desempenho foi fundamental nas batalhas contra a colonização europeia, permitindo aos adultos a preparação necessária para as lutas iminentes, sem que isso trouxesse prejuízos sociais às crianças (Ani, 2000ANI, Marimba. Introduction. In: FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A.M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.). Buscávamos entender como esse sistema funcionava, como as crianças bakongo viviam seu processo formativo junto a seus pares e às pessoas mais velhas e, ainda, como esse entendimento poderia contribuir para refletirmos acerca da educação das crianças no Brasil, em especial das crianças negras, na necessária dimensão de propiciar-lhes uma educação antirracista.

Consideramos que pensar a infância bakongo (do povo Kongo) assume relevância para todos os pesquisadores brasileiros que se arvoram a entender a infância: os povos bantu integram um expressivo contingente de humanos escravizados trazidos à força para o Brasil e, mais do que sabemos, suas tradições fizeram parte da construção de nossa cultura e nacionalidade. Nesse sentido, não podemos pensar em infância brasileira sem pensarmos nas contribuições das culturas africanas, nesse caso especificamente a cosmologia bantu-kongo (bakongo).

Como aponta Nei Lopes (2021)LOPES, Nei. Bantos, malês e identidade negra. 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2021., precisamos compreender o quanto nosso entendimento das contribuições africanas para o que somos hoje, como nação, foi enormemente encurtado, tendo em vista que

[...] a negação da importância cultural do segmento banto na formação brasileira apesar de esse segmento, pela anterioridade de sua presença e pelo número vultuoso de sua entrada nos portos brasileiros, por mais de 300 anos – além de sua dispersão forçada por quase todo o território nacional [...] ter sido o que mais influiu na formação da civilização brasileira e de outras nas Américas (Lopes, 2021, p. 9LOPES, Nei. Bantos, malês e identidade negra. 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2021.).

Voltamos nossa atenção para os povos e as culturas banto1 1 Doravante nomeados de bantu. para que possamos encontrar chaves analíticas, pistas que nos permitam melhor compreender a infância negra brasileira, seus modos de ser e estar no mundo, uma vez que entendemos essas crianças como herdeiras da tradição bantu, na medida em que vivenciam em suas comunidades alguns dos princípios milenares que acompanham esses povos ao longo da história. Como aponta Lopes (2021)LOPES, Nei. Bantos, malês e identidade negra. 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2021., a partir das ideias de Theophile Obenga (1985)OBENGA, Theophile. Les bantu: langues, peuples, civilisations. Paris; Dakar: Presénce Africaine, 1985., para o povo bantu “[...] a ideia de beleza está indissoluvelmente ligada às de bem, vida e verdade. Desse modo, em toda a África banta, é belo o que é bom, vivo e verdadeiro, e que carrega dentro de si uma tradição de ancestralidade, que a cria e a diviniza”.

Nessa perspectiva, a beleza de viver bem paira sobre estar com a ancestralidade atuando verdadeiramente para a manutenção dessa relação. É através de comportamentos cotidianos e coletivos que se consolidam as aprendizagens essenciais para a vida social, ou os modos de ser e estar que condizem com os valores cosmológicos das sociedades bantu-kongo (Fu-Kiau; Lukondo-Wamba, 2000FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.; Santos, 2019SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.). Nesta escrita, partimos de referenciais africanos e afrodiaspóricos para tecermos o exercício de falar/pensar a infância. Não qualquer infância, mas uma infância negra para muitos desconhecida: a infância bakongo. Com esse movimento, buscamos aproximar nossas interpretações sobre as crianças na cosmologia Kongo, como fora sistematizada na escrita de Bunseki Fu-Kiau, para então apontarmos um caminho em que, dado determinados contextos, apesar da persistência e sofisticação da colonialidade e do racismo, as crianças negras – e mesmo as não-negras – no Brasil seguem tendo vivências oriundas de valores civilizatórios africanos, ora elencados por Azoilda Trindade (2005)TRINDADE, Azoilda Loretto da. Valores civilizatórios afro-brasileiros na educação infantil. Salto para o Futuro, Brasília, p. 30-36, 2005. como valores civilizatórios afrobrasileiros. Adiante, aproximar-nos-emos de pesquisas sobre/com crianças negras, apostando em uma abordagem que vá na contramão de “perspectivas limitadas quanto às potencialidades das crianças negras”, conforme afirmam Silva e Noguera (2020, p. 190)SILVA, Liziane Guedes da; NOGUERA, Renato. Repensando as infâncias das crianças negras: notas afroperspectivistas e introdutórias a partir do Sopapinho Poético. Revista Brasileira de Estudos da Homocultura, Cuiabá, v. 3, n. 9, p. 187-203, 2020., ao constatarem que um número significativo de publicações nas áreas da educação e psicologia “partem da relação entre estas crianças e as várias nuances do racismo” apenas.

Apresentamos uma breve contextualização sobre o tempo solar que movimenta os sistemas de pensamento bantu-kongo, para que possamos confluir nos significados de pessoa/ser humano/muntu: entender o que significa o humano dentro da cultura bakongo permite que pensemos a infância dentro de um campo de significações distintas daquelas nas quais nos inserimos comumente na cultura ocidental, ligadas à invenção da infância como um construto social associado aos processos de ascensão da burguesia e invenção da escola, como aponta Ariès (1981)ARIÈS, Phillipe. História social da criança e da família. 2. ed. São Paulo: TLC, 1981., ou ainda às proposições da Sociologia da Infância, trazidas por Sarmento e Gouvea (2008)SARMENTO, Manuel Jacinto; GOUVEA, Maria Cristina Soares de (Org.). Estudos da Infância: educação e práticas sociais. Petrópolis: Vozes, 2008. e Sarmento e Vasconcelos (2007)SARMENTO, Manuel Jacinto; VASCONCELOS, Vera Maria Ramos de (Org.) Infância (in)visível. Araraquara: Junqueira & Marin Editores, 2007.. Permite, ainda, que possamos compreender os esforços em valorizar a infância e entender outros modos de estar e aprender com ela.

Muntu: o ser humano na cosmologia bantu-kongo

Os bakongo fazem parte do que se configurou como um grande grupo linguístico, histórico e cultural chamado bantu, um conjunto de sociedades africanas que compartilham um mesmo tronco linguístico, desde suas origens nos primeiros milênios antes da era comum (Fourshey; Gonzales; Saidi, 2019FOURSHEY, Catherine Cymone; GONZALES, Rhonda M.; SAIDI, Christine. África Bantu: de 3500 ac até o presente. Petrópolis: Vozes, 2019.); hoje estão localizados em uma grande expansão territorial do continente, cobrindo os países da África Central, Centro-Ocidental, Oriental e Austral (Munanga, 2009MUNANGA, Kabengele. Origens africanas do Brasil contemporâneo: histórias, línguas, culturas e civilizações. São Paulo: Globo, 2009.). As línguas desse grupo refletem “[...] a organização de uma filosofia do ser humano, da coletividade humana e da relação desses seres com a natureza e o universo” (Cunha Junior, 2010, p. 26CUNHA JÚNIOR, Henrique Antunes. NTU: introdução ao pensamento filosófico bantu. Revista Educação em Debate, Fortaleza, ano 32, v. 1, n. 59, p. 25-40, 2010.). Também possuem uma raiz em comum, ntu, utilizada para nomear o ser humano (mu-ntu, singular; ba-ntu, plural), por esse motivo “essas línguas foram batizadas de bantu pelos linguistas ocidentais” (Munanga, 1996, p. 58MUNANGA, Kabengele. Origem e histórico do quilombo na África. Revista USP, São Paulo, n. 28, p. 56-63, 1996.).

Segundo Tiganá Santana Santos (2019, p. 122)SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.:

O termo muntu, em língua kikongo, com variantes, tais como mutu e ntu, em outras línguas bantu, vem a significar ‘pessoa’. Mu-ntu indica ‘dentro da cabeça’, ‘por cabeça’, ‘o que se manifesta e/ou é, a partir da cabeça’. A ideia de pessoa, entre os bantu-kongo, está totalmente associada à concepção de que a cabeça (ntu) determina o ‘ser de modo humano’.

Nessa mesma direção, Nei Lopes (2005, p. 23)LOPES, Nei. Kitábu: o livro do saber e do espírito negro-africanos. São Paulo: Senac, 2005. apresenta uma noção de muntu em que a pessoa é “a força vital realizada, existente, pulsando” no mundo. Essa força, por sua vez, assume a responsabilidade (e a manutenção) de toda a vida no universo, no mundo físico e espiritual. Dessa forma, todos os seres são possuidores de uma força vital própria, e a ela é atribuído o “valor supremo da existência” (Lopes, 2005, p. 24LOPES, Nei. Kitábu: o livro do saber e do espírito negro-africanos. São Paulo: Senac, 2005.). O ser humano, portanto, é tanto um ser espiritual quanto material/físico, pois não só é dotado de inteligência como também de intensa força vital.

Além disso, o ser humano está envolvido em uma temporalidade cíclica, cujas semelhanças com o ir e vir do Sol não são meras coincidências: tudo aquilo que existe, já existiu e ainda há de existir deve passar por processos de nascimento, amadurecimento e morte. Assim como o ciclo solar, que não se esgota, mas se renova a cada novo amanhecer, o ser humano vive um eterno estado de transformação, em que a morte não é o fim da vida necessariamente, mas uma passagem, que dá rumo a um outro modo existir. Nas palavras de Fu-Kiau (2001 apud Santos, 2019, p. 20SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.) “[...], para um muntu africano, os mortos não estão mortos: eles são apenas seres vivendo além da muralha esperando pelo seu provável retorno à comunidade, ao mundo físico (ku nseke)”. Nesse sentido, a partir da cosmologia bantu-kongo apresentada pelo autor, o ser humano é considerado a própria materialidade do Sol na Terra, que nasce e se põe continuamente.

Esse processo pode ser ilustrado por intermédio do Dikenga dia kongo, ou cosmograma bakongo, definido por Tiganá Santana Santos (2019, p. 127)SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. como um “[...] mapa interpretativo do mundo e dos acontecimentos, da realidade existencial de todas as coisas que são”. Além de ilustrar os caminhos percorridos pelo Sol, indo do amanhecer ao ápice do meio-dia, para então o pôr do sol até o sol da meia-noite, a partir do cosmograma somos introduzidos a um verdadeiro portal que nos conduz a outro tempo. Distinto do kronos em sua origem e vivência, “o conceito Kongo do tempo aqui descrito”, nas letras de Fu-Kiau (1994), “é profundamente enraizado em nossa visão de mundo, nossa cosmologia [a do Kongo]”: trata-se de um alinhamento entre musoni, o momento da concepção, quando as ideias têm seu primeiro lampejo de luz, quando não se é tangível, físico, o momento em que se atinge o ápice no mundo espiritual (ku mpemba), sua cor amarela é associada ao conhecimento; em direção ao amanhecer chegamos em kala, o nascimento, quando é o momento de tornar-se, de ser, é quando surge a vida no mundo físico; no ápice deste está tukula, quando a maturidade se efetiva e os grandes feitos acontecem; e, por fim, temos luvemba, o mortal estágio em que tudo se finda, momento no qual se faz a travessia até o outro lado da muralha, o mundo espiritual, é quando as grandes transformações ocorrem e novo ciclos podem ter início (Fu-Kiau, 2001 apud Santos, 2019SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.).

Percebemos, nesse sentido, a fundamental contribuição do dikenga dia kongo (Figura 1) para a compreensão do pensamento Kongo, uma vez que registra uma dinâmica cósmica em relação ao mundo e à vida, além de estabelecer uma noção de temporalidade que se dá em ciclos. Ou seja, tudo o que é, tudo o que existe, está posto em circularidade, numa dinâmica de eterna transformação, pois “nada na vida diária da sociedade Kongo está fora das suas práticas cosmológicas” (Fu-Kiau, 2001 apud Santos, 2019, p. 34SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.). Em sua trajetória, o muntu está a todo momento assimilando a realidade em que se encontra, transformando-a enquanto transforma a si mesmo. Vive e revive inúmeras situações distintas, acumula experiências, aprendizagens, histórias e memórias, alavancando inícios e reelaborando fins, pois nada surge em ku nseke (mundo físico) sem que tenha passado por ku mpemba (mundo espiritual) e vice-versa.

Figura 1
Dikenga dia kongo: cosmograma bakongo.

Estando o ser humano imerso nessas práticas cosmológicas, podemos estreitar nossa perspectiva para pensar as crianças à luz dessa dinâmica solar. Para os povos do Kongo, cada criança que nasce dá corpo e forma física a um novo Sol vivo. Como força vital realizada (Lopes, 2005LOPES, Nei. Kitábu: o livro do saber e do espírito negro-africanos. São Paulo: Senac, 2005.), a criançamuntu começa seu ciclo neste mundo, o mundo físico, desde o momento de seu nascimento, que não deixa de ser o amanhecer de uma vida, o momento de vir à luz, como ilustram Fu-Kiau e Lukondo-Wamba (2000)FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000. em Kindezi: The Kongo art of babysitting (Figura 2):

Figura 2
Ilustração disponível na obra Kindezi: the Kongo art of babysitting.

No ponto B acompanhamos o amanhecer, o momento no qual o Sol ensaia a luz do dia com seus primeiros raios de luz aparente, é quando a criança dá seus primeiros suspiros no mundo físico, o nascimento. Partindo em direção à posição G, acompanhamos seus passos rumo ao crescimento, é o momento da maturidade e das realizações, de se posicionar com firmeza no mundo. E, por fim, o ponto D representa o findar do dia ao pôr do sol, o momento propício às maiores mudanças, quando, depois de uma longa jornada, pega-se o caminho que leva da velhice ao invisível: a morte equivale a pôr-se em direção para “além da muralha” até que seja hora de um novo amanhecer (Fu-Kiau, 2001 apud Santos, 2019, p. 20SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.).

Crianças negras, performances e valores

Estando o muntu em um eterno estado de transformações e mudanças, a cosmologia bakongo nos convida a refletir, especialmente nesse caso, a respeito das crianças negras africanas e afrodiaspóricas. Seja pelo calor que emana desde dentro, pelas idas e vindas cotidianas ou pelos movimentos constantes, entendemos que o nascimento de uma criança ainda pode representar um Sol vivo recém-chegado em nossas comunidades. A palavra muntu, segundo Henrique Antunes Cunha Junior (2010, p. 26)CUNHA JÚNIOR, Henrique Antunes. NTU: introdução ao pensamento filosófico bantu. Revista Educação em Debate, Fortaleza, ano 32, v. 1, n. 59, p. 25-40, 2010., evoca uma noção de pessoa que é constituída pelo “corpo, mente, cultura e, principalmente, pela palavra”, entendendo-se, nesse contexto, a palavra “[...] como um fio condutor da sua própria história, do seu próprio conhecimento da existência”. Pois que a palavra falada, proferida, também representa um poderoso saber, segundo Leda Maria Martins (1997, p. 146)MARTINS, Leda Maria. Afrografias da memória: O Reinado do Rosário no Jatobá. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: Mazza Edições, 1997.:

[...] a palavra é o sopro, hálito, dicção, acontecimento e performance, índice de sabedoria. [...] Torna-se acontecimento não porque se cristalizou nos arquivos da memória, mas, principalmente, por ser reeditado na performance do cantador/narrador e na resposta coletiva.

Nesse sentido, propomos o exercício de pensar as crianças na perspectiva bakongo, buscando levantar possibilidades de ler os resquícios desse ser infante que perduram, como memória ou célula tronco, na infância negra brasileira: aquela que respira nas frestas, no entre culturas, na tradição de saberes compartilhados nos territórios em que a ancestralidade africana permanece viva, através da oralidade e demais valores civilizatórios afrobrasileiros (Trindade, 2005TRINDADE, Azoilda Loretto da. Valores civilizatórios afro-brasileiros na educação infantil. Salto para o Futuro, Brasília, p. 30-36, 2005.; 2014TRINDADE, Azoilda Loretto da. Multiculturalismo: mil e uma faces da escola. Petrópolis: DP et alii, 2014.), dos cantos, das danças, da espiritualidade. Infância negra brasileira viva nas ruas, nas brincadeiras, nas encruzilhadas, na ciranda, no jongo, no tambor de mina, nos unguentos, na capoeira, na dança livre de um corpo que guardou memória. Estamos aqui a contemplar uma corporeidade afrodiaspórica que, como aponta Júlio Tavares (2020)TAVARES, Julio Cesar. Gramática das corporeidades afrodiaspóricas. Perspectivas etnográficas. Curitiba: Appris Editora, 2020., é dotada de uma gramática a partir da qual escreve sua narrativa e, nessa escrita, performa. Uma infância que dá/empresta o corpo para que essa escrita tome forma, aconteça.

A criança-muntu não é senão uma vida em relação com a ancestralidade, cuja memória pode estabelecer elos entre passado e presente, em um corpo que desafia o tempo e o espaço, pois ilumina e é fonte da própria vida – tal qual o Sol que traz luz aos dias e aquece a vida sob a Terra. Performa no mundo porque partilha a experiência de ser em comunhão com valores e princípios ancestrais, performa porque seu estar não (re)conhece fronteiras espaciais ou limites etários, pois que ela, em sendo a ancestralidade viva, a energia vital existente, pode ser mais velha que o velho que a acompanha. Dada sua importância, não por acaso a educação de crianças na cultura bakongo é tomada como uma responsabilidade comunitária, um compromisso partilhado por todos os membros de uma comunidade.

Na medida em que os pequenos e pequenas estão inseridos/as como parte importante e essencial do corpo social de uma comunidade, a educação passa a ser organizada de modo tal que a infância possa estar ativamente envolvida na vida comunitária – que não pode ser percebida de maneira universalizada, correndo o risco de ser atravessada por uma compreensão subentendida de que a vida comunitária diz respeito aos adultos ou iniciados nas tradições apenas.

Nesse contexto, um compromisso ético de valorização da vida humana em sua completude é firmado em vias de auxiliar o/a jovem muntu a integrar-se à comunidade em uma dinâmica recíproca e de intensa troca de força vital, por meio da qual, ao mesmo tempo, diferentes relações se estabelecem em prol de uma noção de humanidade compartilhada: crianças ensinam e aprendem umas com as outras (e são incentivadas a isso), e também o fazem com adultos de diferentes idades, ou ainda com velhos/as experientes nos mais variados assuntos (Fu-Kiau; Lukondo-Wamba, 2000FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.).

Em movimentos contínuos, através de idas-vindas-e-retornos, a criança se encontra no centro dessa organização comunitária (Figura 3), relacionando-se com seus familiares (P), com cuidadores e cuidadoras (N) e com a comunidade como um todo (S). Cotidianamente a infância é investida de um sentimento de unidade que Fu-Kiau e Lukondo-Wamba (2000, p. 1)FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000. descrevem como uma energia poderosa que “liga as pessoas e as aquece”2 2 Do original, em inglês: “[...] binds people and warm them up” (tradução nossa). (p. 17), consolidando ao pequeno Sol uma experiência de vida emocionante, em que a união é “algo espiritualmente compartilhado para aperfeiçoar a sobrevivência da comunidade”3 3 Do original, em inglês: “[...] that of togetherness as a shared spiritual thing for the betterment of community survival” (tradução nossa). (Fu-Kiau; Lukondo-Wamba, 2000, p. 19FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.).

Figura 3
Ilustração disponível na obra Kindezi, the kongo art of babysitting.

Essa organização comunitária em torno das crianças garante que elas circulem entre as diferentes instituições locais, onde elas constroem e elaboram conhecimentos a partir do lugar em que vivem, com/no/sobre o território: o sâdulo é o local onde as crianças vivenciam suas experiências cotidianas de descobrimento do mundo e tudo aquilo que as cerca. De acordo com Lowden (2000)LOWDEN, Frances Y. Kindezi: A Distinctively Afrocentric Perspective on Early Childhood Education. The Education Resources Information Center (ERIC), Champaign, Opinion Papers n. 120, 2000. Disponível em: https://files.eric.ed.gov/fulltext/ED445791.pdf. Acesso em: 02 jan. 2019.
https://files.eric.ed.gov/fulltext/ED445...
, “[...] o sâdulo (local de aprendizados práticos) engloba o mundo das crianças, o qual não pode ser restringido por paredes físicas”4 4 Do original em inglês: “[...] sadulu (practical place of learning) which encompasses the world of the child, unconstrained by physical walls” (tradução nossa). . Portanto, não se trata da estrutura física de escolas, por exemplo, mas de uma comunidade inteira à disposição do cuidado e da aprendizagem. Novamente aqui encontramos correlação com a infância negra brasileira das comunidades ditas periféricas, dos terreiros onde as tradições da espiritualidade africana perduram, onde a infância negra brasileira é, em alguma medida, educada e cuidada por todos: nas comunidades onde uma criança mais velha passa e recolhe cada um/uma para ir/voltar à/da escola ou de praças; nos terreiros onde, nas longas madrugadas, enquanto os rituais tomam forma, as crianças se alimentam, participam, dormem e acordam sob os cuidados de todos.

Os relatos de Fu-Kiau e Lukondo-Wamba (2000)FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000. demonstram que o sâdulo, local onde as crianças encontravam seus cuidadores (ndezi), era distinto em diversos aspectos das creches e pré-escolas como conhecemos. Não apenas pela ausência de brinquedos industrializados, ou com canetinhas e folhas em excesso, mas principalmente pelas possibilidades de integração da comunidade aos processos educativos. O ensino tinha um caráter oral e prático, pautado nas vivências construídas no cotidiano (Fu-Kiau; Lukondo-Wamba, 2000, p. 16FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.). Também era comum que crianças e suas cuidadoras e cuidadores circulassem livremente pelo território, para coletar flores, além de ervas e frutas, podendo conhecer os insetos e animais que viviam nos arredores. Essa dinâmica tornava os processos educativos itinerantes, portanto em movimento, de acordo com os princípios cosmológicos bantu-kongo. Era, portanto, “[...] uma escola em movimento, onde as crianças da comunidade não apenas conhecem o/a seu ndezi, mas onde também aprendem fazendo” (Fu-Kiau; Lukondo-Wamba, 2000, p. 16FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.).

Entendemos que, entre brincadeiras, jogos, histórias e canções, as crianças aprendem a nomear sua realidade, explorando a complexa unidade do mundo em relação a si próprias, pois podem refletir e elaborar sentidos sobre tudo que as cerca, sobre seus sentimentos e seu estar no chão que pisam. No Brasil, esses espaços são aqueles em que valores civilizatórios afrobrasileiros constituem princípios e comportamentos cotidianos, como podemos acompanhar na obra de Vanda Machado (2019)MACHADO, Vanda. Irê Ayó: uma epistemologia afro-brasileira. Salvador: EDUFBA, 2019., que, ao narrar suas experiências a favor de uma epistemologia afro-brasileira para a educação, insere-nos no cotidiano com as crianças do projeto Ire Ayo no Ile Axe Opo Afonjá, na Bahia. Em sua companhia, as crianças circulavam pelo território e aprendiam a partir do que acontecia no dia a dia. À semelhança do sâdulo bantu-kongo, a experiência da autora também ilustra processos educativos itinerantes, isto é, em movimento. Assim como no sâdulo, onde movimentar-se pelo território conferia a possibilidade de vivenciar novos acontecimentos, no terreiro, localizado na Bahia, a autora lança um alerta “[...] para o fato de que, quando menos se espera, há um acontecimento novo na roça, o que implica muita atenção para que não se perca o momento oportuno para vivenciar ações criadoras” (Machado, 2019, p. 98MACHADO, Vanda. Irê Ayó: uma epistemologia afro-brasileira. Salvador: EDUFBA, 2019.).

Esses ‘acontecimentos novos’ ainda hoje são valorizados e considerados importantes nos processos pedagógicos oriundos de comunidades negras. Quando, por exemplo, as crianças que frequentam o Sopapo Poético, em Porto Alegre/RS, são convidadas ao centro das rodas de poesia, “o sarau visa amenizar a distância que a criança [negra] sofre em relação à própria cultura” (Fontoura; Salom; Tettamanzy, 2016, p. 170FONTOURA, Pâmela Amaro; SALOM, Julio Souto; TETTAMANZY, Ana Lúcia Liberato. Sopapo Poético: sarau de poesia negra no extremo sul do Brasil. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 49, p. 153-181, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2316-4018498. Acesso em: 02 jan. 2019.
https://doi.org/10.1590/2316-4018498...
). Nessa mesma dinâmica, a comunidade costuma receber as crianças “com canto e palmas até o centro da roda de poesias”, pois assim

[...] o Sopapo convoca as crianças para defenderem sua autoestima, seu potencial de criadoras, internalizando, desde cedo, o protagonismo que irá ampliar seu olhar sobre si mesmas enquanto sujeitos históricos. Elas começam dizendo seu nome e depois contam o que fizeram e aprenderam naquela noite. Aqueles que já sabem ler e escrever recitam seus poemas (Fontoura; Salom; Tettamanzy, 2016, p. 170FONTOURA, Pâmela Amaro; SALOM, Julio Souto; TETTAMANZY, Ana Lúcia Liberato. Sopapo Poético: sarau de poesia negra no extremo sul do Brasil. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 49, p. 153-181, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2316-4018498. Acesso em: 02 jan. 2019.
https://doi.org/10.1590/2316-4018498...
).

Nesse espaço, crianças negras e não negras podem experienciar algo como estar no sâdulo: um espaço que prepara as crianças para a vida em comunidade. Em nosso entendimento, é exatamente aqui que reside a diferença entre as crianças brancas e as crianças negras: através desses processos educativos vivenciados ora no sâdulo do Kongo, no Candomblé da Bahia ou no Sarau de poesia do Sul, que as crianças performam, todavia essa performatividade das crianças negras carrega a memória de valores civilizatórios que ecoam e significam de modo único e singular, a partir de suas corporeidades e identidades como sujeitos negros em diáspora5 5 Tomamos aqui o conceito de diáspora na dimensão proposta por Hall (2005), de modo a pensar a construção das múltiplas identidades negras para além da concepção binária de identidade e diferença, imposta pela história do tráfico. . Esse processo prático e sensível é essencial para garantir a união entre a criança e o corpo social no qual ela está inserida (podemos retomar a Figura 3), segundo a cosmologia bantu-kongo, pois os códigos sociais mobilizados para as aprendizagens estabelecem a noção de uma comunidade espiritualmente unida, em partilha e em movimento (Fu-Kiau, 2000FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.).

Para pensarmos a criança bakongo como uma criança performer, e por extensão pensarmos os ecos dessa performatividade operando nas crianças negras brasileiras, precisamos falar do corpo. Não de qualquer corpo, mas daquele que a criança congolesa habita: ele não é o corpo do infante ocidental, racializado pelo colonialismo, cindido e regulado pela invenção da infância, governado pela escola; ele é. Um corpo que transita, que se desloca e experimenta – a vida, o mundo ao redor – em liberdade de sentir/pensar. Como bem aponta Eduardo Oliveira (2021)OLIVEIRA, Eduardo. Filosofia da ancestralidade: corpo e mito na Filosofia da Educação Brasileira. Rio de Janeiro: Ape’Ku, 2021., o corpo nas concepções africanas precisa ser pensado como diversidade, integração e ancestralidade: diverso a partir de sua multiplicidade biológica e cultural, integrado, pois que é condição para qualquer relação e, ao mesmo tempo, conditio que acomete e fenece e, por fim, é ancestral, porquanto é anterioridade, é a ancestralidade (e por ela é guiado). Nela, na ancestralidade, repousa a tradição. Assim, num continuum de experienciar, esse corpo pode brincar e performar. Pode ser

[...] um acontecimento que inaugura a existência. Não apenas é uma existência coletiva: o corpo é a forma cultural que dá forma ao corpo. O corpo é, então, o modo Preexistente de existir. [...] Une-se o vazio ao pleno; continente a conteúdo. O corpo é a mediação entre mistério e revelação. O corpo, visível, é o sinal do invisível no corpo. Forma e conteúdo no mesmo instante do acontecimento (Oliveira, 2021, p. 124OLIVEIRA, Eduardo. Filosofia da ancestralidade: corpo e mito na Filosofia da Educação Brasileira. Rio de Janeiro: Ape’Ku, 2021.).

Nesse sentido, quando indagamos sobre as experiências performadas pelas crianças bakongo e pelas crianças negras brasileiras, pensamos em uma performance que edifica a relação passado-presente no corpo, que se manifesta na corporeidade, nos passos de dança, nas expressões faciais, na entonação da voz, na palavra falada – que é também a palavra divina –, nos movimentos em torno de si e de outrem, nas idas-e-vindas enquanto exibem amostras de harmonia entre o ancestral e o vivo, consolidando performances que brincam com as noções de tempo, tornando vivas as memórias. Sejam nos cantos e palmas no centro da roda (Fontoura; Salom; Tettamanzy, 2016FONTOURA, Pâmela Amaro; SALOM, Julio Souto; TETTAMANZY, Ana Lúcia Liberato. Sopapo Poético: sarau de poesia negra no extremo sul do Brasil. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 49, p. 153-181, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2316-4018498. Acesso em: 02 jan. 2019.
https://doi.org/10.1590/2316-4018498...
), ou nos acontecimentos cotidianos que atravessam a experiência educativa – rituais, celebrações, visitas, doenças, conquistas (Machado, 2019MACHADO, Vanda. Irê Ayó: uma epistemologia afro-brasileira. Salvador: EDUFBA, 2019.).

Pensar a criança como performer não é uma proposição nova: Machado (2010, p. 123)MACHADO, Marina Marcondes. A criança é performer. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 35, n. 2, p. 115-137, maio/ago. 2010., ao discutir a criança de 0 a 6 anos, já convidava à compreensão de que “[...] a criança é performer de sua vida cotidiana, suas ações presentificam algo de si, dos pais, da cultura ao redor, e também algo por vir”. Todavia, não estamos nos limitando a olhar a criança pequena (de 0 a 6 anos), como propõe a autora; ao invés disso, buscamos perceber a infância de crianças negras a partir de alguns pressupostos cosmológicos de origem Kongo, que, em nosso entendimento, vão ao encontro de valores civilizatórios afro-brasileiros enraizados e mantidos através da manutenção da memória – e da tradição: circularidade, religiosidade, corporeidade, musicalidade, memória, ancestralidade, cooperativismo, oralidade, energia vital e ludicidade (Brandão; Trindade, 2010, p. 14). Acreditamos que tais valores civilizatórios podem contribuir para diversas interpretações sobre esses pequenos Sóis vivos que habitam nosso mundo.

O que propomos, então, é demarcar as especificidades de parte das crianças negras brasileiras, pensadas por nós como guardiãs de um modo peculiar e profícuo de oralidade que não centraliza a fala (e nela a voz) como elemento central da comunicação, tão somente porque as crianças estão em processo de apropriação da escrita (Cf. Soares, 2020SOARES, Magda. Alfaletrar: toda criança pode aprender a ler e escrever. São Paulo: Contexto, 2020.; Morais, 2019MORAIS, Arthur Gomes de. Consciência fonológica na educação infantil e no clico de alfabetização. Belo Horizonte: Autêntica, 2019.), mas sim porque em sua oralidade elas atualizam valores civilizatórios africanos (cf. Trindade, 2014TRINDADE, Azoilda Loretto da. Multiculturalismo: mil e uma faces da escola. Petrópolis: DP et alii, 2014.) que se articulam e as permitem performar como um ato de presença que opera produção de conhecimentos, experimentação, ludicidade e transformação. Nessa dimensão, Alcântara e Icle (2011, p. 133)ALCÂNTARA, Celina Nunes de; ICLE, Gilberto. Teatro, palavra, performance: pensar a voz para além da expressão. Repertório, Salvador, n. 17, p. 129-135, 2011. nos lembram que a voz traz em si mesma uma possibilidade performática quando a pensamos não reduzida “[...] à transmissão de uma mensagem, mas uma ação que transforma aquele que a pronuncia, tanto quanto aquele que é co-presente ao ato performático”.

Amadou Hampâté Bâ (2013, p. 11)HAMPÂTÉ BÂ, Amadou. Amkoullel, o menino fula. São Paulo: Pallas Athena, 2013. aponta que

Para descrever uma cena, só preciso revivê-la. E, se uma história me foi contada por alguém, minha memória não registrou somente seu conteúdo, mas toda a cena – a atitude do narrador, sua roupa, seus gestos, sua mímica e os ruídos do ambiente [...]. Quando se reconstitui um acontecimento, o filme gravado desenrola-se do começo ao fim, por inteiro. [...] O relato se faz em sua totalidade, ou não se faz. Nunca nos cansamos de ouvir mais uma vez, e mais outra, a mesma história! Para nós, a repetição não é um defeito.

Entendemos, então, que as crianças em contextos que evidenciem valores civilizatórios afro-brasileiros costumam estar aprendendo com a oralidade e a ancestralidade africana, na perspectiva trazida por Hampâté Bâ (2013)HAMPÂTÉ BÂ, Amadou. Amkoullel, o menino fula. São Paulo: Pallas Athena, 2013., contam histórias vividas/imaginadas; nesse contar, brincam com suas corporeidades: seus gestos, seus movimentos, suas vozes funcionam como em uma performance, onde se encena a palavra “[...] espacial e atemporalmente, aglutinando o pretérito, presente e o futuro, voz e ritmo, gesto e canto, de modo complementar” (Martins, 1997, p. 148MARTINS, Leda Maria. Afrografias da memória: O Reinado do Rosário no Jatobá. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: Mazza Edições, 1997.).

Para Paul Zumthor (2012)ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. São Paulo: Cosac & Naify, 2012., existem três tipos de performances: a completa, que necessita de um corpo presente que conduza o ato imediato e poético através de todos os canais sensoriais do performer e do receptor; a vocal direta, que ocorre sem o corpo presente do performer, recebida por meio da audição de discos ou rádio (como nas peças radiofônicas, por exemplo) e, por fim, a puramente visual, onde o leitor reconstrói o prazer do poético através de suas emoções manifestas pelo/no corpo. Aqui compreendemos que a criança bakongo e a criança negra brasileira, na condição de crianças performers, fazem uso da performance completa quando, na contação de suas experiências/histórias, capturam o outro (real ou imaginário): convidando-o a acompanhar, reviver, estar com ela em seu sâdulo, compartilhando sentidos em uma perspectiva comunitária.

Entendemos que as crianças negras brasileiras, herdeiras dessa ancestralidade bakongo, são guardiãs de saberes antigos e, em alguma medida, reeditam suas performances, quando, por exemplo, estão inseridas em contextos culturais africanos, em que as práticas civilizatórias antigas são cotidianamente preservadas: são os espaços onde habitam as batidas do samba, onde acontecem as rodas de capoeira, dos desafios do jongo, da umbigada, do cotidiano no Candomblé... Lugares onde a episteme eurocêntrica encontra resistência às suas tentativas de regular o corpo, prender os sentidos e ditar as normas.

A partir da obra de Vanda Machado (2019)MACHADO, Vanda. Irê Ayó: uma epistemologia afro-brasileira. Salvador: EDUFBA, 2019. e sua experiência em uma escola pública localizada dentro do Ilê Axé Opo Afonjá, território de matriz africana fundado em 1910, soubemos que as vivências das crianças envolviam a possibilidade de “tomar elementos da cultura afro-brasileira como perspectiva de formação de conceitos” (Machado, 2019, p. 39MACHADO, Vanda. Irê Ayó: uma epistemologia afro-brasileira. Salvador: EDUFBA, 2019.). Ao perceber as tensões causadas pela ausência da cultura africana e afro-brasileira nos currículos escolares, a professora lançou mão de um estudo epistemológico, trazendo à tona significados atribuídos à produção de conhecimentos no terreiro, indicando que um indivíduo – aqui entendido como a criança – pode aproximar o pretérito do presente por meio de associações contínuas, desde que “num ambiente rico em simbologia, termos de linguagem, imagens mentais e conceitos” (Machado, 2019, p. 93MACHADO, Vanda. Irê Ayó: uma epistemologia afro-brasileira. Salvador: EDUFBA, 2019.). Se considerarmos o espaço do terreiro como algo semelhante ao sâdulo dos bakongo, por meio da oralidade a comunidade sustenta a manutenção da memória, e então as crianças podem contar suas histórias, sejam elas vividas ou imaginadas, integrando-se de forma criativa ao mundo na condição de agentes de um processo de aprendizagem voltado para a vida. Elas, assim, performam por entre as cores, entre os sons emitidos pelos instrumentos e os passos de dança, performam na comunhão de vozes em um canto ou, ainda, nos movimentos corporais livres e ritmados.

Como nos aponta Zumthor (2012, p. 77-78)ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. São Paulo: Cosac & Naify, 2012.:

O performer, a partir de sua oralidade, permite a recepção coletiva da obra construindo a poesia através da tríade performer-texto-receptor [...] o corpo é ao mesmo tempo o ponto de partida, o ponto de origem e o referente do discurso. [...] É pelo corpo que o sentido é aí percebido. O mundo tal como existe fora de mim não é em si mesmo intocável, ele é sempre, de maneira primordial, da ordem do sensível: do visível, do audível, do tangível.

Pensando que este texto, no caso das crianças, vem da oralidade, a criança performer expressa, através do corpo, suas compreensões, aflições, conhecimentos, dúvidas, alegrias e se insere na comunidade a que pertence de maneira orgânica e circular, brincante e transitória, ora contando sua experiência – o texto – por meio de suas performances, ora envolvendo-se com todos os seus sentidos em experiências outras, como uma espectadora que não limita sua participação apenas ao que se pode escutar ou assistir. Pelo contrário, busca encontrar meios de imbricar-se ativamente nas dinâmicas sociais. Conforme apontam Fourshey, Gonzales e Saidi (2019)FOURSHEY, Catherine Cymone; GONZALES, Rhonda M.; SAIDI, Christine. África Bantu: de 3500 ac até o presente. Petrópolis: Vozes, 2019., há mais de 5.500 anos as comunidades do tronco linguístico bantu utilizavam em seu vocabulário palavras que indicavam a recorrência da participação ativa de espectadores durante as reuniões comunitárias ou ritualísticas, uma vez que participar de uma performance vai além da silenciosa ação de somente “[...] ouvir os fatos, mas de estar imerso nas palavras, nas imagens, nos sons e nos cheiros das histórias ou mitos narrados e encenados” (Fourshey; Gonzales; Saidi, 2019, p. 155FOURSHEY, Catherine Cymone; GONZALES, Rhonda M.; SAIDI, Christine. África Bantu: de 3500 ac até o presente. Petrópolis: Vozes, 2019.).

A história remota aponta, então, para uma tradição milenar que ainda perdura em menor ou maior escala no cotidiano de crianças negras afrodiaspóricas, ainda que essas vivências e experiências possam sofrer interferências derivadas do colonialismo que interrompam e/ou impeçam seu desenvolvimento. Difundida no que conhecemos como cultura nacional, a cultura bakongo em específico, assim como as culturas africanas de modo geral, estão constantemente sendo revividas e reeditadas no Brasil. Isso porque a criança – associada à noção de muntu – que se movimenta em torno de um eterno estado de transformações e mudanças, quando em união com sua comunidade, tece os fios condutores de sua própria história, isto é, da memória e dos significados, dos conceitos elaborados a partir da cultura, que se mantém viva, enfim, por intermédio da performance, nos atos ritmados de cantar, falar, mover-se, dançar.

Segundo o filósofo camaronês Eboussi Boulaga (1977 apud Dussel, 2012, p. 75DUSSEL, Enrique. Ética da libertação: na idade da globalização e da exclusão. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2012.)6 6 Obra La crise du Muntu: authenticité africaine et philosophie: essai. 1977. ,

[...] a periodicidade é o tempo substancial das coisas [...] Tudo é alternância, ritmo [...] O ritmo é vital [...] O ritmo produz o êxtase, a saída de si que identifica com a força vital [...] Não seria exagerado dizer que o ritmo é a arquitetônica do ser, que, para o ser humano da civilização cuja filosofia expomos, a experiência fundamental, que escapa a todos os ardis do gênio maligo [de Descartes], e que permanece fora de toda dúvida é: Je danse, donc je vis (Eu danço, portanto vivo).

Não estamos negando com isto a compreensão de que as crianças negras brasileiras são sujeitos históricos, agentes de seu tempo e interpeladas pelas especificidades que os demais marcadores identitários (tais como classe, gênero, religiosidade, etc.) conferem às suas trajetórias, mas apontando que, muito além das experiências escolares, a educação dessas crianças também se dá em territórios majoritariamente negros, tais como escolas de samba, terreiros, comunidades periféricas dos centros urbanos, quilombos, dentre outros, onde religiosidade, corporeidade, oralidade, ancestralidade se articulam, permitindo que a sua presença se imponha e atualize em performances que a elas oportunizem ocupar centralidade, exercer protagonismo, além de produzir e compartilhar saberes.

De uma conclusão inconclusa: dos desafios de permitir-se performar com as crianças negras brasileiras

Consideramos que nossos argumentos apontam para um desafio importante: a necessidade de perceber e acolher as crianças negras brasileiras, herdeiras da tradição africana, em sua insurgência, em sua não submissão aos ditames do colonialismo do corpo e do espírito, entrevendo-nos a performar com elas, dentro e fora das escolas.

Nesse sentido, referimos a necessidade de promover uma ruptura decolonial, ao acolhermos as crianças negras (dentro ou fora dos espaços educativos escolares) na dimensão proposta por Maldonado-Torres (2020)MALDONADO-TORRES, Nelson. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: MALDONADO-TORRES, Nelson (Org.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2020., pensando em esforços efetivos para sairmos das estruturas coloniais que ainda regulam nossos modos de ser, poder e saber.

Não pensamos ser esse um desafio pequeno ou banal, mas um efetivo embate para que nossa adulteza ceda e seja desassociada do status de superioridade hierárquica que, em culturas ocidentalizadas, acomete as relações entre crianças e adultos.

Dessa forma, lançamo-nos a esta busca: compreender as crianças a partir de suas performances, que transformam o tempo e modificam o espaço em seus gestos e cantos tão brincantes que dão vida ao imaginário, mas também à memória ancestral presente nos valores civilizatórios afro-brasileiros. Trata-se, portanto, de uma busca por modos de permitir que elas se expressem plenamente e explorem o mundo em que vivem em sua dimensão física e/ou espiritual. Para isso, mais condições e contextos precisam ser elaborados para que as crianças negras levantem suas hipóteses e construam, entre si (e conosco), modos de ser e estar que surgem da ancestralidade.

Cabe-nos, então, o desafio de garantir que esses pequenos ancestrais vivos possam ser, distantes de mecanismos de controle que podam suas experiências sensoriais e corporais cotidianamente, muitas vezes impedindo, também, que suas performances sejam realizadas.

No entanto, imersas num tempo cíclico onde passado e presente podem se tornar um só momento, as performances de crianças negras (no continente ou na diáspora) desacomodam a realidade como a conhecemos. Ao tornar visível o invisível, a infância africana não só acessa a ancestralidade, mas é a partir dela. E, mais do que isso, convoca-nos a participar desse processo de transformação.

Notas

  • 1
    Doravante nomeados de bantu.
  • 2
    Do original, em inglês: “[...] binds people and warm them up” (tradução nossa).
  • 3
    Do original, em inglês: “[...] that of togetherness as a shared spiritual thing for the betterment of community survival” (tradução nossa).
  • 4
    Do original em inglês: “[...] sadulu (practical place of learning) which encompasses the world of the child, unconstrained by physical walls” (tradução nossa).
  • 5
    Tomamos aqui o conceito de diáspora na dimensão proposta por Hall (2005)HALL, Gwendolyn Midlo Hall. Slavery and African Ethnicities in the Americas. Restoring the Links. North Caroline: The University of North Caroline Press, 2005., de modo a pensar a construção das múltiplas identidades negras para além da concepção binária de identidade e diferença, imposta pela história do tráfico.
  • 6
    Obra La crise du Muntu: authenticité africaine et philosophie: essai. 1977.

Referências

  • ALCÂNTARA, Celina Nunes de; ICLE, Gilberto. Teatro, palavra, performance: pensar a voz para além da expressão. Repertório, Salvador, n. 17, p. 129-135, 2011.
  • ANI, Marimba. Introduction. In: FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A.M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.
  • ARIÈS, Phillipe. História social da criança e da família 2. ed. São Paulo: TLC, 1981.
  • CUNHA JÚNIOR, Henrique Antunes. NTU: introdução ao pensamento filosófico bantu. Revista Educação em Debate, Fortaleza, ano 32, v. 1, n. 59, p. 25-40, 2010.
  • DUSSEL, Enrique. Ética da libertação: na idade da globalização e da exclusão. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2012.
  • FONTOURA, Pâmela Amaro; SALOM, Julio Souto; TETTAMANZY, Ana Lúcia Liberato. Sopapo Poético: sarau de poesia negra no extremo sul do Brasil. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 49, p. 153-181, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2316-4018498 Acesso em: 02 jan. 2019.
    » https://doi.org/10.1590/2316-4018498
  • FOURSHEY, Catherine Cymone; GONZALES, Rhonda M.; SAIDI, Christine. África Bantu: de 3500 ac até o presente. Petrópolis: Vozes, 2019.
  • FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki; LUKONDO-WAMBA, A. M. Kindezi: The Kongo Art of Babysitting. c 1988. Baltimore: Inprint Editions, 2000.
  • HALL, Gwendolyn Midlo Hall. Slavery and African Ethnicities in the Americas Restoring the Links. North Caroline: The University of North Caroline Press, 2005.
  • HAMPÂTÉ BÂ, Amadou. Amkoullel, o menino fula São Paulo: Pallas Athena, 2013.
  • LOPES, Nei. Kitábu: o livro do saber e do espírito negro-africanos. São Paulo: Senac, 2005.
  • LOPES, Nei. Bantos, malês e identidade negra 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2021.
  • LOWDEN, Frances Y. Kindezi: A Distinctively Afrocentric Perspective on Early Childhood Education. The Education Resources Information Center (ERIC), Champaign, Opinion Papers n. 120, 2000. Disponível em: https://files.eric.ed.gov/fulltext/ED445791.pdf Acesso em: 02 jan. 2019.
    » https://files.eric.ed.gov/fulltext/ED445791.pdf
  • MACHADO, Marina Marcondes. A criança é performer. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 35, n. 2, p. 115-137, maio/ago. 2010.
  • MACHADO, Vanda. Irê Ayó: uma epistemologia afro-brasileira. Salvador: EDUFBA, 2019.
  • MALDONADO-TORRES, Nelson. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: MALDONADO-TORRES, Nelson (Org.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2020.
  • MARTINS, Leda Maria. Afrografias da memória: O Reinado do Rosário no Jatobá. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: Mazza Edições, 1997.
  • MORAIS, Arthur Gomes de. Consciência fonológica na educação infantil e no clico de alfabetização Belo Horizonte: Autêntica, 2019.
  • MUNANGA, Kabengele. Origem e histórico do quilombo na África. Revista USP, São Paulo, n. 28, p. 56-63, 1996.
  • MUNANGA, Kabengele. Origens africanas do Brasil contemporâneo: histórias, línguas, culturas e civilizações. São Paulo: Globo, 2009.
  • OBENGA, Theophile. Les bantu: langues, peuples, civilisations. Paris; Dakar: Presénce Africaine, 1985.
  • OLIVEIRA, Eduardo. Filosofia da ancestralidade: corpo e mito na Filosofia da Educação Brasileira. Rio de Janeiro: Ape’Ku, 2021.
  • PEREIRA, Gabriel Fortes. Kindezi, the kongo art of babysitting: contribuições da cosmologia bakongo de Bunseki Fu-Kiau para pensar a educação de crianças. 2021. Orientação de Gladis Elise Pereira da Silva Kaercher. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Pedagogia) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2021.
  • SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos Bantu-Kongo por Bunseki FuKiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. 2019. Tese (Doutorado em Estudos da Tradução) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.
  • SARMENTO, Manuel Jacinto; GOUVEA, Maria Cristina Soares de (Org.). Estudos da Infância: educação e práticas sociais. Petrópolis: Vozes, 2008.
  • SARMENTO, Manuel Jacinto; VASCONCELOS, Vera Maria Ramos de (Org.) Infância (in)visível Araraquara: Junqueira & Marin Editores, 2007.
  • SILVA, Liziane Guedes da; NOGUERA, Renato. Repensando as infâncias das crianças negras: notas afroperspectivistas e introdutórias a partir do Sopapinho Poético. Revista Brasileira de Estudos da Homocultura, Cuiabá, v. 3, n. 9, p. 187-203, 2020.
  • SOARES, Magda. Alfaletrar: toda criança pode aprender a ler e escrever. São Paulo: Contexto, 2020.
  • TAVARES, Julio Cesar. Gramática das corporeidades afrodiaspóricas Perspectivas etnográficas. Curitiba: Appris Editora, 2020.
  • TRINDADE, Azoilda Loretto da. Valores civilizatórios afro-brasileiros na educação infantil. Salto para o Futuro, Brasília, p. 30-36, 2005.
  • TRINDADE, Azoilda Loretto da. Multiculturalismo: mil e uma faces da escola. Petrópolis: DP et alii, 2014.
  • ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura São Paulo: Cosac & Naify, 2012.

Editado por

Editoras responsáveis: Taís Ferreira; Melissa Ferreira; Fabiana de Amorim Marcello

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    26 Abr 2022
  • Aceito
    16 Ago 2022
Universidade Federal do Rio Grande do Sul Av. Paulo Gama s/n prédio 12201, sala 700-2, Bairro Farroupilha, Código Postal: 90046-900, Telefone: 5133084142 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: rev.presenca@gmail.com