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Prevalência e fatores associados à constipação intestinal em idosos residentes em instituições de longa permanência

Resumos

Objetivo

: Investigar a prevalência e fatores associados à constipação intestinal em idosos institucionalizados.

Método

: Trata-se de um estudo do tipo transversal. A amostra foi composta por 87 idosos e os dados coletados foram referentes à idade, sexo, ingestão diária de água e fibras, prática de atividade física, histórico familiar de constipação, além de dados referentes ao estado nutricional. O diagnóstico de constipação foi baseado nos critérios de Roma III. Para realização das análises estatísticas foi utilizado o softwareSPSS, versão 18.0, considerando o nível de significância de 5% (p≤0,05) e os testes estatísticos feitos foram:t Student, Mann-Whitney, Qui-quadrado de Pearson ou Exato de Fischer.

Resultados

: A amostra foi predominantemente do sexo feminino (80,5%), apresentando idade média de 79,4 (±9,6) anos. Observou-se que a prevalência de constipação intestinal foi de 42,52%, sendo mais frequente nas mulheres (89,2%), naqueles com idade igual ou superior a 80 anos (67,6%), nos que não praticavam atividade física (56,8%), nos que possuíam uma ingestão hídrica e consumo de fibras abaixo do recomendado, nos que possuíam histórico familiar de constipação, e também se mostrou mais prevalente naqueles que apresentaram diagnóstico nutricional de eutrofia (56,3%). Quando relacionadas à constipação, verificou-se que apenas a idade (p=0,049) e o baixo consumo de fibras (p=0,019) se associaram significativamente.

Conclusão

: Os resultados obtidos evidenciaram que a constipação intestinal é uma queixa digestiva de etiologia multifatorial, com a qual a idade avançada e o baixo consumo de fibras se associaram significativamente.

Constipação Intestinal; Idoso; Hábitos Alimentares; Estilo de Vida


Objective

: Constipation is a frequent motility disorder and while a common complaint among the overall population, is particularly prevalent among the elderly. The increase of this population group is creating a growing demand for long term care institutions. The present study aims to investigate the prevalence of and factors associated with constipation in elderly residents of long stay care institutions.

Method

: The study involved 87 individuals. The data collected from each participant included gender, daily intake of water and fiber, physical activity, family history of constipation and nutritional status. The diagnosis of constipation was based on Roma III criteria. Statistical analysis was performed with the SPSS software program (version 18.0) with a level of significance of 5% (p≤0.05). The Student t, Mann-Whitney, Pearson's chi-square or Fischer's exact tests were employed.

Results

: The sample was predominantly female (80.5%), with a mean age of 79.4(±9.6) years. A 42.52% prevalence of constipation was observed. Among affected individuals, the condition was more frequent among women (89.2%), those aged over 80 years (67.6%), those who did not engage in physical activity (56.8%), those with below the recommended intake of water and fiber, those who had a family history of constipation, and those who were diagnosed with eutrophia (56.3%). Among the factors analyzed, only age (p=0.049) and low fiber intake (p=0.019) were significantly linked to constipation.

Conclusion

: The results show that constipation is a multifactorial disease that is significantly related to age and low fiber intake.

Constipation; Elderly; Food Habits; Life Style


INTRODUÇÃO

O processo de envelhecimento apresenta características peculiares, variando de pessoa para pessoa e de cultura para cultura.11. De Oliveira SCM, Pinto-Neto AM, Góes JRN, Conde DM, Santos-Sá D, Costa-Paiva L. Prevalence and factors associated with intestinal constipation in postmenopausal women. Arq Gastroenterol 2005;42(1):24-3.O aumento da população idosa ocorrido inicialmente nos chamados países desenvolvidos tem atingido também os países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, mostrando que em todo o mundo esta é uma realidade. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o índice de envelhecimento aponta para mudanças na estrutura etária da população brasileira. Em 2008, para cada grupo de 100 crianças de 0 a 14 anos existiam 24,7 idosos de 65 anos ou mais. Em 2050, estima-se que o quadro mudará e para cada 100 crianças de 0 a 14 anos existirão 172,7 idosos.22. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da população do Brasil: população brasileira envelhece em ritmo acelerado. IBGE. 27 Nov 2008. Comunicação Social.

Esse envelhecimento populacional acelerado também terá reflexos no aumento do número de idosos institucionalizados, os quais são considerados vulneráveis do ponto de vista nutricional por apresentarem alterações metabólicas, fisiológicas, anatômicas e psicossociais inerentes à idade.33. Bosshard W, Dreher R, Schnegg JF, Büla CJ. The treatment of chronic constipation in elderly people: an update. Drugs Aging 2004;21(14):911-30.

Junto a esse processo de envelhecimento estão presentes mudanças nas funções orgânicas, que podem ser causadas tanto por fatores intrínsecos relacionados ao avanço da idade, quanto por fatores extrínsecos, como dieta, hábito de fumar, prática de atividade física e composição corporal.44. Netto MP. Tratado de gerontologia. 2 ed. São Paulo: Atheneu; 2007. Ciência do envelhecimento: abrangência e termos básicos e objetivos; p. 29-38. Essas alterações causam mudanças funcionais no organismo do idoso, tendo em vista que que ocorrem em praticamente todas as partes do corpo, podendo levar à constipação intestinal.55. Menezes TN, Marucci MFN. Antropometria de idosos residentes em instituição geriátricas. Fortaleza. Rev Saúde Pública 2005;39(2):169-75. Essa, por sua vez, está associada a fatores como a idade avançada, nutrição inadequada, ingestão insuficiente de líquidos, sedentarismo, polifarmácia, além de estar relacionada à um histórico familiar de constipação.66. Alame AM, Bahna H. Evaluation of constipation. Clin Colon Rectal Surg 2012;25(1):5-11.,77. Jaime RP, Campos RC, Santos TST, Marques MS. Prevalência e fatores de risco da constipação intestinal em universitários de uma instituição particular de Goiânia, GO. Rev Inst Ciênc Saúde 2009;27(4):378-83.

A constipação não é uma doença nem um sinal, mas um sintoma, e, como tal, pode ser originada de vários distúrbios intestinais ou extraintestinais.88. Gavanski OS, Baratto I, Gatti RR. Avaliação do hábito intestinal e ingestão de fibras alimentares em uma população de idosos. Rev Bras Obes Nutr Emagrecimento 2015;9(49):3-11. É a queixa digestiva mais comum na população geral, ocorrendo de maneira predominante no sexo feminino e acometendo todas as faixas etárias, embora seja mais comum em indivíduos com idade superior a 65 anos, nos quais a prevalência pode atingir 15% a 20% em geral, e podendo chegar a 50% em idosos institucionalizados.99. Peppas G, Alexiou VG, Mourtzoukou E, Falagas ME. Epidemiology of constipation in Europe and Oceania: a systematic review. BMC Gastroenterology. 2008;8:1-7.,1010. Lembo MDA, Camilleri MD. Chronic Constipation. N Engl J Med 2003; 349(14):1360-8. Na população idosa, a constipação constitui um problema sanitário importante,1111. Organização Mundial de Gastroenterologia. Constipação: uma perspectiva mundial. Organização Mundial de Gastroenterologia; 2010. se tornando responsável por cerca de 2,5 milhões de visitas médicas, e, indiretamente, por 92 mil hospitalizações nos Estados Unidos a cada ano, mostrando-se como uma doença na qual a prevalência se torna maior que uma série de outras afecções crônicas comuns, como a hipertensão, obesidade e diabetes mellitus.1212. Pleis JR, Lethbridge M. Summary health statistics for U.S. adults: national health interview survey, 2005. Washington: National Center for Health Statistics; 2006. (Vital and Health Statistics), (Séries 10, n. 23).

Embora a constipação intestinal seja uma condição prevalente e de morbidade importante na população geriátrica, podendo provocar outras doenças por meio da cronicidade dos sintomas e da falta de orientação terapêutica adequada, ainda é abordada de forma simplista, o que pode interferir negativamente na qualidade de vida desses indivíduos. Diante do exposto, o presente estudo teve como objetivo investigar a prevalência e fatores associados à constipação intestinal em idosos residentes de instituições de longa permanência .

MÉTODO

Trata-se de um estudo do tipo transversal. A amostra foi composta por idosos residentes em sete instituições públicas de longa permanência localizadas no Vale do Taquari, o qual se localiza na região central do Rio Grande do Sul, com população formada principalmente pelas etnias alemã, italiana e açoriana, desfrutando de excelente qualidade de vida e longevidade. Todos os idosos (n=231) foram convidados a participar da pesquisa, e desses, 87 fizeram parte da amostra, atendendo aos critérios de inclusão: indivíduos lúcidos, conforme avaliação da pesquisadora principal e da equipe de enfermagem, residentes de uma das instituições participantes, que não fizessem uso de laxantes. Prontificaram-se a participar do estudo, por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Univates, parecer nº 161.374/2012.

A coleta de dados ocorreu entre os meses de março e junho de 2013, quando foi aplicado um questionário estruturado com dados referentes à idade, gênero, ingestão hídrica diária, nível de atividade (acamado ou nível leve) e conhecimento sobre a presença de histórico familiar de constipação. Em relação ao consumo diário de fibras, a coleta foi realizada com o auxílio do cardápio elaborado pelo nutricionista de cada instituição. Foi aplicado o instrumento registro alimentar de três dias para verificar a ingestão alimentar. Para a análise dos dados referentes ao consumo alimentar, utilizou-se osoftware Dietwin versão profissional 2008, no qual a ingestão de fibras de cada um dos três dias foi calculada, realizando-se depois a média de consumo diário. A fibra consumida foi comparada com o padrão recomendado segundo a Dietary Reference Intakes (DRIs),1313. Institute of Medicine, Food and Nutrition Board. Dietary reference intakes: energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids. Washington: National Academy Press; 2002. traduzida como Ingestão Dietética de Referência (IDRs), mas utilizada como Ingestão Dietética Recomendada(Recommended Dietary Allowance - RDA), e quando não houve a informação pela RDA, foi usada a Ingestão Adequada (Adequate Intake -AI). Foram verificados os dados antropométricos peso (kg) e estatura (m) dos participantes. O idoso foi pesado no centro de uma balança digital da marca Plenna®, com capacidade para 150 kg, descalço e com roupas leves. A mensuração da estatura foi realizada utilizando-se uma fita métrica com total de 2 m. O idoso foi posicionado em pé, de costas para uma parede livre de rodapé, descalço, com o corpo erguido em extensão máxima e os braços estendidos ao longo do corpo. Para aqueles indivíduos dependentes de cadeira de rodas, tendo em vista a impossibilidade de aplicação deste método, a estimativa do estado nutricional foi realizada por meio do método de Chumlea et al.1414. Chumlea WC, Roche AF, Steinbaugh ML. Estimating stature from knee height for persons 60 to 90 years of age. J Am Geriatr Soc 1985;33(2):116-20. Para a classificação do estado nutricional segundo o índice de massa corporal (IMC), utilizou-se os pontos de corte específicos para idosos preconizados por Lipschitz.1515. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim Care 1994; 21(1):55-67.

O diagnóstico de constipação intestinal foi definido de acordo com os critérios de Roma III,16 16. Tomiko Born, organizadora. Cuidar melhor e evitar a violência: manual do cuidador da pessoa idosa. Brasília, DF: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos; 2008.o qual se baseia nos seguintes critérios específicos: esforço ao evacuar; fezes endurecidas ou fragmentadas; sensação de obstrução ou bloqueio anorretal, manobras manuais para facilitar as evacuações e menos de três evacuações por semana. A presença de dois ou mais critérios em pelo menos 25% das evacuações durante no mínimo três meses em um período de seis meses caracterizou a presença de constipação intestinal.1616. Tomiko Born, organizadora. Cuidar melhor e evitar a violência: manual do cuidador da pessoa idosa. Brasília, DF: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos; 2008.

Quanto à análise estatística, as variáveis quantitativas foram descritas por média e desvio-padrão ou mediana e amplitude interquartílica em conjunto com a amplitude de variação. As variáveis qualitativas foram descritas por frequências absolutas e relativas. Para comparar médias entre os grupos, o teste tStudent foi aplicado. Em caso de assimetria, o teste de Mann-Whitney foi utilizado. Para avaliar a associação entre as variáveis qualitativas, o teste Qui-quadrado de Pearson ou Exato de Fisher foram aplicados.

O nível de significância adotado foi de 5% (p≤0,05) e as análises foram realizadas por meio do software SPSS versão 18.0.

RESULTADOS

Entre os 87 idosos que fizeram parte da amostra, predominou o sexo feminino (80,5%), a idade média foi de 79,4(±9,6), sendo que a maioria (52,9%) apresentou idade igual ou superior a 80 anos. Em relação à prática de atividade física, 37 (42,5%) idosos foram enquadrados como tendo nível de atividade leve. O uso de medicamentos foi verificado em 100% dos participantes, e desses, 85 (97,7%) idosos faziam uso de um ou mais fármaco com efeitos colaterais possivelmente constipantes.

Quanto ao histórico familiar de constipação, 58 (66,7%) souberam responder se pai, mãe ou ambos eram portadores de constipação, sendo 31 (35,7%) com histórico e 27 (31,0%) sem histórico. Os dados referentes à caracterização geral da amostra encontram-se descritos na tabela 1.

Tabela 1.
Caracterização geral da amostra (n=87). Vale do Taquari, RS, 2013.

Os dados descritos na tabela 2 mostram que a mediana da ingestão hídrica diária foi de 700 ml, sendo que apenas 25,2% consomem 1500-2000 mL diariamente, o que seria o ideal para essa população. O consumo de fibras médio foi de 22,6(±3,2) g/dia, também se mostrando abaixo do valor de ingestão recomendado.

Tabela 2.
Caracterização de consumo alimentar e estado nutricional (n=87). Vale do Taquari, RS, 2013.

Em relação ao estado nutricional, a média de IMC encontrada foi de 25,4(±4,4) Kg/m2, com a maior parte dos idosos (56,3%) apresentando diagnóstico de eutrofia.

Na tabela 3, observa-se que a prevalência de constipação intestinal foi de 42,5%, sendo mais frequente nas mulheres (89,2%), naqueles com idade igual ou superior a 80 anos (67,6%), que não praticavam atividade física (56,8%) e possuíam uma ingestão hídrica e consumo de fibras abaixo dos recomendados.

Tabela 3.
Associação das variáveis com a constipação (n=87). Vale do Taquari, RS, 2013.

Em relação à associação da constipação com o estado nutricional, a maior prevalência se mostrou presente naqueles com diagnóstico de eutrofia, e, apesar de não significativo, vale ressaltar que idosos que têm pai ou mãe com histórico apresentaram maior proporção de constipação (p=0,076).

Quando relacionadas as variáveis com a constipação, verificou-se que a idade (p=0,049) e o consumo de fibras (p=0,019) se associaram significativamente.

DISCUSSÃO

A prevalência de constipação intestinal encontrada no presente estudo foi de 42,5%. Estudos feitos em diferentes populações mostram prevalências inferiores, variando de 22,5 a 40%.1717. Beckenkamp J, Santos JS. Efeito da linhaça sobre a constipação intestinal em idosos residentes em instituições geriátricas. Rev Bras Ciênc Envelhec Humano 2011;8(2):179-87.

18. Machado WM, Capelari SM. Avaliação da eficácia e do grau de adesão ao uso prolongado de fibra dietética no tratamento da constipação intestinal funcional. Rev Nutr 2010;23(2):231-8.
-1919. Braz CRS, Lessa NMV. Fatores de risco e prevalência de constipação intestinal em graduandos do curso de nutrição de um centro universitário de Minas Gerais. Rev Digit Nutr 2011;5(8):740-54. Essa variação pode ser justificada, entre outros fatos, pela utilização de diferentes critérios diagnósticos, populações de contextos socioculturais diversos e também a ampla faixa etária avaliada.1919. Braz CRS, Lessa NMV. Fatores de risco e prevalência de constipação intestinal em graduandos do curso de nutrição de um centro universitário de Minas Gerais. Rev Digit Nutr 2011;5(8):740-54. Nesello et al.2020. Nesselo LAN, Tonelli FO, Beltrame TB. Constipação intestinal em idosos frequentadores de um Centro de Convivência no município de Itajaí-SC. Ceres Nutr Saúde 2011;6(3):151-62. avaliaram idosos frequentadores de um Centro de Convivência, onde são desenvolvidas atividades culturais, físicas e recreativas, encontrando uma prevalência de constipação em 28,8% dos avaliados. Verifica-se, portanto, que a constipação é uma condição que acomete ainda mais os idosos institucionalizados, apoiando o que outros autores já haviam afirmado ao relatar que essa prevalência pode chegar até 50%.1111. Organização Mundial de Gastroenterologia. Constipação: uma perspectiva mundial. Organização Mundial de Gastroenterologia; 2010.,2121. Cota RP, Miranda LS. Associação entre constipação intestinal e estilo de vida em estudantes universitários. Rev Bras Nutr Clín 2006;21(4):296-301.

Outro fator que pode contribuir para o surgimento da constipação é a idade avançada.2222. Oliveira JN, Tahan S, Goshima S, Fagundes-Neto, De Morais MB. Prevalência de constipação em adolescentes matriculados em escolas de São José dos Campos, SP, e em seus pais. Arq Gastroenterol 2006;43(1):50-4. Os achados do presente estudo mostram que a maior prevalência esteve presente naqueles com idade igual ou superior a 80 anos. Outros estudos corroboram os resultados encontrados, apresentando uma tendência de crescimento da prevalência de constipação intestinal conforme o avanço da idade.77. Jaime RP, Campos RC, Santos TST, Marques MS. Prevalência e fatores de risco da constipação intestinal em universitários de uma instituição particular de Goiânia, GO. Rev Inst Ciênc Saúde 2009;27(4):378-83.,1919. Braz CRS, Lessa NMV. Fatores de risco e prevalência de constipação intestinal em graduandos do curso de nutrição de um centro universitário de Minas Gerais. Rev Digit Nutr 2011;5(8):740-54. A alta prevalência de constipação encontrada no sexo feminino é outro fato que merece atenção, fatores como a diferença da motilidade intestinal e percepção visceral entre os sexos estão associados a doenças gastrointestinais, como a constipação.2323. Lin C, Toner BB, Shin F, Guthrie E, Locke GR, Norton NJ, et al. Gender, age, society, culture, and the patient's perspective in the functional gastrointestinal disorders. Gastroenterology 2006;130(5):1435-46. Como no presente estudo, Collete et al.24 24. Collete VL, Araújo CL, Madruga SW. Prevalência e fatores associados a constipação intestinal: um estudo de base populacional em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, 2007. Cad Saúde Pública 2010;26(7):1391-1402.encontraram maior prevalência nas mulheres.

Inatividade física, hábito alimentar, ingestão hídrica e polifarmácia são outros fatores que podem ser considerados agravadores da constipação. Do total da amostra do estudo em questão, a maior parte dos entrevistados foi tida como sedentária. Corroborando esses achados, estudo realizado em três instituições de longa permanência para idosos localizadas no município de Rio Claro-SP, mostrou que o índice de prática de atividade física foi baixo tanto para os homens quanto para as mulheres.2525. Vargas-García EJ, Vargas-Salado F. Food intake, nutritional status and physical activity between elderly with and without chronic constipation: a comparative study. Cir & Cir 2013;81(3):214-20. Tal fato pode ser explicado pela idade avançada como também pela incapacidade funcional.55. Menezes TN, Marucci MFN. Antropometria de idosos residentes em instituição geriátricas. Fortaleza. Rev Saúde Pública 2005;39(2):169-75. Embora no presente estudo essa alta prevalência de sedentarismo não tenha sido relacionada significativamente com a constipação (p=1,000), e outro estudo2121. Cota RP, Miranda LS. Associação entre constipação intestinal e estilo de vida em estudantes universitários. Rev Bras Nutr Clín 2006;21(4):296-301. tenha encontrado os mesmos achados, a prática regular de atividade física deve ser realizada, sendo recomendada pela Organização Mundial de Gastroenteorologia2626. Buchman AS, Boyle PA, Wilson RS, Bienias JL. Physical activity and motor decline in older persons.Muscle Nerve 2007;35(3):354-62 como manejo da constipação intestinal.

Quanto aos aspectos dietéticos, tanto o consumo de fibras quanto a ingestão hídrica mostraram-se insuficientes. Na terceira idade, a ingestão de água necessária é de pelo menos dois litros por dia, sendo esta um elemento importante para o funcionamento do intestino, manter a boca úmida e o corpo hidratado.27 27. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Alimentação saudável para a pessoa idosa: um manual para profissionais de saúde.Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2009.O baixo consumo de água pela pessoa idosa pode provocar também mais facilmente o ressecamento das fezes, podendo essas se tornarem petrificadas e muito grandes, prejudicando sua eliminação. Estudo2121. Cota RP, Miranda LS. Associação entre constipação intestinal e estilo de vida em estudantes universitários. Rev Bras Nutr Clín 2006;21(4):296-301. realizado com idosos em que a constipação intestinal foi avaliada verificou que a ingestão hídrica estava abaixo do recomendado, apresentando resultados semelhantes ao presente estudo. Markland et al.,2828. Markland AD, Plalsson O, Goode PS, Burgio KL, Busby-whitehead J, Whitehead WE. Association of low dietary intake of fiber and liquids with constipation: evidence from the National Health and Nutrition Examination Survey. Am J Gastroenterol 2013;108(5):796-803. em trabalho realizado por meio da análise de dados do National Health and Nutrition Examination Surveys (NHANES), verificaram que o baixo consumo de água se mostrou como um fator preditor para a constipação entre homens e mulheres. A hipotrofia hipotalâmica fisiológica, onde se localiza o centro da sede, é um dos fatos que pode explicar essa diminuição de ingestão hídrica nesse grupo populacional.33. Bosshard W, Dreher R, Schnegg JF, Büla CJ. The treatment of chronic constipation in elderly people: an update. Drugs Aging 2004;21(14):911-30.

No que se refere ao consumo de fibras, a média encontrada tanto para os indivíduos constipados quanto para os não constipados mostrou-se inferior ao recomendado. Corroborando esses achados, Salcedo & Kitahara2929. Salcedo RL, Kitahara SE. Avaliação do consumo semanal de fibras alimentares por idosos residentes em um abrigo. Conscientiae Saúde 2004; 3:59-64. também encontraram uma ingestão de fibras diminuída ao avaliarem 48 idosos institucionalizados em São Paulo, com o consumo médio ficando em 12,45 g/dia. No presente estudo, o consumo de fibras foi uma variável que demonstrou relação significativa com a constipação (p=0,019), mostrando que, apesar de todos os idosos avaliados terem apresentado uma média de ingestão abaixo do recomendado, naqueles considerados constipados a média de ingestão de fibras mostrou-se ainda menor em comparação aos não constipados.

Em relação aos achados, constata-se a necessidade do consumo de uma dieta acrescida de fibras, devendo esta atingir 25 g/dia,3030. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Guia alimentar para a população brasileira : promovendo a alimentação saudável. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2008. evitando dessa forma o surgimento ou agravamento dos sintomas relacionados a constipação

Ao avaliar o estado nutricional dos idosos, o valor médio de IMC, 25,4kg/m2, corroborou os achados de outros estudos que fizeram a mesma avaliação em idosos institucionalizados.3131. Trisóglio C, Marchi CMG, Torres US, Netinho JG. Prevalência de constipação intestinal entre estudantes de medicina de uma instituição no Noroeste Paulista. Rev Bras Coloproctol 2010;30(2):203-9.,3232. Rauen MS, Moreira EAM, Calvo MCM, Lobo AS. Avaliação do estado nutricional de idosos institucionalizados. Rev Nutr 2008;21(3):303-10.Assim como na presente investigação, Collete et al.2424. Collete VL, Araújo CL, Madruga SW. Prevalência e fatores associados a constipação intestinal: um estudo de base populacional em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, 2007. Cad Saúde Pública 2010;26(7):1391-1402. também não encontraram associação estatisticamente significativa entre IMC e sintomas gastrointestinais.

Dentre as limitações do estudo, destaca-se o fato de o questionário utilizado para a coleta de dados, apesar de estruturado, não ser validado. Outro ponto importante é o caráter transversal do estudo, que não permite a realização de associações do tipo causa e efeito. Outra limitação consiste em um possível viés de memória relacionado aos dados informados, visto que grande parte foi referido pelos idosos.

CONCLUSÃO

A prevalência de constipação intestinal no grupo populacional estudado foi de 42,5%, mostrando-se superior àquela encontrada em estudos realizados com idosos não institucionalizados e confirmando o que outros autores já haviam relatado sobre essa condição ser muito prevalente em idosos. A constipação demonstrou ser uma queixa digestiva multifatorial, estando a idade avançada e o baixo consumo de fibras associados a ela significativamente. Vale ainda ressaltar que, embora não existam muitos trabalhos abordando a relação entre a constipação intestinal e fatores hereditários, este é um achado que, apesar de no presente estudo não ter apresentado relação significativa, demonstrou que existe uma prevalência maior de constipação naqueles que relataram ter pai, mãe ou ambos constipados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2013
  • Revisado
    17 Jul 2015
  • Aceito
    12 Ago 2015
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