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Efeito da inserção de implante anticoncepcional contendo acetato de nomegestrol sobre a função ovariana, muco cervical e penetração espermática

Effects of a contraceptive implant containing nomegestrol acetate on ovarian function, cervical mucus and sperm penetration

Resumos

OBJETIVOS: estudar o efeito de um único implante de acetato de nomegestrol (Uniplant) sobre função ovariana, produção do muco cervical e penetração espermática, quando inserido na fase pré-ovulatória. MÉTODOS: estudo clínico aberto, comparativo, incluindo 20 mulheres com ciclos menstruais regulares que foram estudadas durante um ciclo menstrual antes (controle) e um ciclo menstrual depois da inserção do implante. Dosagens de hormônio luteinizante (LH), estradiol e progesterona, ultra-sonografia vaginal, coleta de muco cervical e teste de penetração espermática foram realizados. Para comparação estatística, foi utilizado o Student t-test para grupos pareados e o teste Wilcoxon não paramétrico. Os valores estão mostrados como médias ± erro padrão. RESULTADOS: todos os ciclos controles foram ovulatórios com parâmetros normais. Os níveis pré-ovulatórios de estradiol e LH diminuíram significativamente de 603,2 ± 78,0 pmol/l e 22,5 ± 6,5 UI/l na pré-inserção do implante para 380,7 ± 51,9 pmol/l e 4,9 ± 1,3 UI/l 48 horas após a inserção (p < 0,05 e p < 0,01, respectivamente). Os níveis de progesterona mantiveram-se sem variação significativa após a inserção do implante (ciclo controle = 49,8 ± 3,3 nmol/l e ciclo tratado = 43,2 ± 5,2 nmol/l). Muco cervical e penetração espermática foram profundamente afetados em 10,5% das usuárias após 20 horas da inserção do implante, em 68,5% das usuárias após 24 horas e em 100% após 48 horas. Ruptura folicular ocorreu na maioria dos ciclos tratados após 48 horas da inserção. CONCLUSÕES: o uso de um único implante de acetato de nomegestrol inserido na fase pré-ovulatória afetou os picos pré-ovulatórios de estradiol e LH, a produção do muco cervical e a penetração espermática, mas não foi capaz de impedir a ovulação, o que reforça a necessidade da inserção do implante nos 5 primeiros dias do ciclo menstrual.

Implante contraceptivo; Acetato de nomegestrol; Uniplant; Muco cervical; Penetração espermática


OBJECTIVE: to study the effect of a single contraceptive implant of nomegestrol acetate (Uniplant) on the ovarian function, cervical mucus production and sperm penetration, when inserted in women in the preovulatory phase. METHODS: twenty women with regular menstrual cycles were included in an open comparative study. All participants were investigated during one menstrual cycle before (control) and one menstrual cycle after implant insertion. Measurements of estradiol, LH, and progesterone, as well as transvaginal sonography, cervical mucus examination and sperm penetration test, were carried out. Statistical analysis was performed with the paired t-test and the non-parametric test of Wilcoxon. RESULTS: all control cycles were ovulatory and presented normal parameters. Preovulatory estradiol and LH peak decreased significantly from 603.2 ± 78.0 pmo/l and 22.5 ± 6.5 IU/l at pre-insertion to 380.7 ± 51.9 pmol/l and 4.9 ± 1.3 IU/l 48 hours after implant insertion (p < 0.05 and p < 0.01, respectively). Progesterone levels did not vary significantly (control cycle = 49.8 ± 3.3 nmol/l and treated cycle = 43.2 ± 5.2 nmol/l). Cervical mucus and sperm penetration tests were profoundly affected in 10.5% of the users 20 h after implant insertion, in 68.5% after 24 h and in 100% after 48 h. Follicular rupture occurred in the majority of the cycles 48 h after implant insertion. CONCLUSIONS: the use of a single implant of nomegestrol acetate affected estradiol and LH preovulatory peaks and disrupted the process of cervical mucus production and sperm penetration, but it was unable to prevent ovulation when inserted at the preovulatory phase, which reinforces the need to insert the implant during the first five days of the menstrual cycle.

Contraceptive implant; Nomegestrol acetate; Uniplant; Cervical mucus; Sperm penetration


TRABALHOS ORIGINAIS

Efeito da inserção de implante anticoncepcional contendo acetato de nomegestrol sobre a função ovariana, muco cervical e penetração espermática

Effects of a contraceptive implant containing nomegestrol acetate on ovarian function, cervical mucus and sperm penetration

Ione Cristina Barbosa; Elsimar Coutinho; Bruno Matias; Renata Lopes; Antônio Carlos Vieira Lopes

Maternidade Climério de Oliveira, Universidade Federal da Bahia

Endereço para correspondência E ndereço para correspondência Ione C. Barbosa Maternidade Climério de Oliveira Rua do Limoeiro, nº 1 40.055-150 Salvador – BA Tel/Fax. (71) 242-4014

RESUMO

OBJETIVOS: estudar o efeito de um único implante de acetato de nomegestrol (Uniplant) sobre função ovariana, produção do muco cervical e penetração espermática, quando inserido na fase pré-ovulatória.

MÉTODOS: estudo clínico aberto, comparativo, incluindo 20 mulheres com ciclos menstruais regulares que foram estudadas durante um ciclo menstrual antes (controle) e um ciclo menstrual depois da inserção do implante. Dosagens de hormônio luteinizante (LH), estradiol e progesterona, ultra-sonografia vaginal, coleta de muco cervical e teste de penetração espermática foram realizados. Para comparação estatística, foi utilizado o Student t-test para grupos pareados e o teste Wilcoxon não paramétrico. Os valores estão mostrados como médias ± erro padrão.

RESULTADOS: todos os ciclos controles foram ovulatórios com parâmetros normais. Os níveis pré-ovulatórios de estradiol e LH diminuíram significativamente de 603,2 ± 78,0 pmol/l e 22,5 ± 6,5 UI/l na pré-inserção do implante para 380,7 ± 51,9 pmol/l e 4,9 ± 1,3 UI/l 48 horas após a inserção (p < 0,05 e p < 0,01, respectivamente). Os níveis de progesterona mantiveram-se sem variação significativa após a inserção do implante (ciclo controle = 49,8 ± 3,3 nmol/l e ciclo tratado = 43,2 ± 5,2 nmol/l). Muco cervical e penetração espermática foram profundamente afetados em 10,5% das usuárias após 20 horas da inserção do implante, em 68,5% das usuárias após 24 horas e em 100% após 48 horas. Ruptura folicular ocorreu na maioria dos ciclos tratados após 48 horas da inserção.

CONCLUSÕES: o uso de um único implante de acetato de nomegestrol inserido na fase pré-ovulatória afetou os picos pré-ovulatórios de estradiol e LH, a produção do muco cervical e a penetração espermática, mas não foi capaz de impedir a ovulação, o que reforça a necessidade da inserção do implante nos 5 primeiros dias do ciclo menstrual.

Palavras-chave: Implante contraceptivo. Acetato de nomegestrol. Uniplant. Muco cervical. Penetração espermática.

ABSTRACT

OBJECTIVE: to study the effect of a single contraceptive implant of nomegestrol acetate (Uniplant) on the ovarian function, cervical mucus production and sperm penetration, when inserted in women in the preovulatory phase.

METHODS: twenty women with regular menstrual cycles were included in an open comparative study. All participants were investigated during one menstrual cycle before (control) and one menstrual cycle after implant insertion. Measurements of estradiol, LH, and progesterone, as well as transvaginal sonography, cervical mucus examination and sperm penetration test, were carried out. Statistical analysis was performed with the paired t-test and the non-parametric test of Wilcoxon.

RESULTS: all control cycles were ovulatory and presented normal parameters. Preovulatory estradiol and LH peak decreased significantly from 603.2 ± 78.0 pmo/l and 22.5 ± 6.5 IU/l at pre-insertion to 380.7 ± 51.9 pmol/l and 4.9 ± 1.3 IU/l 48 hours after implant insertion (p < 0.05 and p < 0.01, respectively). Progesterone levels did not vary significantly (control cycle = 49.8 ± 3.3 nmol/l and treated cycle = 43.2 ± 5.2 nmol/l). Cervical mucus and sperm penetration tests were profoundly affected in 10.5% of the users 20 h after implant insertion, in 68.5% after 24 h and in 100% after 48 h. Follicular rupture occurred in the majority of the cycles 48 h after implant insertion.

CONCLUSIONS: the use of a single implant of nomegestrol acetate affected estradiol and LH preovulatory peaks and disrupted the process of cervical mucus production and sperm penetration, but it was unable to prevent ovulation when inserted at the preovulatory phase, which reinforces the need to insert the implant during the first five days of the menstrual cycle.

Keywords: Contraceptive implant. Nomegestrol acetate. Uniplant. Cervical mucus. Sperm penetration.

Introdução

O implante subdérmico único de acetato de nomegestrol (Uniplant) libera dose baixa de hormônio e foi demonstrado em vários estudos clínicos como sendo seguro e apresentando mínimos efeitos metabólicos em mulheres saudáveis1. Os mecanismos da sua ação contraceptiva, como a de outros implantes progestínicos, podem ser explicados pela ligação a receptores localizados em diversas células-alvo, distribuídas no eixo hipotalâmico-pituitário-gonadal-trato genital. Implantes progestínicos interferem nos processos requeridos para o encontro de gametas e a fertilização. Deste modo, interferem principalmente com o processo ovulatório, inibindo parcial ou completamente o pico gonadotrófico e modificando a qualidade do muco cervical (MC)2.

Foi demonstrado que a liberação de levonorgestrel por um sistema contraceptivo intra-uterino exerce efeito na função ovariana que consiste em distúrbios do crescimento e da rotura folicular e níveis plasmáticos mais baixos de E2, LH e P3,4. Os autores também constataram que, em mulheres com ciclos menstruais regulares, 61,1% dos ciclos tiveram MC considerado pobre, de acordo com os critérios da Organização Mundial de Saúde5.

Estudos com implante de acetato de nomegestrol6 demonstraram que a produção do MC é afetada durante dois anos consecutivos de uso. Nesses estudos, o implante foi inserido entre o primeiro e o quinto dia do ciclo menstrual e a coleta do MC iniciada no oitavo dia do ciclo menstrual. Era desconhecido o exato momento em que a produção do MC e a penetração de espermatozóides sofrem alterações após a inserção do implante. Um estudo prévio7 demonstrou que o implante de acetato de nomegestrol não teve nenhum efeito sobre a produção do MC nas primeiras 12 horas depois de sua inserção. O objetivo do presente estudo foi verificar, em um número maior de usuárias, o tempo requerido por este implante para exercer seus efeitos sobre a função ovariana, produção de MC e sobre o teste de penetração de espermatozóides, em um momento em que o processo de crescimento folicular e produção do MC já haviam sido iniciados.

Pacientes e Métodos

Mulheres em idade fértil, solicitando método anticoncepcional hormonal, foram convidadas a participar deste estudo, previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Maternidade Climério de Oliveira. Todas as mulheres incluídas no estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Nenhum tipo de conflito de interesse existiu que pudesse comprometer o desenvolvimento e/ou conclusões deste trabalho.

Vinte voluntárias saudáveis, com idade média de 25,3±0,8 anos, média de peso de 55,2±1,8 kg, média da altura de 164,0±2,1 cm, foram incluídas neste estudo. Todas tinham história de ciclos menstruais regulares, com média de 27,9±0,3 dias. Todas tiveram gestações (média de 1,8±0,3 vezes) e tinham parido em média 1,2±0,1 crianças. Não tinham usado contraceptivo hormonal ou DIUs por período mínimo de seis meses antes do início do estudo. Os casais usaram preservativos para contracepção durante os dois ciclos do estudo. Durante o período da coleta do MC, solicitou-se aos casais não manterem relações sexuais, mesmo com o uso de preservativos. Também se solicitou que as mulheres não usassem nenhum inibidor de síntese de prostaglandinas por pelo menos três meses antes do estudo e durante o período do estudo. Todas as pacientes foram avaliadas durante um ciclo antes da inserção do implante e durante o ciclo no qual o implante foi inserido. O implante de acetato de nomegestrol (Uniplant, South-to-South Cooperation in Reproductive Health, Brazil) é um novo contraceptivo de longa duração derivado da 19-norprogesterona.

Os implantes foram manufaturados com tubos de dimetilpolissiloxano fabricados para uso médico (silástico, número de catálogo 602-265, da Dow Corning; Midland, Michigan) e confeccionados com segmentos de tubo medindo 39 milímetros de comprimento total (35 milímetros preenchidos) e 2,4 milímetros de diâmetro. Os tubos de silástico foram preenchidos com 55 mg (±10%) de acetato de nomegestrol cristalino e finamente pulverizado (3,20-oxo-6-metil-17-a-acetoxi-19-norpregna-4,6-dieno; Theramex, França) e selados em ambas as extremidades com adesivo de silástico de padrão médico tipo A. Os implantes foram esterilizados em autoclave. Após anestesia subcutânea com procaína a 2%, realizou-se para cada participante a inserção subcutânea de um único implante na região glútea, conforme descrito previamente8.

Os implantes foram inseridos em todas as voluntárias quando o escore do MC alcançou 8-10, baseados nos seguintes parâmetros: volume, consistência, cristalização, filância e celularidade. Os escores de MC, variando de 0-3 para cada parâmetro foram calculados da seguinte forma: volume: 0 = 0 mL, 1 = 0,1 mL, 2 = 0,2 mL, 3 &gt 0,3 mL; consistência: 0 = espesso/altamente viscoso, 1 = tipo intermediário/viscoso, 2 = moderadamente viscoso, 3 = muco normal para o meio do ciclo (pré-ovulatório); cristalização: 0 = nenhuma cristalização, 1 = cristalização atípica, 2 = cristalização primária e secundária, 3 = cristalização terciária e quaternária; filância: 0 <1 cm, 1 = 1-4 cm, 2 = 5-8 cm, 3 &gt9 cm; celularidade: 0 &gt11 células/HPF (40 x 10), 1 = 6-10, 2 = 1-5, 3 = 0 células. As inserções foram realizadas independentes do dia do ciclo menstrual. Em sete das 20 mulheres as inserções ocorreram quando o escore do MC foi 10, em onze mulheres quando o escore do MC foi 9 e em duas mulheres quando este foi 8. Em uma mulher o implante foi inserido no 10º dia do ciclo. Em quatro mulheres a inserção foi feita no 11º dia, três no 12º dia, nove no 13º dia, duas no 15º dia e em uma, no 16 º dia do ciclo menstrual.

A escolha do dia para a inserção foi baseada somente no escore do MC. As amostras de sangue venoso foram colhidas em dias alternados a partir do 8º dia do ciclo, até que houvesse evidência ultra-sonográfica de um folículo medindo 10,0 mm e o escore do MC fosse maior do que 5; a partir de então, diariamente, até a evidência ultra-sonográfica de ruptura folicular. Em seguida, as amostras foram colhidas em dias alternados, até o próximo sangramento menstrual.

Para a coleta do muco, um tubo fino de polietileno foi adaptado a uma seringa de 10 mL e introduzido no orifício externo nos mesmos dias em que as amostras de sangue venoso foram coletadas. O escore do MC foi determinado de acordo com os critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS)5. O escore máximo para o MC é 15. Um escore superior a 10 é indicativo de MC satisfatório, favorecendo a penetração de espermatozóides, ao passo que um escore menor do que 10 representa MC desfavorável. O MC foi avaliado imediatamente após a coleta. O muco foi colocado em lâmina e deixado secar. Após 2 horas, quatro campos microscópicos (HPF; 40 x 10) foram examinados a fim de se estudar a cristalização e a celularidade. O MC foi coletado 20, 32, 48, 60, 72, 84 e 96 horas após a inserção.

O MC foi colocado em um tubo capilar. Uma extremidade do tubo foi selada com massa de modelar. O MC foi mantido a -20ºC, por período máximo de quatro meses, até o teste de penetração de espermatozóides (TPE) ser analisado. A penetração de espermatozóides no MC foi avaliada de acordo com os critérios da OMS5. Depois que todas as amostras do muco foram descongeladas, foram feitos os TPEs com a mesma amostra previamente analisada, encontrando-se dentro dos limites normais para volume, densidade, morfologia e migração. A extremidade aberta do tubo capilar foi colocada em reservatório contendo a amostra do sêmen, em uma incubadora a gás com temperatura de 37ºC, por uma hora. O escore foi calculado baseado na penetração linear, na densidade da penetração e na motilidade, de acordo com as seguintes definições:

Penetração linear: a profundidade da penetração = a maior distância (em cm) alcançada pelos espermatozóides mais avançados. Densidade da penetração: o número de espermatozóides em áreas selecionadas do tubo capilar (LPF 10 x 10). Motilidade: a motilidade para adiante dos espermatozóides no terço superior do tubo capilar foi analisada como segue: 0 = sem progressão; 1 = 25% dos espermatozóides têm motilidade progressiva; 2 = 25-50% dos espermatozóides têm motilidade progressiva; 3 = >50% dos espermatozóides têm motilidade progressiva.

Escore máximo de 9 representa um excelente teste. O escore mínimo de 0 representa teste negativo. Entre esses valores, escore de 3 representa um teste deficiente, ao passo que 6 representa teste satisfatório (teste de Kramer).

O padrão de crescimento folicular foi avaliado em todas as voluntárias por ultra-sonografia transvaginal, fazendo-se a varredura de ambos os ovários e usando-se a técnica descrita por Osmers9 e Goswamy10. Antes da realização do exame é solicitado que a paciente esvazie a bexiga urinária para eliminar qualquer risco de que uma bexiga distendida possa interferir com a forma da cavidade uterina e a qualidade do exame ultra-sonográfico. A técnica consiste em localizar os ovários por meio de varredura no eixo látero-lateral (transverso), deslocando o transdutor do fundo uterino em direção ao lado do ovário a ser examinado, tentando seguir os prolongamentos dos anexos uterinos aí inseridos, como a trompa, o ligamento útero-ovárico e o mesossalpinge, que aparecem como imagem hipoecóica fina e alongada. Caso o ovário não seja encontrado, deve-se bascular o transdutor no sentido ântero-posterior e vice-versa, de forma delicada, sendo que em algumas pacientes obesas ou com interposição de alças intestinais com gases, pode-se aplicar a compressão anterior do baixo ventre com a mão livre. Se mesmo assim ele não for localizado, a varredura deve passar para o eixo longitudinal, basculando o transdutor da linha mediana para o lado, até encontrar os vasos ilíacos internos, onde habitualmente os ovários estão localizados. Estes encontrados, passamos à fase de varredura completa da gônada, tanto no sentido longitudinal como no transverso, avaliando a sua forma, superfície, contornos, relação com o útero e as estruturas vizinhas, também avaliando a ecotextura do parênquima e achados como folículos, corpo lúteo, cistos e calcificações, devendo detalhá-los e medi-los. O último passo é a medida do volume ovariano, dividindo o visor em duas imagens, sendo uma no maior eixo (longitudinal) e a outra no menor (transverso), coletando-se os diâmetros longitudinais e ântero-posterior no primeiro e o transversal no segundo. O volume é calculado multiplicando estes valores entre si e depois pela constante 0,52 (L x AP x T x 0,52). Para finalizar, deve-se registrar estas imagens e suas respectivas medidas em fotos.

O exame começou no 8º dia do ciclo e foi repetido em dias alternados, até a evidência ultra-sonográfica de um folículo de 10 mm; a partir de então, diariamente até ocorrer evidência ultra-sonográfica de ruptura folicular e, depois disso, em dias alternados até o início do sangramento menstrual seguinte. A espessura e a textura endometriais foram medidas da interface ecogênica proximal à distal na junção entre o endométrio e o miométrio, por calibrador eletrônico interno embutido no equipamento. Somente a seção longitudinal do útero foi usada para a medida da espessura uterina e endometrial. A avaliação da espessura e textura endometrial foi feita de acordo com os estudos prévios11,12. O eco linear central representa a cavidade endometrial, freqüentemente circundada por dois ecos lineares, representando a função mioendometrial. As camadas hipoecogênicas que cercam o eco linear central representam o crescimento endometrial. O crescimento da ecogenicidade, a partir das bordas dos ecos mioendometriais, representam mudanças diferenciais das camadas endometriais.

A progesterona foi dosada por radioimunoensaio usando-se kits comerciais da Diagnostic Products Corporation, Los Angeles, CA, USA. A sensibilidade foi de 0,09 nmol/L e o coeficiente de variação entre ensaios de 6,4%. Os valores normais estavam entre 0,3-89,0 nmol/L. O estradiol foi determinado por radioimunoensaio, usando-se kits comerciais da Diagnostic Products Corporation. A sensibilidade foi de 5,3 pmol/L e o coeficiente de variação entre ensaios, de 5,5%. Os valores normais estavam entre 146,0-1468,0 pmol/L. O LH foi determinado por radioimunoensaio, usando-se kits comerciais da Diagnostic Products Corporation. A sensibilidade foi de 1,21 UI/L e o coeficiente de variação entre ensaios, de 8,3%. Os valores normais estavam entre 15-90 UI/L.

Para comparação estatística, foi utilizado o teste t de Student para grupos pareados e o teste Wilcoxon não paramétrico. Os valores estão mostrados como médias ± erro padrão da média.

Resultados

A média do escore do MC pré-ovulatório para os ciclos controle foi 14,6±0,2. No ciclo tratado, o implante de acetato de nomegestrol foi inserido quando a média do escore do MC foi 10,3±0,1. Vinte horas após a inserção do implante, a média do escore do MC foi de 7,4±0,5, 24 horas após a inserção foi de 6,5±0,3 e após 48 horas a média do escore do MC foi 3,1±0,2 (Tabela 1).

A média da espessura endometrial no ciclo tratado foi de 12,5±0,3 mm. Não se observou nenhuma diferença estatisticamente significante quando os ciclos tratados foram comparados aos ciclos controle.

Para os ciclos controle, a média do escore para o teste de penetração de espermatozóides foi de 7,6±0,3. A média do escore para o teste de penetração do espermatozóide no ciclo tratado, antes da inserção do implante, foi de 6,3±0,5. Vinte horas após a inserção do implante, a média do escore foi de 4,3±0,3, 24 horas após foi de 3,6±0,5 e 48 horas após a inserção do implante, a média do escore para o teste de penetração do espermatozóide foi de 2,1±0,5. Essas diferenças foram estatisticamente significantes quando comparadas à média do escore antes da inserção do implante, assim como à do grupo controle.

Todas as mulheres tiveram ciclos controle ovulatórios, com desenvolvimento, ruptura folicular, produção de MC, teste de penetração de espermatozóides e níveis hormonais dentro dos limites normais. Nos ciclos tratados, das vinte mulheres estudadas, duas ovularam 20 horas após a inserção do implante, quatro mulheres após 24 horas, onze após 48 horas, uma após 72 horas, uma após 84 horas e uma após 96 horas da inserção do implante.

A média dos níveis plasmáticos de estradiol 48 horas antes da ovulação e da inserção do implante foi de 603,2±78,0 pmol/L, diminuindo para 492,6±86,0 em 24 horas e 380,7±51,9 em 48 horas após a inserção do implante. A média do pico máximo de estradiol plasmático, no ciclo controle, foi de 986,5±87,3 pmol/L. Esta diferença foi estatisticamente significativa (p=0,0025) quando comparada ao ciclo em que o implante foi inserido (Tabelas 2 e 3).

A média dos níveis do LH plasmático 48 horas antes da ovulação e pré-inserção do implante foi 22,5±6,5 UI/L, diminuindo para 7,6±1,3 em 24 horas e 4,9±1,3 em 48 horas após a inserção. No ciclo controle, a média do pico pré-ovulatório de LH foi 38,2±4,3 UI/L. Esta diferença foi estatisticamente significativa (p=0,0045), comparada ao ciclo em que o implante foi inserido (Tabela 3).

Não se observou diferença significativa (p=0,055) nos níveis plasmáticos de progesterona quando comparados aos níveis do ciclo controle. Os níveis de progesterona foram mais baixos do que os controles, mas esta diferença não foi estatisticamente significante. No ciclo tratado, a média dos níveis plasmáticos de progesterona foi 43,2±5,2, ao passo que no ciclo controle foi 49,8±3,3 nmol/L (Tabela 2).

Não se observou diferença estatisticamente significante na média dos níveis do pico luteal de estradiol, comparados aos do ciclo controle (Tabela 2).

A média do diâmetro folicular, 48 horas antes da ovulação e da inserção do implante, foi 19,0±0,2. Vinte e quatro horas após a inserção do implante, a média do diâmetro folicular foi 18,7±0,5, e 48 horas após a inserção do implante e pré-ovulação, a média do diâmetro folicular foi 18,6±0,7 mm (Tabela 3).

Discussão

O acetato de nomegestrol é um derivado da 19-norprogesterona, com potente atividade progestacional e nenhum efeito androgênico8. A liberação através da membrana de silástico é muito estável em toda a duração de seu uso13. Neste estudo, 55 mg de acetato de nomegestrol foram usados em uma cápsula única de silástico.

A secreção do MC humano tem importante papel no transporte, sobrevivência e capacitação dos espermatozóides. O MC muda suas características durante todo o ciclo menstrual,seguindo as mudanças cíclicas nos níveis de estradiol e progesterona. No momento da ovulação, o produto secretado torna-se abundante, aquoso e viscoso, e o componente mucinoso é formado como longas fibrilas14-16. Fator comum aos progestagênios é a sua capacidade de tornar o MC viscoso, escasso e impenetrável aos espermatozóides2. Estudos prévios demonstraram que o implante contendo acetato de nomegestrol tem efeito potente na produção do MC nas mulheres, durante período de 24 meses de uso6. Esses achados estão de acordo com estudos anteriores com implantes de levonorgestrel (Norplantâ) e com o sistema intra-uterino de liberação de levonorgestrel (Mirenaâ)6,17-19. O potente efeito sobre o muco cervical observado nesse estudo comunga com relatos anteriores de estudos realizados com outros progestínicos de ação prolongada20-22. Esse efeito foi também descrito em usuárias de implante que libera etonogestrel (Implanonâ)23,24. Esta ação sob o muco cervical é, portanto, um efeito adicional que contribui para a eficácia dos contraceptivos contendo apenas progestagênio.

O presente estudo confirma que, quando inserido na fase folicular periovulatória, o implante de acetato de nomegestrol pode afetar os picos pré-ovulatórios de LH e estradiol, em todas as mulheres estudadas, não sendo, porém, capaz de inibir a ovulação. Por outro lado, há registro na literatura de que óvulos coletados após picos de LH de magnitude reduzida apresentam menor capacidade de fertilização in vitro25. Os níveis de progesterona foram mais baixos que os do ciclo controle, mas essas diferenças não foram estatisticamente significantes.

Discretas alterações no crescimento folicular foram observadas em 12 das 20 mulheres estudadas. Essas alterações consistiram em apenas uma ligeira diminuição no volume folicular. Dezenove dos 20 ciclos foram ovulatórios, de acordo com a ultra-sonografia e os níveis plasmáticos de progesterona. O implante de acetato de nomegestrol afetou a produção do MC e a penetração do espermatozóide 20 horas após a inserção do implante em 10,5% e após 24 horas em 68,5% dos ciclos estudados. Quarenta e oito horas após a inserção, Uniplant afetou a produção do MC e o teste de penetração de espermatozóides em 100% dos ciclos estudados. Esses resultados estão de acordo com os achados em um estudo previamente publicado7.

Baseado nos resultados destes estudos e seguindo as orientações da OMS e FEBRASGO, deve-se orientar as usuárias de todos esses métodos citados acima para utilizarem métodos contraceptivos de barreira, por período de no mínimo vinte e um dias, caso o uso desses progestínicos de longa duração seja iniciado após o quinto dia do ciclo menstrual.

Este estudo demonstrou e confirmou que o implante de acetato de nomegestrol (Uniplant) pode interromper o processo de produção do MC e afetar a penetração de espermatozóides, assim como afetar os picos pré-ovulatórios de LH e de estradiol, mas ele é incapaz de prevenir a ovulação quando inserido na fase periovulatória, o que reforça a necessidade da inserção do implante nos 5 primeiros dias do ciclo menstrual.

Este estudo foi financiado pela Fundação Rockefeller, dentro do programa South-to-South.

Recebido em: 30/5/2003

Aceito com modificações em: 28/5/2004

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Set 2004
    • Data do Fascículo
      Jul 2004

    Histórico

    • Recebido
      30 Maio 2003
    • Aceito
      28 Maio 2004
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