Acessibilidade / Reportar erro

A linguagem e os processos de enunciação e significação na alfabetização

Language and Enunciation and Meaning Processes in Literacy

Resumo

Este artigo, em formato de relato de pesquisa de base teórico-conceitual, objetiva discutir as relações entre a filosofia da linguagem de base marxista adotada pelo Círculo de Bakhtin e os princípios bakhtinianos sobre atividade humana, linguagem e os processos de enunciação; bem como identificar as contribuições deste diálogo para as práticas de ensino na alfabetização. Tais relações destacam a natureza social e ideológica dos signos linguísticos e a interação dialógica como realidade da linguagem. Disto se depreende a necessidade de práticas alfabetizadoras em contextos interdiscursivos que apostem em modos autorais de ensinar e de aprender, a partir de estratégias didáticas contextuais e diversificadas. Conclui-se que, no campo da alfabetização, faz-se necessário um posicionamento filosófico, político e ético que garanta uma unidade de princípios e não uma uniformidade de propostas, que possibilite a inclusão para a equidade social.

Palavras-chave:
linguagem; escrita; discurso; alfabetização

Abstract

This article, in a theoretical-conceptual research report format, aims to discuss the relationship between the Marxist-based philosophy of language adopted by the Bakhtin Circle and the Bakhtinian principles on human activity, language, and the enunciation processes; and to identify the contributions of this dialogue to teaching practices in literacy. Such relationships highlight the social and ideological nature of linguistic signs and dialogical interaction as a reality of language. This shows the need for literacy practices in interdiscursive contexts betting on genuine ways of teaching and learning, from contextual and diverse didactic strategies. It concludes that, in the field of literacy, having a philosophical, political, and ethical position that guarantees a unity of principles and not a uniformity of proposals, which enables inclusion for social equity, is necessary.

Keywords:
language; writing; speech; literacy

1 Introdução

A pesquisa que originou este artigo foi motivada pela emergente necessidade de marcar o que representa o trabalho com linguagem nas escolas brasileiras, considerando as diversidades de modos de produção e de sentidos construídos como percursos identitários e, portanto, únicos e incomparáveis.

Tal urgência está atrelada à análise conjectural das mudanças que têm sido impostas à escola e à formação de professores ao se mudar o perfil político da gestão pública. No contexto atual da Educação no Brasil, podem ser citadas como exemplos a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2018BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília, DF: MEC/SEB, 2018. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf . Acesso em: 2 maio 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/imag...
), a Política Nacional de Alfabetização (BRASIL, 2019aBRASIL. Decreto nº 9765, de 11 de abril de 2019. Institui a Política Nacional de Alfabetização. Brasília: MEC, 2019a. Disponível em: Disponível em: https://legis.senado.leg.br/norma/30902116/publicacao/30905492 . Acesso em: 2 maio 2020.
https://legis.senado.leg.br/norma/309021...
) e a recente Base Nacional Comum de Formação Inicial de Professores da Educação Básica. (BRASIL, 2019bBRASIL. Resolução nº 2, de 20 de dezembro de 2019. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação). Brasília, DF: CNE, 2019b. Disponível em: Disponível em: http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro-2019-pdf/135951-rcp002-19/file . Acesso em: 2 maio 2020.
http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro...
) Tais documentos apregoam o respaldo em “teorias cientificamente comprovadas”, tidas como verdades absolutas e passíveis de generalização para que se tenha modelos de estudantes, bem como modelos de professores a serem imitados.

Contudo, este artigo busca sinalizar que as práticas pedagógicas não podem mais ser construídas em princípios unificados e excludentes, que negam outros caminhos formativos por rejeitar ou desconhecer a produção científica e contemporânea acumulada no campo das ciências humanas, pelo risco de que as desigualdades sociais se ampliem ainda mais.

É a partir deste contexto que nos aproximamos de teorias da linguagem de base filosófica marxista, inspiradas aqui por Bakhtin (2019BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019.) e Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.). Olhar para a concretude das práticas de ensino em linguagem e para os caminhos de aprendizagem é consequência de um processo de abstração e sensibilidade que é a condição para uma educação inclusiva. Desta forma, as ciências cognitivas, linguísticas ou pedagógicas podem encontrar na filosofia da linguagem um acesso para os sujeitos da aprendizagem, para além do aluno que a escola sonha em formar.

Trata-se de uma escolha que se justifica no compromisso de integração social dos sujeitos, com o propósito de conferir legitimidade às tantas identidades agregadas nos espaços escolares. Para alimentar esta discussão, são necessárias referências que se aproximem tanto dos aspectos individuais da linguagem quanto de seus aspectos interindividuais, sem prejuízo para os fatos sociais que a constituem em atos discursivos, pragmáticos e complexos. O ponto de vista filosófico representa, portanto, uma possibilidade de trânsito entre várias áreas de estudo - postura que se faz necessária quando pensamos nos desafios educacionais contemporâneos.

Assumindo esta perspectiva dialógica, este artigo, em formato de relato de pesquisa de base teórico-conceitual, tem como objetivo apresentar uma discussão sobre as relações entre a filosofia da linguagem de base marxista adotada pelo Círculo de Bakhtin e os princípios bakhtinianos sobre atividade humana, linguagem e os processos de enunciação. Como consequência deste debate, busca-se, ainda, identificar as contribuições deste diálogo para as práticas escolares com a linguagem na alfabetização.

Buscando a interlocução entre o sujeito social e o trabalho escolar com a linguagem na alfabetização, este texto se organiza em duas seções, além da introdução e das considerações finais. A primeira parte é referente ao diálogo entre as obras Os gêneros do discurso (BAKHTIN, 2019BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019.) e Marxismo e filosofia da linguagem (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.), no qual se destacam os principais pontos de apoio para os estudos que envolvem a linguagem nos processos educacionais formais. A segunda parte intenta responder à demanda específica dos estudos sobre os processos de alfabetização, letramento e formação de leitores e escritores, sendo este o objeto de pesquisa desenvolvida pelas autoras.

2 O diálogo entre o Círculo de Bakhtin e as teorias da linguagem de base filosófica marxista

Em suas teorias sobre a linguagem, o Círculo de Bakhtin buscou uma fundamentação em abordagens filosóficas da linguagem e das artes, contrariamente ao formalismo russo, que se afastou de questões filosóficas para fundamentar sua orientação em teorias linguísticas de caráter estrutural e formalista. Segundo Grillo (2018GRILLO, S. Marxismo e filosofia da linguagem: uma resposta à ciência da linguagem do século XIX e início do XX. Ensaio introdutório. In: VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018. p. 7-79.), tal orientação se justifica na medida em que as discussões filosóficas permitem uma compreensão mais ampla e consistente dos fundamentos da natureza e, consequentemente, dos objetivos da análise da linguagem.

Tihanov (2002 apud GRILLO, 2018GRILLO, S. Marxismo e filosofia da linguagem: uma resposta à ciência da linguagem do século XIX e início do XX. Ensaio introdutório. In: VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018. p. 7-79.) já tinha observado que as premissas filosóficas dos trabalhos de Volóchinov e Bakhtin a respeito da linguagem e da cultura são fundamentais para compreender a polêmica com os formalistas: “O verdadeiro pomo da discórdia foi a natureza da linguagem como fenômeno social”. (TIHANOV, 2002, p. 97 apud GRILLO, 2018GRILLO, S. Marxismo e filosofia da linguagem: uma resposta à ciência da linguagem do século XIX e início do XX. Ensaio introdutório. In: VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018. p. 7-79., p. 15)

A perspectiva formalista assume a linguagem enquanto forma simbólica autônoma. Cassirer, uma das referências de Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) na obra Marxismo e filosofia da linguagem, critica a teoria ingênua do conhecimento como puro reflexo do mundo para assumir que o conhecimento tem a propriedade fundamental de formação e não somente de reprodução do real; isto é, em vez de se limitar a exprimir passivamente a pura presença dos fenômenos, o conhecimento confere uma significação a eles. Em outros termos, a linguagem atribui sentido ao mundo e, deste modo, os signos linguísticos representam ideias sobre as coisas e os processos objetivos, e nestes conceitos “necessariamente há de se refletir não tanto a natureza das coisas quanto o tipo e a direção individuais da concepção das coisas”. (CASSIRER, 2001, p. 115 apud GRILLO, 2018GRILLO, S. Marxismo e filosofia da linguagem: uma resposta à ciência da linguagem do século XIX e início do XX. Ensaio introdutório. In: VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018. p. 7-79., p. 17)

Contudo, na perspectiva de linguagem de base filosófica marxista adotada pelo Círculo de Bakhtin, a concepção das coisas não é apenas individual, mas dialogicamente coletiva. Todo signo surge entre indivíduos socialmente organizados no processo de sua interação. Portanto, “as formas dos signos são condicionadas, antes de tudo, tanto pela organização social desses indivíduos quanto pelas condições mais próximas de interação”. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 109)

Quanto à natureza do signo, ele “não é somente uma parte da realidade, mas também reflete e refrata uma outra realidade, sendo por isso mesmo capaz de distorcê-la, ser-lhe fiel, percebê-la de um ponto de vista específico e assim por diante” (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 93). Nesse sentido, “onde há signo há também ideologia. Tudo o que é ideológico possui significação sígnica”. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 93) Em outras palavras, todo signo é ideológico e “constitui não apenas um reflexo, uma sombra da realidade, mas também parte material dessa mesma realidade”. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 94)

Por esse ângulo, Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) assinala que a realidade do signo é bastante objetiva, de modo que este constitui um fenômeno do mundo externo. Tanto o próprio signo quanto todos os efeitos por ele produzidos, ou seja, aquelas reações, aqueles movimentos e aqueles novos signos que ele gera no meio social circundante ocorrem na experiência externa.

Tal perspectiva filosófica marxista opõe-se à filosofia idealista da cultura e aos estudos culturais psicológicos, que situam a ideologia na consciência. Segundo Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.), o que essas correntes ignoram é que a própria compreensão somente pode ser realizada em algum material sígnico (no discurso interior). O autor explica que:

A compreensão de um signo ocorre na relação deste com outros signos já conhecidos; em outras palavras, a compreensão responde ao signo e o faz também com signos. Essa cadeia de criação e da compreensão ideológica, que vai de um signo a outro e depois para um novo signo, é única e ininterrupta: sempre passamos de um elo sígnico e, portanto, material, a outro elo também sígnico. Essa cadeia nunca rompe nem assume uma existência interna imaterial e não encarnada no signo. Essa cadeia ideológica se estende entre as consciências individuais, unindo-as, pois o signo surge apenas no processo de interação entre consciências individuais. A própria consciência individual está repleta de signos. Uma consciência só passa a existir como tal na medida em que é preenchida pelo conteúdo ideológico, isto é, pelos signos, portanto apenas no processo da interação social. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 95)

Desse modo, a própria consciência individual é um fato social e ideológico. A consciência se forma e se realiza no material sígnico criado no processo da comunicação social de uma coletividade organizada. Disso se conclui que:

1) Não se pode isolar a ideologia da realidade material do signo (ao inseri-la na ‘consciência’ ou em outros campos instáveis e imprecisos). 2) Não se pode isolar o signo das formas concretas da comunicação social (pois o signo é uma parte da comunicação social organizada e não existe, como tal, fora dela, pois se tornaria um simples objeto físico. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 110)

O autor complementa que a consciência, enquanto permanece na cabeça daquele que pensa, como um embrião verbal da expressão, é apenas uma parte muito pequena da existência, com um campo de ação reduzido. No entanto, quando ela realiza o percurso da objetivação social e entra no campo do ato discursivo, ela se torna uma força verdadeira, haja vista que a força da consciência está na sua encarnação em determinadas situações e contextos comunicativos reais.

Na atividade linguística, tanto locutor quanto interlocutor estão imersos no ato discursivo, de modo que “a interação discursiva é a realidade fundamental da linguagem”. (GRILLO, 2018GRILLO, S. Marxismo e filosofia da linguagem: uma resposta à ciência da linguagem do século XIX e início do XX. Ensaio introdutório. In: VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018. p. 7-79., p. 53) Em Marxismo e filosofia da linguagem, Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) propõe que a construção do sentido decorre do diálogo entre locutor e interlocutor, em que ambos desempenham um papel ativo. Para o autor, a significação “se realiza apenas no processo de uma compreensão ativa e responsiva. A significação não está na palavra, nem na alma do falante, nem na alma do ouvinte. A significação é um efeito da interação entre o falante e o ouvinte no material de um dado conjunto sonoro” (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 232-233). Portanto, apenas a corrente da comunicação discursiva atribui à palavra a luz da sua significação.

Isto posto, faz-se necessário ratificar que esse trabalho constante de criação de sentidos na linguagem é um processo regulado por leis socioculturais, na esfera da comunicação social organizada. Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) explica que:

Para observar o fenômeno da língua, é necessário colocar os sujeitos falante e ouvinte, bem como o próprio som, no ambiente social. É preciso que tanto o falante quanto o ouvinte pertençam a uma mesma coletividade linguística, a uma sociedade organizada de modo específico. É fundamental ainda que os nossos dois indivíduos sejam abarcados pela unidade da situação social mais próxima, isto é, que o encontro entre essas duas pessoas ocorra em um terreno determinado. O intercâmbio verbal só é possível nesse terreno determinado, por mais geral e, por assim dizer, ocasional que ele seja. (p. 145)

Desse modo, assume-se que a realidade da língua está na interação discursiva e nos enunciados concretos que resultam dela. Nos termos da filosofia marxista de Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.), “a língua é um processo ininterrupto de formação, realizado por meio da interação sociodiscursiva dos falantes” (p. 24). O autor alega ainda que “a língua como um sistema estável de formas normativas idênticas é somente uma abstração científica, produtiva apenas diante de determinados objetivos práticos e teóricos. Essa abstração não é adequada à realidade concreta da língua”. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 224)

A realidade efetiva da linguagem, nesta perspectiva, não é o sistema abstrato de formas linguísticas, tampouco o ato psicofisiológico de sua realização, mas o acontecimento social da interação discursiva que ocorre por meio de um ou de vários enunciados. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) Disto decorre que o enunciado é a unidade real da comunicação viva e real.

Bakhtin (2019BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019.) complementa que cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais o autor denomina gêneros discursivos. Para o autor,

A riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas porque são inesgotáveis as possibilidades da multifacetada atividade humana e porque em cada campo dessa atividade vem sendo elaborado todo um repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à medida que tal campo se desenvolve e ganha complexidade. (BAKHTIN, 2019BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019., p. 12)

O autor ainda complementa que os limites de cada enunciado concreto como unidade da comunicação discursiva são definidos pela alternância dos sujeitos do discurso. Todo enunciado tem, por assim dizer, um princípio absoluto e um fim absoluto:

Antes do seu início, os enunciados dos outros; depois do seu término, os enunciados responsivos de outros (ou ao menos uma compreensão ativamente responsiva silenciosa do outro ou, por último, uma ação responsiva baseada nessa compreensão). O falante termina o seu enunciado para passar a palavra ao outro ou dar lugar à sua compreensão ativamente responsiva. (BAKHTIN, 2019BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019., p. 29)

Assim, o enunciado não é uma unidade convencional, mas uma unidade real, delimitada com precisão pela alternância dos sujeitos do discurso. Não obstante, “justamente para estudar as formas dessa unidade real, não se pode isolá-la do fluxo histórico dos enunciados”. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 221)

Cabe ainda salientar que a língua não se constitui como um sistema abstrato de formas normativas e idênticas nem mesmo enquanto estado de consciência linguística subjetiva do falante. Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) afirma que:

A consciência linguística do falante e daquele que escuta e compreende não lida na prática ou na fala viva com um sistema abstrato de formas linguísticas normativas e idênticas, mas com a linguagem no sentido do conjunto de diferentes contextos possíveis em que essa forma linguística pode ser usada. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 180)

Ou seja, para o falante da língua, a palavra se posiciona não como um vocábulo tal como consta num dicionário, mas como uma palavra presente nos mais variados enunciados. O sentido da palavra é inteiramente determinado pelo seu contexto.

Para Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.), a forma da língua realiza a sua significação normativa apenas nos momentos mais raros de conflito, especialmente no caso da língua escrita. O autor acrescenta ainda que a forma linguística, bem como seu critério de correção, é dada ao falante apenas no contexto de certos enunciados e, portanto, apenas em um determinado contexto ideológico (por exemplo, no ensino da língua).

Num ato discursivo real, o objetivo do falante (ou escritor) é direcionado a um enunciado concreto produzido por ele. Como explica Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.):

Para o falante não se trata da aplicação de uma forma normativa idêntica em um contexto concreto. O centro da gravidade para ele não se encontra na identidade da forma, mas naquela significação nova e concreta que ela adquire nesse contexto. Para um falante, não importa o aspecto da forma, que permanece o mesmo em todos os casos do seu uso por mais variados que eles sejam. O que importa para o falante é aquele aspecto da forma linguística graças ao qual ela pode aparecer em um contexto concreto, graças ao qual ela se torna um sinal adequado nas condições de uma situação concreta. (p. 177)

Portanto, para um falante (e para o escritor), a forma linguística é importante não como um sinal constante e invariável, mas como um signo sempre mutável e flexível. No entanto, Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) adverte que o falante deve levar em consideração o ponto de vista daquele que escuta e compreende, e sinaliza que “a tarefa de compreensão não se reduz ao reconhecimento da forma usada, mas à sua compreensão em um contexto concreto, à compreensão da sua significação em um enunciado, ou seja, à compreensão da sua novidade e não ao reconhecimento da sua identidade” (p. 177-178).

Assim sendo, de modo algum o processo de compreensão deve ser confundido com o processo de reconhecimento. Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) explica que são processos profundamente diferentes:

Apenas um signo pode ser compreendido, já o sinal é reconhecido. O sinal é um objeto internamente imóvel e unitário que, na verdade, não substitui, reflete ou refrata nada, mas é simplesmente um meio técnico através do qual se aponta para um objeto (definido e imóvel) ou para alguma ação (também definida e imóvel!) O sinal jamais deve ser relacionado à área do ideológico; ele é parte do universo dos objetos técnicos e dos instrumentos de produção no sentido amplo dessa palavra. (p. 178)

Desta maneira, no ponto de vista da filosofia marxista de linguagem adotada pelo Círculo de Bakhtin, uma forma linguística não será compreendida como tal enquanto for apenas um sinal para aquele que a compreende. Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) afirma que um sinal puro não existe nem nas fases iniciais da aprendizagem de uma língua. Mesmo nesse caso, a forma é orientada pelo contexto e se constitui em um signo, embora estejam presentes sua natureza de sinal e o momento do seu reconhecimento. O autor explica que:

Na língua materna, o sinal e o reconhecimento são eliminados dialeticamente, ou seja, isso ocorre precisamente na consciência linguística do membro de uma dada coletividade linguística. No processo de assimilação de uma língua estrangeira, o momento do sinal e o reconhecimento são percebidos, porém ainda não estão superados, pois a língua ainda não se tornou completamente ela mesma. O ideal da assimilação da língua é a incorporação do sinal pelo signo puro e do reconhecimento pela compreensão pura. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 180)

Compreender um enunciado alheio significa orientar-se em relação a ele, encontrar para ele um lugar devido no contexto correspondente. Toda verdadeira compreensão é ativa e possui um embrião de resposta. Conforme afirma Bakhtin (2019BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019.),

Toda compreensão é ativamente responsiva e não é senão uma fase inicial preparatória da resposta (seja qual for a forma em que ela se dê). O próprio falante está determinado precisamente a essa compreensão ativamente responsiva: ele não espera uma compreensão passiva, por assim dizer, que apenas duble o seu pensamento em voz alheia, mas uma resposta, uma concordância, uma participação, uma objeção, uma execução, etc. […] Ademais, todo falante é por si mesmo um respondente em maior ou menor grau: porque ele não é o primeiro falante, o primeiro a ter violado o eterno silêncio do universo […]. (p. 26)

Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 184) complementa: “todo enunciado, mesmo que seja escrito e finalizado, responde a algo e orienta-se para uma resposta. Ele é apenas um elo na cadeia ininterrupta de discursos verbais”.

Deste modo, efetivamente o enunciado se forma entre dois ou mais indivíduos socialmente organizados, e, “na ausência do interlocutor real, ele é ocupado, por assim dizer, pela imagem do representante médio daquele grupo social ao qual o falante pertence”. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 204) A palavra é endereçada para o interlocutor, ou seja, é orientada para quem é esse interlocutor:

Se ele é integrante ou não do mesmo grupo social, se ele se encontra em uma posição superior ou inferior em relação ao interlocutor (em termos hierárquicos), se ele tem ou não laços sociais mais estreitos com o falante. Não pode haver um interlocutor abstrato, por assim dizer, isolado; pois com ele não teríamos uma língua comum nem no sentido literal, tampouco figurado. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 204-205)

Pode-se concluir com isto que o Círculo de Bakhtin considera um aspecto relevante a orientação da palavra para o interlocutor. Em sua essência, a palavra é um ato bilateral. Ela é determinada tanto por aquele de quem procede quanto por aquele para quem se dirige. Assim, na perspectiva da filosofia marxista da linguagem, a palavra constitui-se enquanto enunciado, produto das inter-relações do falante (ou escritor) com o ouvinte (ou leitor), sendo a interação discursiva a realidade fundamental da língua.

Assim, a discussão teórica empreendida no limite desta seção somente se justifica se contribuir para repensar as práticas escolares com a linguagem na alfabetização. É disto que trata a próxima seção.

3 Sujeitos, sentidos e discursos: conceitos anteriores às práticas de ensino na alfabetização

Ao se assumir qualquer escolha didático-pedagógica para o trabalho com a alfabetização, subjacentes à noção metodológica estão bases conceituais que imprimem os sentidos atribuídos por cada professor à sua prática. Trata-se aqui de conceitos de linguagem, de sujeito, de ideologia e de experiência escolar, compreendidos numa dinâmica que os articula e os define sempre de forma inter-relacionada.

A linguagem, entendida como sistema de natureza simbólica, envolve processos de significação e de dialogismo que não podem ser reduzidos aos processos escolares, pois envolvem experiências ao mesmo tempo individuais e sociais, portanto, psicossociais. É desta maneira que nos aproximamos do que Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 145) chama de “alma”, de “lei interna” que possa configurar efetivamente um fenômeno linguístico: “a comunicação interna organizada”.

Como uma esfera da realidade, esta comunicação é apontada pelo autor como condição para a linguagem:

[…] a unidade do meio social e do acontecimento da comunicação social mais próximo são duas condições totalmente necessárias para que o conjunto físico-psicológico apontado por nós possa ter uma relação com a língua, com o discurso, possa tornar-se um fato da língua-discurso (linguagem). (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 145, grifos do autor)

O propósito destacado pelo autor contribui diretamente para pensarmos teorias que hoje têm voltado às discussões curriculares, privilegiando apenas uma “esfera da realidade” no tratamento da língua, o “processo fisiológico de produção do som e o processo de sua percepção sonora” (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 144), que tem motivado o movimento retrógrado para os métodos fônicos e para a definição de habilidades como conteúdos a serem alcançados para domínio efetivo da língua.

Entretanto, de acordo com Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.), quando se assume apenas uma esfera da realidade, seja a física, a fisiológica ou a psicológica, não há língua presente, pois falta o elemento que traz o sujeito como pertencente a uma “coletividade linguística”, conforme definida pelo autor. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 145) Há, entretanto, processos fundamentais considerados pela filosofia da linguagem de base marxista adotada pelo Círculo de Bakhtin que marcam o movimento imbricado do que se produz através de discursos internos e individuais e aqueles que se produzem na ordem da coletividade. São eles: a significação, a enunciação e a discursividade - discutidos na primeira seção deste artigo.

A significação e a dimensão linguística de um objeto se constituem a partir de processos dialógicos vividos pelos sujeitos. Não se trata de um ponto de chegada, de um marco conceitual ou de uma lista de habilidades que possam ser aferidas apenas do ponto de vista quantitativo. Trata-se da construção de processos que são ao mesmo tempo cognitivos, físicos e sociais - suficientemente complexos e, portanto, de ordem filosófica - que se explicam na lógica de processos exatamente porque são plurais.

Quando transportamos esta reflexão para as práticas de ensino na alfabetização e na formação de leitores e escritores, compreendemos por que a noção de método é reducionista e não corresponde às demandas do letramento escolar. A noção de método centraliza e controla a ação docente a partir de uma lógica definida a priori, com base em generalizações de comportamentos de quem aprende e de quem ensina, com bem pouco investimento nos processos constitutivos de produção de linguagem.

Conforme assinalam Machado e Lopes (2019MACHADO, M.L.C.A.; LOPES, P.S.V.C. Problematização sobre a abordagem da consciência fonológica na alfabetização. In: LINO, C. de S. et al. (Org.) FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona Editora, 2019, p. 137-154.) a discussão em torno da eleição de métodos unificados de alfabetização só cabe quando há a concepção de que as pessoas aprendem do mesmo modo. Nesse ponto de vista, as formas individuais de interação com a linguagem e com a cultura escrita não fazem diferença porque o protagonismo não é do sujeito que aprende, mas sim do método em escolha.

Isso implica afirmar que os métodos tradicionais de alfabetização determinam instruções programadas para itinerários formativos de sujeitos idealizados que deverão ser capazes de desenvolver, no tempo e no modo predeterminado para a alfabetização, habilidades comportamentais como reconhecer, escrever, observar, distinguir, nomear, segmentar, comparar, identificar, agrupar, copiar, recitar, entre outras recorrentes na lista de habilidades descritas para o 1º ano do Ensino Fundamental pela BNCC. (BRASIL, 2018BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília, DF: MEC/SEB, 2018. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf . Acesso em: 2 maio 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/imag...
)

Diferentemente, se não há a proposição de um método unificado de ensino, mas modos diferenciados de alfabetizar, sempre planejados contextualmente para atender à demanda real dos alunos, é possível compreender que os processos discursivos constituídos em sala de aula implicam o conhecimento, a sensibilidade, a compreensão da complexidade e das incontáveis possibilidades de articulações feitas pelos alunos, que podem se tornar viáveis e visíveis nos espaços de elaboração - de (trans)formação, de criação do novo -, nas relações de ensino e de aprendizagem. Nesta perspectiva, o foco, então, está nos modos de proceder - em como organizar, propor, orientar, escutar, interpretar, sistematizar, mostrar, compartilhar etc. - ou seja, nos modos de significar as formas singulares de produção de linguagem com e pelos alunos no coletivo de trabalho.

É nesse sentido que se resgata a importância do planejamento e da organização didática do trabalho em torno dos processos educacionais de alfabetização. No entanto, as decisões metodológicas relacionadas ao processo de alfabetização extrapolam a mera escolha de métodos e envolvem um conjunto de posturas, ações e procedimentos embasados teoricamente por uma concepção de sujeito, de aprendizagem, de linguagem e de alfabetização.

A formação de leitores e escritores, com o objetivo de inclusão para a equidade social, pressupõe a autoria e a autonomia de quem ensina e de quem aprende. Portanto, a possibilidade de realizar escolhas didáticas legitima a profissão docente e agrega sentidos às experiências formativas e à noção de diversidade de modos de ensinar e de aprender, conforme salientam Machado e Lopes (2019MACHADO, M.L.C.A.; LOPES, P.S.V.C. Problematização sobre a abordagem da consciência fonológica na alfabetização. In: LINO, C. de S. et al. (Org.) FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona Editora, 2019, p. 137-154.).

Os procedimentos de ensino e de aprendizagem são, desta maneira, pautados, organizados e sistematizados em princípios pedagógicos para os processos de alfabetização construídos por cada sujeito. Assim, as aprendizagens essenciais poderiam ser apresentadas numa política pública curricular através de ações que motivem comportamentos intelectuais e experiências pessoais - sempre construídos a partir da interação sociodiscursiva -, como criar, elaborar, conceituar, propor, discutir, refletir, questionar, construir, argumentar, escolher, criticar, averiguar, pesquisar, levantar hipóteses e produzir, entre outras.

Deste modo, a alfabetização pode, por exemplo, assumir como um de seus princípios a construção de conceitos em consciência linguística - entre elas a consciência fonológica -, porém pautados em contextos de letramento,1 1 O conceito de letramento assumido neste artigo é definido por Senna como “um projeto de socialização desenvolvido pela escola por meio de um processo que promova o desenvolvimento dos sujeitos, a partir de diferentes fenômenos associados a pontos de vista teórico-científicos os mais diversos”. Tal processo, segundo o autor, “interfere em múltiplas esferas da cognição, desde a representação e orientação global psicomotora, incluindo as representações lógico-causais e essenciais, até as representações socioafetivas de um sujeito que se abre a distintas esferas de socialização”. (SENNA, 2019, p. 186) de maneira que se possa garantir seu caráter interdiscursivo.

Trabalhar a consciência fonológica, ou qualquer outra consciência linguística, como competência que se constitui enquanto conteúdo curricular da alfabetização, não significa treinar e sim criar, elaborar atitudes cognitivas, sociais, culturais e afetivas que permitam uma interação cada vez mais aprofundada com o objeto de conhecimento, neste caso, a língua escrita. Smolka (1999SMOLKA, A. L. B. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização como processo discursivo. São Paulo: Cortez ; Campinas: Editora da Unicamp, 1999.) sinaliza que quando os alunos começam a escrever o que pensam, o que querem dizer, contar, narrar, eles escrevem fragmentos do discurso interior, porque encontram um sentido para escrever e, ao escreverem, vão enfrentando o desafio da representação fonológica e ortográfica de nossa língua. Desse modo, o aluno “não meramente ‘grava’ fonemas e grafemas, não meramente copia ou repete, mas processa, elabora esse conhecimento dinamicamente, discursivamente”. (SMOLKA, 1999SMOLKA, A. L. B. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização como processo discursivo. São Paulo: Cortez ; Campinas: Editora da Unicamp, 1999., p. 84) Corais (2019CORAIS, M. C. Interações discursivas na alfabetização e apropriação do sistema de escrita. In: LINO, C. S. et al. (Org.). FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona , 2019. p. 155-171.) complementa que como a força do discurso é o que impulsiona os alunos, eles não temem se arriscar, tornam-se curiosos, sentem-se capazes de fazê-lo.

Tal perspectiva implica assumir que a alfabetização só pode ser concebida em episódios dialógicos, em situações reais de comunicação, nas quais a unidade de ensino é o enunciado - que se materializa em diferentes textos orais e escritos -, em detrimento de qualquer abordagem metalinguística descontextualizada e mecanicista. Trata-se de propiciar aos alunos farta experienciação linguística: diferentes gêneros discursivos, diferentes pontos de vista, diferentes histórias, diferentes posicionamentos, diferentes formas de agir com/sobre a língua. E nesse agir com/sobre a língua, as análises metalinguísticas das menores unidades (fonemas/grafemas, sílabas, morfemas) não são excluídas, mas ocorrem a partir de enunciados sempre em (com)textos, ou seja, no contexto em que concretamente são demandados para se pensar a construção da palavra e do texto, no pleno e efetivo funcionamento da língua.

Disto decorre o entendimento de que as práticas de ensino na alfabetização não podem ser orientadas por cartilhas, protocolos e manuais pautados em métodos fônicos ou outros métodos sintéticos mecanicistas de alfabetização, centrados em tarefas definidas e elaboradas previamente e de forma homogênea, como se todo alfabetizando fosse um único e mesmo sujeito. Tampouco tal ensino se orienta pela concepção de língua escrita como mera transcodificação da fala - o que, com frequência, se identifica em atividades de alfabetização, em cartilhas ou apostilas, como repetição, cópia, produção de partes da língua (letras, sílabas, ou mesmo palavras e sentenças isoladas) descontextualizadas.

Enfim, a concepção dialógica da linguagem afasta qualquer possibilidade de práticas alfabetizadoras descontextualizadas. Assim, os espaços da sala de aula precisam ser ocupados por atividades instauradas por contextos interlocutivos que dão sustentação às histórias que os alunos estão construindo com a/pela linguagem, em processos que são, ao mesmo tempo, marcados pelas singularidades e por elas responsáveis. Trata-se de garantir aprendizagens significativas para os alunos, em contextos em que se reconheçam como sujeitos de suas histórias.

Assim, é na hora da leitura, momento diário reservado à leitura de livros de literatura, gibis, jornais ou outros materiais disponíveis na sala de aula; no momento da chamada, em que se identificam semelhanças e diferenças fonológicas e ortográficas entre os nomes da turma; na hora da novidade , em que os alunos trazem textos ou outros objetos culturais de interesse e enunciam a respeito; no registro do planejamento do dia no quadro, em que a professora escreve as atividades a serem realizadas; nas tentativas de leitura de circulares e comunicados da escola; nos registros na agenda, em que o aluno faz tentativas de escrita e também cópias contextualizadas; no ato da escritura, no desejo de materializar seu discurso em texto escrito; nos projetos transdisciplinares desenvolvidos com as turmas e em outros infinitos contextos de letramento que ocorrem na sala de aula, que o aluno vai adentrando no mundo da língua escrita, descobrindo as relações grafofônicas, apropriando-se dos conhecimentos fonético-fonológicos, morfológicos, sintáticos, semântico-lexicais e discursivos disponibilizados pela língua. Nesse processo, vai se constituindo como leitor e produtor de textos, como um sujeito sócio-histórico que busca compreender o mundo ao se apropriar da cultura escrita.

Portanto, nessa perspectiva, os alfabetizandos são vistos como sujeitos cognoscentes, histórico-culturais e do discurso, sujeitos ativos que pensam, elaboram e compreendem a língua, capazes de contribuir para os processos dialógicos que ocorrem no espaço escolar, quer seja pela língua oral, pela língua escrita ou por outras semioses. Assim, os alunos são reconhecidos como capazes de assumirem responsabilidades nos episódios interativos em que se veem inseridos no/pelo processo de alfabetização, bem como qualificados para agir no processo de (re)construção linguística configurada no contexto educacional. Enfim, longe de serem passivo-receptivos, são considerados sujeitos atuantes e corresponsáveis por seus processos de alfabetização, autores de sua própria linguagem.

Corais (2019CORAIS, M. C. Interações discursivas na alfabetização e apropriação do sistema de escrita. In: LINO, C. S. et al. (Org.). FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona , 2019. p. 155-171.) sinaliza que é na força viva da linguagem que inunda as salas de aula que os conhecimentos linguísticos vão sendo elaborados pelo aluno. A autora complementa que é preciso resgatar a dimensão sociocultural desse conhecimento, elemento decisivo na alfabetização de todos os alunos e fundamental aos alunos das classes populares, os quais, em grande parte, só têm acesso aos bens produzidos pela cultura escrita através da escola pública.

Os processos de alfabetização, portanto, são imbricados aos de legitimação das práticas sociais associadas ao letramento escolar, visando, desta forma, ações formativas para a vida e não apenas para o domínio de determinados aspectos linguísticos ou fonológicos da língua portuguesa. Goulart corrobora tal perspectiva, ao destacar que:

O trabalho de constituição do discurso social, enquanto elaboração individual, é necessário nos anos escolares da alfabetização. A escrita representa, inaugura e transforma os modos de inserção social. Nesse sentido é preciso conhecer e conceber formas de alfabetização condizentes com o momento histórico em que se vive. (GOULART; SANTOS, 2017GOULART, C. M. A.; SANTOS, A. P. Estudos do discurso como referência para processos de alfabetização em perspectiva discursiva. In: GOULART, C. M. A.; GONTIJO, C. M. M; FERREIRA, N. S. A. (Org). A alfabetização como processo discursivo: 30 anos de A criança na fase inicial da escrita. São Paulo: Cortez, 2017. p. 99-112., p. 109)

Também Vigotski (2007VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes , 2007.) afirma que a escrita deve ser incorporada a uma tarefa necessária e relevante para a vida, o que nos convida a fazer escolhas cuidadosas que considerem os riscos eminentes às práticas engessadas e retrógradas que podem nos levar a polarizações sociais ainda maiores entre classes, regionalidades e gêneros, além de outras condições de desigualdades sociais que se refletem nos espaços escolares brasileiros.

Daí resultam as práticas de ensino que investem na garantia de processos de aprendizagem ricos em variedades de experiências contextuais, pois partem do pressuposto de que o simples contato com os objetos da aprendizagem não garante a interação com eles. O que poderá proporcionar a interação é o contexto interdiscursivo, marcado por movimentos de identificação e de motivação individual e de grupo, por produção de sentidos, por ter o que dizer e ter motivo para dizer, para ler ou para ouvir, como assinala Geraldi (1993GERALDI, W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.).

Desta maneira, no coletivo, na troca, na generosidade de quem aprende junto, vai se desenhando, ao longo de muito tempo e de muitas vozes, a autoria de quem vive os processos de alfabetização, tanto professores quanto alunos. Trata-se da autoria nos processos de ensino e nos processos de aprendizagem, apontadas numa perspectiva discursiva de alfabetização.

A dimensão autoral dos processos de ensino representa a consciência de que o que se produz em sala de aula é intencional e relaciona-se diretamente às práticas reflexivas dos professores sobre o seu próprio trabalho, sobre a organização curricular e sobre a “curiosidade epistemológica” (FREIRE, 1996FREIRE, P. Pedagogia da autonomia - saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 64) que permitirá avaliar quem são seus alunos, suas demandas e suas próprias escolhas metodológicas.

Assim sendo, a autoria do professor é premissa na eleição dos conteúdos e nas formas de fazê-los circular; dos pontos de apoio para as atividades e dos projetos temáticos ou contextos discursivos motivadores; no planejamento das propostas pedagógicas; nas mediações entre os modos de elaborar os conhecimentos dos alunos e o modo científico convencional; na elaboração ou seleção do material didático; na organização da rotina, dos materiais e dos grupos de trabalho.

Desta forma, decisões didáticas relacionadas aos processos de alfabetização extrapolam a mera escolha de métodos e envolvem um conjunto de posturas, ações e procedimentos embasados em um paradigma de linguagem e de alfabetização. Na perspectiva sociodiscursiva assumida neste artigo, entende-se que tal conjunto precisa estar pautado na realidade da sala de aula e que as estratégias didático-pedagógicas devem ser autorais, contextuais e diversificadas. Tais estratégias serão autorais na medida em que forem elaboradas ou selecionadas pelo próprio professor, tendo por base a sua realidade e a de seus alunos; contextuais ao responderem às demandas reais de aprendizagem do aluno e da turma, individualmente e coletivamente o tempo todo, bem como ao tomarem os enunciados como unidade de ensino; e diversificadas ao atenderem à diversidade original do ser humano e dos grupos sociais e à subjetividade também inerente a eles. Assim, todas as propostas didático-pedagógicas em alfabetização precisam ser eleitas em função daquilo que pode representar uma contribuição para a aprendizagem dos estudantes. Isto se aplica desde a escolha dos enunciados como unidade de ensino da Língua Portuguesa às mediações que fazemos oralmente - e só se consolida como contribuição pedagógica quando promove uma real interação dos alfabetizandos com a cultura escrita.

Portanto, é evidente que a alfabetização envolve uma série de questões didáticas, mas não de forma unificada que permita que sejam desenvolvidas através de qualquer método. As opções didáticas para formar leitores e produtores de textos para a autoria, a autonomia, a criação e a produção de sentidos passam pela disponibilidade em conhecer os modos de aprender de nossos alunos, suas próprias formulações lógicas, seus interesses e suas formas de estar no mundo em interação e participação social.

O que nos reconduz à dimensão autoral dos processos de aprendizagem. Compreender que a aprendizagem se dá em percursos individuais implica reconhecer que o desenvolvimento cognitivo é motivado por processos sociointerativos, que culminam em elaboração de conceitos. Como salienta Vigotski (2007VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes , 2007.), os conceitos não são explicados em bases desenvolvimentistas, pois se constroem a partir de formas culturais que são internalizadas e que interferem na “reconstrução da atividade psicológica, tendo como base as operações com signos” (p. 58). Isto explica, por exemplo, por que alunos que vivenciam as mesmas oportunidades escolares produzem conceitos em escrita de formas variadas.

Ocorre que, para além do aluno que escreve, está o sujeito que interage com a cultura escrita e com outras culturas que envolvem outras formas de operar o pensamento. Daí resulta a hipótese de que o conceito formalizado e repleto de regras que modelizam a escrita alfabética não se constrói senão em interação com os conceitos e sentidos elaborados por cada sujeito da alfabetização. E isto não é um problema. Ao contrário, resolve qualquer tentativa de idealização de modos unificados de aprender.

Neste ponto, é necessário considerar que o domínio da escrita alfabética padrão exige do sujeito, conforme sinaliza Machado (2013MACHADO, M.L.C.A. A escrita alfabética, sua natureza e representação: contribuições à Fonoaudiologia aplicada à Educação. 2013. 157f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013.), um modo de pensamento científico, de maneira que disponha de um esquema psicomotor e de atenção diferenciados, bem como uma organização mental que lhe permita operar sobre dados logicamente ordenados causal e temporalmente, planejados previamente e não contextualizados em concreto. A autora alerta que, diferentemente, sujeitos que vivenciam contextos sociais em que a cultura oral prevalece sobre a cultura escrita tendem a apresentar um modo narrativo de pensamento. Tal modo de organização mental conduz os sujeitos a operarem com dados ordenados incidentalmente, a partir de sua ocorrência, planejados ao mínimo e sempre contextualizados.

Portanto, levar em conta que os alunos vivenciam em suas realidades de mundo maior ou menor aproximação com a cultura escrita e que essa variação reflete diretamente em seus modos de organização mental, que por sua vez os aproximam ou os distanciam da forma padrão de escrita alfabética, permite a compreensão de que sujeitos com modos de pensamento científico podem facilmente formular escritas que se aproximam da escrita padrão. Em contrapartida, sujeitos com modo de pensamento narrativo podem produzir modos de escrita diferenciados, com símbolos gráficos que se apresentam de forma incidental e casual, com uma organização morfossintática com marcas de sua oralidade, revelando baixo nível de planejamento e de controle de variáveis.

Tal entendimento nos leva à compreensão de que, ao planejar as práticas de ensino na alfabetização, o professor precisa escolher aquelas que efetivamente proporcionem aos alunos oportunidades para desenvolverem e exercitarem um olhar de cientista, que os levem a interrogar a realidade da língua e de seus usos e a refletir sobre ela, o que caracteriza o pensamento científico. No interior destas práticas, portanto, é preciso que ocorram, por exemplo: formulações de perguntas acerca de suas próprias escritas ou de textos lidos; apresentações de problemas a partir de uma produção oral ou escrita da turma; observações de dados ou de situações-problemas que envolvam a produção escrita ou a leitura; elaborações de hipóteses, a partir das intuições e conceitos sobre a escrita e a fala, bem como suas inter-relações; reflexões sobre a língua em que testem e validem suas hipóteses e as dos colegas de classe, bem como reformulem escritas a partir de dados sugeridos pelo professor, pelos colegas ou pela observação de problemas ou contextos linguísticos análogos; produções que favoreçam a criação e a elaboração de escritas cada vez mais aproximadas da língua padrão e que deem conta de seus objetivos discursivos.

Deste modo, incorporar a interdiscursividade nas práticas de alfabetização implica ter em mente que a linguagem se produz pela significação, pela urgência de identidades convertidas a um mesmo fim, que é concreto, real e dialógico. Para ser verdadeiro, este fim não é previsível, mas é experienciado porque é necessário, afeta e provoca a produção de “sentido ao que somos e ao que nos acontece”, como também nos inspira Larrosa (2002LARROSA, J. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, nº 19, p. 20-169, 2002., p. 21).

É possível afirmar, assim, que o investimento no caminho de elaboração do conhecimento produzido pelos sujeitos pode constituir aprendizagens em consonância com a essencialidade humana, que localiza os modos de aprender no próprio ato de pensar, de produzir conceitos e, portanto, de significar. Neste sentido, a prática alfabetizadora e a formação de leitores e escritores estão muito mais interessadas em conhecer as hipóteses, os modos de elaboração do pensamento dos seus alunos e em integrá-los à diversidade de outros modos nas relações sociais - algo que a eleição de uma única e rígida forma de ensinar não permite.

O investimento da prática pedagógica se dá, então, nas perguntas, nas propostas que convidem os alunos à reflexão sobre o próprio processo de aprendizagem, à autoria, ao protagonismo, à escuta, às relações sociais e ao movimento criador e estético - sempre mediados pela linguagem. Volóchinov (2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) analisa o processo linguístico como o foco para o desenvolvimento da discursividade:

O meio social organizado no qual incluímos nosso conjunto, bem como a situação social de comunicação mais próxima, são, por si sós, extremamente complexos e repletos dos mais diversos tipos e modos de relações, que nem sempre são igualmente necessários para a compreensão dos fatos linguísticos, assim como também nem sempre representam aspectos constitutivos da língua. Por fim, todo esse sistema multiforme de fenômenos e relações, de processos e de objetos precisa ser reduzido a um único denominador; todas as suas linhas devem ser direcionadas a um único centro: ao foco do processo linguístico. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 146)

Tais premissas podem ser localizadas em diferentes autores que vêm discutindo a prática da alfabetização e da formação de leitores e escritores como processos de discursividade, como Smolka (1999SMOLKA, A. L. B. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização como processo discursivo. São Paulo: Cortez ; Campinas: Editora da Unicamp, 1999.), Goulart (2006GOULART, C. M. A. Letramento e modos de ser letrado: discutindo a base teórico-metodológica de um estudo. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, v. 11 n. 33, p. 450-562, 2006.), Marcuschi (2008MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola, 2008.), Machado e Lopes (2019MACHADO, M.L.C.A.; LOPES, P.S.V.C. Problematização sobre a abordagem da consciência fonológica na alfabetização. In: LINO, C. de S. et al. (Org.) FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona Editora, 2019, p. 137-154.), Andrade (2019ANDRADE, L. T. O professor alfabetizador imantado entre propostas teóricas: o letramento e a metodologia do fônico. In: LINO, C. S. et al. (Org.) FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona, 2019. p. 121-136.) e Senna (2019SENNA, L. A. G. Fundamentos da linguagem. Curitiba: Appris, 2019.), entre outros.

É possível identificar na consolidação conceitual sobre alfabetização que vem sendo construída a partir da década de 1980 no Brasil que a demanda por integração e inclusão das minorias sociais nas escolas busca hipóteses sobre os diferentes modos de produção de linguagem muito mais do que respostas que tipifiquem o comportamento de aprendizagem através de teorias gerais. Neste sentido, as práticas de ensino vão redesenhando as suas indagações e substituindo a preocupação centralizada na escolha metodológica pela formulação de teorias contextuais que visam à complexidade da práxis educativa e buscam na filosofia da linguagem um suporte que contemple a formação humana para além da formação escolar - sem a qual não se processa o letramento. Ao refletir sobre a natureza do sujeito da aprendizagem como “alguém em cujo comportamento se pode encontrar a motivação dos processos de ensino” (SENNA, 2019SENNA, L. A. G. Fundamentos da linguagem. Curitiba: Appris, 2019., p. 312), Senna destaca uma mudança de paradigma:

A concepção de um conceito geral de letramento no âmbito da formação dos professores inclui necessariamente dialogar com questões concretas do contexto do ensino básico, particularmente as seguintes: Qual o sentido da educação escolar na sociedade brasileira contemporânea? Que papel o professor deve imprimir a seu trabalho cotidiano com o aluno regular do ensino fundamental e médio? (SENNA, 2019SENNA, L. A. G. Fundamentos da linguagem. Curitiba: Appris, 2019., p. 312, grifos do autor)

A produção de sentidos é, portanto, o que mobiliza o sujeito para pensar a própria identidade e o seu lugar no mundo, imprimindo, assim, uma marca social de reconhecimento da humanidade nos processos históricos e culturais. Daí a relação estreita entre os pressupostos filosóficos marxistas, as concepções de linguagem e os processos escolares, pois este sujeito é, ao mesmo tempo, físico, filosófico, criador e social, entre outras esferas que o definam sempre contextualmente. Logo, este sujeito é quem explica o mundo sob suas próprias bases, aferindo sentido ao tempo, ao espaço, às relações e aos conhecimentos.

Os caminhos da perspectiva de linguagem de base filosófica marxista adotada pelo Círculo de Bakhtin sustentam as práticas de ensino na alfabetização que privilegiam a discursividade porque a intencionalidade do processo linguístico é o diferencial ideológico. Nas questões pedagógicas, o trabalho que assume o texto (oral e escrito) como percurso didático e como o espaço da elaboração de conceitos responde à demanda pelo discurso, privilegiando, assim, os processos de enunciação. A motivação, portanto, para a noção de gêneros do discurso vem dos sentidos atribuídos a estes processos; e estes sentidos não são fixos, mas se reconstroem porque também os sujeitos se reinventam nas relações que estabelecem com os diversos enunciados, tecnologias e textos, e com toda a diversidade de pessoas com as quais dividem o seu cotidiano.

Com tudo isto, conclui-se que os processos de enunciação são autorizados nas relações educacionais apenas em contextos democráticos em que a diversidade encontre legitimação, pois envolve tomada de posição em contextos socialmente estabelecidos. A produção de linguagem, deste modo, contempla a discursividade concreta em cada situação comunicativa que o sujeito tenha a resolver. Nisto se encontram princípios marxistas da filosofia da linguagem, à medida que a singularidade assume processos de colocação em contextos sociais.

A experiência discursiva é, assim, individual e, ao mesmo tempo, sempre em relação com os “enunciados individuais dos outros”. (BAKHTIN, 2019BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019., p. 54) O mundo particular, o mundo do signo (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.) refere-se a processos de abstração que se dão no encontro da psicologia, das ideologias e da filosofia, conforme verifica-se com as definições de Volóchinov:

A significação realizada no material do movimento interior é voltada para o próprio organismo, para o próprio indivíduo, e acima de tudo é definida no contexto da sua vida única. Nesse sentido, os representantes da escola funcional estão parcialmente corretos. Ignorar que a unidade singular do psiquismo esteja ligada à unidade dos sistemas ideológicos é inadmissível. A singularidade da unidade psíquica é totalmente compatível com uma compreensão ideológica e sociológica do psiquismo. (VOLÓCHINOV, 2018VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018., p. 130)

Há ideologias do cotidiano dos processos educacionais que motivam determinadas escolhas pedagógicas. As práticas de ensino em alfabetização e formação de leitores e escritores são, desta forma, consequência de concepções ideológicas assumidas em discursos individuais, mas também sociais, o que coloca os processos pedagógicos e os de significação como uma coisa só - resultante da produção de sentidos.

4 Considerações finais

Este artigo apresentou uma discussão sobre as relações entre a filosofia da linguagem de base marxista adotada pelo Círculo de Bakhtin e os princípios bakhtinianos, destacando especialmente a natureza social e ideológica dos signos linguísticos e a interação discursiva como realidade fundamental da linguagem. Nesta perspectiva, a língua é vista como uma atividade e não como algo acabado, e os processos de significação são apontados como dialógicos, nos quais tanto locutor quanto interlocutor apresentam um papel ativo. É justamente esse caráter dialético, indeterminado e flexível da linguagem o responsável por sua capacidade criadora, e isto precisa ser considerado nas práticas escolares com a linguagem na alfabetização.

Num movimento antagônico, o que se tem verificado nas políticas públicas atuais em alfabetização é uma visão reduzida e fragmentada da língua - como um código definido a priori - que deixa de lado justamente o que deveria ser o centro das atenções nos processos de alfabetização: o sujeito e a (sua) linguagem. O problema maior de tal perspectiva da língua é a não valorização e o apagamento dos esforços linguísticos empreendidos pelos sujeitos que criam estratégias, que agem sobre a língua, que desenvolvem um trabalho com/sobre os recursos - fonológicos, morfológicos, lexicais, sintáticos, textuais e discursivos - disponibilizados pela língua.

Em direção oposta, este artigo buscou discutir a possibilidade de práticas de ensino na alfabetização em contextos dialógicos, apostando em modos autorais de ensinar e de aprender. Essas reflexões permitiram depreender que os sujeitos não aprendem mecanicamente sobre o mundo, mas criativamente no mundo, em intenso diálogo com o mundo. Assim, apontou-se a necessidade de o trabalho docente ser redimensionado constantemente, objetivando o planejamento diversificado e propostas autorais de reais interações com a língua escrita e oral, bem como com outras semioses, nas quais a unidade de ensino é o enunciado, em detrimento de qualquer abordagem metalinguística descontextualizada. Também se sinalizou a importância de se considerar no planejamento didático da alfabetização que a diversidade de comportamentos diante da cultura escrita será sempre uma marca em qualquer sala de aula.

Disso decorre que, embora a sala de aula seja uma, o planejamento deverá ser sempre diversificado, não cabendo a ideia de adoção de um método de alfabetização. As práticas de ensino em alfabetização e formação de leitores e produtores de textos, para que abarquem a diversidade de sujeitos que constituem as escolas brasileiras e contribuam efetivamente para seus processos de aprendizagem e de inclusão social, necessitam contemplar dialeticamente: formas e tipos de interação discursiva em sua relação com as condições concretas; formas dos enunciados ou discursos verbais singulares - e também coletivos - em relação estreita com a interação da qual são parte, isto é, os gêneros dos discursos verbais determinados pela interação discursiva na vida e na criação ideológica; partindo disso e de modo contextual, aspectos formais e notacionais da língua, em sua concepção linguística habitual. Enfim, trata-se de ações que foquem no processo linguístico e nas múltiplas esferas da realidade da linguagem.

Por fim, a discussão realizada neste artigo permite inferir que o aspecto fundamental no campo da alfabetização diz respeito a uma unidade de princípios e não a uma uniformidade de propostas. Trata-se de um posicionamento filosófico, político e ético pautado na inclusão para a equidade social.

Tal assertiva nos convida a refletir sobre a urgência para que nossos discursos e práticas em alfabetização se reconheçam no lugar de quem forma para a participação social, democrática e inclusiva. Esse projeto de formação para a participação não acontece após a escolaridade, mas nos percursos, sempre individuais.

Referências

  • ANDRADE, L. T. O professor alfabetizador imantado entre propostas teóricas: o letramento e a metodologia do fônico. In: LINO, C. S. et al. (Org.) FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona, 2019. p. 121-136.
  • BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019.
  • BRASIL. Decreto nº 9765, de 11 de abril de 2019. Institui a Política Nacional de Alfabetização. Brasília: MEC, 2019a. Disponível em: Disponível em: https://legis.senado.leg.br/norma/30902116/publicacao/30905492 Acesso em: 2 maio 2020.
    » https://legis.senado.leg.br/norma/30902116/publicacao/30905492
  • BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília, DF: MEC/SEB, 2018. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf Acesso em: 2 maio 2020.
    » http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf
  • BRASIL. Resolução nº 2, de 20 de dezembro de 2019. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação). Brasília, DF: CNE, 2019b. Disponível em: Disponível em: http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro-2019-pdf/135951-rcp002-19/file Acesso em: 2 maio 2020.
    » http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro-2019-pdf/135951-rcp002-19/file
  • CORAIS, M. C. Interações discursivas na alfabetização e apropriação do sistema de escrita. In: LINO, C. S. et al. (Org.). FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona , 2019. p. 155-171.
  • FREIRE, P. Pedagogia da autonomia - saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
  • GERALDI, W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
  • GOULART, C. M. A. Letramento e modos de ser letrado: discutindo a base teórico-metodológica de um estudo. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, v. 11 n. 33, p. 450-562, 2006.
  • GOULART, C. M. A.; SANTOS, A. P. Estudos do discurso como referência para processos de alfabetização em perspectiva discursiva. In: GOULART, C. M. A.; GONTIJO, C. M. M; FERREIRA, N. S. A. (Org). A alfabetização como processo discursivo: 30 anos de A criança na fase inicial da escrita. São Paulo: Cortez, 2017. p. 99-112.
  • GRILLO, S. Marxismo e filosofia da linguagem: uma resposta à ciência da linguagem do século XIX e início do XX. Ensaio introdutório. In: VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018. p. 7-79.
  • LARROSA, J. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, nº 19, p. 20-169, 2002.
  • MACHADO, M.L.C.A.; LOPES, P.S.V.C. Problematização sobre a abordagem da consciência fonológica na alfabetização. In: LINO, C. de S. et al. (Org.) FEARJ: debates sobre políticas públicas, currículo e docência na alfabetização. Rio de Janeiro: Rona Editora, 2019, p. 137-154.
  • MACHADO, M.L.C.A. A escrita alfabética, sua natureza e representação: contribuições à Fonoaudiologia aplicada à Educação. 2013. 157f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013.
  • MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola, 2008.
  • SENNA, L. A. G. Fundamentos da linguagem. Curitiba: Appris, 2019.
  • SMOLKA, A. L. B. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização como processo discursivo. São Paulo: Cortez ; Campinas: Editora da Unicamp, 1999.
  • VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes , 2007.
  • VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. 2. ed. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34 , 2018.
  • 1
    O conceito de letramento assumido neste artigo é definido por Senna como “um projeto de socialização desenvolvido pela escola por meio de um processo que promova o desenvolvimento dos sujeitos, a partir de diferentes fenômenos associados a pontos de vista teórico-científicos os mais diversos”. Tal processo, segundo o autor, “interfere em múltiplas esferas da cognição, desde a representação e orientação global psicomotora, incluindo as representações lógico-causais e essenciais, até as representações socioafetivas de um sujeito que se abre a distintas esferas de socialização”. (SENNA, 2019SENNA, L. A. G. Fundamentos da linguagem. Curitiba: Appris, 2019., p. 186)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    15 Maio 2020
  • Aceito
    02 Fev 2022
Faculdade de Letras - Universidade Federal de Minas Gerais Universidade Federal de Minas Gerais - Faculdade de Letras, Av. Antônio Carlos, 6627 4º. Andar/4036, 31270-901 Belo Horizonte/ MG/ Brasil, Tel.: (55 31) 3409-6044, Fax: (55 31) 3409-5120 - Belo Horizonte - MG - Brazil
E-mail: rblasecretaria@gmail.com