Reiki como cuidado de enfermagem às pessoas em sofrimento psíquico: revisão integrativa

RESUMO

Objetivo:

Analisar as evidências científicas do uso do Reiki como estratégia de cuidado às pessoas em sofrimento psíquico.

Métodos:

Revisão integrativa nas bases de dados PubMed, Scielo, Web of Science e BVS. Foram incluídos artigos em inglês, português e espanhol, sem restrição quanto ao ano de publicação, que respondessem à pergunta condutora construída com uso da estratégia PICo: “Quais as evidências científicas sobre o uso do Reiki como estratégia de cuidado à pessoa em sofrimento psíquico?” A literatura cinzenta foi excluída.

Resultados:

Dez artigos compuseram a amostra final. O uso da terapia Reiki apresentou benefícios como estratégia de cuidado no estresse, ansiedade, sintomas depressivos, alívio da dor e melhora na qualidade de vida, seja a terapia utilizada de forma isolada ou complementar a outro tratamento.

Conclusão:

O desenvolvimento de competências dos enfermeiros e demais profissionais da saúde utilizando o Reiki contribui para a melhoria dos padrões de qualidade dos cuidados.

Descritores:
Sofrimento Psíquico; Terapias Holísticas; Toque Terapêutico; Cuidados de Enfermagem; Revisão

ABSTRACT

Objective:

To analyze the scientific evidences of the use of Reiki as a care strategy to people in mental suffering.

Methods:

Integrative review in the databases PubMed, Scielo, Web of Science, and BVS. The study included articles in English, Portuguese, and Spanish, with no time restriction, which answer to the guiding question that was created in accordance to the PICo strategy: “What are the scientific evidences on the use of Reiki as a care strategy to people in mental suffering?” Gray literature was not considered.

Results:

Ten articles made up the final sample. The use of the Reiki therapy had benefits as a strategy to care for stress, anxiety, depressive symptoms, pain relief, and quality of life improvements, whether the therapy was used isolated or to complement other treatments.

Conclusion:

The development of the competence of nurses and other health professionals in the use of Reiki can contribute to improve the quality standards of care.

Descriptors:
Mental Suffering; Holistic Therapy; Therapeutic Touch; Nursing Care; Review

RESUMEN

Objetivo:

Analizar evidencias científicas del uso del Reiki como estrategia de cuidado a las personas en sufrimiento psíquico.

Métodos:

Revisión integrativa en las bases de datos PubMed, Scielo, Web of Science y BVS. Incluidos artículos en inglés, portugués y español, sin restricción cuanto al año de publicación, que respondieran a la interrogación con uso de la estrategia PICo: “¿Cuáles las evidencias científicas sobre el uso del Reiki como estrategia de cuidado a la persona en sufrimiento psíquico?”.

Resultados:

Diez artículos compusieron la muestra final. El uso del Reiki presentó beneficios como estrategia de cuidado en el estrés, ansiedad, síntomas depresivos, alivio del dolor y mejora en la calidad de vida, sea la terapia utilizada de forma aislada o complementar a otro tratamiento.

Conclusión:

El desarrollo de competencias de los enfermeros y demás profesionales de salud utilizando el Reiki contribuye para la mejoría de los estándares de calidad de los cuidados.

Descriptores:
Sufrimiento Psíquico; Terapias Holísticas; Toque Terapéutico; Cuidados de Enfermería; Revisión

INTRODUÇÃO

Os transtornos mentais acometem pelo menos 450 milhões de pessoas no mundo, sendo responsáveis, nas Américas, por um terço do número total de incapacidades psíquicas que impedem o trabalho^(1-2).

Fenômeno social, os transtornos mentais são vistos por diversos olhares de acordo com a cultura de cada época, entretanto, apesar de todos os avanços, ainda não é possível obter uma definição consensual para definir os agravos à saúde mental, os quais, a depender do referencial teórico adotado, podem também ser denominados: distúrbios mentais, sofrimento mental e sofrimento psíquico⁽³⁾. Para esta revisão integrativa, optou-se por utilizar o termo “pessoas em sofrimento psíquico” pela afinidade do vocábulo com os pressupostos da política de saúde mental instituída no Brasil⁽⁴⁾.

O sofrimento psíquico é um agravo à saúde com alto índice de morbidade na sociedade contemporânea, sendo considerado um grave problema de saúde pública⁽⁵⁾.

No Brasil, estudos apontam na população adulta uma prevalência de 20% a 56% de pessoas em sofrimento psíquico, tais como os transtornos de humor, somatoformes, abuso de álcool e ansiedade⁽⁶⁾. Esta última, particularmente, é considerada epidêmica, com percentual de 9,3% de prevalência; esse número, considerando a América do Sul, coloca o país no primeiro lugar de incapacidades psíquicas causadas por esse transtorno⁽²⁾.

As pessoas em sofrimento psíquico apresentam níveis mais elevados de incapacidade funcional, com prejuízo nas atividades cotidianas, trabalho e relações sociais⁽⁷⁾. A incapacidade associada aos sofrimentos psíquicos causa prejuízos no âmbito econômico e social, repercutindo na forma como os serviços de cuidados em saúde estão organizados⁽⁸⁾. Apesar de vários países realizarem mudanças em suas políticas de saúde mental, há um déficit entre a demanda e a oferta de serviços, havendo percentuais elevados de adultos e crianças, com destaque para populações indígenas com doenças mentais graves sem tratamento⁽²⁾.

O sofrimento psíquico pode estar associado a alguma comorbidade clínica, como distúrbios metabólicos, cardiovasculares endócrinos, oncológicos e HIV/AIDS^(9-11), causando repercussões no tratamento, na assistência, na família, nos gestores de saúde e na reabilitação dos usuários⁽¹²⁾.

O modelo tradicional de tratamento a esses agravos está centrado na prescrição de psicofármacos e psicoterapias⁽¹³⁾. No entanto, faz-se necessário buscar outras opções de cuidado que se mostrem efetivas para as pessoas em sofrimento psíquico, minimizando os efeitos colaterais, e que atendam às necessidades dessa clientela.

Uma alternativa ao modelo tradicional centrado no uso dos psicofármacos são as Práticas Integrativas e Complementares (PICs), instituídas no Brasil pela Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC)⁽¹⁴⁾. As PICs são recursos cada vez mais utilizados por promoverem um cuidado humanizado, com foco no cliente, bem como por auxiliarem no processo de recuperação da saúde, respeitando e apoiando os cuidados terapêuticos pré-existentes⁽¹⁵⁾.

Das PICs ofertadas no âmbito da assistência à saúde, podemos destacar o Reiki como prática terapêutica que utiliza a imposição das mãos para canalização da energia vital, visando promover o equilíbrio energético, necessário ao bem-estar físico e mental⁽¹⁶⁾.

Algumas pesquisas apontam que a terapia Reiki pode contribuir no cuidado a pessoas em sofrimento psíquico, reduzindo os níveis de ansiedade e depressão⁽¹⁷⁾, relaxamento e manejo do estresse⁽¹⁸⁾, bem como a redução do burnout⁽¹⁹⁾. Sua utilização acrescenta novas possibilidades ao cuidar, de maneira simples, segura e não invasiva, por ser considerada uma intervenção de baixo risco e utilizada entre os diversos profissionais que atuam nos setores hospitalares e Atenção Básica^(20-21).

Dentre as profissões da saúde, a enfermagem define-se como a profissão do cuidado direto, efetivo e holístico. Dessa forma, o toque terapêutico abre a possibilidade de transformar ainda mais o cotidiano do cuidado, no sentido de tornar o convívio com o paciente acolhedor, agradável e singular, desenvolvendo um relacionamento terapêutico por meio do vínculo e da confiaça⁽²²⁾.

Assim, o Reiki apresenta-se para enfermagem como uma prática especializada de cuidado, regulamentada no Brasil conforme a normativa do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) 581/2018⁽²³⁾.

Estudos^(24-25) já revisaram a literatura com o objetivo de verificar a contribuição do Reiki nos vários cenários do cuidar, porém, nas fontes pesquisadas, ainda são escassas as publicações que estudaram essa prática como terapêutica de cuidado em pessoas com sofrimento psíquico. Acreditase que, conhecendo o uso dessa terapia para tal finalidade, os enfermeiros possam nela se embasar cientificamente e inclusive utilizá-la em suas práticas diárias.

OBJETIVO

Analisar as evidências científicas do uso do Reiki como estratégia de cuidado às pessoas em sofrimento psíquico.

MÉTODOS

Trata-se de uma revisão integrativa segundo o modelo proposto por Whittemore e Knafl: 1) identificação do tema ou questionamento da revisão integrativa; 2) amostragem ou busca na literatura; 3) avaliação e categorização dos estudos incluídos na revisão integrativa; 4) análise dos dados; e 5) síntese do conhecimento evidenciado nos artigos analisados ou apresentação da revisão integrativa⁽²⁶⁾.

Para a elaboração da questão de pesquisa, utilizou-se uma adaptação da estratégia PICO (acrônimo para Patient, Intervention, Comparison, Outcomes), uma vez que a escolha da pergunta da revisão não se aplica a todos os elementos dessa estratégia⁽²⁷⁾. Nesta revisão integrativa, o terceiro e o quarto elementos foram substituídos por “contexto”, sendo então empregada a estratégia PICo (Problema/População, Interesse e Contexto).

Assim, a questão norteadora da revisão foi elaborada de acordo com: (P) – pessoa em sofrimento psíquico; (I) – uso do Reiki; e (Co) – o uso do Reiki como estratégia de cuidado. Finalmente, definiu-se a seguinte pergunta condutora: “Quais as evidências científicas sobre o uso do Reiki como estratégia de cuidado à pessoa em sofrimento psíquico?”.

A busca da literatura foi realizada por meio do acesso às bases de dados PubMed, SciELO, Web of Science e BVS no período de outubro de 2019, sem restrição quanto ao ano de publicação e utilizando os filtros de idioma: português, inglês e espanhol; texto completo disponível. Foram usados os descritores indexados “Mental Disorders”, “Holistic Therapies” e “Therapeutic Touch”, com auxílio dos operadores booleanos AND e OR. Uma mesma estratégia de busca foi utilizada para todas as bases “Mental Disorders”AND (“Therapeutic Touch” OR “Holistic Therapies”) .

Os critérios de inclusão foram artigos originais, em português, inglês e espanhol, que evidenciassem o Reiki como estratégia de cuidado a pessoas em sofrimento psíquico de acordo com a questão norteadora do estudo. Como critérios de exclusão, foram adotados: tese, dissertação, livro ou capítulo de livro, editorial, matéria de jornal, revisão integrativa ou sistemática da literatura, estudo de caso, relatos de experiência e artigos descrevendo experimentos não realizados com seres humanos. Outros detalhes estão contidos na Figura 1.

Figura 1
Fluxograma do processo de identificação, seleção e inclusão dos estudos, elaborado conforme recomendação Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses - PRISMA⁽²⁸⁾

Para a terceira etapa, categorização dos estudos, utilizou-se um instrumento validado⁽²⁹⁾ para verificação das seguintes variáveis: ano, autores, base de dados e país em que a pesquisa foi desenvolvida, nível de evidência, objetivo, resultados e principais conclusões dos estudos.

A avaliação dos estudos incluídos na revisão, quarta etapa do estudo, foi verificada pelo nível de evidência, proposto por Fineout-Overholt et al.⁽³⁰⁾, o qual estabelece seis categorias: Nível I – Evidências oriundas de revisões sistemáticas ou metanálises de relevantes ensaios clínicos; Nível II – Evidências derivadas de pelo menos um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado, evidência moderada; Nível III – Ensaios clínicos bem delineados sem randomização; Nível IV – Estudos de coorte e de caso-controle bem delineados; Nível V – Revisão sistemática de estudos descritivos e qualitativos, evidência fraca; Nível VI – Evidências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo; Nível VII – Opinião de autoridades ou relatório de comitês de especialistas.

Na quinta etapa, referente à interpretação dos resultados, foram extraídos dos artigos: população-alvo, instrumento utilizado para avaliar o sofrimento psíquico, tipo de sofrimento psíquico, protocolo para a utilização do Reiki e terapias usadas em associação ao Reiki como desfecho da pesquisa.

RESULTADOS

A amostra final foi composta por dez estudos, publicados entre os anos de 2004 a 2017 (Quadro 1). Quatro países emergiram entre os artigos selecionados: Estados Unidos (6), Reino Unido (2), Brasil (1) e Itália (1).

Quadro 1
Características dos estudos selecionados para a revisão integrativa, Recife, Pernambuco, Brasil, 2020

Autor, ano, país de origem, base de dados	Tipo de estudo, nível de evidência	População-alvo	Instrumento	Desfecho	Estratégia de cuidado de enfermagem
					Protocolo Reiki	Reiki + Terapia adjuvante
BESSA et al., 2017(34) BrasilBVS	Ensaio clínicoNível II	Adultos que buscaram a terapia independentemente de sua condição clínica	Escala de bem-estar subjetivo	Melhora na dimensão dos afetos positivos sem influenciar as dimensões dos afetos negativos e a satisfação com a vida do bem-estar subjetivo	Três sessões de aproximadamente 42 minutos cada, com intervalo de sete dias entre elas	Apenas Reiki
BREMNER et al., 2016(35) Estados UnidosBVS	Métodos mistosNível II	Adultos com HIV	Center for Epidemiological Studies Depression Scale (CES-D), State Trait Anxiety Inventory (STAI-Y), Visual analog scales (VAS) for pain and anxiety	Diminuição dos escores das escalas de depressão, estresse, ansiedade e dor	Seis sessões semanais de 30 minutos	Reiki e música
ORSAK et al., 2015(36) Estados UnidosBVS	Ensaio clínicoNível II	Adultos em tratamento de quimioterapia	Profile of Mood States Short Form Questionnaire	O Reiki foi classificado como relaxante, sem efeitos colaterais. O Reiki e os grupos de acompanhantes relataram melhorias no humor	Durante cada sessão de quimioterapia, uma sessão de Reiki foi conduzida com duração de 30 minutos; um total de quatro sessões de Reiki foram conduzidas	Reiki e grupos de acompanhantes
BIROCCO et al., 2012(31) ItáliaBVS	Estudo quase-experimentalNível III	Adultos em tratamento de quimioterapia	Visual analog scales (VAS) for pain and anxiety	Nos pacientes que receberam as quatro sessões de Reiki, houve diminuição estatisticamente significante no escore médio da Visual Analog Scales (VAS) para ansiedade	Cada sessão de Reiki durou cerca de 30 minutos. Foram aplicados no máximo quatro sessões de Reiki em quatro sessões de quimioterapia	Apenas Reiki
CUNEO et al., 2011(32) Estados UnidosBVS	Estudo quase-experimentalNível III	Enfermeiros	Perceived Stress Scale (PSS)	Participantes que praticaram Reiki com mais frequência apresentaram escores reduzidos de estresse segundo a Perceived Stress Scale (PSS)	Os enfermeiros autoaplicaram Reiki em sessões de 10 a 15 minutos de duração, diariamente, durante 21 dias	Apenas Reiki
BOWDEN et al., 2011 (37) Reino UnidoBVS	Ensaio clínicoNível II	Estudantes universitários	Depression, Anxiety, and Stress Scale (DASS) e Hospital Anxiety and Stress Scale (HADS)	Participantes com alta ansiedade e/ou depressão que receberam Reiki mostraram uma melhora progressiva no humor geral	Seis sessões de 30 minutos durante um período de duas a oito semanas	Apenas Reiki
BOWDEN et al., 2010(38) Reino UnidoBVS	Ensaio clínicoNível II	Estudantes universitários	Depression, Anxiety, and Stress Scale (DASS)	Quanto maior o escore de estresse pré-intervenção, maior a redução ao longo da intervenção	Dez sessões de 20 minutos durante um período de 2 semanas e meia a 12 semanas	Apenas Reiki
RICHESON et al., 2010(39) Estados UnidosWeb of Science	Ensaio clínicoNível II	Idosos vivendo na comunidade com diagnóstico médico de dor, depressão ou ansiedade	Geriatric Depression Scale (GDS-15), Hamilton Anxiety Rating Scale (HAM-A)	Os escores GDS-15 e HAM-A no grupo experimental tiveram reduções significativas na depressão e ansiedade em comparação com o grupo-controle	Sessões de Reiki de 45 minutos, realizadas uma vez por semana, durante oito semanas	Apenas Reiki
VITALE et al., 2006(33) Estados UnidosBVS	Estudo quase-experimentalNível III	Mulheres adultas com histerectomia abdominal programada	State-Trait Anxiety Inventory (STAI)	No momento da alta, o grupo experimental apresentou uma média menor no escore de ansiedade do que o grupo-controle	Uma sessão de Reiki de 30 minutos: no mesmo dia agendado para a cirurgia; 24 horas e 48 horas após a cirurgia	Apenas Reiki
SHORE et al., 2004(40) Estados UnidosBVS	Ensaio clínicoNível II	Adultos com sintomas de estresse e depressão	Beck Depression Inventory (BDI), Beck Hopelessness Scale (BHS) e Perceived Stress Scale (PSS)	Participantes que receberam o Reiki mostraram menores escores nas escalas de depressão e estresse, logo após o tratamento e também um ano depois	Sessões de Reiki com duração de uma hora e meia, uma vez por semana, durante seis semanas	Apenas Reiki

Sobre o nível de evidência e tipo de estudo, os quase-experimentais (Nível III) e os ensaios clínicos (Nível II) foram os mais frequentes, com três^(31-33) e sete estudos^(34-40), respectivamente.

Destaca-se que todos os artigos apresentaram como população-alvo adultos com algum grau de sofrimento psíquico, apesar de, em um artigo⁽³⁷⁾, o autor selecionar sua amostra com participantes “saudáveis”, porém após aplicação da escala tiveram escore para ansiedade.

Em relação aos instrumentos para mensurar os efeitos da técnica Reiki nos participantes dos estudos, os mais utilizados foram: Spielberg Anxiety Inventory^(33,35), Visual Analog Scales (VAS) for Pain and Anxiety^(31,35), Perceived Stress Scale (PSS)^(32,40), Depression, Anxiety, and Stress Scale (DASS), Pittsburgh Quality of Sleep Index (PSQI), Illness Symptoms Questionnaire, ActivationDeactivation Adjective Check List (AD-ACL), Reiki-Blinding and Expectation Questionnaire e Illness Symptoms Questionnaire (ISQ)^(37-38).

A respeito do protocolo para a realização do Reiki, apenas um estudo utilizou a autoaplicação da técnica⁽³²⁾. Os demais empregaram sessões de Reiki com terapeutas formados nos vários níveis e devidamente certificados. O tempo de duração das sessões variou de dez minutos a uma hora e meia. O intervalo entre as sessões mais frequente foi de uma semana, e a média do número total de sessões foi de seis.

Entre os estudos que compuseram a amostra final, aqueles que utilizaram apenas o Reiki como tratamento também foram maioria (n = 8)^{(31-34,37-40)}; outros tratamentos usados em conjunto com ele foram: uso da música (n = 1)⁽³⁵⁾ e presença de acompanhantes (n = 1)⁽³⁶⁾. O Quadro 1 apresenta informações detalhadas sobre os estudos selecionados.

DISCUSSÃO

Dos dez artigos analisados, os Estados Unidos da América (EUA) aparecem com o maior número de publicações, seguidos da Reino Unido, Itália e Brasil. A predominância norte-americana se justifica pelo crescente interesse dessa população pela medicina complementar e alternativa (CAM), contribuindo para um incentivo às pesquisas em tal área, principalmente após a criação do Centro Nacional de Medicina Complementar e Alternativa (NCCAM)⁽⁴¹⁾. No Brasil, apesar de o Reiki fazer parte do rol das Práticas Integrativas e Complementares integradas ao Sistema Único de Saúde⁽¹⁶⁾ e de sua ampla aceitação no cenário nacional, ainda são escassas as pesquisas sobre essa terapia.

Ao se revisarem os artigos, pode-se observar uma grande preocupação da comunidade científica com os critérios adotados pelos pesquisadores para avaliar o efeito/eficácia da terapia Reiki nos diversos cenários do cuidado e em diferentes populações. Esses pontos de fragilidade ou vieses metodológicos incluem: método, tamanho da amostra, critérios de amostragem, uso diversificado de instrumentos de avaliação e protocolos para aplicação da técnica Reiki^(24,31,33).

Com relação à abordagem metodológica, todos os artigos utilizaram dados quantitativos para mensurar o efeito da terapia Reiki. Entretanto, seis publicações acrescentaram dados qualitativos em seus estudos^{(31-33,35-36,39)} .

No campo científico, não há consenso sobre qual é o melhor método de pesquisa para análise das terapias energéticas, com alguns autores questionando a forma de mensurar a eficácia das práticas de imposição de mãos, ao desconsiderarem a experiência individual dos participantes e os modelos de análise randomizados iguais aos que se aplicam aos fármacos, considerados como o “padrão-ouro” nas pesquisas médicas⁽²⁴⁾.

Nesta revisão, um estudo apresentou como limitação não ter avaliado a motivação do participante em buscar a terapia Reiki⁽³⁴⁾; outros pesquisadores sugerem pesquisas qualitativas ou métodos mistos para melhor compreensão da experiência da terapia Reiki pelos participantes da pesquisa^(24,33,35) e de seus benefícios⁽³⁹⁾. Porém, outros trabalhos recomendaram o uso de estudos controlados e randomizados para confirmar a eficácia dessa prática^(32,37).

Em relação à população, todos os estudos utilizaram a terapia Reiki em pessoas adultas, o que se pode confirmar nas pesquisas realizadas nas bases de dados para esta revisão.

Nos trabalhos selecionados, fica evidente uma diversidade de instrumentos utilizados para avaliar os resultados, considerando o bem-estar, qualidade de vida, dor, depressão e ansiedade. Apesar da confiabilidade e validade de tais instrumentos, os resultados obtidos apresentaram diferenças que podem estar associadas à conformidade desses instrumentos com o objeto da pesquisa e, então, ocasionar viés metodológico⁽²⁴⁾.

Dessa forma, pode-se inferir que, ao se trabalharem variáveis subjetivas como as descritas acima, se faz necessária uma nova concepção do processo saúde/doença e dos meios teóricos/técnicos para o cuidado às pessoas em sofrimento psíquico.

A falta de padronização dos protocolos para aplicação da intervenção Reiki foi evidente nos estudos incluídos nesta revisão. Essa heterogeneidade se refere ao tipo, frequência, duração da prática e nível de experiência do profissional⁽⁴²⁾. Dois estudos utilizaram como abordagem metodológica o ensaio clínico e rigor metodológico ao realizar a aplicação Reiki. Entretanto, o praticante utilizou técnicas e símbolos de Reiki de forma intuitiva para atender às necessidades individuais de cada participante^(37-38).

O nível de experiência do terapeuta pode constituir um viés metodológico já que a efetividade da técnica de imposição de mãos pode estar relacionada a essa condição⁽²⁴⁾. Porém a autoaplicação de Reiki utilizada por enfermeiros iniciados durante 21 dias nessa técnica foi capaz de reduzir níveis de estresse relacionado ao trabalho⁽³²⁾.

A diversidade entre os protocolos pode ser explicada pelos vários métodos de ensino utilizados pelos mestres Reiki. A complexidade ao se pesquisar essa terapia é evidente, com autores sugerindo abordagens mais criativas, tais como o uso da bioeletrografia antes e após as sessões de tratamento como uma forma de mensurar os resultados do trabalho energético⁽³³⁾, bem como tratamentos individualizados levando em consideração as subjetividades e necessidades do paciente⁽²⁴⁾.

A terapia Reiki enquanto estratégia de cuidado à pessoa em sofrimento psíquico apresentou seus benefícios para lidar com o estresse, ansiedade e depressão, seja no contexto ocupacional ao melhorar o humor de estudantes universitários com ansiedade e/ou depressão^(37-38), seja no âmbito ocupacional, no qual enfermeiros que adotaram o Reiki como ferramenta de autocuidado apresentaram redução nos níveis de estresse associado ao trabalho⁽³²⁾.

Nos casos de enfermidades crônicas, com forte carga de sofrimento psíquico, relacionados a procedimentos invasivos, uso prolongado de medicamentos, estigma e sentimento de finitude, a utilização da terapia contribui no manejo da dor, estresse, ansiedade e depressão^(43-44). Estudo mostrou que o uso do Reiki associado à música ajudou na redução desses transtornos em pessoas com HIV⁽³⁵⁾.

Em adição, considerado relaxante e sem efeitos colaterais, essa técnica proporciona bem-estar, alívio da dor, melhora da qualidade do sono e redução da ansiedade em pacientes submetidos à quimioterapia^(31,36). Portanto, o Reiki reestabelece níveis energéticos adequados para o equilíbrio da mente, do corpo e das emoções, sendo visto como uma estratégia não farmacológica de cuidado em enfermagem⁽⁴⁵⁾.

De acordo com a teoria de enfermagem de Watson, a dimensão espiritual é parte integrante do modelo de cuidado transpessoal⁽⁴⁶⁾. Os constructos estabelecidos por esse marco teórico refletem a relação entre o enfermeiro e o paciente, permeada por: presença, desenvolvimento pessoal, aceitação do desconhecido e confiança. Tal modelo refere ainda que a esperança pode transformar tanto o enfermeiro como a pessoa cuidada. Essas ideias são reforçadas pelas terapias energéticas nas quais se enquadra o Reiki, que buscam fornecer um sentido elevado de consciência espiritual para as partes envolvidas⁽⁴⁷⁾.

A complexidade e subjetividade dos fatores envolvidos nos cuidados às pessoas em sofrimento psíquico requerem a atuação de uma equipe interdisciplinar em vários níveis de atenção, em que o enfermeiro, como profissional integrante dessa equipe, pode contribuir com seu conhecimento técnico e habilidades inerentes a sua formação, agregando outras práticas terapêuticas, como o Reiki, em seu cotidiano de assistência.

Nesse contexto, o Reiki se mostrou uma ferramenta promissora quando inserida na práxis da equipe interdisciplinar por meio de profissionais iniciados e certificados nessa prática⁽³⁹⁾; e, desse modo, ela pode ser entendida como um recurso terapêutico, ainda pouco utilizado pela enfermagem psiquiátrica, mas cujo envolvimento clínico encontra-se em expansão⁽³³⁾.

Outrossim, por meio da análise das evidências científicas sobre o uso do Reiki, pode-se percebê-lo como uma tecnologia de cuidado inovadora, de baixo custo, que pode ser utilizada por enfermeiros e demais profissionais promotores da saúde mental, com treinamento prévio, nos quadros de sofrimento psíquico. Isso porque a energia que flui através das mãos do praticante pode agir harmonizando o indivíduo de acordo com suas necessidades e, assim, promover o equilíbrio físico, mental e emocional, podendo melhorar sua qualidade de vida.

Limitações do estudo

Como limitações, podemos apontar a reduzida quantidade de estudos encontrada nas buscas das bases de dados. Isso talvez se deva ao número de bases escolhidas para a busca, à restrição quanto ao idioma e à exclusão da literatura cinzenta. Como uma tentativa de diminuir essa limitação, a estratégia de busca usou termos amplos e não restringiu os estudos quanto ao ano de publicação, visando a um número maior de resultados. Contudo, essa escassez de trabalhos sobre o tema talvez possa ser atribuída também à novidade do uso das práticas integrativas e complementares de saúde no cuidado em saúde mental.

Contribuições para área da Enfermagem, Saúde ou Política Pública

A presente pesquisa poderá contribuir para a elaboração fundamentada de propostas de ações de cuidado na área da Enfermagem em saúde mental, por meio da divulgação e síntese das evidências científicas para o uso das práticas integrativas e complementares, entre elas o Reiki, empoderando o enfermeiro e a equipe multiprofissional; buscando uma assistência holística e humanizada; e atendendo às singularidades das pessoas em sofrimento psíquico, em consonância com os pressupostos da Reforma Psiquiátrica Brasileira.

Destarte, a coleta, análise e integração dos achados dentro de um significado global podem incentivar a criação de Projetos Terapêuticos Singulares e o desenvolvimento de novas pesquisas que envolvam o cuidado de enfermagem e equipe multidisciplinar, embasados em estratégias não farmacológicas para o tratamento dos transtornos mentais nos múltiplos cenários de atenção à saúde.

CONCLUSÕES

Por meio dos resultados dos artigos analisados, este estudo revela que o Reiki, como prática aplicada por enfermeiros ou integrantes da equipe multidisciplinar em saúde mental para o alívio da dor e do sofrimento psíquico, contribui para a melhoria dos padrões da qualidade da assistência, uma vez que humaniza o cuidado prestado.

Foi notório que a evidência científica, nas bases analisadas, sobre o uso do Reiki para pessoas com sofrimento psíquico ainda é escassa, mas crescente. Dessa forma, pesquisas futuras devem ser realizadas para ampliar a produção do conhecimento sobre essa técnica enquanto instrumento de cuidado em saúde mental.

Ademais, os resultados demonstraram que o uso da terapia Reiki apresentou para pessoas em sofrimento psíquico benefícios como redução do estresse, ansiedade, sintomas de depressão, dores físicas. Tanto de forma isolada quanto complementar a outro tipo de tratamento, é usada também como forma de relaxamento, auxiliando na promoção de melhorias na qualidade de vida.

Entretanto, há questionamentos nas evidências científicas sobre o uso da metodologia utilizada para avaliar a eficácia das terapias energéticas, sendo recomendados, por alguns autores, estudos avaliativos de abordagem qualitativa ou métodos mistos, por entenderem que pesquisas quantitativas não elucidam mudanças vibracionais sutis.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Priscilla Broca

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  28 Abr 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  27 Jul 2020
• Aceito
  18 Out 2020