Acessibilidade / Reportar erro

ASPECTOS TEÓRICOS DO TRABALHO DE DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE E DA PARTICIPAÇÃO DA ENFERMEIRA NO MESMO

" a promoção do homem apresenta-se-nos como um dever pessoal e comunitário... por seu compromisso... presente... porque é um empenho que deve realizar-se agora, em cada momento, no encontro cotidiano com cada homem e com todos homens..."

"EZEQUIEL ANDER-EGG

1. JUSTIFICATIVA

Dadas as limitações circunstanciais, pretendemos apenas rever rapidamente o assunto; gostariamos de contribuir, com isto, para despertar nas enfermeiras um interesse maior pelo trabalho de Desenvolvimento de Comunidade e colocar em foco, mais uma vez, as oportunidades que teriam para participarem nesse trabalho e, implicitamente, o preparo que para isto lhes é requerido.

Para possibilitar uma identidade de interpretação na terminologia que vai ser usada ao nos referirmos a Desenvolvimento de Comunidade, achamos oportuno, de início, fazer uma breve recordação sobre a conceituação de "Comunidade", de "Desenvolvimento de Comunidade" e sobre os objetivos deste Trabalho.

2. CONCEITUAÇÃO DE "COMUNIDADE" E DE "DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE"

Adotaremos, como ponto de partida, a definição de "Comunidade" do sociólogo JOSÉ ARTHUR RIOS, que diz ser a comunidade "... um grupo humano, vivendo em área geográfica contígua, caracterizando-se por uma trama de relações e contatos íntimos, possuindo a mesma tradição e os mesmos interesses, mais a consciência da participação em ideais e valores comuns".(66 F.S.P. - U.S.P. - Disciplina de Fundamentos Sociais em Saúde Pública - Ideologias de Saúde Pública: Estudo Comparativo - Apostila fornecida no Curso de Pós-Groduação em Saúde Pública, 1970.)

Aceitamos sua colocação de que "nem todo grupo de localidade representa uma comunidade"(7), porque as características mais marcantes desta são a participação, a consciência e a ação comum"(7), o que leva a uma idéia clara dos próprios problemas e finalidades e a uma ação orgânica que resolva os primeiros e alcance as segundas.

As definições de "Comunidade" são inúmeras, e, por vezes, as ênfases dadas às características apontadas diferem de uma definição para outra, mas, de modo geral, todas são unânimes em citar as mesmas características: a) é um grupo humano; b) numa geográfica mais ou menos definida; c) que mantém interrelacionamento, com identidade de interesse e ideais.

Posto isto, passemos a ver o que podemos considerar como "Desenvolvimento de Comunidade" - Aqui também se repete a diversidade de definições que, entretanto, identifica praticamente os mesmos pontos. Um dos aspectos que fica aberto a opções é a natureza do processo: alguns estudiosos do assunto o chamam de "Técnica Social"(11 ANDER-EGG, Ezequiel - Metodologia y Prática del Desarrollo de La Comunidad. - 3.ª Ed., Buenos Aires, Ed. Rumanitas, 1967.), alguns de "Processo Educativo"(55 RIOS, José Arthur - A Educação dos Grupos - Serviço Nacional de Educação Sanitária M. S., Rio de Janeiro, 1967.), outros de "Processo Social"(33 BIDDLE , William W. - Estímulo ao Desenvolvimento da Comunidade, Rio de Janeiro, Ed. Agir, 1969.), e ainda outros de "Método Educativo"(66 F.S.P. - U.S.P. - Disciplina de Fundamentos Sociais em Saúde Pública - Ideologias de Saúde Pública: Estudo Comparativo - Apostila fornecida no Curso de Pós-Groduação em Saúde Pública, 1970.). Pensamos que a escolha do termo dependerá de quem a fizer, da natureza e objetivo do trabalho em vista; poder-se-ia mesmo dizer que uma classificação não exclui a outra, pois "Desenvolvimento de Comunidade "é processo, porque é uma progressão sucessiva e dinâmica de fatos, em fases e etapas; é educativo, porque diz respeito a mudança de comportamento; é social, porque é realizado com grupos humanos profundamente envolvidos por fatores sociais; e pode ser classificado como um método ou uma técnica, desde que seja o caminho ou o meio considerado de escolha para a obtensão de fins desejados.

Contudo, adotaremos, uma das definições de Desenvolvimento de Comunidade, das muitas existentes, a fim de possibilitar uma incursão no assunto.

Podemos dizer, então, com EZEQUIEI ANDER-EGG, que Desenvolvimento de Comunidade é "um método e uma técnica social que contribui positiva, real e efetivamente para um processo de desenvolvimento integral e harmônico do homem, atendendo fundamentalmente a certos aspectos extra-econômicos, em particular psico-sociais; que intervem na promoção ide atitudes, aspirações e desejos para o desenvolvimento do homem e na mobilização de recursos humanos e institucionais para este desenvolvimento, mediante a participação ativa e democrática da população, no planejamento e execução de programas a nível de comunidades de base, destinados a melhorar seu nível de vida".(11 ANDER-EGG, Ezequiel - Metodologia y Prática del Desarrollo de La Comunidad. - 3.ª Ed., Buenos Aires, Ed. Rumanitas, 1967.)

3. OBJETIVOS DO TRABALHO DE DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE

O trabalho de D. C. visa de modo geral:

3.1 - Conseguir a melhoria das condições econômicas, sociais e culturais realizando um trabalho de base.

3.2 - Promover o florescimento dos valores humanos nas classes menos favorecidas, muitas vezes não explorado ou mal orientados.

3.3 - Suscitar um respeito ativo pelo homem, pelos seus direitos.

Os objetivos específicos do trabalho de D. C., podem ser os mais variados, dependendo do campo em que se pretenda trabalhar (economia, civismo, saúde, campo social, etc.).

3.4 - Desenvolver atitudes favoráveis e ativas no indivíduo, tais como:

a) desejo de progresso, conseguido pelo próprio esforço e trabalho;

b) bom nível de aspirações, o que pode ser criado pela tensão entre a situação social atual e a desejada, dando ao mesmo tempo as aspirações nascidas dessa tensão um caráter de exequibilidade;

c) propensão para trabalhar e inovar;

d) atitude positiva em favor dos problemas da comunidade (local e nacional), pela qual não se espera que outros (o Estado, por exemplo) resolvam todos os problemas e, sim que as próprias pessoas na comunidade se disponham a agir individual ou coletivamente a fim de se resolverem os ditos problemas, na medida em que esteja ao seu alcance;

e) espírito e ação cooperativos, com o que é desenvolvido o sentimento de unidade entre os indivíduos, grupos e comunidades, os quais se alimentam do desejo e promoção própria e também coletiva.

4. METODOLOGIA DO TRABALHO DE DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE

Dizem os estudiosos do trabalho de Desenvolvimento de Comunidade que deve constituir processo em forma de constelação, não havendo atividades que se justaponham formalmente, de modo rígido, mas existindo todas, mais ou menos, em caráter de concomitancia.

Contudo, por ser um processo organizacional, é aconselhado que se tenha em mente as etapas ou fases de ação que são observados neste tipo de trabalho e que podem ser seguidas, se não houver contra-indicação.

4.1 - Fases da Metodologia de Trabalho

As fases metodológicas, que não são mais que a aplicação do método científico, seguem a seguinte ordenação:

4.1.1 - Fase introdutória:

  1. investigação preliminar;

  2. diagnóstico preliminar;

  3. prepalro da comunidade;

  4. planejamento e organização da ação preliminar;

  5. execução do plano preliminar;

  6. avaliação preliminar;

4.1.2 - Fase de Investigação geral (novos problemas)

4.1.3 - Fases do Diagnóstico geral (novas necessidades)

4.1.4 - Fase do Planejamento geral (novos projetos)

4.1.5 - Fase da Execução do plano geral

4.1.6 - Fase da Avaliação geral

4.1.7 - Fase da Continuação (núcleo permanente)

5. DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO

Passemos a alguns detalhes das diversas fases acima relacionadas prura maiores eclarecimentos quanto ao trabalho a ser feito.

5.1 - Fase Introdutória:

Esta primeira fase, que não visa precisamente o conhecimento de todos os problemas realmente importantes da comunidade, mas sim os que esta apontará com os mais urgentes para ela, admite inicialmente algumas considerações, a saber:

  • a) quem a começa?

  • b) quando?

  • c) como?

a) QUEM A COMEÇA?

É iniciada pelo animador, isto é, qualquer pessoa, na comunidade, que sinta a necessidade de resolver um problema comum, e tenha a consciência de que o mesmo será mais eficiente e beneficamente resolvido se o for em conjunto; não é necessário que conheça o asunto a fundo ou, que saiba a técnica de solucioná-lo; o que é preciso, é que tenha o bom senso de levar o grupo a se formar e se orientar adequadamente. A comunidade porém, pode não estar consciente dos seus problemas e alguém ou alguma organização de fora pode percebe-los; acreditando que a comunidade pode ser orientada no sentido e se organizar para aprender a identificá-los e pocurar solucioná-los, esta pessoa ou organização, com a necessária discrição e paciência, poderá iniciar esse processo que levará a comunidade à auto-suficiência: no atendimento de suas necessidades.

b) QUANDO COMEÇA?

Inicia-se quando uma necessidade é sentida expontaneamente por alguém na comunidade ou através da indução externa.

c) COMO COMEÇA?

Ai se colocam duas situações que condicionariam as sub-fases da "Fase Introdutória":

- o animador é da própria comunidade;

- o animador é estranho à comunidade.

Sendo o animador, pessoa da comunidade, na "Fase Introdutoria" são realizadas algumas atividades, em caráter preliminar, com o fim de facilitar o início imediato da ação esperada pela comunidade. Tais atividades são:

a) Investigação Preliminar:

O animador residente, tratará de pesquisar entre seus concidadãos, a partir de seus vizinhos, amigos, companheiros de trabalho, conhecidos, quem se interessará pelo assunto e poderá ser motivado prura cooperar na solução do problema.

Se, ou quando, contar com, alguns simpatizantes dispostos a participarem, promoverá encontros formais ou informais (como convier mais) para discusão do assunto e, desde que o grupo assim formado concorde que a questão é do interesse de todos, então poderá partir para as sub-fases seguintes.

Na hipótese de ser o animador pessoa estranha à comunidade, a investigação preliminar será um pouco mais complexa e demorada, podendo ser esquematizada do seguinte modo:

a.1. - Conhecimento elementar da comunidade - através de:

  • a.1.1. - observação pessoal (direta, indireta ou ambas):

    • - do aspecto físico da comunidade;

    • - das suas perturbações e carências;

    • - dos seus recursos materiais e institucionais;

    • - das pessoas

  • a.1.2. - consulta a documentos (de instituições públicas e particulares):

    • - relatórios estatísticos e descritivos;

    • - regulamentos;

    • - catálogos;

    • - jornais;

    • - fotografias, etc.

  • a.1.3. - entrevistas a indivíduos ou a grupos, com o fim de:

    • - conhecer o que sabem, pensam, desejam, fazem e necessitam;

    • - saber como se distribuem;

    • - conhecer elementos humanos sobre quem agir;

    • - identificar líderes;

    • - descobrir grupos dominantes;

    • - dar-se a conhecer;

    • - oferecer sugestões construtivas;

    • - estimular a compreensão mútua dos líderes;

    • - conhecer e influenciar a opinião pública local;

    • - combater preconceitos;

    • - tornar-se elemento local.

O estabelecimento do animador externo na comunidade é um trabalho que requer muita habilidade e deve ser feito informalmente, a modo de infiltração lenta e segura, que permita a formação e sedimentação de um relacionamento de amizade e confiança: os contatos devem ser na base de conversas e visitas informais em que os intereses dos residentes se sobreponham sempre; para resumir, a comunidade deverá concluir que o animador é um amigo, disposto a trabalhar "com", a cooperar para o seu crescimento.

É a seguinte, em traços rápidos a atuação do animador do trabalho de Desenvolvimento de Comunidade:

- de início, mostrar as vantagens da cooperação;

- servir de elo entre a entidade organizadora do movimento e os recursos governamentais, obras sociais, igrejas, escolas etc.;

- estimular a consideração de outras experiências alheias à comunidade;

- assistir ao maior número possível de reuniões, atuando sempre como participante, ao falar, ou mesmo não falando;

- conferenciar com indivíduos informalmente;

- estimular a responsabilidade das pessoas;

- orientar, mostrando os erros, mas sem interferir;

- oferecer idéias sem propor soluções;

- ser amigo, animador, fonte de inspiração e acreditar nos outros;

- ser participante de algumas atividades;

- ser técnico do processo, orientador, conciliar, iniciador de um processo ou seu animador.

Chegando ao ponto em que o animador "externo", conhece suficientemente a comunidade e é por ela simpaticamente aceito, seu trabalho se identifica com o que faria um animador residente na comunidade nas mesmas condições e prosseguirá o trabalho conforme as demais sub-fases do esquema, já relacionados.

b) Diagnóstico preliminar:

Trata-se de uma conclusão sobre a situação sentida pela comunidade quanto aos seus problemas, (após o estudo destes), dos recursos disponíveis para resolvê-los, assim como da prioridade indicada para a sua solução.

Este diagnóstico é feito com a comunidade. Coloca-se a seguir então, um outro aspecto importante do trabalho de D. C. que é:

c) Preparo da Comunidade:

Grande parte deste trabalho é feita informalmente através do método da participação ativa da comunidade - do aprender fazer, fazendo; porém, havendo indicação (e há sempre), os especialistas são convidados a darem sua colaboração orientando no que for preciso; na conscientização dos problemas, em pesquisas, em discussões de grupo, na interpretação de informações, na escolha de métodos, no treinamento dos trabalhadores dos projetos, etc, mas jamais decidindo arbitrariamente.

Em resumo, são aspectos do preparo da comunidade:

c-1. Motivação:

Quanto à motivação, indiretamente já foi abordada ao tratarmos do início do trabalho de Desenvolvimento de Comunidade.

c-2. Formação do grupo básico:

O grupo básico é formado a partir das pessoas que ao interessarem pelo trabalho, tendo-se o cuidado de se incentivar a adesão das pessoas que foram identificadas como líderes naturais ativos. O número de participantes ativos, é bom lembrar, será sempre pequeno, segundo Biddle (2): o de planejadores indo por volta de 5%, o de participantes das atividades planejadas, um pouco maior, e o de beneficiários, sempre o maior.

c-3. Identificação dos líderes:

A identificação dos líderes pode ser feita formalmente através de inquérito em que a questão é incluída, ou informalmente, através de informações obtidas em conversas amistosas. As pessoas indicadas em ambos os processos serão pessoalmente convidadas para reunião em local e hora aprazados. O fato de não comparecerem ao primeiro convite não será motivo para que sejam excluídas. Com as que comparecem para esta reunião começará o trabalho de formação de agentes multiplicadores cuja técnica é presumivelmente bastante divulgada e que dispensa maiores comentários. Uma vez conseguido o sentido do bem comum, pelo menos em esboço, seguir-se-á a execução da sub-fase seguinte que é:

c-4. Organização da estrutura de trabalho:

Esta estrutura será a que o grupo decidir: informal, apenas com um presidente que coordene os trabalhos, um secretário e um tesoureiro; ou formal, se houver corum suficiente, com uma diretoria ou conselho provisório e os sub-comitês. Passando o grupo a constituir um corpo jurídico, legalizado ou não, conforme sua vontade, sua atenção, assim como a da própria comunidade, será regida por um regulamento ou estatuto, elaborado pelo próprio grupo e aprovado em plenário.

Também poderá ser aproveitada alguma organização pré-existente na comunidade, apenas com a inclusão, para fins de D. C., dos membros da comunidade que quiserem a ela se aliar.

Por este tempo, o grupo deve estar pronto a se responsabilizar pelo estudo do(s) problema(s), e iniciar o trabalho para solucioná-los.

Concomitantemente, o animador estará empenhado no preparo das pessoas designadas pela comunidade para o trabalho, isto é, os responsáveis pela direção, supervisão e planejamento dos programas, pelo aspecto técnico, e pelos trabalhos de campo.

Relembremos, entretanto que, conforme foi dito ao abordarmos a metodologia do trabalho de Desenvolvimeno de Comunidade, as fases do processo não precisam necessariamente se suceder, podem ser simultaneas, por exemplo: ao tratarmos do preparo dos que vão trabalhar, estamos já treinando-os no próprio planejamento, porque estarão aprendendo a elaborar e ao mesmo tempo a executar o programa. Para efeito de ordem, contudo, é bom que sejam expostas, a seguir as demais atividades do processo.

d) Planejamento da ação preliminar:

O ponto focal deste planejamento são os problemas sentidos pela comunidade, como foi dito, e para ele se convocará toda a população em ampla divulgação, pelos meios disponíveis.

Serão apresentados então, à comunidade, pelo grupo de base, os resultados do inquérito em que os problemas mais urgentes foram identificados e, na ocasião, a comunidade escolherá os que receberão tratamento imediato através de uma programação que será feita pelo grupo definitivamente eleito, em obediência às normas do estatuto. O animador e/ou especialista orientará não só na técnica do planejamento, mas também no desenvolvimento da auto-suficiência para planejar, no futuro.

Por esta ocasião, serão também escalonados os problemas restantes para tratamento posterior.

e) Execução do plano preliminar:

É a fase em que cada projeto é posto em ação pela comunidade, em que as pessoas executam elas mesmas o trabalho projetado, ou pressionam as instituições ou governantes para a ação requerida.

O trabalho do animador será o que as circunstâncias indicarem: ou continuará estimulando a cooperação dos indivíduos, ou se omitirá, se sua presença não for aconselhada; ou participará na ação dos executantes, o que deve ser raro; ou estará empenhado, com outros grupos, na continuação da pesquisa geral.

Sobre a realização do projeto deve ser feito um relatório que será apresentado à comunidade em reunião geral, onde será analizada a eficiência do trabalho.

f) Avaliação preliminar:

Refere-se à:

f-1. alcance dos objetivos propostos

f-2. procedimentos e técnicas utilizados

f-3. adequação dos recursos

f-4. opinião dos beneficiários

5.2. Fase de Investigação Geral:

Trata-se da coleta de dados complementares para o conhecimento completo da comunidade. Sua utilidade sobretudo para o animador, portanto poderá ser realizada à medida que decorrem as atividades preliminares; refere-se a aspectos da comunidade, necessáios para completarem uma visão de conjunto e, quem sabe, levarem à descoberta de problemas não sentidos pela comunidade, mas, nem por isto, menos graves. Esta coleta de dados será facilitada se se referir a fatos existentes e registrados em algum lugar, mas se não forem registrados, então será necessário que se faça um inquérito de campo, para seu conhecimento. Na relação dos dados necessários que vem a seguir, não entraremos em detalhes, uma vez que os mesmos, são facilmente encontrados em roteiros existentes:

a) Localização da comunidade

b) História

c) Características físicas

d) Infra estrutura e equipamento

e) Demografia

f) Níveis de vida

g) Organização social

h) Processos Sociais

i) Percepção das mudanças sociais

j) Recursos e potencialidades

5. 3. - Fase do Diagnóstico Geral:

É a conclusão, em ampla escala, sobre o estado de enfermidade da comunidade, isto é, de suas perturbações, necessidades e carências, inclusive os de natureza sanitária; os fatores que condicionam essa enfermidade, e, as necessidades que, uma vez atendidas, levarão à solução dos problemas.

Nesta etapa, simultanea à ação já instalada preliminarmente, novos problemas poderão ser identificados e novo processo de conscientização será começado para que a comunidade perceba sua existencia e se organize para solucioná-los.

As fases correspondentes aos ítens, 5.4 - 5.5 - 5.6 - relativas respectivamente a planejamento geral, execução do plano geral, e avaliação geral, permitem as mesmas considerações feitas quando o assunto foi abordado na fase introdutória, apenas levando em conta, agora, a magnitude dos problemas, e os recursos necessários para a sua solução, que certamente hão de condicionar o tempo a ser previsto para a execução dos planos a eles relacionados.

Na fase 5.7/ de Continuação, é prevista a saída do animador, quando a comunidade, eficientemente trabalhada, capaz de persistência no estudo de suas necessidades e de uma relativa eficiência para atendê-las, quer sozinha, quer se utilizando de recursos externos particulares e oficiais.

Resta dizer que, Desenvolvimento de Comunidade, não é uma tarefa para meses e sim para anos, antes que se percebam resultados compensadores e duradouros. Nunca é um processo suave, é feito com lutas, controvérsias, preocupações, despontamentos, progressos irregulares e períodos de entusiasmo e atividade, e de desânimo e apatia.

6. ALGUNS FUNDAMENTOS DO TRABALHO DE DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE

Segundo alguns sociólogos, há Desenvolvimento de Comunidade quando se opera a nível de atitude e comportamento, mediante um processo educativo, que torna reais as possibilidades latentes em indivíduos, grupos e comunidades, permitindo-lhes o crescimento através da conscientização, fazendo-os capazes de uma ação organizada, e tornando-os auto-suficientes.

Estamos, então, num momento oportuno para levantar algumas questões, que possivelmente não serão diretamente respondidas, mas cuja finalidade é contribuir para que o assunto permaneça em discussão (pelo menos).

Tais perguntas são:

a) Porque trabalhar em Desenvolvimento de Comunidade no setor saúde?

b) Qual a finalidade da participação da enfermeira no trabalho do Desenvolvimento de Comunidade?

c) De que consta o trabalho da enfermeira em Desenvolvimento de Comunidade

Então vejamos: - a) Porque trabalhar em Desenvolvimento de Comunidade?

De noções extraídas da Disciplina de Fundamentos Sociais em Saúde Pública, da F.S.P.(66 F.S.P. - U.S.P. - Disciplina de Fundamentos Sociais em Saúde Pública - Ideologias de Saúde Pública: Estudo Comparativo - Apostila fornecida no Curso de Pós-Groduação em Saúde Pública, 1970.), pensamos poder tirar considerações úteis em torno da primeira questão. Se se levar em conta o muito que já se sabe e se tem descoberto tecnicamente em matéria de saúde, verífica-se que, pouco se tem conseguido realizar em termos de mudança de comportamento das populações, neste terreno, da sua participação ativa na solução de seus próprios problemas sanitários.

Porque?

Os motivos são diversos. Tomemos alguns dos que tocam mais de perto a nós, que trabalhamos no setor da saúde, principalmente por que, sobre eles podemos atuar; são os que se prendem a fatores relacionados às ideologias funcionais dos serviços de saúde, isto é:

ideologia tecnológica

- ideologia humanística

A primeira destas ideologias é paternalística, tem como centro de interesse "O Programa", e a segunda, "O Homem"; o objetivo da primeira é a prestação de assistência, realizada pela entidade assistencial, não sendo ouvida a população, que, neste caso, é passivamente beneficiada; seus resultados finais são avaliados em termos de quantidades.

Na segunda, o objetivo é conseguir que a população, para ser beneficiada, conheça seus problemas sanitários, assuma responsabilidade na sua solução, ainda mesmo que esta solução envolva ajuda externa, mas de tal forma, que haja crescimento do indivíduo, traduzido numa elevação do seu nível de vida; seus efeitos são avaliados não só pela melhoria dos índices de saúde-doença, mas também pela verificação da mudança de conduta, na qual se procura basear esta melhoria.

Tais considerações nos mostram que, de modo geral, ainda não chegamos a integrar a filosofia humanística no nosso trabalho de saúde , poís, o comportamento da população quanto à saúde, ainda não ganhou para nós um valor equivalente aos indicadores sanitários estatísticos.

Uma conclusão lógica é que os resultados não serão eficientes como se quer, enquanto não se cuidar de medir o procedo de mudança deste comportamento e de nele influir.

O que se deve visar afinal com o trabalho de Desenvolvimento de Comunidade no setor saúde?

Deve-se visar a cooperação das pessoas - da comunidade - ou agindo, elas mesmas, ou pressionando outras que terão o dever de agir.

Ora, ninguém se empenha pelo que não valoriza, ou que não valoriza bem; ninguém valoriza bem o que não conhece ou que conhece negativamente; e ninguém, de modo geral, conhece corretamente sem ter pagado por um processo de aprendizagem. Portanto, se as pessoas numa comunidade, não agem eficientemente pró-saúde, se são passivas, se às vezes nos parecem nem terem ouvido o que lhes ensina, é porque o não valorizam a ação requerida, ou não a valorizam bem porque não a conhecem bem.

Lembremo-nos do refrão da didática que diz "se o discíplo não aprendeu é porque o mestre não ensinou bem". Em resumo, isto é um processo de educação, de mudança de conduta para obtenção de um fim desejado.

Nós apoiamos, a idéia de que Desenvolvimento de Comunidade, um meio eficiente para se conseguir a cooperação da comunidade a fim de que esse processo de mudança se realize; bem sabemos que a motivação é um fenômeno intrínseco à pessoa, vem de dentro para fora, ainda que o estímulo seja externo; não podemos dar à comunidade um "motivo", que é o que a leva a agir, só a podemos estimular; este motivo tem que nascer nela, com a força de decisão ãe grupo para que tenha poder de ação, e, como resultado de uma assimilação de aprendizagem, para que seja suficientemente integrado, maduro e perseverante, e a leve à decisão e ação consequentes.

Enfim, todos nós conhecemos bem os princípios a serem considerados no processo educativo; resta lembrar que a enfermeira, por força de sua função como profissional, deve ser indiscutivelmente, em cada minuto do seu trabalho, uma educadora em saúde. Não queremos dizer que ela é, ou deva ser, forçosamente, uma técnica em educação, mas que deve teir suficientemente preparo no assunto, como complemento de sua fomação, para que possa atingir seu objetivo máximo inerente à sua condição de enfermeira: contribuir para a saúde, para o completo bem estar do indivíduo, da família e da coletividade.

Estão aí feitos, então, alguns comentários, que, além de terem abordado a primeira questão, envolveram igualmente a segunda: qual a finalidade da participação da enfermeira no trabalho de Desenvolvimento de Comunidade?"

Se concordamos com o exposto, fica óbvio que a enfermeira por ter inerente em sua função o caráter de educadora, pode desempenhar em Desenvolvimento de Comunidade, pelo menos, o papel de voluntário, atuando como agente animador. Para reforçar nossa opinião, invocamos a autoridade dos peritos que dizem que trabalhar em Desenvolvimento de Comunidade, não é tarefa exclusiva de ninguém, é de todos, se bem que haja várias categorias de trabalhadores, começando pelo voluntário, até se chegar ao profissional, para o qual é exigido um preparo específico, mais complexo.

Em conclusão, se é finalidade da Enfermeira educar, se o Desenvolvimento de Comunidade, é um proceso educativo e, se a enfermeira possui aptidões para nele participar, vem a propósito, aqui o dizer de Ezequiel Ander-Egg: "o homem será julgado pelo vaso de água que não fez chegar ao que tinha sede, pelo pão que não deu ao que tinha fome; pelo acesso à dignidade que não fez possível ao que tinha mais necessidade de comunhão humana e de respeito que de calorias e dinheiro".(11 ANDER-EGG, Ezequiel - Metodologia y Prática del Desarrollo de La Comunidad. - 3.ª Ed., Buenos Aires, Ed. Rumanitas, 1967.).

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

  • 1
    ANDER-EGG, Ezequiel - Metodologia y Prática del Desarrollo de La Comunidad - 3.ª Ed., Buenos Aires, Ed. Rumanitas, 1967.
  • 2
    BIDDLE, William W. - Desenvolvimento da Comunidade - Rio de Janeiro, Ed. Agir, 1967.
  • 3
    BIDDLE , William W. - Estímulo ao Desenvolvimento da Comunidade, Rio de Janeiro, Ed. Agir, 1969.
  • 4
    BRITO BASTOS, N. C. - Desenvolvimento de Comunidade como um Método de Educação Sanitária em Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1967.
  • 5
    RIOS, José Arthur - A Educação dos Grupos - Serviço Nacional de Educação Sanitária M. S., Rio de Janeiro, 1967.
  • 6
    F.S.P. - U.S.P. - Disciplina de Fundamentos Sociais em Saúde Pública - Ideologias de Saúde Pública: Estudo Comparativo - Apostila fornecida no Curso de Pós-Groduação em Saúde Pública, 1970.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 1973
Associação Brasileira de Enfermagem SGA Norte Quadra 603 Conj. "B" - Av. L2 Norte 70830-102 Brasília, DF, Brasil, Tel.: (55 61) 3226-0653, Fax: (55 61) 3225-4473 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: reben@abennacional.org.br