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Adolescentes, áreas de pobreza, violência e saúde pública: um enfoque interseccional

RESUMO

Objetivos:

discutir a influência da pobreza urbana no contexto da violência entre adolescentes sob a perspectiva da interseccionalidade.

Métodos:

a pesquisa original, de tipo pesquisa-ação, analisou dados produzidos em 13 oficinas. Participaram adolescentes de ambos os sexos, entre 15 e 17 anos, de uma escola pública de um bairro de periferia de São Paulo, SP. A proposta metodológica de análise interseccional orientou a interpretação do material empírico.

Resultados:

a intersecção de classe com gênero pode potencializar em alguns homens a (re)produção das violências. A intersecção de raça/cor, classe social, gênero e território contribui na construção de narrativas que naturalizam as desigualdades e, assim, justificam as discriminações.

Considerações Finais:

são necessárias e oportunas políticas públicas que considerem os contextos sociais e experiências dos sujeitos resultantes das articulações dos marcadores sociais.

Descritores:
Adolescente; Violência; Saúde Pública; Identidade de Gênero; Raça

ABSTRACT

Objectives:

to discuss the influence of urban poverty on the context of violence among adolescents from an intersectional perspective.

Methods:

the original research, of the action research type, analyzed data from 13 workshops. The participants were adolescents from both sexes, from 15 to 17 years old, from a public school in a peripheral neighborhood of São Paulo, SP. The methodological proposition of intersectional analysis guided the interpretation of the empirical material.

Results:

the intersection of class and gender may increase the (re)production of violence in some men. The intersection of race/color, social class, and territory contributes to the construction of narratives that naturalize inequality and, thus, justify discrimination.

Final Considerations:

there is necessity of new public policies that consider the social contexts and experiences of the subjects that stem from the articulation of social markers.

Descriptors:
Adolescent; Violence; Public Health; Gender Identity; Continental Population Groups

RESUMEN

Objetivos:

discutir la influencia de la pobreza urbana en el contexto de la violencia entre adolescentes bajo la perspectiva de la interseccionalidad.

Métodos:

la investigación original, de tipo investigación-acción, se analizó en 13 talleres. Participaron adolescentes de ambos los sexos, entre 15 y 17 años, de una escuela pública de un barrio de la periferia de São Paulo, SP. La propuesta metodológica de análisis interseccional dirigió la interpretación del material empírico.

Resultados:

la intersección de clase con género puede potencializar en algunos hombres la (re)producción de las violencias. La intersección de raza/color, clase social, género y territorio contribuye en la construcción de narrativas que naturalizan las desigualdades y, así, justifican las discriminaciones.

Consideraciones Finales:

son necesarias y oportunas políticas públicas que consideren los contextos sociales y experiencias de los sujetos resultantes de las articulaciones de los marcadores sociales.

Descriptores:
Adolescente; Violencia; Salud Pública; Identidad de Género; Grupos de Población Continentales

INTRODUÇÃO

A violência é um problema mundial de saúde pública. No mundo, a taxa de homicídios entre os homens de 15 a 29 anos é de 18,2 por 100 mil habitantes(11 World Health Organization (WHO). Global status report on violence prevention. World Health Organization. Geneva: WHO; 2014. https://doi.org/10.1136/injuryprev-2015-041640
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), e estima-se que morram cerca de 200 mil jovens por homicídio a cada ano(22 World Health Organization (WHO). Preventing youth violence: an overview of the evidence [Internet]. World Health Organization. Geneva: WHO; 2016 [cited 2019 Sep 10]. Available from: https://www.who.int/violence_injury_prevention/violence/youth/youth_violence/en/
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). No Brasil, as mortes violentas têm aumentado significativamente nos últimos dez anos, sobretudo entre homens jovens, pretos ou pardos, moradores da periferia urbana(33 Cerqueira DRC, Lima RS, Bueno S, Neme C, Ferreira H, Coelho D, et al. Atlas da violência [Internet]. Rio de Janeiro: IPEA; 2018 [cited 2019 Sep 10]. Available from: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/180604_atlas_da_violencia_2018.pdf
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), como resultado da ausência de políticas públicas que combatam a exclusão social. Com isso, reproduzem-se discriminações sociais que são potencializadas na/pela articulação de marcadores sociais da diferença, tais como gênero, classe, raça/cor(44 Monteiro S, Cecchetto F. Discriminação, cor/raça e masculinidade no âmbito da saúde: contribuições da pesquisa social. In: Gomes R. Saúde do homem em debate [Internet]. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2011 [cited 2019 Sep 10]. p. 129-44. Available from: http://books.scielo.org/id/6jhfr/pdf/gomes-9788575413647-06.pdf
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).

Desde 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece a obrigatoriedade de notificar o Conselho Tutelar da suspeita ou confirmação de violência a crianças ou adolescentes — esse órgão acolhe e encaminha vítimas ou familiares aos serviços de atendimento. Todavia, no âmbito da saúde, somente em 2001 o Ministério da Saúde promulgou a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violência(55 Ministério da Saúde (BR). Política nacional de redução da morbimortalidade por acidentes e violências. Brasília: MS; 2003. https://doi.org/10.1590/S0034-89102000000400020
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). Em 2011, a violência foi incorporada como notificação de forma universal e compulsória em todos os serviços de saúde pelo sistema de Vigilância de Violências e Acidentes - VIVA(66 Minayo MCS, Souza ER, Silva MMA, Assis SG. Institucionalização do tema da violência no SUS: avanços e desafios. Cienc Saude Colet. 2018;23(6):2007-16. https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.04962018
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-77 Macedo DM, Foschiera LN, Bordini TCPM, Habigzang LF, Koller SH. Revisão sistemática de estudos sobre registros de violência contra crianças e adolescentes no Brasil. Cienc Saude Colet. 2019;24(2):487-96. https://doi.org/10.1590/1413-81232018242.34132016
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), proporcionando maior precisão e segurança quanto aos dados sobre os quais os estudos epidemiológicos se baseiam e, por sua vez, fundamentando propostas para o combate às violências.

Um estudo de revisão sistemática(77 Macedo DM, Foschiera LN, Bordini TCPM, Habigzang LF, Koller SH. Revisão sistemática de estudos sobre registros de violência contra crianças e adolescentes no Brasil. Cienc Saude Colet. 2019;24(2):487-96. https://doi.org/10.1590/1413-81232018242.34132016
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) no qual foram analisados os registros oficiais de violência contra crianças e adolescentes concluiu que, embora as variáveis coletadas permitam discutir a magnitude do problema da violência, ainda há falta de informações sobre os aspectos psicossociais anteriores às situações da violência. Nesse sentido, os estudos qualitativos contribuem e aprofundam dimensões do complexo e multidimensional fenômeno da violência envolvendo os jovens. Ademais, estudos na perspectiva qualitativa ressaltam que os sistemas de gênero, raça/cor e classe no território periférico urbano mostram-se como um campo conflitivo que, de um lado, envolve alguns homens jovens em práticas sexuais e comportamentais violentas e, de outro, situam algumas mulheres jovens sob a opressão masculina. Tais dimensões em conflito mostram-se primordiais para a elaboração, implementação e avaliação de políticas públicas concernentes às violências e saúde para os jovens nesses segmentos(88 Pinho O. A “fiel”, a “amante” e o “jovem macho sedutor”: sujeitos de gênero na periferia racializada. Saude Soc. 2007;16(2):133-45. https://doi.org/10.1590/S0104-12902007000200013
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).

Neste artigo, ao consideramos as diferentes dimensões das violências, bem como a amplitude semântica do termo, lançamos mão dos postulados teóricos de Slavoj Žižek, para o qual há um vínculo indissociável entre poder (dominação), violência e ação do Estado. Em sua formulação teórica, Žižek(99 Žižek S. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo; 2014.) aponta haver dois tipos de violência: a subjetiva e a objetiva, sendo esta última subdividida em violência simbólica e violência sistêmica.

A violência subjetiva, direta e visível, é exercida pelos agentes sociais no cotidiano e pelos aparelhos repressivos do Estado. Nesse caso, como exemplo, tem-se a violência juvenil, em que os jovens a praticam ou a ela são submetidos por representantes do Estado como as polícias, ou seja, os jovens são perpetradores ou vítimas(99 Žižek S. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo; 2014.). Nesse tipo de violência, é possível identificar o agressor e a agressão cometida. A violência objetiva simbólica, não visível, por sua vez, pertencente às linguagens e aos sistemas simbólicos de classificações, busca a imposição de certo universo de sentido e, muitas vezes, não chega a ser reconhecida como violência. Devido a esse caráter de invisibilidade, torna-se mais difusa, sendo difícil identificar o agressor. Já a violência objetiva sistêmica decorre do funcionamento dos sistemas econômico e político e é sustentada pelos jogos de relações sociais, arraigados nas instituições sociais, valendo-se do poder para impor-se e perpetuar-se, não sendo atribuída a sujeitos concretos(99 Žižek S. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo; 2014.).

Assim, considerando a problemática da violência no contexto dos jovens na periferia urbana, pergunta-se: A intersecção dos sistemas de gênero, classe e raça/cor alicerçada em estruturas sociais discriminatórias no contexto de um território periférico (re)produz violências nas práticas cotidianas dos adolescentes? E em que medida suas experiências (re)produzem desigualdades com consequências para a própria saúde e para a saúde de outros com os quais se relacionam?

OBJETIVOS

Discutir a influência da pobreza urbana no contexto da violência entre adolescentes sob a perspectiva da interseccionalidade, a fim de potencializar novas análises sobre as implicações das expressões de violências entre os adolescentes em termos de (re)produção das discriminações articuladas de raça/cor, classe e gênero e seus impactos em termos dos agravos à saúde nesse segmento social.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Estudo aprovado pelo Comitê de Ética da instituição proponente.

Referencial teórico-metodológico e tipo de estudo

Trata-se de um estudo qualitativo. O material empírico que dá suporte às análises remonta a uma pesquisa qualitativa mais ampla: “Comunicação em saúde: pesquisa-ação para elaboração de programa midiático de educação sobre drogas direcionada a jovens”(1010 Oliveira E. Comunicação em saúde: pesquisa-ação para elaboração de programa midiático de educação sobre drogas direcionada a jovens. São Paulo. [Tese]. Escola de Enfermagem. Universidade de São Paulo; 2015.).

Vinculamos a opção teórico-política da abordagem da violência, segundo a perspectiva de Žižek, ao referencial teórico-metodológico da interseccionalidade, o qual se esforça para entender o que é criado na/pela intersecção de dois ou mais eixos de opressão(1111 Hankivsky O, Doyal L, Einstein G, Kelly U, Shim J, Weber L, et al. The odd couple: using biomedical and intersectional approaches to address health inequities. Glob Health Action. 2017;10(Suppl.2):1326686. https://doi.org/10.1080/16549716.2017.1326686
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) referenciados pelos marcadores sociais da diferença. Por “marcadores sociais da diferença”, como classe social, gênero, raça/cor, geração, compreendemos as construções sociais anteriores à existência dos sujeitos, as quais se articulam de modo a produzir maior ou menor inclusão social a depender da localização dos sujeitos nesses sistemas de classificação(1212 Couto MT, Oliveira E, Separavich MAA, Luiz OC. La perspectiva feminista de la interseccionalidad en el campo de la salud pública: revisión narrativa de las producciones teórico-metodológicas. Salud Colect. 2019;15:e1994. https://doi.org/10.18294/sc.2019.1994
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). Com base nessa abordagem interdisciplinar, busca-se apreender a complexidade das identidades e suas relações com as desigualdades consubstanciadas pelas estruturas sociais e vivenciadas nos espaços de localização social dos sujeitos. A abordagem interseccional(1313 Gkiouleka A, Huijts T, Beckfield J, Bambra C. Understanding the micro and macro politics of health: inequalities, intersectionality & institutions, a research agenda. Soc Sci Med. 2018;200:92-8. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2018.01.025
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) é promissora no campo da saúde pública, pois não enfatiza as determinações dos fenômenos apenas na base econômica, mas na articulação desta com outros marcadores sociais, uma vez que diversos aspectos de desigualdades são, hoje, reconhecidos e influenciam as práticas cotidianas dos sujeitos.

Cenário do estudo

A pesquisa foi realizada em uma escola pública situada no distrito de Guaianases, município de São Paulo, estado de São Paulo, Brasil. A instituição atende alunos do ensino fundamental e médio e educação para jovens e adultos (EJA). A escola foi selecionada por adotar estratégia pedagógica de trabalho em conjunto com o território, possibilitando ampla participação dos moradores, outros equipamentos sociais e pais de alunos. O local, Guaianases, foi selecionado por ser uma área periférica com presença intensa de movimentos sociais que incluem os jovens(1414 Damião PL. A ressignificação do espaço: produção e circulação de cultura contra hegemônica nas periferias da cidade de São Paulo [Dissertação]. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas; Universidade de São Paulo; 2014. 202 p.).

Fonte de dados

Participaram voluntariamente da investigação adolescentes, entre 15 e 17 anos, de ambos os sexos, sendo 21 homens e 5 mulheres, que se identificaram com o tema da investigação.

Coleta e organização dos dados

O estudo foi conduzido entre fevereiro e setembro de 2014. A produção dos dados empíricos se deu por meio de oficinas, técnica grupal de produção de dados em investigações participativas, com grupos de características homogêneas. Foram realizadas 13 oficinas, cada uma com cerca de duas horas de duração. Apoiando-se no tema central, “Ser jovem na periferia”, foi possível discutir coletivamente outros temas abrangentes e correlatos, como: consumo de drogas; lazer e socialização; necessidades de saúde; representações da periferia e dos jovens nas diferentes mídias, influência da mídia na socialização dos jovens; estratégias juvenis de enfrentamento das desigualdades(1515 Oliveira E, Soares CB, Silva JA. Pesquisa-ação emancipatória com jovens escolares: relato de experiência. Rev Gaúcha Enferm. 2016;37(3):e62059. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2016.03.62059
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). O material empírico produzido possibilitou análises sobre a relação entre tais temas e o objeto da violência.

Na condução das oficinas, vários recursos foram utilizados para incentivar e mediar a comunicação entre os adolescentes e com eles, como filmes, desenhos em quadrinhos, colagens usando jornais, encenações, além do uso de comunicação em redes sociais. Na produção e sistematização dos dados empíricos do estudo, o diário de campo foi a técnica utilizada. Além deste instrumento, todas as oficinas foram gravadas e filmadas pelos próprios adolescentes em momentos de apresentação de dramatizações e de síntese(1515 Oliveira E, Soares CB, Silva JA. Pesquisa-ação emancipatória com jovens escolares: relato de experiência. Rev Gaúcha Enferm. 2016;37(3):e62059. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2016.03.62059
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). Todo material foi transcrito e posteriormente analisado.

Análise dos dados

O material empírico foi analisado à luz da perspectiva da interseccionalidade, e seguiram-se os quatro primeiros passos da proposta de Winker e Degele(1616 Winker G, Degele N. Intersectionality as multi-level analysis: dealing with social inequality. Eur J Women Stud 2011;18(1):51-66. https://doi.org/10.1177/1350506810386084
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), sem que se fixassem fronteiras rígidas entre eles. As autoras sugerem uma análise interseccional multinível, articulando as dimensões da construção da identidade, as representações simbólicas e a estrutura social.

Passo 1: identificam-se os participantes no processo de reconhecer-se e diferenciar-se de outros sujeitos, trazendo luz às histórias dos adolescentes em seus contextos de pertencimento social. Passo 2: identificam-se as representações simbólicas do grupo, contemplando consensos e dissensos acerca das categorias de diferenciação (classe, raça/cor, gênero e geração) para análise da construção de suas identidades. Esse passo tem como objetivo identificar as normas, valores e ideologias aos quais os sujeitos se referem. Passo 3: busca estabelecer associações entre o nível das práticas e as representações simbólicas que dão sentido às primeiras, com o propósito de alcançar normas, sentidos e valores partilhados pelo grupo, buscando localizá-las em relação à estrutura social e ao objeto de análise (violência), o que constitui uma síntese preliminar. Finalmente, Passo 4: implementa-se uma síntese interpretativa final do objeto de forma articulada com as categorias de diferenciação consideradas (classe social, gênero e raça/cor) e com a literatura acerca do tema em questão: a violência e os adolescentes vivendo em contextos de periferia urbana.

RESULTADOS

Considerando-se os passos de análise interseccional multinível(1616 Winker G, Degele N. Intersectionality as multi-level analysis: dealing with social inequality. Eur J Women Stud 2011;18(1):51-66. https://doi.org/10.1177/1350506810386084
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), iniciamos com a descrição dos participantes. Os adolescentes se identificaram como moradores de um território precário, expostos às violências, imersos na lógica do consumo e no convívio, mais próximo ou distante, com o tráfico de drogas, seja na escola, seja nos entornos dela.

Ser jovem [na periferia] é matar um leão por dia […] é falta de oportunidade. É ser julgado todos os dias por ser de uma região inferior às outras. […], a remuneração aqui é baixa. Ser jovem aqui é muito difícil, […] não tem um lugar para você se distrair. (Mulher, Oficina 01)

[…] uma esquina sim, uma esquina não, tem gente vendendo drogas, a maioria é jovem. […] então, a coisa é vender droga. É isso que a gente vive aqui, querendo ou não. […] porque não tem trabalho. Você quer um tênis, quer uma roupa. Você não tem essa condição, então vai trabalhar na biqueira. (Homem, Oficina 02)

Para os adolescentes, o fato de morar na periferia já os caracteriza como excluídos socialmente, segundo os referenciais de quem não vive nesse território. Não à toa, referem rótulos do território em que vivem como lugar de “preto” e “pobre”, os quais incidem sobre seus corpos, levando-os a se reconhecerem como “pretos”, o que não necessariamente coincide com a cor da pele. “Preto”, portanto, é uma marca social, arbitrária, heterorreferida e introjetada pelos participantes. Outro demarcador cultural e simbólico de identidade, relacionado à raça/cor, à condição de pobreza e ao território da periferia, é a cultura do funk. O funk é referido como lazer, sociabilidade e pertencimento dos jovens:

Aqui na periferia, todos são negros independente da cor da nossa pele. (Homem, Oficina 01)

Se tirar o funk de Guaianases, não sobra nada [risos] […]. Se você vê um menino voltando da escola […] você vai julgar o menino; ele é um menino bom, mas se você vê um menino saindo do baile funk, você vai dizer “esse moleque é maloqueiro”, porque ele está no baile funk. Isso é um preconceito. (Homem, Oficina 01)

Outros espaços de socialização elencados foram a escola, família e as redes sociais. Embora o funk não seja a preferência musical de alguns adolescentes, estes frequentam os bailes funk, demonstrando que, a despeito da heterogeneidade nos gostos musicais, as práticas de lazer são condicionadas pelas efetivas disponibilidades do território.

Tem jovem que prefere ficar em casa, tem jovem que prefere fazer outro passeio, não ir para baile funk. Mas, se não tem outro passeio, vai para onde? Vai para o baile funk. Se tivesse outra opção, não iria. […] vai para o baile funk, às vezes, porque gosta, ou porque não tem outra opção. […] Uns gostam, mas outros não. Não tem outra opção para sair, então faz isso. (Homem, Oficina 01)

Utilizando da oposição “nós”, da periferia, versus “eles”, dos bairros ricos, os participantes destacaram que jovens de frações da classe privilegiada participam de bailes funk, todavia, em locais protegidos e que não perturbam a vizinhança. Portanto, as referências dissonantes são de classe social, local de moradia e proteção social.

No bairro nobre, o jovem [vai] para o baile funk, tem até na mídia, mas eles são diferentes. Eles não atrapalham ninguém. Eles não estão três horas da manhã na tua rua gritando e escutando funk, não deixando você dormir, e usando drogas no teu portão. Eles vão em uma boate ouvir funk, isso é bem diferente. Eles são diferentes. (Homem, Oficina 01)

A heterorreferência como “gente da periferia” e “bandido”, particularmente atribuída por policiais, também se constitui como elemento na construção da identidade dos jovens. Em muitos relatos, sobretudo dos adolescentes homens, sobressaem os modos violentos e desrespeitosos como são abordados por policiais. A polícia, tida como uma das raras representações do Estado no território, é enfaticamente associada às respostas violentas ao comportamento e forma de lazer dos adolescentes e jovens.

No baile funk, os polícias invadem, colam, então tem confronto entre os participantes e os polícias. Os polícias jogam bombas e nós jogamos pedra. Não nós que eu falo [Referência ao grupo da Oficina]. (Homem, Oficina 01)

Trazendo esses elementos de autoidentificação e diferenciação para o plano da articulação com o Passo 2 da metodologia proposta, vê-se que, no baile funk, a ordem de gênero e a classe (aqui referida como acesso ao consumo de bens e status social) se instituem e se expressam de forma intersectada. Os homens jovens considerados como de “status social” são os mais cobiçados pelas meninas, significando uma forma de poder desse segmento masculino e de assertividade diante das mulheres. Todavia, a falta de oportunidades de trabalho gera um quadro de exclusão e, em uma lógica perversa de exclusão, violência e presença do tráfico de drogas, a condição de trabalhar para o tráfico e se envolver em roubos e furtos são naturalizadas como “trabalho” por alguns dos participantes da pesquisa, sobretudo adolescentes homens.

O rico chega lá [para comprar] com cartão. Você não vai ver ele tirando a carteira e pegando o dinheiro. Ele vai pagar com o cartão de débito. (Homem, Oficina 04)

[…] às vezes, o menino é chamado para entregar drogas na rua, de um lugar para o outro, mesmo que ele não use, pra poder ter um dinheiro. (Homem, Oficina 08)

Porque não tem trabalho, […] não tem essa condição então, eles acabam roubando. (Homem, Oficina 08)

Nesse contexto, as adolescentes salientaram que a diferença de poder entre os homens ocorre de acordo com a posição que estes ocupam nos diferentes espaços do território e segundo as categorias locais de “status social”. Para os adolescentes homens, a performance masculina socialmente aceita é ser “valentão” e violento. As falas das adolescentes mulheres sobre os homens naturalizam e banalizam suas experiências de violências, como se “ser violento” fizesse parte da sociabilidade masculina, a qual guarda diferenciações com o universo feminino no território. O relato abaixo corrobora as referências de masculinidade assentadas na virilidade e violência, que são culturalmente aceitas em segmentos da sociedade contemporânea e atravessam classes sociais e gerações, mas são relativizadas segundo o contexto de relação de poder entre homens.

Ele aqui entre a gente, ele acha que é malandro, que manda em todo mundo, que pode bater em todo mundo. Ele pode fazer o que bem quer. Quando vai na biqueira e está devendo, leva um tapa na cara e pede desculpas […]. Na cadeia, vira mocinha, vira um mocinha. (Mulher, Oficina 10)

O Passo 3 na análise interseccional multinível(1616 Winker G, Degele N. Intersectionality as multi-level analysis: dealing with social inequality. Eur J Women Stud 2011;18(1):51-66. https://doi.org/10.1177/1350506810386084
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) busca estabelecer associações entre o nível das práticas e as representações simbólicas que dão sentido às primeiras, com o propósito de alcançar normas e valores partilhados pelo grupo, buscando localizá-los em relação à estrutura social e ao objeto de análise (violência).

Na escola e no baile funk, é comum a presença de adolescentes e jovens que se envolvem em situações de violências; alguns, inclusive, que já tiveram experiências no sistema prisional. Ao discorrerem sobre suas práticas cotidianas no território e sobre as práticas de seus pares, os adolescentes destacaram aspectos positivos e negativos dos bailes funk. Em termos positivos, relatam que são eventos nos quais a socialização e a participação coletiva oferecem satisfações diretas e imediatas.

A parte positiva [do baile funk] é que todos se divertem. Isso é importante porque os jovens não têm outra opção [de lazer]. (Mulher, Oficina 03)

Quanto ao lado negativo do baile funk, foram enfatizados o som altíssimo, o consumo de drogas, o estímulo ao consumo de produtos de marca e a exploração do corpo da mulher. Dentro do que se chama “funk ostentação”, essa exploração ocorre, principalmente, no momento em que algumas meninas estão “louconas”.

[…] A menina vai ao baile funk, ela bebe e fica loucona. Os meninos não querem nem saber, levam ela lá, depois fica grávida e não sabe nem de quem é o pai do filho, é aí? (Mulher, Oficina 01)

As práticas cotidianas dos adolescentes estão indissociáveis da estrutura social, na qual o pertencimento de classe e o local de moradia, a raça/cor e gênero são basilares para as possibilidades concretas de existência. Soma-se a isso a mídia, a qual reforça estereótipos que atrelam esses jovens às criminalidades e violências. Como reflexo disso, e constrangidos pela ordem social e suas estruturas opressivas, os jovens dizem não serem “ninguém” socialmente.

A mídia fala que a zona leste é uma zona perigosa, […] para a mídia, ser jovem em Guaianases é álcool e drogas e violência. (Homem, Oficina 01)

Porque onde eu moro, ou mesmo aqui, nas redondezas, você não é ninguém. Se você estiver saindo do baile funk e tomar um tiro, você não é ninguém, [mas se] se eu estou saindo da escola e estou com uniforme, e o policial me para, ele sabe que eu sou da escola. (Homem, Oficina 03)

Para se protegerem das violências, das discriminações e dos problemas que enfrentam, os adolescentes sublinham a necessidade de melhor interação entre os moradores do território, assim como a participação em projetos sociais locais, a fim de obterem alguma resposta às suas demandas por melhores condições de vida, trabalho e lazer. Como medida de proteção, enfatizam o uniforme escolar. Outrossim, apontam a religião, que, para alguns, teria a prerrogativa de ser refúgio contra a violência externa; todavia, nem mesmo o pertencimento às comunidades religiosas locais, particularmente evangélicas, é garantia de proteção.

Um pai que dá de tudo, mostra o caminho para o filho, mesmo assim, às vezes, usa drogas. Tipo, os crentes têm carinho, educação, mas se você for na cadeia, a maioria que está lá é filho de pastor, filho de gente que vai na igreja. Os pais mostraram o que é certo e o que é errado, mesmo assim, ele foi para o lado errado por influência dos amigos. (Mulher, Oficina 09)

No Passo 4 da análise, apresentada no tópico discussão, busca-se implementar a síntese analítica do objeto articulado com as categorias de diferenciação social consideradas no estudo (classe social, gênero e raça/cor). Para tanto, e considerando os três passos anteriores da análise, que contemplam as dimensões da identidade, das representações sociais e da estrutura social, adicionase, nesta síntese interpretativa final, o diálogo com alguns estudos acerca do objeto e tema em questão: os jovens vivendo em contextos de periferia urbana.

DISCUSSÃO

A periferia é depositária da lógica da sociedade circundante que reafirma os pretos, pardos e pobres como criminosos e violentos. Nessa lógica, parte dos adolescentes e jovens tende a (re)produzir violências em suas práticas cotidianas, bem como associações com o crime e com o tráfico. Consequentemente, serão alvo de situações de violência que os levam à morte ou ao encarceramento(33 Cerqueira DRC, Lima RS, Bueno S, Neme C, Ferreira H, Coelho D, et al. Atlas da violência [Internet]. Rio de Janeiro: IPEA; 2018 [cited 2019 Sep 10]. Available from: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/180604_atlas_da_violencia_2018.pdf
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,1717 Carvalho S. O encarceramento seletivo da juventude negra brasileira: a decisiva contribuição do poder judiciário. Rev Fac Direito. 2015;67:623-52. https://doi.org/10.12818/P.0304-2340.2015v67p623
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), com impacto deletério na saúde desse segmento, o que demanda ações urgentes no campo das políticas públicas intersetoriais.

Cabe frisar que, consideradas em seus contextos, as práticas cotidianas dos adolescentes e jovens se expressam em suas relações sociais e são conformadas com base em posições sociais de diferenciação segundo raça/cor; dos recursos do território, em que a presença do Estado é mínima, no sentido de provisão de serviços e acesso aos direitos universais(1818 Campos CMS, Mishima SM. Necessidades de saúde pela voz da sociedade civil e do Estado. Cad Saude Publica. 2005;21(4):12060-8. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2005000400029
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); e pela reprodução social(1919 León RB, Villaveces A, Eastman AC. Understanding the uneven distribution of the incidence of homicide in Latin America. Int J Epidemiol. 2008;37:751-7. https://doi.org/10.1093/ije/dyn153
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). Portanto, suas práticas cotidianas não se reduzem ao mero exercício de individualidades(2020 Certeau M. A invenção do cotidiano. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes; 2014.). Assim, os adolescentes e jovens experimentam diariamente os tensionamentos no sentido de construir projetos de vida e buscar realizá-los sob condicionantes sociais impostos.

Convém ressaltar que esses jovens são adeptos do funk ostentação, no qual se tem a diminuição das referências do cotidiano das favelas do funk carioca(2121 Fascina A. “Não me bate doutor”: funk e criminalização da pobreza. Anais do V ENECULT: Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura; 2009; Mai 27- 29; Salvador, Bahia. Brasil.), para a adoção daquele gênero musical que valoriza o consumo, os produtos de marca e as belas mulheres(2222 Pereira AB. Funk ostentação em São Paulo: imaginação, consumo e novas tecnologias da informação e da comunicação. Rev Estud Cult [Internet]. 2014[cited 2019 Sep 10];01:1-18. Available from: https://www.revistas.usp.br/revistaec/article/view/98367
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). Isso faz aflorar contradição em sua sociabilidade, pois as pessoas do local têm dificuldade de adquirir esses produtos(2323 Oliveira E, Soares CB, Batista LL, Separavich MA. Midiatização da periferia: como os jovens se posicionam. In: Marques E, organizador. Representações Cotidianas: teoria e prática. Curitiba: CVR; 2018.), de modo que expressam isso sob a forma de violência simbólica.

No que tange ao baile funk (um dos modos de lazer e socialização dos adolescentes participantes da pesquisa), a mídia(2222 Pereira AB. Funk ostentação em São Paulo: imaginação, consumo e novas tecnologias da informação e da comunicação. Rev Estud Cult [Internet]. 2014[cited 2019 Sep 10];01:1-18. Available from: https://www.revistas.usp.br/revistaec/article/view/98367
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) e alguns moradores do território estereotipavam e homogeneizavam seus idealizadores e praticantes como criminosos. Nessa direção, foram criadas leis que proíbem o uso de aparelhos sonoros em vias públicas, a fim de impedir eventos como os bailes funk(2424 Governo do Estado de São Paulo. Lei Nº 16.049, de 10 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a emissão de ruídos sonoros provenientes de aparelhos de som portáteis ou instalados em veículos automotores estacionados e dá outras providências. Diário Oficial do Estado de São Paulo. 11 de dezembro de 2015.), que são realizados nas ruas com sons altíssimos.

Assim sendo, legitima-se o aparato legal da segurança pública que criminaliza e ataca os jovens pobres negros da periferia, sobressaindo a intersecção das diferenças (especialmente raça/cor, classe e geração) que os estratifica socialmente, levando-os a experimentar violências nos momentos de lazer. Diante do exposto, os adolescentes expressaram ser atingidos pela violência simbólica dos discursos discriminatórios que inferiorizam seu gosto pelo gênero musical funk, assim como pela violência subjetiva, tanto por relações violentas no território entre os pares quanto por aquelas perpetradas por agentes do Estado, nomeadamente os policiais.

Sendo assim, vale observar que a violência sistêmica do racismo se configura nas práticas e controle punitivo das agências penais. Estas, preferencialmente, criminalizam os modos de expressão de adolescentes e jovens da periferia, exteriorizando a naturalização de práticas racistas pelos poderes públicos, em que a polícia cumpre seu papel histórico de cúmplice escravagista(1717 Carvalho S. O encarceramento seletivo da juventude negra brasileira: a decisiva contribuição do poder judiciário. Rev Fac Direito. 2015;67:623-52. https://doi.org/10.12818/P.0304-2340.2015v67p623
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) sustentando a relação de dominação e exclusão(99 Žižek S. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo; 2014.).

Como exemplo de confirmação da exclusão social, o Brasil ultrapassou, em 2016, a marca de 700 mil encarcerados. Naquele ano, havia 352,6 pessoas presas para cada 100 mil habitantes, 55% das quais eram jovens de 18 a 29 anos, 64% eram pretos e pardos, e a maioria era do sexo masculino(1717 Carvalho S. O encarceramento seletivo da juventude negra brasileira: a decisiva contribuição do poder judiciário. Rev Fac Direito. 2015;67:623-52. https://doi.org/10.12818/P.0304-2340.2015v67p623
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,2525 Ministério da Justiça (BR). Infopen. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública; 2017. 67 p.). Esses dados corroboram as narrativas dos participantes de que muitos estudantes do território haviam passado pelo sistema prisional e tido a participação na venda de drogas como condição que potencializa o encarceramento massivo de jovens negros pobres.

Convém salientar que as adolescentes participantes da pesquisa destacaram que, uma parcela das meninas, no âmbito do baile funk, se engaja em relações sexuais desprotegidas e busca por homens que detenham e demonstrem poder, como forma de exibir prestígio social. Conforme ressaltam alguns estudos, do mesmo modo que, no baile funk, tem-se ampla participação de mulheres(2222 Pereira AB. Funk ostentação em São Paulo: imaginação, consumo e novas tecnologias da informação e da comunicação. Rev Estud Cult [Internet]. 2014[cited 2019 Sep 10];01:1-18. Available from: https://www.revistas.usp.br/revistaec/article/view/98367
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), há, não raramente, nas letras das músicas, a “coisificação do corpo da mulher”, podendo remeter à violência sexual e ao sexo desprotegido(2626 Brilhante AVM, Giaxa RRB, Branco JGO, Vieira LJES. Cultura do estupro e violência ostentação: uma análise a partir da artefactualidade do funk. Interface (Botucatu) 2019;23:e170621. https://doi.org/10.1590/interface.170621
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). Embora essa ótica do baile funk evidencie as relações de conflitos e tensão entre homens e mulheres, estudos têm apontando que as mulheres possuem participações ativas nos bailes, sendo público fundamental para a realização e sucesso desses eventos(2222 Pereira AB. Funk ostentação em São Paulo: imaginação, consumo e novas tecnologias da informação e da comunicação. Rev Estud Cult [Internet]. 2014[cited 2019 Sep 10];01:1-18. Available from: https://www.revistas.usp.br/revistaec/article/view/98367
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).

Conforme pode-se apreender dos relatos dos adolescentes homens e mulheres, são nos espaços de socialização, permeados por conflitos e contradições, que as relações sociais — e, portanto, relações de gênero entre os jovens — vão sendo construídas(2727 Connell R. Gênero em termos reais. São Paulo: nVersos; 2016.). Nesse contexto, no qual as masculinidades de adolescentes e jovens são conformadas e se efetivam com base em referências ao padrão dominante da masculinidade, parcela dos adolescentes e jovens reproduz demonstrações de poder, virilidade e violência como parte da norma esperada de masculinidade, ainda que não se possam generalizar esses achados.

Nessa perspectiva, segundo os achados do estudo, os adolescentes referem que ser homem negro da periferia equivale a ser um sujeito inferiorizado, sofrendo as violências sistêmica e simbólica da sociedade de classe social com corte de raça/cor99 Žižek S. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo; 2014.. Isso pode justificar os múltiplos fatores que os associam às diferentes violências(2828 Peres MFT, Azeredo CM, Rezende LFM, Zucchi EM, Franca-Jr, Luiz OC, et al. Personal, relational and school factors associated with involvement in fights with weapons among school-age youth in Brazil: a multilevel ecological approach. Int J Publ Health Sci. 2018;63:957-65. https://doi.org/10.1007/s00038-018-1128-0
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) e à maior mortalidade, quando comparados com outros segmentos de jovens do sexo masculino(33 Cerqueira DRC, Lima RS, Bueno S, Neme C, Ferreira H, Coelho D, et al. Atlas da violência [Internet]. Rio de Janeiro: IPEA; 2018 [cited 2019 Sep 10]. Available from: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/180604_atlas_da_violencia_2018.pdf
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,1919 León RB, Villaveces A, Eastman AC. Understanding the uneven distribution of the incidence of homicide in Latin America. Int J Epidemiol. 2008;37:751-7. https://doi.org/10.1093/ije/dyn153
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).

No cotidiano, os adolescentes participantes do estudo reportam que ser homem jovem periférico é ser “ninguém” perante as estruturas sociais. Considerando que a política do medo e da invisibilidade são formas cruéis de coerção do Estado, os adolescentes reforçam o desgaste de viver na pobreza e sob pressão do Estado e de outras instituições(99 Žižek S. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo; 2014.,2727 Connell R. Gênero em termos reais. São Paulo: nVersos; 2016.) que não os reconhecem como cidadãos. Esses desgastes e pressões recaem sobre a saúde física e mental dos adolescentes, que, expostos às violências, se envolvem em comportamentos prejudiciais como o consumo de drogas, sexo inseguro e envolvimento em situações de violência22 World Health Organization (WHO). Preventing youth violence: an overview of the evidence [Internet]. World Health Organization. Geneva: WHO; 2016 [cited 2019 Sep 10]. Available from: https://www.who.int/violence_injury_prevention/violence/youth/youth_violence/en/
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. Além disso, o estudo mostra situações de adolescentes que, vivendo em contextos de periferia urbana, sofrem estigmas e isolamento social, prejudiciais à saúde mental(2929 Cassidy T, Inglis G, Wiysonge C, Matzopoulos R. A systematic review of the effects of poverty deconcentration and urban upgrading on youth violence. Health Place. 2014;26:78-87. https://doi.org/10.1016/j.healthplace.2013.12.009
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).

Em razão das situações cotidianas de discriminação e exclusão, os adolescentes buscam medidas protetoras em face das violências, mas não obtêm sucesso. Em relação a se protegerem das influências dos amigos, os estudos epidemiológicos são controversos quanto à influência dos amigos nos comportamentos violentos nesse segmento(2828 Peres MFT, Azeredo CM, Rezende LFM, Zucchi EM, Franca-Jr, Luiz OC, et al. Personal, relational and school factors associated with involvement in fights with weapons among school-age youth in Brazil: a multilevel ecological approach. Int J Publ Health Sci. 2018;63:957-65. https://doi.org/10.1007/s00038-018-1128-0
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). Quanto à religião, ela não traz esperança, dado que não mais resulta em respeito absoluto como outrora(99 Žižek S. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo; 2014.,1919 León RB, Villaveces A, Eastman AC. Understanding the uneven distribution of the incidence of homicide in Latin America. Int J Epidemiol. 2008;37:751-7. https://doi.org/10.1093/ije/dyn153
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). Ademais, entende-se que reconhecer o círculo da (re)produção da violência é fundamental para o enfermeiro e outros profissionais da saúde prestarem cuidados aos jovens e se envolverem na elaboração e implementação de políticas públicas de saúde e sociais na perspectiva interseccional e de caráter intersetorial. Ademais, é fundamental a desconcentração da pobreza do território enquanto medida de prevenção(2929 Cassidy T, Inglis G, Wiysonge C, Matzopoulos R. A systematic review of the effects of poverty deconcentration and urban upgrading on youth violence. Health Place. 2014;26:78-87. https://doi.org/10.1016/j.healthplace.2013.12.009
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), como também melhorar as condições de trabalho e vida da população do território.

Limitações do estudo

Uma limitação deste estudo está na realização da análise interseccional com os jovens da periferia urbana, impossibilitando ampliar o diálogo sobre as experiências dos jovens do ponto de vista interseccional. A pequena presença de adolescentes mulheres nas oficinas dificulta análises relacionais de gênero mais consistentes.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde e política pública.

Este estudo contribui para a área da enfermagem e saúde pública ao utilizar a interseccionalidade para a compreensão das diferentes violências sofridas por adolescentes e jovens em contextos de periferia. Diante dessa realidade e tendo em vista a relevância das diferentes formas de experiências de violência e discriminação com impacto na reprodução das desigualdades sociais e na saúde dos jovens(44 Monteiro S, Cecchetto F. Discriminação, cor/raça e masculinidade no âmbito da saúde: contribuições da pesquisa social. In: Gomes R. Saúde do homem em debate [Internet]. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2011 [cited 2019 Sep 10]. p. 129-44. Available from: http://books.scielo.org/id/6jhfr/pdf/gomes-9788575413647-06.pdf
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), estes devem ser chamados à discussão dos problemas que enfrentam como cidadãos. A elaboração e implementação de políticas públicas voltadas para as múltiplas dimensões sociais que atravessam a realidade dos sujeitos e suas experiências concretas têm maior alcance e efetividade de ações, particularmente entre aquelas orientadas pela intersetorialidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise das práticas cotidianas dos adolescentes em contexto de pobreza urbana revela sistemas de desvantagens sociais que se entrelaçam e criam opressões para além da base econômica, tais como gênero, raça/cor, geração e local de moradia, as quais influenciam suas experiências e (re)produzem as violências e as discriminações sociais que sofrem.

O marcador “classe social” é traduzido no universo simbólico dos adolescentes como a falta de oportunidades, a baixa remuneração, a moradia em local de exclusão social e a escassez de opções de lazer. Nesse contexto, as narrativas de alguns adolescentes, especialmente os homens, estabelecem relações de proximidade entre parte de alguns homens jovens da periferia e o trabalho com o tráfico de drogas bem como o envolvimento em furtos e roubos, alternativas viáveis diante da falta de recursos e enquanto modo de inserção em grupos de pares locais.

Os recursos oriundos das práticas relacionadas com o tráfico permitem o consumo e a ostentação entre esse segmento de homens jovens da periferia. Essa dimensão do “ser homem jovem” intersecciona com o marcador social de gênero, ou seja, com os elementos dos padrões de masculinidade predominantes entre os jovens — assentados na virilidade, em correr riscos e no envolvimento em relações de violência. Tais padrões são exercitados localmente como forma de ampliar as possibilidades de conquista do sexo oposto e do exercício de poder sobre as mulheres.

Os participantes ressaltam que a masculinidade em parte do segmento de homens jovens nesse território é significada na qualidade de demonstração de poder, virilidade e violência, refletindo um padrão hegemônico assentado na valorização do consumo, das marcas famosas e das belas mulheres. Nesse contexto, a assimetria de poder entre homens e mulheres é banalizada, naturalizada, o que legitima formas de violência contra as mulheres, expressas na desmoralização, objetificação, assédio, violência física e sexual(3030 Pinho AO. O efeito do sexo: políticas de raça, gênero e miscigenação. Cad Pagu. 2004;23:89-119. https://doi.org/10.1590/S0104-83332004000200004
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). Embora tais padrões de comportamento atravessem a sociedade brasileira, eles carregam contradições e tensões de um processo histórico dinâmico, que reconfigura as posições históricas dos sujeitos em relação(3131 Brah A. Diferença, diversidade, diferenciação. Cad Pagu. 2006;26:329-76. https://doi.org/10.1590/S0104-83332006000100014
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).

No espaço do baile funk, se intersecta raça/cor com classe social e gênero. Considerando o funk como um lócus de experiência da juventude no território, a expressão do racismo em intersecção com a condição de pobreza na periferia cria e dá sustentação a expressões da juventude da periferia como resistência(88 Pinho O. A “fiel”, a “amante” e o “jovem macho sedutor”: sujeitos de gênero na periferia racializada. Saude Soc. 2007;16(2):133-45. https://doi.org/10.1590/S0104-12902007000200013
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,1414 Damião PL. A ressignificação do espaço: produção e circulação de cultura contra hegemônica nas periferias da cidade de São Paulo [Dissertação]. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas; Universidade de São Paulo; 2014. 202 p.). Ao mesmo tempo, expõe os atributos que a sociedade usa para estratificar e colocar os sujeitos em uma posição hierárquica de inferioridade, naturalizando as desigualdades e justificando as discriminações de raça/cor e classe.

Nesse sentido, à medida que os rótulos discriminatórios fixam o que é ser jovem da periferia (violentos, criminosos, perigosos, negros), a lógica dominante do “nós” versus “eles” perpetua a segregação social. Tais atribuições têm reflexos na saúde física e mental dos jovens, como visto: violências, sexo desprotegido, gravidez na adolescência, consumo abusivo de drogas. Logo, é imprescindível instrumentalizar enfermeiros e outros profissionais da saúde para que, em sua atuação com os jovens, não os levem a sofrer outras violências no momento do atendimento e cuidado oferecidos.

MATERIAL SUPLEMENTAR

Comunicação em saúde: pesquisa-ação para elaboração de programa midiático de educação sobre drogas direcionada a jovens, link: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7141/tde-09112015-152548/pt-br.php

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Priscilla Valladares Broca

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2020
  • Aceito
    15 Ago 2021
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