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CONDICIONANTES DAS EMISSÕES DE DIÓXIDO DE CARBONO (CO2) NO BRASIL: EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS DE UMA CURVA NO FORMATO DE “N”

CONDITIONS OF CARBON DIOXIDE (CO2) IN BRAZIL: EMPIRICAL EVIDENCE OF A CURVE IN THE "N" FORMAT

RESUMO

Este artigo tem como objetivo investigar empiricamente quais os principais condicionantes das emissões de CO2 no Brasil no período 1971-2011. Além disso, este trabalho procura evidências da hipótese da Curva de Kuznets Ambiental (CKA) para o Brasil. As variáveis utilizadas para explicar as emissões de CO2 foram a renda per capita, consumo per capita de energia, densidade populacional e o grau de abertura da economia. Também foi adicionada uma dummyexógena ao modelo para captar os efeitos do protocolo de Kyoto sobre as emissões brasileiras. O trabalho utilizou-se da metodologia de vetores autorregressivos com correção de erros (modelos VEC) para atingir seu principal objetivo. Os resultados do modelo VEC, para o longo prazo, apontaram para significância estatística de todas as variáveis explicativas do modelo. Além disso, não foram encontradas evidências de uma CKA para o Brasil. Ao contrário, encontraram-se evidências de uma curva no formato de “N”, mostrando que as emissões de CO2 diminuem apriori, mas voltam a subir a partir de determinado patamar de renda per capita. O ponto de máximo da curva ocorre quando a renda per capita atinge US$ 2.729,27 e o ponto de mínimo se dá quando a renda per capita chega a US$ 9.122,54.

PALAVRAS-CHAVE:
Curva de Kuznets Ambiental; emissões brasileiras de CO2; econometria de séries temporais

ABSTRACT

This article aims to empirically determine the main determinants of CO2 emissions in Brazil throughout the period 1971-2011. Moreover, we seek empirical evidences to support the hypothesis of the Environmental Kuznets Curve (EKC) for Brazil. The variables used to explain CO2 emissions were per capita income, per capita energy consumption, population density, and the degree of openness of the economy. We also added an exogenous dummy to the model to capture the effects of the Kyoto Protocol on Brazilian emissions. The methodology used to achieve our main goal was the autoregressive vectors model with error correction (VEC models). The results produced by the VEC model for the long term pointed to the statistical significance of all explanatory variables in the model. In addition, no evidence was found of a EKC to Brazil. Instead, we found evidence of a curve in the "N" format, showing that CO2 emissions first decrease, but then rise again from a certain level of per capita income. The maximum point of the curve occurs when per capita income reaches US$ 2,729.27, and the minimum point when per capita income is US$ 9,122.54.

KEYWORDS:
Environmental Kuznets Curve; Brazilian emissions of CO2; time series econometrics

Introdução

De maneira genérica, é possível atribuir grande parte dos problemas ambientais a uma perda crescente dos chamados serviços ecossistêmicos1 1 Serviços ecossistêmicos são a interface básica entre o capital natural e o bem-estar humano (ANDRADE e ROMEIRO, 2011). (MEA, 2005). As mudanças climáticas se destacam neste contexto como um dos principais desafios da humanidade, tanto pela sua complexidade como pela urgência na sua solução (IPCC, 2014). Se, por um lado, a atenuação de seus efeitos requer a redução nas emissões de gases de efeito estufa (GEE), o que se evidencia pelo comprometimento formal de redução de emissões por parte de vários países;por outro, significa incorrer em altos custos de mitigação, já que exige que as nações diminuam a utilização de um dos principais fundamentos da moderna civilização industrial, qual seja, os combustíveis fósseis.

Neste intricado contexto, como pré-requisito para a elaboração de políticas eficazes e eficientes que auxiliem os países a alcançarem suas metas, há que se aprimorar a compreensão sobre os condicionantes de curto e longo prazo das emissões de dióxido de carbono (CO2), bem como sobre as relações entre crescimento econômico e degradação ambiental em geral. Isto se faz necessário na medida em que os diversos países terão mais chances de serem bem-sucedidos nos esforços de mitigação ou adaptação às mudanças climáticas, se estiverem respaldados em sólidos estudos que elucidem as interconexões existentes entre as diversas variáveis que condicionam o progresso socioeconômico humano e as emissões de CO2 e outros gases que contribuem para o efeito estufa.

É nesse sentido que o presente trabalho procura contribuir ao analisar os determinantes das emissões de CO2 da economia brasileira no período 1971-2011. O objetivo central é investigar empiricamente - por meio da modelagem econométrica de séries temporais -, quais os impactos que variáveis como renda per capita, consumo per capita de energia, densidade populacional e grau de abertura da economia tiveram sobre as emissões de CO2 no Brasil no período mencionado. Além disso, buscam-se evidências para a hipótese de Curva Ambiental de Kuznets (CKA) no Brasil. Para tanto, o trabalho utiliza a metodologia de vetores autorregressivos com correção de erros (modelos VEC) para atingir seu principal objetivo. O restante do trabalho se dedica a apresentar os materiais e os métodos utilizados, bem como a descrição dos resultados encontrados. Antes, porém, a primeira seção faz um breve resgate sobre a relação entre crescimento econômico e meio ambiente à luz da CKA.

Crescimento econômico e meio ambiente - a Curva de Kuznets Ambiental

Aspectos teóricos

Desde o fim da década de 1960, a relação entre crescimento econômico e meio ambiente tem sido objeto de um intenso debate. A publicação do documento The limits to growth, elaborado em 1972 por diversos pesquisadores do Massassuchets Institute of Technology (MIT),a pedido dos membros do Clube de Roma, chamou a atenção ao apontar uma barreira biofísica para o crescimento contínuo da renda mundial. Tal barreira seria imposta pela base finita de recursos naturais do planeta (MEADOWS etal., 1972MEADOWS, D.H. et al. Limits to growth. New York: Universe Books, 1972.).

No fim da década de 1980, o debate entre o nível de renda da economia e a degradação ambiental toma outra vertente. O relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (World Comission on Environment and Development - WCED) foi um marco teórico importante, pois apresentou a possibilidade de se alcançar a sustentabilidade sem que houvesse mudanças significativas no sistema econômico, lançando a ideia de desenvolvimento sustentável (definido como aquele que atende às necessidades presentes sem comprometer as necessidades das gerações futuras). A partir de então, consolidou-se a visão de que o crescimento econômico era uma solução viável para os problemas ambientais, assim como também o era para problemas ligados à pobreza.

Nesse contexto, alguns autores começaram a investigar a relação entre crescimento da renda e degradação ambiental a partir da hipótese de uma curva em formato de “U” invertido. A lógica é que nos estágios iniciais do processo de crescimento econômico há um aumento da degradação ambiental, mas que este, por si só, engendra posteriormente uma redução na deterioração ambiental. Essa relação ficou conhecida na literatura como CKA, em referência ao estudo clássico de Kuznets (1955KUZNETS, S. Economic growth and income inequality. American Economic Review, v. 45, p. 1-28. 1955.) para explicar o nível de atividade econômica e distribuição de renda nas economias dos países.

De acordo com Lucena (2005LUCENA, A. F. P. Estimativa de uma Curva de Kuznets Ambiental aplicada ao uso de energia e suas implicações para as emissões de carbono no Brasil. Dissertação (Mestrado em Planejamento Energético) - Faculdade de Engenharia,Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005.), a CKA é uma hipótese acerca da relação entre indicadores de degradação ambiental e a renda per capita. Segundo o autor, nos estágios iniciais do desenvolvimento econômico a degradação ambiental e a poluição aumentariam juntos com a renda per capita. Contudo, após um certo nível de renda (denominado de “ponto de inflexão”; em inglês, turning point), que varia de acordo com os indicadores estudados, essa tendência se reverteria de tal forma que a qualidade ambiental melhoraria com o crescimento econômico. Tal efeito foi denominado por alguns autores como “descolamento” (decoupling) entre a atividade econômica e pressão ambiental (IBRD, 1992). Isso implica que o impacto ambiental se apresenta como uma função na forma de “U” invertido da renda per capita.

A busca por evidências da CKA se iniciou com o trabalho de Grossman e Krueger (1991GROSSMAN, G.; KRUEGER, A. Environmental impacts of a North American free trade agreement. NBER Working Papers, n. 3914, 1991.), no qual os autores estimaram os possíveis impactos ambientais de um acordo de livre comércio entre os países da América do Norte, o North American Free Trade Agreement (NAFTA). No entanto, o conceito popularizou-se com a publicação do Relatório de Desenvolvimento Mundial (IBDR, 1992). Posteriormente, mais três trabalhos publicados na primeira metade da década de 1990 tornaram-se relevantes para o tema, quais sejam: Shafik e Bandyopadhyay (1992SHAFIK, N.; BANDYOPADHYAY, S. Economic growth and environmental quality: a time series and cross-country evidence. Journal of Environmental Economics and Management, v. 4, p. 1-24, 1992.), Selden e Song (1994SELDEN, T. M.; SONG, D. Environmental quality and development: is there a Kuznets Curve for air pollution emissions? Journal of Environmental Economics and Management, v. 27, n. 2, p. 147-162, 1994.) e Grossman e Krueger (1995).

Em termos gerais, a estimação da CKA parte de um modelo simples que relaciona renda a um indicador de degradação ambiental:

E i t = α i + λ t + β 1 Y i t + β 2 Y i t 2 + β 3 Y i t 3 + γ ' X i t + u i t (1)

Em (1), E representa algum indicador de degradação ambiental; Y é a medida da renda; X é um vetor de outras variáveis explicativas, enquanto α representa efeitos específicos à unidade, constantes no tempo; e λ, os efeitos temporais, comuns a todas as unidades. Para que a hipótese da CKA seja validada, é necessário que β1>0, β2< 0 e β30.

O que se torna preponderante para a hipótese da CKA são os mecanismos que explicam a inversão da trajetória positivamente inclinada para uma negativamente inclinada. Segundo Everett et al. (2010EVERETT, T. et al. Economic growth and the environment. Defra Evidence and Analysis Series, n. 2, Mar. 2010. Disponível em: <Disponível em: https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/69195/pb13390-economic-growth-100305.pdf >. Acesso em: 06 de jul. 2015.
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), em termos gerais, a reversão da trajetória da CKA seria explicada por três motivos:

  1. A níveis baixos de renda per capita, a redução da poluição é indesejável, uma vez que os indivíduos estão preocupados em satisfazer suas necessidades básicas de consumo;

  2. Quando certo nível de renda é atingido, os indivíduos começam a considerar o trade-off entre crescimento econômico e qualidade ambiental, e a degradação ambiental começa a decrescer a taxas inferiores;

  3. Depois de certo ponto, os gastos com melhorias na qualidade ambiental dominam as preferências dos indivíduos, de tal forma que se observa uma reversão da relação inicial entre renda e degradação ambiental.

Outros fatores que explicam a inversão da CKA são os diferentes efeitos que o crescimento econômico causa no meio ambiente, a saber: efeito escala, efeito composição e efeito técnico ou tecnológico. O efeito escala acontece pelo fato de o crescimento econômico resultar em efeitos negativos sobre o meio ambiente, ou seja, o aumento da produção e do consumo de bens e serviços causa, inevitavelmente, uma deterioração dos recursos naturais. O efeito composição está relacionado com a mudança da composição da produção de uma economia, que passa de uma produção primária, baseada principalmente em atividades agrícolas e extrativistas, para uma segunda fase na qual a participação da indústria é predominante. O último estágio é quando a economia se move em direção ao terceiro setor (serviços), em que a degradação ambiental se reduz. O terceiro efeito é o técnico e se refere ao desenvolvimento de novas técnicas produtivas que agridem menos o meio ambiente. Por último, tem-se as mudanças nas preferências da sociedade que podem alterar as formas de produção e as opções de consumo de uma economia. A magnitude destes quatro efeitos em conjunto é o que define a relação entre o crescimento econômico e a degradação ambiental (EVERETT et al., 2010EVERETT, T. et al. Economic growth and the environment. Defra Evidence and Analysis Series, n. 2, Mar. 2010. Disponível em: <Disponível em: https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/69195/pb13390-economic-growth-100305.pdf >. Acesso em: 06 de jul. 2015.
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).

Outros autores oferecem uma explicação alternativa para a fase descendente da curva. Selden e Song (1994SELDEN, T. M.; SONG, D. Environmental quality and development: is there a Kuznets Curve for air pollution emissions? Journal of Environmental Economics and Management, v. 27, n. 2, p. 147-162, 1994.) indicam alguns fatores que atuariam como amortecedores ou compensadores do processo. São eles: (i) elasticidade-renda positiva para a qualidade ambiental, ou seja, à medida que a renda aumenta as pessoas tendem a querer mais qualidade ambiental; (ii) mudanças na composição da produção e do consumo; (iii) aumento do nível educacional e consciência ambiental; e (iv) sistemas políticos mais abertos.

Existe, ainda, a interpretação de que o movimento de queda na curva de degradação ambiental se deve às instituições presentes na sociedade. Nos países desenvolvidos, as instituições tomadoras de decisão seriam as responsáveis pela internalização das externalidades ambientais e, portanto, responsáveis pela diminuição da poluição gerada nessas nações. A qualidade dessas instituições poderia, inclusive, levar a relação entre renda per capita e degradação ambiental a um formato contrário daquele proposto pela CKA (JONES e MANNUELI, 1995JONES, L. E.; MANNUELI, R. D. A positive model of growth and pollution controls. NBE Working Papers, n. 5205, 1995.).

A questão básica por trás da CKA é se o crescimento econômico é ou não conciliável com a sustentabilidade ambiental, ou, dito de outra forma, se é possível uma estratégia de desenvolvimento sustentável sem a necessidade de promover drásticas mudanças na economia. Sua validade indicaria que não há necessidade de sacrificar o crescimento econômico por conta de preocupações ambientais (CARVALHO, 2013CARVALHO, S. A relação entre crescimento e o meio ambiente:uma reavaliação da Curva de Kuznets Ambiental. Texto para Discussão, IPEA, Brasília, n. 1902, nov. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/TDs/td_1902.pdf >. Acesso em: 3 abr. 2016.
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).

Revisão da literatura empírica

O grande volume de trabalhos publicados sobre CKA apresenta um aporte empírico bastante diversificado. Variam os indicadores de degradação ambiental, as especificações dos modelos e suas formas funcionais, as técnicas econométricas, os países envolvidos e o período de tempo analisado. Alguns trabalhos encontram evidências da CKA, enquanto outros criticam a alta sensibilidade dos resultados às formas funcionais. Já o arcabouço teórico apresenta desde modelos estáticos simples até complexos modelos dinâmicos de gerações superpostas (FONSECA e RIBEIRO, 2004FONSECA, L. N.; RIBEIRO, E., P. Preservação Ambiental e Crescimento Econômico no Brasil. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 32., João Pessoa, Paraíba, 7-10 dez. 2004.).

Nesta seção será feita uma breve revisão da literatura especializada sobre o tema, dando-se ênfase aos estudos seminais sobre CKA2 2 Os estudos seminais sobre CKA são aqueles publicados na primeira metade da década de 1990 e que se tornaram referência para o tema, podendo-se destacar os trabalhos de Grossman e Krueger (1991, 1995), Shafik e Bandyopadhyay (1992) e Selden e Song (1994). , nos trabalhos que utilizaram uma metodologia econométrica semelhante àquela empregada neste artigo e em outros que testaram a hipótese do “U” invertido para o Brasil. O objetivo é apresentar as principais características destes trabalhos, analisando o período de tempo, os indicadores de degradação ambiental e as variáveis utilizadas, as formas funcionais e a metodologia econométrica empregada e, por fim, os resultados encontrados.

O primeiro trabalho publicado em CKA foi o de Grossman e Krueger (1991GROSSMAN, G.; KRUEGER, A. Environmental impacts of a North American free trade agreement. NBER Working Papers, n. 3914, 1991.). Neste estudo, os autores estimaram uma CKA para o dióxido de enxofre (SO2), fumaça negra e partículas suspensas usando dados do Global Enviromental Monitoring System (GEMS) para diversas cidades em 32 países diferentes. A estimativa considerou as variáveis em nível e levou em conta outros termos que mensuravam aspectos de localidade, densidade populacional e comércio internacional, além das variáveis renda e seus respectivos termos ao quadrado e ao cubo. Os autores encontraram um ponto de inflexão da curva quando a renda atinge algo em torno de US$ 5.000 para os poluentes, sendo que no caso do material particulado suspenso no ar o valor seria ainda menor. No entanto, a partir de níveis de renda entre US$ 10.000 e US$ 15.000, os autores verificaram que os níveis de poluentes voltavam a subir.

As estimativas feitas por Shafik e Bandyopadhyay (1992SHAFIK, N.; BANDYOPADHYAY, S. Economic growth and environmental quality: a time series and cross-country evidence. Journal of Environmental Economics and Management, v. 4, p. 1-24, 1992.) levaram em conta dez indicadores de qualidade ambiental para testar a hipótese da CKA para 149 países no período de 1960-1990. A metodologia econométrica foi a de dados em painel, e as variáveis utilizadas foram - além do PIB e seus respectivos termos quadrático e cúbico - uma tendência temporal, densidade populacional e comércio externo. Os resultados obtidos para cada indicador foram bem diferentes. Para as variáveis deficit na provisão de água potável e deficit na provisão de saneamento básico, os autores obtiveram uma relação negativa com a renda ao longo do tempo. As medidas relacionadas com o desmatamento demonstram não ter relação alguma com a variável renda, enquanto a qualidade das águas tende a piorar com o aumento da renda. Para os dois indicadores de poluição do ar, os autores encontraram resultados que confirmam a CKA, com pontos de inflexão entre US$ 3.000 e US$ 4.000. Por fim, para a geração de lixo per capita por município e a emissão de carbono per capita, observaram uma relação altamente positiva com a variável renda.

Selden e Song (1994SELDEN, T. M.; SONG, D. Environmental quality and development: is there a Kuznets Curve for air pollution emissions? Journal of Environmental Economics and Management, v. 27, n. 2, p. 147-162, 1994.) estimaram a relação entre crescimento econômico e degradação ambiental, utilizando quatro tipos de poluentes: SO2, óxido de nitrogênio (NOx), partículas suspensas no ar (SPM) e monóxido de carbono (CO). Foi considerada uma amostra de 30 países no estudo, sendo que 22 eram classificados como de alta renda, 6 como de média renda e 2 como de baixa renda. A metodologia utilizada foi a de dados em painel, e o período do estudo compreendeu os anos de 1973 a 1984. O modelo econométrico teve como variáveis explicativas o PIB real per capita, seu termo ao quadrado e a densidade populacional. Os resultados encontrados pelos autores foram que a poluição ambiental se reduziria quase a zero, após ser alcançado níveis altos de renda. Os pontos de inflexão da CKA foram de $8.709 para SO2, $11.217 para NOx, $10.289 para SPM, e $5.963 para CO.

Em outro trabalho, Grossman e Krueger (1995GROSSMAN, G.; KRUEGER, A. Economic growth and the environment. Quarterly Journal of Economics, Massachussetts, v. 110, n. 2, p. 353-377, 1995.) ampliaram a base de dados utilizada em Grossman e Krueger (1991) e incluíram 14 indicadores de poluição do ar e de bacias hidrográficas. O trabalho procurou mostrar a relação entre crescimento econômico e meio ambiente para diferentes cidades em diferentes países, de acordo com a disponibilidade dos dados. Foi utilizada a metodologia de dados em painel, e os modelos econométricos tinham como variável dependente a degradação ambiental da água ou do ar. As variáveis explicativas dos modelos foram o PIB per capita e suas formas ao quadrado e ao cubo para testar a hipótese do “U” invertido. Além disso, foram incluídas as médias do PIB per capita e de suas respectivas formas quadrática e cúbica. Os autores encontraram evidências de uma curva no formato de “U” invertido para 11 indicadores de degradação ambiental utilizados. Os pontos de inflexão para os diferentes poluentes variaram, mas na maioria dos casos eles vêm antes de um país atingir uma renda per capita de US$ 8.000.

Estudos mais recentes, como os deJalil e Mahmud (2009JALIL, A.; MAHMUD, S. F. Environment Kuznets curve for CO2 emissions: A cointegration analysis for China. Energy Policy, v. 37, n. 12, p.5167-5172, dez. 2009. Disponível em: <Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0301421509005527 >. Acesso em: 05 jun. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
), Pao, Yu e Yang (2011PAO, H.; YU, H.; YANG, Y. Modeling the CO2 emissions, energy use, and economic growth in Russia. Energy, v. 36, n. 8, p. 5094-5100, ago. 2011. Disponível em: < Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0360544211003811 >. Acesso em: 13 jun. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
), Ahmed e Long (2012AHMED, K.; LONG, W. Environmental Kuznets Curve and Pakistan: an empirical analysis. Procedia Economics and Finance, v. 1, p. 4-13, 2012. Disponível em: <Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2212567112000032 >. Acesso em: 02 jun. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
), Saboori, Sulaiman e Mohd (2012aSABOORI, B.; SULAIMAN, J. B.; MOHD, S. An empirical analysis of the environmental Kuznets Curve for CO2 emissions in Indonesia: the role of energy consumption and foreign trade. International Journal of Economics and Finance, v. 4, n. 2, p.243-251, jan. 2012a., 2012b), e de Rabbi, Akbar e Kabir (2015RABBI, F.; AKBAR, D.; KABIR, S. Z. Environment Kuznets Curve for carbon emissions: a cointegration analysis for Bangladesh. International Journal of Energy Economics and Policy, v. 5, n. 1, p. 45-53, 2015. Disponível em: <Disponível em: http://www.econjournals.com/index.php/ijeep/article/view/947/726 >. Acesso em: 08 jul. 2015.
http://www.econjournals.com/index.php/ij...
)têm procurado estimar as relações causais entre crescimento econômico e meio ambiente,utilizando dados de séries de tempo e aplicando a técnica de vetores autorregressivos com correção de erros (VEC). Os modelos VEC empregados nesses estudos buscam captar as relações de curto e longo prazo entre as emissões de CO2 e as demais variáveis explicativas. No que tange ao período de tempo e às variáveis empregadas nos modelos, estes trabalhos são muito semelhantes entre si. O intervalo temporal é relativamente pequeno, o que acaba por distorcer as relações de longo prazo entre o crescimento econômico e as emissões de dióxido de carbono. Com relação às variáveis, grande parte deles utilizam um polinômio de segundo ou terceiro grau da renda per capita e alguma variável adicional para explicar as emissões de dióxido de carbono nos países, como consumo de energia per capita, densidade populacional e/ou uma variável de abertura comercial considerada como proxy do fluxo de comércio. Os resultados encontrados pelos diferentes autores são bastante heterogêneos, variando de resultados que mostram evidências da curva no formato de “U” invertido, como nos trabalhos de Jalil e Mahmud (2009), Saboori, Sulaiman e Mohd (2012b), Ahmed e Long (2012) e Rabbi, Akbar e Kabir (2015), até a insignificância, do ponto de vista estatístico, dos parâmetros que mensuram o impacto do crescimento econômico sobre o meio ambiente, conforme os estudos de Pao, Yu e Yang (2011) e Saboori, Sulaiman e Mohd (2012a).

Entre os trabalhos que abordam a questão do crescimento econômico e da degradação ambiental por meio da modelagem econométrica de séries temporais para o Brasil estão o de Pao e Tsai (2011PAO, H.; YU, H.; YANG, Y. Modeling the CO2 emissions, energy use, and economic growth in Russia. Energy, v. 36, n. 8, p. 5094-5100, ago. 2011. Disponível em: < Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0360544211003811 >. Acesso em: 13 jun. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
) e Cunha e Scalco (2013CUNHA, C. A.; SCALCO, P. R. Crescimento econômico brasileiro e emissão de CO2. Revista do Desenvolvimento Regional, Santa Cruz do Sul, v. 18, n. 2, p. 214-230, ago. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://online.unisc.br/seer/index.php/redes/article/view/2584/2815 >. Acesso em: 03 jun. 2015.
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). O período de análise dos dois estudos é bem parecido e compreende os anos entre 1980 e 2007. Enquanto o estudo de Cunha e Scalco (2013) leva em conta somente a variável renda e seu termo ao quadrado, o trabalho de Pao e Tsai (2011) acrescenta uma variável adicional ao modelo, que é o consumo de energia no país. No que diz respeito aos resultados, ambos os estudos chegam à conclusão de que não há evidências de uma CKA para o Brasil e que o consumo de energia é mais importante para explicar as emissões de CO2 no país.

Fonseca e Ribeiro (2004FONSECA, L. N.; RIBEIRO, E., P. Preservação Ambiental e Crescimento Econômico no Brasil. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 32., João Pessoa, Paraíba, 7-10 dez. 2004.), por sua vez, adotaram uma forma funcional diferente dos demais estudos analisados até aqui para explicar a degradação ambiental nos estados do Brasil entre 1985 e 2000. O modelo utilizado estabeleceu uma relação entre o percentual de áreas preservadas e o logaritmo da renda per capita, o logaritmo da escolaridade média, uma proxy para participação social (percentual de votos brancos e nulos) e o índice de Gini. As estimativas dos autores indicaram a importância da renda per capita em polinômio e da escolaridade como determinantes na extensão da proteção ambiental. Contudo, a medida de capital social (votos brancos e nulos) e a desigualdade não afetaram significativamente a variável dependente. Além disso, os coeficientes significativos foram como esperados, indicando uma CKA para os estados brasileiros.

De maneira geral, o notório entre todos estudos de CKA examinados é a grande heterogeneidade dos resultados encontrados pelos diferentes autores. Os estudos seminais sobre CKA apontaram, na grande maioria dos indicadores de poluição utilizados, para evidências da curva no formato de “U” invertido. Entretanto, os pontos de inflexão das curvas variaram bastante, com intervalos de níveis de renda per capita entre US$ 3.000 e US$ 11.000, aproximadamente. Os estudos que estimaram a CKA para alguns países por intermédio de modelos VEC também mostraram resultados bastante diferentes. A hipótese da CKA foi encontrada em países, como China, Malásia, Paquistão e Blangadesh, respectivamente, nos trabalhos de Jalil e Mahmud (2009JALIL, A.; MAHMUD, S. F. Environment Kuznets curve for CO2 emissions: A cointegration analysis for China. Energy Policy, v. 37, n. 12, p.5167-5172, dez. 2009. Disponível em: <Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0301421509005527 >. Acesso em: 05 jun. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
), Saboori, Sulaiman e Mohd (2012bSABOORI, B.; SULAIMAN, J. B.; MOHD, S. Economic growth and CO2 emissions in Malaysia: A cointegration analysis of the Environmental Kuznets Curve. Energy Policy, v. 51, p.184-191, dez. 2012b. Disponível em: < Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0301421512007471 >. Acesso em: 07 jul. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
), Ahmed e Long (2012AHMED, K.; LONG, W. Environmental Kuznets Curve and Pakistan: an empirical analysis. Procedia Economics and Finance, v. 1, p. 4-13, 2012. Disponível em: <Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2212567112000032 >. Acesso em: 02 jun. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
) e Rabbi, Akbar e Kabir (2015RABBI, F.; AKBAR, D.; KABIR, S. Z. Environment Kuznets Curve for carbon emissions: a cointegration analysis for Bangladesh. International Journal of Energy Economics and Policy, v. 5, n. 1, p. 45-53, 2015. Disponível em: <Disponível em: http://www.econjournals.com/index.php/ijeep/article/view/947/726 >. Acesso em: 08 jul. 2015.
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). Para o Brasil, o estudo que indicou evidências da curva no formato de “U” invertido foi o de Fonseca e Ribeiro (2004FONSECA, L. N.; RIBEIRO, E., P. Preservação Ambiental e Crescimento Econômico no Brasil. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 32., João Pessoa, Paraíba, 7-10 dez. 2004.). Nos demais artigos não foram encontradas evidências da hipótese da CKA, conforme visto nos estudos de Cunha e Scalco (2013CUNHA, C. A.; SCALCO, P. R. Crescimento econômico brasileiro e emissão de CO2. Revista do Desenvolvimento Regional, Santa Cruz do Sul, v. 18, n. 2, p. 214-230, ago. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://online.unisc.br/seer/index.php/redes/article/view/2584/2815 >. Acesso em: 03 jun. 2015.
http://online.unisc.br/seer/index.php/re...
) e Pao e Tsi (2011PAO, H.; YU, H.; YANG, Y. Modeling the CO2 emissions, energy use, and economic growth in Russia. Energy, v. 36, n. 8, p. 5094-5100, ago. 2011. Disponível em: < Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0360544211003811 >. Acesso em: 13 jun. 2015.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
).

Metodologia

Base de dados e análise descritiva

Conforme visto na revisão de literatura, grande parte dos estudos que tratam do nexo entre crescimento econômico e meio ambiente busca estabelecer relações de longo prazo entre PIB e degradação ambiental à luz do arcabouço teórico da hipótese da CKA. Partindo desta mesma base teórica, este trabalho adota em sua análise um período temporal mais extenso (1971-2011) e um modelo econométrico com algumas variáveis adicionais que podem ser importantes para explicar as emissões de CO2no Brasil. A degradação ambiental é mensurada pelas emissões per capita de dióxido de carbono e as variáveis adicionais inseridas no modelo são o consumo per capita de energia, o grau de abertura da economia e a quantidade de habitantes por quilômetro quadrado. Além disso, foi colocada uma dummy exógena para verificar a influência do Protocolo de Kyoto sobre o nível das emissões brasileira. Dessa forma, o modelo econométrico proposto possui a seguinte especificação:

C O 2 p c = β 0 + β 1 y + B 2 y 2 + β 3 y 3 + β 4 C E p c + β 5 D P + β 6 V C + ε t (2)

Em (2), CO 2 pc corresponde às emissões per capita de dióxido de carbono; y é o produto interno bruto per capita; y 2 é o produto interno bruto per capita ao quadrado; y 3 é o produto interno bruto per capita ao cubo; CEpc é o consumo de energia per capita; já VC é uma variável de comércio e DP é a densidade populacional. Por fim, εté o termo de erro do modelo.

As variáveis foram escolhidas com base em estudos empíricos sobre o tema e foram coletadas de diversos órgãos. Abaixo segue uma breve caracterização de cada uma delas:

  1. Emissões per capita de CO2 (CO2 pc): Esta é a variável dependente que será usada como uma proxy para a degradação ambiental. Ela representa as emissões totais de dióxido de carbono decorrentes da queima de combustíveis fósseis e da produção de cimento dividido pela população do Brasil. O motivo de sua escolha se dá pelo fato de o CO2 ser um dos gases mais importantes na geração do “efeito estufa” e seus impactos serem de escala global. Além disso, as emissões estão diretamente relacionadas com o nível de atividade econômica, de modo que a variável CO2 pc é tida como uma variável de fluxo. As emissões per capita de CO2estão em toneladas métricas de carbono e foram coletadas na base de dados World Development Indicators (WDI), do Banco Mundial.

  2. Produto Interno Bruto per capita (y): definido como a soma de todos os bens e serviços finais por habitante produzidos em uma economia. Esta variável foi incluída com o objetivo de mensurar o impacto do crescimento econômico da economia brasileira sobre as emissões de CO2. O y foi obtido junto ao WDI e está expresso em dólares de 2005 (US$ 2005).

  3. Produto Interno Bruto per capita ao quadrado (y 2): A variável (y 2) foi incluída para testar a hipótese da CKA. Para que haja evidências da curva no formato de “U” invertido é necessário que

    β2>0 e β3<0
    , implicando, assim, em aumento das emissões de CO2 nos estágios iniciais do crescimento econômico, as quais começam a declinar a partir de certo ponto. O ponto de inflexão da curva é dado por
    y*= β12β2
    (GREENE, 2003GREENE, W. H. Econometrics analysis. 5. ed. Cambridge, MA: MIT Press, 2003.).

  4. Produto Interno Bruto per capita ao cubo (y 3): esta variável será incluída para testar a hipótese da curva no formato de “N”. Para que haja evidências dessa curva no formato de “N” é necessário que

    β4>0
    , indicando que os níveis de degradação ambiental tendem a subir com o crescimento econômico após terem diminuído em um momento anterior.

  5. Consumo per capita de energia (CEpc): expressa o consumo total de energia primária dividido pela população do país. Esta variável está medida em quilogramas (kg) de óleo equivalente per capita e foi obtida junto ao site da International Energy Agency (IEA). Optou-se pela sua inclusão para captar o impacto da matriz energética brasileira sobre as emissões de CO2. Dessa forma, considera-se que o crescimento econômico brasileiro possui relação direta com a demanda de energia.3 3 Segundo dados do MME (2015), a participação de combustíveis fósseis na matriz energética do Brasil foi de, aproximadamente, 57,65% em 2013.

  6. Densidade populacional (DP): representa a quantidade de pessoas por km2. Essa série foi obtida junto ao site do United Nations Department of Economic and Social Affairs (UNDESA). Desse modo, acredita-se que, quanto maior o número de pessoas em determinada área (maior adensamento de pessoas), maior é a pressão por regulação ambiental exercida naquela localidade (SELDEN e SONG, 1994SELDEN, T. M.; SONG, D. Environmental quality and development: is there a Kuznets Curve for air pollution emissions? Journal of Environmental Economics and Management, v. 27, n. 2, p. 147-162, 1994.).

  7. Variável de Comércio (VC): mede o grau de abertura comercial da economia e foi calculada pela soma das exportações e importações dividida pelo PIB do Brasil. Quanto maior o grau de abertura de uma economia, maior é a emissão de CO2, uma vez que o nível de transações comerciais pode influenciar a quantidade de produção e de consumo de um determinado país. Os dados utilizados para o cálculo dessa variável foram obtidos do United Nations Statistics Division (UNSD).

  8. Protocolo de Kyoto (PK): foi incluída de forma exógena no modelo para representar o acordo institucional de redução de gases de efeito estufa (GEE) que emergiu no final da década de 1990. A variável PK é uma dummy que assume valor 0 até 2004 e valor 1 de 2005 em diante - ano em que o Protocolo de Kyoto entrou em vigor.

Após ser feita a caracterização das variáveis e apresentada suas respectivas fontes, partiu-se para a análise das estatísticas descritivas (média, desvio-padrão, valor mínimo e máximo) das variáveis que serão utilizadas no modelo. A Tabela 1 a seguir exibe os valores das principais estatísticas descritivas:

Tabela 1
Estatísticas descritivas das variáveis incluídas no modelo

Na Tabela 1, percebe-se que o nível médio de emissões durante o período analisado foi de 1,58 tonelada métrica de carbono por pessoa, com desvio-padrão de 0,27. O menor valor de emissão per capita foi 1,04 tonelada métrica, verificado no ano de 1971, e o valor máximo de 2,19 toneladas métricas, observado no último ano da série, ou seja, em 2011.

Com relação ao PIBpc, percebe-se que cada pessoa viveu, em média, com US$ 4.148,46 (a dólares constantes de 2005). Entre as variáveis analisadas, o desvio-padrão da renda per capita foi o maior com 673,83. O valor mínimo da série aconteceu em 1971, com US$ 2.542,36, e o valor máximo em 2011, com uma cifra de US$ 5.750,61.

O consumo médio de energia foi de 996,75 (kg de óleo equivalente per capita). O desvio-padrão foi de 150,13, e os valores mínimo e máximo foram 709,15 e 1.346,65, apurados em 1971 e 2011, respectivamente.

No que tange à densidade populacional, quantidade de pessoas por quilômetro quadrado (km2), a média foi 18 habitantes por km2 e desvio-padrão de 3,75. Os valores mínimo e máximo desta variável foram de 11 pessoas/km2 e 23 pessoas/km2, respectivamente.

O grau de abertura da economia foi, em média, de 18,75% ao longo do período. O desvio-padrão foi o menor entre as variáveis, com 0,07. O ano que o Brasil se mostrou mais fechado foi em 1986, com um grau de abertura de 10,97%. Por outro lado, o ano de 2011 foi quando se teve a maior abertura comercial, com um grau de 36,33%.

Modelagem econométrica de séries temporais

Ao se trabalhar com séries temporais, o primeiro passo é realizar os testes de raiz unitária para avaliar se as séries do modelo são estacionárias ou não.4 4 Basicamente,um processo estocástico é estacionário se suas média e variância forem constantes ao longo do tempo e o valor da covariância entre dois períodos depender apenas da distância ou defasagem entre os dois períodos, e não do período de tempo efetivo em que a covariância é calculada (ENDERS, 2015). No entanto, os testes de raiz unitária pressupõem o conhecimento do número de defasagens, uma vez que é necessário garantir que os resíduos da regressão sejam não correlacionados e, consequentemente, os resultados sejam não viesados. Dessa forma, utilizou-se os critérios de informações proposto por Akaike (1974AKAIKE, H. A new look at the statistical model identification. IEEE Transactions on Automatic Control., Boston, v. 19, n. 6, p. 716-723, Dec. 1974.), Schwarz (1978SCHWARZ, G. Estimating the dimension of a model. The Annals of Statistics, p. 461-464, 1978.) e Hannan e Quinn (1979HANNAN, E. J.; QUINN, B. G. The determination of the order of an autoregression. Journal of The Royal Statistical Society, p. 190-195, dez. 1979.) para a seleção do número de defasagens ideal.

Uma vez determinado o número de defasagens do modelo, o próximo passo é fazer os testes de raiz unitária para determinar a ordem de integração das variáveis. Os testes utilizados neste trabalho para verificar a estacionaridade das séries foram o Augmented Dickey-Fuller (ADF), o Phillips e Perron (PP) e o Kwiatkowski-Phillips-Schmidt-Shin (KPSS). A hipótese nula dos testes ADF e PP é a de um processo estocástico não estacionário (ou de raiz unitária), ao passo que o teste KPSS tem como hipótese nula a estacionaridade das séries temporais, isto é, a ausência de raiz unitária.

Após avaliar as séries temporais e constatar que elas são integradas de ordem 1 - I(1) - faz-se o teste de cointegração. Os testes de cointegração mais usados atualmente são o de Engle-Granger e o de Johansen. De acordo com Margarido (2004MARGARIDO, M. A. Teste de co-integração de Johansen utilizando o SAS. Agricultura em São Paulo, São Paulo, v. 51, n. 1, p. 87-101, jan./jun. 2004.), a vantagem do teste de Johansen em comparação ao teste de Engle-Granger está em o primeiro informar o número de vetores de cointegração, enquanto o segundo diz somente se as variáveis são cointegradas ou não. Além disso, o teste de Johansen é multivariado, de modo que se pode testar se mais de duas variáveis são cointegradas.

Em sendo assim, utilizou-se o teste de cointegração de Johansen e Juselius (1990JOHANSEN, S.; JUSELIUS, K. Maximum Likelihood estimation and inference on cointegration with applications to the demand for money. Oxford Bulletin of Economics and Statistics, v. 52, n. 2, p. 169-210, 1990.) para identificar possível relação de longo prazo entre as variáveis do modelo. Partindo de um modelo VAR:

X t = z + i = 1 p Π i X t i + Φ D t + ε t (3)

Em (3), as variáveis determinísticas z têm (n x 1) vetores e Πicontém os coeficientes de uma matriz (n x n). Dtrepresenta termos determinísticos, como, constante, tendência linear, dummies sazonais, dummies de intervenção ou qualquer outro tipo de regressor que são considerados fixos e não estocásticos.

A estimação da representação de correção de erros é dada por:

Δ X t = z + Π X t 1 + i = 1 p 1 Π i Δ X t i + Φ D t + ε t (4)

Em (4), X t é um vetor coluna (m x 1) de variáveis; z é um vetor (n x 1) de termos constantes; ∏ e Π i representam matrizes de coeficientes; p é a ordem das defasagens; e o resíduo ε t é não autocorrelacionado e homocedástico. A matriz de coeficientes ∏ é conhecida como matriz cointegrante e contém informações sobre o equilíbrio de longo prazo entre as variáveis. O número de autovalores de ∏ que são estatisticamente diferentes de zero, o que corresponde ao posto de ∏, fornece o número de vetores cointegrantes no sistema. Para se testar quantos vetores cointegrantes existem em (4), Johansen sugeriu a estatística do traço, expressa por:

λ t r a c e = T i = r + 1 n ln ( 1 λ ^ i ) (5)

Em (5), λ^i são os valores estimados dos autovalores obtidos da matriz ∏, e T é o número de observações. A hipótese nula é de que há no máximo r vetores de cointegração no sistema.

Depois de definir o número de vetores de cointegração do sistema pelo teste do traço de Johansen, estimou-se o modelo vetorial autorregressivo com o vetor de correção de erros, conhecido como VAR/VEC. Esse modelo é importante para verificar o relacionamento econômico de curto e longo prazo entre as variáveis. Em geral, a especificação deste modelo é dada por:

Δ Y t = ϕ + Π Y t 1 + α t + i = 1 p 1 Γ i Δ Y t i + ε t (6)

A equação (6) pode ser reescrita como:

Δ Y t = ϕ 1 + α 1 t + γ ( β ' Y t 1 ϕ 2 α 2 t ) + i = 1 p 1 Γ i Δ Y t 1 + ε t (7)

A intuição é que parte das variações em Y pode vir da tendência temporal ou de parte do mecanismo de correção de erros (o qual está entre parênteses). A última parte da expressão que inclui o somatório de i=1 até p-1 são os valores diferenciados da variável dependente usados para eliminar a presença de autocorrelação serial.

Além da estimação do modelo VEC, utilizou-se outros dois instrumentos para avaliar as variações nas emissões de CO2, quais sejam, a decomposição de variância dos erros de previsões e a função impulso-resposta. O primeiro instrumento mostra a participação de cada variável explicativa sobre a variável explicada na presença de choques não esperados sobre esta última. O segundo instrumento analisa a trajetória temporal de cada variável diante de choques inesperados tanto sobre a variável dependente como sobre as outras variáveis explicativas do modelo.

Resultados

Para a determinação do número de defasagens a ser usadas nos testes e no modelo, utilizaram-se os três critérios de informações (AKAIKE, SCHWARZ e HANNAN-QUINN), expostos na Tabela 2. De acordo com estes três critérios, deve-se usar quatro defasagens nos testes de raiz unitária:

Tabela 2
Critério de informação de Akaike, Schwarz e Hannan-Quinn (número de defasagens)

Depois de definir o número de defasagens para os testes e para a estimação do modelo, partiu-se para os testes de raiz unitária. A importância dos testes de estacionaridade em dados de séries temporais é determinar a ordem de integração das variáveis para aplicar a metodologia econométrica adequada. Devido ao fato de a constante e a tendência não terem se mostrado estatisticamente significantes, escolheu-se o modelo dos testes ADF, PP e KPSS que não inclui constante e tendência nas séries.

A Tabela 3 a seguir mostra os p-values dos três testes de raiz unitária para as séries temporais em nível. Percebe-se que as probabilidades foram bem grandes na segunda e terceira colunas (testes ADF e KPSS), indicando que a hipótese nula de presença de raiz unitária não fosse rejeitada. Na quarta coluna da tabela é exibido o teste KPSS. Ao contrário dos testes ADF e PP, o teste KPSS tem como hipótese nula a ausência de raiz unitária nas séries temporais. Os valores mostrados na coluna do teste KPSS indicam a rejeição da hipótese nula a um nível de significância α=5%, mostrando, assim, que as séries são não estacionárias. Desse modo, conclui-se pelos três testes executados que as séries são não estacionárias em nível, isto é, não seguem um passeio aleatório.

Tabela 3
Valores “p” dos testes de raiz unitária das variáveis em nível

Após ser verificado que todas as séries apresentaram raiz unitária em nível, fez-se os testes de raiz unitária na primeira diferença. Os testes para verificar a estacionaridade das séries temporais na primeira diferença são importantes para determinar a ordem de integração das variáveis. A Tabela 4 apresenta os p-values dos testes de raiz unitária empregados nas primeiras diferenças das séries. Nota-se que na segunda e terceiras colunas (testes ADF e PP) as probabilidades são muito pequenas, indicando a rejeição da hipótese nula de não estacionaridade. A quarta coluna (teste KPSS) mostra uma probabilidade relativamente grande (>10%), apontando para a não rejeição da hipótese nula de estacionaridade do teste KPSS. Portanto, a conclusão que se chega pelos três testes reportados na Tabela 4 é que as séries utilizadas neste trabalho tornam-se estacionárias nas suas primeiras diferenças, isto é, elas são integradas de ordem 1 - I(1).

Tabela 4
Valores “p” dos testes de raiz unitária das variáveis em primeira diferença

O teste de cointegração de Johansen pode ser aplicado quando as variáveis possuem a mesma ordem de integração. A Tabela 5 a seguir mostra o teste do traço de Johansen para as sete variáveis utilizadas. Este teste tem como hipótese nula a ausência de vetor de cointegração contra as hipóteses alternativas de que existe ao menos r vetor (es) de cointegração. Percebe-se, pela Tabela 5, que a estatística de teste foi maior do que o t-crítico para um nível de significância α=5%, fazendo com que a hipótese nula de r = 4 fosse rejeitada. Sendo assim, o teste de cointegração de Johansen indica a existência de cinco vetores de cointegração entre as variáveis.

Tabela 5
Teste de cointegração de Johansen

Uma vez comprovado que existem vetores de cointegração entre as variáveis, isto é, que elas convergem para um equilíbrio de longo prazo, deve-se estimar o modelo autorregressivo vetorial com o mecanismo de correção de erros (VEC). Os resultados da estimação de longo prazo são apresentados na Tabela 6.

Tabela 6
Estimações dos coeficientes de longo prazo da relação de cointegração

A Tabela 6 mostra os resultados para o longo prazo. Todos os coeficientes se mostraram estatisticamente significantes a 5%, indicando que todas as variáveis do modelo são importantes para explicar as emissões de CO2no Brasil. O modelo se mostrou robusto, dado que os testes dos resíduos não apresentaram problemas. O diagnóstico de teste na Tabela 6 apontou que não existe autocorrelação e heterocedasticidade nos resíduos. Além disso, o teste de normalidade indicou que os resíduos seguem uma distribuição normal com média zero e variância constante.

O coeficiente y, que mede o impacto do crescimento econômico, tem sinal positivo e estatisticamente significante, mostrando que se o nível de atividade econômica aumentar, as emissões per capita de dióxido de carbono também aumentarão. Os coeficientes y 2 e y 3mostram que existe evidências de uma curva no formato de “N” e não de “U” invertido, como postula a hipótese da CKA. Isso significa que a degradação ambiental diminui a priori, mas a partir de determinado nível de renda ela volta a subir. O ponto de máximo da curva ocorre quando a renda per capita atinge US$ 2.729,27, e o ponto de mínimo se dá quando a renda per capita chega a US$ 9.122,54.

O coeficiente que mede o impacto do uso de energia sobre as emissões brasileiras tem sinal positivo e conforme o esperado pela teoria, mostrando que quanto maior o consumo per capita de energia, maior são as emissões de dióxido de carbono no país. Este resultado já era esperado, uma vez que mais de 60% da matriz energética brasileira é constituída de fontes não-renováveis - grandes emissores de CO2 - e que a demanda de energia vem crescendo bem acima do PIB no Brasil, 3,1% contra 0,1%, respectivamente, no ano de 2014 (MME, 2016).

O coeficiente que mensura o impacto da densidade populacional sobre as emissões de CO2 é estatisticamente significante e apresenta sinal negativo. A teoria que trata sobre degradação ambiental postula que se há mais pessoas vivendo em uma determinada área, há mais conscientização em relação aos problemas ambientais e uma pressão maior por regulações ambientais, levando, assim, a uma menor degradação ambiental (SELDEN e SONG, 1994SELDEN, T. M.; SONG, D. Environmental quality and development: is there a Kuznets Curve for air pollution emissions? Journal of Environmental Economics and Management, v. 27, n. 2, p. 147-162, 1994.). O coeficiente da variável “DP”, que capta este efeito, mostrou que se a densidade populacional aumentar em 1 pessoa/km2, as emissões per capita de CO2 se reduzirão em 0,47 toneladas métricas de carbono.

O grau de abertura da economia, mensurado pela variável de comércio, teve coeficiente estatisticamente significante e de acordo com a teoria. Ou seja, quando o grau de abertura da economia brasileira aumenta, as emissões de CO2 também tendem a aumentar. Segundo Carvalho (2013CARVALHO, S. A relação entre crescimento e o meio ambiente:uma reavaliação da Curva de Kuznets Ambiental. Texto para Discussão, IPEA, Brasília, n. 1902, nov. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/TDs/td_1902.pdf >. Acesso em: 3 abr. 2016.
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), esse efeito pode ser explicado pelas hipóteses do deslocamento e do abrigo da poluição (pollution haven hypothesis). Isto é, as indústrias poluentes procuram maximizar a competitividade nos países em desenvolvimento, como o Brasil, onde existe uma regulação ambiental,muitas vezes, menos rígida e/ou uma menor capacidade de enforcement.

Os coeficientes de curto prazo são mostrados na Tabela 7. Considerando-se um nível de significância α=5%, percebe-se que nenhuma das variáveis, com exceção da constante C, possuem significância estatística, indicando que, no curto prazo, não há relação entre elas e as emissões de CO2.

Tabela 7
Estimações dos coeficientes de curto prazo

A Figura 1 exibe as funções de impulso de todas variáveis para respostas em CO2 pc. Nota-se que a variável dependente responde negativamente aos choques nas três variáveis de renda per capita. A diferença é que para variável y a resposta de CO2 pc apresenta tendência positiva a partir do 14º período, enquanto as respostas aos choques na renda per capita ao quadrado e ao cubo têm tendência negativa ainda no 15º período. Com relação ao consumo de energia per capita, a resposta ao choque é positiva e chega a 10% no 6º período, mostrando uma leve tendência de queda até o período final. A resposta ao choque na variável de densidade populacional é a que apresenta menos volatilidade ao longo do período, chegando a -5% no 9º período, mas voltando ao seu nível inicial a partir do 14º período. Por fim, a resposta ao choque na variável que mensura o grau de abertura da economia é positiva a partir do 4º período e muito instável ao longo do tempo, oscilando em torno do seu nível inicial.

Figura 1
Funções de impulso-resposta para choques nas variáveis selecionadas

A Tabela 8 mostra a decomposição da variância dos erros de previsão sobre choques não antecipados na variável dependente,bem como nas variáveis explicativas do modelo. No primeiro período, os erros de previsão da variável emissões de CO2 pc se devem exclusivamente a ela. Percebe-se que, com o passar do tempo, por exemplo, no período 5, um choque em CO2 pc faz com que somente 11,80% da variância dos erros de previsão possam ser atribuídos a ela mesma. Nesse mesmo período, um choque em CEpc representa 43,17% dos erros de previsão de CO2 pc, sendo a variável que mais contribui com a variância dos erros de previsão. Decorridos 10 períodos, após um choque em CO2 pc, apenas 7,47% da variância de seus erros de previsão podem ser explicados por ela própria. As contribuições do crescimento econômico (y) na variância dos erros de previsão são relativamente pequenas em todos os períodos, chegando no valor máximo de 5,94% no 13º período. A densidade populacional tem maior participação na variância dos erros de previsão apenas no 11º período, com uma cifra de 7,92%. A variável que mede o grau de abertura da economia tem participação bem pequena em todos os períodos.

Tabela 8
Decomposição da Variância dos erros de previsão em porcentagem

Considerações Finais

A principal contribuição deste artigo foi mostrar os determinantes das emissões de CO2 no Brasil para o período 1971-2011. As emissões de CO2foram explicadas pela renda per capita, consumo per capita de energia, densidade populacional e o grau de abertura da economia. Também foi adicionada uma dummy exógena no modelo para captar os efeitos do protocolo de Kyoto sobre as emissões brasileiras. A metodologia econométrica utilizou-se de um modelo de vetores autorregressivos com correção de erros para verificar os relacionamentos econômicos de curto e longo prazo entre as variáveis. Por fim, empregaram-se os instrumentos de decomposição da variância dos erros e funções de impulso-resposta para analisar o comportamento, percentual e gráfico, das emissões de dióxido de carbono decorrente de um choque inesperado sobre as outras variáveis do modelo.

Os resultados do modelo VEC, para o longo prazo, apontaram para a significância estatística de todos coeficientes estimados, cujos sinais se apresentaram conforme o esperado pela teoria.Os parâmetros que medem o efeito do crescimento econômico sobre as emissões de CO2 mostraram evidências de uma curva no formato de “N” e não de “U” invertido, como postulado pela hipótese da CKA.Isto é, as emissões de CO2 diminuem a priori, mas a partir de determinado nível de renda elas voltam a subir. O ponto de máximo da curva ocorre quando a renda per capita atinge US$ 2.729,27 e o ponto de mínimo se dá quando a renda per capita chega a US$ 9.122,54. Há que se ressaltar, ainda, que o modelo não apontou para relacionamentos de curto prazo entre as variáveis, tendo em vista que nenhuma delas apresentou significância estatística.

Embora o presente estudo tenha avançado ao mostrar que a relação entre crescimento econômico e poluição ambiental no Brasil possui o formato de um “N”, ainda existem algumas limitações que são inerentes à teoria da CKA. Primeiramente, alguns poluentes, como o CO2, possuem natureza cumulativa. Dessa forma, os pontos de inflexão da curva não garantem a redução de estoques de dióxido de carbono que já estão acumulados na atmosfera (DE BRUYN et al., 1998DE BRUYN, S. M.; VAN DEN BERGH, J. C. J. M.; OPSCHOOR, J. B. Economic growth and emissions: reconsidering the empirical basis of environmental Kuznets curves. Ecological Economics, Amsterdam, v. 25, p. 161-175, 1998.). Além disso, a representação dos impactos ambientais somente por um tipo de poluente fica muito restrita, uma vez que muitos outros fatores influenciam na deterioração do meio ambiente. Outra limitação da CKA consiste no fato de ela desconsiderar a capacidade de assimilação do meio ambiente absorver resíduos e dejetos provenientes do sistema econômico, além de ignorar a estrutura adaptativa e regenerativa dos ecossistemas que alicerçam as atividades de produção e consumo das sociedades (STERN, 2004STERN, D. The rise and fall of the environmental Kuznets curve. World development, v. 32, n. 8, p. 1419-1439, 2004.).

Mesmo assim, acredita-se que o primeiro passo para a formulação e implementação de políticas públicas eficazes e eficientes para enfrentar a questão das mudanças climáticas é o conhecimento dos determinantes das emissões de CO2, cujo peso nas emissões totais de GEE é de aproximadamente 75% (IPCC, 2014). No último Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, o Brasil se comprometeu a reduzir em 43% suas emissões de GEE até 2030, tendo-se como referência o ano de 2005. Apesar de este trabalho ter tratado apenas das emissões de CO2, considera-se que seus resultados podem servir de parâmetro para o refinamento de políticas para lidar com a questão.

Em primeiro lugar, a evidência de que o formato da curva é de um “N” sugere que o próprio crescimento econômico não é solução espontânea para o problema das emissões. Ao contrário, são necessárias medidas deliberadas e que contemplem a necessidade de se reduzir a intensidade de emissões por unidade do PIB, especialmente em um cenário de retomada do crescimento econômico.

Em segundo lugar, o resultado que mostra a relação entre consumo per capita de energia e emissões de CO2 sugere que os formuladores de políticas públicas devem aspirar dois movimentos: (i) maior participação de energias renováveis na matriz energética; e (ii) maior eficiência no uso da energia. Ademais, autoridades brasileiras devem refletir sobre o perfil do comércio externo brasileiro e principalmente sobre sua inserção. As transações comerciais que envolvam tecnologias menos poluentes para o Brasil devem ser estimuladas com o intuito de tornar a estrutura produtiva brasileira mais moderna e eficiente, do ponto de vista ambiental. Além disso, deve-se aumentar a capacidade de fiscalização da legislação ambiental, já que os resultados indicaram que quanto maior o grau de abertura da economia brasileira, maiores são as emissões.

Por último, é importante salientar que este trabalho considerou em suas estimações apenas as emissões de CO2 provenientes da queima de combustíveis fósseis e da produção de cimento. Portanto, as emissões de CO2 decorrentes de outras fontes, como o desmatamento, por exemplo, não foram contempladas na análise aqui feita. Entretanto, entende-se que a manutenção da cobertura vegetal e a redução do desmatamento no Brasil são de extrema relevância para diminuir os níveis de emissões de CO2, tendo em vista que as florestas são grandes reservatórios deste poluente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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    » https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2212567112000032
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  • CLASSIFICAÇÃO JEL:

    Q50; Q54; Q56.
  • 1
    Serviços ecossistêmicos são a interface básica entre o capital natural e o bem-estar humano (ANDRADE e ROMEIRO, 2011).
  • 2
    Os estudos seminais sobre CKA são aqueles publicados na primeira metade da década de 1990 e que se tornaram referência para o tema, podendo-se destacar os trabalhos de Grossman e Krueger (1991, 1995), Shafik e Bandyopadhyay (1992) e Selden e Song (1994).
  • 3
    Segundo dados do MME (2015), a participação de combustíveis fósseis na matriz energética do Brasil foi de, aproximadamente, 57,65% em 2013.
  • 4
    Basicamente,um processo estocástico é estacionário se suas média e variância forem constantes ao longo do tempo e o valor da covariância entre dois períodos depender apenas da distância ou defasagem entre os dois períodos, e não do período de tempo efetivo em que a covariância é calculada (ENDERS, 2015).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jan 2019
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2016
  • Aceito
    21 Set 2018
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