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DA PROVIDÊNCIA À FAVELA: OS TRABALHADORES E A OCUPAÇÃO DE UM MORRO DA REGIÃO PORTUÁRIA DO RIO DE JANEIRO (1856-1901)1 1 Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo. A pesquisa contou com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), através de uma Bolsa de Produtividade em Pesquisa (processo n. 302440/2018-6).

FROM PROVIDÊNCIA TO FAVELA: WORKERS AND THE OCCUPATION OF A HILLSIDE IN THE PORT REGION OF RIO DE JANEIRO (1856-1901)

Resumo

Localizado na região portuária do Rio de Janeiro, o Morro da Providência tem papel central nas análises habituais sobre a formação das favelas na cidade. Associada em geral à chegada das tropas que voltavam da Guerra de Canudos, em meados da década de 1890, a formação da comunidade ali instalada foi muitas vezes tomada como ponto de início do fenômeno que viria a definir os estigmas que marcam, desde então, esse tipo de moradia informal nos morros da cidade. Por serem pensadas prioritariamente a partir da perspectiva do Estado, no entanto, tais análises deixaram de lado a experiência de outros sujeitos envolvidos nesta história, como os trabalhadores de baixa renda que passaram a ver naquele morro uma alternativa de moradia a partir da segunda metade do século XIX. Ao acompanhar sua experiência, este artigo pretende trazer novos elementos para pensar o processo de construção social daquele espaço ao longo daquele período.

Palavras-chave
Favela; Morro da Providência; trabalhadores; habitações populares; Rio de Janeiro

Abstract

Located in the port area of Rio de Janeiro, the Morro da Providência plays a central role in the usual analyses of the development of the favelas in the city. Generally associated with the arrival of troops returning from the Canudos War in the mid-1890s, the formation of the community that settled there has often been taken as the starting point of the phenomenon that would come to define the stigmas that have marked this type of informal housing in the city’s hills ever since. Since they are thought primarily from the perspective of the State, however, these analyses leave aside the experience of other groups involved in this history, such as the low-income workers who began to see that hill as an alternative for a home from the second half of the 19th century on. By following their experience, this article intends to bring new elements to think about the process of social construction of that space throughout that period.

Keywords
Slum; Morro da Providência; workers; popular housing; Rio de Janeiro

No dia 9 de maio de 1901, uma nota do jornal A Notícia sobre um assassinato ocorrido no Morro da Providência assinalava a existência, na localidade, de “um grupo de casinhas cobertas de telha de zinco, conhecido pelo Arraial da Favela”. Se tal definição descrevia a realidade local por meio de um termo então usado para designar um “alojamento do exército em campanha” (MORAES SILVA, 1890MORAES SILVA, Antonio. Dicionário da Língua Portuguesa, v. 1, Rio de Janeiro: Empresa Literária Fluminense, 1890., p. 234), ela adotava, como seu nome próprio, o que reconhecia ser uma denominação “moderna”, criada poucos meses “depois da chegada (…) dos corpos do exército que estiveram em Canudos”:

É que os moradores de tais casinhas são todos soldados casados, que estiveram combatendo no Alto da Favela, em Canudos, os quais encontraram pontos de semelhança entre os dois morros.3 3 TENTATIVA de assassinato. A Noticia, Rio de Janeiro, 9 maio 1901. Noticiando o mesmo crime, o repórter da Gazeta de Noticias explicava também que o “arraial da Favela” se comunicava com o Morro da Providência “pela ladeira dos Melões”. O MORRO da Providência. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 10 maio 1901.

O jornalista não chegava a explicar quais seriam estes pontos de semelhança. Definia, no entanto, um ponto de origem para a localidade: a chegada ao Rio de Janeiro, em 1897, dos combatentes de Canudos, um dos mais violentos massacres patrocinados pelo exército brasileiro nos primeiros tempos da República (GALVÃO, 2001GALVÃO, Walnice Nogueira. O Império do Belo Monte: vida e morte em Canudos. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2001.). O texto deixava claro que originalmente tal designação servia apenas para a pequena comunidade instalada no alto do morro, “na face que dá para a ladeira dos Melões, junto ao túnel da estrada de ferro que leva à estação marítima”. Em pouco tempo, no entanto, outras notícias passariam a tratar como “Morro da Favela” todo o “antigo da Providência”, como fez no final daquele mesmo ano um repórter do Jornal do Brasil.4 4 SANGUINÁRIO. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 14 dez. 1901. Iniciava-se, desse modo, o reconhecimento daquele local pelo termo favela.

Àquela altura, a existência de uma variedade de designações para aquele morro estava longe de constituir uma novidade. Localizado na região portuária da Gamboa, ele recebeu diferentes denominações ao longo do tempo. Embora fosse mais conhecido como Morro da Providência, diversos dos espaços por ele englobados chegaram a assumir, em vários momentos, designações próprias – como a de Morro do Livramento, designação que contemplava a parte do maciço voltada para a região da Saúde; a de Morro do Mirante, para definir sua parte mais alta; ou a de Morro da Formiga, que designava parte do morro voltado para a Cidade Nova.5 5 Ver MERIAN, A., Planta do Rio de Janeiro com os horários dos Bondes, Estradas de Ferro, Barcas, Estradas de Rodagem etc. Rio de Janeiro, Livraria Fauchon, 1903; e “Espancamento”, Gazeta da Tarde, 19 dez. 1898. Ficava claro, no caráter variável de tais denominações, o sentido contextual da definição daquele território, do qual se valiam alguns dos moradores da região ao designar seu espaço de moradia como Morro da Favela.

Ao entender aquela nova definição como um ponto de origem da comunidade instalada na localidade, relatos como aquele publicado em 1901 pelo jornal A Notícia acabaram por servir de base para a definição de uma memória unívoca sobre o processo de ocupação daquele morro. Desconhecido pelos leitores habituais das grandes folhas do Rio de Janeiro, o arraial ali situado começava a aparecer com mais frequência no noticiário à medida em que se tornava palco de algumas ocorrências policiais. Aos poucos estas ocorrências passaram a se articular à definição geral do “Morro da Favela”.6 6 Conferir, respectivamente, “Assassinato”, A Notícia, 26 abr. 1904; “Salteadores no centro da cidade”, A Imprensa, 3 maio 1908; e “O samba da morte”, A Imprensa, 5 jul. 1909. Como resultado, esse termo passou a ser progressivamente utilizado pela imprensa e autoridades públicas para nomear toda a comunidade instaurada na localidade – acabando também por definir para ela um ponto de origem, representado pela chegada ao Rio de Janeiro dos soldados de Canudos. Por mais que se tratasse de uma definição decorrente da ignorância dos jornalistas e autoridades sobre a diversidade de espaços de habitação constituídos no morro, o nome Favela acabou por prevalecer na cobertura da imprensa nos primeiros anos do século XX.

Começava a se definir, a partir disso, uma memória para aquele morro que passou a ver nele um espaço simbolicamente central para o processo de formação de um tipo de comunidade de baixa renda que rapidamente se espalharia pela cidade, dando origem ao fenômeno mais amplo das favelas. Em um importante artigo escrito em 1994, o geógrafo Maurício Abreu foi dos primeiros a avaliar a importância daquele marco. Embora se mostrasse atento para o caráter mais amplo do processo de constituição das favelas, indicando que o Morro da Providência não era, no final do século XIX, o único ocupado por uma população de baixa renda, ele liga o surgimento do fenômeno a “dois focos de tensão que afetaram o Rio de Janeiro no final do século XIX”: a “crise habitacional” – decorrente do aumento populacional da cidade – e as “crises políticas advindas com a República”. Embora reconhecesse a possibilidade de ocupação anterior dos morros da cidade, demarcava com isso os primeiros anos da República como momento de consolidação daquele tipo de comunidade – vendo eventos como a Revolta da Armada e a Guerra de Canudos como fatores de incentivo ao surgimento deste tipo de ocupação, frente à necessidade de resolver “o problema do alojamento dos soldados no Rio de Janeiro”. Como resultado, embora se afastasse da ideia de senso comum de que “foram esses soldados que deram origem à favela na cidade”, defendia que “foi realmente a partir do Morro da Providência que o termo favela incorporou-se ao quotidiano da cidade” (ABREU, 2014ABREU, Maurício. Reconstruindo uma história esquecida: origem e expansão inicial das favelas do Rio de Janeiro. In: FRIDMEN, Fania & HAESBAERT, Rogério. Escritos sobre espaço e história. Rio de Janeiro: Garamond, 2014, p. 421-450., p. 428-429).

A importância deste marco é reafirmada pela urbanista Lilian Vessler Vaz, de maneira igualmente cuidadosa. Mesmo reconhecendo a existência anterior de casebres precários em alguns dos morros da cidade, ela reforça que “a versão mais difundida sobre o início da favela remete à Guerra de Canudos”, com a ocupação do Morro da Providência pelos soldados retornados. Ao citar outros acontecimentos que poderiam ter estimulado aquela ocupação, como a derrubada em 1894 do cortiço Cabeça de Porco, Vaz define que somente ao longo da década de 1890 o Morro da Providência teria se constituído como uma favela (VAZ, 1998VAZ, Lilian Fessler. Do cortiço à favela: um lado obscuro da modernização do Rio de Janeiro. In: SAMPAIO, Maria Ruth Amaral de (org.). Habitação e cidade. São Paulo: FAPESP, 1988, p. 39-52., p. 48-49). Em linha semelhante, a antropóloga Lícia Valladares retomaria a questão em um livro publicado em 2005, no qual se propõe a analisar as “representações sociais” fomentadas pelo fenômeno da favela ao longo do século XX. Além de reconhecer também na guerra aos cortiços “o germe da favela”, ela retoma aquele que define como um “mito de origem” sobre aquele tipo de comunidade: “a imagem do povoado de Canudos descrita por Euclides da Cunha em Os Sertões”. Embora ressalte que isso aconteceu também em outros morros, define que “foi o Morro da favela que entrou para a história”, sendo descrito pela imprensa do começo do século XX como foco exemplo principal do novo fenômeno (VALLADARES, 2005VALLADARES, Lícia do Prado. A invenção da favela: do mito de origem a favela.com. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005., p. 22-27).

Apesar das nuances e diferenças de perspectiva entre estas análises, constituídas a partir de campos disciplinares distintos, todas convergem não apenas no reconhecimento do papel simbólico central do Morro da Providência no início do fenômeno das favelas, mas também na definição de que ele somente teria se afirmado ao longo das primeiras décadas da República. Embora muitos autores mostrem que a formação daquele núcleo de moradias era um dos resultados da “escassez e a carestia das casas populares” que vinha se afirmando ao longo da segunda metade do século XIX (MATTOS 2020MATTOS, Romulo. O Morro da favela como território das classes perigosas na Primeira República. In: GONÇALVES, Rafael et al. Pensando as favelas cariocas: história e questões urbanas. Rio de Janeiro: Pallas; PUC-Rio, 2020, p. 31-55., p. 34), o surgimento da favela acabou assim associado aos primeiros governos republicanos, que colocaram em pauta a questão das habitações populares. Por se voltarem para a tentativa de compreensão mais ampla do problema das favelas ao longo do século XX, tais trabalhos acabaram assim por demarcar uma periodização que parte do momento em que aquele espaço passava a ser reconhecido como um problema pelo poder público republicano, em perspectiva que acaba por deixar de lado a tentativa de entender a formação daquela comunidade e de seus problemas ao longo das décadas anteriores.

Como apontado por Knauss e Brum em artigo de 2012, isso se devia, em grande medida, ao fato de que os primeiros estudos dedicados à história da favela tinham como ponto em comum o uso de fontes oficiais. Entendendo o Estado como um “instrumento das classes dominantes”, tais análises se preocuparam em investigar “as políticas do Estado para as classes pobres”, dando menos atenção aos interesses e experiências das próprias “classes pobres, atingidas pelas reformas urbanas”. Desse modo, a ocupação do Morro da Providência é vista como uma “mera consequência da postura do Estado de enfrentamento dos cortiços”, em um tipo de análise que “não afirmou os moradores das favelas como sujeitos sociais da história” (KNAUSS; BRUM, 2012KNAUSS, Paulo & BRUM, Mario. Encontro marcado: a favela como objeto da pesquisa histórica. In: MELLO, Marco Antonio da Silva et al. Favelas cariocas: ontem e hoje. Rio de Janeiro: Garamond, 2012, p. 101-121., p. 127-130). O surgimento da favela é assim tratado como o fruto direto da desatenção dos governos republicanos em relação à demanda por moradia popular – em uma leitura que ignora a perspectiva de outros dos sujeitos envolvidos no processo, como os proprietários dos terrenos e casebres da localidade ou os próprios trabalhadores que a habitavam, aos quais só restaria resistir às investidas das sucessivas administrações municipais.

Na contramão da periodização proposta por estas análises, trabalhos mais recentes apontam para a necessidade de refletir sobre os limites desta interpretação. Em livro publicado em 2013, Rafael Gonçalves mostra que a própria preocupação do Estado republicano com a questão não chegava a constituir uma novidade, pois já existiria “um discurso político criticando a expansão de construções precárias nos morros, pelo menos desde a metade do século XIX” (GONÇALVES, 2013GONÇALVES, Rafael Soares. Favelas do Rio de Janeiro: história e direito. Rio de Janeiro: Pallas; Editora da PUC, 2013., p. 46). Em sentido semelhante, Rafael Almeida defende que “a existência de casebres, de construções rústicas, sem saneamento ou arruamento, ocupando terras sem título de propriedade, mesmo em áreas urbanas, não data do início do século XX”, constituindo uma prática já disseminada na segunda metade do século anterior. Ao ignorarem tais práticas, as análises habituais sobre o fenômeno da favela as teriam estudado “como objetos já plenamente constituídos, cuja existência independe dos discursos e instituições que são formados em relação às mesmas” (ALMEIDA, 2016ALMEIDA, Rafael Gonçalves de. Favelas do Rio de Janeiro: invenção histórica de um espaço. Tese de Doutorado em Geografia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016., p. 4 e 15). Trata-se de um problema reconhecido também por Andrelino Campos – que, ao defender que “a favela não pode ser apreendida como um efeito de acontecimentos exteriores a ela”, aponta para a necessidade de compreender também a experiência de seus moradores, muitos deles descendentes dos trabalhadores escravizados (CAMPOS, 2012CAMPOS, Andrelino. Do quilombo à favela: a produção do espaço criminalizado no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Bertrand, 2012., p. 19). Por caminhos diversos, esses trabalhos evidenciam os limites das análises que se restringem à perspectiva do poder público republicano, apontando para a possibilidade de compreender a formação daquele o fenômeno em uma mirada mais ampla.

É seguindo esta trilha que deve ser analisada a ocupação do Morro da Providência, assim como o processo que levou à criação de certas imagens para a localidade registradas pela imprensa a partir de 1901. Se a bibliografia demonstra de forma convincente que foi nos primeiros anos da República, em meio ao acirramento da crise habitacional da cidade, que aquele espaço se tornou um problema reconhecido pelo poder público, cabe tentar compreender, a partir do caso específico deste morro, como este problema ganhou forma ao longo das décadas anteriores, analisando a perspectiva dos sujeitos que participaram desse processo. Para isso é necessário acompanhar, por meio da imprensa do período, os diferentes tipos de testemunhos daqueles que viveram no morro ao longo da segunda metade do século XIX, que iam das pequenas notícias policiais aos anúncios classificados publicados diariamente pelos grandes jornais (PEREIRA, 2016PEREIRA, Leonardo Affonso de Miranda. Negociações impressas: a imprensa comercial e o lazer dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Primeira República. História, São Paulo, v. 35, p. 1-21, 2016. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/his/a/WtS867DVMvyQgSsGRzY6s9z/?lang=pt>. Acesso em: 10 abr. 2023. doi: <https://doi.org/10.1590/1980-436920160000000099>.
https://www.scielo.br/j/his/a/WtS867DVMv...
). Ainda que de forma indireta, tais registros permitem compreender as experiências, expectativas e estratégias dos muitos trabalhadores que, ao longo daquelas décadas, acabaram por fazer do morro seu novo espaço de moradia, assim como os interesses e lógicas daqueles que trataram de explorar estas carências habitacionais. Por meio do caso específico dos moradores da Providência, podemos assim trazer novos elementos para a compreensão do processo mais amplo de constituição das favelas que levem em conta a lógica de seus habitantes.

Subindo o morro

No dia 21 de junho de 1856, o Correio Mercantil, folha dedicada aos interesses do comércio, publicou em sua coluna de “notícias diversas” uma breve nota sobre a reclamação que foi dirigida à redação por alguns de seus leitores. Tal nota cobrava a “atenção da autoridade” para a “falta de asseio” de algumas regiões da cidade, citando especificamente o caso do Morro da Providência. Segundo a nota, tratava-se de uma localidade em que “mora muita gente”, mas na qual não haveria “nem iluminação, nem água, nem asseio, nem polícia”.7 7 “Notícias diversas”, Correio Mercantil, 21 jun. 1856. Escrita como forma de reverberar a demanda dos moradores locais pelos cuidados da municipalidade, a nota explicitava algo muitas vezes esquecido pelas análises sobre a ocupação daquele morro: o fato de que ela havia se iniciado muitas décadas antes da chegada dos soldados de Canudos.

Datam de meados da década de 1820 os primeiros relatos sobre a ocupação do Morro da Providência, iniciada pelo lado do Livramento. Àquela altura não existiam ainda as ladeiras do Barroso e do Faria, que lhe serviriam de subida, e a única casa existente em cima do morro era a do próprio Conselheiro Barroso, um dos proprietários de boa parte daquelas terras. Em 1825, entretanto, um “alvará do juiz de órfãos”, responsável por heranças e partilhas, teria colocado à venda os primeiros lotes na parte alta do morro, que iam de uma cocheira situada na base do Morro do Livramento até a localidade em que seriam construídas as duas ladeiras.8 8 A CIDADE e as ruas: Morro do Livramento. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 17 maio 1911. Três anos depois eram oferecidos, em leilão púbico para o pagamento de dívidas de um certo Luiz Botelho Sampaio, “três propriedades no Morro do Livramento com grande quintal”, nas quais se dizia poder “edificar seis ou mais moradias”.9 9 LEILÕES. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 29 maio 1828. Embora a oferta tenha ficado em aberto por muito tempo, mostrando o baixo interesse pela oportunidade, a observação final do anúncio não era casual: embora o mais comum ainda fosse a venda de grandes terrenos e chácaras no morro,10 10 Cf. VENDAS. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2 jul. 1831. demarcando seu aspecto rural, a proximidade com a região central começava a fazer da localidade uma opção viável de moradia.

Se em 1828 tal possibilidade não parecia ainda tão atrativa, nos anos seguintes a localização privilegiada do morro faria com que ele começasse a receber serviços do poder público que ajudariam a transformá-lo em uma alternativa efetiva de habitação. Foi o caso da instalação da rede de água, realizada em 1838 – consequência do fato de que o Morro da Providência, por sua localização, já abrigava uma das caixas d’água que abasteciam a cidade.11 11 MINISTÉRIO do Império. Correio Oficial, Rio de Janeiro, 25 maio 1838. Essas novidades ajudavam a aumentar o número de moradores da localidade, em processo testemunhado por nota publicada em 1856 pelo Correio Mercantil. Ao mesmo tempo, no entanto, era a expectativa de existência desta infraestrutura instalada que alimentava as primeiras queixas sobre o morro publicadas pelo jornal, que dava publicidade às reclamações de seus moradores sobre a falta de água, luz e policiamento que o caracterizaria. Por mais que se tratasse de uma localidade mais contemplada pelo poder público do que outros bairros distantes do centro, os moradores do Morro da Providência mostravam, com suas queixas, encará-lo como parte constitutiva da região central, a mais urbanizada da cidade – merecendo, por isso, os mesmos serviços públicos existentes em seu entorno. Não por acaso, uma das reclamações expressas pela nota do Correio Mercantil mereceu uma resposta imediata do governo municipal, que já no ano seguinte instalou no morro os lampiões pedidos pelos moradores para garantir a iluminação pública.12 12 O morador agradecido: Morro da Providência. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 19 jul. 1857.

Ainda que de início se evidenciassem as características rurais da vida no Morro da Providência, expressas em pequenas ocorrências cotidianas como o roubo de galinhas,13 13 Correio da Tarde, Rio de Janeiro, 11 abr. 1858. a partir do início da segunda metade do século XIX ele começaria a ser ocupado mais densamente. Se em 1856 os jornais já testemunhavam que havia ali “muita gente”, no início da década de 1860 o aparecimento de vários anúncios oferecendo casas para vender ou alugar no morro apontava para um aumento da oferta e da procura pela localidade. Tratavam-se, por vezes, de residências bem estruturadas, como sobrados ou casas com três ou quatro ambientes, algumas “com cômodos para numerosa família”, mas ainda assim com preços mais acessíveis do que aqueles praticados na parte baixa da região central.14 14 Conferir, dentre outros, CASAS para vender, Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 1 fev. 1860; CASA para alugar. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 1 mar. 1860; CASA para alugar. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 4 abr. 1860; ANUNCIO. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 5 abr. 1862. Distantes de qualquer ilegalidade, essas casas eram reconhecidas pelo poder público, que cobrava anualmente seus impostos e atestava sua legitimidade – mesmo quando se tratava de casas sujeitas ao pagamento de laudêmio, por ser ainda a Câmara Municipal a “senhoria direta” de muitos dos terrenos do morro.15 15 LEILÃO. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 28 ago. 1863; Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 6 jun. 1860; NOTÍCIAS diversas. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 11 ago. 1865.

Por mais que ainda abrigasse algumas chácaras habitadas por senhores e trabalhadores escravizados,16 16 Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 18 jul. 1865. era assim notável o aumento da procura por moradias no Morro da Providência. Além da infraestrutura urbana já existente, parecia colaborar, para isso, a importância que se começava a atribuir às questões da higiene. Em um contexto de valorização progressiva da ciência como forma de gerir a vida social, em especial o mundo urbano (CHALHOUB, 1996CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.), uma das características que se passava a valorizar socialmente para avaliar a qualidade de uma casa, especialmente para aquelas destinadas a trabalhadores, era sua salubridade. Situados a grande altura, próximas da região central, mas distantes da concentração demográfica e dos problemas sanitários comuns a ela, as casas que começavam a se multiplicar na parte alta do morro se beneficiavam deste critério. Como faziam questão de assinalar muitos dos anúncios de aluguel publicados ao longo das décadas de 1860 e 1870, tais casas, além de terem uma “excelentíssima vista”, se situavam em “lugar muito saudável”. Com “bons ares e boas vistas”, elas escapariam do controle da saúde pública, constituindo exemplos acabados de moradias salubres.17 17 CASA para alugar. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 4 abr. 1860; Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 3 maio 1871. Era de conhecimento público, por isso, que um dos motivos de atração de novos moradores para o Morro da Providência seria o “ar saudável que ali se goza”.18 18 MORRO da Providência. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 13 ago. 1868.

Era assim por dentro de uma lógica de direitos que os moradores da localidade passaram a cobrar do poder público tratamento semelhante àquele dispensado a outros bairros – em especial aqueles mais elegantes, como a Glória e Botafogo. Cientes de que optavam por um espaço legítimo de moradia, muitos deles começaram a buscar regularmente os jornais para dar publicidade a suas queixas e reivindicações. Foi o que fizeram em março de 1860 alguns moradores, que procuraram a redação do Correio Mercantil para se queixar do fato de que a ladeira que dava acesso ao morro seria um “depósito de imundícies”. Ciosos de seus direitos, cobravam que o “respectivo fiscal” se dignasse a comparecer ao local “para ver com os próprios olhos” a situação.19 19 Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 20 mar. 1860.

Sem constituir um caso isolado, queixas como estas eram reproduzidas, meses depois, pelo Diário do Rio de Janeiro – que publicou a denúncia de outro morador local sobre o “estado intransitável” em que estaria a ladeira de acesso ao morro em virtude das chuvas do verão, motivo pelo qual pedia “providências às autoridades.20 20 Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 nov. 1860. Em 1862, outro grupo de moradores reclamava ao mesmo jornal não apenas do “péssimo estado” da ladeira, mas também do fato de que “o encanamento de gás acha-se em parte descoberto” – mostrando que, além da água, eles já tinham então acesso ao gás encanado. No mesmo ano, moradores locais apresentavam à Câmara Municipal o pedido para que fosse demolida uma casa que estava à venda no morro “para se alargar a rua”, no esforço de implementar ali as mesmas condições existentes na parte baixa da cidade.21 21 Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 28 mar. 1862; Archivo Municipal, Rio de Janeiro, 15 maio 1862. Por fim, em 1864 uma comissão de moradores mandou publicar nos jornais a solicitação que faziam aos “vereadores da câmara municipal” para “mandarem calçar e aformosear o dito morro”. Reconhecendo a “benevolência” com que suas reivindicações costumavam ser recebidas pela Câmara, mostravam “esperar ser atendidos neste seu pedido”.22 22 Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 out. 1864. De tão frequente que se tornava a publicação de “reclamações dos moradores” enviadas à Câmara Municipal, em 1866 uma coluna humorística definia aquele como o “morro do inferno”.23 23 Sesotris; Bazar volante. Bazar Volante, Rio de Janeiro, 1 abr. 1866. Deixando de ser visto como espaço rural, o Morro da Providência passava a ser pensado por seus moradores como parte do mundo urbano, que mereceria da municipalidade o mesmo tratamento dispensado ao resto da cidade.

A Intendência Municipal se mostrou de início sensível aos apelos dos moradores da nova localidade. Depois de muitas queixas sobre o “estado intransitável” de suas vias e o “péssimo estado” de sua ladeira principal,24 24 Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 e 29 nov. 1860; Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 25 out. 1862. em 1863 a subida do morro passou a ser facilitada pelo calçamento da Ladeira de São Lourenço, primeiro nome atribuído ao caminho que levava à sua parte alta. Quatro anos depois, em 1867, este caminho seria dividido em dois pelas Câmara Municipal – passando a se chamar de Ladeira do Faria, no trecho que subia a partir da chácara pertencente a José Justino Pereira de Faria, e Ladeira do Barroso, na parte que levava à antiga casa do conselheiro de mesmo nome.25 25 CÂMARA municipal. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 2 abr. 1863; Boletim da Ilustríssima Câmara Municipal da Corte, v. 4-6, Rio de Janeiro: Tipografia do Correio Mercantil, 1867, p. 20. Ao atender tais reinvindicações, melhorando as condições de acesso ao morro, a municipalidade ajudava a torná-lo ainda mais atrativo para a moradia – por mais que ao longo dos anos seguintes as mesmas queixas continuassem a aparecer na imprensa, expressando uma disputa permanente entre as demandas dos moradores e os serviços oferecidos pelo poder público.

Com acesso a serviços públicos como a água e gás, uma situação jurídica regularizada e uma salubridade que afastava suas casas do esforço de controle e repressão da Higiene Pública, o Morro da Providência se constituía, em meados da década de 1860, como opção legítima e acessível de moradia. Por esse motivo, ele progressivamente passava a servir como uma alternativa habitacional para setores sociais que, precisando ou desejando morar na região central, não teriam condições de alugar casas semelhantes na parte baixa da cidade. Como consequência, a parte mais alta do morro passava a ser habitada por trabalhadores como a viúva Maria Roza da Silva, que com 85 anos de idade pedia em 1861 para entrar no “número de socorridos pela caixa municipal de Beneficência”; o sapateiro Joaquim Luiz de Carvalho, que em 1863 tentou se suicidar com uma facada na barriga; e o português José Elias Martins, preso várias vezes ao longo dos anos anteriores por desordens e embriaguez.26 26 Conferir, respectivamente, NOTAS diversas. A Actualidade, Rio de Janeiro, 9 nov. 1863; PROVEDORIA municipal. Archivo Municipal, Rio de Janeiro, 12 set. 1861; ESTATÍSTICA da Corte. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 31 maio 1863; The Anglo-Brazilian Times, Rio de Janeiro, 11 mar. 1867.

Por mais que ainda residissem no morro alguns moradores de condição social mais estável, em especial nas chácaras ainda existentes na localidade, ficava clara a rápida mudança do perfil social dos que passavam a habitar o local – que começava a se constituir em um dos lugares “privativos dos pobres” na cidade, como reconhecia em 1866 o relato publicado por um pequeno jornal semanal.27 27 Bazar Volante, Rio de Janeiro, 4 fev. 1866. “Aluguéis de casas mais baratos, não pagarem despejos, e economia de alguma peça de roupa que ali mesmo se lava, fazem com que a pobreza para ali aflua”, explicava o redator da nota, para o qual o morro começava a se constituir em um espaço desconhecido por parte dos setores de maior renda da sociedade carioca. Ao chamar a atenção para as dificuldades enfrentadas por seus moradores, como os “contínuos guinchos, berros e urros das locomotivas da estrada de ferro” que lhe era vizinha, ou o barulho de um “batuque de preto” que costumava ocorrer na região aos domingos, ele atestava se tratar, já então, de um lugar regularmente habitado por trabalhadores de baixa renda, reforçando a necessidade de melhorar as condições das cerca de 40 famílias que residiriam na parte alta do morro.

Já distante da paisagem rural que apresentava algumas décadas antes, o Morro da Providência passava assim a ser reconhecido como parte do mundo urbano carioca, fosse nas colunas dos articulistas da imprensa ou nas cartas e reclamações enviadas por seus moradores às redações. Em uma delas, publicada em 1868 pelo Diário do Rio de Janeiro, um morador atestava que a localidade já contava com 100 casas, nas quais “residem para cima de 1000 pessoas” atraídas “pela modicidade dos aluguéis dos prédios” e pelo “ar saudável que ali se goza”.28 28 MORRO da Providência. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 13 ago. 1868. Ainda que com provável exagero, pois em sua conta seriam cerca de dez habitantes por casa, seu relato evidenciava o intenso processo de adensamento da localidade durante aqueles anos. Como resultado, ao final de década de 1860, cerca de 30 anos antes da Guerra de Canudos, aquele novo espaço urbano no alto do morro já era apresentado como uma efetiva possibilidade de habitação para os trabalhadores da cidade, em processo que se aprofundaria ao longo da década seguinte.

O território dos trabalhadores

Nos primeiros meses de 1875, o cocheiro Manoel Alves, trabalhador negro livre, passou por uma experiência que mudaria o rumo de sua vida. Com cerca de 28 anos, ele tinha uma carreira de sucesso pelas ruas da Corte Imperial, que o levava a ser reconhecido como o condutor que tinha “o tílburi mais elegante da cidade”, tornando-o “o preferido do mundo elegante”. Nesta condição, enamorou-se por uma jovem, com a qual decidiu se juntar. Cioso de sua posição de prestígio no círculo social em que vivia, passou a procurar uma casa que pudesse abrigá-los de forma decente, mas que coubesse em seu orçamento. Foi assim que naquele ano se mudou para o alto do Morro da Providência, onde residiria até o final de sua vida. Em entrevista concedida 50 anos após esta decisão, o próprio Manoel tratava de explicá-la: “as casas lá embaixo eram caras, aqui em cima… de graça. E de graça fizemos o nosso ninho”. 29 29 AS TRADIÇÕES vivas da cidade. A Manhã, Rio de Janeiro, 26 dez. 1928. “Tilburis” eram os carros com duas rodas e dois assentos, com capota, e puxados apenas por um cavalo. Escapando até mesmo dos aluguéis que costumavam ser cobrados pelas casas existentes na localidade, o cocheiro se aproveitava da possibilidade para constituir uma residência sem custos na parte mais alta do morro, no qual já estava instalada uma comunidade de trabalhadores como ele.

A história de Manoel Alves é semelhante à de muitos outros trabalhadores que, a partir do início da década de 1870, passaram a fazer do Morro da Providência seu local de moradia. Por mais que a localidade já constituísse desde a década anterior um novo espaço de habitação possível para os trabalhadores da cidade, àquela altura era ainda marcante a diferença que ele nota entre o alto do morro, no qual construiu sua casa, e a parte baixa, correspondente ao início das ladeiras do Faria e do Barroso. Em meados da década de 1870, era ainda possível encontrar na base do morro alguns reconhecidos estabelecimentos comerciais, como a Casa de Saúde do Dr. Figueiredo Magalhães, que ficava na Ladeira do Faria 25 A; o Colégio Santo Cristo dos Milagres, no número 5 da mesma via; e estabelecimentos industriais como a fábrica de cigarros São Lourenço, na Ladeira do Faria 2, e a Fábrica de ventiladores de Silva Sampaio, no número 19 da Ladeira do Barroso.30 30 TESTAMENTO. O Globo, Rio de Janeiro, 25 mar. 1875; COLÉGIO Santo Cristo dos Milagres. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 26 set. 1879; FUMO picado. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 2 jun. 1876. Na mesma área ainda residiam também pessoas de maior renda, muitas delas contando com o trabalho de negros escravizados – caso de Francisco José de Azevedo, que residia no número 1 da Ladeira do Faria quando do falecimento de sua esposa, da qual legou a posse “do escravo de nome Luiz”, e de outros proprietários locais que publicavam nos jornais anúncios para tentar localizar seus escravos em fuga.31 31 TESTAMENTOS. A República, Rio de Janeiro, 16 dez. 1872; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 dez. 1880; Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 13 ago. 1882. Por mais que se tratasse de famílias distantes da opulência senhorial (como sugeria o caso de “uma pobre velha, moradora da Ladeira do Faria” que estaria sendo maltratada por “uma parda escrava”, provavelmente sua única trabalhadora escravizada),32 32 Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 7 nov. 1879. a presença na parte baixa do morro desses moradores de maior renda e de estabelecimentos comerciais explicava por que era em suas partes altas que começavam a se estabelecer trabalhadores como Manoel Alves.

Apesar de já encontrar muitos trabalhadores residindo ali no momento de sua chegada, o cocheiro logo perceberia que o morro guardava ainda resquícios do aspecto rural de décadas anteriores. Nas memórias de Manoel, “grande parte do morro era uma fazenda de família ricaça, que ali criava grande quantidade de bezerros e cabritos”. De fato, apesar da rápida mudança de perfil que a localidade ia atravessando naqueles anos, boa parte de seus terrenos continuava a abrigar chácaras como a do comerciante “Dr. Amorim Soares”, que residia em Botafogo, mas mantinha sua propriedade no morro.33 33 SAIU-SE mal. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 14 jan. 1876; ALMANACK administrativo, mercantil e industrial do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1870, p. 562. Embora muitas vezes não servissem mais de residências para seus proprietários, tais chácaras eram mantidas como forma de investimento, contando com o trabalho de escravizados como “o preto José, escravo de Fuão Santos”, que se feriu em 1873 enquanto cortava lenha na propriedade de seu senhor.34 34 FERIDO. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 26 jul. 1873. Quando da mudança de Manoel Alves para o Morro da Providência, no entanto, a presença dessas práticas rurais começava a gerar reclamações, como aquela feita na Gazeta de Notícias por um grupo de “moradores prejudicados” contra “um rancho de cabras que estão se criando no Morro da Providência”, que geraria “prejuízos” aos habitantes locais.35 35 AO ILMO. Sr. Fiscal da Freguesia de Santana. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 18 abr. 1880. Era assim a mudança de perfil da localidade, na qual se afirmava de modo cada vez mais intenso uma forte marca urbana, que fazia dela uma nova alternativa de moradia para os trabalhadores da cidade.

Ao contrário do que sugere a memória do cocheiro, no entanto, a ocupação daquele espaço por meio da construção própria de pequenas casas em terrenos baldios, embora já fosse uma possibilidade efetiva para os que procuravam terrenos sem posse clara, estava longe de constituir um padrão para aqueles que ali se estabeleciam. Frente à dificuldade de buscar habitações de baixa renda na Corte, fosse pelo marcante crescimento populacional que a cidade começava a atravessar naquela década ou pelo início de uma intensa perseguição aos cortiços (CHALHOUB, 1996CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.), os proprietários de casas e terrenos do morro passaram a se aproveitar do crescente aumento da busca por moradias por parte de trabalhadores de baixa renda. Associada ao enfraquecimento da vocação rural na localidade, tal procura fez que muitos dos donos das antigas chácaras passassem a dar outra destinação a suas propriedades. Como forma de tirar deles maior lucro, passaram a construir pequenas casas dentro de seus terrenos e chácaras, que eram oferecidas para aluguel em anúncios publicados nos jornais.36 36 Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 3 set. 1866; Correio do Brasil, Rio de Janeiro, 9 set. 1872; REVISTA mensal das decisões preferidas pela relação da corte. Rio de Janeiro: Tipografia H.J. Pinto, 1876, p. 146. Ao mesmo tempo, ao longo da década de 1870 se tornava comum que várias das casas ali existentes, antes destinadas somente à moradia de seus proprietários, passassem a alugar quartos para os interessados, “por preço cômodo”.37 37 ATENÇÃO. O Guarany, Rio de Janeiro, 4 nov. 1871; ENTRE vizinhos. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 out. 1875.

O sucesso dessas primeiras iniciativas incentivou a criação, no Morro da Providência, de outra forma de moradia: as estalagens e cortiços, que começavam a ser fortemente perseguidas pela municipalidade na parte baixa da cidade. Se até então não se tinha notícia sobre a existência desse tipo estabelecimento no morro, ao longo da década de 1870 jornais começavam a divulgar as brigas e desentendimentos entre os moradores de uma estalagem ali criada.38 38 ASSASSINATO. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 3 ago. 1876; OCORRÊNCIAS de rua. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 abr. 1878; PEDRADA. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 23 abr. 1878. Tão lucrativo parecia ser o negócio que, poucos anos depois, já eram cinco os cortiços existentes no Morro da Providência, como registrado em um relatório publicado em 1884 nos Anais Brasilienses de Medicina.39 39 Anais Brasilienses de Medicina, Rio de Janeiro, tomo XXV, n. 4, abril a junho de 1884, p. 468. Em apenas um deles, a comissão vacínico-sanitária, que fazia naquele ano uma inspeção na região, encontrou uma “vasta praça e 7 casinhas novas do lado direito”, além de “um barracão assobradado, em ruína, com 3 quartos habitados, 2 quartos em seguida e mais 4 em uma ladeira, todos em péssimo estado”, apontando para a transformação dos antigos sobrados do morro em casas de cômodo.40 40 COMISSÕES vacínico-sanitárias. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 1 abr. 1884. Fosse em casas modestas, em quartos em casas de família ou em estalagens e casas de cômodo, se expandiam radicalmente as ofertas de opção de moradia no morro para os trabalhadores de baixa renda.

Em consequência, aprofundava-se a mudança do perfil social dos habitantes locais iniciada ao longo da década anterior. Frente à presença desses recém-chegados ao morro, os jornais passavam a publicar reclamações de seus antigos residentes, em especial daqueles situados em sua parte baixa, sobre o fato de que tivessem que conviver com esses novos sujeitos – como fez um grupo de moradores da Ladeira do Faria ao se queixarem da “malta de indivíduos” que passava a se reunir na rua para se divertir, “proibindo assim que as famílias cheguem às suas janelas”.41 41 O Repórter, Rio de Janeiro, 1º jul. 1879. Disputas como estas mostravam as tensões decorrentes da rápida mudança do perfil dos habitantes locais, apontando para o incômodo dos moradores de maior renda com o perfil social daqueles que passavam a buscar no morro um espaço de moradia.

Àquela altura, no entanto, tratava-se de uma guerra perdida para os antigos moradores de maior renda. A partir de meados da década de 1870 se tornaria ainda mais clara a preponderância de trabalhadores na localidade. É o que mostrava a lista de qualificação eleitoral organizada em junho de 1876 pela Junta Municipal da Corte para definir os que teriam direito a participar das eleições daquele ano.42 42 LISTA de qualificação dos votantes do Município Neutro. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 14 jul. 1876. Em um momento em que a possibilidade de participação eleitoral dependia da renda, e era feita por demanda do eleitor (SOUZA, 2020SOUZA, Felipe Azevedo. A dissimulada arte de produzir exclusões: as reformas que encolheram o eleitorado brasileiro (1881-1930). Revista de História, São Paulo, n. 179, p. 1-35, 2020. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/revhistoria/article/view/166560>. Acesso em: 10 abr. 2023. doi: <https://doi.org/10.11606/issn.2316-9141.rh.2020.166560>.
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), esta lista apresentava o resultado da análise dessas solicitações. Dividida por quarteirões, ela apresentava os nomes, profissão e renda desses possíveis eleitores. Na parte relativa ao 15º quarteirão da freguesia de Santana, correspondente ao Morro da Providência, apareciam os nomes de 30 indivíduos que se apresentavam como eleitores, dentre os quais cinco não conseguiram a qualificação. Dado os critérios que regiam a qualificação eleitoral, somente os moradores em melhores condições financeiras se apresentavam nesta lista. Ainda assim, 28 desses possíveis eleitores se apresentavam, de diferentes formas, como trabalhadores, sendo as únicas exceções o caso de um “proprietário” e de um “negociante”. Dentre os demais, sete se definiam como “empregados públicos”, constituindo uma categoria de trabalhadores com situação financeira mais estável. O resto era composto por trabalhadores manuais – fossem aqueles que se caracterizavam genericamente como “artista” ou “trabalhador” ou os que definiam com mais precisão seu ramo de trabalho, como pedreiros, carpinteiros, pintores e ferreiros. Mesmo que excluísse aqueles que não teriam sequer a possibilidade de pleitear a participação eleitoral, a lista atestava a mudança do perfil social dos moradores da localidade, evidenciando a inegável preponderância de trabalhadores no Morro em 1876.43 43 Ressalte-se que tal listagem foi feita antes da reforma eleitoral de 1881, que reduziria a possibilidade de participação dos trabalhadores no processo eleitoral ao excluir os analfabetos do processo. Ver Souza (2020).

Assim como o registro eleitoral, o noticiário cotidiano sobre o Morro da Providência já apontava também para a hegemonia de trabalhadores na localidade. Frente a seu adensamento populacional pela presença de moradores de baixa renda, estes começavam a aparecer ocasionalmente nas colunas policiais ou judiciais das grandes folhas da cidade – como foi o caso do carpinteiro João Joaquim de Souza, morador do morro, que em 1876 era processado por ter agredido uma irmã.44 44 JURI da Corte. O Globo, Rio de Janeiro, 15 ago. 1876. Para além das profissões registradas na lista de qualificação eleitoral, que só incluía atividades masculinas, apareciam também ocorrências relativas às atividades das mulheres que habitavam o morro, como lavadeiras, costureiras e empregadas domésticas. Na maior parte das vezes, no entanto, eram as próprias trabalhadoras que procuravam os jornais para divulgar seus serviços, como fez em 1876 uma moradora ao publicar no jornal O Globo um pequeno anúncio se oferecendo para lavar e engomar “roupas de pessoa de tratamento”.45 45 O Globo, Rio de Janeiro, 29 out. 1876.

Do mesmo modo, tornavam-se frequentes na imprensa, a partir do início da década de 1870, referências relativas a trabalhadores idosos, doentes ou incapacitados que passavam a ter na localidade uma de suas únicas alternativas de moradia. Na lista das esmolas distribuídas em 1882 pela alfaiataria Estrela do Brasil apareciam nomes como o de Francisco Manoel Borges, um cego que residia no número 28 do Morro da Providência. Dois anos depois, os jornais registravam o atropelamento de Francisca Candida dos Santos, de 60 anos, que residia também no morro, mas “vivia de esmolas”.46 46 ESTRELA do Brasil. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 31 dez. 1882; DESASTRE e morte. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 18 nov. 1884. Casos como estes mostravam que, para boa parte dos habitantes locais, a vida no morro começava a se constituir na única possibilidade de moradia existente – fosse pelo “menor aluguel que ali pagam”, como registrado em 1886 pelo jornal O Paiz,47 47 Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 5 abr. 1881; O Paiz, Rio de Janeiro, 22 abr. 1886. ou pela possibilidade de buscarem terrenos sem propriedade clara para construir suas próprias casas, como fez o cocheiro Manoel Alves.

Consolidado no início da década de 1880 como uma alternativa acessível de moradia para trabalhadores de baixa renda, o Morro da Providência acabou por se afirmar também como um dos territórios de maior presença negra na cidade. Por ser próximo da região portuária, que abrigava categorias profissionais de forte marca afrodescendente, como a dos estivadores (VELASCO E CRUZ, 2000VELASCO E CRUZ, Maria Cecília. Tradições negras na formação de um sindicato: sociedade de resistência dos trabalhadores em Trapiche e Café, Rio de Janeiro, 1905-1930. Afro-ásia, Salvador, n. 24, p. 243-290, 2000. Disponível em: <https://periodicos.ufba.br/index.php/afroasia/article/view/21001>. Acesso em: 10 abr. 2023. doi: <https://doi.org/10.9771/aa.v0i24.21001>.
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), o morro já era antes disso procurado por figuras como Raphael Leite, um africano que residia em uma de suas ladeiras de acesso até falecer, em 1880; e um certo Manoel, ex-escravo de Anna Eugenia de Mello, que residia na casa número 15 do Morro da Providência em 1886, quando conseguiu sua liberdade por meio da lei dos sexagenários.48 48 5º EDITAL de libertos sexagenários. O Paiz, Rio de Janeiro, 2 set. 1896. Sobre a Lei dos Sexagenários e seus efeitos, ver Mendonça (1999). À medida que se expandiam as possibilidades de moradia na localidade, ao mesmo tempo que avançava o processo de conquista da liberdade, esta presença negra seria intensificada pela chegada de outros trabalhadores afrodescendentes em busca de um espaço de autonomia. Foi o que fez uma certa Honorata: em 1876, depois de conquistar sua alforria por meio de relações de dependência com o antigo senhor, ela contou com sua ajuda para se estabelecer em uma casa na parte alta do morro – na qual, para o descontentamento de alguns vizinhos, passou a desfrutar de sua liberdade com grande altivez.49 49 PACOTILHA. Tagarela, Rio de Janeiro, 25 mar. 1881. Casos como estes faziam com que, no início da década de 1880, o morro começasse a ser associado pela imprensa a uma forte marca negra. Não por acaso, o noticiário desses jornais começava a registrar com certa frequência a presença, na localidade, de práticas associadas às culturas de matriz africana – como a capoeira, que a polícia acusava alguns dos moradores locais de praticar frequentemente, e práticas de curandeirismo que a imprensa associava à figura de Juca Rosa, um destacado pai de santo negro do período (SAMPAIO, 2009SAMPAIO, Gabriela. Juca Rosa: um pai de santo na Corte Imperial. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2009.).50 50 FATOS diversos. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 17 abr. 1883.

Não eram apenas os trabalhadores cariocas que se aproveitariam daquele novo espaço de moradia. Ao longo da década de 1880, os mesmos motivos que levavam trabalhadores pretos e pardos a procurar o Morro da Providência faziam que a localidade se tornasse um importante foco de atração e recepção para imigrantes de baixa renda recém-chegados à cidade. Era o caso dos muitos dos europeus que chegavam então ao Brasil como resultado do estímulo à importação de mão de obra europeia iniciado na década anterior. Nos próprios anúncios de casas para aluguel no morro, seus proprietários chegavam a ressaltar que se tratava de uma localidade que “se presta muito para uma família estrangeira”, devido ao seu “ar fresco”.51 51 Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 26 out. 1879. Como resultado, o noticiário sobre o morro começava a registrar, com frequência crescente, a presença de vários trabalhadores imigrantes – caso dos portugueses José de Brum e Manoel de Souza, que falecem já como moradores do morro; da espanhola Angela Ximenes, agredida por um ébrio; e do italiano Carlos Grosso, que residia “com outros compatriotas nos fundos do prédio n. 21 do Morro da Providência”.52 52 Ver, respectivamente, Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 16 maio 1881 e 12 dez. 1883; Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 24 dez. 1888; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 dez. 1887. Além destes, o morro passava a abrigar também trabalhadores asiáticos como o chinês Amadeu – ferido na cabeça por um compatriota enquanto descansava em sua casa no alto do morro.53 53 Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 13 set. 1878.

Em movimento semelhante, trabalhadores de outras regiões do Brasil passavam a ver também o morro um espaço possível de acolhimento em sua chegada à Corte. Entre as décadas de 1880 e 1890 os jornais da cidade já traziam diversos registros sobre a presença de imigrantes nordestinos na localidade, como baianos, cearenses e alagoanos.54 54 O Paiz, Rio de Janeiro, 16 mar. 1886; Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 11 jul. 1891; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 4 out. 1897. Ao mesmo tempo, o morro passava a se constituir em alternativa de chegada para muitos trabalhadores escravizados da zona rural do estado do Rio que, após conquistarem a liberdade, se mudaram para a Corte – como fez Virgolina Maria Helena, natural de Campos, que em sua chegada à cidade se instalou no alto da Providência e passou a exercer a prostituição, até ser assassinada anos depois.55 55 ANTES do crime. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 22 mar. 1898. Não era de se estranhar, por isso, que o morro tenha sido escolhido em 1875 pelo cocheiro Manoel Alves como seu novo local de moradia.

Casos como estes mostravam que o morro já era visto nos últimos anos do Império como território acolhedor para trabalhadores de diferentes origens, constituindo para eles uma alternativa legítima de moradia no Rio de Janeiro. Por mais que ele contasse ainda com algumas chácaras e casas de família de maior renda, que esporadicamente publicavam anúncios nos jornais em busca de empregados ou chacareiros,56 56 Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 24 jun. 1890 e 14 dez. 1890. um redator do jornal O Paiz testemunhava em 1886 que o perfil da localidade já era então definido pela presença de “grande número de operários e pessoas que trabalham por soldadas”.57 57 O Paiz, Rio de Janeiro, 22 abr. 1886. Eram esses os sujeitos que, a partir daquele momento, passariam a lutar por melhores condições de vida para a localidade, vista por eles como parte integrante e legítima do mundo urbano carioca.

A vida na montanha da morte

A consolidação do Morro da Providência como espaço de habitação popular ao longo da década de 1870 teve como consequência a mudança de postura do poder público em relação às reivindicações de seus moradores. Se até meados da década anterior a municipalidade tentava sistematicamente responder às demandas dos habitantes locais, o aumento da ocupação na parte alta do morro, associado ao perfil modesto desses novos sujeitos que se mudavam para a localidade, faria que suas queixas se multiplicassem a partir dos últimos anos do Império. É o que mostrava uma reportagem publicada em junho de 1881 na Gazeta da Tarde, que se abria com a constatação de que os habitantes locais “pedem socorro ao governo e à Câmara Municipal”. Listando uma série de problemas experimentados cotidianamente por eles, a matéria evidenciava “o quadro hediondo que os pobres moradores deste morro e suas circunvizinhanças nos apresentam, suplicando um apelo à administração do país”. Não por acaso, seu próprio título apresentava um tipo de definição para a localidade que, ao longo das décadas seguintes, se tornaria cada vez mais utilizada para definir suas mazelas: “a montanha da morte”.58 58 A MONTANHA da morte. Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 25 jun. 1881.

Embora àquela altura a definição fosse talvez exagerada, ao menos frente aos problemas que viriam a se apresentar ao longo das décadas seguintes, ela expressava o marcante crescimento das queixas e demandas dos habitantes locais à municipalidade ao longo da década de 1880. Por meio destas queixas, publicadas cotidianamente nos grandes jornais da cidade a partir de pedidos dos próprios moradores, começavam a se configurar algumas das características negativas associadas à vida no morro que, compartilhadas com muitas outras comunidades do gênero, ajudariam posteriormente a definir a própria categoria favela. Além da pobreza e do adensamento, que já haviam se configurado ao longo das décadas anteriores, tais características incluiriam, para autores como Lilian Vaz, a “ilegalidade, insalubridade, desordem, autoconstrução e falta de serviços e infraestrutura urbana” (VAZ, 1998VAZ, Lilian Fessler. Do cortiço à favela: um lado obscuro da modernização do Rio de Janeiro. In: SAMPAIO, Maria Ruth Amaral de (org.). Habitação e cidade. São Paulo: FAPESP, 1988, p. 39-52., p. 48). Em vez de tomar cada uma destas características como dados objetivos capazes de definir aquele tipo de comunidade, cabe acompanhar, nos limites do Morro da Providência, o processo pelo qual elas se afirmam entre as décadas de 1880 e 1890, de modo a percebermos o papel ativo desempenhado pelos próprios habitantes da localidade na definição e no reconhecimento dessas carências.

A própria matéria de 1881 da Gazeta da Tarde se encarregaria de apresentar um elenco dos problemas então enfrentados pelos moradores da localidade, reverberando muitas outras queixas publicadas nos jornais ao longo daquele período. Em um momento no qual o Rio de Janeiro atravessava grandes epidemias e a higiene se afirmava como uma nova obsessão do poder público (CHALHOUB, 1996CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.), não era de se estranhar que boa parte dessas queixas se voltasse para as questões relativas à higiene e salubridade do morro – definido na matéria em questão como um “esplendido foco de miasmas, dentro de cujo bojo se geram as amáveis febres paludosas, as adoráveis perniciosas e a Mestra Febre Amarela”. De fato, ao longo daquela década o morro foi um dos principais focos da febre amarela na cidade.59 59 Revista dos Cursos Teóricos e Práticos da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, 1885, p. 83. O mesmo aconteceria, anos depois, com a epidemia de cólera.60 60 Ver INSTITUTO SANITÁRIO FEDERAL. Cartograma do Cholera-morbus durante o ano de 1895 na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1896. Biblioteca Nacional, ARC.008-06-047 – Cartografia. Os motivos para isso eram regularmente elencados pelos moradores por meio de sucessivos relatos registrados pela imprensa, nos quais eles apontavam para a falta de saneamento e limpeza daquele território. “Um morador do Morro da Providência nos avisa que por lá não se pode viver pelo mau fétido que exalam os canos de esgoto”, registrava em 1878 o jornal O Cruzeiro.61 61 O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 21 fev. 1878. Por mais que a localidade já contasse com alguma estrutura urbana já instalada, como uma rede de esgotos, os habitantes locais denunciavam seu abandono, apontando para o descaso das autoridades com as condições de vida no morro após a mudança do perfil social de sua ocupação. Por esse motivo, foram frequentes, entre as décadas de 1870 e 1890, as queixas dos moradores sobre “a falta de limpeza que ali reina”.62 62 Ver O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 22 fev. 1878; Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 28 nov. 1890; Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 5 jan. 1897.

Não se encerravam aí as reclamações e demandas dos moradores. Junto com os problemas da salubridade, eles se queixavam reiteradamente de outras questões – como a ordem urbana, com foco especial no problema da segurança, de responsabilidade da Polícia da Corte. À medida que se intensificava a ocupação do morro, aumentavam também os casos de desordem e de roubos. Iniciava-se assim, a partir de meados da década de 1870, a ocorrência de roubos por suas ladeiras e caminhos, com grupos de ladrões que pegavam desprevenidos os trabalhadores que subiam o morro sem que a polícia tomasse maiores providências.63 63 Jornal da Tarde, Rio de Janeiro, 29 nov. 1877; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 18 jun. 1878; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 2 maio 1886. Pelo mesmo motivo, se tornavam cada vez mais frequentes os assaltos às casas, passando o morro a ser “frequentemente visitado” pelos “amantes dos bens alheios”. De forma sistemática, tais roubos eram motivados pela ausência de qualquer força policial, que só depois da queixa dos moradores tomava “conhecimento do fato” – em situação de “falta de polícia” que se prolongaria até a década de 1890, quando um jornalista testemunhava que era ainda “raro aparecer por lá algum rodante”.64 64 GATUNOS. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 18 jun. 1876; Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 18 jun. 1876; Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 28 nov. 1890.

Mais importantes e frequentes do que as queixas direcionadas à polícia eram aquelas ligadas à carência de serviços públicos e à precariedade da estrutura urbana, que tinham o poder público municipal como alvo. Ressalte-se, nesse sentido, a questão do acesso à água. Se a presença de um reservatório no alto do morro havia estimulado a própria ocupação da localidade, as deficiências do abastecimento de água foram objetos constantes dos protestos dos habitantes do morro. Segundo um redator do jornal Correio do Dia, em 1880 eles viveriam “em tais securas” que era uma constante “vê-los sofrer”. “Apesar das chuvas que têm caído, apesar da estação em que entramos, há quinze dias que não corre água para os pequenos prédios do morro”, testemunhava seis anos depois um redator do jornal O Paiz – sugerindo que o problema seria restrito às casas menores, instaladas em tempos mais recentes. Reclamações como estas continuariam a aparecer nos jornais ao longo de toda década, como mostravam as queixas de moradores em 1889 sobre “a constante falta d’água que ali há”, que obrigaria seus moradores “a virem busca-la muito embaixo, à rua da América”, em “prejuízo da saúde de muitos”.65 65 Correio do Dia, Rio de Janeiro, 28 nov. 1880; O Paiz, Rio de Janeiro, 22 de abril e 1886; QUEIXAS do povo. Diario do Commercio, Rio de Janeiro, 2 abr. 1889. Estendendo-se pela década seguinte, o problema continuaria a ser “uma constante em algumas casas”, deixando esses moradores por longos períodos sem “uma gota dá água sequer” sem que “nenhuma providência” fosse tomada pelo poder público. Como resultado, em 1898 eles se viam anda obrigados a encaminhar à autoridade responsável pela questão um abaixo-assinado com a mesma queixa.66 66 Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 jun. 1895; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 12 set. 1895; O Paiz, Rio de Janeiro, 27 ago. 1895; Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19 jan. 1898; AGUA. O Paiz, Rio de Janeiro, 27 ago. 1898.

Além da falta d’água, a própria estrutura urbana do morro foi objeto das queixas frequentes. A pedido de um grupo de moradores, em 1884 o Diario Fluminense chamava a atenção para “a grande necessidade de mandar endireitar umas tantas coisas tortas que há no Morro da Providência”, citando o exemplo de “uma calha feita pelas obras públicas” que lançaria dejetos sobre as ruas. Cinco anos depois, outro grupo solicitava, pelas páginas do Diario de Noticias, “que sejam melhoradas as ruas daquele morro, por onde são eles obrigados a transitar”.67 67 Diario Fluminense, Rio de Janeiro, 11 set. 1884; RECLAMAÇÕES. Diario de Noticias, Rio de Janeiro, 15 ago. 1889. Para além do estado precário das vias públicas, era também comum que eles se queixassem da falta de fiscalização sobre antigas construções que ameaçavam ruir; dos riscos de desabamento durante as chuvas, que geravam o desmoronamento de algumas casas e poderiam causar “qualquer catástrofe que possa ser fatal”; e da falta de controle sobre a pedreira localizada na base do morro, que colocava muitas de suas casas em risco.68 68 CRÔNICA municipal. Correio do Dia, Rio de Janeiro, 30 jan. 1881; Diario do Brazil, Rio de Janeiro, 24 fev. 1882; INEDITORIAIS. O Soldado, Rio de Janeiro, 31 maio 1881; QUEIXAS do povo. Diario do Commercio, Rio de Janeiro, 4 abr. 1889.

De tão frequentes que eram as queixas dos moradores sobre a falta de atenção da municipalidade ao Morro da Providência, em 1898 eles já eram definidos por um jornalista como “os desprotegidos da Inspeção Geral de Obras públicas”.69 69 O Paiz, Rio de Janeiro, 3 fev. 1898. Por mais que a Câmara Municipal se inteirasse de muitos desses problemas, reconhecendo o risco constante de desabamentos no morro, nenhuma providência era tomada.70 70 ILMA. Camara Municipal. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 6 maio 1881. “Parece-nos que os que moram nos morros pagam impostos e têm as mesmas regalias que os outros habitantes da capital”, registrava ironicamente em 1890 um redator do jornal Cidade do Rio ao comentar as “constantes queixas dos moradores deste morro”.71 71 MORRO do Livramento. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 28 nov. 1890. A observação deixava claro que, em um momento no qual outras regiões da cidade experimentavam condições muito piores do que aquelas relatadas em tais queixas, era como cidadãos no pleno gozo de seus direitos que os habitantes locais apresentavam suas reclamações à municipalidade. Reiteradas com frequência nos jornais entre as décadas de 1880 e 1890, queixas como estas atestavam a intensa disputa que os moradores do morro travavam com o poder público para afirmar seu direito aos serviços básicos da cidade.

Àquela altura, no entanto, não eram somente a polícia e a municipalidade os responsáveis pelas dificuldades enfrentadas pelos moradores do morro. Se a matéria publicada em 1881 sobre a “montanha da morte” elencava dentre os principais problemas da localidade a existência de “habitações em ruína”, com “telhados descobertos e sem vigamento de segurança”,72 72 A MONTANHA da morte. Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 25 jun. 1881. na maior parte dos casos tal fato não era responsabilidade nem da municipalidade nem dos próprios moradores, mas sim dos antigos proprietários dos terrenos e casas no morro. Como mostram os registros de inventários do período, na maior parte das vezes estes não chegavam a residir na localidade, o que fazia dos terrenos que tinham no morro apenas mais uma dentre suas posses.73 73 Ver Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 1º fev. 1885 e 12 dez. 1888; EXPLORAÇÃO indigna. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 1º maio 1896. Ainda assim, à medida em que se adensava sua ocupação esses terrenos passavam a se mostrar mais atrativos, como mostrava o aumento do número de disputa judiciais e leilões relativos a posses no morro.74 74 Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 5 mar. 1874; O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 14 set. 1878; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 2 mar. 1886. Se a clara mudança do perfil social dos ocupantes do morro não fazia dele uma opção de moradia para seus proprietários, este mesmo motivo passou a levá-los a ver tais propriedades como lucrativos investimentos. Não por acaso, os anúncios de terrenos à venda na localidade passavam frequentemente a trazer a informação da renda por ele propiciada.75 75 É o caso do anúncio de “sete casas no morro da Providência” anunciadas em 1887, que trazia a informação de que elas rendiam 3:624$000 anuais. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 out. 1887. Ver ainda Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 29 fev. 1888 e 13 nov. 1896. Atentos à questão, eles trataram de tentar se aproveitar de suas posses para tirar delas o maior lucro possível, dividindo seus terrenos em pequenas casas ou construindo neles habitações coletivas – o que faria da posse dessas casas e terrenos um “excelente emprego de capital”, como assinalaria em 1897 o anúncio de venda de uma dessas propriedades.76 76 Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 21 ago. 1897.

O resultado da transformação do morro em fonte de especulação imobiliária foi a radical mudança do perfil de suas construções. Se até a década de 1860 as casas eram maiores e espaçadas, ocupando o centro de terrenos, no início da década de 1880 já era explícito o esforço desses proprietários em otimizar seus lucros por meio da repartição de suas propriedades no maior número de unidades habitacionais possível – como fez o dono de um terreno que, ao ser leiloado, já contava com quatro casas, sendo uma a “construção antiga” que era sua sede original, duas casas pequenas e a última definida como “um telheiro, tudo dividido em cômodos para família”.77 77 Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 12 nov. 1899. Se este processo ocorria sem que houvesse maiores registros sobre ele nas páginas da imprensa, seus resultados seriam atestados em 1906 por um jornalista da Gazeta de Notícias. Ao comentar que “a área ocupada por qualquer uma destas casas faz pasmar”, responsabilizava por isso os próprios proprietários dos terrenos do local, que “foram de uma economia assombrosa, não só, como se vê, no fabrico dos prédios, mas também na distribuição avara dos terrenos”.78 78 OS BAIRROS altos: a favela. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 8 set. 1906. Resultava daí a proliferação, pelo morro, de casebres e construções precárias, em frequente risco de desmoronamento.79 79 Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 4 jun. 1881; Jornal do Comercio, Rio de Janeiro, 23 set. 1884. Frente a esta realidade, um jornalista da Gazeta da Tarde já reconhecia, em 1884, que “nos prédios deste morro habitam muitas famílias pobres, que por falta de recursos não os podem abandonar, sujeitando-se assim a serem vitimadas”.80 80 Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 14 mar. 1884.

Mesmo que precárias, estas pequenas casas construídas pelos proprietários se mostravam por vezes inacessíveis a muitos daqueles interessados em residir no morro. Com um custo médio de aluguel que variava de 12$00 a 45$000, em um momento no qual um servente municipal recebia aproximadamente 60$000 (DAMAZIO, 1996DAMAZIO, Sylvia. Retrato social do Rio de Janeiro na virada do século. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1996., p. 48), estas casas estavam em muitos casos acima da renda de trabalhadores como o próprio cocheiro Manoel Alves, que para lá se mudou em 1875.81 81 A Manhã, Rio de Janeiro, 26 dez. 1928. Sobre o valor mínimo e máximo do aluguel de casas nos anúncios classificados publicados entre 1880 e 1890, ver Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 mar. 1890; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 25 jan. 1889. Para piorar, os proprietários eram rígidos na cobrança dos aluguéis, o que gerava constantes conflitos com os inquilinos. Ainda assim, eles costumavam adotar no morro a política do “despejo imediato” – pela qual, “sem ordem do juiz”, se encarregavam de expulsar o devedor “a bem ou a mal”.82 82 A Notícia, Rio de Janeiro, 31 ago. 1897; O Imparcial, Rio de Janeiro, 12 set. 1899; OS BAIRROS altos: a favela. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 8 set. 1906. Como resultado, por mais que vivessem em habitações precárias os inquilinos se viam por vezes obrigados a abandonar suas casas por falta de condições de fazer o pagamento, deixando para trás todas suas posses.83 83 Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 14 out. 1894.

Frente a esta realidade, não tardou para que os proprietários de terrenos no local tentassem otimizar ainda mais seus lucros não apenas por meio do aluguel de casinhas ou quartos, mas também de pequenos espaços em seus terrenos nos quais os próprios interessados poderiam construir suas residências, alugados à margem da legalidade. Como explicaria em 1901 um redator do Cidade do Rio, era assim o próprio proprietário do terreno, no qual já existiriam “construções antediluvianas”, que passou a “dividi-lo em lotes, que aluga a quem ali quer construir sua choupana”. Como resultado, “erguem-se umas construções toscas, feitas até com latas de fósforo” – tornando ainda mais precárias as condições das moradias do morro, no qual muitos trabalhadores passavam a construir “tendas de quatro palmos de altura, cobertas por folhas de lata de querosene”.84 84 COBRANÇAS a dente. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 4 dez. 1901; CERCO a um quilombo. A Federação, Porto Alegre, 1º ago. 1899. Por mais que alguns possam ter se aproveitado dessa possibilidade por conta própria, a precariedade e ilegalidade dessas autoconstruções que passaram a caracterizar a localidade eram assim em sua maior parte o fruto dos interesses comerciais dos donos daqueles terrenos.

Era como um fruto deste processo que, na década de 1890, o Morro da Providência seria reconhecido como “uma colônia que surge” – como afirmado por um jornalista da Gazeta de Notícias em um relato no qual descrevia que “por toda a encosta do lado da Cidade Nova” se viam “casinhas feitas de barro, a sopapo, cobertas de zinco, sem ordem, esparsas, (…) desmanteladas e feias”.85 85 ASSASSINATO. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 22 mar. 1898. Do ponto de vista de quem olhava o morro de longe, podia de fato se tratar de uma novidade a existência daquela comunidade. Para os que a acompanharam este processo ao longo das décadas anteriores, no entanto, ficava claro que era como fruto direto das disputas travadas pelos trabalhadores que habitavam a localidade com o poder público, com a polícia e com os proprietários que se configurava, a partir de 1881, a imagem da Providência como o “morro da morte”.

Considerações finais

Ainda que vividas anos antes de que a favela se tornasse um problema para o poder púbico, histórias como a do cocheiro Manoel Alves, do africano Raphael Leite ou de Honorata, que se mudou para a localidade após conquistar sua liberdade, podem nos ajudar a compreender melhor outras dimensões da formação do fenômeno que não se restringem à atuação do Estado. Elas mostram que, muito antes da Guerra de Canudos, o Morro da Providência já era um território urbano em disputa, pelo qual lutavam muitos trabalhadores que fixaram ali suas residências. Assim como acontecia no período em outros morros da cidade, como o de Santo Antônio, ele havia se constituído como um novo “bairro pobre” marcado pela precariedade – sendo por isso explicável que no momento da destruição do famoso cortiço Cabeça de Porco, na base do morro, o prefeito Barata Ribeiro tenha resolvido “facultar à gente pobre que habitava aquele recinto a tirada de madeiras”, provavelmente utilizada para a construção de novas casas.86 86 FOLHETIM. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 27 fev. 1899; O Paiz, Rio de Janeiro, 28 jan. 1893. Sobre o Morro de Santo Antônio, ver BAIRRO novíssimo. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 out. 1901. Longe de ser o espaço do vazio e do abandono, o morro havia sido assim regularmente ocupado e disputado por trabalhadores que fizeram dele um local de moradia, passando a reivindicar dali seu direito à cidade.

Era justamente por isso que a localidade se converteu em opção de moradia para os soldados que regressavam da batalha. Se muitos militares já haviam participado do próprio processo de ocupação anterior do morro, no qual residiam pelo menos desde 1881, na década seguinte se tornava cada vez mais frequente a presença de soldados como José Casimiro de Almeida, que em 1898 já se encontravam ali instalado em “um casebre infecto, coberto de latas de querosene” no qual precisava conviver com o arbítrio de seu senhorio.87 87 INEDITORIAIS. O Soldado, Rio de Janeiro, 31 maio 1881; O Liberal, Rio de Janeiro, 29 jul. 1881; O Paiz, Rio de Janeiro, 27 mar. 1898. Foi assim pela existência anterior desta realidade que os regressados de Canudos se juntaram a ele, somando-se àqueles soldados que antes mesmo da partida já residiam no morro.88 88 A FAVELA em foco. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26 jul. 1918. Ao atribuir a ele o nome de Morro da Favela, local a partir do qual haviam bombardeado os seguidores de Antônio Conselheiro,89 89 Sobre os bombardeios, ver Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 6 jul. 1897. estes soldados e os demais moradores da localidade podiam assim ter em mente não apenas a semelhança física entre a vegetação dos dois morros, mas também a precariedade de uma realidade marcada pela necessidade de enfrentar a experiência da exclusão, comum às duas localidades.

  • 1
    Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo. A pesquisa contou com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), através de uma Bolsa de Produtividade em Pesquisa (processo n. 302440/2018-6).
  • 3
    TENTATIVA de assassinato. A Noticia, Rio de Janeiro, 9 maio 1901. Noticiando o mesmo crime, o repórter da Gazeta de Noticias explicava também que o “arraial da Favela” se comunicava com o Morro da Providência “pela ladeira dos Melões”. O MORRO da Providência. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 10 maio 1901.
  • 4
    SANGUINÁRIO. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 14 dez. 1901.
  • 5
    Ver MERIAN, A., Planta do Rio de Janeiro com os horários dos Bondes, Estradas de Ferro, Barcas, Estradas de Rodagem etc. Rio de Janeiro, Livraria Fauchon, 1903MERIAN, A., Planta do Rio de Janeiro com os horários dos Bondes, Estradas de Ferro, Barcas, Estradas de Rodagem etc. Rio de Janeiro: Livraria Fauchon, 1903.; e “Espancamento”, Gazeta da Tarde, 19 dez. 1898.
  • 6
    Conferir, respectivamente, “Assassinato”, A Notícia, 26 abr. 1904A Notícia (RJ), 1897-1904; “Salteadores no centro da cidade”, A Imprensa, 3 maio 1908A Imprensa (RJ), 1908-1909; e “O samba da morte”, A Imprensa, 5 jul. 1909.
  • 7
    “Notícias diversas”, Correio Mercantil, 21 jun. 1856Correio Mercantil (RJ), 1856-1866.
  • 8
    A CIDADE e as ruas: Morro do Livramento. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 17 maio 1911.
  • 9
    LEILÕES. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 29 maio 1828.
  • 10
    Cf. VENDAS. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2 jul. 1831.
  • 11
    MINISTÉRIO do Império. Correio Oficial, Rio de Janeiro, 25 maio 1838Correio Oficial (RJ), 1838.
  • 12
    O morador agradecido: Morro da Providência. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 19 jul. 1857.
  • 13
    Correio da Tarde, Rio de Janeiro, 11 abr. 1858Correio da Tarde (RJ), 1858.
  • 14
    Conferir, dentre outros, CASAS para vender, Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 1 fev. 1860; CASA para alugar. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 1 mar. 1860; CASA para alugar. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 4 abr. 1860; ANUNCIO. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 5 abr. 1862.
  • 15
    LEILÃO. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 28 ago. 1863; Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 6 jun. 1860; NOTÍCIAS diversas. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 11 ago. 1865.
  • 16
    Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 18 jul. 1865.
  • 17
    CASA para alugar. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 4 abr. 1860; Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 3 maio 1871.
  • 18
    MORRO da Providência. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 13 ago. 1868.
  • 19
    Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 20 mar. 1860.
  • 20
    Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 nov. 1860.
  • 21
    Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 28 mar. 1862; Archivo Municipal, Rio de Janeiro, 15 maio 1862Archivo Municipal (RJ), 1861-1862.
  • 22
    Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 out. 1864.
  • 23
    Sesotris; Bazar volante. Bazar Volante, Rio de Janeiro, 1 abr. 1866Bazar Volante (RJ), 1866.
  • 24
    Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 e 29 nov. 1860; Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 25 out. 1862.
  • 25
    CÂMARA municipal. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 2 abr. 1863; Boletim da Ilustríssima Câmara Municipal da Corte, v. 4-6, Rio de Janeiro: Tipografia do Correio Mercantil, 1867Boletim da Ilustríssima Câmara Municipal da Corte, vol. 4,5 e 6, Rio de Janeiro: Tipografia do Correio Mercantil, 1867., p. 20.
  • 26
    Conferir, respectivamente, NOTAS diversas. A Actualidade, Rio de Janeiro, 9 nov. 1863A Actualidade (RJ), 1863; PROVEDORIA municipal. Archivo Municipal, Rio de Janeiro, 12 set. 1861; ESTATÍSTICA da Corte. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 31 maio 1863; The Anglo-Brazilian Times, Rio de Janeiro, 11 mar. 1867.
  • 27
    Bazar Volante, Rio de Janeiro, 4 fev. 1866.
  • 28
    MORRO da Providência. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 13 ago. 1868.
  • 29
    AS TRADIÇÕES vivas da cidade. A Manhã, Rio de Janeiro, 26 dez. 1928A Manhã (RJ), 1928. “Tilburis” eram os carros com duas rodas e dois assentos, com capota, e puxados apenas por um cavalo.
  • 30
    TESTAMENTO. O Globo, Rio de Janeiro, 25 mar. 1875; COLÉGIO Santo Cristo dos Milagres. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 26 set. 1879; FUMO picado. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 2 jun. 1876.
  • 31
    TESTAMENTOS. A República, Rio de Janeiro, 16 dez. 1872A República (RJ), 1872; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 dez. 1880; Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 13 ago. 1882.
  • 32
    Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 7 nov. 1879.
  • 33
    SAIU-SE mal. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 14 jan. 1876; ALMANACK administrativo, mercantil e industrial do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1870Almanack Admimistrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1870., p. 562.
  • 34
    FERIDO. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 26 jul. 1873.
  • 35
    AO ILMO. Sr. Fiscal da Freguesia de Santana. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 18 abr. 1880.
  • 36
    Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 3 set. 1866; Correio do Brasil, Rio de Janeiro, 9 set. 1872; REVISTA mensal das decisões preferidas pela relação da corte. Rio de Janeiro: Tipografia H.J. Pinto, 1876Revista mensal das decisões preferidas pela Relação da Corte. Rio de Janeiro: Tipografia H.J. Pinto, 1876., p. 146.
  • 37
    ATENÇÃO. O Guarany, Rio de Janeiro, 4 nov. 1871; ENTRE vizinhos. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 out. 1875.
  • 38
    ASSASSINATO. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 3 ago. 1876; OCORRÊNCIAS de rua. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 abr. 1878; PEDRADA. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 23 abr. 1878.
  • 39
    Anais Brasilienses de Medicina, Rio de Janeiro, tomo XXV, n. 4, abril a junho de 1884, p. 468.
  • 40
    COMISSÕES vacínico-sanitárias. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 1 abr. 1884.
  • 41
    O Repórter, Rio de Janeiro, 1º jul. 1879.
  • 42
    LISTA de qualificação dos votantes do Município Neutro. Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 14 jul. 1876.
  • 43
    Ressalte-se que tal listagem foi feita antes da reforma eleitoral de 1881, que reduziria a possibilidade de participação dos trabalhadores no processo eleitoral ao excluir os analfabetos do processo. Ver Souza (2020).
  • 44
    JURI da Corte. O Globo, Rio de Janeiro, 15 ago. 1876.
  • 45
    O Globo, Rio de Janeiro, 29 out. 1876.
  • 46
    ESTRELA do Brasil. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 31 dez. 1882; DESASTRE e morte. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 18 nov. 1884.
  • 47
    Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 5 abr. 1881; O Paiz, Rio de Janeiro, 22 abr. 1886.
  • 48
    5º EDITAL de libertos sexagenários. O Paiz, Rio de Janeiro, 2 set. 1896. Sobre a Lei dos Sexagenários e seus efeitos, ver Mendonça (1999)MENDONÇA, Joseli. Entre a mão e os anéis: a lei dos sexagenários e os caminhos da abolição no Brasil. Campinas: Editora Unicamp, 1999..
  • 49
    PACOTILHA. Tagarela, Rio de Janeiro, 25 mar. 1881.
  • 50
    FATOS diversos. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 17 abr. 1883.
  • 51
    Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 26 out. 1879.
  • 52
    Ver, respectivamente, Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 16 maio 1881 e 12 dez. 1883; Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 24 dez. 1888; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 dez. 1887.
  • 53
    Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 13 set. 1878.
  • 54
    O Paiz, Rio de Janeiro, 16 mar. 1886; Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 11 jul. 1891; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 4 out. 1897.
  • 55
    ANTES do crime. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 22 mar. 1898.
  • 56
    Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 24 jun. 1890 e 14 dez. 1890.
  • 57
    O Paiz, Rio de Janeiro, 22 abr. 1886.
  • 58
    A MONTANHA da morte. Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 25 jun. 1881.
  • 59
    Revista dos Cursos Teóricos e Práticos da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, 1885Revista dos Cursos Teóricos e Práticos da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, 2º ano, 2º número, 1885, p. 83.
  • 60
    Ver INSTITUTO SANITÁRIO FEDERAL. Cartograma do Cholera-morbus durante o ano de 1895 na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1896Instituto Sanitário Federal. “Cartograma do Cholera-morbus durante o ano de 1895 na cidade do Rio de Janeiro”. Rio de Janeiro, 1896. Biblioteca Nacional, ARC.008-06-047 – Cartografia. Biblioteca Nacional, ARC.008-06-047 – Cartografia.
  • 61
    O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 21 fev. 1878.
  • 62
    Ver O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 22 fev. 1878; Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 28 nov. 1890; Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 5 jan. 1897.
  • 63
    Jornal da Tarde, Rio de Janeiro, 29 nov. 1877; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 18 jun. 1878; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 2 maio 1886.
  • 64
    GATUNOS. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 18 jun. 1876; Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 18 jun. 1876; Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 28 nov. 1890Cidade do Rio (RJ), 1890-1901.
  • 65
    Correio do Dia, Rio de Janeiro, 28 nov. 1880Correio do Brasil (RJ), 1872; O Paiz, Rio de Janeiro, 22 de abril e 1886; QUEIXAS do povo. Diario do Commercio, Rio de Janeiro, 2 abr. 1889.
  • 66
    Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 jun. 1895; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 12 set. 1895; O Paiz, Rio de Janeiro, 27 ago. 1895; Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19 jan. 1898; AGUA. O Paiz, Rio de Janeiro, 27 ago. 1898.
  • 67
    Diario Fluminense, Rio de Janeiro, 11 set. 1884; RECLAMAÇÕES. Diario de Noticias, Rio de Janeiro, 15 ago. 1889Diario de Noticias (RJ), 1889..
  • 68
    CRÔNICA municipal. Correio do Dia, Rio de Janeiro, 30 jan. 1881Correio do Dia (RJ), 1880-1881; Diario do Brazil, Rio de Janeiro, 24 fev. 1882Diario do Brazil (RJ), 1882; INEDITORIAIS. O Soldado, Rio de Janeiro, 31 maio 1881; QUEIXAS do povo. Diario do Commercio, Rio de Janeiro, 4 abr. 1889.
  • 69
    O Paiz, Rio de Janeiro, 3 fev. 1898.
  • 70
    ILMA. Camara Municipal. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 6 maio 1881.
  • 71
    MORRO do Livramento. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 28 nov. 1890.
  • 72
    A MONTANHA da morte. Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 25 jun. 1881.
  • 73
    Ver Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 1º fev. 1885 e 12 dez. 1888; EXPLORAÇÃO indigna. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 1º maio 1896.
  • 74
    Diario do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 5 mar. 1874; O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 14 set. 1878; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 2 mar. 1886.
  • 75
    É o caso do anúncio de “sete casas no morro da Providência” anunciadas em 1887, que trazia a informação de que elas rendiam 3:624$000 anuais. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 out. 1887. Ver ainda Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 29 fev. 1888 e 13 nov. 1896.
  • 76
    Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 21 ago. 1897.
  • 77
    Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 12 nov. 1899.
  • 78
    OS BAIRROS altos: a favela. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 8 set. 1906.
  • 79
    Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 4 jun. 1881; Jornal do Comercio, Rio de Janeiro, 23 set. 1884.
  • 80
    Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 14 mar. 1884.
  • 81
    A Manhã, Rio de Janeiro, 26 dez. 1928. Sobre o valor mínimo e máximo do aluguel de casas nos anúncios classificados publicados entre 1880 e 1890, ver Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 23 mar. 1890; Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 25 jan. 1889.
  • 82
    A Notícia, Rio de Janeiro, 31 ago. 1897; O Imparcial, Rio de Janeiro, 12 set. 1899; OS BAIRROS altos: a favela. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 8 set. 1906.
  • 83
    Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 14 out. 1894.
  • 84
    COBRANÇAS a dente. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 4 dez. 1901; CERCO a um quilombo. A Federação, Porto Alegre, 1º ago. 1899A Federação (RS), 1 de agosto de 1899..
  • 85
    ASSASSINATO. Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, 22 mar. 1898.
  • 86
    FOLHETIM. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 27 fev. 1899; O Paiz, Rio de Janeiro, 28 jan. 1893. Sobre o Morro de Santo Antônio, ver BAIRRO novíssimo. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 14 out. 1901.
  • 87
    INEDITORIAIS. O Soldado, Rio de Janeiro, 31 maio 1881; O Liberal, Rio de Janeiro, 29 jul. 1881; O Paiz, Rio de Janeiro, 27 mar. 1898.
  • 88
    A FAVELA em foco. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26 jul. 1918.
  • 89
    Sobre os bombardeios, ver Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 6 jul. 1897.

Fontes

  • A Actualidade (RJ), 1863
  • A Federação (RS), 1 de agosto de 1899.
  • A Imprensa (RJ), 1908-1909
  • A Manhã (RJ), 1928
  • A Notícia (RJ), 1897-1904
  • A República (RJ), 1872
  • Annaes Brasilienses de Medicina (RJ), 1884
  • Archivo Municipal (RJ), 1861-1862
  • Bazar Volante (RJ), 1866
  • Cidade do Rio (RJ), 1890-1901
  • Correio da Tarde (RJ), 1858
  • Correio do Brasil (RJ), 1872
  • Correio do Dia (RJ), 1880-1881
  • Correio Mercantil (RJ), 1856-1866
  • Correio Oficial (RJ), 1838
  • Diario de Noticias (RJ), 1889.
  • Diario do Brazil (RJ), 1882

2 – Outros

  • Almanack Admimistrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1870.
  • Boletim da Ilustríssima Câmara Municipal da Corte, vol. 4,5 e 6, Rio de Janeiro: Tipografia do Correio Mercantil, 1867.
  • Instituto Sanitário Federal. “Cartograma do Cholera-morbus durante o ano de 1895 na cidade do Rio de Janeiro”. Rio de Janeiro, 1896. Biblioteca Nacional, ARC.008-06-047 – Cartografia
  • MERIAN, A., Planta do Rio de Janeiro com os horários dos Bondes, Estradas de Ferro, Barcas, Estradas de Rodagem etc. Rio de Janeiro: Livraria Fauchon, 1903.
  • Revista dos Cursos Teóricos e Práticos da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, 2º ano, 2º número, 1885
  • Revista mensal das decisões preferidas pela Relação da Corte Rio de Janeiro: Tipografia H.J. Pinto, 1876.

Referências bibliográficas

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Editado por

Editores Responsáveis

Miriam Dolhnikoff e Miguel Palmeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Ago 2022
  • Aceito
    15 Dez 2022
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