Acessibilidade / Reportar erro

Huguenotes, ingleses, abacaxis: associativismo abolicionista e escravizados nas rotas de fuga entre Pernambuco e Ceará na década de 1880* * Em tempos de pandemia, com arquivos fechados, a escrita desse artigo só foi possível graças à generosidade de Celso Thomas Castilho e Arthur Danillo Castelo Branco de Souza, que cederam cópias de importante documentação sobre o Clube do Cupim. O autor registra sua profunda gratidão.

Huguenots, Englishmen, pineapples: abolitionist associational movement and enslaved people in escape routes between Pernambuco and Ceará in the 1880s

Hugonotes, ingleses, piñas: asociaciones abolicionistas y esclavizados en las rutas de escape entre Pernambuco y Ceará en la década de 1880

RESUMO

Huguenotes, ingleses e abacaxis são termos que foram empregados por abolicionistas para ocultar a identidade de pessoas escravizadas que escaparam do cativeiro por rotas de fuga entre a Zona da Mata pernambucana, o Recife e os quilombos abolicionistas no Ceará. O artigo aborda a montagem de uma rede abolicionista interprovincial no início da década de 1880 e a intensificação das fugas de escravizados entre 1884 e 1888, observando em particular a atuação clandestina e radical do Clube do Cupim, bem como alguns aspectos relacionados à construção de sua memória no pós-abolição. O Clube se destacou em relação às associações abolicionistas do período pela diversidade social de seus membros e pela capacidade de promover a articulação de trabalhadores livres pobres, libertos e escravizados em operações que desarticularam o escravismo na região.

Palavras-chave:
associativismo abolicionista; Clube do Cupim; escravizados em rotas de fuga

ABSTRACT

Using terms like Huguenots, Englishmen, and pineapples, abolitionists have concealed the identity of enslaved people that they were in escape routes across the Pernambuco’s Zona da Mata region, Recife, and abolitionist quilombos in Ceará. This article examines the emergence of an interprovincial abolitionist networking in the early 1880s and the growing movement of escaped slaves between 1884 and 1888. It focuses on clandestine and radical actions performed by the Clube do Cupim. It also takes into consideration some aspects of Clube’s memory in the post-abolition. The Club stood out amongst abolitionist associations in terms of social diversity and the capacity to engage free, liberated and enslaved workers in operations that caused impacts over slavery in the region.

Keywords:
abolitionist associational movement; Clube do Cupim; enslaved people in escape routes

RESUMEN

Hugonotes, inglés y piñas son términos que fueron utilizados por los abolicionistas para ocultar la identidad de las personas esclavizadas que escaparon del cautiverio a través de rutas de escape entre la Zona da Mata de Pernambuco, Recife y los quilombos abolicionistas en Ceará. El artículo analiza la instalación de una red abolicionista interprovincial a principios de la década de 1880 y la intensificación de la fuga de personas esclavizadas entre 1884 y 1888, destacando en particular las actividades clandestinas y radicales del Clube do Cupim, así como algunos aspectos relacionados con la construcción de su memoria post-abolición. El Club se destacó en relación a las asociaciones abolicionistas de la época por la diversidad social de sus miembros y por su capacidad de promover la articulación de los trabajadores libres pobres, libres y esclavizados en operaciones de desmantelamiento de la esclavitud en la región.

Palabras clave:
asociativismo abolicionista; Clube do Cupim; esclavizados en rutas de escape

Escravizados em fuga e abolicionismo em perspectiva

Dentre revoltas, motins, sedições, conspiratas, crimes e toda a sorte de atos de rebeldia que inscreveram a tensa dinâmica do escravismo, a fuga foi a estratégia mais típica da resistência escrava (REIS; GOMES, 2006REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos. Introdução - Uma história da liberdade. In: REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos(org.). Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras , 2006. p. 9-25., p. 9). Mas escapar do domínio senhorial imediato estava longe de significar liberdade pronta e segura. A fuga quase sempre colocava os escravizados perante adversidades inerentes à própria ordem social escravista. A liberdade era geralmente concebida e depois conquistada e, então, um horizonte de agruras se delineava em torno da ameaça da captura perpetrada por capitães do mato, do castigo, da reescravização, da violência policial, da prisão, da fome. Cada episódio de fuga ocorria em meio a circunstâncias particulares e, segundo aponta a historiografia sobre o tema, geralmente não decorriam de atos súbitos. Era comum que houvesse algum nível de planejamento traçado pelos escravizados nos dias que antecediam a jornada, mas também aguçado senso de oportunidade, além de noções sobre as rotas e refúgios que deveriam possuir de antemão.1 1 Ver, entre outros, Foner (2015), Carbado e Weise (2012), Franklin e Schweninger (2000, cap. 3), Bezerra Neto (2000) e Carvalho (1987). Em célebre relato, Frederick Douglass conta que passou um ano planejando uma fuga, “inventando meios e maneiras de desenvolver um plano viável”, sopesando as ameaças “reais e imaginárias” (DOUGLASS, 2005DOUGLASS, Frederick. My bondage and my freedom. Nova York: Barnes & Noble Classics, 2005., cap. X).

A partir de 1870, mas, sobretudo, durante os anos 1880, a vigência da escravidão legal dava sinais de que estava com os dias contados no Brasil. Naquele momento, as fugas de escravizados se generalizaram e foram incorporadas ao repertório do movimento abolicionista. Anteriormente circunscrito a setores da elite, a camadas médias urbanas e aos debates no Parlamento e na imprensa, o movimento passou a contar com ampla adesão popular e a participação de homens e mulheres de condição livre, liberta e cativa. Conferências, meetings, cortejos e festivais abolicionistas tomaram conta das ruas e colocaram o protesto contra a escravidão na ordem do dia. Em alguns centros urbanos a mobilização se articulou às fugas em massa e à desagregação do trabalho cativo nas fazendas e engenhos do interior.2 2 A título de exemplo dos novos estudos sobre o tema, ver: Castilho (2016), Alonso (2015), Moraes (2015), Silva (2011), Machado (2010 [1994]), Jesus (2009), Bezerra Neto (2009), Silva (2003) e Bezerra Neto (2000). Para uma análise das diferentes visões cunhadas pela historiografia produzida ao longo de um século após a abolição legal da escravatura, cf. o ensaio de Ciro Cardoso (1988). Sua difusão ganhou maior abrangência com a montagem de redes, alianças e conexões país afora, com estruturas complexas de comunicação, transporte, alojamentos e financiamento de fugas, imprimindo ao abolicionismo um caráter revolucionário (SILVA, 2011SILVA, Eduardo. Domingo, dia 13: o underground abolicionista, a tecnologia de ponta e a conquista da liberdade. In: ABREU, Martha; PEREIRA, Matheus Serva. (org.). Caminhos da liberdade: histórias da abolição e do pós-abolição no Brasil. Niterói: PPGHistória - UFF, 2011. p. 29-37., p. 29-37).

A atuação de sociedades e militantes abolicionistas robusteceu a força política do movimento, fosse pela realização de eventos públicos, pela reunião de fundos à compra de cartas de alforria ou pelo envolvimento com pessoas escravizadas em fuga. A historiografia vem demonstrando nas últimas décadas como essas articulações e alianças foram sendo tramadas no quadro mais amplo das lutas por liberdade no século XIX. Este artigo pretende contribuir ao debate historiográfico a partir de um olhar sobre os escravizados em fuga e suas conexões com abolicionistas e o Clube do Cupim sediado no Recife. Cruzando registros dessa entidade, correspondências particulares, jornais e outras fontes primárias, busca-se examinar as articulações do Clube com entidades e militantes abolicionistas do Ceará e com trabalhadores livres pobres, libertos e os que ainda viviam sob cativeiro em Pernambuco; o papel da associação na montagem de redes e rotas de fuga de escravizados entre essas províncias e no desarranjo das relações de trabalho escravistas na Zona da Mata pernambucana; e a construção da memória do Clube no pós-abolição.

O Clube do Cupim e o associativismo abolicionista

O Clube do Cupim funcionou secretamente como sociedade abolicionista na cidade do Recife durante a década de 1880. Fundado meses depois da celebrada liberação do Ceará, em 25 de março de 1884, o Clube sistematizou e ampliou o envio de escravizados fugidos do Recife para aquela província (CASTILHO, 2016CASTILHO, Celso Thomas. Slave emancipation and transformations in Brazilian Political Citizenship. Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 2016., p. 114). Era uma associação sem estatutos, seus princípios e finalidades eram sumarizados de modo panfletário: “a libertação do escravo por todos os meios”.3 3 Atas do Clube do Cupim, 30 ago. 1885. Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano (doravante: IAHGP), Fundo Fia, Cx.16. As atividades da agremiação podem ser acompanhadas através de um variado conjunto de registros manuscritos produzidos pelos sócios. Em atas de reunião e correspondências trocadas entre os membros do clube se encontram as pautas de discussão, estratégias de ação e balanços de receita e despesa da instituição. Provavelmente, trata-se do caso mais bem documentado de uma agremiação desse tipo. Nesse material se entrevê aspectos do funcionamento regular da entidade e seu extenso círculo de atuação, que cobria articulações com senzalas da Zona da Mata pernambucana e sociedades abolicionistas no Ceará. Os registros das operações de fuga fornecem indícios sobre a maneira como agiam militantes abolicionistas radicais e evidenciam o protagonismo de escravizados em seus processos de invenção da liberdade.

A disponibilidade de fontes da própria agremiação a diferencia de organizações congêneres surgidas naquela década. Muito do que hoje se sabe a respeito delas deve-se, principalmente, à pena de memorialistas e a relatos escritos e veiculados após o 13 de maio. Um exemplo é a Ordem dos Caifazes, que mantinha conexões com o Quilombo do Jabaquara na província de São Paulo (MACHADO, 2010FRANKLIN, John Hope; SCHWENINGER, Loren. Runaway Slaves: rebels on the plantation. Oxford: Oxford University Press, 2000., p. 134-135; OTSUKA, 2015OTSUKA, Alexandre Ferro. Antonio Bento: discurso e prática abolicionista na São Paulo da década de 1880. Tese (Doutorado em História), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2015., p. 86-108), e a Confederação Abolicionista fundada na Corte em 1883, que cultivava laços com o Quilombo do Leblon (SILVA, 2003SILVA, Eduardo. As camélias do Leblon e a abolição da escravatura: uma investigação de História Cultural. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.). Outro caso emblemático é o da Sociedade Libertadora de Benevides, no Pará, cujas façanhas relacionadas a fugas podem ser conhecidas por meio de narrativas de autoridades policiais interessadas em capturar e reprimir fujões e seus acoitadores (BEZERRA NETO, 2000BEZERRA NETO, José Maia. Fugindo, sempre fugindo: escravidão, fugas escravas e fugitivos no Grão-Pará (1840-1888). Dissertação (Mestrado em História), Universidade Estadual de Campinas, 2000., p. 297-304; BEZERRA NETO, 2009BEZERRA NETO, José Maia. Por todos os meios legítimos e legais: as lutas contra a escravidão e os limites da abolição (Brasil, Grão-Pará: 1850-1888). Tese (Doutorado em História), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2009., p. 388-404).

Muito embora o centro de operações do Cupim fosse a capital pernambucana, a atuação do clube era do conhecimento de muitos escravizados fugidos de engenhos localizados a quilômetros de distância da cidade. Talvez porque os debates travados por abolicionistas na imprensa do Recife repercutissem, de um modo ou de outro, no interior das senzalas da Zona da Mata ao norte e ao sul da província. Havia uma rede subterrânea de comunicação sendo gestada nesse espaço, alimentada pela intensidade do rastilho de fugas e pela crescente onda de negociação de contratos de liberdade condicionais e/ou de manumissões imediatamente consignados por senhores de engenho acuados pela ameaça de fugas coletivas, principalmente no ano de 1887.

Ao longo de sua existência, o Clube organizou o envio de fugidos do Recife para os portos do Ceará mediante articulação permanente com a Sociedade Cearense Libertadora. Não há como calcular objetivamente quantos completaram a jornada de cerca de 600 quilômetros por navegação de cabotagem entre Pernambuco e Ceará. Em seus dez primeiros meses, o Clube havia expedido 1.649 escravizados fugidos para a “terra dos livres”.4 4 Atas do Clube do Cupim, 23 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. Logo após o 13 de maio de 1888 uma “companhia de colonização” interessada em atrair braços à lavoura pernambucana informava que existia “na cidade de Fortaleza cerca de três mil libertos que desejam ardentemente voltar a esta província”.5 5 Diário de Pernambuco (Recife), 27 maio 1888. Como muitos fugidos desembarcavam no Ceará e, posteriormente, rumavam para outras províncias, é difícil precisar quantos em Pernambuco deixaram a escravidão para trás e se tornaram livres no período. A atuação do Clube do Cupim entre 1884 e 1888, segundo as estimativas acima, pode ter sido mais eficaz para a libertação de escravizados do que os diversos fundos de emancipação civis, provinciais e imperiais (CASTILHO, 2016CASTILHO, Celso Thomas. Slave emancipation and transformations in Brazilian Political Citizenship. Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 2016., p. 170).

O Cupim foi a agremiação com maior diversidade social no universo associativo, ainda que mantivesse alguma hierarquia interna que diferenciava seus membros entre efetivos e auxiliares (CASTILHO, 2016CASTILHO, Celso Thomas. Slave emancipation and transformations in Brazilian Political Citizenship. Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 2016., p. 123). Contava com vinte e um sócios efetivos, quase todos homens brancos, profissionais liberais, comerciantes e redatores dotados de certo prestígio social. Alguns deles eram políticos, outros jovens bacharéis da Faculdade de Direito do Recife. Já os auxiliares - a conta de mais ou menos vinte associados - trabalhavam como canoeiros, cocheiros, catraieiros e em serviços urbanos de pouca qualificação, dentre os quais muitos eram negros, alguns libertos.6 6 Listas de colaboradores externos ao clube vieram a público após 1888. Nelas constam mais de duas centenas de pessoas, aliadas de circunstância, indício de que o grupo em torno da entidade era ainda mais diversificado do que se supunha, chegando a incluir mulheres escravizadas e damas de famílias tradicionais (BRAGA, 2015). Em texto póstumo, Joaquim Nabuco escreveu que “os [sócios] auxiliares mais úteis ficam por modéstia ou obediência na penumbra”.7 7 Jornal Pequeno (Recife), 18 abr. 1910. De fato, pouco se sabe a respeito deles. Apenas se verificam os primeiros nomes, o que dificulta a tarefa de rastreá-los. Mas é possível supor que eles desempenhassem papel crucial, pois eram os principais responsáveis por estender as linhas de comunicação do Clube com os escravizados. Os sócios auxiliares guiavam as barcaças que transportavam os fugidos, cuidavam da arrecadação de fundos entre os cativos e da concepção de boa parte das operações de fuga. Eram homens despossuídos atuando na linha de frente do abolicionismo mais radical, enfrentando o escravismo e os senhores ao arrepio da lei.

A montagem de uma estrutura interprovincial permitiu ao Clube do Cupim acelerar o passo do ativismo abolicionista. Como veremos na próxima seção, os bastidores em torno do modus operandi do Clube indica que ele não apenas trouxe para o seu raio de atuação setores populares até então alijados dos espaços formais de participação política, como contribuiu decisivamente para ampliar o horizonte de expectativas de liberdade entre escravizados em uma das principais regiões do escravismo. Afinal, Recife integrava o comércio negreiro transatlântico, tendo sido o quarto maior porto de desembarque de africanos escravizados nas Américas (ELTIS; RICHARDSON, 2010ELTIS, David; RICHARDSON, David. Atlas of the Transatlantic Slave Trade. New Haven & Londres: Yale University Press, 2010.). Em 1883, ano anterior à fundação do Cupim, estima-se que havia 83.835 escravizados matriculados na província de Pernambuco.8 8 Jornal do Recife (Recife), 28 out. 1884.

A diferença entre fujões e sacos de farinha

As barcaças que levavam gente e mercadoria entre Pernambuco e Ceará tiveram um papel fundamental na constituição de uma das mais sólidas rotas de navegação de cabotagem do comércio interprovincial Oitocentista (GOMES, 2016GOMES, Alessandro Filipe de Meneses. Das docas de Comércio ao Cais Contínuo: as tentativas frustradas de melhoramento do porto do Recife no Oitocentos. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal de Pernambuco, 2016., p. 113-114). Os negociantes João Ramos e João Cordeiro, cada qual situado em um polo dessa rota, tinham nas barcaças uma parte do seu métier. Ramos possuía uma casa de importação de artigos de luxo e bens de consumo em Recife, onde fregueses podiam encontrar o “incomparável café do Ceará”.9 9 Almanaque Administrativo, Mercantil, Industrial e Agrícola da Província de Pernambuco para o ano de 1875. Recife: Tip. Universal, 1874. p. 168. A Província (Recife), 4 fev. 1890. Em Mossoró e, depois em Fortaleza, Cordeiro esteve à frente de uma firma de exportação de algodão cujas operações eram mediadas pelo entreposto da capital pernambucana.10 10 Revista do Instituto do Ceará. Apontamentos biográficos de João Cordeiro, escritos por ele próprio: (Do Documentário do Instituto, respeitadas a redação e ortografia do original). Fortaleza: Instituto do Ceará, Tomo LIX, 1945. p. 272. Em setembro de 1880, João Ramos e outros abolicionistas fundaram a Nova Emancipadora, uma sociedade dedicada ao gerenciamento de um fundo de emancipação local. Na mesma época, João Cordeiro presidia a Junta de Classificação do Fundo de Emancipação do Município de Fortaleza com recursos do fundo administrado pela Sociedade Libertadora Cearense.11 11 Jornal do Recife (Recife), 28 set. 1880; Gazeta do Norte (Fortaleza), 14 set. 1880.

No início da década de 1880, escravizados em fuga passaram a se infiltrar no trânsito comercial em que atuavam Ramos e Cordeiro. Eles procuravam os negociantes porque ambos gerenciavam fundos de emancipação em suas respectivas cidades. Eram formalmente os homens que deveriam ser contatados por aqueles interessados em alforriar-se e isso não era informação difícil de se encontrar. Em Fortaleza, por exemplo, João Cordeiro veiculou em caixa alta no jornal Libertador o anúncio “PROPOSTAS PARA LIBERDADES”:

A diretoria provisória da Sociedade Cearense Libertadora receberá propostas para liberdade de escravos, as quais deverão ser entregues ao cidadão João Cordeiro, presidente da mesma diretoria. [...] Os escravos que tiverem pecúlio e que os seus bárbaros senhores se negarem a fazer propostas para sua alforria, poderão entender-se com qualquer abolicionista, que providenciará, sem demora, sobre o que for de mister fazer para livrar um infeliz das garras do abutre.12 12 Libertador (Fortaleza), 3 mar. 1881.

Incomum para a época, este anúncio era objetivamente dirigido a escravizados. Trata-se de convocatória para aqueles que podiam ser alistados no fundo de emancipação municipal, mas não só isso. Ainda que os escravizados com pecúlio tivessem suas alforrias negadas pelos “bárbaros senhores”, Cordeiro e seus aliados se colocavam à disposição para impetrar ações de liberdade a fim de pleitear a libertação dos cativos. Esta era uma possiblidade inscrita no terreno da legalidade. Mas tanto Cordeiro quanto os membros da Cearense Libertadora não se atinham apenas à observância dos liames normativos concernentes ao estatuto da propriedade escrava. Ainda em 1881, o negociante abolicionista afirmava, em carta remetida a João Ramos, que na “luta contra os negreiros [...] é necessário pisar as leis do país”. E afirmava que estava “criando associações em toda a província para proteger a fuga dos negros em larga escala. Mais de 100 já, arbitrariamente, gozam dos doces atrativos da liberdade”.13 13 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de João Cordeiro para João Ramos, 9 jun. 1881.

Vários escravizados, com ou sem pecúlio, responderam ao anúncio de Cordeiro. Um caso em especial ganhou destaque no debate público: a fuga de seis escravizados pertencentes a Antônio Pereira de Brito Paiva, um dos mais tradicionais líderes do Partido Liberal na província do Ceará. Pouco mais de um mês após a divulgação do anúncio, os escravizados, aproveitando-se de uma saída de seu senhor, foram bater à porta da “tipografia do Cearense, nos baixos da casa da residência de João Cordeiro”. O grupo era formado por Guilherme, “um cabra de mais ou menos 20 anos”, Carlota e suas duas filhas, Rosa e Maria, que tinham respectivamente 24 e 26 anos, além de dois menores escravizados: Anacleta, de 11 anos, e Pedro, de 12 anos.

O deputado mobilizou sua rede de amigos e familiares para vasculhar a cidade e, semanas depois, conseguiu capturá-los. Rosa e Maria prestaram depoimentos ao chefe de polícia do Ceará e forneceram informações a respeito da complexa estrutura de esconderijos que se espraiava da malha urbana de Fortaleza até as freguesias vizinhas e se apoiava em uma rede de colaboradores abolicionistas livres e libertos.14 14 Gazeta do Norte (Fortaleza), 15 jul. 1881. Do púlpito da Assembleia Provincial do Ceará, Antônio de Paiva discursava expondo sua lamúria senhorial: “fizeram desaparecer todos os meus escravos”, mas admitia que “para furtar um escravo não é preciso carregá-lo como se fosse um saco de farinha”.15 15 Coincidência ou não, o iate João Valle, mantido por João Cordeiro para “transportar escravos roubados em Pernambuco”, eventualmente era listado no movimento do porto do Recife carregando “sacos com farinha de mandioca”. Em 30 de agosto de 1885, uma operação de fuga foi planejada em uma embarcação que transportava 250 sacos de farinha de mandioca para o porto de Macau-RN. Revista do Instituto do Ceará. Apontamentos biográficos de João Cordeiro, escritos por ele próprio: (Do Documentário do Instituto, respeitadas a redação e ortografia do original). Fortaleza: Instituto do Ceará, Tomo LIX, 1945. p. 277. Jornal do Recife (Recife), 18 jul. 1882; Diário de Pernambuco (Recife), 30 out. 1885.

Nem furtadas, nem carregadas como sacos de farinha, Rosa e Maria afirmaram em seus depoimentos que apenas atenderam a um pedido da mãe para ir “ao armazém de João Cordeiro”, o que foi o início de uma intensa jornada que durou cerca de quatro semanas. A fuga começou nas imediações da cidade, no sítio Benfica, propriedade de Antonio Bezerra de Menezes, deputado provincial e membro da Libertadora Cearense. De lá seguiram pela praia até a região da alfândega, tendo chegado em casa de um tal Mathias, homem de “cor cabra”. Depois, afastaram-se da cidade pelo caminho dos trilhos de trem e repousaram por mais um par de dias na “casa de Manoela, uma preta idosa e liberta”, antes de rumarem à freguesia de Maranguape, onde ficaram por duas semanas em casa da viúva Dona Josefa. O menor Pedro, “por estar doente de um pé”, foi levado até ali a cavalo, mas não continuou com o grupo por estar sofrendo de “febre e frieiras”. Dos seis escravizados que semanas antes tinham fugido, quatro chegaram a um sítio na freguesia de Pacatuba. Além de Pedro, Maria havia se desgarrado do grupo e voltado para a casa do seu senhor. Desse sítio retornaram a Fortaleza e ficaram na casa de Telles Marrocos, tipógrafo do jornal da Sociedade Cearense Libertadora. Rosa contou que após esta última parada eles viajariam de vapor para o Amazonas, mas os planos foram bruscamente interrompidos quando o bando do deputado Antônio de Paiva invadiu o domicílio e capturou o grupo de fugidos.16 16 A saga da fuga foi reconstruída a partir da Gazeta do Norte (Fortaleza), edições de 30 abr. 1881, 2 jun. 1881, 4 jun. 1881, 5 jul. 1881; 15 jul. 1881; e do Cearense (Fortaleza) de 3 maio 1881.

O que se observa no depoimento das irmãs Rosa e Maria é a extensão e a diversidade da rede de colaboradores envolvidos com fugas de escravizados no Ceará, a inserção do abolicionismo nesse âmbito e a desobediência civil no interior de casas e sítios espalhados por Fortaleza e freguesias contíguas, com gente pobre disposta a compartilhar cômodos com escravizados em fuga. Muitas dessas fugas tinham por destino final a província do Amazonas, talvez por meio do transporte de mercadorias da firma João Cordeiro & C. que mantinha regularmente uma conexão mercantil com Manaus, onde também existia uma “Colônia Cearense do Amazonas” que se correspondia publicamente com a Sociedade Cearense Libertadora.17 17 Libertador (Fortaleza), 21 abr. 1884; Libertador (Fortaleza), 26 abr. 1884. Existe uma consistente leva de novas pesquisas informando a presença marcante de escravizados fugidos no curso dos fluxos migratórios de cearenses para províncias ao Norte, sobretudo no contexto da Seca de 1877, que motivou o deslocamento de mais de 100 mil cearenses à região amazônica. Edson Barboza evidenciou que os escravizados se infiltravam em meio aos contingentes de retirantes e rumavam para o Norte também para escapar das malhas do tráfico interprovincial dirigido a lavouras cafeeiras do centro-sul do país (CARDOSO, 2017; BARBOZA, 2016; BARBOZA, 2013; CRAVO, 2014; BEZERRA NETO, 2000).

“Um valhacouto de escravos roubados”.18 18 Gazeta do Norte (Fortaleza), 5 jul. 1881. O deputado Antônio Paiva assim denominava o sítio Benfica, de onde partiu em fuga o grupo de Rosa e Maria. Por sua vez, em correspondência particular, João Cordeiro se referia ao sítio como o “quilombo do Bezerra”, um dos refúgios para os cerca de “200 negros [vivendo] em quilombos” mantidos sob a proteção dos abolicionistas no Ceará em 1883.19 19 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de João Cordeiro para João Ramos, 3 maio 1884. Alguns desses aquilombados provinham de Pernambuco. Nas cartas e telegramas recebidos por João Ramos, eles eram chamados de “huguenotes”, “ingleses” e “abacaxis” - termos utilizados para ocultar suas identidades e despistar sentinelas intrometidas na linha do telégrafo. Não é para menos, afinal, já naqueles tempos os fugidos estavam sendo embarcados por abolicionistas e aliados com método e regularidade. Em Recife, João Ramos tomava ciência das operações. “Recebi o huguenote e já o arrumei em boa casa. Está garantido”, informava Antônio Bezerra de Menezes.20 20 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Antônio Bezerra de Menezes para João Ramos, 1881. “Recebi Felipe e Manuel e mais 4 ingleses, os quais estão bem acondicionados”, comunicava João Cordeiro.21 21 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de João Cordeiro para João Ramos, 22 ago. 1883. “Sobre o portador dos abacaxis estão tomadas as providências”, inteirava Gualter Silva.22 22 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Gualter Silva para João Ramos, 4 mar. 1883. Em relação a um africano acolhido em seu sítio, dizia Antônio Bezerra que: “nada lhe faltará e vive como se estivesse em seu país natal”.23 23 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Antônio Bezerra de Menezes para João Ramos, 20 jul. 1882.

Nem sempre os fugidos eram remetidos a quilombos. Segundo João Cordeiro alguns deles tinham sido empregados em instâncias do governo provincial na capital, como na força pública (que, em tese, deveria atuar na captura dos fugidos). Em carta endereçada a Ramos, Gualter Silva avisava: “Temos conseguido colocar no palácio e na polícia 3 criados ingleses, os quais têm se portado de tal forma que nem o presidente, nem o chefe [de polícia], apesar de já saberem a procedência deles, tem querido os despedir”.24 24 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Gualter Silva para João Ramos, 22 fev. 1884.

O ir e vir desses escravizados fugidos ocorreu antes da afamada liberação do Ceará e da fundação do Clube do Cupim. Naquele momento, João Ramos participava da diretoria da Nova Emancipadora, agenciava manumissões e administrava um fundo de emancipação. Mas, também, no mesmo escritório, ele era solicitado por escravizados que tinham a intenção de escapar do cativeiro. Alguns entregaram-lhe bilhetes com mensagens sumárias reclamando proteção no embarque e salvo-conduto, “a fim de que possa encontrar alguma mão amiga na terra da liberdade”.25 25 Bilhete de Manoel de Albuquerque s/d. Carta de José Francisco da Cunha para João Ramos, 27 abr. 1883. Bilhete de José Mariano Carneiro da Cunha, 20 fev. 1884. Carta de Carta João Hermano Caminha para João Ramos, 22 fev. 1884. Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Indícios de que os escravizados da região adaptavam suas estratégias de liberdade dentro das possibilidades abertas pelas redes do movimento abolicionista.

Da comarca do Cabo, ao sul da capital pernambucana, um ativista escrevia a Ramos em 1881 afirmando que “todos os dias chegam a minha presença escravos rogando que os liberte e que não podem mais suportar maus tratos! (fome, bordoadas, serviços maiores que suas forças, chicote e bolos a valer!!)”.26 26 Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Prisciano Lins para João Ramos, 28 maio 1881. Estes intermitentes contatos exasperavam os senhores de engenho. Em 1883 o Clube da Lavoura de Ipojuca (comarca vizinha à do Cabo) elaborou abaixo-assinado subscrito por 109 agricultores requerendo providências do presidente da província para conter as articulações entre o movimento abolicionista e os escravizados:

[...] sob a pressão e ameaça dos abolicionistas intransigentes desta Capital, muitos dos quais não receiam dos meios mais reprovados para pôr em prática os seus criminosos intentos contra a propriedade alheia. Assim é que de propósito se insinua aos escravos, que não devem mais trabalhar aos seus senhores por estarem libertos, acontecendo que muitos destes infelizes se têm apresentado às sociedades emancipadoras e aos diversos advogados desta Capital, como consta pelos jornais, exigindo-lhes as suas cartas de emancipação [...] escravos fugidos das fazendas para aí correm, contando com a proteção dos abolicionistas exaltados, que os acoitam e escondem. Os que são reclamados pelos senhores são protegidos e animados em sua revolta por homens exaltados, quase todos desconhecidos e sem responsabilidade, que se opõem a volta dos mesmos escravos para as fazendas, incitando e amotinando o povo ignaro das ruas, os vadios e os próprios escravos [...] toda vigilância e fiscalização pela polícia do porto do Recife, a fim de não embarcarem para fora da província escravos subtraídos a seus senhores.27 27 Abaixo-assinado. Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano, Série de documentos Avulsos, 17 abr. 1883. Apud Braga (2015).

A força do movimento abolicionista se espraiava de Recife até os engenhos de açúcar da Zona da Mata. Os proprietários escravistas rogavam a autoridades do Estado para conter o fluxo da palavra abolicionista que se infiltrava nas senzalas e subvertia a ordem senhorial. No início de 1883, portanto, a rede subterrânea de acoitamentos e fugas já estava montada e em pleno funcionamento, mobilizando projetos de liberdade entre escravizados.

Nem todos os escravizados conseguiam obter auxílio das mãos de benfeitores simpáticos à sua causa. Muitos amealhavam vinténs através do trabalho no ganho, outros roubavam a fim de custear passagens do Recife para as barras do Norte. Certo dia do ano 1883 ou 1884, quando duas escravizadas apareceram na sede da Nova Emancipadora “para tratar de sua liberdade e embarque para o Ceará”, João Ramos solicitara os 20$000 réis dos bilhetes, ao que elas ofertaram algumas joias em troca. Em depoimento à polícia, João Ramos e a escravizada Maria, que também esteve no escritório encaminhando sua própria manumissão, afirmaram enfaticamente que o abolicionista se negou a fazer o embarque por saber que aquelas joias eram “objetos roubados”. Apesar disso, elas foram embarcadas para o Ceará por alguém.28 28 Os depoimentos foram prestados em junho de 1884, mas no cabeçalho há registro de 1883. Autuamento de João Ramos e da parda Maria de propriedade de Agostinho Santos. Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15.

Em 1884, a fama de João Ramos como agenciador de fugas de escravizados havia se estabelecido. Nas grandes festas ocorridas em Fortaleza por ocasião da liberação do Ceará em 25 de março daquele ano, um abolicionista escreveu-lhe: “um huguenote vendo o seu retrato [...] na iluminação da Perseverança e Porvir - pausou-lhe a mão umas poucas vezes e beijo-a! Que gratidão! Você é um santo para eles”.29 29 Perseverança e Porvir era uma associação emancipadora formada pelo mesmo núcleo de membros da Sociedade Libertadora Cearense. Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Gualter Silva para João Ramos, 25 mar. 1884. Mas, nem tudo era gratidão. Ramos foi chamado à chefatura de polícia algumas vezes para dar conta de suas atividades e entrou em conflito com membros da Nova Emancipadora por causa de seu radicalismo. Ele então decidiu declarar publicamente que havia se retirado do movimento abolicionista e se desfiliou formalmente das associações de que fazia parte.30 30 Diário de Pernambuco (Recife), 1˚ jun. 1884; Jornal do Recife (Recife), 3 jun. 1884. Jogo de cena ou cartada política para se livrar das pressões que se lhe abatiam, o fato é que Ramos voltou à cena presidindo a reunião secreta de fundação do Clube do Cupim em 8 de outubro de 1884.31 31 Inicialmente, o nome da associação era Clube Relâmpago. Porém, os participantes decidiram modificar o nome porque “algum sócio” havia transmitido “a pessoas estranhas ao clube algumas das deliberações tomadas”. Atas do Clube do Cupim, 30 ago. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. A fundação do Clube se insere em meio ao momento mais fértil do associativismo abolicionista, o 25 de março cearense motivou uma onda de fundação de associações abolicionistas pelo Brasil (CASTILHO, 2016, cap. 4; ALONSO, 2015, cap. 6; SANTOS, 2016).

O Clube e os cupins

Apesar de os escravizados em fuga pouco aparecerem nas atas de reunião do clube, é possível encontrá-los nas movimentações do fluxo de caixa, que tanto indicam aspectos sobre o funcionamento do Clube quanto informam sobre a participação dos fugidos. O dinheiro ao custeio das ações da sociedade era predominantemente oriundo dos próprios escravizados, contrariando narrativas que insistiam no caráter passivo dos escravizados furtados das fazendas ou resgatados das senzalas. Ainda que tenham sido executadas operações de resgate de escravizados seviciados em troncos, as fontes permitem supor que muitos (talvez a maior parte) dos escravizados que buscaram o Cupim já acalentavam planos de liberdade e tinham economias suficientes para pagar os 10$000 réis referentes ao valor do transporte para o Ceará.32 32 Os 10$000 réis eram referidos com constância como valor base para passagens individuais, mas em embarques coletivos o custo era barateado. Em uma ocasião um sócio revelou que “recebeu 96$000 como pagamento das passagens de 12 ingleses”. Atas do Clube do Cupim, 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.

O Clube possuía duas fontes de receita: as mensalidades dos sócios efetivos e as contribuições dos escravizados. Os vinte e um sócios efetivos deveriam pagar 3$000 réis mensais. Em ocasiões fortuitas alguns sócios chegaram a oferecer quantia superior ao valor da mensalidade regular. Os sócios auxiliares eram isentos da contribuição porque não tinham como assumir o pagamento de qualquer valor fixo. Os balanços de caixa eram raros, mas há dados sobre a arrecadação e despesa para o mês de novembro de 1884 que fornecem uma boa noção sobre a administração financeira do Clube. As contribuições dos sócios financiavam basicamente a estadia dos escravizados em Recife nos períodos que antecediam a organização dos embarques. Naquele mês, por exemplo, os sócios contribuíram com 66$000 mil réis, valor próximo aos 61$000 réis referentes a despesas com alimentação, aluguel de uma casa que servia de refúgio, locação de um bote e o envio de telegramas. O total arrecadado entre os fugidos foi de 299$000 réis, o suficiente para custear quase trinta passagens.33 33 Atas do Clube do Cupim, 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.

A quantidade de embarcados para o Norte naquele mês foi consideravelmente superior a trinta, portanto, é provável que nem todos os valores movimentados pelos fugidos fosse registrado em atas, boa parte deveria ser entregue diretamente aos capitães das embarcações. Pelo menos dois embarques ocorreram no período enfocado: um na primeira quinzena de novembro, quando “34 cidadãos que seguiram no iate João Vale” de propriedade de João Cordeiro, e o segundo no dia 30.34 34 Atas do Clube do Cupim, 21 nov. 1884; 28 nov. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16 O literato Joaquim Maria Carneiro Vilela publicou, em 1905, um texto em que menciona o último embarque realizado pelo Clube, ocorrido em 23 de abril de 1888, quando, segundo Vilela, foram embarcados cento e dezenove escravizados na barcaça Flor de Jardim a um custo de 300$000 réis. Os números indicam que a quantidade de passageiros e os custos das operações poderiam variar conforme as contingências.35 35 Jornal Pequeno (Recife) 15 maio 1905.

O dinheiro dos escravizados chegava ao caixa da sociedade pelas mãos dos sócios auxiliares.36 36 Ver, por exemplo, Atas do Clube do Cupim, dias 4 nov. 1884 e 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. Eles eram os principais agentes da conexão entre o Clube e os fugidos. Muitos trabalhavam em ofícios volantes e todo um anedotário foi escrito sobre sua atuação. Os canoeiros levavam escravizados embaixo de cobertas de capim e passavam à frente da chefatura de polícia da rua da Aurora, em plácido trânsito pelas águas do Rio Capibaribe.37 37 Jornal Pequeno (Recife) 15 maio 1905. Uma crônica tematizou o dia em que os cocheiros de uma casa funerária simularam um cortejo fúnebre para conduzir os escravizados em caixões e trajes de luto.38 38 A Provincia (Recife), 21 maio 1918. As façanhas eram registradas nas atas do Clube. Juvenal Machado, um dos sócios auxiliares mais ativos, conseguira livrar uma escravizada que “estava a bordo de um navio com o fim de ser vendida em província longínqua”, enquanto Israel de Barros “solt[ara] um inglês das mãos de um capitão de campo”.39 39 Atas do Clube do Cupim, dias 7 nov. 1884 e 27 nov. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. Os embates com capitães de campo, aliás, não parecem ter sido isolados. Contra “um tal Marcolino” determinavam “toda energia”, encorajando “os auxiliares a [lhe] darem uma lição de mestre em ocasião oportuna”.40 40 Atas do Clube do Cupim, 10 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. Não existem registros de conflitos violentos envolvendo os cupins, mas as operações se davam em uma atmosfera de justificada inquietude. Os auxiliares eram orientados “a manter a maior vigilância e no caso de dúvidas a manobra de suas armas”.41 41 Atas do Clube do Cupim, 23 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.

Os sócios auxiliares do Clube do Cupim conquistaram paulatinamente um protagonismo de relevo dentro da instituição. Nas primeiras sessões, os sócios efetivos detinham o monopólio da palavra e do planejamento associativo, enquanto os “auxiliares conservavam-se na antessala”. Somente ao término da reunião eram “cumprimentados e instruídos dos seus deveres”.42 42 Atas do Clube do Cupim, 29 out. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. Na sétima reunião, eles foram convidados a “tomar lugar no recinto” logo na abertura da sessão.43 43 Atas do Clube do Cupim, 12 nov. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. A partir de então os auxiliares passaram a municiar os encontros da sociedade com relatos sobre ações realizadas e encaminhar propostas de enfrentamento mais arrojadas ao grupo.

Outro aspecto que reforça tal protagonismo foram as duas ocasiões em que os sócios auxiliares atravessaram os caminhos de lideranças do Partido Conservador. Uma delas, em 1885, quando os conservadores voltaram ao poder pelo gabinete ministerial chefiado pelo escravocrata barão de Cotegipe. Em Pernambuco, o conselheiro João Alfredo Correia de Oliveira estruturou a máquina da administração provincial em oposição aos chamados abolicionistas radicais.44 44 Escrevendo sobre esse período alguns anos depois, Ambrósio Machado, um dos fundadores do Clube da Lavoura de Ipojuca, afirmou na imprensa que em conversa particular “diante de mim e de vários agricultores [o conselheiro João Alfredo] disse que um governo moralizado e honesto, fosse ele qual fosse, a primeira coisa que devia fazer era mandar restituir escravos roubados que estavam no Ceará a seus legítimos senhores”. Diá­rio de Pernambuco (Recife), 29 mar. 1889. De imediato, o conselheiro dispôs um outro Correia no governo, Luiz Correia de Queiroz Barros assumiu o comando do executivo provincial sob o cargo interino de vice-presidente. Um mês depois da chegada de Barros ao Recife, o sócio auxiliar João Canella cientificou o Clube que “os auxiliares têm em mente tirar uma escrava do Sr. vice-presidente da província”.45 45 Atas do Clube do Cupim, 10 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. Não se tratava apenas de promover um ato de libertação, mas, também, dirigir uma ofensiva ao Partido Conservador recém-conduzido ao poder central.

Não era a primeira vez que a política partidária guiava os rumos da ação do clube. Na célebre Campanha Abolicionista de 1884, encabeçada por Joaquim Nabuco e José Mariano, exatamente no dia da votação que decidiria o pleito, cinco sócios auxiliares invadiram o engenho São João, no bairro da Várzea, “sublevaram parte da escravatura” (sic) e fizeram uma “entrada triunfante na cidade”.46 46 Jornal do Recife (Recife), 4 dez. 1884. Na ocasião fugiram “70 e tantos companheiros que não quiseram mais se sujeitar a um senhor”,47 47 Atas do Clube do Cupim, 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. no caso, o barão de Muribeca, líder do Partido Conservador, deputado e presidente da Assembleia Provincial até 1883. Naquela mesma tarde, na matriz de São José, no centro da cidade, onde funcionava um local de votação, estourou um conflito entre liberais e conservadores que acabou em grande corre-corre com dois fiscais do partido conservador assassinados a facadas sob os gritos de “mata essa cambada de escravocrata”.48 48 Segundo transcrição do “Auto de perguntas feitas a José Symplicio de Sá Esteves, aos 2 de dezembro, pelo delegado de polícia”, publicada em: Diário de Pernambuco (Recife), 14 dez. 1884. O autor das facadas, o liberto Nicolau Duarte, havia se tornado membro auxiliar do Clube do Cupim e tinha relações próximas com o deputado José Mariano, sócio efetivo do Clube.49 49 Jornal do Recife (Recife), 3 jan. 1885.

As fontes não indicam se as duas ações foram previamente tramadas pelos sócios auxiliares ou se o fato de terem ocorrido no mesmo instante foi obra do acaso. Mas, independentemente disso, isto é, se foram ou não planejadas, as ocorrências denotam como a militância abolicionista fervilhava na capital pernambucana, muito em razão do protagonismo de subalternos dispostos a cruzar as fronteiras da legalidade.

Quando o canavial se tornou um cupinzeiro

“Para fazer efetivos os direitos dos proprietários de escravos”, eis o propósito do Segundo Congresso Agrícola de Recife. Em meados de 1884, pouco antes da realização do evento, a Sociedade Auxiliadora da Agricultura de Pernambuco reuniu proprietários de várias localidades da Zona da Mata pernambucana e produziu uma representação dirigida ao Imperador, à Câmara dos Deputados e à Assembleia Provincial. Nela, os proprietários rogavam aos poderes constituídos “medidas tendentes a pôr fim [...] [a]o estado precário e anormal a que a chamada propaganda abolicionista [...] vai reduzindo a lavoura de cana de açúcar”.

Que não se consintam passeatas e mais demonstrações [...] acompanhadas de dísticos e discursos incendiários e calculados para promover a insubordinação, amedrontar os proprietários de escravos e compeli-los a alforriá-los. Nem tampouco, que em conferências ou qualquer reunião pública, possa ser aconselhada a violação das leis e promovida a insurreição, sem determinar procedimento algum repressivo por parte das autoridades policiais e judiciárias.50 50 Diário de Pernambuco, 9 jul. 1884.

Ao que parece, a representação senhorial não resultou em uma onda de repressão aos abolicionistas pernambucanos, ou, pelo menos não houve nada comparável à repressão comandada pelo chefe de polícia Coelho Bastos na Corte (ALONSO, 2015ALONSO, Ângela. Flores, votos e balas: o movimento abolicionista brasileiro (1868-1888). São Paulo: Companhia das Letras, 2015., cap. 8). De modo um tanto brusco e misterioso, a última ata do Clube do Cupim registrou a dissolução formal da sociedade em novembro de 1885. O fim encenado pode ter sido um ato de proteção contra algum informante infiltrado ou muito próximo. Afinal, o clube continuou desempenhando suas atividades, conforme indica uma lista de embarque com o perfil e a origem das fugas de um grupo de escravizados que se evadiu justamente dos engenhos da Zona da Mata. Em 1887, Joaquim Nabuco escreveu sobre as incursões que os abolicionistas realizaram nessa região a convite de lideranças tradicionais do Partido Liberal. Eles visitaram os engenhos para tratar de assuntos partidários. Fizeram viagens tidas como “um verdadeiro cavalo de Tróia, que entrava na cidadela puxado pela rédea por senhores de escravos, mas que ia cheio de abolicionistas”. Nabuco dizia: “eu fui com José Mariano a Palmares, a Escada, a Nazaré, onde chegávamos os escravos vinham a nós, e em muitos lugares consta-me que eles fugiram depois de nossa partida”.51 51 O Paiz (Rio de Janeiro), 19 abr. 1887. De fato, alguns dos fugidos registrados na lista de embarques do Cupim eram provenientes de fazendas das localidades mencionadas por Nabuco.

A lista datada de 4 de abril de 1887 detalha o perfil de vinte e sete escravizados em fuga de treze engenhos localizados em pelo menos oito cidades diferentes (Mapa I).52 52 Documentação avulsa do Clube do Cupim. IAHGP, Fundo FIA, Cx.16. Na lista consta a informação de que haviam embarcado “no Apudy mais 6 homens vindos do Poço por José Mariano diretamente”. Apudy era o nome do iate que tinha Mossoró como principal destino. O grupo de escravizados totalizava vinte homens e sete mulheres com média etária de 38 anos; os dois mais jovens tinham 15 anos e o mais velho, 56. Afora um homem e uma mulher que constavam como casados, talvez entre si, todos eram solteiros. E com exceção de um “cabra”, os demais foram classificados como pretos.

O embarque no Apudy é um fio visível de uma rede subterrânea que ia erodindo sistematicamente a autoridade senhorial. Pois se essas fugas transformavam completamente a vida dos que partiam, também modificavam os destinos dos escravizados que ficavam. Foi principalmente naquele ano de 1887 que manumissões e contratos de liberdade coletivos passaram a ser veiculados em anúncios de jornal por diversos senhores de engenho. “Ou libertam, ou os escravos dizem-lhe um adeusinho... para nunca mais!”, escreveu um articulista de uma folha abolicionista da Corte que associava a onda de manumissões com a atuação do Clube do Cupim e dos próprios escravizados:

Quase diariamente A Província [...] registra centenas de manumissões, que, apesar de serem em grande parte condicionadas por prazo, representam hercúlea vitória da ativíssima propaganda iniciada pelo Clube do Cupim. [...] ou os emperrados proprietários procedem assim e têm garantia de trabalho de seus escravos por mais algum tempo, ou então resistem e veem-se abandonados, porque os pretinhos põem-se em caminho das redentoras plagas cearenses... não há para onde apelar.53 53 Vinte e cinco de Março (Rio de Janeiro), 7 ago. 1887.

Membros destacados de famílias poderosas da província, como os Souza Leão, e mesmo nobres, como o visconde de Tabatinga, se viram então impelidos a negociar com os escravizados os termos das relações de trabalho e apresentar condições à obtenção da liberdade legal. Apenas em julho de 1887 foram anunciados nos jornais do Recife as alforrias de 428 escravizados e a dispensa do serviço de 39 ingênuos.54 54 Jornal do Recife (Recife), 3 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 5 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 6 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 8 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 29 jul. 1887. Muitos deles sob acordos de prestação de serviço com prazos que variavam de dois a três anos, excluindo do “benefício os que se evadirem ou tiverem mau comportamento”. O Visconde de Campo Alegre, “senhor de uma das mais avultadas fortunas da província”, prometia que após os dois anos de serviços prestados os escravizados receberiam, além de suas alforrias, “casa, terras e salário se quiserem permanecer no trabalho como colonos”.55 55 Jornal do Recife (Recife), 28 jun. 1887.

Um artigo de opinião publicado na imprensa da capital correlacionava essas alforrias coletivas e as fugas de escravizados, criticando “as libertações sob condições de serviço por um prazo marcado”, pois mantinham “o desassossego de espírito, as inquietações, e os sustos do senhor de escravos no meio dessa propaganda de um abolicionismo torpe e especulador que [...] seduz, ilude e saqueia”.56 56 Jornal do Recife (Recife), 8 jul. 1887. Mas a classe senhorial pernambucana não detinha a primazia sobre a estratégia das alforrias coletivas. Em 1887 o abandono das senzalas corroeu o cativeiro em outros centros escravocratas do Império, com destaque para o Oeste paulista, onde os senhores reagiram de modo análogo para tentar conter as arribações sucessivas (AZEVEDO, 1987AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda negra medo branco: o negro no imaginário das elites do século XIX. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.; EISENBERG, 1987EISENBERG, Peter. Ficando livre: as alforrias em Campinas no século XIX. São Paulo: Estudos Econômicos, v. 17, n. 2, 1987.). Da tribuna do Senado, o barão de Cotegipe destacava o impacto da onda de manumissões coletivas: “Uns alforriavam os escravos, estes ou ficavam ou se retiravam; o vizinho não podia mais manter a disciplina na sua fazenda, e também era obrigado a seguir o exemplo ou via desaparecerem todos os seus trabalhadores.”57 57 Anais do Senado Brasileiro, 1888, livro I, p. 34.

O mapa I apresenta uma situação muito semelhante à descrita por Cotegipe. Os marcadores em roxo indicam a localização aproximada dos onze engenhos que anunciaram alforrias coletivas em julho de 1887, pontilhando um corredor que atravessa de cima a baixo a Zona da Mata Sul. Mais espalhados pela Zona da Mata Norte, os marcadores em amarelo apontam os engenhos de onde partiram alguns dos vinte e sete fugidos embarcados pelo Clube do Cupim no iate Apudy. A geografia dos dados obtidos mostra a difusão de processos e experiências de liberdade por toda a extensão da região canavieira de Pernambuco em meados de 1887.

Mapa 1:
Fugas e manumissões (Pernambuco, 1887)

Em relação às fugas, é de se notar, pela variedade de engenhos listados em apenas um embarque, que a palavra do Cupim irradiava muito além das cercanias de Recife. O jovem Floriano, de 15 anos, era o único listado como proveniente do Engenho Salgado, na paróquia de Timbaúba, distante mais de 100 quilômetros do Engenho Cachoeira, em Ipojuca, de onde saiu João, de 35 anos. Como eles, outros oito eram mencionados como viajantes solitários de suas senzalas de origem. Talvez tenham percorrido a jornada de matas e canaviais em companhia de outros fugitivos de engenhos vizinhos. Mesmo que fossem em comboio, os indícios levam a crer que eles não se evadiam em grupos numerosos.

Uma vez na capital, eles buscavam os abolicionistas. Certa vez um deles bateu à porta de Joaquim Nabuco. Em seu diário, o militante abolicionista escreveu que era “Cassiano, 19 anos, sinais de ferro ao pescoço e todo o corpo. Acoito-o” (NABUCO, 2005NABUCO, Joaquim. Diários. Prefácios e notas de Evaldo Cabral de Mello. Rio de Janeiro: Bem-tevi; Recife: Fundaj, Ed. Massangana, v. 1, 2005., p. 248). A esta altura da luta em Recife havia uma legião de acoitadores e acoitadoras. O Clube do Cupim mantinha uma casa alugada no bairro dos Aflitos para receber os fugidos e outra no Pátio do Carmo, além de um “prédio no beco da Moeda” também “ocupado por soldados do Clube”. A cocheira da residência de José Mariano, no Poço da Panela, tornou-se uma filial da associação, assim como as dependências do Hotel Internacional, no Derby. Essas localidades eram chamadas pelos sócios de “panelas”. A maior parte ficava às margens do rio Capibaribe, o principal vazo comunicante das “panelas” com o porto. O Clube, portanto, detinha uma rede de colaboração espalhada pela cidade, que gradativamente ia transformando a escravidão em um fuste de madeira seco e gasto, carcomido por galerias de cupins.58 58 Atas do Clube do Cupim, dias 3 e 10 set. 1885; 8 out. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.

A barquinha e a memória

No momento em que os sócios auxiliares se perfilaram atrás de uma barquinha alegórica do Clube do Cupim e posaram para esta foto, provavelmente no início da década de 1890, o grupo já havia deixado a clandestinidade e ganhara lugar no panteão das comemorações abolicionistas em Pernambuco. Um dos fotografados, o último à direita, ao que parece trazia no peito a medalha conferida aos colaboradores do Clube nos festejos do 13 de maio de 1889.

Figura 1:
Sócios auxiliares do Clube do Cupim e a barquinha

Nas festas da abolição por todo o país, uma cornucópia de representações foi desfilada em estandartes e cânticos, com destaque para ícones localmente conformados na lida cotidiana do cativeiro e nas lutas por liberdade (DOMINGUES, 2011DOMINGUES, Petrônio José. “A redempção de nossa raça”: as comemorações da abolição da escravatura no Brasil. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 31, n. 62, p. 19-48, 2011.; MORAES, 2015MORAES, Renata Figueiredo. A abolição no Brasil além do parlamento: as festas de maio de 1888. In: MACHADO, Maria Helena; CASTILHO, Celso (org.). Tornando-se livre: agentes históricos e lutas sociais no processo de abolição. São Paulo: EDUSP, 2015.; MACHADO, 2010MACHADO, Maria Helena P. T. [1994]. O Plano e o pânico: os movimentos sociais na década da abolição. São Paulo: Editora Edusp, 2010., p. 152-153). As estratégias de representação e os personagens cultuados variavam conforme as especificidades regionais. Em São Paulo, por exemplo, as fugas coletivas foram silenciadas. Os afro-paulistas, nas palavras de Petrônio Domingues, celebravam “o ideal de integração [...] e escamoteavam a resistência escrava” (DOMINGUES, 2011DOMINGUES, Petrônio José. “A redempção de nossa raça”: as comemorações da abolição da escravatura no Brasil. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 31, n. 62, p. 19-48, 2011., p. 32). Em Recife, os ideais de integração também foram perseguidos nas cerimônias. Mas os termos desse horizonte conciliatório englobavam e reverenciavam narrativas de resistência escrava e a atuação dos membros do Clube do Cupim.

Em um Teatro Santa Isabel lotado, a exibição da “comédia drama” “O Cupim e a lei de 13 de maio” colocava em cena a trama das fugas de escravizados em um ato e, em outro ato, “o ministro [João Alfredo] na ocasião em que entregava a S. A. a Princesa Imperial o decreto de abolição”.60 60 Jornal do Recife (Recife), 15 maio 1889. A abolição era interpretada como resultado de contendas parlamentares, mas também do protagonismo de escravizados e da ação subterrânea dos abolicionistas do Cupim. Setores da imprensa buscaram estabelecer o 13 de maio como “a data verdadeiramente nacional, porque foi nela que a nacionalidade brasileira começou a viver”. E a proposta deste novo marco de nacionalidade se insinuava coerente com a lógica de organização do Clube que reunia “no seu grêmio homens de todas as posições sociais”.61 61 Jornal do Povo (Recife), 25 abr. 1889.

E assim foi no segundo aniversário da abolição. Parada cívica, comércio fechado, palcos, camarotes e bandeiras de associações abolicionistas hasteadas ao lado do pavilhão nacional. O Clube do Cupim não foi representado por figurões proeminentes do movimento abolicionista, mas, sim, pelos próprios emancipados que desfilaram em posição de destaque. O roteiro da festa começava com o préstito de “um grupo com as primeiras autoridades do Estado, oficiais de mar e terra e da Guarda Nacional”. Depois marcharam “os cidadãos emancipados pela lei áurea, guarnecendo a legendária jangada do Clube do Cupim”, seguida pelas “demais corporações e os cidadãos que comparecerem ao ato”.62 62 Jornal do Recife (Recife), 13 maio 1890.

As celebrações podem ser compreendidas como parte de um processo imediato de patrimonialização do Clube do Cupim, que incluía o depósito de sua documentação em instituição arquivística, a instalação de uma pedra de mármore alusiva ao Clube no frontispício de uma casa onde funcionou uma “panela” e a distribuição de medalhas e honrarias a seus membros. Tal processo se imiscuía e era construído também a partir dos relatos e do sentimento de pertencimento dos sócios auxiliares, alguns se tornaram notáveis guardiões da memória do grupo, entre eles, o mais célebre foi Sebastião Grande de Arruda, retratado abaixo trajando cartola com o nome do Clube.

Figura 2:
Sebastião Grande de Arruda, sócio auxiliar

Arruda posava segurando um livro. Era alfabetizado e militante em campanhas eleitorais no período republicano. Os relatos sobre ele revelam um cidadão orgulhoso em ostentar os signos de sua trajetória militante, “todos os anos, a 13 de maio, lá estava ele, alquebrado, com o peito cheio de medalhas humanitárias ganhas pelo seu trabalho, a visitar o túmulo dos abolicionistas”.63 63 Diário de Pernambuco (Recife), 23 mar. 1918. Era figura carimbada em comissões cívicas e devotou parte de sua velhice a promover a memória do Clube do Cupim. Em 1911, já quase septuagenário e com problemas de visão, “ofereceu-se [...] para fazer os concertos” da barquinha do Clube que se encontrava “exposta às chuvas e ao sol”, abandonada e já em avançado estado de deterioração.64 64 A Província (Recife), 22 abr. 1911.

Não há como desvincular o denodo de Sebastião Grande de Arruda em restaurar aquela barquinha e o seu ímpeto em perpetuar uma memória de lutas protagonizadas por uma aliança social diversa entre libertos, escravizados, trabalhadores pobres e próceres abolicionistas na província de Pernambuco. As travessias executadas ao longo da década de 1880 foram determinantes para que milhares de pessoas conseguissem deixar para trás a vida do cativeiro, dilatando os planos e as esperanças de liberdade de tantos outros escravizados e pavimentando a ruína da ordem senhorial em um dos principais territórios escravistas das Américas. Em meio ao processo de atualização da violência racial e do apagamento do ativismo abolicionista dos escravizados no pós-abolição por todo o Brasil, os emancipados que carregaram a barquinha do Cupim sobre seus próprios ombros nas festas do 13 maio no Recife buscavam impedir que o prestígio daquela data passasse em branco.

Fontes documentais

  • ANAIS do Senado Brasileiro, 1888, livro I.
  • ATAS do Clube do Cupim. Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, Fundo Fia, Cx.16.
  • CARTA corográfica da Província de Pernambuco, 1889. Arquivo Nacional. Fundo ABL.
  • CARTE cabinet. Pernambuco, s/d.Coleção Francisco Rodrigues. Fundação Joaquim Nabuco.
  • DOCUMENTAÇÃO avulsa do Clube do Cupim. Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, Fundo FIA, Cx.16.

Correspondências

  • Correspondências de João Ramos. Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano. Fundo FIA, Cx.15.

Periódicos

  • A Provincia(Recife): 1911, 1918.
  • Cearense (Fortaleza): 1881.
  • Diário de Pernambuco(Recife): 1884, 1885, 1888, 1889, 1918.
  • Gazeta do Norte(Fortaleza): 1880, 1881.
  • Jornal do Povo(Recife): 1889.
  • Jornal Pequeno(Recife): 1905, 1910.
  • Jornal do Recife(Recife): 1880, 1882, 1884, 1885, 1887, 1890
  • Libertador (Fortaleza): 1881, 1884.
  • O Paiz(Rio de Janeiro): 1887.
  • Vinte e cinco de Março(Rio de Janeiro): 1887.

Referências

  • ALONSO, Ângela. Flores, votos e balas: o movimento abolicionista brasileiro (1868-1888). São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
  • AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda negra medo branco: o negro no imaginário das elites do século XIX. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
  • BARBOZA, Edson Holanda Lima. A hidra cearense: rotas de retirantes e escravizados entre o Ceará e as fronteiras do Norte (1877-1884). Tese (Doutorado em História), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2013.
  • BARBOZA, Edson Holanda Lima. Da diáspora cearense: classificações raciais e alianças em rotas entre o Ceará e a Amazônia. Projeto História, São Paulo, n. 56, p. 117-148, maio-ago., 2016.
  • BEZERRA NETO, José Maia. Fugindo, sempre fugindo: escravidão, fugas escravas e fugitivos no Grão-Pará (1840-1888). Dissertação (Mestrado em História), Universidade Estadual de Campinas, 2000.
  • BEZERRA NETO, José Maia. Por todos os meios legítimos e legais: as lutas contra a escravidão e os limites da abolição (Brasil, Grão-Pará: 1850-1888). Tese (Doutorado em História), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2009.
  • BRAGA, Flávia. Roendo a madeira da escravidão: o Club do Cupim como espaço de luta política (Pernambuco, 1884-1888). In: Caravana 25 anos da ANPUH Pernambuco: diálogos entre a pesquisa e o ensino Recife, 2015.
  • CARBADO, Devon; WEISE, Donald (ed.). The long walk to freedom: Runaway Slave Narratives. Boston: Beacon Press, 2012.
  • CARDOSO, Antonio Alexandre Isidio. O Eldorado dos deserdados: indígenas, escravos, migrantes, regatões e o avanço rumo ao oeste amazônico no século XIX. Tese (Doutorado em História), Universidade de São Paulo, 2017.
  • CARDOSO, Ciro Flamarion Santana. A abolição como problema histórico e historiográfico. In: CARDOSO, Ciro Flamarion Santana (org.). Escravidão e abolição no Brasil: novas perspectivas. Rio de Janeiro: Zahar, 1988. p. 74-110.
  • CARVALHO, Marcus J. M. de. “Quem furta mais e esconde”: o roubo de escravos em Pernambuco, 1832-1855. Estudos Econômicos, São Paulo, v. 17, n. 9, p. 89-110, 1987.
  • CASTILHO, Celso Thomas. Slave emancipation and transformations in Brazilian Political Citizenship Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 2016.
  • CRAVO, Ana Carolina Trindade. “Haja cacetes! Haja páo!” - A Sociedade Libertadora de Benevides: abolicionistas, escravos e colonos na luta contra a escravidão (1881-188). Tese (Doutorado em História), Universidade Federal do Pará, 2014.
  • DOMINGUES, Petrônio José. “A redempção de nossa raça”: as comemorações da abolição da escravatura no Brasil. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 31, n. 62, p. 19-48, 2011.
  • DOUGLASS, Frederick. My bondage and my freedom Nova York: Barnes & Noble Classics, 2005.
  • EISENBERG, Peter. Ficando livre: as alforrias em Campinas no século XIX. São Paulo: Estudos Econômicos, v. 17, n. 2, 1987.
  • ELTIS, David; RICHARDSON, David. Atlas of the Transatlantic Slave Trade New Haven & Londres: Yale University Press, 2010.
  • FONER, Eric. Gateway to freedom: the hidden history of the underground railroad. Oxford: Oxford University Press, 2015.
  • FRANKLIN, John Hope; SCHWENINGER, Loren. Runaway Slaves: rebels on the plantation. Oxford: Oxford University Press, 2000.
  • GOMES, Alessandro Filipe de Meneses. Das docas de Comércio ao Cais Contínuo: as tentativas frustradas de melhoramento do porto do Recife no Oitocentos. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal de Pernambuco, 2016.
  • JESUS, Ronaldo P. de. Visões da Monarquia: escravos, operários e abolicionismo na Corte. Belo Horizonte: Argvmentvm, 2009.
  • MACHADO, Maria Helena P. T. [1994]. O Plano e o pânico: os movimentos sociais na década da abolição. São Paulo: Editora Edusp, 2010.
  • MORAES, Renata Figueiredo. A abolição no Brasil além do parlamento: as festas de maio de 1888. In: MACHADO, Maria Helena; CASTILHO, Celso (org.). Tornando-se livre: agentes históricos e lutas sociais no processo de abolição. São Paulo: EDUSP, 2015.
  • NABUCO, Joaquim. Diários Prefácios e notas de Evaldo Cabral de Mello. Rio de Janeiro: Bem-tevi; Recife: Fundaj, Ed. Massangana, v. 1, 2005.
  • OTSUKA, Alexandre Ferro. Antonio Bento: discurso e prática abolicionista na São Paulo da década de 1880. Tese (Doutorado em História), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2015.
  • REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos. Introdução - Uma história da liberdade. In: REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos(org.). Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras , 2006. p. 9-25.
  • SANTOS, Maria Emília Vasconcelos dos. Antes do 13 de maio: o 25 de março no Ceará e o movimento abolicionista em Pernambuco. Afro-Ásia, Salvador, v. 53, p. 149-183, 2016.
  • SILVA, Eduardo. As camélias do Leblon e a abolição da escravatura: uma investigação de História Cultural. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
  • SILVA, Eduardo. Domingo, dia 13: o underground abolicionista, a tecnologia de ponta e a conquista da liberdade. In: ABREU, Martha; PEREIRA, Matheus Serva. (org.). Caminhos da liberdade: histórias da abolição e do pós-abolição no Brasil. Niterói: PPGHistória - UFF, 2011. p. 29-37.
  • *
    Em tempos de pandemia, com arquivos fechados, a escrita desse artigo só foi possível graças à generosidade de Celso Thomas Castilho e Arthur Danillo Castelo Branco de Souza, que cederam cópias de importante documentação sobre o Clube do Cupim. O autor registra sua profunda gratidão.
  • 1
    Ver, entre outros, Foner (2015), Carbado e Weise (2012), Franklin e Schweninger (2000, cap. 3), Bezerra Neto (2000) e Carvalho (1987).
  • 2
    A título de exemplo dos novos estudos sobre o tema, ver: Castilho (2016), Alonso (2015), Moraes (2015), Silva (2011), Machado (2010 [1994]), Jesus (2009), Bezerra Neto (2009), Silva (2003) e Bezerra Neto (2000). Para uma análise das diferentes visões cunhadas pela historiografia produzida ao longo de um século após a abolição legal da escravatura, cf. o ensaio de Ciro Cardoso (1988).
  • 3
    Atas do Clube do Cupim, 30 ago. 1885. Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano (doravante: IAHGP), Fundo Fia, Cx.16.
  • 4
    Atas do Clube do Cupim, 23 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 5
    Diário de Pernambuco (Recife), 27 maio 1888.
  • 6
    Listas de colaboradores externos ao clube vieram a público após 1888. Nelas constam mais de duas centenas de pessoas, aliadas de circunstância, indício de que o grupo em torno da entidade era ainda mais diversificado do que se supunha, chegando a incluir mulheres escravizadas e damas de famílias tradicionais (BRAGA, 2015).
  • 7
    Jornal Pequeno (Recife), 18 abr. 1910.
  • 8
    Jornal do Recife (Recife), 28 out. 1884.
  • 9
    Almanaque Administrativo, Mercantil, Industrial e Agrícola da Província de Pernambuco para o ano de 1875. Recife: Tip. Universal, 1874. p. 168. A Província (Recife), 4 fev. 1890.
  • 10
    Revista do Instituto do Ceará. Apontamentos biográficos de João Cordeiro, escritos por ele próprio: (Do Documentário do Instituto, respeitadas a redação e ortografia do original). Fortaleza: Instituto do Ceará, Tomo LIX, 1945. p. 272.
  • 11
    Jornal do Recife (Recife), 28 set. 1880; Gazeta do Norte (Fortaleza), 14 set. 1880.
  • 12
    Libertador (Fortaleza), 3 mar. 1881.
  • 13
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de João Cordeiro para João Ramos, 9 jun. 1881.
  • 14
    Gazeta do Norte (Fortaleza), 15 jul. 1881.
  • 15
    Coincidência ou não, o iate João Valle, mantido por João Cordeiro para “transportar escravos roubados em Pernambuco”, eventualmente era listado no movimento do porto do Recife carregando “sacos com farinha de mandioca”. Em 30 de agosto de 1885, uma operação de fuga foi planejada em uma embarcação que transportava 250 sacos de farinha de mandioca para o porto de Macau-RN. Revista do Instituto do Ceará. Apontamentos biográficos de João Cordeiro, escritos por ele próprio: (Do Documentário do Instituto, respeitadas a redação e ortografia do original). Fortaleza: Instituto do Ceará, Tomo LIX, 1945. p. 277. Jornal do Recife (Recife), 18 jul. 1882; Diário de Pernambuco (Recife), 30 out. 1885.
  • 16
    A saga da fuga foi reconstruída a partir da Gazeta do Norte (Fortaleza), edições de 30 abr. 1881, 2 jun. 1881, 4 jun. 1881, 5 jul. 1881; 15 jul. 1881; e do Cearense (Fortaleza) de 3 maio 1881.
  • 17
    Libertador (Fortaleza), 21 abr. 1884; Libertador (Fortaleza), 26 abr. 1884. Existe uma consistente leva de novas pesquisas informando a presença marcante de escravizados fugidos no curso dos fluxos migratórios de cearenses para províncias ao Norte, sobretudo no contexto da Seca de 1877, que motivou o deslocamento de mais de 100 mil cearenses à região amazônica. Edson Barboza evidenciou que os escravizados se infiltravam em meio aos contingentes de retirantes e rumavam para o Norte também para escapar das malhas do tráfico interprovincial dirigido a lavouras cafeeiras do centro-sul do país (CARDOSO, 2017; BARBOZA, 2016; BARBOZA, 2013; CRAVO, 2014; BEZERRA NETO, 2000).
  • 18
    Gazeta do Norte (Fortaleza), 5 jul. 1881.
  • 19
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de João Cordeiro para João Ramos, 3 maio 1884.
  • 20
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Antônio Bezerra de Menezes para João Ramos, 1881.
  • 21
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de João Cordeiro para João Ramos, 22 ago. 1883.
  • 22
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Gualter Silva para João Ramos, 4 mar. 1883.
  • 23
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Antônio Bezerra de Menezes para João Ramos, 20 jul. 1882.
  • 24
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Gualter Silva para João Ramos, 22 fev. 1884.
  • 25
    Bilhete de Manoel de Albuquerque s/d. Carta de José Francisco da Cunha para João Ramos, 27 abr. 1883. Bilhete de José Mariano Carneiro da Cunha, 20 fev. 1884. Carta de Carta João Hermano Caminha para João Ramos, 22 fev. 1884. Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15.
  • 26
    Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Prisciano Lins para João Ramos, 28 maio 1881.
  • 27
    Abaixo-assinado. Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano, Série de documentos Avulsos, 17 abr. 1883. Apud Braga (2015).
  • 28
    Os depoimentos foram prestados em junho de 1884, mas no cabeçalho há registro de 1883. Autuamento de João Ramos e da parda Maria de propriedade de Agostinho Santos. Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15.
  • 29
    Perseverança e Porvir era uma associação emancipadora formada pelo mesmo núcleo de membros da Sociedade Libertadora Cearense. Correspondência de João Ramos. IAHGP, Fundo FIA, Cx.15. Carta de Gualter Silva para João Ramos, 25 mar. 1884.
  • 30
    Diário de Pernambuco (Recife), 1˚ jun. 1884; Jornal do Recife (Recife), 3 jun. 1884.
  • 31
    Inicialmente, o nome da associação era Clube Relâmpago. Porém, os participantes decidiram modificar o nome porque “algum sócio” havia transmitido “a pessoas estranhas ao clube algumas das deliberações tomadas”. Atas do Clube do Cupim, 30 ago. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16. A fundação do Clube se insere em meio ao momento mais fértil do associativismo abolicionista, o 25 de março cearense motivou uma onda de fundação de associações abolicionistas pelo Brasil (CASTILHO, 2016, cap. 4; ALONSO, 2015, cap. 6; SANTOS, 2016).
  • 32
    Os 10$000 réis eram referidos com constância como valor base para passagens individuais, mas em embarques coletivos o custo era barateado. Em uma ocasião um sócio revelou que “recebeu 96$000 como pagamento das passagens de 12 ingleses”. Atas do Clube do Cupim, 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 33
    Atas do Clube do Cupim, 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 34
    Atas do Clube do Cupim, 21 nov. 1884; 28 nov. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16
  • 35
    Jornal Pequeno (Recife) 15 maio 1905.
  • 36
    Ver, por exemplo, Atas do Clube do Cupim, dias 4 nov. 1884 e 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 37
    Jornal Pequeno (Recife) 15 maio 1905.
  • 38
    A Provincia (Recife), 21 maio 1918.
  • 39
    Atas do Clube do Cupim, dias 7 nov. 1884 e 27 nov. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 40
    Atas do Clube do Cupim, 10 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 41
    Atas do Clube do Cupim, 23 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 42
    Atas do Clube do Cupim, 29 out. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 43
    Atas do Clube do Cupim, 12 nov. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 44
    Escrevendo sobre esse período alguns anos depois, Ambrósio Machado, um dos fundadores do Clube da Lavoura de Ipojuca, afirmou na imprensa que em conversa particular “diante de mim e de vários agricultores [o conselheiro João Alfredo] disse que um governo moralizado e honesto, fosse ele qual fosse, a primeira coisa que devia fazer era mandar restituir escravos roubados que estavam no Ceará a seus legítimos senhores”. Diá­rio de Pernambuco (Recife), 29 mar. 1889.
  • 45
    Atas do Clube do Cupim, 10 set. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 46
    Jornal do Recife (Recife), 4 dez. 1884.
  • 47
    Atas do Clube do Cupim, 5 dez. 1884. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 48
    Segundo transcrição do “Auto de perguntas feitas a José Symplicio de Sá Esteves, aos 2 de dezembro, pelo delegado de polícia”, publicada em: Diário de Pernambuco (Recife), 14 dez. 1884.
  • 49
    Jornal do Recife (Recife), 3 jan. 1885.
  • 50
    Diário de Pernambuco, 9 jul. 1884.
  • 51
    O Paiz (Rio de Janeiro), 19 abr. 1887.
  • 52
    Documentação avulsa do Clube do Cupim. IAHGP, Fundo FIA, Cx.16.
  • 53
    Vinte e cinco de Março (Rio de Janeiro), 7 ago. 1887.
  • 54
    Jornal do Recife (Recife), 3 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 5 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 6 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 8 jul. 1887; Jornal do Recife (Recife), 29 jul. 1887.
  • 55
    Jornal do Recife (Recife), 28 jun. 1887.
  • 56
    Jornal do Recife (Recife), 8 jul. 1887.
  • 57
    Anais do Senado Brasileiro, 1888, livro I, p. 34.
  • 58
    Atas do Clube do Cupim, dias 3 e 10 set. 1885; 8 out. 1885. IAHGP, Fundo Fia, Cx.16.
  • 59
    Entre os sócios auxiliares, no centro da foto, está Gertrudes Maria de Jesus. Ela é uma das quatro mulheres mencionadas como sócias auxiliares em uma lista redigida em 1889. Entre os que posaram para este retrato, constam os seguintes sócios: Juvenal Machado, Israel de Barros, Genuíno de Oliveira, Manoel Francisco dos Santos, Gertrudes Maria de Jesus, Ascenso José de Sant'Anna, João Clemente Chaves, José Diogo dos Passos e Sebastião Grande Arruda.
  • 60
    Jornal do Recife (Recife), 15 maio 1889.
  • 61
    Jornal do Povo (Recife), 25 abr. 1889.
  • 62
    Jornal do Recife (Recife), 13 maio 1890.
  • 63
    Diário de Pernambuco (Recife), 23 mar. 1918.
  • 64
    A Província (Recife), 22 abr. 1911.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    16 Dez 2020
  • Aceito
    21 Abr 2021
Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro Largo de São Francisco de Paula, n. 1., CEP 20051-070, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel.: (55 21) 2252-8033 R.202, Fax: (55 21) 2221-0341 R.202 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: topoi@revistatopoi.org