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TURISMO RESPONSÁVEL: PROPOSTA DE FRAMEWORK A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO NO BRASIL.

RESPONSIBLE TOURISM: FRAMEWORK PROPOSAL BASED ON THE EXPERIENCE OF THE SOCIAL SERVICE OF COMMERCE IN BRAZIL.

TURISMO RESPONSABLE: PROPUESTA DE FRAMEWORK BASADO EN LA EXPERIENCIA DEL SERVICIO SOCIAL DE COMERCIO EN BRASIL.

RESUMO:

O crescimento do setor de turismo e os impactos para os destinos torna importante o estudo de alternativas para mitigar os impactos negativos e intensificar os positivos com foco na qualidade de vida do residente e na geração de valor para as organizações. Este artigo tem por objetivo desenvolver um framework a partir da identificação e análise das dimensões do Turismo Responsável via estudo do caso das operações de turismo do Serviço Social do Comércio (Sesc). O estudo possui abordagem quantitativa: Por meio da aplicação de questionário junto aos funcionários da organização e análises estatísticas descritivas e fatoriais, os resultados demonstraram que as dimensões que se apresentaram com maior expressividade foram a responsabilidade sociocultural (participação e cooperação local, engajamento dos residentes e empresas locais); a responsabilidade ambiental (uso de acomodações e transporte sustentáveis, monitoramento de impactos ambientais e grupos de turismo reduzidos); a responsabilidade econômica (estímulo a compra em produtores locais e uso de mão de obra local); a imagem e reputação da organização (marketing, reputação e vantagem competitiva) e a incorporação da sustentabilidade à gestão (gestão sustentável e percepção de qualidade). O framework reconhece a complexidade da atividade turística e pode contribuir para a sua gestão responsável.

PALAVRAS-CHAVE:
responsável; stakeholders; responsabilidade social; framework; gestão em turismo

RESUMEN:

El crecimiento del sector turístico y las repercusiones en los destinos hace que sea importante estudiar alternativas para mitigar los impactos negativos e intensificar los positivos, centrándose en la calidad de vida del residente y la generación de valor para las organizaciones. El presente artículo objetiva desarrollar un framework a partir de la identificación y análisis de las dimensiones del Turismo Responsable a través del estudio de caso del Servicio Social de Comercio (Sesc). El estudio adopta un enfoque cuantitativo: mediante la aplicación de cuestionario y análisis estadístico descriptivo y factorial, los resultados mostraron que las dimensiones más expresivas fueran la responsabilidad sociocultural (participación y cooperación local, compromiso de los residentes y empresas locales); la responsabilidad ambiental (utilización de alojamiento y transporte sostenibles, monitoramiento de los efectos ambientales y reducción de los grupos turísticos); la responsabilidad económica (fomento de la compra a los productores locales y utilización de mano de obra local); la imagen y la reputación de la organización (comercialización, reputación y ventaja competitiva) y la incorporación de la sostenibilidad en la gestión (gestión sostenible y percepción de la calidad). El framework diseñado reconoce la complejidad de la actividad turística y puede contribuir a la gestión responsable del turismo.

PALABRAS CLAVE:
turismo responsable; stakeholders; responsabilidad social; framework; gestión de turismo

ABSTRACT:

The growth of the tourism sector and the consequent impacts on destinations make it important to study alternatives to mitigate the negative impacts and intensify the positive impacts, focusing on the quality of life of the resident and the value generation for the organizations. This article aims to develop a framework based on identifying and analyzing the Responsible Tourism dimensions through the case study of tourism operations of the Social Service of Commerce (Sesc). The study adopts a quantitative approach: Through the application of a questionnaire with the firm’s employees and descriptive and factorial statistical analysis, the results showed that the most expressive dimensions were socio-cultural responsibility (participation and local cooperation, engagement of residents and local businesses); environmental responsibility (use of sustainable accommodation and transport, monitoring of environmental impacts and reduced tourism groups); economic responsibility (encouraging purchase from local producers and use of local labor); image and reputation of the organization (marketing, reputation, and competitive advantage) and incorporation of sustainability into management (sustainable management and perception of quality). The framework designed recognizes the complexity of tourism activity and can contribute to the responsible management of tourism.

KEYWORDS:
responsible tourism; stakeholders; social responsibility; framework; tourism management

INTRODUÇÃO

A influência do setor de turismo apoiada em seu potencial econômico e na possibilidade de servir como ferramenta para o desenvolvimento é crescente e conhecida. O setor tem evoluído mundialmente acima de 4% ao ano desde o ano 2009 e, antes da pandemia da Covid-19, 1,3 bilhão de turistas viajavam pelo mundo anualmente. A cadeia produtiva do setor de turismo, nos períodos anteriores à crise, representava mais de 10% do PIB mundial e provia um para cada dez empregos no mundo (World Tourism Organization and Organization of American States, 2018).

Os aspectos econômicos envolvidos na atividade turística são, com frequência, os mais valorizados (Hall, 2010Hall, C. M. (2010). Changing paradigms and global change: From sustainable to steady-state tourism. Tourism Recreation Research, 35(2), 131-143. https://doi.org/10.1080/02508281.2010.11081629
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; Li, Jin, & Shi, 2018Li, K. X., Jin, M., & Shi, W. (2018). Tourism as an important impetus to promoting economic growth: A critical review. Tourism Management Perspectives , 26, 135-142. https://doi.org/10.1016/j. tmp.2017.10.002
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). Os indicadores utilizados para descrever o setor - quantidade de turistas, PIB, contribuição para o emprego, dentre outros - demonstram um esforço constante para afirmar sua importância, mas, ao mesmo tempo, refletem inquietação em admitir impactos sociais e ambientais cada vez mais evidentes (Budeanu, Miller, Moscardo, & Ooi, 2016Budeanu, A., Miller, G., Moscardo, G., & Ooi, C-S. (2016). Sustainable Tourism, Progress, Challenges and Opportunities: An Introduction. Journal of Cleaner Production, 111(Part B), 285-294. https://doi. org/10.1016/j.jclepro.2015.10.027
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).

Pesquisas têm demonstrado que a atividade turística pode gerar diversos impactos negativos nos destinos na dimensão econômica - redução da oferta e aumento dos preços de aluguel residencial (Llop, 2017Llop, N. L. (2017). A policy approach to the impact of tourist dwellings in condominiums and neighbourhoods in Barcelona. Urban Research and Practice, 10(1), 120-129. https://doi.org/10. 1080/17535069.2017.1250522
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; Scholtz, & Slabbert, 2018Scholtz, M., & Slabbert, E. (2018). A remodelled approach to measuring the social impact of tourism in a developing country. Development Southern Africa, 356), 743-759. https://doi.org/10.1080/037 6835X.2018.1461609
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) e aumento do custo de vida (Scholtz, Viviers, & Maputsoe, 2019Scholtz, M., Viviers, P. A., & Maputsoe, L. (2019). Understanding the residents’ social impact perceptions of an African Cultural Festival: the case of Macufe. Journal of Tourism and Cultural Change, 17(2), 166-185. https://doi.org/10.1080/14766825.2018.1426592
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) - na dimensão ambiental, geralmente associados à pressão sobre recursos naturais para atender demandas criadas por visitantes (Lopes, Mendes, Fonseca, & Villasante, 2017Lopes, P. F. M., Mendes, L., Fonseca, V., & Villasante, S. (2017). Tourism as a driver of conflicts and changes in fisheries value chains in Marine Protected Areas. Journal of Environmental Management, 200, 123-134. ; Macneill, & Wozniak, 2018Macneill, T., & Wozniak, D. (2018). The economic, social, and environmental impacts of cruise tourism. Tourism Management , 66, 387-404. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2017.11.002
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) e ao aumento do volume de resíduos sólidos e dos custos para coleta de lixo (Gogonea, Baltălungă, Nedelcu, & Dumitrescu, 2017Gogonea, R.-M., Baltălungă, A. A., Nedelcu, A., & Dumitrescu, D. (2017). Tourism pressure at the regional level in the context of sustainable development in Romania. Sustainability, 9(5), 1-24. ; Greco, Cenciarelli, & Allegrini, 2018Greco, G., Cenciarelli, V. G., & Allegrini, M. (2018). Tourism’s impacts on the costs of municipal solid waste collection: Evidence from Italy. Journal of Cleaner Production , 177, 62-68. https://doi. org/10.1016/j.jclepro.2017.12.179
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) - e na dimensão sociocultural, que diz respeito à redução do bem estar da população local (Serenari, Peterson, Wallace, & Stowhas, 2017Serenari, C., Peterson, M. N., Wallace, T., Stowhas, P. (2017). Private protected areas, ecotourism development and impacts on local people’s well-being: a review from case studies in Southern Chile. Journal of Sustainable Tourism , 25(12), 1792-1810. https://doi.org/10.1080/09669582.2016.1178755
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), hostilidade por parte da população (Marins, Mayer, & Fratucci, 2015Marins, S. R., Mayer, V. F., & Fratucci, A. C. (2015). Impactos percibidos del turismo. Un estúdio comparativo con residentes y trabajadores del sector en Rio de Janeiro-Brasil. Estudios y Perspectivas en Turismo, 24(1), 115-134. ) e isolamento de grupos não contemplados pela atividade turística (Serenari et al., 2017).

Diante da tendência de crescimento do setor e das consequências decorrentes para os destinos, torna-se importante estudar alternativas para mitigar os impactos negativos e intensificar os positivos com foco na qualidade de vida do residente, dado que estudos apontam relações significativas entre qualidade de vida e ações responsáveis em turismo (Frey, & George, 2010Frey, N., & George, R. (2010). Responsible tourism management: The missing link between business owners’ attitudes and behaviour in the Cape Town tourism industry. Tourism Management , 31(5), 621-628. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2009.06.017
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; Hanafiah, Azman, Jamaluddin, & Aminuddin, 2016Hanafiah, M. H., Azman, I., Jamaluddin, M. R., & Aminuddin, N. (2016). Responsible Tourism Practices and Quality of Life: Perspective of Langkawi Island communities. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 222, 406-413. ; Mathew, 2017Mathew, P. V. (2017). Impact of responsible tourism on destination sustainability and quality of life of community in tourism destinations. Journal of Hospitality andTourism Management , 31, 83-89. https://doi.org/10.1016/j.jhtm.2016.10.001
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; Moscardo, & Murphy, 2014Moscardo, G., & Murphy, L. (2014). There is no such thing as sustainable tourism: Reconceptualizing tourism as a tool for sustainability. Sustainability , 6(5), 2538-2561. https://doi.org/10.3390/su6052538
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). É nesse contexto que a responsabilidade das empresas de turismo quanto aos impactos de suas atividades é levada em consideração como possibilidade para um desenvolvimento turístico mais equilibrado (Goodwin, 2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. ). O conceito de Turismo Responsável se estabeleceu, assim, como área de investigação entre pesquisadores de turismo (Mihalic, 2016Mihalic, T. (2016). Sustainable-responsible tourism discourse -Towards “responsustable” tourism. Journal of Cleaner Production , 111 (Part B), 461-470. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.12.062
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) e também tem sido considerado como oportunidade de negócio pelas empresas do setor (Hanafiah et al., 2016), tendo em vista que o engajamento em ações e práticas responsáveis ajudam a criar valor para as organizações e para a sociedade e podem gerar vantagem competitiva (Camilleri, 2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
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).

É relevante, portanto, o estudo das relações entre as partes interessadas, notadamente as empresas de turismo e a comunidade receptora, a partir de uma perspectiva socialmente responsável e de geração de valor. Esse cenário leva à questão: como mitigar impactos negativos e potencializar os positivos a partir das dimensões sociocultural, ambiental e econômica do Turismo Responsável? A importância em se propor uma referência para o apoio à gestão do turismo, a partir da identificação e análise das dimensões do Turismo Responsável, impõe como objetivo deste estudo o desenvolvimento de uma proposta de estrutura para uma gestão responsável do setor. No campo dos estudos organizacionais, é comum a tradução de temas cuja análise é complexa para formas que possam ser estudadas e aplicadas por comunidades com diferentes perspectivas, acadêmicas ou não, bem como para realizar comparações, acompanhamentos e tomadas de decisão (Lima; Lezana, 2005Lima, E. P., Lezana, A. G. R. (2005). Desenvolvendo um framework para estudar a ação organizacional: das competências ao modelo organizacional. Gestão e Produção, 12(2), 177-190. https://doi.org/10.1590/S0104-530X2005000200004
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). Nesse estudo, o framework é o suporte utilizado para a representação dos resultados.

Para compreensão dos resultados e, especialmente, da construção da proposta de framework apresentada ao final, faz-se necessário estabelecer o marco teórico que forneceu as bases para a pesquisa.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Evidências apontam que há problemas de ordem prática quando se trata de sustentabilidade e turismo devido à ampla diversidade de atores envolvidos no desenvolvimento da atividade turística, com conjunto diferente de objetivos e compreensões distintas do conceito ambíguo de sustentabilidade, frequentemente concentrado na dimensão ambiental (Farmaki, Panayiotis, Yiasemi, & Karis, 2014Farmaki, A., Panayiotis, C., Yiasemi, I., & Karis, P. (2014). Responsible tourism in Cyprus: the rhetoric and the reality. Worldwide Hospitality and Tourism Themes, 6(3), 10-26. https://doi.org/10.1108/ WHATT-10-2013-0041
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; Goodwin, 2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. ; Mihalic, 2016Mihalic, T. (2016). Sustainable-responsible tourism discourse -Towards “responsustable” tourism. Journal of Cleaner Production , 111 (Part B), 461-470. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.12.062
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; Moscardo, & Murphy, 2014Moscardo, G., & Murphy, L. (2014). There is no such thing as sustainable tourism: Reconceptualizing tourism as a tool for sustainability. Sustainability , 6(5), 2538-2561. https://doi.org/10.3390/su6052538
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; Santos, Méxas, & Meiriño, 2017Santos, R. A., Méxas, M. P., & Meiriño, M. J. (2017). Sustainability and hotel business: criteria for holistic, integrated and participative development. Journal of Cleaner Production , 142, 217-224. ; World Travel and Tourism Council, 2017World Travel and Tourism Council (2017, March). Understanding the Critical Issues for the Future of Travel & Tourism. Recuperado de https://www.americansforthearts.org/sites/default/files/issuetourism. pdf.
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). Falta clareza, segundo Goodwin (2016), sobre quem são os responsáveis pela busca da sustentabilidade e isto provoca a sensação de que a responsabilidade é de todos e ao mesmo tempo de ninguém.

É nesse contexto que o conceito de Turismo Responsável se apresenta como uma ampliação do discurso na procura por formas práticas de lidar com a busca pela sustentabilidade (Lima, 2017Lima, K. S. C. (2017). Turismo responsável e eventos: uma análise sobre a responsabilidade a partir do Festival Internacional de Cinema e Video Ambiental (FICA) em Goiás/GO. [s.l.] Universidade de Brasilia - UnB. ). Uma vez que pode beneficiar empresas, melhorar a imagem e competitividade dos destinos turísticos e melhorar a qualidade de vida das comunidades, o conceito tem recebido significativa atenção de várias organizações intergovernamentais e pesquisadores acadêmicos (Camilleri, 2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
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; Farmaki et al., 2014Farmaki, A., Panayiotis, C., Yiasemi, I., & Karis, P. (2014). Responsible tourism in Cyprus: the rhetoric and the reality. Worldwide Hospitality and Tourism Themes, 6(3), 10-26. https://doi.org/10.1108/ WHATT-10-2013-0041
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; Mathew, 2017Mathew, P. V. (2017). Impact of responsible tourism on destination sustainability and quality of life of community in tourism destinations. Journal of Hospitality andTourism Management , 31, 83-89. https://doi.org/10.1016/j.jhtm.2016.10.001
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).

TURISMO RESPONSÁVEL

O termo específico Turismo Responsável ganhou força em 2002, a partir da Declaração de Cape Town, que o definiu como “o turismo que cria melhores lugares para as pessoas morarem e melhores lugares para as pessoas visitarem”. A Declaração aponta avanços na busca pela sustentabilidade no turismo, mas reconhece que há um longo caminho a percorrer para alcançá-la. Destaca-se, em especial, a perspectiva mais ampla e cooperativa do documento, direcionando a responsabilidade para múltiplos atores e buscando a garantia do equilíbrio entre a qualidade de vida da comunidade receptora, melhores experiências para os visitantes e a criação de melhores oportunidades de negócios para as empresas (África do Sul, 2002África do Sul (2002). Cape Town Declaration on Responsible Tourism. Cidade do Cabo: [s.n.]. ).

Para Goodwin (2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. , p. 23), turismo responsável “trata de assumir responsabilidade e reconhecer que o turismo é o que fazemos dele”. Para este autor, “a ênfase está naquilo que indivíduos e grupos fazem para abordar as questões de sustentabilidade que surgem em lugares específicos, prioridades locais, relatando de forma transparente o que está sendo feito” (Goodwin, 2016, p. 23). Indivíduos - seja o turista ou a comunidade receptora - empresas e poder público são responsáveis coletivamente por como o turismo funciona em um determinado local e pelos seus impactos positivos e negativos, assim como são responsáveis pela mudança de paradigma em busca da sustentabilidade (Goodwin, 2016, pp. 35-36).

Outra abordagem sobre turismo responsável é apresentada por Moscardo e Murphy (2014Moscardo, G., & Murphy, L. (2014). There is no such thing as sustainable tourism: Reconceptualizing tourism as a tool for sustainability. Sustainability , 6(5), 2538-2561. https://doi.org/10.3390/su6052538
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): estes autores argumentam que o turismo deve ser visto como ferramenta para a sustentabilidade e propõem, em uma clara mudança de perspectiva, que projetos turísticos não deveriam observar quais recursos estão disponíveis no destino para o turismo, mas sim quais recursos o turismo traria para a região e como os visitantes poderiam contribuir para atender às necessidades e aspirações de residentes e empresas não turísticas. As empresas de turismo se tornam, portanto, corresponsáveis pelos impactos sobre a qualidade de vida da comunidade receptora.

Traçando paralelos com a sustentabilidade, Farmaki et al. (2014Farmaki, A., Panayiotis, C., Yiasemi, I., & Karis, P. (2014). Responsible tourism in Cyprus: the rhetoric and the reality. Worldwide Hospitality and Tourism Themes, 6(3), 10-26. https://doi.org/10.1108/ WHATT-10-2013-0041
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, p. 12) criticam a abordagem tradicional do turismo sustentável, que “busca alcançar uma combinação específica de números e tipos de visitantes para minimizar o efeito de suas atividades no destino”, e afirmam que o turismo responsável vai além da gestão de recursos naturais, destacando a responsabilidade moral das empresas de turismo em relação ao meio ambiente e sociedade.

Spenceley et al. (2002Spenceley, A., Relly, P., Keyser, H., Warmeant, P., McKenzie, M., Mataboge, A., Seif, J. (2002, July). Responsible Tourism Manual for South Africa. Department for Environmental Affairs and Tourism. https://doi.org/10.13140/RG.2.1.3512.0484
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) enumeram cinco elementos-chave do Turismo Responsável: Desenvolver uma vantagem competitiva; avaliar, monitorar e divulgar os impactos do desenvolvimento do turismo; garantir o envolvimento das comunidades e o estabelecimento de vínculos econômicos significativos; incentivar a diversidade natural, econômica, social e cultural; e promover o uso sustentável dos recursos locais. Já Goodwin e Francis (2003Goodwin, H., & Francis, J. (2003). Practitioner Papers Ethical and responsible tourism: Consumer trends in the UK. Journal of Vacation Marketing, 9(3), 271-284. ) assumem as diretrizes da Associação de Operadores de Turismo Independentes, instituição que representa várias operadoras de turismo do Reino Unido, que também destaca cinco pontos: proteger o meio ambiente; respeitar as culturas locais; beneficiar as comunidades locais; conservar os recursos naturais e minimizar a poluição.

Identifica-se, portanto, como elementos comuns às definições de Turismo Responsável, as dimensões sociocultural, ambiental e econômica, sem necessariamente uma definição de hierarquia ou priorização entre elas. É também possível destacar um enfoque na interdependência entre os atores que fazem parte da cadeia produtiva do turismo, e a responsabilização das empresas sobre seus impactos nos destinos. Nesse sentido, convém ponderarmos sobre a responsabilidade social nas organizações turísticas, tema ainda recente no que tange às pesquisas acadêmicas.

RESPONSABILIDADE SOCIAL EM ORGANIZAÇÕES TURÍSTICAS

Especialistas argumentam que a responsabilidade social corporativa (RSC) é parte fundamental do conceito de turismo responsável, pois ao incorporar práticas desta natureza, procura-se garantir que as partes interessadas (stakeholders) envolvidas no turismo sejam responsáveis por suas ações e comportamentos, isto é, a responsabilidade das empresas é sublinhada em termos do impacto de suas decisões e ações (Coles, Fenclova, Dinan, 2013Coles, T., Fenclova, E., Dinan, C. (2013). Tourism and corporate social responsibility: A critical review and research agenda. Tourism Management Perspectives, 6, 122-141, http://dx.doi.org/10.1016/j. tmp.2013.02.001 ; Farmaki et al., 2014Farmaki, A., Panayiotis, C., Yiasemi, I., & Karis, P. (2014). Responsible tourism in Cyprus: the rhetoric and the reality. Worldwide Hospitality and Tourism Themes, 6(3), 10-26. https://doi.org/10.1108/ WHATT-10-2013-0041
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).

A RSC é “um conceito de gestão em que as empresas integram preocupações sociais e ambientais em suas operações de negócios e interações com seus stakeholders.” (United Nations Industrial Development Organization, 2021United Nations Industrial Development Organization (2021). What is CSR? Vienna. Recuperado de https://www.unido.org/our-focus/advancing-economic-competitiveness/competitive-trade-capacities-and-corporate-responsibility/corporate-social-responsibility-market-integration/ what-csr.
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). Trata-se de um “compromisso das empresas em contribuir para o desenvolvimento econômico sustentável, trabalhando com os empregados, suas famílias, a comunidade local e a sociedade em geral para melhorar sua qualidade de vida.” (World Business Council for Sustainable Development, 2002World Business Council for Sustainable Development (2002). Corporate Social Responsibility: The WBCSD’s Journey. Suíça. Recuperado de www.wbcsd.org. )

Carroll (1999Carroll, A. B. (1999). Corporate Social Responsibility: Evolution of a definitional construct. Business & Society, 38(3), 268-295, https://doi.org/10.1177%2F000765039903800303
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), em sua revisão sobre o tema, argumenta que o termo “social” na RSC é percebido como algo vago e sem especificidade quanto a por quem a empresa é responsável. Esta observação é corroborada por outros autores, cujas pesquisas analisaram percepções sobre o tema em distintos segmentos e destacaram a sua complexidade (Goodwin, 2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. ; Porter, Kramer, 2006Porter, M. E., & Kramer, M. R. (2006). Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility. Harvard Business Review, 84, 78-92. ; Sheldon, Park, 2011Sheldon, P. J., & Park, S.-Y. (2011). An Exploratory Study of Corporate Social Responsibility in the U.S. Travel Industry. Journal of Travel Research , 50(4), 392-407. https://doi.org/10.1177/0047287510371230
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). Carroll (1999), em uma tentativa de esclarecer a ambiguidade, defende o uso do conceito de stakeholder, pois personaliza responsabilidades sociais delineando os grupos específicos que os negócios devem considerar em suas atividades.

As perspectivas a serem consideradas para definição das responsabilidades de uma empresa, segundo Garriga e Melé (2004Garriga, E., Melé, D. (2004). Corporate Social Responsibility Theories: Mapping the territory. Journal of Business Ethics, 53 (1/2), 51-71, https://doi.org/10.1023/B:BUSI.0000039399.90587.34
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), podem estar baseadas em teorias éticas, as quais consideram que a relação entre empresa e sociedade está embutida em valores éticos, isto é, princípios que expressam a coisa certa a fazer ou a necessidade de alcançar uma boa sociedade. Os autores salientam que uma concepção desta natureza deve atender aos objetivos e intenções da empresa e estar alinhada com a sua estratégia, como uma resposta apropriada às circunstâncias em que a organização opera (Garriga, Melé, 2004).

Nesse sentido, Porter e Kramer (2006Porter, M. E., & Kramer, M. R. (2006). Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility. Harvard Business Review, 84, 78-92. ), após analisarem os elos entre RSC e vantagem competitiva, afirmam que as escolas de pensamento sobre o assunto compartilham da mesma fraqueza: são concentradas na tensão entre os negócios e a sociedade, e não em sua interdependência.

Uma agenda corporativa social afirmativa deve buscar benefícios sociais e econômicos simultaneamente, em uma dependência mútua entre empresas e sociedade. Isto significa que, para além das expectativas da comunidade e da mitigação dos impactos negativos, as escolhas devem beneficiar os dois lados por meio do progresso social, seguindo o princípio do valor compartilhado (Porter, & Kramer, 2006Porter, M. E., & Kramer, M. R. (2006). Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility. Harvard Business Review, 84, 78-92. ). Para isso, Porter e Kramer (2006) defendem a transformação das atividades da cadeia de valor em um pequeno número de iniciativas cujos benefícios sociais e comerciais à sociedade sejam grandes e distintos, e cujos resultados reforcem a estratégia corporativa.

No setor turístico não é diferente: a criação de valor compartilhado depende da colaboração entre organizações, isto é, depende do trabalho em rede entre diferentes setores. A comunicação e diálogo contínuo entre todas as partes interessadas, somadas a práticas ambientais sustentáveis e responsáveis, alavancam o desempenho das empresas de turismo e podem trazer vantagem competitiva (Camilleri, 2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
https://doi.org/10.1080/21568316.2015.10...
). No entanto, embora pesquisas e práticas sobre RSC tenham aumentado nos últimos anos, apresentando não apenas um corpo conceitual consolidado, mas, também, ferramentas de uso global, o setor turismo tem demorado a reagir a essa tendência. Poucos estudiosos se envolveram com o tema de forma extensiva ou sistemática, e o resultado é um conjunto ainda parcial de conhecimento quando se trata de RSC em turismo (Coles, Fenclova; Dinan, 2013Coles, T., Fenclova, E., Dinan, C. (2013). Tourism and corporate social responsibility: A critical review and research agenda. Tourism Management Perspectives, 6, 122-141, http://dx.doi.org/10.1016/j. tmp.2013.02.001 ; Frey, George, 2010Frey, N., & George, R. (2010). Responsible tourism management: The missing link between business owners’ attitudes and behaviour in the Cape Town tourism industry. Tourism Management , 31(5), 621-628. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2009.06.017
https://doi.org/10.1016/j.tourman.2009.0...
; Sheldon, Park, 2011Sheldon, P. J., & Park, S.-Y. (2011). An Exploratory Study of Corporate Social Responsibility in the U.S. Travel Industry. Journal of Travel Research , 50(4), 392-407. https://doi.org/10.1177/0047287510371230
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).

Em sua pesquisa sobre gestão sustentável no setor hoteleiro, Santos, Méxas e Meiriño (2017Santos, R. A., Méxas, M. P., & Meiriño, M. J. (2017). Sustainability and hotel business: criteria for holistic, integrated and participative development. Journal of Cleaner Production , 142, 217-224. ) salientam que as pesquisas mais recentes sobre o tema apresentam debates ainda esparsos relacionados à responsabilidade social. A partir desse ponto de vista, os autores consideram importante a análise de critérios mais detalhados para a sua incorporação de forma holística, participativa e integrada à realidade interna e externa de uma organização turística.

Nessa lógica, Camilleri (2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
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) aponta algumas recomendações essenciais para a agenda do turismo responsável no que tange ao envolvimento das empresas:

  1. promoção de processos de negócios que tragam valor econômico, social e ambiental;

  2. incentivo a abordagens inovadoras e criativas, que promovam o ambiente adequado para o desenvolvimento e aplicação de práticas sustentáveis e responsáveis;

  3. aprimoramento de colaborações e acordos de parceria com governos, sindicatos e sociedade em geral, incluindo as partes interessadas do mercado;

  4. assegurar a existência de níveis adequados de desempenho em áreas como saúde e segurança, condições de trabalho adequadas e práticas ambientais sustentáveis;

  5. maior conscientização, comunicação construtiva, diálogo e confiança;

  6. criação de marco regulatório que incentive e possibilite a implementação de práticas comportamentais sustentáveis e responsáveis pelas empresas de turismo (Camilleri, 2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
    https://doi.org/10.1080/21568316.2015.10...
    , pp. 231-232).

Definidos os conceitos nos quais a pesquisa foi baseada, serão realizadas considerações acerca dos processos metodológicos utilizados no estudo.

METODOLOGIA

Os procedimentos adotados neste estudo têm uma abordagem de caráter quantitativo. Busca-se, no campo pesquisado, obter uma visão holística do contexto a partir da percepção dos envolvidos (Gray, 2012Gray, D. (2012). Pesquisa no mundo real. Porto Alegre: Penso. ), e faz-se a medição se o fato investigado é verídico por meio de dados mensuráveis das variáveis, entendendo suas interligações (Fonseca, 2009Fonseca, R. C. V. (2009). Metodologia do Trabalho Científico. Curitiba: IESDE Brasil. ). Especialmente no caso das pesquisas sociais, visa obter novos conhecimentos no campo da realidade social (Gil, 2002Gil, A. C. (2002). Como elaborar Projetos de Pesquisa. (4a. ed.). São Paulo: Atlas.). O estudo proposto é classificado, quanto aos seus objetivos, como uma pesquisa descritiva, pois procura identificar características de determinada população ou fenômeno e a relação entre variáveis. Também foca na análise dos fatos, descrevendo-os, classificando-os e interpretando-os (Gil, 2002; Rudio, 1985Rudio, F. V. (1985). Introdução ao projeto de pesquisa científica. (9a. ed.) Petrópolis, RJ: Vozes ). Gil (2002) identifica que, na maioria dos casos, pesquisas deste tipo envolvem o levantamento bibliográfico, abordagens com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado e a análise de exemplos que estimulem a compreensão.

No que se refere à sua natureza, é uma pesquisa aplicada, pois seus fundamentos são motivados pela necessidade de gerar conhecimentos para uma aplicação prática, dirigidos às soluções de problemas específicos (Gil, 2002Gil, A. C. (2002). Como elaborar Projetos de Pesquisa. (4a. ed.). São Paulo: Atlas.).

Para a pesquisa empírica de coleta de percepções foram utilizados questionários estruturados utilizando escala de 7 pontos do tipo Likert. O instrumento de pesquisa desenvolvido por Goffi, Masiero e Pencarelli (2018Li, K. X., Jin, M., & Shi, W. (2018). Tourism as an important impetus to promoting economic growth: A critical review. Tourism Management Perspectives , 26, 135-142. https://doi.org/10.1016/j. tmp.2017.10.002
https://doi.org/10.1016/j. tmp.2017.10.0...
) foi adotado na íntegra devido, em primeiro lugar, ao uso de três dimensões de análise (responsabilidade ambiental, econômica e social), alinhadas com o marco teórico deste estudo; e em segundo lugar, em virtude das semelhanças encontradas entre as características das empresas investigadas.

Importante salientar que o instrumento escolhido possui versão original em inglês e, dessa forma, foi realizada a técnica de tradução reversa, isto é, traduziu-se do inglês para o português e, logo, do português para o inglês, para garantir a consistência dos significados originais.

Foi realizado pré-teste do instrumento com cinco profissionais atuantes em agências de viagens e turismo do mercado brasileiro. A partir do pré-teste, os ajustes a seguir foram efetuados:

  1. Exclusão de pergunta sobre o faturamento das empresas (os respondentes manifestaram desconforto com a variável);

  2. Inclusão de pergunta aberta para que os interessados recebam os resultados por email.

Os questionários foram enviados eletronicamente, por meio da plataforma SurveyMonkey, por e-mail e ferramentas de comunicação ágil de trocas de mensagens, como o WhatsApp, aos 120 funcionários das agências de viagens e turismo do Serviço Social do Comércio (Sesc) em nível nacional. Por se tratar de uma pesquisa de caráter quantitativo, cujo instrumento é composto unicamente por questões fechadas, não houve interação direta entre os autores e os respondentes para obtenção das respostas, já que o questionário é autoexplicativo.

O Sesc é uma empresa brasileira, sem fins lucrativos e de atuação em âmbito nacional, criada em 1946 por iniciativa de empresários de comércio e de serviços e organizações sindicais, que a sustentam e administram (SESC DN, 2014SESC DN. (2014). Diretrizes gerais de ação. Rio de Janeiro: [s.n.]. ). Formata, comercializa e operacionaliza excursões e passeios turísticos, mantendo relacionamentos com grande parte da cadeia produtiva do setor de turismo. Está enquadrada como agência de turismo, de acordo com a Lei 11.771, de 17 de setembro de 2008Lei nº 11.771 de 17 de setembro 2008. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007- 2010/2008/lei/L11771.htm. , sendo assim definida: “a pessoa jurídica que exerce a atividade econômica de intermediação remunerada entre fornecedores e consumidores de serviços turísticos ou os fornece diretamente”. A empresa está presente com ações de turismo em 23 estados brasileiros, e realizou, em 2017, 7.300 passeios e 4.100 excursões (SESC DN, 2018SESC DN. (2018). Análise crítica da Atividade Turismo Social - 2017. Rio de Janeiro: [s.n.]. ).

A diretriz básica do Sesc é a de um trabalho eminentemente educativo, que permeia direta ou indiretamente todas as ações desenvolvidas pela organização. É justamente essa função que diferencia sua atuação frente ao trabalho de outras organizações. Dessa forma, seus objetivos principais são:

  1. Fortalecer, por meio da ação educativa não formal, propositiva e transformadora, a capacidade de os indivíduos buscarem a melhoria de suas condições de vida;

  2. Oferecer serviços que possam contribuir para o bem-estar de sua clientela e melhoria da sua qualidade de vida;

  3. Contribuir para o aperfeiçoamento, enriquecimento e difusão da produção cultural. (SESC DN, 2014)

Para atender a estes objetivos, a atuação do Sesc está baseada em cinco campos de atuação: cultura, educação, saúde, assistência social e lazer. Inseridas neste último, encontram-se as atividades de turismo, conforme diretriz número nove do quinquênio 2016-2020:

As ações do Sesc em Turismo, além de proporcionar chances de entretenimento e lazer, devem primar pela valorização da pessoa, do meio ambiente e do patrimônio histórico-cultural, material e imaterial, buscando a dinamização social inerente ao turismo, consoante uma perspectiva educativa e de vivência de cidadania (SESC DN, 2015SESC DN. (2015). Diretrizes do quinquênio 2016-2020. Rio de Janeiro: [s.n.]. ).

O questionário foi disponibilizado durante dois períodos: do dia 15 de novembro até o dia 15 de dezembro de 2018 e, posteriormente, do dia 15 de janeiro até o dia 15 de fevereiro de 2019. O resultado final apresentou 72 questionários válidos para análise.

Os dados foram tratados por meio do software SPSS (Statistical Package for Social Scienses) 25 e submetidos à análise fatorial do tipo PCA (Principal Component Analysis), com rotação varimax, somando-se à observação do índice de adequação da amostra Kaiser-Meyer- Olkin (KMO), que indica a fatorabilidade dos dados; realização de teste de esfericidade de Bartlett, que fornece a probabilidade estatística de que a matriz de correlação seja significante e a consistência interna das variáveis por meio do Alpha de Cronbach (Hair, 2005Hair, J. (2005). Fundamentos de métodos de pesquisa em administração. Porto Alegre, RS: Bookman. ).

A análise fatorial tem como objetivo a redução de uma grande quantidade de variáveis observadas a um número reduzido de fatores. Os fatores traduzem as dimensões latentes (construtos) que resumem ou explicam o conjunto de variáveis observadas (Hair, 2005Hair, J. (2005). Fundamentos de métodos de pesquisa em administração. Porto Alegre, RS: Bookman. ). O Alpha de Cronbach serve para avaliar a consistência interna dos fatores verificando o grau em que os itens de um instrumento estão correlacionados (Hair, 2005).

RESULTADOS

A análise fatorial apresentou índice de adequação da amostra Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) de 0,702, indicando a fatorabilidade dos dados. O teste de KMO quantifica o grau de intercorrelações entre as variáveis e a adequação da análise de componentes principais. Esse teste, segundo Hair (2005Hair, J. (2005). Fundamentos de métodos de pesquisa em administração. Porto Alegre, RS: Bookman. ), tem as seguintes interpretações:

  1. Maior ou igual a 0,80: admirável

  2. Entre 0,80 e 0,70: mediano

  3. Entre 0,70 e 0,60: medíocre

  4. Menor que 0,60: inaceitável

O teste de esfericidade de Bartlett apresentou significância de 0,000, o que também indica correlação das variáveis dentro da amostra pesquisada. Foram destacados 8 fatores, porém, com diversas variáveis apresentando cargas divididas.

Assim, realizaram-se novas tentativas de análise fatorial buscando realocar ou excluir variáveis a partir do referencial teórico, assim como foram calculados o Alpha de Cronbach de cada fator, de maneira a encontrar o modelo mais adequado para este estudo.

O Critério da Raiz Latente foi novamente adotado para extração dos fatores. A análise fatorial retornou sete fatores, estando algumas variáveis, ainda, com cargas baixas e divididas entre os componentes. Como último procedimento para definir o modelo ideal para esta pesquisa, novamente os conjuntos das variáveis foram analisados à luz do referencial teórico e nova análise fatorial foi realizada. O modelo final apresentou cinco fatores e 18 variáveis, conforme indicado na tabela 1.

Tabela 1:
Resultados da análise fatorial.

A decisão pela exclusão de 19 variáveis, listadas a seguir, baseou-se no fato destas apresentarem cargas baixas, cargas negativas e/ou reduzirem o índice de Alpha de Cronbach das dimensões.

  1. E6: Compreensão do papel da organização na sustentabilidade dos destinos

  2. E7: A sustentabilidade como parte da visão e dos valores da organização

  3. E8: A sustentabilidade como estratégia de redução de custos

  4. E10: Treinamento das equipes em boas práticas ambientais

  5. E11: Desenvolvimento de projetos de conservação nos destinos

  6. E14: Participação em programas de rotulagem ecológica

  7. E17: Uso de acomodações de propriedade local

  8. E18: Uso de bens locais

  9. E20: Estabelecimento de padrões para a mão de obra local

  10. E23: Encorajamento dos clientes a comprarem passeios ou excursões diretamente de agências de viagens locais

  11. E24: Promoção de doações realizadas por turistas

  12. E28: Oferta de informações detalhadas sobre culturas locais

  13. E29: Monitoramento dos impactos socioeconômicos

  14. E30: Fornecimento de código de conduta para os clientes

  15. E31: Limitação do número de turistas nas atividades

  16. E33: Estímulo à conscientização sobre turismo sustentável nos destinos

  17. E34: Introdução de diretrizes de turismo sustentável em empresas parceiras

  18. E36: Produção de relatórios periódicos sobre sustentabilidade

  19. E37: Comunicação de questões relacionadas à sustentabilidade

Nesta última análise, verificou-se que o índice de adequação da amostra Kaiser- Meyer-Olkin (KMO) foi de 0,787, indicando fatorabilidade ainda maior dos dados. Já o teste de esfericidade de Barlett apresentou uma significância de 0,000, o que mantém a correlação das variáveis dentro da amostra pesquisada e adequação à análise dos componentes principais.

O conjunto final de variáveis também foi submetido a análise do Alpha de Cronbach e apresentou resultado de 0,906, demonstrando uma excelente consistência interna das variáveis analisadas.

Conforme visto na tabela 1, os fatores identificados por meio da análise fatorial foram: cinco elementos relacionados à responsabilidade sociocultural; quatro à responsabilidade ambiental; três referentes à responsabilidade econômica; três elementos associados à imagem e reputação da organização e, por fim, três elementos sobre a incorporação da sustentabilidade à gestão. A denominação dos fatores foi fundamentada na revisão de literatura.

As percepções sobre turismo responsável nas operações da empresa investigada são explicadas, principalmente, pela dimensão “responsabilidade sociocultural”, que responde por 30,075% da variância total, seguido pela “responsabilidade ambiental”, com 14,137%; “responsabilidade econômica”, que explica 10,584%; “imagem e reputação”, com 7,673%; e, por fim, “incorporação da sustentabilidade à gestão”, que explica 5,728% da variância total.

Aproximadamente 80% da variância explicada do construto, que foi de 68,197%, é demonstrada pelos três primeiros fatores do modelo, acompanhando as pesquisas recentes, que manifestam as dimensões sociocultural, econômica e ambiental como elementos comuns à compreensão sobre turismo responsável (África do Sul, 2002; Spenceley et al. 2002Spenceley, A., Relly, P., Keyser, H., Warmeant, P., McKenzie, M., Mataboge, A., Seif, J. (2002, July). Responsible Tourism Manual for South Africa. Department for Environmental Affairs and Tourism. https://doi.org/10.13140/RG.2.1.3512.0484
https://doi.org/10.13140/RG.2.1.3512.048...
; Goodwin e Francis 2003Goodwin, H., & Francis, J. (2003). Practitioner Papers Ethical and responsible tourism: Consumer trends in the UK. Journal of Vacation Marketing, 9(3), 271-284. ; Goodwin, 2016).

Serão promovidas, a seguir, análises sobre os resultados de cada uma das dimensões para facilitar a compreensão dos dados, assim como serão apresentadas possíveis hipóteses para os níveis de concordância encontrados, fundamentadas nas características dos produtos ofertados pela organização pesquisada e também na discussão da literatura.

DIMENSÃO RESPONSABILIDADE SOCIOCULTURAL

A dimensão “responsabilidade sociocultural” apresentou Alpha de Cronbach de 0,828 e nível de concordância com média de 4,89.

Esta dimensão está associada a elementos de cooperação da organização investigada com atores locais, isto é, nos destinos turísticos que fazem parte dos produtos ofertados; além de elementos de conscientização sobre turismo sustentável e monitoramento de impactos socioeconômicos.

A importância dada às necessidades do mercado e dos visitantes, em detrimento das expectativas da comunidade residente quanto ao desenvolvimento do turismo, é considerado por vários autores um dos principais problemas do planejamento de destinos turísticos (Farmaki et al., 2014Farmaki, A., Panayiotis, C., Yiasemi, I., & Karis, P. (2014). Responsible tourism in Cyprus: the rhetoric and the reality. Worldwide Hospitality and Tourism Themes, 6(3), 10-26. https://doi.org/10.1108/ WHATT-10-2013-0041
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; Goodwin, 2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. ; Hall, 1999Hall, C. M. (1999). Rethinking collaboration and partnership: A public policy perspective. Journal of Sustainable Tourism, 7(3-4), 274-289. https://doi.org/10.1080/09669589908667340
https://doi.org/10.1080/0966958990866734...
; Krippendorf, 1989Krippendorf, J. (1989). Sociologia do Turismo: para uma nova compreensão do lazer e das viagens. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. ; Moscardo, & Murphy, 2014Moscardo, G., & Murphy, L. (2014). There is no such thing as sustainable tourism: Reconceptualizing tourism as a tool for sustainability. Sustainability , 6(5), 2538-2561. https://doi.org/10.3390/su6052538
https://doi.org/10.3390/su6052538...
).

O bem-estar da comunidade residente, que inclui as empresas locais, está associado aos relacionamentos duradouros entre governo, empresas e sociedade e à compreensão de que a atividade turística deve ser um meio para se alcançar esta percepção (Budeanu et al., 2016Budeanu, A., Miller, G., Moscardo, G., & Ooi, C-S. (2016). Sustainable Tourism, Progress, Challenges and Opportunities: An Introduction. Journal of Cleaner Production, 111(Part B), 285-294. https://doi. org/10.1016/j.jclepro.2015.10.027
https://doi. org/10.1016/j.jclepro.2015....
; Goodwin, 2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. ; Moscardo, Konovalov, Murphy, McGehee, & Schurmann, 2017Moscardo, G., Konovalov, E., Murphy, L., McGehee, N. G., & Schurmann, A. (2017). Linking tourism to social capital in destination communities. Journal of Destination Marketing and Management, 6(4), 286-295. https://doi.org/10.1016/j.jdmm.2017.10.001
https://doi.org/10.1016/j.jdmm.2017.10.0...
).

O Sesc apresentou altos níveis para os elementos E25 e E26, que tratam dos relacionamentos com stakeholders no nível local. Estes resultados talvez possam ser justificados tanto pelos objetivos de desenvolvimento dos destinos, declarado pela empresa em suas diretrizes, quanto pela sua centralidade nas regiões onde exerce suas atividades, em especial, nos territórios fora do eixo turístico tradicional, onde poucas empresas se dedicam ao turismo.

O resultado é positivo visto que pesquisas recentes sugerem que o estímulo ao engajamento e participação da comunidade e dos stakeholders locais é fundamental para o desenvolvimento sustentável dessas regiões (Moscardo et al., 2017Moscardo, G., Konovalov, E., Murphy, L., McGehee, N. G., & Schurmann, A. (2017). Linking tourism to social capital in destination communities. Journal of Destination Marketing and Management, 6(4), 286-295. https://doi.org/10.1016/j.jdmm.2017.10.001
https://doi.org/10.1016/j.jdmm.2017.10.0...
; Nunkoo, 2017Nunkoo, R. (2017). Governance and sustainable tourism: What is the role of trust, power and social capital? Journal of Destination Marketing & Management, 6(4), 277-285. https://doi.org/10.1016/j. jdmm.2017.10.003
https://doi.org/10.1016/j. jdmm.2017.10....
), com consequências favoráveis sobre o bem-estar geral da sociedade e, inclusive, sobre o alívio da pobreza (Goffi, Cucculelli, & Masiero, 2019Goffi, G., Cucculelli, M., & Masiero, L. (2019). Fostering tourism destination competitiveness in developing countries: The role of sustainability. Journal of Cleaner Production , 209, 101-115. https://doi. org/10.1016/j.jclepro.2018.10.208
https://doi. org/10.1016/j.jclepro.2018....
). Acompanha também a visão recente sobre responsabilidade social corporativa, que incorpora a escuta das partes interessadas à gestão de empresas, como parte do seu compromisso com o desenvolvimento sustentável das regiões nas quais opera (Coles, Fenclova, Dinan, 2013Coles, T., Fenclova, E., Dinan, C. (2013). Tourism and corporate social responsibility: A critical review and research agenda. Tourism Management Perspectives, 6, 122-141, http://dx.doi.org/10.1016/j. tmp.2013.02.001 ; Farmaki et al., 2014Farmaki, A., Panayiotis, C., Yiasemi, I., & Karis, P. (2014). Responsible tourism in Cyprus: the rhetoric and the reality. Worldwide Hospitality and Tourism Themes, 6(3), 10-26. https://doi.org/10.1108/ WHATT-10-2013-0041
https://doi.org/10.1108/ WHATT-10-2013-0...
; World Business Council for Sustainable Development, 2002).

Ao mesmo tempo, o nível de participação em ações coletivas possui relação direta com a posição dos membros em uma rede (Hwang, & Stewart, 2017Hwang, D., & Stewart, W. P. (2017). Social Capital and Collective Action in Rural Tourism. Journal of Travel Research, 56(1), 81-93. ) o que pode, em alguma medida, gerar acúmulo desigual de poder e reforçar hierarquias (Stevenson, 2016Stevenson, N. (2016). Local festivals, social capital and sustainable destination development: experiences in East London. Journal of Sustainable Tourism , 24(7), 990-1006. https://doi.org/10.1 080/09669582.2015.1128943
https://doi.org/10.1 080/09669582.2015.1...
). Por isso, é recomendável um equilíbrio nas relações existentes no âmbito da formação de redes (Li, & Hunter, 2015Li, Y., & Hunter, C. (2015). Community involvement for sustainable heritage tourism: a conceptual model. Journal of Cultural Heritage Management and Sustainable Development, 5(3), 248-262. https://doi.org/10.1108/JCHMSD-08-2014-0027
https://doi.org/10.1108/JCHMSD-08-2014-0...
).

Nesse sentido, cabe destacar o elemento E27, que mede o relacionamento com organizações não governamentais (ONGs). Embora acima do ponto central, esta variável apresentou a segunda média mais baixa do construto, revelando um nível ainda moderado de relacionamento com estas instituições.

Já o elemento E32 se refere aos estímulos à conscientização sobre turismo sustentável para os clientes. Segundo Moscardo et al. (2017Moscardo, G., Konovalov, E., Murphy, L., McGehee, N. G., & Schurmann, A. (2017). Linking tourism to social capital in destination communities. Journal of Destination Marketing and Management, 6(4), 286-295. https://doi.org/10.1016/j.jdmm.2017.10.001
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), uma efetiva comunicação sobre turismo, alinhada à novas formas de medir o sucesso da atividade, são componentes importantes associados à participação local.

No contexto pesquisado, a empresa revelou uma propensão maior à conscientização dos clientes e menor dos destinos, levando, inclusive, à eliminação do elemento E33 do modelo final devido à baixa carga fatorial apresentada. Estes resultados já eram esperados, em primeiro lugar, pelo caráter educativo central das atividades de turismo propostas pelo Sesc e, em segundo lugar, pela facilidade naturalmente maior de realizar este tipo de estímulo nos clientes do que nos destinos, algo que dependeria de acesso a outras instituições.

Os níveis de concordância mais baixos foram encontrados nos elementos E29 e E35, que se referem ao monitoramento dos impactos socioeconômicos e a contratação de fornecedores de acordo com padrões sustentáveis. O primeiro, considerado por Spenceley et al. (2002Spenceley, A., Relly, P., Keyser, H., Warmeant, P., McKenzie, M., Mataboge, A., Seif, J. (2002, July). Responsible Tourism Manual for South Africa. Department for Environmental Affairs and Tourism. https://doi.org/10.13140/RG.2.1.3512.0484
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) componente chave para o desenvolvimento da atividade de maneira responsável, junto com sua divulgação regular, foi eliminado do modelo por apresentar baixa carga fatorial. A avaliação dos impactos também é recomendada por diversas instituições de referência (GRI, n.dGRI (n.d). About GRI. Recuperado de https://www.globalreporting.org/information/about-gri/Pages/ default.aspx.
https://www.globalreporting.org/informat...
.; Buró internacional de Turismo Social, 1996Buró Internacional de Turismo Social (1996). Declaración de Montreal. Por una visión humanista y social del turismo. Bruxelas. ; World Tourism Organization and Organization of American States, 2018World Tourism Organization and Organization of American States (2018). Tourism and the Sustainable Development Goals: Good Practices in the Americas. Madrid: UNWTO. https://doi.org/10.18111 /9789284419685
https://doi.org/10.18111 /9789284419685 ...
).

A mensuração dos impactos do turismo, no entanto, ainda é um desafio para pesquisadores, órgãos governamentais e gestores, pois carece de uma compreensão mais profunda desses impactos e como ele influencia tanto a comunidade residente quanto os visitantes (Deery, Jago, & Fredline, 2012Deery, M., Jago, L., & Fredline, L. (2012). Rethinking social impacts of tourism research: A new research agenda. Tourism Management, 33(1), 64-73. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2011.01.026
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; Scholtz, & Slabbert, 2018Scholtz, M., & Slabbert, E. (2018). A remodelled approach to measuring the social impact of tourism in a developing country. Development Southern Africa, 356), 743-759. https://doi.org/10.1080/037 6835X.2018.1461609
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). O resultado apresentado pela variável E29, portanto, não surpreende.

Da mesma forma, a contratação de fornecedores a partir de padrões sustentáveis (E35) apresentou o valor médio mais baixo do construto. Embora importante para estimular comportamentos responsáveis nas empresas parceiras, provavelmente ainda esbarra em dificuldades diversas, como elevação de custos e adequação do mercado aos requisitos. Trata-se de uma barreira à busca por geração de valor compartilhado (Porter, Kramer, 2006Porter, M. E., & Kramer, M. R. (2006). Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility. Harvard Business Review, 84, 78-92. ) a partir de princípios éticos (Garriga, Melé, 2004Garriga, E., Melé, D. (2004). Corporate Social Responsibility Theories: Mapping the territory. Journal of Business Ethics, 53 (1/2), 51-71, https://doi.org/10.1023/B:BUSI.0000039399.90587.34
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), elementos que contribuem para o progresso social e obtenção de vantagem competitiva mútua (Camilleri, 2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
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; Porter, Kramer, 2006).

DIMENSÃO RESPONSABILIDADE AMBIENTAL

A dimensão a ser analisada na sequência é a “responsabilidade ambiental”, que possui Alpha de Cronbach 0,822 e média das variáveis no valor de 3,85, a mais baixa dentre todas as dimensões do modelo.

Em indústrias cujo poder de transformação vem sendo percebido com mais força, como o turismo, a gestão moderna deve estar atenta a respeito dos limites a serem impostos sobre o uso de recursos naturais e sobre o impacto negativo das operações no meio ambiente e na sociedade (Santos et al., 2017Santos, R. A., Méxas, M. P., & Meiriño, M. J. (2017). Sustainability and hotel business: criteria for holistic, integrated and participative development. Journal of Cleaner Production , 142, 217-224. ).

A conservação e a promoção do uso sustentável dos recursos ambientais dos destinos turísticos e a minimização dos impactos ambientais provocados pela atividade são, portanto, componentes fundamentais de uma abordagem responsável no setor turístico (Goodwin, 2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. ; Goodwin, & Francis, 2003; Spenceley et al., 2002Spenceley, A., Relly, P., Keyser, H., Warmeant, P., McKenzie, M., Mataboge, A., Seif, J. (2002, July). Responsible Tourism Manual for South Africa. Department for Environmental Affairs and Tourism. https://doi.org/10.13140/RG.2.1.3512.0484
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).

Os elementos E13 e E12, que tratam do uso de equipamentos sustentáveis, apresentaram valores abaixo do ponto central. Parece ser possível afirmar que o uso preferencial destes tipos de equipamento ainda possui custo elevado ou oferta restrita, o que pode resultar no uso tímido nos destinos que fazem parte do portfólio da organização investigada, acompanhando Santos, Méxas e Meiriño (2017Santos, R. A., Méxas, M. P., & Meiriño, M. J. (2017). Sustainability and hotel business: criteria for holistic, integrated and participative development. Journal of Cleaner Production , 142, 217-224. ), para quem ainda se faz necessária a incorporação do debate sobre sustentabilidade ambiental de maneira mais integrada à realidade interna e externa de uma organização turística.

O elemento E16 se refere ao monitoramento dos impactos ambientais, sendo este um dos oito temas principais sugeridos pelo World Travel and Tourism Council (2017) para compreensão do turismo nos dias atuais. O baixo nível de concordância relatado pela pesquisa acompanha Moscardo et al. (2017Moscardo, G., Konovalov, E., Murphy, L., McGehee, N. G., & Schurmann, A. (2017). Linking tourism to social capital in destination communities. Journal of Destination Marketing and Management, 6(4), 286-295. https://doi.org/10.1016/j.jdmm.2017.10.001
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), que relataram a necessidade urgente de monitorar e gerenciar os impactos negativos da atividade com regularidade. A criação de um marco regulatório, como propõe Camilleri (2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
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), pode ser um caminho possível para tratar o tema.

Por essa perspectiva, no instrumento original havia uma variável, associada ao monitoramento dos impactos ambientais, para medir o reporte periódico sobre sustentabilidade. Este elemento foi eliminado durante a análise dos fatores latentes pois não manifestou relação significativa com nenhum fator. Dado que a organização pesquisada não produz este tipo de reporte com regularidade, tal resultado acompanha as conclusões de Goffi et al. (2018Goffi, G., Masiero, L., & Pencarelli, T. (2018). Rethinking sustainability in the tour-operating industry: Worldwide survey of current attitudes and behaviors. Journal of Cleaner Production , 183, 172- 182. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2018.02.029
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), segundo os quais a eficácia de qualquer monitoramento fica prejudicada sem uma atividade de relatório específica e regular.

Cabe comentar que a participação em programas de rotulagem ecológica, ou selos ambientais, medido pelo elemento E14, depende da transparência de informações sobre ações sustentáveis das organizações. Por esse motivo, a ausência de reportes formais e regulares, conforme já descrito, pode justificar a eliminação do item por carga fatorial baixa.

A manutenção de grupos de turismo ao mínimo (E15) é uma possível resposta mais imediata ao chamado turismo de massas para aliviar a pressão sobre recursos naturais, consequência do aumento da frequência de visitantes (Lopes et al., 2017Lopes, P. F. M., Mendes, L., Fonseca, V., & Villasante, S. (2017). Tourism as a driver of conflicts and changes in fisheries value chains in Marine Protected Areas. Journal of Environmental Management, 200, 123-134. ; Macneill, & Wozniak, 2018Macneill, T., & Wozniak, D. (2018). The economic, social, and environmental impacts of cruise tourism. Tourism Management , 66, 387-404. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2017.11.002
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). Este elemento possui a média mais elevada do construto. Este resultado já era esperado, tendo em vista que as agências de viagens e turismo do mercado tradicionalmente operam com grandes volumes de clientes, enquanto o Sesc já opera em volumes menores.

DIMENSÃO RESPONSABILIDADE ECONÔMICA

A dimensão “responsabilidade econômica” reúne elementos cujo foco é o desenvolvimento dos atores locais nos destinos. Esta dimensão revelou boa associação entre as variáveis, apresentando Alpha de Cronbach 0,718. Já o nível médio de concordância foi o mais alto dentre todas as dimensões, com valor 6,31.

Moscardo e Murphy (2014Moscardo, G., & Murphy, L. (2014). There is no such thing as sustainable tourism: Reconceptualizing tourism as a tool for sustainability. Sustainability , 6(5), 2538-2561. https://doi.org/10.3390/su6052538
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) afirmam que o turismo deve servir como ferramenta para os stakeholders dos destinos melhorarem seu bem-estar e alcançarem a sustentabilidade em vários níveis. Frey e George (2010Frey, N., & George, R. (2010). Responsible tourism management: The missing link between business owners’ attitudes and behaviour in the Cape Town tourism industry. Tourism Management , 31(5), 621-628. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2009.06.017
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) corroboram com esta reflexão e destacam que uma gestão responsável do turismo trata de gerenciar os negócios de forma a beneficiar a comunidade local.

Todos os elementos da dimensão apresentaram médias altas, com destaque para os elementos E21 e E22, que se referem ao estímulo do uso de serviços e compras em negócios locais. Isso demonstra um alinhamento da organização investigada às conclusões mais recorrentes da literatura, ao incluir a gastronomia e o artesanato local como elementos do patrimônio imaterial em seus roteiros, estimulando o consumo em produtores locais, gerando valor econômico, social e ambiental, conforme argumenta Camilleri (2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
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) em sua proposta de agenda para o turismo responsável.

Li e Hunter (2015Li, Y., & Hunter, C. (2015). Community involvement for sustainable heritage tourism: a conceptual model. Journal of Cultural Heritage Management and Sustainable Development, 5(3), 248-262. https://doi.org/10.1108/JCHMSD-08-2014-0027
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), por sua vez, argumentam que as organizações turísticas são, geralmente, o poder dominante em muitos destinos. Por esta razão, sugerem a construção de uma estrutura institucional que envolva comunidades residentes em operações sustentáveis e promova o compartilhamento de benefícios. Já Moscardo et al. (2017Moscardo, G., Konovalov, E., Murphy, L., McGehee, N. G., & Schurmann, A. (2017). Linking tourism to social capital in destination communities. Journal of Destination Marketing and Management, 6(4), 286-295. https://doi.org/10.1016/j.jdmm.2017.10.001
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) destacam o engajamento e os benefícios aos atores locais como elemento central para a melhoria geral da qualidade de vida em destinos turísticos. Com base nesses entendimentos, os resultados apresentados pelo elemento E19 demonstram uma alta preferência pelo uso de mão de obra local como forma de movimentar positivamente a economia dos destinos. A inclusão de moradores locais como participantes ativos e remunerados nos roteiros ofertados, valorizando o saber local e contribuindo ao desenvolvimento econômico dos destinos - em especial aqueles fora do eixo turístico tradicionalmente ofertado pelo mercado - é uma característica da organização pesquisada que pode justificar tais resultados.

Cabe comentar sobre o elemento E17, que está associado ao uso de acomodações de propriedade local, e que foi eliminado do modelo devido à sua baixa carga fatorial. Tal resultado pode ser reflexo do uso frequente de equipamentos de hospedagem social de propriedade da organização em estudo - portanto, não locais - nos produtos ofertados aos clientes.

DIMENSÃO IMAGEM E REPUTAÇÃO

Essa dimensão reúne elementos que fazem referência à imagem e à reputação da organização frente à sociedade e aos parceiros de negócios no que diz respeito a uma atuação sustentável. Associados, os três elementos que compõem a dimensão apresentaram Alpha de Cronbach 0,787 e nível de concordância médio no valor de 5,75.

As variáveis utilizadas para medir esse construto estão relacionadas à sustentabilidade como ferramenta de marketing; como diferencial competitivo; e sobre a manutenção da reputação frente à sociedade. São elementos relevantes porque os resultados de uma agenda sustentável, segundo Porter e Kramer (2006Porter, M. E., & Kramer, M. R. (2006). Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility. Harvard Business Review, 84, 78-92. ), devem buscar benefícios sociais comuns, mas, ao mesmo tempo, reforçar a estratégia corporativa.

Camilleri (2016Camilleri, M. A. (2016). Responsible tourism that creates shared value among stakeholders. Tourism Planning and Development, 13(2), 219-235. https://doi.org/10.1080/21568316.2015.1074100
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) também afirma que práticas sustentáveis e responsáveis, somadas ao diálogo com a sociedade, alavanca o desempenho das empresas turísticas.

Algumas empresas do setor, entretanto, interessadas principalmente em melhorar sua imagem, utilizam ações de sustentabilidade, geralmente menores e pontuais, para influenciar as percepções da sociedade e apenas legitimar sua atuação (Font, Garay, & Jones, 2016Font, X., Garay, L., & Jones, S. (2016). Sustainability motivations and practices in small tourism enterprises in European protected areas. Journal of Cleaner Production , 137, 1439-1448. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.01.071
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).

Nessa perspectiva, Goodwin (2016Goodwin, H. (2016). Responsible Tourism: using tourism for sustainable development (2nd ed.) Oxford: Goodfellow Publishers. ) e Garriga e Melé (2004Garriga, E., Melé, D. (2004). Corporate Social Responsibility Theories: Mapping the territory. Journal of Business Ethics, 53 (1/2), 51-71, https://doi.org/10.1023/B:BUSI.0000039399.90587.34
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) chamam atenção para que a alavancagem dos negócios a partir da publicidade relacionada à sustentabilidade seja pautada por uma postura ética. Frey e George (2010Frey, N., & George, R. (2010). Responsible tourism management: The missing link between business owners’ attitudes and behaviour in the Cape Town tourism industry. Tourism Management , 31(5), 621-628. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2009.06.017
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), por sua vez, afirmam que adotar uma abordagem ética garante transparência e equilíbrio entre os objetivos financeiros, sociais e ambientais, e protege o negócio contra publicidade negativa.

A organização pesquisada apresentou médias bastante elevadas para todas as variáveis. É possível relacioná-los, em primeiro lugar, ao fato de que o termo sustentabilidade é uma tendência. Aderir uma atuação sustentável à imagem das empresas é visto como oportunidade de negócios pelas empresas turísticas (Hanafiah et al., 2016Hanafiah, M. H., Azman, I., Jamaluddin, M. R., & Aminuddin, N. (2016). Responsible Tourism Practices and Quality of Life: Perspective of Langkawi Island communities. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 222, 406-413. ) porque práticas responsáveis, em um mercado competitivo como o turismo, contribuem para criação de valor para as organizações e para a sociedade.

Ao mesmo tempo, o fato de a empresa ter programas de sustentabilidade ambiental generalistas, ainda que não específicos para o setor de viagens e passeios, contribuem para conferir importância ao tema de maneira transversal, expressando uma consciência do potencial de uma atuação sustentável perante a sociedade.

DIMENSÃO INCORPORAÇÃO DA SUSTENTABILIDADE À GESTÃO

A dimensão “incorporação da sustentabilidade à gestão” trata de elementos que medem a percepção do quanto à sustentabilidade está incorporada à gestão da organização e das empresas parceiras. O Alpha de Cronbach do conjunto de variáveis apresentou valor 0,780 e a média encontrada foi 5,58. De acordo com Budeanu et al. (2016Budeanu, A., Miller, G., Moscardo, G., & Ooi, C-S. (2016). Sustainable Tourism, Progress, Challenges and Opportunities: An Introduction. Journal of Cleaner Production, 111(Part B), 285-294. https://doi. org/10.1016/j.jclepro.2015.10.027
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), um volume crescente de relatórios de pesquisa e prática mostra que a sustentabilidade se tornou parte integrante das agendas corporativas e governamentais, assim como existem numerosos exemplos de empresas de turismo e hospitalidade em todo o mundo que implementaram com sucesso sistemas de gestão sustentáveis. Mihalic (2016Mihalic, T. (2016). Sustainable-responsible tourism discourse -Towards “responsustable” tourism. Journal of Cleaner Production , 111 (Part B), 461-470. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.12.062
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) afirma, no entanto, que o discurso dominante sobre sustentabilidade no setor de turismo é teórico, isto é, a sustentabilidade é vista como conceito; já o termo responsabilidade é direcionado à prática, portanto, entendido como ação apropriada, o que exige uma sólida compreensão do processo de implementação de uma agenda sustentável.

Os valores médios de todos os elementos desta dimensão são altos, o que demonstra uma alta integração da sustentabilidade ao processo de gestão da organização. Também demonstra boa associação à percepção de qualidade dos clientes e das empresas parceiras, o que contribui para alavancar o desempenho da empresa. A existência de uma política de sustentabilidade, transversal às suas atividades principais, pode auxiliar a justificar estes resultados.

O uso da Declaração de Montreal (Buró Internacional de Turismo Social, 1996) como fundamento base dos projetos de turismo da organização também pode contribuir para os resultados, assim como as Diretrizes do Quinquênio 2016-2020 (SESC DN, 2015), dado que ambos os documentos reforçam a necessidade de uma atuação sustentável. O quadro 1, a seguir, apresenta uma síntese das possíveis hipóteses para os níveis de concordância encontrados, fundamentadas nas características da organização pesquisada e também na discussão da literatura.

Quadro 1
Síntese das possíveis hipóteses para os níveis de concordância

PROPOSTA DE FRAMEWORK

À luz das análises realizadas na seção anterior, propõe-se um framework de gestão responsável do turismo, apresentado na figura 1. O framework foi construído levando-se em consideração os achados a partir da percepção dos respondentes, associados à prática da organização investigada, bem como à discussão de literatura.

A estrutura de gestão construída insere os elementos percebidos com mais expressividade na organização investigada, nas suas dimensões sociocultural, ambiental e econômica - e as respectivas hipóteses que teriam levado aos níveis de concordância encontrados - em um ambiente produtivo no qual a sustentabilidade e a educação são transversais a todas elas. Destaca a necessidade de mensurar os impactos da atividade turística e de reportá-los com regularidade aos parceiros de negócios e à sociedade em geral. Por fim, apresenta uma agenda de gestão turística responsável que resume necessidades para sua implementação.

Figura 1
Framework de gestão responsável do turismo

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escolha do Serviço Social do Comércio para aplicação do instrumento de pesquisa se mostrou adequada, tendo em vista a relevância da instituição no âmbito do turismo no Brasil e sua expressiva produção, que certamente gera relacionamentos frequentes com diversos setores da cadeia produtiva.

No contexto investigado, as dimensões que se apresentaram com maior expressividade foram a responsabilidade sociocultural (participação e cooperação local, engajamento dos residentes e empresas locais), a responsabilidade ambiental (uso de acomodações e transporte sustentáveis, monitoramento de impactos ambientais e grupos de turismo reduzidos), a responsabilidade econômica (estímulo a compra em produtores locais e uso de mão de obra local), a imagem e reputação da organização (marketing, reputação e vantagem competitiva) e a incorporação da sustentabilidade à gestão (gestão sustentável e percepção de qualidade).

A responsabilidade sociocultural revelou maior representatividade, o que pode estar associado à clareza com que a missão e os objetivos sociais da organização são definidos e compreendidos pelos funcionários. Já a responsabilidade ambiental, embora representativa, revelou resultados que parecem indicar dificuldades no uso de equipamentos sustentáveis nas operações de turismo. Ações que colaboram para o desenvolvimento econômicos dos destinos, como a valorização da produção e dos saberes locais, realizadas com regularidade, elevaram o nível de concordância da dimensão responsabilidade econômica para o maior dentre os respondentes.

A análise dessas dimensões, a partir dos resultados empíricos do estudo, possibilitou a construção de um framework que pode contribuir para a gestão do turismo em uma perspectiva de responsabilidade para com o desenvolvimento dos destinos, das organizações turísticas, dos turistas e residentes, na medida em que dá suporte à mitigação dos impactos negativos e potencialização dos impactos positivos da atividade turística. Dentre as limitações apresentadas nesta pesquisa, uma diz respeito ao estudo ter sido realizado com funcionários de apenas uma organização, o que não permite realizar generalizações para o restante da cadeia produtiva do setor. A outra faz referência ao tamanho da amostra, dado que os resultados estão condicionados à quantidade de respostas válidas recebidas por meio eletrônico. Mesmo assim, os resultados encontrados contribuem para a compreensão sobre os fatores influenciadores do turismo responsável no ambiente das organizações turísticas, estimulando novas pesquisas neste campo.

Haja vista que as conclusões expostas de modo algum encerram o tema, mas, sim, são estímulos para a continuidade e evolução da pesquisa, considera-se importante apresentar algumas sugestões para estudos futuros: inicialmente, sugere-se estudos de caso em outras empresas do campo do turismo para fins de comparação dos resultados, o que inclui a aplicação do instrumento em empresas estrangeiras para identificar diferenças de percepção baseadas em regiões. Também recomenda-se analisar correlações que possam existir entre uma gestão responsável do turismo e percepções do capital social, a fim de compreender se um determinado comportamento responsável na atividade turística pode influenciar elementos como a confiança e a reciprocidade na cadeia produtiva do setor.

Por fim, recomenda-se a aplicação da proposta de framework, especialmente em estudos de caso longitudinais, para verificar sua aplicabilidade e necessidade de ajustes, assim como o delineamento de pesquisas com métodos qualitativos, a fim de complementar e qualificar os resultados.

AGRADECIMENTOS

A pesquisa foi apoiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - Chamada 01-2016, Processos: 430119/2016-0; PQ 303915/2019-6 e MCTIC 429195/2018-4. Agradecemos também à Universidade Federal Fluminense, à Universidade Caxias do Sul e ao Departamento Nacional do Sesc.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    23 Fev 2021
  • Aceito
    14 Out 2021
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