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Padrão morfológico e ciclo de vida de Eutetranychus banksi (Acari: Tetranychidae) de diferentes locais e hospedeiros

Morphological pattern and life cycle of Eutetranychus banksi (Acari: Tetranychidae) from different localities and hosts

Resumo

Eutetranychus banksi (McGregor, 1914) is a phytophagous, polyphagous and cosmopolitan species recorded on 23 plant families in 24 countries in North, Central and South Americas, Europe, Asia, and Africa. Specimens of E. banksi present morphological variability among individuals of the same population and also among populations from different host species, being commonly referred to as a polytypic species, despite the fact that studies based on meristic comparisons of these populations are lacking. Also, there is no data available in the literature on the biological life tables of E. banksi on different hosts. Specimens collected in Brazil, Guadeloupe, Martinique, Mexico, and Paraguay were investigated in order to recognize morphological patterns among populations from different localities and hosts. A redescription of the species is provided based on data both from literature and new observations. Also, the biological cycle on three hosts, experiments of hosts exchange and the possibility of interbreeding in individuals originating from different populations were evaluated. Significant differences in the morphology of the females of different populations were detected when comparing the different hosts. The length of the dorsal pairs of setae v2, sc2, c1, c3, e1 and h1 differentiated the specimens of the populations collected from Citrus sp. from those of Hevea brasiliensis Muell. Arg. and Pachira aquatica Aubl.. Herein we observed significant variation among the life cycle of this species on the three hosts studied. When a substrate different from the one where the mites were collected was used for the biological cycle essay, significant variation was observed in several parameters such as average oviposition rate, events of arrenothoky, and sex ratio. Interbreeding with populations collected from Citrus sinensis and P. aquatica resulted in no descendants, although mating was observed.

Arrenothoky; Citrus sinensis; Hevea brasiliensis; interbreeding; multivariate morphometry


Arrenothoky; Citrus sinensis; Hevea brasiliensis; interbreeding; multivariate morphometry

BIOLOGY

Padrão morfológico e ciclo de vida de Eutetranychus banksi (Acari: Tetranychidae) de diferentes locais e hospedeiros

Morphological pattern and life cycle of Eutetranychus banksi (Acari: Tetranychidae) from different localities and hosts

Viviane M. MattosI; Reinaldo J. F. FeresII

IUniversidade de Cuiabá, Campus de Primavera do Leste. Avenida Guterrez 241, Jardim Riva, 78850-000 Primavera do Leste, Mato Grosso, Brasil. E-mail: vivianemmattos@yahoo.com.br

IILaboratório de Acarologia, Departamento de Zoologia e Botânica, Universidade Estadual Paulista. Rua Cristóvão Colombo 2265, Jardim Nazareth, 15054-000 São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil. E-mail: reinaldo@ibilce.unesp.br

ABSTRACT

Eutetranychus banksi (McGregor, 1914) is a phytophagous, polyphagous and cosmopolitan species recorded on 23 plant families in 24 countries in North, Central and South Americas, Europe, Asia, and Africa. Specimens of E. banksi present morphological variability among individuals of the same population and also among populations from different host species, being commonly referred to as a polytypic species, despite the fact that studies based on meristic comparisons of these populations are lacking. Also, there is no data available in the literature on the biological life tables of E. banksi on different hosts. Specimens collected in Brazil, Guadeloupe, Martinique, Mexico, and Paraguay were investigated in order to recognize morphological patterns among populations from different localities and hosts. A redescription of the species is provided based on data both from literature and new observations. Also, the biological cycle on three hosts, experiments of hosts exchange and the possibility of interbreeding in individuals originating from different populations were evaluated. Significant differences in the morphology of the females of different populations were detected when comparing the different hosts. The length of the dorsal pairs of setae v2, sc2, c1, c3, e1 and h1 differentiated the specimens of the populations collected from Citrus sp. from those of Hevea brasiliensis Muell. Arg. and Pachira aquatica Aubl.. Herein we observed significant variation among the life cycle of this species on the three hosts studied. When a substrate different from the one where the mites were collected was used for the biological cycle essay, significant variation was observed in several parameters such as average oviposition rate, events of arrenothoky, and sex ratio. Interbreeding with populations collected from Citrus sinensis and P. aquatica resulted in no descendants, although mating was observed.

Key words: Arrenothoky; Citrus sinensis; Hevea brasiliensis; interbreeding; multivariate morphometry.

Eutetranychus banksi (McGregor, 1914) ocorre, com ampla distribuição geográfica, nas três Américas (JEPPSON et al. 1975, BOLLAND et al. 1998), Europa, Ásia e África (BAKER & TUTTLE 1994) sendo registrada sobre uma grande variedade de hospedeiros, aproximadamente 90 espécies vegetais de 23 famílias (MIGEON & DORKELD 2006). Sua importância econômica como praga é reconhecida nos cultivos de citros no Texas (DEAN 1980) e na Flórida (MUMA et al. 1953). No Brasil, E. banksi (referido vulgarmente como "ácaro-texano") está associado aos citros e a uma variedade de outros hospedeiros cultivados e silvestres (FLECHTMANN & ABREU 1973, GONDIM JR & OLIVEIRA 2001, FERES et al. 2002, BELLINI et al. 2005, MORAES & FLECHTMANN 2008), embora ainda não tenha sido apontado no país como causador de danos à agricultura. Apesar de tratar-se de uma espécie neotropical, sua origem geográfica precisa é desconhecida (BOLLAND et al. 1998) e sua dispersão pode ter sido amplificada através do cultivo dos citros e plantas ornamentais (PRITCHARD & BAKER 1955), demonstrando a grande capacidade de adaptação de E. banksi a diferentes hospedeiros, dentre eles espécies nativas brasileiras como a seringueira, Hevea brasiliensis Muell. Arg., e a monguba, Pachira aquatica Aubl. (BOLLAND et al. 1998). Existem estudos biológicos da espécie demonstrando a capacidade de sobrevivência sob temperaturas entre 15º e 32ºC (CHILDERS et al. 1991) e em utilizar outros hospedeiros além daquele no qual a população foi originalmente obtida. Espécimes coletados sobre mamão (Carica papaya Linnaeus) puderam ser criados satisfatoriamente tanto sobre mamão quanto sobre dois cultivares de acerola (Malpighia emarginata A. DC.) e laranja lima (Citrus sp.) (BARBOSA et al. 2004). Contudo, considerando a ampla distribuição geográfica, o número de espécies vegetais nas quais foi registrada e a capacidade adaptativa da espécie, mais estudos são necessários para elucidar o potencial biológico da espécie.

Eutetranychus banksi apresenta variações morfológicas entre diferentes populações e hospedeiros, além de variações dentro da mesma população, em relação ao comprimento e forma das setas dorsais (MUMA et al. 1953, PRITCHARD & BAKER 1955, FLECHTMANN & BAKER 1975). PRITCHARD & BAKER (1955) e FLECHTMANN & BAKER (1975), por exemplo, apresentam ilustrações das tíbias e tarsos das pernas I e II de fêmeas que diferem no número de setas táteis e quimiossensoriais representados. O polimorfismo presente em E. banksi levou pesquisadores a considerarem-na uma espécie politípica (PRITCHARD & BAKER 1955).

Raças em diferentes hospedeiros têm sido documentadas em organismos parasitos e fitófagos (BERLOCHER & FEDER 2002, FUNK et al. 2002) e podem se formar em espécies generalistas com relativo isolamento de populações especializadas em diferentes espécies hospedeiras ou em espécies especialistas em uma espécie hospedeira, como resultado do isolamento em diferentes indivíduos hospedeiros. Isso pode resultar numa restrição do fluxo gênico entre as populações nos diferentes hospedeiros mesmo em condições de ocorrência simpátrica (e.g., FILCHAK et al. 2000, GROMAN & PELLMYR 2000). De acordo com HELLE & OVERMEER (1973), a abundância das raças em Acari é uma conseqüência do sistema de reprodução haplodiplóide, que diminui a variabilidade genética intra-populacional e ao mesmo tempo aumenta a diferença entre as populações.

Os métodos morfométricos podem ser usados para detectar diferenças sutis entre populações (REYMENT et al. 1981). Para distinguir as variações entre os grupos utiliza-se a Análise das Variáveis Canônicas (AVC). Essa análise fornece uma descrição das diferenças entre os grupos especificados a priori em um conjunto de dados multivariados, maximizando a variação entre os grupos relativa à variação dentro dos grupos (MONTEIRO & REIS 1999).

Embora alguns cuidados devam ser considerados ao se comparar as dimensões corporais de ácaros submetidos a diferentes períodos de montagem em meio de Hoyer (REESE et al. 1996), o uso da morfometria na Acarologia mostra-se como um instrumento útil de caracterização morfológica e sistemática de espécies, sendo que estudos sobre variação morfológica de ácaros fitófagos associada a hospedeiros são necessários para elucidar a interação ácaro-hospedeiro e melhorar a sistemática no nível de espécie (SKORACKA et al. 2002).

No presente trabalho, tivemos como objetivo analisar a variação morfológica de fêmeas de E. banksi de diferentes populações e hospedeiros, buscando verificar a existência de possíveis padrões morfológicos e o ciclo de vida de indivíduos pertencentes a populações de três hospedeiros, em hospedeiros trocados e com cruzamento entre indivíduos de diferentes populações.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados exemplares fêmeas depositados nas coleções de Acari da Universidade Estadual Paulista, São José do Rio Preto (DZSJRP); Setor de Zoologia Agrícola, Escola Superior de Agricultura Luiz de Quieroz, (ESALQ/USP), Piracicaba; e coleção particular do Dr Carlos H.W. Flechtmann (ESALQ/USP), originários do Brasil (Pernambuco e São Paulo), Guadalupe, Martinica, México e Paraguai (Tab. I). Além disso, foram criados em laboratório e montados em lâminas de microscopia com meio de Hoyer (FLECHTMANN 1975) exemplares provenientes dos seguintes hospedeiros: Pachira aquatica Aubl. (Malvaceae), dos municípios de Bálsamo e São José do Rio Preto; Hevea brasiliensis Muell. Arg. (Euphorbiaceae) de Cedral e São José do Rio Preto; Citrus sp. (Rutaceae) de São José do Rio Preto e Guapiara, São Paulo. Para os estudos de morfometria, os ácaros oriundos de citros não tiveram seus hospedeiros identificados ao nível específico, no entanto, para análise biológica foram utilizados indivíduos de apenas uma população oriunda de Citrus sinensis. As medições foram feitas com auxílio de microscópio fotônico com contraste de fases e retículo calibrado para as objetivas utilizadas. A terminologia utilizada para as setas dorsais é aquela proposta por GRANDJEAN (1939) de acordo com LINDQUIST (1985). Todas as medidas são apresentadas em micrômetros (µm). Os caracteres analisados foram: o comprimento do idiossoma (CI); largura do idiossoma (LI); comprimento dos pares de setas dorsais (v2, sc1, sc2, c1, c2, c3, d1, d2, e1, e2, f1, f2, h1) e distância de inserção entre os elementos dos pares sc2-c3, c1-c1, c1-c2, c2-c3, c1-d1, d1-d1, d1-d2, d1-e1, e1-e1, e1-e2, e2-f1, f1-f1. Os resultados foram submetidos à análise de morfometria univariada através da análise de box plot medianas e quartis com o auxílio do software Bioestat® 4.0, e multivariada com a análise das variáveis canônicas (AVC) com o auxílio do software SAS® 9.1.3. Os testes multivariados aplicados à análise das variáveis canônicas foram: Wilks' Lambda, Pillai's Trace, Hotelling-Lawley Trace e Roy's Greatest Root, usualmente empregados no programa SAS®. Para a análise de morfometria multivariada, as populações foram comparadas entre si de acordo com o hospedeiro e localidade. Foram agrupadas na análise populações de um mesmo hospedeiro de diferentes localidades para avaliação da variabilidade biogeográfica e populações de diferentes hospedeiros da mesma localidade para avaliação da variabilidade entre hospedeiros. Todos os caracteres (tamanho e distância entre setas) não foram reunidos numa única análise devido à restrição material imposta pelo tempo de preservação diferente dos espécimes, o que poderia prejudicar os resultados (REESE et al. 1996). Foi analisado também o número e o tipo de setas presentes nos artículos (da coxa ao tarso) das pernas I a IV. O material testemunho, espécimes montados em lâminas (números 6500 a 6801) e imagens capturadas para o estudo, foi depositado na coleção de Acari (DZSJRP), Departamento de Zoologia e Botânica, IBILCE, Universidade Estadual Paulista (www.splink.cria.org.br) e respectivo banco de imagens.

Foram analisadas, isolada e conjuntamente, 248 fêmeas oriundas dos hospedeiros H. brasiliensis (91), Citrus sp. (78) e P. aquatica (79). Estas foram coletadas em duas localidades para cada hospedeiro, de modo que 30 fêmeas foram medidas para cada localidade/hospedeiro. Na análise conjunta foram utilizadas as medidas de 180 fêmeas oriundas destes hospedeiros. Na análise isolada foram reunidas todas as fêmeas disponíveis oriundas de cada hospedeiro nas diferentes localidades (Tab. I). Para avaliar a variação entre hospedeiros, foram analisadas conjuntamente 52 fêmeas oriundas de 11 hospedeiros de diferentes localidades (Tab. I e Fig. 20).










A partir dos novos dados morfológicos e biológicos obtidos, confrontados com aqueles da descrição original (MACGREGOR 1914: 357-358) e disponíveis na literatura, elaboramos uma redescrição da espécie. As medidas informadas para o tamanho do idiossoma e setas dorsais, representam a média aritmética dos 250 exemplares fêmeas e 50 machos seguidas, entre parênteses, dos valores mínimos e máximos encontrados para as mesmas.

Indivíduos coletados no município de São José do Rio Preto sobre H. brasiliensis, C. sinensis e P. aquatica foram criados nas folhas de seus respectivos hospedeiros. A criação foi mantida em câmara do tipo BOD a 28 ± 1ºC, 12 horas de fotofase e 70 ± 10% UR. Fêmeas e machos foram transferidos com pincel de pêlos finos para unidades de criação. As unidades foram confeccionadas com folhas ou folíolos dos três hospedeiros lavadas em água destilada e colocadas com a face abaxial sobre um pedaço de esponja de náilon umedecido mantido em bandeja de plástico de 6 x 15 x 23cm. As bordas das folhas e folíolos foram recobertas com tiras de algodão hidrófilo. Diariamente, foi adicionada água destilada às bandejas para manter a umidade do sistema. Os ácaros foram transferidos para novas unidades de criação quando as folhas começavam a apresentar danos (clorose ou necrose dos tecidos). O experimento foi realizado em três blocos com 60 fêmeas, 20 em cada tratamento, provenientes da mesma população de cada um dos três hospedeiros e criadas nos três substratos sendo: bloco 1 - fêmeas provenientes de H. brasiliensis, em folhas/folíolos de H. brasiliensis, P. aquatica e C. sinensis; bloco 2 - fêmeas provenientes de C. sinensis, em folhas/folíolos de C. sinensis, P. aquatica e H. brasiliensis; bloco 3 - fêmeas provenientes de P. aquatica, em folhas/folíolos de P. aquatica, H. brasiliensis e C. sinensis. Foram montadas unidades semelhantes às da criação estoque, delimitando-se arenas de 2,5 cm2 com tiras de lenço de papel para confinamento dos indivíduos e acompanhamento do desenvolvimento de todas as fases. No início do experimento, fêmeas foram transferidas para arenas individuais e retiradas após a oviposição, mantendo-se apenas um ovo por arena. Quando atingiram o estágio deutoninfal, as fêmeas receberam em suas arenas machos da criação estoque da mesma população.

Além disso, machos de dois diferentes hospedeiros foram transferidos para arenas de folha/folíolo do hospedeiro de origem das fêmeas que produziram as deutocrisálidas fêmeas nelas presentes. Foram observadas a oviposição, emergência das larvas e desenvolvimento até a fase adulta da geração F1 com determinação da razão sexual da prole. Em seguida foram feitos cruzamentos para testar a viabilidade reprodutiva da geração F2. O experimento foi realizado em dois blocos (de machos e fêmeas) com 45 indivíduos cada. Cada bloco foi dividido em três tratamentos com 15 indivíduos cada, sendo os tratamentos constituídos pelos três hospedeiros.

Nos dois experimentos, as observações foram feitas às 8:00, 13:00 e 18:00 h. Os resultados foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey com utilização do software BioEstat 4.0.

RESULTADOS

Redescrição de Eutetranychus banksi

Fêmea. Medidas (n = 250) - comprimento do idiossoma (incluindo o rostro): 390 (145-462) mm; Largura: 288 (105-373) mm. Idiossoma robusto, deprimido, com coloração verde a marrom-pálida em vida. Manchas escuras laterais relativas ao conteúdo dos cecos digestivos são visíveis através da parede translúcida do corpo. Pernas translúcidas na região proximal e com coloração vermelho-ferrugem ao laranja nos artículos dos palpos e distais das pernas. No material tipo, descrito de mamona e mucuna, a coloração é relatada como sendo "rusty-red". Fêmeas coletadas sobre Citrus sinensis apresentaram coloração avermelhada nos palpos e artículos distais das pernas mais pronunciada em relação a daquelas coletadas sobre H. brasiliensis e P. aquatica. Neste último hospedeiro, apresentou-se mais pálida o que sugere que a coloração sofreu interferência dos componentes alimentares disponíveis em cada diferente substrato. Nos espécimes vivos a posição de repouso, com as pernas I e II orientadas à frente do corpo e III e IV para trás, é característica. Os ovos são redondos, achatados e depositados preferencialmente ao longo da nervura central na face adaxial das folhas. É registrada sobre muitas espécies hospedeiras, preferencialmente na face adaxial das folhas ou folíolos. Contudo, observamos que ocupa preferencialmente a face abaxial das folhas em Cecropia sp. Dorso: A estriação é pouco conspícua, formando linhas suaves transversais na região mediana em relação ao eixo longitudinal do corpo, limitadas pelas inserções dos elementos dos pares de setas c1 e d1. Dessa forma, pode-se observar estriação transversal apenas na região histerossomal central. Às margens desta, a partir de uma constrição entre os elementos das setas c1 e d1, as linhas inicialmente próximas tornam-se curvas e centrífugas seguindo em direção, correspondente na região ventral, à da inserção das coxas III e IV. Imediatamente abaixo da inserção dos elementos do par d1, e tendo essas como base, formam um triângulo com vértice mediano à inserção dos elementos do par e1. Esse ponto coincide, em relação à região ventral, com a área estriada da abertura genital. Na região histerossomal estão localizados os elementos do par de poros ia, conspícuos e localizados na região mediana entre as bases dos elementos das setas c2 e d2, exatamente sobre uma linha imaginária entre as coxas III e IV. Os poros im e ip são menores e não conspícuos sob aumento de 400x, localizados entre a inserção dos elementos das setas d2-e2 e e2-f2, respectivamente. Setas dorsais curtas e espatuladas, pares v2 44 (16-57), sc2 43 (18-54), c3 42 (17-57), d2 26 (10-46), e2 33 (13-52), f1 41 (17-60), f2 28 (11-41) e h1 32 (12-44), com a extremidade distal dilatada e espatulada ou em forma de clava, sempre maiores que as setas dos pares sc1 20 (6-38), c1 13 (5-19), sc2 16 (5-35), d1 14 (5-19), e116 (6-24), que são curtas e com formato de clava. Os pontos de inserção dos elementos dos pares de setas e1 e f1 formam a figura de um trapézio invertido.Pernas: quetotaxia (da coxa ao tarso) - I: 2-1-6 [ou 7]-4-9(1)-13(1) + 1 assoc., II: 2-1-4 [4 a 6]-4-6-11+ 1 assoc., III: 1-1-2-2-4 ou 5-10(1), IV: 1-1-1-2-5 [ou 6] -10(1).

Macho. Medidas (n = 50) - Comprimento do corpo (incluindo o rostro): 293(272-313) mm; Largura: 193 (177-209) µm. Setas dorsais: v2 30 (27-35), sc1 20 (14-27), sc2 31 (24-38), c112 (11-14), sc2 15 (11-22), c3 31 (24-38), d112 (8-16), d2 24 (16-30), e1 13 (11-19), e2 25 (22-33), f1 29 (24-33), f2 21 (19-24), h1 23 (19-27). Coloração semelhante à da fêmea. Corpo delgado, alongado e afunilado na porção terminal. Apresentam as setas dorsais mais delgadas com as extremidades geralmente mais afiladas. Edéago com eixo do corpo reto, colo dirigido dorsalmente com curvatura em direção proximal e extremidade distal levemente aguda, formando um ângulo de cerca de 45º em relação ao eixo do corpo. Quetotaxia (da coxa ao tarso) - I: 2-1-9-4-9(4)-14(2) + 1 assoc., II: 2-1-7-4-6(2)-12(1) + 1 assoc., III: 1-1-4-2-5-10(1), IV: 1-1-1-2-5 [ou 6] -10(1).

Observação. Eutetranychus banksi difere de E. orientalis Klein, 1936, por esta última apresentar as bases dos elementos dos pares e1 e f1 formando a figura de um quadrado, com área muito inferior à figura de trapézio presente em E. banksi. Além disso, difere na quetotaxia dos artículos das pernas e por E. orientalis apresentar a inserção da maioria das setas dorsais sobre tubérculos (ATTIAH 1967).

Morfometria

A análise de box plot medianas e quartis do comprimento das setas dorsais indicou que as fêmeas oriundas de Citrus sp. puderam ser diferenciadas daquelas dos outros dois hospedeiros através do comprimento das setas v2, sc2, c1, c2, c3 e e1, sendo v2, sc2, c3 menores e c1, c2 e e1 maiores em comparação às de H. brasiliensis e P. aquatica, que não diferiram entre si (Figs 1-6). O tamanho do corpo (comprimento e largura do idiossoma) variou significativamente apenas nas fêmeas coletadas sobre H. brasiliensis de São José do Rio Preto sendo menores para as duas dimensões em relação a todas as outras populações (Figs 7 e 8).

A análise das distâncias entre elementos dos pares de setas dorsais resultou na correlação positiva entre a morfologia e o hospedeiro utilizado. Fêmeas de H. brasiliensis apresentaram as distâncias entre as setas sc2 e c3, c3 e c2 e e2 e e1, significativamente menores do que aquelas registradas nas fêmeas dos outros dois hospedeiros (Figs 9-11). Fêmeas oriundas H. brasiliensis de São José do Rio Preto apresentaram as distâncias entre as setas sc2 e c3, c2 e c1, c1 e d1, d2 e d1 e d1e e1 menores em relação a todas as outras populações (Figs 9 e 13-16). Exceto pelas distâncias entre os elementos do par d1 (d1-d1) não houve diferença nas distâncias entre os elementos dos pares de setas das fêmeas oriundas de Citrus sp. e P. aquatica (Figs 9-16).

Os testes multivariados aplicados à análise das variáveis canônicas para todas as combinações de populações foram significativos: Wilks' Lambda (p< 0,0001), Pillai's Trace (p < 0,0001), Hotelling-Lawley Trace (p< 0,0001) e Roy's Greatest Root (p < 0,0001). A variação total explicada pela análise das populações, expressa em porcentagem, foi diretamente proporcional ao número e distância das localidades amostradas (Tab. II).

Houve diferença significativa na morfologia das fêmeas das diferentes populações estudadas quando comparados os diferentes hospedeiros, tendo sido individualizados três agrupamentos referentes aos mesmos (Figs 17 e 18). Houve maior diferenciação morfológica das fêmeas de Citrus sp., evidenciada pela distribuição das fêmeas deste hospedeiro nos valores negativos ao longo do eixo relativo à canônica 1. As fêmeas oriundas dos hospedeiros H. brasiliensis e P. aquatica distribuíram-se ao longo dos valores positivos do eixo da canônica 1 e foram mais semelhantes entre si quando comparadas às de Citrus sp. (Figs 17-19). Para os caracteres tamanho do corpo e comprimento das setas dorsais H. brasiliensis e P. aquatica diferiram apenas pela distribuição ao longo do eixo relativo à canônica 2, contudo apresentaram sobreposição nos extremos dessa distribuição (Fig. 17). A sobreposição deixa de existir quando utilizados caracteres mais informativos sobre as diferenças entre essas populações (distâncias entre os elementos dos pares das setas dorsais) (Figs 18 e 19). A distribuição da análise com 29 caracteres distingue as populações por hospedeiro e localidade (Fig. 18) sendo que os caracteres de distância entre elementos de setas são os mais importantes para distinguir localidades, ainda que respondam por apenas 2,9% da variação total (Fig. 19).

A variação total da distribuição morfométrica das seis populações de três hospedeiros (n = 180) e localidades próximas (estado de São Paulo) foi de 8,2% (Fig. 17) enquanto que na análise de fêmeas de onze hospedeiros e quatro países (n = 52) a variação total foi de 18,6% (Fig. 20). Isso indica distância morfológica acumulada entre diferentes localidades e hospedeiros que pode ser observada pela ampla dispersão das populações ao longo dos eixos das canônicas 1 e 2. Na distribuição morfométrica de fêmeas de E. banksi coletadas em H. brasiliensis de cinco localidades foi de 5,1% (Fig. 21); e em P. aquatica de três localidades de 4,6% (Fig. 22) sendo as duas últimas análises relativas a populações próximas. Já para fêmeas oriundas de Citrus sp. do Brasil, de Guadalupe e do Paraguai a variação total foi de 7,4% (Fig. 23).




Quando representada a distribuição das setas dorsais do idiossoma de três fêmeas representativas dos três hospedeiros, constatamos que a diferença entre elas pode ser de difícil percepção e os padrões existentes são evidenciados somente através da análise morfométrica (Fig. 24 e Tab. II - valores morfométricos citados).


A variação total explicada pela análise conjunta do comprimento e largura do corpo, comprimento e distância de inserção entre pares de setas dorsais foi de 12,2%. Isoladamente, a variação total encontrada foi de 8,2% para o comprimento e largura do corpo e comprimento das setas (15 caracteres) e de apenas 2,9% para distâncias entre setas (14 caracteres). O caráter que mais influenciou a canônica 1 diferiu nas análises sendo v2 para a análise isolada e c3 para a conjunta (Tab. III).

As fêmeas dos três hospedeiros das seis localidades apresentaram variação no número de setas táteis dos fêmures I e II e das tíbias III e IV. A variação encontrada no número das setas está presente nas seis populações estudadas e não foi relacionada com o hospedeiro utilizado (Tab. IV). As setas quimiossensoriais não variaram em número. A disposição das setas também não variou nos artículos das pernas.

Biologia

A duração da maioria das fases da vida (ovo, larva, protocrisálida, protoninfa, deutocrisálida e deutoninfa) (Tab. V) e do período de pré-oviposição e a longevidade (Tab. VI) de fêmeas de E. banksi provenientes de P. aquatica foi significativamente maior quando comparada com a daquelas provenientes dos outros dois hospedeiros, que não apresentaram diferença significativa entre si para a duração das fases de vida e período de pré-oviposição. A fecundidade das fêmeas oriundas de P. aquatica foi a menor encontrada entre as populações estudadas e diferiu significativamente entre os três hospedeiros estudados (Tab. VI) mantendo-se semelhante por três gerações consecutivas (Tab. VII).

A oviposição de fêmeas de E. banksi provenientes de P. aquatica ocorreu neste e nos outros dois hospedeiros testados e a média diária foi menor no hospedeiro original, sendo C. sinensis o melhor substrato para essa população, seguido por H. brasiliensis. Não ocorreu oviposição em hospedeiros trocados em três tratamentos, dois deles tendo P. aquatica como substrato. Fêmeas oriundas de C. sinensis não foram capazes de utilizar outras espécies vegetais como substrato. Apenas uma fêmea proveniente de H. brasiliensis efetuou postura em outra espécie vegetal, P. aquatica (Tab. VIII).

O intercruzamento de indivíduos oriundos de H. brasiliensis com os de C. sinensis e P. aquatica produziu prole.Machos e fêmeas provenientes de P. aquatica não foram capazes de se reproduzir com aqueles de C. sinensis. A prole obtida nos demais intercruzamentos foi cruzada entre si até a terceira geração e produziu descendência fértil, exceto para o cruzamento de fêmeas de H. brasiliensis com machos de C. sinensis que não produziu prole a partir da segunda geração (Tab. IX). A impossibilidade desse cruzamento deveu-se à redução populacional causada pela baixa fecundidade (número de ovos/fêmea) F1 (10,5) e F2 (9,5) e grande inviabilidade na fase de ovo observada nas duas gerações F1 (36,9%) e F2 (52,1%). Registrou-se inviabilidade na fase de ovo muito maior em todos os intercruzamentos (13,7 a 73,2%) (Fig. 25) do que nas populações-controle do mesmo experimento (8% sobre H. brasiliensis; 9,1% sobre C. sinensis e 7,2% sobre P. aquatica).


A razão sexual nos intercruzamentos não diferiu da observada nas populações originais por três gerações consecutivas e também não variou significativamente em relação ao substrato utilizado (Tab. IX). Eventos de partenogênese arrenótoca exclusiva (onde a fêmea produz somente descendentes machos) foram observados em 46,7% das tentativas de cruzamentos da geração F1 em que as fêmeas receberam machos oriundos de outro hospedeiro. Nas gerações consecutivas, a ocorrência de partenogênese arrenótoca exclusiva caiu para 21,6% na geração F2 e apenas 2,6% na geração F3. Contudo, a ocorrência de prole também diminuiu ao longo das gerações, tendo ocorrido, respectivamente, 75, 51 e 38 ocorrências de prole do total de 90, 54 e 49 tentativas respectivamente. Os cruzamentos sem produção de prole e a ocorrência de partenogênese arrenótoca exclusiva foram, respectivamente, 4 e 13 entre as populações de H. brasiliensis e C. sinensis; 3 e 6 entre H. brasiliensis e P. aquatica e 8 e 16 entre C. sinensis e P. aquatica de um total de 30 tentativas de cruzamento para cada par de hospedeiros testado (Tab. X). Foi observada a cópula em todos os tratamentos. Nos cruzamentos entre indivíduos oriundos do mesmo hospedeiro (controle) não ocorreram eventos de arrenotoquia exclusiva em nenhum dos três hospedeiros estudados.

DISCUSSÃO

A variação morfológica observada entre indivíduos de E. banksi da mesma população e em diferentes hospedeiros corrobora as observações de MUMA et al. (1953), PRITCHARD & BAKER (1955) e FLECHTMANN & BAKER (1975) em relação à variação no comprimento das setas dorsais numa mesma população e entre populações de diferentes hospedeiros. A determinação desta variação por esses autores se deu através da análise visual do padrão corporal e de medições isoladas de séries de indivíduos de hospedeiros e origem geográfica diferentes, contudo não foram publicadas medidas que pudessem ser confrontadas no presente trabalho. Desenhos dos tarsos e das tíbias diferiam nesses trabalhos, mas a quetotaxia das pernas não foi informada.

Segundo PRITCHARD & BAKER (1955), as setas dorsais da fêmea de E. banksi são todas curtas e espatuladas na série típica, com as setas histerossomais dorsolaterais c2, d2 e e2 maiores do que as dorsocentrais (c1, d1, e1 e h1). Esse padrão foi observado em nossos estudos para todos os espécimes analisados, ainda que variações no tamanho dessas setas tenham sido encontradas como indicativo de variação intra e interpopulacional.

A variabilidade total encontrada a partir dos estudos morfométricos parece aumentar com o aumento do número de indivíduos e quando são comparadas populações de hospedeiros diferentes e isoladas geograficamente, podendo estar subestimada devido ao pequeno número de indivíduos e de hospedeiros analisados de diferentes países. Através do presente estudo, foi possível demonstrar que os caracteres de maior peso na variação morfológica de E. banksi, capazes de individualizar morfologicamente uma população, são o comprimento das setas dorsais, correspondendo à maior parte da variação encontrada, seguido pelas distâncias entre a base dessas setas e, só então, o tamanho do corpo (comprimento e largura do idiossoma). A análise dos 29 caracteres selecionados para todos os espécimes ora estudados certamente resultaria numa melhor interpretação da variação total existente. Essa afirmação é suportada pela grande variação intra-populacional no comprimento das setas dorsais, caráter mais contemplado no presente estudo, que prejudica a análise entre as populações. Por outro lado, as distâncias entre as bases das setas dorsais mostraram-se muito eficientes na separação morfológica entre indivíduos das diferentes localidades (Fig. 19), o que se deveu à homogeneidade intra-populacional do caráter e à conservação da variação entre as populações. Até mesmo fêmeas de populações do mesmo hospedeiro, isoladas geograficamente, conservaram o padrão para esse caráter. Curiosamente, nas análises de box plot (Figs 9-16) e AVC (Fig. 19) para o mesmo conjunto de dados referentes às distâncias entre elementos dos pares de setas, observamos que a sensibilidade da AVC é indispensável para a discriminação das populações. Enquanto que na análise de box plot não foram registradas diferenças significativas entre as distâncias entre as setas das fêmeas oriundas de C. sinensis e P. aquatica, a AVC separa completamente as populações não só destes hospedeiros entre si mas também entre as populações oriundas do mesmo hospedeiro.

Observamos que o tempo de preservação não prejudicou a análise dos caracteres comprimento e largura do corpo para as populações analisadas como advertiu REESE et al. (1996), uma vez que não encontramos diferenças significativas nesses caracteres para a maioria das populações (Figs 7 e 8). Contudo, esses caracteres foram responsáveis por explicar a maioria da variação nas populações de P. aquatica nas canônicas 1 e 2 e de H. brasiliensis na canônica 1 (Tab. II). Esses resultados poderiam ser apontados como comprometedores da análise. No entanto, nessas populações todos os espécimes foram montados com intervalo de poucos meses, através da mesma técnica, com o mesmo meio de Hoyer e pela mesma pessoa. Isso reduziu a influência de fatores como o método e o tempo de preservação na alteração das dimensões dos exemplares.

Fêmeas oriundas de H. brasiliensis de São José do Rio Preto são menores que as fêmeas das outras populações estudadas (Figs 7 e 8) e apresentaram padrão de distância entre setas semelhante ao das fêmeas de H. brasiliensis de Cedral (Figs 1-3). Estas, por sua vez, não diferiram das fêmeas das outras duas populações quanto ao tamanho do corpo, o que pode indicar que a redução observada nas fêmeas de São José do Rio Preto seja resultado de um polimorfismo posterior à separação dessas populações possivelmente oriundas de H. brasiliensis ou, simplesmente, da redução do tamanho do corpo condicionada pela grande densidade populacional na criação-estoque. Dentre as populações dos três hospedeiros criadas para este estudo, apenas naquela oriunda de H. brasiliensis a densidade populacional esteve sempre alta, devido à maior fecundidade das fêmeas (Tab. VI). Ainda nas fêmeas de H. brasiliensis de São José do Rio Preto foram registradas distâncias menores entre as setas sc2 e c3, c2 e c1, c1 e d1, d2 e d1, d1 e e1, até em relação às fêmeas do mesmo hospedeiro de outras localidades. Contudo, esse fato não implica na mudança de padrão e sim na redução proporcional das distâncias entre setas devido à redução do tamanho do corpo (Figs 9 e 13-16). Através de estudos de campo, AKIMOV et al. (2004) analisaram a variação morfológica sazonal do ácaro parasita Varroa destructor (Anderson e Trueman, 2000) (Varroidae) através de morfometria multivariada e observaram que entre os caracteres de maior variação morfológica da população estudada estavam duas medidas de distâncias entre setas. Segundo os autores, essa variação deveu-se à seleção diferencial sazonal dos genótipos que determinaram a diferença significativa no tamanho do corpo entre as amostras coletadas no verão e inverno. Da mesma forma, o observado não foi uma mudança no padrão e, sim, a redução proporcional das distâncias entre setas devido à redução do tamanho do corpo. A redução do tamanho do corpo em fêmeas criadas em laboratório por gerações sucessivas foi observada para barbeiros (e.g., SZUMLEWICZ 1976, ZELEDÓN 1981). Assim como nestas populações, os espécimes medidos foram criados em condições laboratoriais por sucessivas gerações e a densidade populacional nas criações esteve sempre alta. Segundo DUJARDIN et al. (1999), nestas condições, pela grande necessidade nutricional das fêmeas e pela maior sobrevivência dos indivíduos menores da população, esta poderia sofrer uma conseqüente redução no tamanho do corpo nas gerações seguintes devido à reprodução diferencial dos genótipos menores e mais bem sucedidos. Desta forma, acreditamos que a redução do tamanho do corpo verificada nessa população tenha sido condicionada pelo ambiente, ainda que apenas a análise molecular das populações desse hospedeiro poderia apontar a presença ou ausência de um polimorfismo associado ao fenótipo apresentado.

BARBOSA et al. (2004) demonstraram que a fecundidade (expressa em número de ovos/fêmea) não diferiu para os hospedeiros Carica papaya Linnaeus (mamão) e Malpighia emarginata A. DC. (acerola), embora ambas tenham diferido de Citrus sp. (laranja lima) (37,5 ± 6,22; 31,0 ± 5,1 e 11,9 ± 2,21, respectivamente). Demonstraram também que a longevidade de E. banksi não diferiu entre estes hospedeiros (aproximadamente 13 dias). Encontramos diferença significativa na longevidade e fecundidade das fêmeas de E. banksi entre os hospedeiros H. brasiliensis, C. sinensis e P. aquatica (Tab. VI). Mesmo a longevidade em Citrus sp. e C. sinensis diferiu do encontrado por aqueles autores. Como BARBOSA et al. (2004) utilizaram nos seus experimentos exemplares da mesma população, provenientes de C. papaya, a longevidade e a sobrevivência podem ter sido subestimadas, uma vez que também encontramos reduções significativas na longevidade e sobrevivência dos ácaros sobre hospedeiros diferentes daqueles em que foram obtidos. Como partimos de diferentes populações obtidas em seus diferentes hospedeiros, acreditamos que os dados relativos a esses parâmetros não sejam comparáveis. Já a fecundidade de E. banksi mostrou-se intimamente relacionada com o hospedeiro utilizado nos dois estudos. Ainda no sentido de enriquecer o conhecimento acerca da espécie, integrando os estudos existentes, pudemos perceber que a capacidade de utilização de substratos vegetais diferentes do hospedeiro de origem, para a população oriunda de C. papaya e para a população oriunda de P. aquatica, faz de E. banksi uma espécie comprovadamente polífaga.

Através dos estudos morfológicos e biológicos foi possível inferir uma possível seqüência de colonização e adaptação de E. banksi nos hospedeiros ora estudados. Eutetranychus banksi provavelmente sofreu diferenciação através do isolamento reprodutivo em diferentes hospedeiros, conservando maior distância morfológica e biológica entre C. sinensis, hospedeira de uma população inicial na colonização da espécie na área de estudo contemplada, e P. aquatica, espécie possivelmente colonizada a partir de uma população que apresentava fluxo gênico com a população oriunda de H. brasiliensis. Essa afirmação é suportada pela capacidade de intercruzamento entre as populações provenientes de H. brasiliensis e P. aquatica e a maior semelhança morfológica destas em relação à de C. sinensis. As diferenças registradas entre os ciclos de vida dessas duas populações podem estar relacionadas à recente colonização de P. aquatica e, consequentemente, ao desempenho reprodutivo inferior nesse hospedeiro. Fêmeas coletadas e criadas sobre P. aquatica apresentaram taxa de oviposição inferior a daquelas criadas em folhas de C. sinensis e H. brasiliensis, sob as mesmas condições experimentais. Segundo KASSEN (2002), populações especializadas têm melhor desempenho no seu hospedeiro de origem do que em outros. FRY (1989) demonstrou a habilidade de tetraniquídeos de adaptarem-se a uma nova espécie hospedeira em menos de dez gerações.

As populações coletadas em H. brasiliensis, por sua vez, apresentaram grande desempenho no seu hospedeiro natural e incapacidade de utilização de outras espécies vegetais como hospedeiro alternativo. Segundo AGRAWAL (2002), o desempenho dos tetraniquídeos está geneticamente associado com a preferência e a complexidade das defesas da planta hospedeira e pode restringir a utilização pelo fitófago para uma única espécie. A adaptação dessas populações à H. brasiliensis pode ter suplantado a resposta induzida pela sua fitofagia aumentando seu desempenho, mas diminuindo a capacidade de utilização de novas espécies vegetais.

Segundo KASSEN (2002), populações especializadas têm melhor desempenho no seu hospedeiro de origem e isso pode resultar numa restrição do fluxo gênico entre as populações nos diferentes hospedeiros mesmo em condições de ocorrência simpátrica (e.g., FILCHAK et al. 2000, GROMAN & PELLMYR 2000). O isolamento reprodutivo entre populações provenientes de C. sinensis e P. aquatica provavelmente estabeleceu-se devido à seqüência adaptativa possivelmente ocorrida; primeiro entre as populações de C. sinensis com o novo hospedeiro, H. brasiliensis, seguida pela colonização de populações de H. brasiliensis em P. aquatica. A isso soma-se a rápida diferenciação sofrida pelos ácaros pelo seu modo de reprodução haplodiplóide, que diminui a variabilidade genética intrapopulacional e ao mesmo tempo aumenta a diferença entre as populações (HELLE & OVERMEER 1973). Então, considerando a polifagia e a ampla distribuição geográfica, é esperado que novas linhagens possam ser freqüentemente descobertas.

Em nossos experimentos constatamos que eventos de partenogênese arrenótoca exclusiva não ocorreram nas populações de E. banksi em seu próprio hospedeiro, ocorrendo somente quando as populações dos diferentes hospedeiros são intercruzadas ou submetidas a outros substratos. Assim como HELLE & PIETERSE (1965) observamos grande incompatibilidade reprodutiva entre indivíduos provenientes de diferentes hospedeiros, com drástica redução da produção de prole e, provavelmente, a esterilidade dos híbridos, sendo que as populações encontradas sobre C. sinensis e P. aquatica parecem ser reprodutivamente isoladas entre si.

Contudo, mais estudos poderiam ser desenvolvidos acerca de E. banksi uma vez que pode se tratar de um complexo de espécies. A análise molecular seria uma ferramenta importante a ser utilizada na tentativa de diferenciá-las, desde que acompanhada de estudos complementares das informações biológicas. NAVAJAS et al. (1999) encontraram diferenças significativas entre populações de Amphitetranychus viennensis (Zacher, 1920) oriundas da França e do Japão através do seqüenciamento do DNA ribossomal nuclear e parte do gene mitocondrial (regiões ITS2 e COI, respectivamente). Entretanto, houve fertilidade das fêmeas híbridas indicando a coespecificidade dessas populações.

A ocorrência de polimorfismos em E. banksi pôde ser constatada não apenas pela variação no tamanho do corpo e setas e distância das setas dorsais do idiossoma, mas também no número das setas táteis dos fêmures I e II e das tíbias III e IV (Tab. IV). A diferença relevante no entendimento desses polimorfismos é que o primeiro se correlaciona com os hospedeiros, presumivelmente devido à restrição do fluxo gênico condicionado ao hábito alimentar e o segundo não se correlaciona, sugerindo que sua presença nas diferentes populações se deva ao fluxo gênico entre elas. A variação do número das setas táteis no fêmur II e na tíbia IV representaram caracteres importantes na variação intra-populacional compartilhada nas seis populações estudadas e não foram correlacionadas com o hospedeiro utilizado por elas. A variação no número das setas táteis das pernas ocorrendo na forma de mosaicos nas diferentes populações, ou seja, presentes em populações que poderiam manter o fluxo gênico entre si, e também nas quais esse fluxo apresentou-se restrito (e.g., populações oriundas de C. sinensis e P. aquatica do município de São José do Rio Preto) podem indicar o compartilhamento genético destas de uma forma indireta. Acreditamos que E. banksi possa reunir populações em processo evolutivo de adaptação a diferentes hospedeiros, além da provável manutenção do fluxo gênico entre populações de diferentes locais e hospedeiros. Assim, uma "redescrição" ao nível específico como por exemplo para as populações oriundas de C. sinensis resultaria numa visão restrita e errônea da espécie, ainda que embasada no isolamento reprodutivo das populações oriundas de C. sinensis e P. aquatica e na distinção morfológica destas em relação às de H. brasiliensis e P. aquatica através de caracteres morfológicos (comprimento das setas v2, sc2, c1, c2, c3 e e1). Apesar disso, o fluxo gênico entre elas seria possível através das populações oriundas de H. brasiliensis. Através desta análise, conclui-se que o fluxo gênico pode ser constante, ainda que haja fenótipos distintos em dados hospedeiros e até se estabeleçam isolamento reprodutivo entre certas populações, mas não com outras. Neste caso, seria possível apenas a busca de variedades ecológicas ou subespécies (FUTUYMA 1992), mas este propósito poderia não ter uma aplicabilidade legítima, ainda que muitas das populações - dentre as registradas nas 23 famílias vegetais relatadas na literatura como hospedeiras desta espécie - pudessem apresentar diferenças e mesmo particularidades morfológicas e no ciclo de vida entre si.

AGRADECIMENTOS

A Carlos H.W. Flechtmann e ao Setor de Zoologia Agrícola, ESALQ/USP de Piracicaba pelo empréstimo de exemplares de E. banksi das coleções e valiosas sugestões ao manuscrito. A Manoel G.C. Gondim Jr e ao Departamento de Agronomia, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Área de Fitossanidade, pela doação de espécimes. A Fernando R. de Carvalho, Programa de Pós-graduação em Biologia Animal, pelo treinamento no uso do Programa SAS®. À Denise N.M. Ferreira e Vera C. Silva pela leitura crítica do primeiro manuscrito. À Empresa Athena Mudas Ltda, pela concessão de bolsa parcial à primeira autora. Ao CNPq pela concessão de bolsa ao segundo autor.

LITERATURA CITADA

Submitted: 12.XII.2008; Accepted: 15.IX.2009.

Editorial responsibility: Pedro Gnaspini Netto

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Dez 2009
  • Data do Fascículo
    Set 2009

Histórico

  • Aceito
    15 Set 2009
  • Recebido
    21 Dez 2008
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