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INDICADORES PARA REGULAÇÃO DO SANEAMENTO EM ÁREAS DE POBREZA: ESTRUTURA E APLICAÇÃO EM CUBATÃO-SP, BRASIL1 1 . Os autores agradecem: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo: 2015/23382-1; Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Resumo

O marco regulatório do saneamento no Brasil foi instituído em 2007, cabendo às entidades reguladoras a verificação do cumprimento dos planos de saneamento por parte dos prestadores de serviços. Os serviços de esgotamento sanitário e abastecimento de água (SAA&ES) em aglomerados subnormais apresentam características peculiares que demandam das reguladoras ferramentais apropriados para tal monitoramento. O presente artigo teve como objetivo construir e apresentar um sistema de indicadores para esse fim. Para a seleção dos indicadores utilizou-se uma combinação das abordagens participativa e tradicional. Onze indicadores foram propostos na abordagem participativa e outros doze foram inseridos na abordagem tradicional. Esses indicadores foram avaliados por especialistas e aplicados no município de Cubatão. Como resultado, é apresentado um sistema com vinte e três indicadores para monitorar as metas contratuais e de planejamento dos SAA&ES para aglomerados subnormais. O modelo é inovador e pode ser utilizado pela regulação por incentivos ou Sunshine.

Palavras-chave:
Indicadores ambientais; abastecimento de água e esgotamento sanitário; assentamentos irregulares e favelas

Abstract

The sanitation regulatory milestone in Brazil was established in 2007; regulatory agencies are responsible for assuring that service providers work in compliance with sanitation plans. The Water Supply and Sanitation Services (WS&SS) provided to subnormal clusters present peculiar features that require regulatory agencies to have appropriate tools to perform such monitoring. The aim of the current article is to build and present a system of indicators used for this purpose. A combination of traditional and participatory approaches was used to collect the indicators. Eleven indicators were proposed in the participatory approach and twelve were inserted in the traditional approach. These indicators were assessed by experts and applied to Cubatão County. Thus, a system comprising twenty-three indicators is herein presented to help monitoring the contractual and planning goals of WS&SS provided to subnormal clusters. The model is innovative and can be used in Incentive-based or in Sunshine regulations.

Keywords:
Environmental indicators; water supply and sanitary sewage; squatter settlements and slums

Resumen

El marco regulatorio del saneamiento en Brasil fue instituido en 2007, y las agencias reguladoras tienen la responsabilidad de verificar el cumplimiento de los planes de saneamiento por parte de los proveedores de servicios. Los Servicios de Abastecimiento de Agua y Saneamiento (SAA&S) para aglomerados subnormales tienen características peculiares que exigen de las agencias reguladoras instrumentos apropiados para monitoreo. El propósito de este artículo fue construir un sistema de indicadores para este propósito. Para la selección de los indicadores se utilizó una combinación de enfoques tradicionales y participativos. Se propusieron once indicadores en el enfoque participativo y doce en el enfoque tradicional. Estos indicadores fueron evaluados por expertos y aplicados en el municipio de Cubatão. Como resultado, se presenta un sistema con veintitrés indicadores para monitorear los objetivos de los SAA&S para aglomerados subnormales. El modelo es innovador y puede ser utilizado por la regulación de Incentivo o Sunshine.

Palabra-Clave :
Indicadores ambientales; abastecimiento de agua y saneamento; asentamientos precarios y favelas

1 Introdução

A institucionalização da regulação para os Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário (SAA&ES) ocorreu a partir da Lei de diretrizes nacionais para o Saneamento Básico e do decreto que a regulamenta (BRASIL, 2007, 2010). Esse processo teve como principal objetivo criar mecanismos para fiscalizar, controlar a qualidade e estabelecer regras para a prestação desses serviços.

Após a institucionalização da regulação do saneamento no Brasil, as operadoras dos SAA&ES são responsáveis por prestar contas e atender metas estabelecidas por órgãos independentes e não vinculados a elas, as entidades reguladoras (CNI, 2014). Por sua vez, essas entidades (em forma de agência) têm o papel de estabelecer parâmetros para qualidade dos serviços prestados, determinar a estrutura tarifária, monitorar as condições de infraestrutura (redes de distribuição de água e coleta de esgoto), monitorar o cumprimento dos contratos de prestação de serviços e dos Planos de Saneamento Básico e aplicar penalidades quando cabíveis (TUROLLA, 2002TUROLLA, F. A. Política de saneamento básico: avanços recentes e opções futuras de políticas públicas (Texto para discussão nº 922). Rio de Janeiro: IPEA, 2002.; MADEIRA, 2010MADEIRA, R. F. O setor de saneamento básico no Brasil e as implicações do marco regulatório para a universalização do acesso. Revista do BNDES, v. 33, p. 123-154, 2010.).

Em determinadas situações, o monitoramento ainda é um desafio e carece de metodologias apropriadas. Uma dessas situações relaciona-se à universalização do acesso ou, como preconiza a Lei nº 11.445, à “ampliação progressiva do acesso de todos os domicílios ocupados ao saneamento básico” (HOHMANN, 2012HOHMANN, A. C. C. Regulação e Saneamento na Lei Federal nº 11.445/07. Revista Jurídica da Procuradoria Geral do Estado do Paraná, Curitiba, v. 3, p. 211-244, 2012.). O atendimento das populações que vivem nas periferias urbanas em aglomerados subnormaisi apresenta peculiaridades, que demanda das reguladoras ferramentais apropriados para monitorar as metas contratuais e de planejamento dos SAA&ES para essas áreas.

Um dos ferramentais possíveis é a utilização de indicadores, que podem ser medidas quantitativas ou qualitativas de um aspecto particular, desempenho, ou padrão de serviço. Para o monitoramento, eles podem ser utilizados na comparação da evolução histórica da qualidade do serviço ou para confrontar os padrões atuais da operadora com um valor pré-estabelecido (ALEGRE et al., 2004ALEGRE, H. et al. Performance indicators for water supply services. Londres: IWA Publishing, 2004.). Segundo os mesmos autores, essa ferramenta utilizada de forma integrada ao processo de regulação comprovadamente traz melhorias.

Considerando esse contexto, o objetivo do presente trabalho foi elaborar e apresentar um sistema de indicadores, que pode ser aplicado à regulação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, porém de forma específica para aglomerados subnormais. Para seleção dos indicadores utilizou-se um mix entre as abordagens tradicional e participativa. Como estudo de caso foi apresentada uma aplicação dessa estrutura para o município de Cubatão, SP.

2 Abordagens de construção de indicadores

A abordagem tradicional para construção de indicadores de desenvolvimento sustentável prima pelos aspectos formais dos indicadores, como sua validade científica e sua qualidade de ser transferível e genérico (FERNÁNDEZ-SÁNCHEZ; RODRÍGUEZ-LÓPEZ, 2010FERNÁNDEZ-SÁNCHEZ, G.; RODRÍGUEZ-LÓPEZ, F. A methodology to identify sustainability indicators in construction project management: Application to infrastructure projects in Spain. Ecological Indicators, v. 10, n.6, p. 1193-1201, 2010.; RAMETSTEINER et al., 2011RAMETSTEINER, E. et al. Sustainability indicator development: Science or political negotiation? Ecological Indicators, v. 11 (1), p. 61-77, 2011.). Quando atende a esses critérios, um conjunto de indicadores pode representar uma realidade e permitir comparações entre regiões, tempos, entidades ou governos (MASCARENHAS et al., 2010MASCARENHAS, A. et al. The role of common local indicators in regional sustainability assessment. Ecological Indicators, v 10, p. 646-656, 2010.; SHEN et al., 2011SHEN, Y. et al. The application of urban sustainability indicators - A comparison between various practices. Habitat International, v 35, p 17-29, 2011.). Esse tipo de indicador geralmente é definido por especialistas e permitem representar de forma numérica uma situação, disponibilizando esta de forma mais simples para as partes interessadas.

Por outro lado, uma abordagem mais participativa na escolha de indicadores pode incorporar os valores individuais das partes interessadas no processo de tomada de decisão (CHAMARET et al., 2007CHAMARET, A.; O’CONNOR, M.; RECOCHE, G. Top-down/bottom-up approach for developing sustainable development indicators for mining: Application to the Arlit uranium mines (Niger). International Journal of Sustainable Development, v. 10, p.161-174, 2007.; MAGEE et al., 2013MAGEE, L. et al. Reframing social sustainability reporting: towards an engaged approach. Environment, Development and Sustainability, v. 15, p. 225-243, 2013.), sendo uma forma mais justa de representar os interesses dos usuários dos indicadores (MAGEE et al., 2013). Essa abordagem também permite que os conhecimentos locais sejam ponderados para tomada de decisão. Outros trabalhos mostram vantagens adicionais, como diminuição de conflitos e empoderamento da democracia (KURKA; BLACKWOOD, 2013KURKA, T.; BLACKWOOD, D. Participatory selection of sustainability criteria and indicators for bioenergy developments. Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 24, p. 92-102, 2013.; CHRISTOPOULOS; MARQUES, 2013CHRISTOPOULOS, T. P.; MARQUES, T. C. A. Formulação de indicadores de impacto para microfinanças. Revista de Políticas Públicas, São Luís, v.16, p. 105-114, 2013.; MAGALHÃES; DIAS, 2013MAGALHÃES, P. S.; DIAS, S. M. F. Construção de uma matriz de indicadores para a avaliação de programas/projetos de educação ambiental em saneamento: Possibilidades metodológicas. Revista Brasileira de Educação Ambiental, v. 8, p. 47-62, 2013.).

Os trabalhos de Doody et al. (2009DOODY, D.G.; KEARNEY P.; BARRY J.; MOLES R.; O’REGAN B. Evaluation of the Q-method as a method of public participation in the selection of sustainable development indicators. Ecological Indicators, v. 9, p. 1129-1137, 2009.), O’ryan e Pereira (2015), Roy et al. (2015ROY, R.; CHAN, N.W.; XENARIOS, S. Sustainability of rice production systems: an empirical evaluation to improve policy. Environment, Development and Sustainability, p 1-22, 2015.), Barrett et al. (2015BARRETT, J. et al. Development of an estuarine climate change monitoring program. Ecological Indicators, v. 53, p. 182-186, 2015.) e de Huang et al. (2015HUANG, Z.; YU, H.; PENG, Z.; ZHAO, M. Methods and tools for community energy planning: A review. Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 42, p. 1335-1348, 2015.) apresentam vantagens em estratégias que unam as duas abordagens. Eles defendem que uma ampla participação de especialistas, em diferentes campos científicos e de usuários dos indicadores melhora os efeitos sobre a qualidade da decisão final.

Para o setor de saneamento existe uma gama de indicadores selecionados da forma tradicional (VON SPERLING, T.; VON SPERLING M., 2013VON SPERLING, T. L.; VON SPERLING, M. Proposição de um sistema de indicadores de desempenho para avaliação da qualidade dos serviços de esgotamento sanitário. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 18, p. 313-322, 2013.; SANTIAGO, 2012SANTIAGO, L. S.; DIAS, S. M. F. Matriz de indicadores de sustentabilidade para a gestão de resíduos sólidos urbanos. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 17, p. 203-212, 2012.; TEIXEIRA; HELLER, 2001TEIXEIRA, J. C.; HELLER, L. Modelo de priorização de investimentos em saneamento com ênfase em indicadores de saúde: desenvolvimento e aplicação em uma companhia estadual. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 6, p. 138-146, 2001.) e poucos de forma participativa (MAGALHÃES; DIAS, 2013MAGALHÃES, P. S.; DIAS, S. M. F. Construção de uma matriz de indicadores para a avaliação de programas/projetos de educação ambiental em saneamento: Possibilidades metodológicas. Revista Brasileira de Educação Ambiental, v. 8, p. 47-62, 2013.; MIRANDA; TEIXEIRA, 2004MIRANDA, A. B.; TEIXEIRA, B. A. N. Indicadores para o monitoramento da sustentabilidade em sistemas urbanos de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 9, p. 269-279, 2004.), porém existe uma carência de indicadores específicos para o monitoramento das metas contratuais e de planejamento dos SAA&ES para aglomerados subnormais. Nesse contexto, não existem indicadores selecionados pela fusão entre as abordagens tradicional e participativa.

3 Construção do sistema de indicadores para monitorar os SAA&ES em aglomerados subnormais

Os indicadores foram selecionados a partir de uma combinação das abordagens participativa e tradicional. Primeiramente, contando com potenciais utilizadores dos indicadores, foi aplicada a abordagem participativa para seleção das dimensões, critérios e indicadores a serem utilizados para o monitoramento das metas e planos de SAA&ES para aglomerados subnormais. Ainda de forma participativa, a qualidade dos indicadores selecionados foi avaliada a partir dos critérios de Malheiros et al. (2006MALHEIROS, T. F.; PHILIPPI JR, A.; COUTINHO, S. M. V. Interfaces dos serviços de água e esgoto. In: GALVÃO JÚNIOR, A. C; SILVA, A. C. (Editores). Regulação: indicadores para a prestação de serviços de água e esgoto. 2 ed. Fortaleza: Fortaleza Expressão Gráfica e Editora Ltda., 2006, p. 91-122.).

Num segundo momento, através de entrevistas e oficinas de trabalho com especialistas da área, a abordagem tradicional foi aplicada para selecionar os indicadores e para revisar e reformular os indicadores já selecionados, a partir dos critérios de Quiroga-Martinez (2001).

As etapas estão explicitadas na Figura 1, que apresenta um resumo gráfico da metodologia adotada no presente trabalho, e as subseções 3.1 e 3.2 detalham as etapas de seleção dos indicadores, pelas abordagens participativa e tradicional, respectivamente.

Figura 1
Resumo gráfico da metodologia adotada na seleção dos indicadores para regulação do saneamento em aglomerados subnormais.

3.1 Seleção dos indicadores: abordagem participativa

Nessa primeira etapa, a escolha e análise da qualidade dos indicadores foram realizadas com a participação de instituições relacionadas aos SAA&ES, principalmente com os potenciais utilizadores dos indicadores a serem selecionados. Essas elaborações coletivas ocorreram na forma de workshops com a agência reguladora do Estado de São Pauloii e com prestadoras de serviços.

Previamente foram realizados seminários e reuniões para mobilização e preparação dos participantes das oficinas de trabalho. Os workshops tiveram a participação de representantes da agência de regulação do abastecimento de água e esgotamento sanitário do Estado de São Paulo, de companhias de abastecimento de água e esgotamento sanitário, de organizações não governamentais, de departamentos de serviços de água e esgoto, do departamento de saneamento e recursos hídricos do estado de São Paulo, da Associação Brasileira e Engenharia Sanitária (ABES), de universidades, da Fundação Paulista de Análises de Dados (FPAD) e da Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e a Cultura (UNESCO).

Na subseção 3.1.1, são apresentadas as dimensões, critérios e indicadores selecionados por essa abordagem.

3.1.1 Dimensões, critérios e indicadores selecionados

As reuniões e seminários, seguindo as recomendações de Morris et al., (2011MORRIS, J. B. et al. A framework for participatory impact assessment: Involving stakeholders in European policy making, a case study of land use change in Malta. Ecology and Society, v. 16, p. 12. 2011.), permitiram um alinhamento de ideias, preparação e mobilização dos participantes em relação aos aspectos fundamentais do tema e auxiliaram na avaliação das diferentes realidades em que vivem.

Após a mobilização, ocorreu uma oficina de trabalho contando com 45 participantes, sendo 22 representantes de operadoras, sete representantes da Agência de Regulação, três da Secretaria Paulista de Saneamento e Recursos Hídricos (SPSRH), três representantes da sociedade civil organizada, cinco representantes da FPAD e cinco pesquisadores. Na oficina foi apresentado um modelo conceitual inicial para o sistema de indicadores (dimensões), a partir do qual as discussões foram iniciadas. Como resultado desse workshop, oito dimensões e doze indicadores para monitoramento dos SAA&ES em aglomerados subnormais foram delimitados. Essas dimensões, os critérios utilizados e os indicadores são descritos a seguir:

Dimensão Institucional

Os atores envolvidos identificaram que as relações institucionais podem ajudar na gestão e melhoria dos serviços. O indicador selecionado para representar a dimensão foi:

  • 1. Parcerias entre agências relacionadas aos aglomerados subnormais.

Dimensão Recursos Hídricos

Foi identificado que é necessário avaliar a quantidade de coleta e tratamento de esgoto que não satisfaz totalmente a necessidade das pessoas, além da quantidade de água que é informalmente fornecida às populações vulneráveis. Os indicadores selecionados foram:

  • 2. Coleta de esgoto em aglomerados subnormais.

  • 3. Tratamento de esgoto em aglomerados subnormais.

  • 4. Desperdício de água em aglomerados subnormais.

Dimensão Econômica

Nessa dimensão, foram levantados cinco critérios:

  • a) verificar as perdas de receitas incorridas devido à fraude ou uso inadequado dos serviços, buscando visualizar também as perdas relacionadas à informalidade dos serviços à população;

  • b) observar os investimentos que a operadora faz para servir populações vulneráveis​​. Os participantes dos workshops entenderam que os investimentos das operadoras nessas áreas podem ser um passo importante para a melhoria, uma vez que maiores investimentos podem significar maior interesse na oferta ou a existência de uma política social;

  • c) verificar o custo de se ofertar serviços às populações que não têm abastecimento de água. Identificar o valor real para se custear o atendimento dessas áreas ou a quantidade de subsídios necessários que deverá ser alocada. Aqui se incluem os valores para as operadoras e para parcela da população que está ligada formalmente às redes, que indiretamente arcam com os custos;

  • d) observar se as operadoras fornecem incentivos, em forma de subsídios, para que as populações de aglomerados subnormais utilizem seus serviços. Por exemplo, o custeio da taxa de ligação da casa à rede e preços diferenciados às populações em aglomerados subnormais. Em outras palavras, avaliar se as operadoras têm incentivos para subsidiar serviços.

  • e) comparar a quantidade de água que é utilizada pela população em aglomerados subnormais (que têm acesso formal ao abastecimento de água), com as populações que não vivem nessas condições.

Com esses critérios, os indicadores selecionados foram:

  • 5. Perdas de faturamento de água em aglomerados subnormais ​​.

  • 6. Investimentos em serviços para populações atendidas por programas assistenciais.

  • 7. Custo de conexão para a operadora em aglomerados subnormais.

  • 8. Custo de conexão para os usuários em aglomerados subnormais.

  • 9. Consumo de água nos aglomerados subnormais.

Dimensão Identificação de Vulnerabilidade

O critério definido foi de identificar populações sanitariamente vulneráveis em aglomerados subnormais. O princípio da dimensão é mapear as populações vulneráveis e calcular a proporção de populações sanitariamente vulneráveis. Como proxy para essas informações, seria levantado o número de famílias cadastradas em programas assistencialistas do governo. O indicador selecionado foi:

  • 10. Famílias cadastradas em programas assistenciais.

Dimensão Educação e Cidadania

O objetivo dessa dimensão é observar as atividades de educação promovidas pelas operadoras, com foco no saneamento básico, principalmente, para conservação dos recursos hídricos, controle de perdas e ligação na rede de esgotos. Além disso, observar quanto dinheiro e tempo o operador dedica a esse tipo de atividade, bem como para avaliar a participação dos cidadãos nestas atividades. Os indicadores selecionados foram:

  • 11. Programas educacionais desenvolvidos pelas operadoras.

  • 12. Participação da população em programas educacionais desenvolvidos pelas operadoras.

Dimensões Gestão, Social e Operacional

Nos workshops, não foi possível alcançar um consenso para os critérios e indicadores dessas dimensões.

Depois de selecionado, cada indicador passou por uma análise de qualidade, que está apresentada na subseção 3.1.2.

3.1.2 Análise conjunta dos indicadores

Cada indicador passou por uma análise conforme os critérios de Malheiros et al. (2006MALHEIROS, T. F.; PHILIPPI JR, A.; COUTINHO, S. M. V. Interfaces dos serviços de água e esgoto. In: GALVÃO JÚNIOR, A. C; SILVA, A. C. (Editores). Regulação: indicadores para a prestação de serviços de água e esgoto. 2 ed. Fortaleza: Fortaleza Expressão Gráfica e Editora Ltda., 2006, p. 91-122.). Essa análise foi realizada em uma segunda oficina de trabalho contando com 22 participantes, sendo oito representantes das operadoras, três representantes da SSRH, quatro representantes da agência reguladora paulista, um representante da sociedade civil organizada, um representante da FPAD e cinco pesquisadores. Os resultados estão explicitados na Tabela 1.

Após esta avaliação sugeriu-se a exclusão do indicador 2 do sistema, bem como foram recomendadas modificações para outros indicadores e criaram-se os indicadores recomendados, que são ideias de indicadores não integrantes do conjunto inicial, mas que deveriam ser elaborados e detalhados na etapa tradicional.

Tabela 1
Resultado da análise participativa sobre a qualidade dos indicadores selecionados.

3.2 Seleção dos indicadores: abordagem tradicional

Nessa etapa, o processo anteriormente descrito passou por uma revisão de especialistas em regulação do saneamento, construção de indicadores e saneamento em áreas de pobreza (docentes de universidades e sete profissionais de agências reguladoras nacionais e internacionais). O objetivo foi selecionar os indicadores que não obtiveram consenso na etapa participativa e fazer uma (re)estruturação técnica dos indicadores já selecionados, com base na ficha metodológica de Quiroga-Martinez (2001).

Nesse processo: a) adaptaram-se indicadores da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos de Portugal (ERSAR) para as dimensões ‘Social’, ‘Gestão’ e ‘Operacional’; b) criou-se uma nova dimensão e outra foi retirada; c) indicadores foram realocados entre as dimensões; d) dois indicadores foram excluídos: Famílias cadastradas em programas assistenciais e Consumo de água nos aglomerados subnormais; e) por fim, cumprindo os critérios estabelecidos na ficha metodológica de QUIROGA-MARTINEZ (2001QUIROGA-MARTINEZ. R. Los indicadores de sostenibilidad ambiental y de desarrollo sostenible: estado del arte y perspectivas. Santiago: CEPAL, 2001.), os indicadores foram renomeados e receberam descrição e fórmulas de cálculos.

O conjunto final de indicadores, assim como sua identificação, descrição, fórmula e direção desejada são explicitados na Tabela 2. Importante salientar que antes da definição final dos indicadores para regulação dos SAA&ES em aglomerados subnormais, houve uma oficina final de fechamento com a reguladora ARSESP (potencial usuária) e com a operadora SABESP (potencial auditada).

Tabela 2
Indicadores para regulação dos SAA&ES em aglomerados subnormais.

4 Aplicação da estrutura no município de Cubatão (Estudo de caso)

4.1 Caracterização do local

O município de Cubatão está localizado na área central da Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS), situado no litoral do estado de São Paulo. Constitui-se de um importante polo industrial brasileiro dos setores petroquímicos, siderúrgico e de fertilizantes. Seu PIBiii per capita de 52.772,36 reais é significantemente maior que o do Estado de São Paulo, que é de 32.454,91 reais (IBGE, 2012).

O índice de Gini para o município é 0,45, muito próximo do índice do Estado de São Paulo, com 0,474 (IBGE, 2012). O índice de desenvolvimento humano médio é de 0,737, o que coloca Cubatão no 850º lugar no ranking nacional (PNUD, 2013).

No último censo, apresentou população residente de 118.720 habitantes, sendo que 65.573 vivem em aglomerados subnormais, distribuídos em 19 assentamentos precários ou irregulares, dos quais, quatro estão localizados no Parque Estadual da Serra do Mar, seis em áreas de Mangue e nove em áreas públicas urbanas (IBGE, 2010a).

Nesse trabalho, foram estudadas as áreas Vila Esperança (19.414 habitantes), Vila dos Pescadores (11.255 habitantes), Cota 200, Cota 95/100 e Pinhal do Miranda/Grotão (20.941 habitantes). A soma das populações dessas áreas representa 78,3% da população que vive em aglomerados subnormais no município. Suas localizações estão na Figura 2.

Figura 2
Localização dos aglomerados subnormais objetos do estudo.

4.2 Resultados dos indicadores para Cubatão

A estrutura de indicadores para regulação dos SAA&ES, específica para aglomerados subnormais, foi aplicada à Cubatão, sendo que os resultados podem ser visualizados da tabela 3.

Tabela 3
Resultados dos indicadores para regulação dos SAA&ES em aglomerados subnormais calculados para o município de Cubatão no ano de 2014.

Para efeitos de comparação, 87,34% da população do município de Cubatão é atendida com abastecimento de água e 46,8% com cobertura de esgotamento sanitário, sendo que 100% do esgoto coletado é tratado. O índice de perda financeira de água no município é de 29,67% (SNSA, 2010). Claramente se nota que os indicadores para os aglomerados subnormais do município apresentam resultados piores que para a média do município.

4.3 Análise dos indicadores pós-aplicação

Do conjunto de vinte e três indicadores, construídos para regulação do saneamento em aglomerados subnormais, somente quinze foram calculados no estudo de caso devido à falta de dados. Porém, outros municípios podem dispor de dados para o cálculo de todos os indicadores. Além disso, devido à importância do problema, deve haver uma pressão da reguladora para que as operadoras coletem os dados.

Os indicadores de Atendimento de água e Atendimento de esgoto são baseados no número de domicílios fornecido pelo IBGE, geralmente subestimado. O número de funcionários incumbidos da prestação dos serviços nas áreas com populações vulneráveis também é um dado aproximado, baseado somente nos trabalhos desenvolvidos em campo. É necessário avaliar se as operadoras estão dispostas a diferenciar a atividade dos funcionários e de formalizá-la para o cálculo do indicador.

O número de parcerias institucionais foi levantado por meio de entrevista, sem avaliação de contratos assinados. Sugere-se documentar e padronizar estas parcerias firmadas para que sejam devidamente avaliadas.

Sugere-se também optar entre um dos indicadores Atendimento de esgoto ou Coleta de esgoto nas áreas de aglomerados subnormais, já que ambos contemplam objetivos similares. Além de excluir o indicador tratamento de esgoto, pois não é possível distinguir a porcentagem de tratamento dos aglomerados subnormais das demais áreas de um município.

Para calcular a perda de faturamento da água consumida informalmente é importante que seja obtida somente a estimativa do volume de água de Uso Social no dado Volume de Outros Usos.

Seria interessante que a agência reguladora trabalhasse com um indicador de número de poços artesianos e fossas sépticas, que fosse registrado e acompanhado por algum órgão do setor de saneamento como, por exemplo, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB).

Os indicadores que foram respondidos com dados do cadastro operacional da operadora não apresentam dúvidas quanto à exatidão dos dados e por isto são considerados os mais confiáveis, são eles: Tarifa social, Adesão à rede de esgoto e Adesão à rede de água.

5 Discussão

5.1 Sobre a aplicação dos indicadores para regulação dos SAA&ES em aglomerados subnormais

Para as reguladoras fiscalizarem e verificarem o cumprimento dos planos de saneamento pelas operadoras em aglomerados subnormais, são necessários ferramentais apropriados e a revisão realizada mostrou que os indicadores podem ser interessantes, pois permitem: a) uma avaliação da evolução histórica da qualidade dos serviços da operadora; b) uma comparação com padrões pré-estabelecidos; c) uma comparação com outras empresas.

Dessa forma, os indicadores selecionados poderão ser utilizados pelas reguladoras para garantir o cumprimento das condições e metas estabelecidas nos contratos de prestação de serviços e nos Planos Municipais de Saneamento Básico. Além disso, poderão fazer parte dos padrões e normas a serem elaborados pelas reguladoras para a adequada prestação de serviços e satisfação dos usuáriosiv e para estabelecer as metas progressivas de expansão e de qualidade dos serviçosv, porém, é necessário expor que a coleta e o monitoramento desses dados, por parte das reguladoras, seriam bastante complexos pela grande quantidade e variedade de aglomerados subnormais. Isso se deve à maioria dos dados, para cálculo dos indicadores, terem que ser coletados de forma primária e à assimetria de informações dos dados secundários, o que acarretaria uma grande demanda de recursos humanos e financeiros.

Outra questão que limita a utilização desses indicadores para fins de comparação é quando há presença de áreas irregulares nos aglomerados subnormais. Uma vez que a operadora pode precisar de autorização do Ministério Público para prestar os SAA&ES nos aglomerados subnormais em situação de irregularidade, a regulação perde o sentido se trabalhada para comparar resultados de desempenho ou penalizar a operadora pela ausência ou precariedade do atendimento nesses locais.

Na análise jurídica do relatório Trata Brasil, esse assunto é tratado como complexo, pois muitas vezes os assentamentos irregulares estão em Áreas de Preservação Permanente (APPs) e em desacordo com a legislação municipal de uso e ocupação do solo. Dessa forma, existem conflitos de direitos/princípios constitucionais, sejam eles da proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, do direito à moradia digna, à dignidade da pessoa humana, do direito à vida, da propriedade e da função social da propriedade (TRATA BRASIL, 2016).

Nesses casos, recomenda-se que os indicadores sejam utilizados para uma regulação do tipo Sunshine vi , no qual a reguladora publicaria os resultados dos indicadores das prestadoras de serviços sob sua alçada.

Ao levar em conta que a regulação Sunshine é baseada no incentivo à melhoria de desempenho, acredita-se que a presença ou não da autorização pode funcionar como um fator de contexto na avaliação dos resultados da operadora. Desta forma, mesmo que não haja a permissão, acredita-se que a exposição pública sobre a situação da prestação dos serviços pode incentivar iniciativas dos demais atores do setor de saneamento em busca de soluções cabíveis em suas competências.

Sendo assim, a regulação Sunshine pode dar visibilidade aos requisitos necessários para alcançar bons resultados na prestação dos serviços nos aglomerados subnormais. Acredita-se que a regulação Sunshine pode ser uma forma de consolidar a cultura da informação e da transparência sobre a prestação dos serviços nestas áreas, ainda que a oportunidade de melhoria dependa da ação da operadora e dos demais atores.

Em relação às experiências do estudo de caso em Cubatão, percebe-se que é preciso avaliar a possibilidade e a efetividade de se comparar prestadoras que não possuem contextos similares. Pondera-se que há uma diversidade de qualidade de gestão em diferentes municípios. Cada município possui particularidades de gestão dos SAA&ES, há multiplicidade de formatos administrativos, dimensões populacionais e territoriais e formatos de urbanização. Devido a isso, recomenda-se que a comparação seja feita, por exemplo, entre municípios de uma mesma região metropolitana, ou que haja um agrupamento de municípios que possam de fato ser comparados entre si.

Por outro lado, ao invés de agrupar todos os aglomerados subnormais de um município para calcular os indicadores, pode-se comparar as áreas intramunicipais, tendo como objetivo olhar mais de perto as fragilidades e as boas práticas do local. Isso seria principalmente importante em contextos metropolitanos onde existe conurbação de municípios, interligação dos sistemas de água e esgoto e a presença de extensas áreas com populações pobres.

5.2 Sobre a abordagem de seleção de indicadores

Com a elaboração participativa, os indicadores refletiram interesses e pontos de vista de diferentes participantes, como já retrataram Gallopin (1997GALLOPIN, G. C. Indicators and their use: information for decision-making. SCOPE, v. 58, p. 13-27, 1997. ), Meadows (1998MEADOWS, D. H. Indicators and information systems for sustainable development. Hartland Four Corners: The Sustainable Institute, 1998. ), Bossel (1999BOSSEL, H. Indicators for sustainable development: theory, method, applications. Winnipeg: International Institute for Sustainable Development, 1999. ), Santos (2004SANTOS, R. F. Planejamento ambiental: teoria e prática. São Paulo: Oficina de textos, 2004.), Malheiros, et al. (2006MALHEIROS, T. F.; PHILIPPI JR, A.; COUTINHO, S. M. V. Interfaces dos serviços de água e esgoto. In: GALVÃO JÚNIOR, A. C; SILVA, A. C. (Editores). Regulação: indicadores para a prestação de serviços de água e esgoto. 2 ed. Fortaleza: Fortaleza Expressão Gráfica e Editora Ltda., 2006, p. 91-122.) e Reed (2008REED, M. S. Stakeholder participation for environmental management: a literature review. Biological conservation, v. 141, p. 2417-2431, 2008.).

A construção participativa dos indicadores incentivou a mobilização, além de auxiliar no aprendizado das boas práticas do setor. O processo participativo, apesar de imprescindível, apresentou limitações que precisaram ser superadas a cada processo: a) a necessidade de maior tempo de trabalho na discussão, avaliação e elaboração dos indicadores; b) a necessidade de aderência dos participantes ao processo; e c) a necessidade de parcerias institucionais.

A partir disso, pôde-se compreender que a aplicação desses indicadores e a discussão dos mesmos são valiosas para o setor, considerando a importância da universalização e de oferecimento dos SAA&ES às populações pobres. A proposição coletiva das dimensões, critérios e indicadores mostrou-se um processo essencial, pois desencadeia uma dinâmica de diálogo, de integração dos atores do setor e de posicionamento dos tomadores de decisão.

Ademais, a realização do processo participativo permitiu a inclusão de indicadores consistentes com a realidade, portanto, com maior chance de serem utilizados, uma vez que foram selecionados pelos atores que irão utilizá-los. Entretanto, recomenda-se que, antes de serem aplicados, haja uma consulta pública, principalmente, com as populações em aglomerados subnormais, que são atores diretamente afetados pelas decisões tomadas.

Um dos principais problemas relacionados à abordagem participativa de seleção de indicadores é a falta de validade científica e sua incapacidade de ser transferível e genérico (DOODY et al., 2009DOODY, D.G.; KEARNEY P.; BARRY J.; MOLES R.; O’REGAN B. Evaluation of the Q-method as a method of public participation in the selection of sustainable development indicators. Ecological Indicators, v. 9, p. 1129-1137, 2009.). Dessa forma, a pesquisa para elaboração dos indicadores também utilizou uma abordagem tradicional, realizada por especialistas, visando sanar esses problemas. Foi observado que a revisão técnica dos indicadores permitiu a determinação precisa da finalidade dos indicadores a partir de um marco conceitual, sem perder a escala de abrangência local. Ao utilizar os princípios de Quiroga-Martinez (2001), os especialistas conferiram caráter científico aos indicadores, permitindo que eles possam ser utilizados em diferentes municípios e realidades.

Assim, o mix entre as abordagens participativa/tradicional permitiu que os pontos positivos de cada abordagem fossem mantidos e os pontos negativos superados. O sistema permitiu ainda o desenvolvimento de indicadores focados, úteis e que atendem às necessidades de seus usuários de acordo com o objetivo de regular os SAA&ES em aglomerados subnormais.

5.3 Sobre os indicadores

Os SAA&ES já possuem indicadores desenvolvidos e utilizados historicamente para avaliação no Brasil. Existem sistemas de indicadores, como o Sistema Nacional de Informações sobre o Saneamento (SNIS), que desde 2002, utiliza cerca de 80 indicadores para seus diagnósticos (SNSA, 2010); o Prêmio Nacional de Qualidade em Saneamento, que adota um sistema de avaliação com base em 79 indicadores (PNQS, 2011); entre outros sistemas oficiais de coleta de dados, tais como SEADE e IBGE e agências reguladoras estaduais.

Embora o uso rotineiro de indicadores importantes tenha sido feito pelas agências reguladoras e operadoras para avaliar o desempenho dos serviços, esta avaliação tem sido insuficiente para medir e monitorar a universalização dos SAA&ES.

Os indicadores propostos por essa pesquisa buscam representar a necessidade de universalização dos SAA&ES, através das lentes da sustentabilidade, enfocando indicadores que se vinculem. Não é objetivo dessa pesquisa propor indicadores completos e estanques. Espera-se que esses indicadores possam ser melhorados, substituídos e até excluídos caso não atendam o objetivo da regulação para universalização.

O sistema de indicadores proposto permite uma visualização simples, mas também pode mostrar a complexidade do problema, mostrando as diversas faces e as dimensões de forma holística. O modelo ajudou a reunir em um mesmo sistema, visões e problemas diferentes, que precisam também de informações diferentes. A partir dos resultados apresentados pode-se inferir que os indicadores têm potencial para mostrar e mensurar a situação em que se encontram os SAA&ES nos aglomerados subnormais.

Caso seja vencida a dificuldade legal de se fornecer SAA&ES em domicílios irregulares, é possível que as agências reguladoras utilizem os indicadores propostos como instrumentos para o monitoramento dos contratos de prestação de serviços e cumprimento dos Planos de Saneamento Básico. Para isso é necessário que a reguladora defina também padrões desejáveis de qualidade para cada indicador proposto. Posteriormente, é necessário incentivar a incorporação dessas medidas. Por fim, a reguladora deve determinar os melhores processos para monitoramento e rever sistematicamente os indicadores.

5.4 Sobre a disponibilidade de dados para o cálculo dos indicadores propostos

A falta de informações para preencher os indicadores foi um indício significativo de que as operadoras não têm dados sobre os aglomerados subnormais. Isso foi previsto pelos participantes durante a elaboração de indicadores, porém todos foram mantidos devido à necessidade de avaliar estas informações. Contudo, foi possível levantar 24 dados, sendo 21 diretamente com a operadora. Da base de dados do IBGE, três dados foram levantados, porém essa fonte de dados deve ser substituída, uma vez que os dados necessários para o cálculo dos indicadores necessitam de uma frequência maior que a fornecida pelo IBGE. No SNIS foi encontrado apenas um dos dados, visto que, por mais que o sistema forneça diversas variáveis que compõem os indicadores, esses não estão no recorte dos aglomerados subnormais, mas sim em formato de unidade municipal.

Dentre os vinte e um dados obtidos na operadora, dezenove partiram de entrevistas com o gerente local da operadora no município de Cubatão. Os outros dois foram auferidos na Superintendência Regional, localizada no município de São Paulo, por meio de correio eletrônico. Os dados coletados em Cubatão foram comentados durante a entrevista e por isto puderam ser melhor compreendidos e ajustados, de acordo com as considerações expostas pelo entrevistado. Já os dados enviados por meio de correio eletrônico não puderam ser discutidos, fato que restringiu a análise final do indicador correspondente. Nesse sentido, a entrevista mostrou-se a maneira mais adequada para a coleta de dados, pois foi possível compreender aspectos fundamentais sobre os dados e particularidades sobre a prestação dos serviços em aglomerados subnormais.

Um dos aspectos mais importantes para que a maior parte dos dados fosse levantada foi o fato dos aglomerados subnormais estarem setorizados no município de Cubatão. Somente desta maneira foi possível ter os dados restritos para as áreas de estudo e assim calcular os indicadores.

Não foi possível levantar nove dados. Dentre eles, seis existem na operadora, mas somente de forma geral para o município. Dessa forma, os indicadores não podem ser calculados especificamente para os aglomerados subnormais. Portanto, caso haja interesse em calcular os respectivos indicadores, os sistemas de informações devem ser adaptados para gerar tais dados no formato proposto. Outros dois dados não foram alcançados por falta de registro formal das atividades quando realizadas, de modo que seria possível obtê-los caso isso passasse a acontecer. Ou seja, compreende-se aqui, que a maior parte dos dados pode ser gerada se a operadora adaptar as informações para o recorte dos aglomerados subnormais.

Vale também apontar como fragilidade da pesquisa que a coleta dos dados foi realizada apenas no município de Cubatão, em unidade de uma operadora paulista que desempenha funções voltadas à operação do sistema de água e esgoto do município. Como é uma empresa operadora de perfil regional, determinadas funções acabam sendo desenvolvidas em outras divisões da empresa. Portanto, é possível que os dados não obtidos em Cubatão possam ser levantados em outras unidades da organização ou em outros municípios.

6 Considerações finais

Identificou-se que a setorização e medição de variáveis nos aglomerados subnormais precede a implantação de um sistema de indicadores que contribua para a gestão e regulação da eficiência técnica.

O cálculo dos indicadores por aquisição de variáveis provenientes de medição e não por estimativa possibilitam um salto de qualidade dos serviços, pois fornecem informações para tomada de ações por parte do Poder Público e das prestadoras de serviços.

Os indicadores definidos no sistema propuseram um modelo de diagnóstico inovador para universalização, uma vez que podem apontar o que outros sistemas não revelaram ainda. Se os indicadores forem bem analisados, eles permitem identificar populações em aglomerados subnormais, que não são servidos por SAA&ES com regularidade e continuidade

Os potenciais ganhos de sua utilização estão diretamente relacionados à melhoria dos serviços devido a uma regulação específica para aglomerados subnormais, podendo se dar através de comparações entre operadoras ou com padrões pré-estabelecidos. Esses resultados podem ser utilizados, por exemplo, para formação das tarifas, gerando incentivos aos operadores com bom desempenho em aglomerados subnormais ou desincentivos às que não apresentam, ou ainda gerar penalidades.

Os indicadores podem ainda ser utilizados em um modelo de regulação Sunshine para exposição da qualidade dos serviços prestados pelas operadoras em aglomerados subnormais, favorecendo uma pressão da sociedade para melhoria dos serviços.

Cabe ressaltar, que indicadores não são a solução para a questão da universalização dos serviços de água e esgoto nas áreas com populações de pobreza, porém são instrumentos robustos de melhoria para o planejamento e gestão. Além disso, fomentam a transparência de informações e o diálogo entre os atores do setor de saneamento, de modo a medir a preparação da operadora para enfrentar a problemática da universalização e melhorar a governança. A utilização dos indicadores apresentados nesse trabalho pode promover importantes saltos de qualidade e ações mais inclusivas e menos alienadas da realidade das áreas urbanas do Brasil.

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  • 1
    . Os autores agradecem: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo: 2015/23382-1; Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Notas

  • i
    “Conjunto constituído de, no mínimo, 51 unidades habitacionais carentes, em sua maioria, de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular) e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa” (IBGE, 2010b).
  • ii
    ARSESP - Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo.
  • iii
    Produto Interno Bruto.
  • iv
    Inciso I do Art 22 da lei 11.455
  • v
    Inciso III do Art 22 da lei 11.455
  • vi
    A estratégia desse regime regulatório é baseada na exposição pública e na comparação de um conjunto de indicadores de eficiência e eficácia dos serviços prestados pelas empresas de água e esgoto.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    08 Fev 2016
  • Aceito
    25 Set 2017
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
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