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SEGURANÇA E SOBERANIA ALIMENTAR: o caso brasileiro (1994-2015)

FOOD SECURITY AND SOVEREIGNTY: the Brazilian case (1994-2015)

SÉCURITÉ ET SOUVERAINETÉ ALIMENTAIRES: le cas brésilien (1994-2015)

Resumos

O presente artigo objetiva analisar como as concepções de Segurança Alimentar e de Soberania Alimentar, dois conceitos fundamentais ligados à questão da alimentação, são apresentadas e incorporadas às narrativas sobre alimentação no Brasil. Analisando as conferências sobre alimentação realizadas no Brasil, entre 1994 e 2015, busca-se mostrar como estes conceitos são significados e como se relacionam entre si na construção das políticas alimentares nacionais.

Segurança Alimentar; Soberania Alimentar; Segurança Nutricional


This article aims to analyze how Food Security and Food Sovereignty, two fundamental concepts linked to the issue of food, are presented and incorporated into the narratives about food in Brazil. Analyzing the conferences on food held in Brazil, between 1994 and 2015, we seek to show how these concepts are meant and how they relate to each other in the construction of national food policies.

Food Security; Food Sovereignty; Nutrition Security


Cet article vise à analyser comment les concepts de sécurité alimentaire et de souveraineté alimentaire, deux concepts fondamentaux liés à la question de l’alimentation, sont présentés et incorporés dans les récits sur l’alimentation au Brésil. En analysant les conférences sur l’alimentation tenues au Brésil entre 1994 et 2015, nous cherchons à montrer comment ces concepts sont signifiés et comment ils s’articulent dans la construction des politiques alimentaires nationales.

Sécurité alimentaire; Souveraineté Alimentaire; Sécurité nutritionnelle


INTRODUÇÃO

A questão da provisão de alimentos às populações dos países tem sido objeto de sistemáticos debates sobre os parâmetros sobre os quais isto deve acontecer. Dado seu caráter multifacetado, esforços para apreender toda sua complexidade, inúmeras vezes, resultam em políticas deficitárias no esforço para garantir aos cidadãos uma alimentação suficiente e saudável para a sobrevivência digna do ser humano. Abordagens e conceitualizações do fenômeno mudam de acordo com a época, os governos e as compreensões científicas sobre o tema. Nas últimas décadas, as tentativas para a compreensão e a garantia da alimentação das populações têm sido cada vez mais sistematizadas nos debates públicos. Todo este empenho acabou refletindo em políticas mais presentes em instâncias internacionais e em programas nacionais, na tentativa de tornar o acesso à alimentação uma garantia de todos.

Paralelo a esta sistematização dos debates, novos conceitos e abordagens acadêmicas também foram criados, tornando as ações de garantia à alimentação reflexos da compreensão científica deste fenômeno. Dentre os conceitos construídos sobre este tema nos últimos anos, dois se destacam: o conceito de Segurança Alimentar e o de Soberania Alimentar. Em termos gerais, o primeiro refere-se à garantia de acesso à alimentação por parte da população dos Estados. O segundo, criado para se contrapor ao primeiro, prega a necessidade não apenas de acesso à alimentação pelos indivíduos, mas, também, da garantia de que hábitos culturais alimentares e produção familiar de alimentos sejam incorporados às políticas de Estados.

O presente artigo analisa, no caso brasileiro, como esses conceitos são apresentados e incorporados às narrativas sobre alimentação no nosso país. Analisando as conferências sobre alimentação realizadas no Brasil, entre 1994 e 2015, se mostra como esses conceitos são significados e se relacionam na construção das políticas alimentares nacionais. A hipótese testada é que os conceitos de Segurança Alimentar e Soberania Alimentar – criados de forma contraposta em seu princípio – acabam sendo incorporados como algo complementar nas narrativas brasileiras. Ao invés de preservar seus caráteres antagônicos, os discursos sobre Segurança Alimentar e Soberania Alimentar no Brasil apagam as contradições existentes entre os dois para apresentá-los de forma suplementar. Além disso, especificamente o conceito de Soberania Alimentar utilizado no caso brasileiro é confundido com a noção de autonomia estatal, distanciando de sua definição original.

Metodologicamente, o presente trabalho irá analisar os documentos produzidos pelas cinco Conferências sobre Segurança Alimentar e Nutricional, bem como de seus quatro encontros preparatórios, ocorridos no Brasil, entre 1994 e 2015. Primeiro, iremos fazer uma análise quantitativa da presença dos conceitos de Segurança Alimentar e de Soberania Alimentar em cada um destes documentos. Em seguida, iremos apontar os principais elementos contidos em cada um destes documentos e analisar os sentidos dados aos conceitos de Segurança Alimentar e Soberania Alimentar. Finalmente, pretendemos verificar, a partir destas análises, as relações de complementariedade, interseções ou antagonismos porventura existentes, dos conceitos de Segurança Alimentar e Soberania Alimentar, nas conferências estudadas.

O CONCEITO DE SEGURANÇA E SOBERANIA ALIMENTAR

O fim da Guerra Fria trouxe significativas mudanças para o campo da Segurança Internacional. Durante o período bipolar, questões relativas à segurança eram restritas aos fenômenos relativos aos conflitos e às guerras entre Estados. Discutir segurança significava exclusivamente debater em que medida, e através de quais estratégias, os atores internacionais poderiam contribuir para evitar a escala de tensões entre os Estados e assegurar a soberania destas unidades nacionais. (Buzan; Waever; Wilde, 1998)

A partir da década de 1990, entretanto, este cenário começa a mudar. Temas, até então não vistos sob a perspectiva da segurança, passam a ser tratados, também, a partir deste viés. Questões ligadas à economia, ao meio ambiente, aos direitos humanos, dentre outros, começam a ser analisadas como potencialmente passíveis de análises securitárias. Cria-se, portanto, um certo consenso segundo o qual, não existiriam temas relativos à segurança por sua natureza, e sim, olhares que teriam o potencial de tratar qualquer tema da sociedade e do ambiente internacional como relacionado à segurança. Os Estados começam, então, a perder a exclusividade de objetos de referência por excelência da segurança e passam a dividir este status com demais dimensões como, por exemplo, a proteção da estabilidade econômica, a preservação de ecossistemas e a garantia da sobrevivência e da dignidade das pessoas, dentre outros. (Buzan; Waever; Wilde, 1998)

A partir dessas mudanças de ampliação do conceito de segurança, a dimensão alimentar também passa a ser vista por este viés. O provimento não somente de quantidades de alimentos para a sobrevivência como, também, da qualidade dos nutrientes necessários para uma vida saudável passa a ser objetivo perseguido pelos países na garantia de uma noção de segurança mais ampla. Estados, organizações internacionais e setores da sociedade civil, nos mais diversos países do mundo, começaram a se mobilizar a partir do pressuposto de que a Segurança Alimentar e a soberania dos Estados somente seriam completas com a garantia de uma alimentação suficiente, saudável e sustentável no tempo para todas as suas populações. ( Hough, 2015HOUGH, P. Food Security. In: International security studies: Theory and Practice. HOUGH, P.; MALIK, S.; MORAN, A. (Eds) New York: Routledge, 2015. )

O que é Segurança Alimentar?

A concepção do que é Segurança Alimentar (SA) tem evoluído. Conforme será apresentado ao longo do texto, as abordagens restringiam-se a falar, quase que exclusivamente, sobre a escassez de alimentos, tornando a ausência desta segurança um sinônimo de fome. Essa percepção foi mudando, já que, nos debates mais contemporâneos ( Devereux, 2007DEVEREUX, Stephen et al (Ed.). The New Famines: Why famines persist in an era of globalization. London: Routledge, 2007. ; Silva, 2010; Rubin, 2016RUBIN, O. Contemporary famine analysis. Springer briefs in political science. Department of Society and Globalization. Roskilde University, Denmark: 2016. ), novas dimensões para o conceito passam a ser pleiteadas, visando aprimorá-lo.

A FAO formulou, em 1996, na Cúpula Mundial de Alimentação, o que viria a ser a perspectiva internacionalmente conhecida e mais utilizada sobre SA, segundo a qual:

(...) a Segurança Alimentar existe quando todas as pessoas, em todos os momentos, têm acesso físico e econômico a alimentos seguros, nutritivos e suficientes, que atendam às suas necessidades dietéticas e preferências alimentares para uma vida ativa e saudável1” (FAO, 1996, versão livre dos autores).

Trata-se de uma perspectiva ampla, que possui quatro dimensões principais, que podem ser sintetizadas no Quadro 1 abaixo:

Quadro 1
Dimensões da Segurança Alimentar

Essas dimensões se incorporaram ao conceito ao longo das décadas e são essenciais para o entendimento da evolução das perspectivas em SA já que, dependendo do contexto, o foco era direcionado para alguma dimensão específica. Como resultado, as respostas dadas pela comunidade internacional giravam em torno de ações que fossem coerentes com a dimensão dominante naquele determinado entendimento.

A SA relaciona-se também com o Direito à Alimentação Adequada, expresso no artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948), e está conectada à garantia de um padrão de vida decente, que proveja saúde e bem-estar. O direito à alimentação tem seu sentido aprofundado no Comentário Geral nº 12,2 2 É feita uma interpretação do artigo 11 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. feito pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais sobre o Direito Humano à Alimentação Adequada das Nações Unidas, por meio dele percebe-se que o direito à alimentação é realizado quando:

(...) todo homem, mulher e criança, sozinho ou em conjunto com outros, tem acesso físico e econômico, em todos os momentos, à alimentação adequada ou aos meios para sua obtenção. O direito à alimentação adequada não deve, portanto, ser interpretado em um sentido estrito ou restritivo, que o equaciona em termos de um pacote mínimo de calorias, proteínas e outros nutrientes específicos. O direito à alimentação adequada terá de ser alcançado de maneira progressiva (ONU, 1999, p.3 versão livre dos autores).3 3 (...) Every man, woman and child, alone or in community with others, have physical and economic access at all times to adequate food or means for its procurement. The right to adequate food shall therefore not be interpreted in a narrow or restrictive sense which equates it with a minimum package of calories, proteins and other specific nutrients. The right to adequate food will have to be realized progressively .

Nessa perspectiva, são duas dimensões presentes nesse direito: o direito de estar livre da fome e da má nutrição e o direito à alimentação adequada. Isso significa que, para que o direito à alimentação seja plenamente realizado, não se deve tratar a questão como algo que afeta estritamente a quantidade de calorias e nutrientes (Valente, 2002). Sobre a conceituação da Segurança Alimentar, é possível verificar que cada país tem sua definição própria que, de forma geral, adota como base o conceito da FAO.

A Definição Brasileira do Conceito de Segurança Alimentar

O Brasil vem desenvolvendo diversos instrumentos para fortalecer e institucionalizar a questão da SA. A Lei Orgânica de Segurança Alimentar, Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006 (Losan), é o principal marco legal sobre o tema. Além dela, o aparato brasileiro conta com outros instrumentos visando garantir e proteger o direito humano à alimentação adequada, ilustrados na Figura 1:

Figura 1
Instrumentos legais para o atendimento do direito humano à alimentação adequada

A Losan traz uma perspectiva de SA mais complexa do que a proposta pela FAO 1996. Nela, a dimensão nutricional é evidenciada, além de questões relacionadas à sustentabilidade e à cultura, conforme pode ser verificado na sua definição de Segurança Alimentar e Nutricional:

§ 3º A Segurança Alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (Brasil, 2006).

Este acréscimo da dimensão nutricional foi resultado da insistência de grupos, principalmente de esquerda, ligados à defesa da agricultura familiar, que viam a necessidade de se ressaltar a qualidade dos alimentos fornecidos à população e, não somente, a quantidade destes. Este foco na questão nutricional rechaçava narrativas, nas quais o sucesso da Segurança Alimentar era mensurado apenas em termos quantitativos, favorecendo, assim, os investimentos apenas em técnicas de plantio em grande escala, principalmente aquelas praticadas pelas grandes empresas do setor.

Além disso, por meio da Losan criou-se o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), formado por vários setores do governo para promover a Segurança Alimentar. O Sisan é formado por três instâncias de gestão: a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, o Conselho de Segurança Alimentar (Consea)4 4 Extinto através da Medida Provisória nº 870, promulgada no dia 1º de janeiro, no atual governo de Jair Bolsonaro. e a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar (Caisan), eles têm suas funções expressas resumidamente na Figura 2 .

Figura 2
Instâncias de Gestão do Sisan

Cabe ainda ressaltar que, por meio da emenda constitucional EMC-064, de 04/02/2010, a alimentação é incluída no rol dos direitos sociais presentes no Artigo 6º da Constituição Federal.

SOBERANIA ALIMENTAR

No contexto da Segurança Alimentar, outro conceito desponta: a Soberania Alimentar. Indo ao encontro das tradicionais preocupações em se respeitar a soberania política dos Estados, esse conceito surge do desejo de criar um novo paradigma alimentar que enfatizasse também a soberania e a autodeterminação alimentar dos povos. As primeiras ideias relativas a este conceito têm destaque por meio da Via Campesina e partem da perspectiva que os alimentos não devem ser tratados meramente como mercadorias. Além disso, questiona-se o domínio das grandes corporações no sistema alimentar global e advoga-se em favor da preservação da cultura e hábitos alimentares, além da sustentabilidade ambiental ( Gordillo; Jerónimo, 2013GORDILLO, G.; JERÓNIMO, O. M. Seguridad y Soberanía Alimentaria. Documento base para Discusión. FAO, 2013. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-ax736s.pdf. Acesso em: 19 jul. 2020.
http://www.fao.org/3/a-ax736s.pdf...
).

Assim como o conceito de Segurança Alimentar, a definição de Soberania Alimentar também surge em 1996 na Cúpula Mundial de Alimentação, contudo durante um fórum paralelo da sociedade civil. A Via Campesina contestou os resultados dessa Cúpula, considerada o foco excessivamente produtivista:

Sua crítica se dirige contra a ideia de que o acesso ao alimento pode se resumir à oferta abundante de alimentos baratos (...) esta posição produtivista supõe que o comércio internacional de alimentos constitui o fator chave para o direito à alimentação. Nesta linha de raciocínio mercantil e industrial, o desenvolvimento sem entraves do comércio internacional de produtos agrícolas favorece a redução dos preços dos alimentos, o que já satisfaz os requisitos de Segurança Alimentar ( Marques, 2014MARQUES, P. E. M. Críticas e justificações em torno da Soberania Alimentar: fundamentações com vistas a um sistema agroalimentar justo. São Paulo: USP, 2014. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4050094/mod_resource/content/1/Soberania%20alimentar%2026032014.pdf. Acesso em: 15 ago. 2020.
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.p...
, p.7).

A Soberania Alimentar pode ser definida como:

(...) o direito dos povos à alimentação saudável e culturalmente adequada que seja produzida por métodos ecologicamente corretos e sustentáveis. É também o direito dos povos definirem seus próprios sistemas alimentares e agrícolas (Forum For Food Sovereignty, 2007, versão livre dos autores5 5 (...) is the right of peoples to healthy and culturally appropriate food produced through ecologically sound and sustainable methods, and their right to define their own food and agriculture systems. ).

A partir dessa definição, pode-se examinar o conceito por meio de duas dimensões principais assentadas no direito a: 1) alimentação e 2) autonomia:

Em relação à SA, a principal diferença entre os conceitos reside na dimensão autonomia. A Soberania Alimentar não se preocupa somente com o acesso aos alimentos, mas qual a sua origem e a forma de produção. Consumidores, distribuidores e produtores são colocados no centro dos sistemas e políticas alimentares, indo além das exigências dos mercados e das grandes corporações (Forum For Food Sovereignty, 2007).

Em 2007, ocorreu na África o Fórum Mundial pela Soberania Alimentar ou Fórum de Nyéléni, que contou com a participação de mais de 500 delegados de cerca de 80 países. Os participantes eram oriundos de organizações não governamentais e movimentos sociais ligados a agricultores e camponeses ( Gordillo; Jerónimo, 2013GORDILLO, G.; JERÓNIMO, O. M. Seguridad y Soberanía Alimentaria. Documento base para Discusión. FAO, 2013. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-ax736s.pdf. Acesso em: 19 jul. 2020.
http://www.fao.org/3/a-ax736s.pdf...
).

Ao final desse Fórum foi redigida a Declaração de Nyéléni, que é um dos principais instrumentos que tratam do tema. Nela são apontados os seis pilares da Soberania Alimentar: 1. Centra-se nos alimentos para as pessoas: considera a necessidade das pessoas se alimentarem no centro das políticas e enxerga a comida como algo além de mercadoria; 2. Valoriza os fornecedores de alimentos: apoia os modos de vida sustentáveis e respeita o trabalho de todos os fornecedores de alimentos; 3. Localiza os sistemas alimentares: busca reduzir a distância entre fornecedores e consumidores de alimentos, rechaçando o dumping e a assistência alimentar inadequada e resistindo à dependência de corporações distantes e irresponsáveis; 4. Coloca o controle no nível local: o controle fica nas mãos de fornecedores locais de alimentos, reconhece a necessidade de habitar e compartilhar territórios, além de rejeitar a privatização dos recursos naturais; 5. Promove conhecimentos e habilidades: baseia-se no conhecimento tradicional e usa a pesquisa para apoiar e transmitir esse conhecimento às gerações futuras e rejeita tecnologias que ameaçam os sistemas alimentares locais; 6. É compatível com a natureza: maximiza as contribuições dos ecossistemas, melhora a resiliência e rejeita o uso intensivo de energia da monocultura industrializada e outros métodos destrutivos ( Food Secure Canada, 2012FOOD SECURE CANADA. The six pillars of food sovereignty, developed at Nyéléni 2007. Disponível em: <http://usc-canada.org/UserFiles/File/SixPillars_Nyeleni.pdf>.Nyéléni, 2012. Acesso em: 31 maio 2023.
http://usc-canada.org/UserFiles/File/Six...
).

Segurança Alimentar X Soberania Alimentar: semelhanças e incompatibilidades nos conceitos

Historicamente, pode-se dizer que os conceitos de Segurança Alimentar e de Soberania Alimentar surgiram para atender a interesses distintos:

Enquanto a Segurança Alimentar surgiu das condições criadas pelo aparecimento de um paradigma tecnológico, relacionado a existência dos oligopólios, a Soberania Alimentar se originou do exercício democrático das camadas mais populares de diferentes partes do mundo. Ou seja, a formulação do conceito de Soberania Alimentar teve como protagonista as organizações representativas daquela parcela da população mundial que não é integrada aos segmentos pactuados com os interesses das grandes empresas e corporações de alimentos, os quais, em última instância, formulam as maneiras de pensar a Segurança Alimentar (ALEM et. al., 2015 p.19).

Esse é também o entendimento de Hoyos e D’Agostini (2017), segundo essas autoras o conceito de Segurança Alimentar e Soberania Alimentar responde a interesses historicamente opostos, que convergem no propósito geral, mas tem grandes divergências em relação ao papel do Estado, ao sistema de produção e comercialização, dentre outros: “A Soberania Alimentar é a proposta dos trabalhadores do campo e da cidade; já a Segurança Alimentar é a proposta dos Organismos Multilaterais” (Hoyos; D’Agostini, 2017, p. 1).

Nesse sentido, pode-se apontar algumas diferenças centrais entre os dois conceitos: 1) Equilíbrio de forças e assimetria de poder: o conceito da FAO é neutro em relação à correlação de forças, não trata da concentração de poder presente na cadeia alimentar e/ou no comércio internacional. Já o conceito de Soberania Alimentar parte da existência de assimetria de poder nos diferentes mercados e espaços de negociações internacionais; 2) Modo de produção de alimentos: o conceito de Segurança Alimentar da FAO não traz um posicionamento único em relação ao modo de produção de alimentos. Isso se deve em grande parte à própria natureza multilateral do órgão, que admite dois tipos de produção: agricultura industrial - a qual faz-se uso intensivo de combustíveis fósseis; agricultura orgânica - que se subdivide em dois tipos: a) agricultura orgânica que faz uso de biomassa e biotecnologias, mas uma parte é formada por organismos geneticamente modificados, e b) agricultura orgânica com padrões mais rigorosos, envolve processos que requerem várias formas de certificação e não envolve transgênicos. No que tange ao conceito de Soberania Alimentar, ele está vinculado à agricultura de pequena escala, não industrial, preferencialmente orgânico, e adota também o conceito de agroecologia ( Gordillo; Jerónimo, 2013GORDILLO, G.; JERÓNIMO, O. M. Seguridad y Soberanía Alimentaria. Documento base para Discusión. FAO, 2013. Disponível em: http://www.fao.org/3/a-ax736s.pdf. Acesso em: 19 jul. 2020.
http://www.fao.org/3/a-ax736s.pdf...
).

Esse artigo parte do pressuposto de que Segurança e Soberania Alimentar são conceitos diferentes, mas não necessariamente autônomos. Esse é também o entendimento da Via Campesina, que é crítica tanto ao conceito (FAO 1996) quando às políticas de SA:

No entender da Via Campesina, o conceito de Segurança Alimentar não questiona a qualidade dos alimentos – estes podem ser transgênicos ou ecológicos – nem a padronização alimentar proposta pelos conglomerados que atuam no setor das commodities. Em contraposição, a Via Campesina amplia esse conceito e passa a discuti-lo em conjunto com a Soberania Alimentar, a qual se apresenta como um “guarda-chuva” que inclui, além da Segurança Alimentar, muitos outros princípios ( Santos, 2009SANTOS, F. Perspectiva para a Soberania Alimentar brasileira. In: SOGLIO, F. D.; KUBO, R. R. Agricultura e sustentabilidade. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. Disponível em: https://books.google.com.br/s?hl=ptBR&lr=&id=RhuBc4C2lzUC&oi=fnd&pg=PA117&dq=soberania+alimentar&ots=d9hN4PqQEL&sig=asxWewvRlLbqBCAg20wjtLeNEQc#v=onepage&q=soberania%20alimentar&f=false. Acesso em: 14 ago. 2020.
https://books.google.com.br/s?hl=ptBR&lr...
, p. 121).

Pode-se entender de Santos (2009)SANTOS, F. Perspectiva para a Soberania Alimentar brasileira. In: SOGLIO, F. D.; KUBO, R. R. Agricultura e sustentabilidade. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. Disponível em: https://books.google.com.br/s?hl=ptBR&lr=&id=RhuBc4C2lzUC&oi=fnd&pg=PA117&dq=soberania+alimentar&ots=d9hN4PqQEL&sig=asxWewvRlLbqBCAg20wjtLeNEQc#v=onepage&q=soberania%20alimentar&f=false. Acesso em: 14 ago. 2020.
https://books.google.com.br/s?hl=ptBR&lr...
, que para a Via Campesina o conceito de Soberania Alimentar é composto de muitos princípios, dentre eles a Segurança Alimentar. Sendo assim, a Segurança Alimentar seria parte integrante do conceito de Soberania Alimentar. O que se percebe no caso brasileiro (e que será discutido nas próximas seções) é a inversão dessa lógica, a perspectiva de soberania alimentar não é um “guarda-chuva” que abarca vários princípios. A Soberania Alimentar se torna um dos princípios e a Segurança Alimentar o “guarda-chuva”.

Essa linha de raciocínio (de um conceito ser parte integrante do outro) é bem frequente quando se fala de Segurança Alimentar e Soberania Alimentar, contudo, a discordância é geralmente em relação qual é o conceito “principal”. A FAO admite que a Soberania Alimentar é uma das condições para que se alcance a Segurança Alimentar e essa postura é compartilhada pelo Brasil, que nos mais diversos instrumentos que tratam da questão, trata a Soberania Alimentar como uma das variáveis que compõem a Segurança Alimentar:

De acordo com a Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006, que institui o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional no (SISAN), a Soberania Alimentar e o direito humano à alimentação compõem os dois princípios orientadores de ações intersetoriais relacionadas à Segurança Alimentar e nutricional. Nessa concepção, a soberania está contida e subordinada à segurança, em uma definição que restringe a soberania ao potencial produtivo na escala do território nacional (Valerio, 2018, p. 9).

No Brasil, a Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006 - Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional - cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) e visa assegurar o direito humano à alimentação adequada. Na referida Lei, há somente uma referência direta à Soberania Alimentar, no artigo 5°, segundo o qual: “A consecução do direito humano à alimentação adequada e da Segurança Alimentar e nutricional requer o respeito à soberania, que confere aos países a primazia de suas decisões sobre a produção e o consumo de alimentos” (Brasil, 2006, art. 5°). Além disso, há referências indiretas à Soberania Alimentar por meio de elementos que são basilares para o conceito, como: sustentabilidade e cultura.

Em 2010, é lançado um decreto que regulamenta a Lei de Segurança Alimentar e institui a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Trata-se do Decreto n° 7.272, de 25 de agosto de 2010. Neste Decreto há duas referências diretas sobre a Soberania Alimentar, no artigo 3°, inciso VII: “apoio a iniciativas de promoção da Soberania Alimentar, Segurança Alimentar e nutricional e do direito humano à alimentação adequada em âmbito internacional e a negociações internacionais baseadas nos princípios e diretrizes da Lei no 11.346, de 2006” (Brasil, 2010); além do artigo 4°, inciso IV: “incorporar à política de Estado o respeito à Soberania Alimentar e a garantia do direito humano à alimentação adequada, inclusive o acesso à água, e promovê-los no âmbito das negociações e cooperações internacionais” (Brasil, 2010).

Exposto isso, o que se verifica é que a Soberania Alimentar no Brasil é vista como uma variável inserida dentro do conceito de Segurança Alimentar e nutricional: “(...) a Soberania Alimentar é descrita meramente como um ‘princípio’ (junto com o direito humano à alimentação) que orientaria a Lei de Segurança Alimentar e Nutricional” (Valério, 2018, p. 10).

Ao longo das Conferências, a Soberania Alimentar se insere cada vez mais como tema, contudo, essa inserção é bem periférica em relação à SA. Apesar dos dois conceitos possuírem diferenças muitas vezes irreconciliáveis, como pode ser visto nas seções anteriores, eles são inseridos e associados pacificamente dentro do quadro geral da Segurança Alimentar, mas a:

(...) associação “despreocupada” da segurança à Soberania Alimentar, numa postura que desconsidera as particularidades de cada concepção em termos de projetos de sociedade ou, mais especificamente, de diferentes propostas de produção e abastecimento alimentar. Mais que implicações meramente teóricas e conceituais, a operacionalização dos diferentes conceitos por meio de políticas públicas e/ou movimentos sociais resulta em propostas de desenvolvimento intrinsecamente conflitantes (Valério, 2018, p. 1).

AS CONFERÊNCIAS SOBRE SEGURANÇA ALIMENTAR NO BRASIL

Entre 1994 e 2015, cinco conferências sobre Segurança Alimentar e Nutricional foram realizadas no Brasil. Além dessas conferências, mais quatro encontros foram realizados, a partir da segunda conferência, dois anos após as principais, com o intuito de fazer um balanço da evolução das metas estabelecidas em cada um dos encontros anteriores. Atualmente, essas conferências são realizadas e organizadas pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, o Consea.

O Consea foi criado em 2003 e integra o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). Ligado à Presidência da República, o Consea é formado por dois terços de membros da sociedade civil e um terço por representantes do governo. Dentre suas funções, destacam-se a promoção, o monitoramento e a avaliação de políticas nacionais sobre Segurança Alimentar e Nutricional, bem como propor estratégias de ação na Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisan).

As Conferências sobre Segurança Alimentar e Nutricional acontecem no prazo máximo de quatro anos e seus relatórios finais buscam pautar o Governo Federal na busca de estratégias a curto e longo prazo para a promoção de uma política alimentar inclusiva e que atenda os critérios mínimos de nutrição para a população brasileira. Estas conferências também estimulam a coordenação entre as diversas instâncias governamentais e do setor civil no sentido de maximizar os objetivos propostos em seus relatórios. Entre 1994 e 2015, as seguintes conferências foram realizadas:

Fonte: Consea (2015).

Além dessas cinco conferências, outras três suplementares: em 2006 (II Conferência + 2); em 2009 (III Conferência + 2); em 2014 (IV Conferência + 2). Todas elas realizadas em Brasília (DF).6 6 Havia a previsão de um encontro em 2018, mas o mesmo acabou não acontecendo. São estes os documentos que serão utilizados para analisarmos a evolução dos conceitos de Segurança e Soberania Alimentar no Brasil.

Os conceitos de Segurança e Soberania Alimentar nas conferências brasileiras

Como visto anteriormente, o conceito de Soberania Alimentar nasceu em contraponto ao conceito de SA. A noção de Soberania Alimentar, criada pela Via Campesina, denunciava a limitação do conceito de Segurança Alimentar que, em princípio, se restringia em garantir o acesso das populações aos alimentos sem levar em conta aspectos culturais e qualitativos destes processos.

No caso brasileiro, o conceito de Soberania Alimentar foi sendo introduzido de forma bem tímida e gradativa nas conferências realizadas. Enquanto na Primeira Conferência, de 1994, o termo não aparece em momento algum,7 7 Formalmente o conceito de Soberania Alimentar (assim como Segurança Alimentar) passou a existir em 1996, contudo, já se faziam referências a ele. nas demais conferências o conceito vai ganhando lugar ao lado da Segurança Alimentar, ainda que de forma não proporcional ao uso deste último conceito.

Em relação à Primeira Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional, de 1994, podemos destacar os seguintes elementos encontrados em seu relatório final: referências explícitas à conjuntura política do Brasil; exaltação da democracia e da necessidade da reforma agrária no país; alerta para a necessidade de um projeto nacional de alimentação que não se restrinja ao Estado, mas inclua, também, os diversos segmentos da sociedade civil; necessidade de proteção a grupos étnicos, populações indígenas e pequenos produtores; e, talvez o mais importante, a apresentação do conceito de SA enquanto algo ainda incipiente e pronto para ser construído.

Em relação ao primeiro ponto, narrativas com referência à situação política do Brasil àquela época, devemos lembrar que o país havia aprovado o impeachment do então presidente Fernando Collor há pouco tempo. Este fato acabou dando um tom mais político ao relatório final da conferência, fazendo com que alusões a um novo reinício de projeto nacional (a partir da deposição do ex-presidente) se tornasse tema recorrente no documento apresentado:

O Movimento Pela Ética na Política não se exauriu no episódio que culminou com o impeachment do ex-Presidente Fernando Collor. (...) Para implementar uma Política de Segurança Alimentar, como elemento integrante de um Projeto Nacional, é necessário fazer mudanças profundas nos procedimentos do Estado, alterando a sua natureza – historicamente excludente, elitista e autoritária – e o engajamento de toda a sociedade (CONSEA, 1994, p. 47, 148).

Este suposto novo projeto nacional, almejado por vários participantes da conferência, não poderia, entretanto, ser limitado a políticas de Estado ou governo. De acordo com o documento analisado, o país deveria fazer um planejamento em relação à alimentação da população que incluísse também os mais diversos setores da sociedade civil. Segundo o relatório final, o Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional) seria o caminho para a junção das políticas de governo e as bases da sociedade civil para o país avançar rumo a uma política inclusiva de alimentação popular.

Este projeto de alimentação da população brasileira deveria, ainda, proteger grupos específicos de diversas religiões, artistas, etnias desfavorecidas da nossa população, bem como representantes da sociedade civil.

O País que queremos precisa reconhecer a existência de uma cultura, costumes, os seus artistas, artesãos, aqueles que defendem a pluralidade religiosa, grupos afro, espíritas, carismáticos, defensores do meio ambiente. E temos de reconhecer todas as corporações profissionais, usuários de serviços, representantes do movimento estudantil, dos consumidores (CONSEA, 1994, p. 49).

Mas, talvez o ponto mais sintomático da Primeira Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional seja a tentativa de definir o conceito de SA. Em diversos momentos, o relatório final da conferência tenta elencar alguns princípios relativos a este conceito, ao mesmo tempo em que incorpora elementos que vão além do simples acesso aos alimentos por parte da população:

Por Segurança Alimentar entende-se um conjunto de princípios, políticas, medidas e instrumentos que assegure (sic) permanentemente o acesso de todos os habitantes em território brasileiro aos alimentos, a preços adequados, em quantidade e qualidade necessárias para satisfazer as exigências nutricionais para uma vida digna e saudável bem como os demais direitos da cidadania (CONSEA, 1994, p. 134).

Na segunda Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional, de 2004, bem como no encontro de 2006, que deu seguimento a esta conferência, podemos destacar os seguintes elementos: críticas à lógica de mercado neoliberal e suas consequências para a alimentação dos brasileiros; ampliação dos segmentos sociais que devem ser protegidos pelas políticas de alimentação; primeiros usos do conceito de Soberania Alimentar.

Nesta conferência e no encontro que se seguiu, o tom político de exaltação de um novo começo de projeto nacional, encontrado na conferência de 2004, é trocado por várias críticas à lógica neoliberal. Segundo o relatório, a entrega da produção e distribuição de alimentos ao modelo de competição de mercado acabaria marginalizando os pequenos produtores e levaria a deficiências no acesso de todos a alimentos baratos e de qualidade:

Que o controle das sementes por meia dúzia de empresas multinacionais coloca um grave problema de Soberania Alimentar no caso de esses produtos dominarem o mercado. No Brasil 4 empresas multinacionais já controlam mais de 80% da oferta de sementes de milho e as 4 estão prontas a substituí-las por variedades transgênicas se forem liberadas no País (...) (CONSEA, 2004, p. 39).

Também nestes encontros foi ressaltada a necessidade de proteção a setores da sociedade com maior vulnerabilidade social. Entretanto, o número de segmentos da população passíveis da proteção por parte do Estado foi ampliado se comparado aos citados na conferência anterior. Além de índios e pequenos agricultores, a conferência menciona a necessidade de proteção a quilombolas, ribeirinhos, garimpeiros e extrativistas:

Criar e implementar ações de SAN e treinamentos para aproveitamento dos recursos alimentares da região, desenvolvidos por entidades de ensino e pesquisa, aproveitando-os também na merenda escolar, acampamentos de reforma agrária, assentamentos rurais, quilombolas, indígenas, ribeirinhos, garimpeiros, extrativistas e outros existentes nos municípios, além de estimular a autonomia em relação à produção de sementes e mudas para a produção de alimentos (CONSEA, 2004, p. 21).

Porém, o ponto que mais chama a atenção para os objetivos deste artigo é o uso do conceito de Soberania Alimentar. Dois aspectos podem ser ressaltados aqui. Primeiro, ao contrário do sentido original deste conceito, pensado pela Via Campesina, que o contrapunha em muitos aspectos ao conceito de Segurança Alimentar, a conferência de 2004, bem como a sua complementação de 2006, trata Soberania Alimentar e Segurança Alimentar como conceitos complementares e não em oposição. Apesar dos dois conceitos não aparecerem juntos no documento final, ambos são tratados não como concorrentes, e sim como suplementos.

No caso brasileiro, a conquista da Soberania Alimentar é frequentemente associada à soberania do Estado brasileiro e não dos povos. Nas poucas vezes em que o conceito é utilizado em seu sentido original, não se percebe no projeto brasileiro a intenção de “Soberania Alimentar para todos”, mas a intenção de preservar hábitos e culturas das populações tradicionais como os povos indígenas e quilombolas dentro de um contexto maior que é o da Segurança Alimentar. Pode-se dizer, portanto, que na perspectiva brasileira pode-se alcançar a SA sem se alcançar plenamente a Soberania Alimentar. Na ideia original de Soberania Alimentar, infere-se que ela não se restringiria apenas aos povos tradicionais. No conceito utiliza-se o termo “povos” em um contexto amplo. Neste sentido, o conceito de Soberania Alimentar está ligado não ao conceito de povos específicos - no sentido de poderem preservar seus hábitos e culturas alimentares - e sim à soberania do país em definir suas próprias políticas de abastecimento alimentar em contraponto a práticas e imposições internacionais. Dentre suas resoluções relativas à relação entre Soberania Alimentar e Relações Internacionais, estão:

Resolução sobre Alca: Considerando os efeitos nefastos aos povos, meio ambiente, à economia sustentável e à Soberania Alimentar causados pelos acordos de livre comércio que beneficiam apenas as multinacionais, como o Nafta, por exemplo. Reconhecendo que o atual governo brasileiro, por intermédio do MRE, tem, nos fóruns internacionais, demonstrado uma grande capacidade política no sentido de defender nossa soberania e os legítimos interesses políticos e econômicos do Brasil (CONSEA, 2004, p. 23).

O uso da ideia de soberania enquanto algo ligado à autonomia estatal e não ao respeito à cultura dos povos torna-se tão automático ao longo dos encontros que uma das moções aprovadas após o encontro de 2004 refere-se, de forma deslocada do contexto da conferência, à retirada das tropas americanas e inglesas do Iraque:

Na II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, a questão da soberania foi abordada várias vezes e o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou na abertura que a nossa guerra é contra a fome e não contra os iraquianos. Nesse sentido, nos somamos nesta data aos povos do mundo na exigência da imediata retirada das tropas americanas e inglesas do Iraque, pela paz (CONSEA, 2004, p. 46).

É oportuno notar, também, que a apresentação da Soberania Alimentar e a Segurança Alimentar como complementares, e a relação do primeiro conceito à ideia segurança nacional (algo ausente do uso do conceito feito pela Via Campesina) se inicia a partir desta Segunda Conferência e continua a ser utilizada em todas as conferências seguintes, até 2015.

A conferência de 2007 e seu encontro complementar de 20098 8 O Encontro de 2007 é o primeiro em que os conceitos de Segurança e Soberania Alimentar aparecem juntos no título: Segurança Alimentar e Nutricional: por um desenvolvimento sustentável com Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. continuaram com as críticas feitas ao modelo neoliberal, já encontradas na conferência anterior. Seu tom, porém, deixa de refletir politicamente a conjuntura brasileira e concentra-se mais na defesa de políticas relativas à Segurança Alimentar e à Soberania Alimentar sem entrar em debates partidários domésticos. As populações a serem protegidas em termos de produção alimentar são novamente estendidas. Agora, torna-se dever do Estado proteger indígenas, quilombolas, população negra; comunidades de terreiro, extrativistas, ribeirinhos, caboclos, pescadores artesanais, pomeranos, portadores de deficiência e comunidades GLBTTs.9 9 Àquela época, ainda não se usava a sigla LGBTI+. A necessidade de transferência de renda para populações vulneráveis (como, por exemplo, o Programa Bolsa Família) é enfatizada em vários momentos e, pela primeira vez, é nítido um esforço sistemático de monitoramento das variáveis ligadas à produção alimentar. Além destes fatores, ressalta-se a necessidade de uma educação voltada para aspectos alimentares, além da defesa do acesso à água por populações de regiões áridas. A defesa da não transposição do rio São Francisco destaca-se dentre estas políticas defendidas.10 10 As razões apontadas para a não transposição seriam o medo de assoreamento do rio e a possibilidade de privatização futura do acesso à água.

Em relação ao conceito de Soberania Alimentar, os relatórios apresentam partes conflitantes, relativas a esta definição. Enquanto em alguns momentos a Soberania Alimentar é definida em consonância como o conceito da Via Campesina, em outros trechos é visível a equivalência feita entre Soberania Alimentar à soberania do Estado Brasileiro e não dos povos e da população que o compõe:

O enfraquecimento dos Estados nacionais e a dominação dos interesses financeiros das grandes corporações, apoiados na hegemonia do pensamento econômico neoliberal desde o final da década de 1980, impuseram políticas econômicas contrárias aos interesses da maioria da população e que afetam a Soberania Alimentar do País. A política econômica ainda vigente restringe a ampliação de atividades econômicas geradoras de emprego de qualidade e de oportunidades de trabalho digno. Esse modelo transfere vultosos recursos para o ganho financeiro especulativo para o pagamento da dívida pública (CONSEA, 2007, p. 16).

O atual contexto internacional contribui para a inSegurança Alimentar e nutricional e ameaça a Soberania Alimentar dos países do Terceiro Mundo, entre eles, o Brasil. Submetidos a uma ordem econômica injusta, esses países são induzidos a depender do comércio internacional, que não é fonte confiável de Segurança Alimentar e nutricional. Nos moldes em que é realizado e regulado, esse comércio compromete a Soberania Alimentar, isto é, compromete o exercício soberano de políticas de Segurança Alimentar e nutricional (CONSEA, 2007, p. 20).

O papel de destaque desempenhado pelo Brasil nas negociações internacionais, em particular, nas relações com os países em desenvolvimento, reforça a importância de o País se pautar pelo objetivo de criar condições para sua Soberania Alimentar e contribuir para a soberania dos demais países (CONSEA, 2007, p. 20).

Já nos encontros de 2011 e 2014, encontramos um texto mais técnico, com o uso recorrente de estatísticas. A questão das mudanças climáticas globais e sua relação com os temas alimentares torna-se ponto de amplo debate e preocupação nestes relatórios. A proteção às mulheres também é citada diversas vezes e a preocupação com o etnodesenvolvimento também encontra espaço nos documentos.11 11 É interessante notar que, apesar do etnodesenvolvimento estar diretamente ligado à Soberania Alimentar, estes dois conceitos não são apresentados necessariamente como vinculados nestes documentos. Um ponto que chama a atenção nestes relatórios, se comparados com os demais, é que, apesar do conceito de soberania ser utilizado 25 vezes, não existe um esforço evidente para defini-lo. Em alguns momentos, é possível notar uma correta correlação entre soberania e autonomia dos povos (algo em concordância com o uso original do termo), mas sem uma tentativa sistemática de estabelecer objetividade a este conceito:

Ao longo do debate em plenária, alguns outros grandes desafios foram apontados, tais como: a incorporação da SAN nas estratégias de desenvolvimento, o que requer medidas como sua inclusão entre os macro desafios e eixos de desenvolvimento previstos no Plano Plurianual (PPA); o empreendimento de maior esforço, por parte do Consea, no debate sobre temas polêmicos, como o papel regulador do Estado para a garantia da Soberania Alimentar e do DHAA e a perspectiva de impor limites ao avanço da monocultura no País; a necessidade de assegurar maior transparência na divulgação de pesquisas governamentais, principalmente aquelas que mostram a vulnerabilidade alimentar da população negra, dos povos indígenas, povos tradicionais de matriz africana e demais povos e comunidades tradicionais; a abertura de maior espaço na pauta do Consea para o debate sobre a pesca artesanal e sua territorialidade, dentre outros (CONSEA, 2011, p. 49).

Por fim, no documento do encontro de 2015, a primeira característica que chama a atenção é a enorme ampliação das populações consideradas vulneráveis em relação à questão alimentar. Logo no início do texto, a lista destes povos contempla 34 itens (13 a mais que nos documentos de 2007 e 2009). Além desses povos, são ainda citados 12 segmentos sociais que também devem ser protegidos no que se refere a aspectos alimentares.

No que se refere ao conceito de Soberania Alimentar, pode-se notar que, pela primeira vez, o termo passa a ser remetido totalmente ao seu sentido original, desvinculando-se da noção de soberania enquanto autonomia estatal e adquirindo seu sentido inicial de autossuficiência, respeito cultural e garantia da qualidade original dos alimentos. Entretanto, a definição vincula-se a um novo conceito criado denominado “comida de verdade”. De acordo com o documento, comida de verdade é:

Comida de verdade começa com o aleitamento materno. Comida de verdade é produzida pela agricultura familiar, com base agroecológica e com o uso de sementes crioulas e nativas. É produzida por meio do manejo adequado dos recursos naturais, levando em consideração os princípios da sustentabilidade e os conhecimentos tradicionais e suas especificidades regionais. É livre de agrotóxicos, de transgênicos, de fertilizantes e de todos os tipos de contaminantes. A Comida de verdade garante a Soberania Alimentar; protege o patrimônio cultural e genético; reconhece a memória, a estética, os saberes, os sabores, os fazeres e os falares, a identidade, os ritos envolvidos, as tecnologias autóctones e suas inovações. É aquela que considera a água alimento. É produzida em condições dignas de trabalho. É socialmente justa. Comida de verdade não está sujeita aos interesses de mercado (CONSEA, 2015, p. 28).

Assim, 21 anos após a primeira conferência, podemos notar que o conceito de Soberania Alimentar ganha sua estabilização semântica. Colocado ainda como algo que não se opõe à noção de SA (conforme seu sentido original), este conceito volta, entretanto, ao seu lugar originário de conceito que abarca todas as demais noções alimentares e aproxima-se, pelo menos em parte, do sentido dado pela Via Campesina.

Os conceitos de Soberania Alimentar e Segurança Alimentar no Brasil

Através de uma análise histórica dos conceitos de Soberania Alimentar e Segurança Alimentar no Brasil, utilizando para isto os relatórios das Conferências Nacionais sobre o tema, podemos notar características próprias no uso destas concepções em nosso país. Em relação ao próprio conceito de Segurança Alimentar, este ganhou viés desvinculado do agronegócio e das práticas de monocultura (negando também seu sentido original) e ganhou o complemento da necessidade nutricional. Também contrariando sua definição primária, a ideia de Segurança Alimentar, ao invés de ser incluída dentro do conceito de Soberania Alimentar, em diversos momentos foi descrita como anterior e mais abrangente que esta. Em várias passagens dos documentos analisados, a Soberania Alimentar é tratada como um dos itens da Segurança Alimentar e não o inverso, como previa seu sentido original.

O conceito de Soberania Alimentar também foi utilizado, até o ano de 2015, com sentido divergente daquele dado pela Via Campesina. Durante décadas no Brasil, o conceito de Soberania Alimentar foi descrito não como algo em oposição ao conceito de Segurança Alimentar, e sim como complementar a este. Provavelmente isso se deve ao fato de que, no Brasil, o conceito de SA perdeu seus vínculos com o agronegócio e com a produção pela monocultura e ganhou a necessidade de garantir não apenas o acesso da população aos alimentos, mas, também, a necessária qualidade desses (principalmente em relação à não utilização de agrotóxicos e à ausência de uso de sementes modificadas geneticamente).

Enquanto o conceito de Soberania Alimentar, definido pela Via Campesina, referia-se à soberania de todos os povos do planeta, sem distinção do grau de vulnerabilidade ou qualquer relação com o conceito de soberania estatal, no Brasil esse conceito sempre foi interpretado de forma divergente. Em nosso país, até pelo menos 2015, garantir a Soberania Alimentar quase sempre foi traduzido como garantir a autonomia do país na definição de suas políticas agrícolas - em detrimento das grandes corporações internacionais ou interferência de países estrangeiros - e da autossuficiência na produção de nossos alimentos. Além disso, no caso específico do Brasil, quando o conceito de Soberania Alimentar é utilizado corretamente, ele restringe-se às populações socialmente mais vulneráveis. Ao invés de ter como objetivo a garantia da qualidade, das práticas culturais e o respeito à tradição alimentar de toda a população brasileira, o uso desse conceito em nosso país sempre restringiu a garantia da Soberania Alimentar às populações mais tradicionais. O número dessas populações, entretanto, foi sendo aumentado com o decorrer das conferências, passando de simples proteção a pequenas famílias, grupos indígenas, dentre outros, a mais de 30 povos sendo descritos como vulneráveis nas últimas conferências:

Essas especificidades encontradas no caso brasileiro nos leva a refletir sobre algumas possíveis consequências do uso específico destes conceitos. Em primeiro lugar, podemos concluir que as críticas ao agronegócio e à política de monocultura nas conferências brasileiras flexibilizaram o conceito de Segurança Alimentar, tornando-o não como algo incompatível com o sentido geral de Soberania Alimentar, e sim como complementar a esta. Esse deslocamento semântico foi positivo, pois permitiu maior profundidade conceitual e tornou possível abordar a questão do acesso aos alimentos como algo compatível com o respeito às tradições regionais e garantia de permanência de saberes locais. Em segundo lugar, a inserção da necessidade de aspectos nutricionais ao conceito de SA também contribuiu para que o conceito não se limitasse ao mero fornecimento de alimentos, mas, também, à necessidade de qualidade deles.

Entretanto, o equívoco de se traduzir o conceito de Soberania Alimentar, pelo menos até a conferência de 2015, como a garantia da soberania nacional, tornou o uso desta definição duvidosa, levando a crer que o mesmo se referia à autonomia do Estado quando, na verdade, foi criado para garantir o respeito e a autonomia dos povos, independentemente do país. Essa situação somente foi ratificada na conferência de 2015. Também, a tentativa de garantir a Soberania Alimentar somente às populações vulneráveis (quando o conceito era utilizado no seu sentido original) nos induziu a acreditar que a defesa de tradições culturais e a proteção à qualidade de alimentos regionais seriam restritas a esses povos. Utilizando o conceito original do termo, percebemos que o intuito era a preservação desses elementos para toda a população do globo. Não estamos aqui, obviamente, sugerindo que a defesa da Soberania Alimentar desses povos específicos não deve acontecer. Entretanto, a correlação feita pelos documentos das conferências nos induz ao erro de acreditar que somente a salvaguarda alimentar dessas populações seria suficiente para garantir os objetivos vinculados ao conceito de soberania. A defesa dessas populações, somada aos esforços de garantia da Soberania Alimentar a todos os brasileiros, estaria bem mais próxima dos objetivos iniciais da Via Campesina que não limitava a defesa das tradições e a autonomia alimentar somente aos segmentos vulneráveis da sociedade.

CONCLUSÃO

Foi objetivo deste artigo demonstrar como os conceitos Segurança Alimentar e Soberania Alimentar foram apresentados e incorporados às narrativas sobre alimentação no Brasil, por meio da análise das Conferências de Segurança Alimentar e Nutricional realizadas no Brasil entre 1994 e 2015. Pode-se perceber que, ao longo das Conferências, os conceitos de Segurança Alimentar e Soberania Alimentar foram sendo incorporados como perspectivas que se complementam nas narrativas brasileiras. Muitas das contradições existentes entre esses dois conceitos foram suprimidas de modo a apresentá-los de forma suplementar como se não houvesse incongruências entre eles.

O conceito de Segurança Alimentar obteve maior ênfase em todas as Conferências, com um discurso bem alinhado com as diretrizes da FAO, ao passo que a Soberania Alimentar foi se inserindo aos poucos e de forma mais restrita a abarcar algumas populações. Pode-se dizer que no caso brasileiro a SA é tida como o conceito principal e a Soberania Alimentar, um conceito associado. A confusão na aplicação dos conceitos (segurança alimentar, soberania alimentar, soberania nacional) e/ou uma associação equivocada entre eles faz com que percam ou enfraqueçam o seu sentido original e consequentemente as metas a serem alcançadas para cada um acaba enfraquecida e algumas até abortadas.

Pode ser positivo que as metas em relação a esses três conceitos sejam, de certo modo, associadas, mas consequências indesejáveis podem ocorrer no uso desses termos como sinônimos, causando insuficiências no alcance dos objetivos quando operacionalizados em políticas públicas.

Por fim, pode-se concluir que os conceitos de Soberania Alimentar e Segurança Alimentar quase sempre foram utilizados de forma equivocada (se analisarmos os sentidos originais do termo) no decorrer das conferências sobre alimentação no nosso país. Enquanto essa divergência produziu alguns aspectos positivos, como no caso desvinculação da Segurança Alimentar à monocultura ou ao simples acesso aos alimentos, outros aspectos negativos desta desvinculação podem ser apontados, como a vinculação da Soberania Alimentar à mera soberania política do Estado brasileiro; o apagamento das tensões entre os conceitos de Soberania Alimentar e Segurança Alimentar; a luta pela garantia da Soberania Alimentar apenas para populações específicas; a inversão dimensional, tratando, durante muito tempo, a Soberania Alimentar como inclusa na Segurança Alimentar e não o contrário.

Sabe-se que todo processo de constituição semântica conceitual é histórico e contingente. Assim, não pressupomos que essas idiossincrasias sejam exclusividade das políticas brasileiras. Entretanto, um maior preciosismo na definição dos conceitos junto a uma procura pelos seus significados originais colaboraria para políticas mais claras relativas à alimentação do povo brasileiro e evitaria, consequentemente, interpretações contraditórias. No caso brasileiro, entretanto, parece que esses problemas foram amenizados na última conferência de 2015. Entretanto, o cancelamento do encontro de 2018 e a atual falta de uma política sistemática sobre a alimentação no país nos impedem de confirmar a continuidade destes avanços e até mesmo do aperfeiçoamento conceitual dessas ideias.

Figura 3
Histórico das Conferências Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional.

Fonte: Consea (2015).


Gráfico 1
– Frequência dos conceitos de Segurança e Soberania Alimentar

Quadro 2
– Dimensões da Soberania Alimentar

Quadro 3
Comparação dos conceitos de Soberania e Segurança Alimentar no sentido dado pela Via Campesina e no sentido utilizado pelo Brasil

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  • 1
    Food security exists when all people, at all times, have physical and economic access to sufficient, safe and nutritious food to meet their dietary needs and food preferences for an active and healthy life.
  • 2
    É feita uma interpretação do artigo 11 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
  • 3
    (...) Every man, woman and child, alone or in community with others, have physical and economic access at all times to adequate food or means for its procurement. The right to adequate food shall therefore not be interpreted in a narrow or restrictive sense which equates it with a minimum package of calories, proteins and other specific nutrients. The right to adequate food will have to be realized progressively .
  • 4
    Extinto através da Medida Provisória nº 870, promulgada no dia 1º de janeiro, no atual governo de Jair Bolsonaro.
  • 5
    (...) is the right of peoples to healthy and culturally appropriate food produced through ecologically sound and sustainable methods, and their right to define their own food and agriculture systems.
  • 6
    Havia a previsão de um encontro em 2018, mas o mesmo acabou não acontecendo.
  • 7
    Formalmente o conceito de Soberania Alimentar (assim como Segurança Alimentar) passou a existir em 1996, contudo, já se faziam referências a ele.
  • 8
    O Encontro de 2007 é o primeiro em que os conceitos de Segurança e Soberania Alimentar aparecem juntos no título: Segurança Alimentar e Nutricional: por um desenvolvimento sustentável com Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.
  • 9
    Àquela época, ainda não se usava a sigla LGBTI+.
  • 10
    As razões apontadas para a não transposição seriam o medo de assoreamento do rio e a possibilidade de privatização futura do acesso à água.
  • 11
    É interessante notar que, apesar do etnodesenvolvimento estar diretamente ligado à Soberania Alimentar, estes dois conceitos não são apresentados necessariamente como vinculados nestes documentos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    21 Out 2020
  • Aceito
    10 Maio 2023
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