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COORDENAÇÃO FEDERATIVA DE POLÍTICAS PÚBLICAS: os sistemas nacionais de políticas normatizados

FEDERAL COORDINATION OF PUBLIC POLICIES: the national systems of regulated policies

COORDINATION FEDERALE DES POLITIQUES PUBLIQUES: les systèmes nationaux de politiques standardisées

Resumo

A Constituição de 1988 trouxe inúmeras inovações sobre políticas públicas. Uma delas foi a definição de um leque de competências compartilhadas entre as três esferas de governo. Dessas competências, algumas dependem da adesão voluntária dos estados. Este é o caso dos sistemas de políticas aqui denominados de normatizados. O artigo analisa por que os estados aderem a esses sistemas, quais os incentivos para a cooperação e quais os instrumentos de indução do governo federal para o enforcement das políticas. O artigo apresenta contribuições teóricas e empíricas. A teórica é o apoio nas teorias que enfatizam o papel das regras, dos incentivos e do desenho da política para a implementação de políticas em países federais. A empírica é a montagem de um banco de dados com cerca de 30 mil ocorrências, que correspondem ao número de convênios firmados entre o governo federal e os estados e que mostram o funcionamento desses sistemas – segurança pública, cultura, turismo e habitação, no período 1996-2014. O artigo conclui que a despeito do ativismo regulador do governo federal, a adesão dos estados é condicionada por suas capacidades e que os entraves dos sistemas não foram objeto de avaliação sistemática.

Palavras-chave
Políticas públicas; Federalismo; Competências concorrentes; Estado-membro; Constituição de 1988

Abstract

The 1988 Constitution brought numerous innovations on public policies. One of them was the definition of a range of competences shared between the three spheres of government. Of these competences, some depend on the voluntary adherence of the states. This is the case of the policies here called regulated. The article analyzes why states adhere to these systems, what are the incentives for adherence and cooperation, and what are the federal government’s induction instruments for policy enforcement. The article presents theoretical and empirical contributions. The first is based on theories that emphasize the role of rules, incentives and design for the implementation of policies in federal countries. The empirical is the collection of data on the functioning of these systems – public security, culture, tourism and housing, in the period 1996-2014 through a data base of more than 30,000 occurences. The article concludes that despite the regulatory activism of the federal government, the adherence of the states is conditioned by their capacities and that the systems’ obstacles have not been the object of a systematic evaluation.

Key words
Public policies; Federalism; Concurrent powers; Member-state; 1988 Constitution

Résumé

La Constitution de 1988 a apporté de nombreuses innovations sur les politiques publiques. L’une d’entre elles était la définition d’un éventail de compétences partagées entre les trois sphères de gouvernement. Parmi ces compétences, certaines dépendent de l’adhésion volontaire des états. C’est le cas des polices dites ici standardisées. Le article analyse pourquoi les états adhèrent à ces systèmes, quelles sont les incitations à la coopération, et quels sont les instruments d’induction du gouvernement fédéral pour l’application des politiques. Le article présente des contributions théoriques et empiriques. La théorie est basée sur des théories qui mettent l’accent sur le rôle des règles et des incitations pour la mise en œuvre des politiques dans les pays fédéraux. L’empirique est la collecte de données sur le fonctionnement de ces systèmes – sécurité publique, culture, tourisme et logement, dans la période 1996-2014. Le article conclut que malgré l’activisme réglementaire du gouvernement fédéral, l’adhésion des états est conditionnée par leurs capacités et que les obstacles du système n’ont pas fait l’objet d’une évaluation systématique.

Mots-clés
Politiques publiques; Fédéralisme; Compétences compétitives; État membre; Constitution de 1988

INTRODUÇÃO

Desde o final dos anos 1980 e como resultado das mudanças nas políticas públicas introduzidas pela Constituição de 1988, o governo federal adotou uma série de regras para colocar em prática os mandamentos constitucionais relativos às políticas públicas. A partir de então, dois grandes e complexos tipos de sistemas de políticas públicas foram constituídos, ambos regulados pela esfera federal. O primeiro foi objeto de emendas constitucionais que definiram a participação dos entes federados nas políticas, assim como vincularam recursos das três esferas ao seu provimento. Esses sistemas podem ser rotulados de constitucionalizados e abrangem as políticas de educação básica e saúde. O segundo compreende grande variedade de políticas e é resultado das competências concorrentes definidas na Constituição de 1988. Esse segundo sistema pode ser rotulado de sistema nacional de políticas normatizado (SNPN).

Como se verá adiante, o Executivo federal exerceu, até 2016, ativismo normativo e regulatório na maioria dessas políticas. Das competências concorrentes, as seguintes foram constituídas como sistemas nacionais, constitucionalizados ou normatizados: saúde; educação; assistência social; segurança alimentar e nutricional; meio ambiente; cultura; habitação; saneamento, resíduos sólidos e turismo. Além desses, foi instituído também o Sistema Nacional de Segurança Pública, integrado pelo Sistema Prisional e pelo Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas. Embora constitucionalmente essas duas funções não sejam concorrentes, a maioria dos diagnósticos apontava que, sem o apoio financeiro da União, os problemas da violência e do combate às drogas não seriam reduzidos nem melhoradas as condições dos presídios.

Se ambos os sistemas são regulados pela esfera federal, o primeiro, o das políticas constitucionalizadas, vincula recursos das três esferas ao seu provimento, tornando a adesão automática. Já o segundo, o das políticas normatizadas, é de livre adesão. O acesso aos recursos é pela via de convênios e condicionado a diversos tipos de contrapartida, sejam financeiras sejam institucionais. O desenho dos dois sistemas, com regulação federal, implementação subnacional e financiamento partilhado indica que, após 1988, o federalismo brasileiro tornou-se mais cooperativo do que dual. De forma simplificada, federações cooperativas como são, por exemplo, a Alemanha e o Brasil, são aquelas em que os diferentes níveis de governo compartilham a provisão de políticas públicas nacionais e legislam na mesma esfera, embora haja, obviamente, variações entre as unidades constituintes e entre os países. Já as federações duais ou competitivas, das quais os Estados Unidos se aproximam, são baseadas no princípio de que o governo federal e os governos estaduais são coiguais e legislam em esferas separadas. 2 2 É preciso destacar que federações não são estáticas e se adaptam às circunstâncias políticas e econômico-sociais, variando no tempo, no espaço e por política. A federação norte-americana, por exemplo, embora não tenha sofrido mudança constitucional nesse tema desde sua promulgação, não é hoje tão dual, dadas a expansão do governo federal e as várias formas de relacionamento com os governos estaduais. Para uma excelente discussão sobre federalismo dual e cooperativo, relações intergovernamentais e centralização/descentralização nas federações democráticas em perspectiva comparada, ver Dardanelli e Kincaid (2023). Para o caso brasileiro, ver Abrucio et al. (2020); Arretche (2012; 2009), Gomes (2009), Machado e Palotti (2015), (Souza (2019; 2001) e Vazquez (2014).

Este artigo tem dois objetivos. O primeiro é mapear, descrever e analisar os SNPNs que são partilhados entre as esferas estadual e federal. O tema ainda é pouco conhecido tanto na literatura sobre federalismo como na de políticas públicas. O trabalho busca contribuir para essa literatura, ao incorporar o debate sobre centralização, recentralização e descentralização na federação brasileira a partir das legislações infraconstitucionais pós-1988, tornando a federação brasileira mais cooperativa e menos dual, e ao analisar o desenho das políticas públicas como variável explicativa da sua implementação.

Apesar de cada sistema ter regras diferentes, assim como diferentes atores políticos envolvidos, cadeias decisórias específicas, clivagens exclusivas, como, por exemplo, com os ciclos eleitorais, e consequências também diferentes, o objetivo de apresentá-los conjuntamente é o de analisar seu funcionamento e testar as hipóteses extraídas da literatura sobre o tema. O segundo objetivo é investigar a relevância desses sistemas na execução de políticas públicas pelos governos estaduais, analisando a importância relativa dos recursos provenientes desses sistemas nos orçamentos estaduais, assim como as contrapartidas que são deles exigidas, ou seja, os incentivos que mobilizam os estados à sua adesão, a importância das regras para a implementação de políticas e o papel dos partidos políticos no direcionamento dos recursos dos sistemas nacionais.

O levantamento cobre o período 1996-2014, no qual o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e o Partido dos Trabalhadores (PT) governaram o país. O período analisado foi aquele em que os Sistemas foram mais mobilizados, passando a diminuir sua importância a partir do governo Dilma 2. A base de dados é constituída pelos convênios firmados entre o governo federal e os estados, extraída do Portal da Transparência da Controladoria Geral da União (CGU), totalizando 37.369 convênios. 3 3 http://www.portaltransparencia.gov.br/downloads/snapshot.asp?c=Convenios . Os dados relativos ao partido dos governadores foram coletados no Tribunal Superior Eleitoral e os orçamentários dos estados na Secretaria do Tesouro Nacional. 4 4 Por limitação de espaço, os procedimentos metodológicos e o banco de dados podem ser solicitados à autora. A origem das informações da CGU é a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) por meio do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI) e o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) por meio do Sistema de Convênios (Siconv). 5 5 A base do Siconv disponível on-line tem início em 2008. Como a maior parte dos sistemas nacionais foi instituída anteriormente, a base disponibilizada pela CGU é a única que cobre todo o período abrangido pela pesquisa. O período justifica-se pela prioridade à criação desses sistemas nesses governos, enquanto os presidentes Temer e Bolsonaro os desmobilizaram. Com o retorno do PT ao governo federal, presume-se que os sistemas normatizados devam ser reconstituídos, podendo esta pesquisa contribuir para melhor conhecê-los.

O trabalho testa quatro hipóteses, ressaltando que as H1 e 2 são rivais:

H1 – Estados com maior participação da arrecadação de recursos próprios na sua receita total tendem a não aderir às regras dos SNPNs, o que torna o esforço normativo do governo federal mais destinado aos estados economicamente menos desenvolvidos, contribuindo, portanto, para a diminuição das desigualdades regionais. Esta hipótese remete à discussão sobre as características do federalismo brasileiro.

H2 – A liberação de recursos federais para os estados é condicionada por critérios técnicos, aí incluídos capacidade de contrapartida, de elaboração de projetos e de gestão, também remetendo às características do federalismo brasileiro.

H3 – O desenho do sistema importa para a adesão/cooperação dos estados, remetendo às teorias sobre políticas públicas e às teorias institucionalistas, pela importância da coordenação em federações cooperativas e das regras para a implementação das políticas.

H4 – O governo federal tende a priorizar a alocação de recursos dos sistemas nos estados governados pelos partidos que compõem sua base de sustentação, incorporando fatores partidários às decisões sobre alocação dos recursos.

Este trabalho está dividido em três partes. A primeira faz o levantamento das características dos SNPNs. A segunda detalha quatro sistemas, mostra sua trajetória na agenda dos governos, analisa os dados sobre os convênios celebrados pelas instâncias do governo federal responsáveis pela coordenação e pelo financiamento das ações resultantes dos sistemas, assim como os recursos federais transferidos para a realização dos objetivos das políticas que compõem os sistemas, testando, assim, as quatro hipóteses da pesquisa. Todos os dados foram extraídos da base de dados acima detalhada. A última parte apresenta algumas considerações finais.

SISTEMAS DE POLÍTICAS NACIONAIS NORMATIZADOS (SNPNS)

Os SNPNs começaram a ser instituídos no Brasil a partir de 2005. No entanto, os fundos que os financiam são anteriores à Constituição de 1988, que promoveu mudanças na forma como as políticas são decididas, financiadas e implementadas. Como se verá a seguir, o desenho de cada política aqui analisada é diferente, embora tenham em comum a coordenação do governo federal, o financiamento partilhado e a implementação do estado.

A proliferação dos SNPNs foi resultado da listagem de competências concorrentes entre as três esferas de governo, até então inédita nas constituições brasileiras. 6 6 Como se sabe, na maioria dos países federais, a União tem capacidade para regular, através de normas gerais, as competências definidas como concorrentes. Sobre as razões que levaram os constituintes a ampliar o rol das competências concorrentes, ver Souza (1997; 2001). A decisão dos constituintes de listar as competências concorrentes abriu espaço para a institucionalização dos SNPNs e é um dos elementos que contribuem para a classificação do federalismo brasileiro como mais cooperativo do que dual/competitivo. Essa classificação segue o caminho teórico-metodológico aberto por Obinger et al. (2005)OBINGER, Hebert et al. (2005) Federalism and the welfare state: new world and European experiences. Cambridge: Cambridge University Press, 2005., que propõem que as federações sejam classificadas e analisadas a partir do desenho de suas regras. Como mencionado acima, no federalismo competitivo, as esferas nacional e estadual partilham poder soberano sobre o território e as populações. Já nas federações cooperativas, a característica é a de que a partilha de responsabilidades entre as esferas e as instituições federais e estaduais é marcada pela independência e interdependência entre elas, algumas vezes com sobreposição de funções e de recursos financeiros. Nessa modalidade de federação, a coordenação dos entes federados, que caracteriza os SNPNs, torna-se crucial. 7 7 Sobre a tipologia das federações em geral e da brasileira em particular, ver, entre outros, Souza (1997; 2001).

O Quadro a seguir apresenta as principais características dos SNPNs que são dirigidos aos estados.

Quadro 1
Principais características dos Sistemas Nacionais Normatizados

No período analisado, foram celebrados 37.369 convênios entre os governos subnacionais e o federal, totalizando um valor conveniado de cerca de R$ 266 bilhões. Os municípios são os principais beneficiários dos repasses. Sem correção dos valores, do total de cerca de R$ 399 bilhões conveniados com as esferas subnacionais (em 461.492 convênios), aproximadamente R$ 139 bilhões foram destinados aos estados. O Ministério da Fazenda destaca-se como o maior alocador de recursos aos estados, concentrado no período 1996-2002. Tal concentração é explicada pelo apoio técnico e financeiro do governo federal ao ajuste fiscal dos estados. A maior transferência de recursos ocorreu no período (Fernando Henrique Cardoso) FHC 1, mesmo excluído o Ministério da Fazenda. A partir de 2008, os recursos declinaram, particularmente no governo Dilma, mostrando que os recursos dos SNPNs, por não serem de transferência obrigatória, são afetados por fatores endógenos, principalmente financeiros e políticos.

Após a desagregação dos dados por órgão federal, foram separados os que compõem os SNPNs aqui analisados: (a) Sistema Único da Segurança Pública (SUSP) que envolve também o Sistema Nacional de Combate às Drogas (Sisnad) e o Sistema Penitenciário Nacional (SPN); (b) Sistema Nacional de Cultura (SNC); (c) Sistema Nacional de Turismo (SNT); e (d) Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS), correspondendo a mais de 30 mil ocorrências, analisados nas seções seguintes. 8 8 Os sistemas de assistência social e segurança alimentar e nutricional são voltados para os municípios. O de saneamento não é objeto de transferências via convênios, mas restrito à montagem de um sistema de informações, que inclui água, esgoto e resíduos sólidos. O Sistema Nacional de Resíduos Sólidos foi objeto de levantamento de dados neste trabalho, mas decidiu-se não o incluir porque a parte do sistema administrada pelo Ministério do Meio Ambiente só celebrou dois convênios com os estados e a administrada pelo Ministério das Cidades, embora tenha celebrado cerca de 60 convênios no período, não permite distinguir os voltados para os resíduos sólidos dos voltados para os recursos hídricos.

SISTEMA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA (SUSP)

A entrada do governo federal no tema da segurança foi resultado, segundo Soares (2007)SOARES, Luiz Eduardo. A política nacional de Segurança Pública: histórico, dilemas e perspectivas. Estudos Avançados, São Paulo, n. 21 (61), Dez. 2007, p. 77-97., do sequestro na Zona Sul carioca do ônibus 174, assistido com perplexidade por todo o país em tempo real. Ato contínuo, o presidente FHC determinou a elaboração de um plano nacional de segurança pública, divulgado em 2000, que definiu a agenda nacional para a segurança do ponto de vista dos compromissos da União. O SUSP é o sistema mais regulado e com maior número de instâncias de coordenação e implementação entre os aqui analisados. No entanto, a política federal enquanto sistema integrador e coordenador das unidades federadas só foi instituída em 2012, pela Presidente Dilma, nascendo o Sistema Nacional de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (Sinesp), em 2018 denominado SUSP, financiado por dois fundos: Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) e Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP). O primeiro foi criado em 1994, pelo Presidente Itamar, e o segundo em 2001, pelo Presidente FHC. O SUSP é coordenado pelo Ministério da Justiça (MJ), através da Secretaria Nacional de Segurança Pública.

O SUSP comporta proposta complexa e ambiciosa de coletar informações relacionadas à segurança pública, ao sistema prisional, à execução penal e ao enfrentamento ao tráfico de drogas. Tais informações constituiriam um banco de dados com o objetivo de estruturar a política de segurança pública em todo o país. O banco de dados alimentaria o cadastro criminal unificado (INFOSEG) e o Observatório Nacional de Segurança Pública, voltado para a identificação e a disseminação de experiências bem-sucedidas na prevenção e no combate à violência. O sistema seria alimentado por dados encaminhados pelos estados. Por isso, e diferentemente de outros sistemas nacionais de políticas públicas, que contam com a participação ativa dos municípios, o SUSP, seu Conselho e seus fundos funcionariam como sistemas de cooperação técnica e financeira entre a União e os estados.

Assim como outros sistemas nacionais, o SUSP contém, nas suas regras, incentivos para a adesão/cooperação dos estados. Isso porque os integrantes que deixarem de fornecer ou atualizar dados não poderão receber recursos ou celebrar parcerias com a União para financiamento de programas. No entanto, e como se verá adiante, esses incentivos, que condicionam a transferência de recursos, não foram suficientes para seu enforcement e sustentabilidade, particularmente do seu componente mais importante, isto é, a montagem de um sistema nacional e integrado de informações.

O SUSP conta com inúmeras instâncias e instrumentos decisórios e cooperativos. A coordenação é da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). Seu conselho, o Conselho Nacional de Segurança Pública (CONASP), é de natureza consultiva e deliberativa. A gestão participativa se dá pela via das Conferências Nacionais de Segurança Pública, iniciadas em 2009, que, pelo seu desenho, compartilha, entre Estado e Sociedade, a responsabilidade de planejar, implementar, monitorar e avaliar as ações de segurança. O Gabinete de Gestão Integrada (GGI) é um fórum deliberativo e executivo que opera por consenso no combate ao crime organizado. Em todos os estados que aderirem ao programa serão criados GGIs. As decisões do comitê estadual são repassadas ao CONASP. O comitê também define as prioridades para investimentos federais.

O SUSP conta ainda com diversos instrumentos de planejamento, execução e sistemas de informação, com destaque para (a) o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), que articula políticas de segurança com ações sociais; (b) Subsistema de Inteligência, criado em 2000, com a finalidade de coordenar e integrar as atividades de inteligência de segurança pública, bem como suprir os governos federal e estaduais de informações que subsidiem a tomada de decisões; (c) Plano Nacional de Segurança Pública, de 2000, e que tem como objetivo aperfeiçoar o sistema de segurança pública brasileiro, por meio de propostas que integrem políticas de segurança, políticas sociais e ações comunitárias 9 9 Em 2003, outro Plano foi divulgado, baseado em diagnósticos elaborados por especialistas e coordenado pelo Instituto da Cidadania. ; (d) Programa Brasil Mais Seguro, voltado para o fortalecimento das fronteiras, o enfrentamento às drogas, o combate às organizações criminosas, a melhoria do sistema prisional, a segurança pública para grandes eventos, a criação do Sistema Nacional de Informação em Segurança Pública e a redução da criminalidade violenta; (e) Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (ENASP), instituída em 2010 com objetivo de planejar, implementar e coordenar ações e metas nas áreas de justiça e segurança pública que exijam a conjugação articulada dos órgãos envolvidos; (f) Escola Superior de Segurança Pública, para qualificar profissionais das diferentes instâncias policiais.

O segmento mais importante do SUSP – coleta e tratamento de informações – é composto pelo Sistema Nacional de Estatística de Segurança Pública e Justiça Criminal (SINESPJC), iniciado em 2004, com o objetivo de consolidar uma base nacional de dados sobre as ocorrências criminais e atividades de polícia. O banco de dados é alimentado pelos sistemas estaduais e por alguns órgãos federais. Para viabilizar a coleta em âmbito nacional e gerar comparabilidade entre os dados produzidos em cada estado, produziu-se uma metodologia de padronização das categorias e critérios de classificação de ocorrências, assim como suas unidades de medida, de forma a compatibilizar as categorias classificatórias utilizadas pelos estados.

A coleta e o processamento dos dados são de responsabilidade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Compõem também o sistema de informações (a) o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN) que congrega estatísticas do sistema penitenciário; (b) Base de Dados de Ocorrências Criminais, baseado no número de registros de homicídios da base de dados do SUSP e do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS); (c) Anuário Estatístico, publicado anualmente pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que contém dados relativos às estatísticas criminais; gastos com segurança pública e prisões; população carcerária; efetivos das forças policiais e sistema socioeducativo; (c) Mapa da Violência, em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e a Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), baseado nas Declarações de Óbito e no DATASUS; e (d) Diagnostico da Perícia Criminal no Brasil, para coletar informações e subsidiar decisões das ações decorrentes do Programa Brasil Mais Seguro.

O financiamento do SUSP provém principalmente do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP). O incentivo para a adesão dos estados é o compromisso com os resultados relacionados à redução do índice da criminalidade, aumento do índice de apuração de crimes, desenvolvimento de ações integradas das polícias civil e militar e aperfeiçoamento do contingente policial. As regras também determinam que somente terá acesso aos recursos os estados que tenham instituído plano de segurança pública e cumprido os prazos estabelecidos para o fornecimento de dados. Os projetos habilitados a receber recursos do FNSP não poderão ter prazo superior a dois anos e os recursos poderão ser aplicados diretamente pela União ou repassados mediante convênios.

Já o Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN) apoia as atividades de modernização e aprimoramento do Sistema Penitenciário. Os recursos são aplicados em construção, reforma, ampliação de estabelecimentos penais; formação, aperfeiçoamento e especialização do serviço penitenciário; aquisição de material permanente, equipamentos e veículos especializados necessários ao funcionamento dos estabelecimentos penais; formação educacional e cultural do preso; e programas de assistência jurídica aos presos carentes.

O MJ e os estados celebraram 4.282 convênios. O SUSP é o programa de maior vulto dentro do MJ, destacando-se tanto em número de convênios quanto em valores conveniados.

O Gráfico 2 mostra que o Sistema Nacional de Combate às Drogas possui uma participação marginal no SUSP, que conta com o SENASP e o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) como principais protagonistas federais na condução do Sistema. Ambos apresentaram, ao longo do período, momentos de crescimento nos valores conveniados, seguidos de momentos de redução. Durante o Governo FHC, verificou-se maior crescimento, principalmente em 2000 e 2001. Nos Governos Lula, esse crescimento ocorreu principalmente em 2008 e 2009.

Gráfico 2
: Valor Conveniado - SUSP (em R$ corrigidos pelo IGP-DI-Dez/2014) – 1996-2014

Segundo as regras do SUSP, os estados que quiserem aderir devem assinar Protocolos de Intenção. O primeiro requisito é a criação de um GGI. Todos os estados e o DF tinham grupos formalizados. Alguns estados constituíram, contudo, GGIs que não seguiram exatamente as determinações das regras federais, mas foram aceitos pela Senasp. Este é o caso de Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Paraná, todos governados por partidos de oposição. Não existem informações disponíveis sobre a situação dos estados em relação ao cumprimento dos demais requisitos, tais como elaboração de plano de segurança, nem o acompanhamento e/ou avaliação do cumprimento dos seus objetivos listados acima, tais como a redução dos índices de criminalidade.

Em linhas gerais, os estados economicamente mais desenvolvidos são os que mais absorveram recursos do SUSP, contestando a H1 e confirmando a H2. São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, com maior capacidade técnica e financeira do que os demais, foram os maiores beneficiários. O pequeno número de estados que recebeu mais recursos mostra também que o desenho da política (H3) não criou incentivos capazes de incorporar estados mais pobres e com menor condições de gerar capacidades (H1).

Os dados sobre os valores conveniados, liberados e as contrapartidas dos governos estaduais politicamente alinhados e não alinhados ao governo federal, que testam a H4, mostram que, durante os Governos FHC, ocorreu direcionamento dos recursos aos governadores alinhados. No Governo Lula 1, não se verificou tal direcionamento, que passa a ocorrer, contudo, no seu segundo mandato. No período Dilma, há um leve favorecimento na alocação dos recursos do SUSP aos governadores alinhados. Isso mostra que parece não existir um padrão de alinhamento partidário que condicione a liberação dos recursos, não confirmando, portanto, a H4.

No que diz respeito à liberação de recursos, os conveniados foram, em sua maioria, integralmente liberados, com exceções de 2007, 2008 e 2013, primeiros anos da crise política e financeira. O mesmo aconteceu com os recursos para o sistema penitenciário. Isso mostra que, ao aderirem ao SUSP, os estados têm relativa previsibilidade da alocação dos valores conveniados na ausência de crises. Os poucos cortes ocorreram majoritariamente em estados economicamente menos desenvolvidos (Acre, Rondônia e Amapá).

Todos os SNPNs requerem a contrapartida dos estados. A maioria dos convênios assinados contou com contrapartida inferior a 20%. Contudo, em diversos casos foram identificadas contrapartidas superiores. São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro apresentaram altas contrapartidas em diversos anos, confirmando a H2. O governo Dilma, por sua vez, apresentou baixos percentuais de contrapartidas, com algumas exceções. São Paulo, que absorveu grandes volumes de recursos até 2007, ofereceu igualmente altas contrapartidas no mesmo período. Com relação ao Sistema Penitenciário, o volume de contrapartidas é consideravelmente superior. Em diversos casos, a contrapartida supera o valor conveniado. Tais fatos, associados ao perfil dos valores alocados e às diferentes capacidades de investimento dos estados, sugerem que a alocação de recursos é baseada em critérios técnicos (capacidade financeira), fortalecendo, novamente, a H2.

Em relação ao sistema penitenciário, desde sua criação, o FPN celebrou cerca de 1.100 convênios, cujos objetos vão desde a reintegração social do apenado até a construção de estabelecimentos penais. Entretanto, a maior parte dos recursos foi destinada à geração de vagas e à modernização dos estabelecimentos existentes. A manutenção do sistema penitenciário possui custo elevado, o que dificulta investimentos estaduais no sistema. No período, foram criadas 78.184 novas vagas, São Paulo à frente (27.223). Em linhas gerais, os estados economicamente mais desenvolvidos e com maior capacidade são os que mais absorveram recursos, confirmando a H2.

A análise dos recursos efetivamente liberados e das contrapartidas oferecidas também reforça a H2. Os estados que receberam mais recursos em um ano sofrem reduções nos anos posteriores, o que faz sentido no caso de construções e reformas dos presídios. Adicionalmente, em diversos casos, a cooperação com o Sistema Penitenciário Nacional ganha importância relativa quando se analisa a capacidade de investimento dos estados. Em diversos estados o valor conveniado alcançou mais de 5% das despesas estaduais com investimento, chegando, em alguns casos, a mais de 10%, reforçando a H2.

Assim como ocorreu com os convênios assinados pelo SUSP, os dados mostram a inexistência de direcionamento dos recursos aos governadores alinhados, não confirmando a H4. Como dito acima, a montagem do sistema de informações foi o principal objetivo do SUSP. No entanto, e como afirmam seus vários usuários e/ou participantes, os resultados permaneceram aquém do esperado não só em relação à diminuição da violência, como à coleta e sistematização das informações. 10 10 Dado que a responsabilidade constitucional da segurança pública é do estado, o SUSP teria o papel de apoiá-lo por meio da organização e coordenação de um sistema de informações, o que, apenas indiretamente, poderia contribuir para a diminuição da violência. Nenhum dos documentos oficiais ou dos parceiros do sistema deixou de constatar as dificuldades relacionadas ao fornecimento de informações que alimentariam o sistema e subsidiariam a tomada de decisão.

Os responsáveis pela edição de 2014 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, por exemplo, afirmaram que, ao final, muitas informações foram obtidas apenas após tentativas junto aos gestores das diferentes fontes dos dados. Vários órgãos federais também não coletaram dados primários, como a Secretaria de Direitos Humanos. No plano estadual, o quadro não foi diferente. Várias unidades da federação tiveram dificuldades em fornecer dados sobre, por exemplo, suicídios, letalidade e vitimização policial. Algumas delas, inclusive, classificaram tais informações como estratégicas e se negaram a fornecê-las nos termos da Lei de Acesso à Informação. Os autores do Anuário concluem que “preocupa a deterioração da capacidade das instituições públicas, federais ou estaduais, em manter dados sobre a área da segurança atualizados e transparentes”. 11 11 Ver https://forumseguranca.org.br/publicacoes/ . O Relatório do Mapa da Violência afirma, por sua vez, que uma das questões preocupantes é o subregistro das mortes consideradas violentas devido à ocorrência de sepultamentos sem a devida certificação. Não só a quantidade, mas também a qualidade dos dados é problemática: mortes sem assistência médica que impedem o apontamento correto de suas causas, deficiências no preenchimento adequado da certidão etc. 12 12 Ver https://flacso.org.br/project/mapa-da-violencia/ .

Figueiredo (2017)FIGUEIREDO, Isabel. A gestão de informações e o papel da Senasp. In: IPEA (org.) Atlas da Violência, v. 2.7. Brasília: Ipea, 2017, p. 47-51. sintetizou os principais problemas apontados pela própria SENASP: inconsistência da série temporal devido a irregularidade no envio das informações pelos estados; falta de padronização no envio de informações; mudanças constantes da informação registrada na base de dados decorrentes de retificações; alguns itens solicitados não são enviados pela maioria dos estados, como, por exemplo, população carcerária e caracterização das vítimas. Os alertas dos participantes do Sistema, inclusive da própria Senasp, não foram suficientes para a correção das rotas da política de segurança pública. Apesar dessas limitações, existe ampla concordância nos relatórios em indicar, por um lado, a enorme importância desse sistema e, por outro, a necessidade de seu aprimoramento.

A despeito de inúmeros instrumentos com que conta o SUSP, inclusive a assinatura dos estados de protocolos em que concordam em atualizar os dados nos padrões estabelecidos pelo SUSP, o sistema é avaliado pela própria SINESP como ineficaz. Dificuldades na coleta de dados que só podem ser fornecidos pelos estados bem como na sua sistematização devido a classificações diferentes foram registradas em todos os documentos pesquisados. Essas dificuldades mostram que, na prática, a adesão dos estados e/ou dos seus órgãos de segurança ao SUSP não se concretizou, apesar da liberação de recursos. Por quê? Apenas algumas hipóteses podem ser sugeridas: (a) as sanções não são suficientes ou são descumpridas, mas não impedem os estados de receberem recursos federais, remetendo à H3; (b) os sistemas estaduais não aderiram à estratégia de operarem tanto nacionalmente como localmente, remetendo também à H3; (c) os governadores não veem incentivos para a produção de informações que alimentem a formulação de políticas nacionais, mas sim o recebimento de recursos para as questões de segurança mais emergenciais em seus estados (H3) e (d) a multiplicidade de atores envolvidos e disputas sobre a classificação das informações, a despeito da normatização federal, tornam o sistema de difícil operacionalização, indicando fragilidades no seu desenho (H3).

A síntese que se pode fazer em relação à ambiciosa, mas racional, criação de um sistema de informações que congregue dados estaduais é a seguinte: trata-se de um sistema que reúne milhares de informações criminais desencontradas, várias instâncias deliberativas e órgãos executores, mas, no período aqui analisado, não conseguiu alcançar seus objetivos. Em síntese, se os dados quantitativos acima apontam para a confirmação mais robusta da H2, a percepção dos que se debruçaram sobre o Sistema aponta no sentido da H3, ou seja, o desenho da política importa para a adesão/cooperação dos estados e regras não são suficientes para o cumprimento dos objetivos da política. Aponta também que os diagnósticos sobre os problemas do SUSP, único sistema que passou por algum tipo de análise dos seus participantes, careceu de um método mais específico para a solução de seus problemas de implementação, dado que não apontou alternativas, não ocorreu de forma sistemática nem foi institucionalizado.

SISTEMA NACIONAL DE CULTURA (SNC) 13

O SNC é um modelo de gestão e promoção conjunta de políticas culturais, que envolve os entes da federação e a sociedade civil e que tem como órgão gestor e coordenador o Ministério da Cultura (MINC) em âmbito nacional e as secretarias estaduais/distrital e municipais de cultura ou equivalentes em seu âmbito de atuação.

Diferentemente dos demais SNPNs, o da cultura foi objeto de duas emendas constitucionais, uma no Governo Lula e outra no Governo Dilma, mas sem vinculação de recursos. Também diferentemente de outros sistemas, o SNC incorpora a participação de agentes culturais não governamentais, mas tem características semelhantes aos demais no que se refere aos incentivos à cooperação entre os entes federados, sob a coordenação da União. O sistema é mais voltado para os municípios do que para os estados.

Segundo informações on-line, “a inspiração para o SNC veio dos resultados alcançados por outros sistemas de articulação de políticas instituídos no Brasil, particularmente o SUS. A experiência do SUS mostrou que o estabelecimento de princípios e diretrizes comuns, a divisão de atribuições e responsabilidades entre os entes da federação, a montagem de um esquema de repasse de recursos e a criação de instâncias de controle social asseguram maior efetividade e continuidade das políticas públicas”. 14 14 Ver http://portalsnc.cultura.gov.br/ . No entanto, e diferentemente do SUS, o SNC não conta com recursos constitucionalmente vinculados.

A participação das esferas subnacionais far-se-á por meio de termo de adesão, e aquelas que aderirem ao Plano Nacional de Cultura (PNC) deverão elaborar planos decenais até um ano após a assinatura do termo. Os recursos federais transferidos às esferas subnacionais deverão ser aplicados prioritariamente por meio de Fundo de Cultura, que será acompanhado e fiscalizado pelo Conselho de Cultura. O monitoramento e avaliação do PNC conta com a participação do Conselho Nacional de Política Cultural, tendo o apoio de especialistas, técnicos e agentes culturais, institutos de pesquisa, universidades, instituições culturais e organizações e redes socioculturais.

Os Conselhos de Política Cultural são instâncias colegiadas permanentes, de caráter consultivo e deliberativo, tendo na sua composição, no mínimo, 50% de representantes da sociedade civil, que são eleitos. Sua principal finalidade é atuar na formulação de estratégias e no controle da execução das políticas culturais.

O sistema conta com as seguintes instâncias de deliberação, planejamento, execução, financiamento e de informações: (a) conferências nacionais e setoriais; (b) Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais (SNIIC), com a obrigatoriedade da inserção e atualização de dados pelos participantes; (c) Programa Mais Cultura, para levar cultura a grupos em situações de vulnerabilidade ou excluídos dos circuitos relacionados aos mercados e às cidades mais dinâmicas; (d) Fundo Nacional de Cultura (FNC), criado no Governo Collor, substituindo o do Governo Sarney, que financia até 80% do custo total dos projetos. A partilha é decidida em comissões intergestores tripartite ; (e) Programa Nacional de Formação na Área da Cultura (PNC) para a formação de pessoal em política e gestão culturais.

No período, foram assinados 767 convênios com os estados. O SNC representa cerca de 42% dos convênios firmados, absorvendo, no entanto, cerca de 28% dos recursos conveniados. Segundo Silva e Abreu (2011), as transferências para os estados cresceram cerca de quase quatro vezes entre 2005 e 2009, mas para os municípios foram mais vultosas vis-à-vis os estados.

Como se vê acima, o SNC ganha fôlego e recursos a partir de 2008, atingindo seu pico em 2010, com diversos estados sendo contemplados com convênios. O gráfico também mostra que na maior parte da série os recursos mais volumosos transferidos pelo MINC para os estados proveem de fora do SNC.

Os valores conveniados concentraram-se no Governo Lula 2. São Paulo foi o principal estado no que se refere à assinatura de convênios, confirmando, mais uma vez, a H2. No entanto, os estados do Nordeste tiveram importância relativa, ou seja, uma parte do SNC também apoia a H1.

Sobre a H4, durante os Governos FHC 1 e 2 houve maior direcionamento dos recursos aos governadores alinhados. No Governo Lula 1, por sua vez, não se verifica tal direcionamento, que passa a ocorrer, no entanto, em seu segundo mandato. No período Dilma, também ocorreu favorecimento na alocação dos recursos aos governadores alinhados, com exceção de 2013. Assim como ocorreu com o SUSP, a H4 não é plenamente confirmada.

A análise da liberação dos recursos e da contrapartida dos estados indica a ocorrência de constantes cortes na liberação de recursos e a exigência de altas contrapartidas, o que pode explicar a baixa adesão dos estados. As altas contrapartidas reforçam as H2 e H3, dado que São Paulo e Rio de Janeiro foram os que mais aderiam ao SNC. Por fim, o peso dos valores conveniados em relação às despesas dos estados com investimento é pequeno, particularmente nos estados cujos convênios foram mais volumosos como São Paulo e Rio.

A síntese do SNC é que os estados pouco aderiram ao SNC, apontando para a confirmação da H3. Ao contrário do SUSP, onde todos os estados participaram e conveniaram, mesmo que por razões distintas, o SNC não atraiu a adesão dos estados, não se consolidando como sistema. Além disso, mesmo em anos em que vários estados assinaram convênios, como em 2010, os recursos efetivamente liberados foram baixos. Existem anos, como em 2011 e 2013, em que quase nenhum convênio foi assinado. Em 2012 aumenta o número de convênios, porém com muitos cortes. Por fim, os valores das contrapartidas também fogem do padrão: há contrapartidas da ordem de 30%, 50%, 60% e até 100%, o que indica que apenas estados com maior arrecadação tributária podem ter interesse em aderir ao SNC, remetendo à H2.

A baixa adesão dos estados ao SNC, assim como a liberação oscilante dos recursos e as altas contrapartidas, faz com que apenas os estados com maior arrecadação tributária tenham incentivos para aderir ao SNC, oposto do que propugna a H1 e aos objetivos do Programa Mais Cultura.

SISTEMA NACIONAL DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL (SNHIS) 15

O SNHIS foi instituído em 2005. Sua criação partiu de uma iniciativa popular, sob a liderança do movimento da moradia. Seu objetivo é implementar políticas e programas que promovam o acesso à moradia para a população de baixa renda, que compõe a quase totalidade do déficit habitacional do país. Além disso, esse Sistema centraliza todos os programas e projetos destinados à habitação de interesse social, sendo integrado pelo Ministério das Cidades, Conselho Gestor do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS), Caixa Econômica Federal (CEF), Conselho das Cidades, conselhos, órgãos e instituições da Administração Pública direta e indireta dos estados, DF e dos municípios relacionados às questões urbanas e habitacionais, entidades privadas que desempenham atividades na área habitacional e agentes financeiros autorizados pelo Conselho Monetário Nacional.

A lei que criou o SNHIS incorporou dois subsistemas – o de habitação de mercado e o de interesse social, diferentemente da proposta inicial. O primeiro visa dar segurança jurídica ao financiamento de mercado e o segundo é dependente de um complexo processo institucional para articular estados e municípios ao sistema.

Diferentemente da maioria dos SNPNs, o da habitação tem uma longa trajetória, que data da criação do Banco Nacional de Habitação (BNH), em 1964, e que constituiu o Sistema Brasileiro de Habitação (SFH). O SFH contou com vultosos recursos gerados pela criação, em 1967, do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), alimentado pela poupança compulsória de todos os assalariados, que veio se somar aos recursos da poupança voluntária. Ambos formaram o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). O SFH era estruturado em torno do BNH e dos seus fundos de financiamento, que centralizava decisões e recursos, tendo como agente promotor público nas esferas estaduais as chamadas Companhias de Habitação (COHABS) e, em poucos casos, agências municipais.

O papel dos estados e municípios no modelo do BNH era o de organizar a demanda, através de cadastros encaminhados à CEF para a seleção dos beneficiários e, ainda, o de criar condições para facilitar a produção, através da desoneração tributária e da flexibilização da legislação urbanística dos municípios. Em alguns casos, estados e municípios poderiam ainda viabilizar o atendimento à demanda de baixa renda através da cessão de terrenos públicos.

Como informa Bonduki (2008)BONDUKI, Nabil. Política habitacional e inclusão social no Brasil: revisão histórica e novas perspectivas no governo Lula. Arq.urb, São Paulo, n. 1, p. 70-104, 2008., os resultados, do ponto de vista quantitativo, foram expressivos: nos 22 anos de funcionamento, o BNH financiou a construção de 4,3 milhões de unidades novas, sendo 2,4 milhões com recursos do FGTS, para o setor popular, e 1,9 milhão com recursos do SBPE, para o mercado de habitação para a classe média. Além disso, foi também significativo o papel do SFH no saneamento, com destaque para o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), decisivo na expansão das redes de água que ocorreu nas principais cidades brasileiras. Em 2000, mais de 90% da população urbana estava abastecida por rede de água.

A partir de 1983 tem início o declínio dos financiamentos tanto com recursos do FGTS como do SBPE. Entre a extinção do BNH, em 1986, e a criação do Ministério das Cidades, em 2003, o setor do governo federal responsável pela gestão da política habitacional esteve subordinado a sete órgãos diferentes, caracterizando descontinuidade e ausência de estratégia para enfrentar o problema habitacional.

Com a extinção do BNH, a Caixa Econômica Federal tornou-se o agente financeiro do SFH, absorvendo algumas de suas atribuições, pessoal e acervo. A regulamentação do crédito habitacional passou para o Conselho Monetário Nacional, tornando-se, assim, um instrumento de política monetária, o que levou a um controle mais rígido do crédito. Entre 1991 e 1995, anos de instabilidade macroeconômica e de alta inflação, ocorreu a paralisação total dos financiamentos com recursos do FGTS.

Em 1996, a Secretaria de Política Urbana, que passou a ser a gestora do setor habitacional, divulgou o documento da Política Nacional de Habitação, realizado no contexto da preparação para a 2ª Conferência das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (Habitat II), com a inclusão de novos programas que deixavam de privilegiar unicamente o financiamento à produção. Dentre os programas criados no Governo FHC e que continuaram a existir no Governo Lula 1, incluiu-se o financiamento voltado ao beneficiário final (Carta de Crédito, individual e associativa), que passou a absorver a maior parte dos recursos do FGTS. Além deste, o Governo FHC criou um programa focado na urbanização de áreas precárias, o Pró-Moradia, paralisado, contudo, em 1998. Em 1999, foi criado o Programa de Arrendamento Residencial (PAR), voltado à produção de unidades novas para arrendamento que utilizava um mix de recursos formados pelo FGTS e pelo Tesouro.

Quando da candidatura do presidente Lula em 2002, o Instituto Cidadania, vinculado ao PT, elaborou o Projeto Moradia, tornando-se a base do seu programa eleitoral para a área da habitação e desenvolvimento urbano. O desenho institucional proposto reforçava o papel estratégico das administrações locais, mas propunha a sua articulação institucional e financeira com outros níveis de governo.

Um dos pilares do Projeto Moradia era a criação do Fundo Nacional de Moradia (FNM), antiga reivindicação do movimento da habitação. A área econômica do governo, contudo, colocou restrições ao Projeto de Lei, que tramitou por 13 anos no Congresso. Após ampla reformulação, que restringiu a abrangência do FNM, um substitutivo foi aprovado, criando o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social. Também como parte do seu compromisso eleitoral, o presidente Lula criou, em 2003, o Ministério das Cidades.

O Ministério das Cidades é o órgão coordenador, gestor e formulador da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, envolvendo, de forma integrada, as políticas ligadas à cidade, resgatando a coordenação política e técnica das questões urbanas. Coube-lhe, ainda, a incumbência de articular e qualificar os diferentes entes federados na montagem de uma estratégia nacional para equacionar os problemas urbanos das cidades brasileiras.

A Secretaria Nacional de Habitação (SNH) é responsável por acompanhar e avaliar, além de formular e propor, os instrumentos para a implementação da Política Nacional de Habitação, em articulação com as demais políticas públicas e instituições voltadas ao desenvolvimento urbano, com o objetivo de promover a universalização do acesso à moradia. Nesse sentido, a SNH desenvolve e coordena ações que incluem desde o apoio técnico aos entes federados e aos setores produtivos até a promoção de mecanismos de participação e controle social nos programas habitacionais.

O SNHIS é financiado pelo Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS), que centraliza e gerencia os recursos para os programas destinados a implementar políticas habitacionais direcionadas à população de menor renda. Os recursos têm aplicação definida pela lei que criou o FNHIS, como, por exemplo, aquisição, construção, conclusão, melhoria, reforma, locação social e arrendamento de unidades habitacionais, produção de lotes urbanizados para fins habitacionais, regularização fundiária e urbanística de áreas de interesse social e implantação de saneamento básico, infraestrutura e equipamentos urbanos complementares aos programas de habitação de interesse social. O FNHIS é gerido por um Conselho Gestor, de caráter deliberativo e composto de forma paritária por órgãos e entidades do Poder Executivo e de representantes da sociedade. A Presidência do Conselho do FNHIS é exercida pelo Ministério das Cidades.

Os recursos do FNHIS são aplicados pelos entes subnacionais. Assim como os demais SNPNs, as transferências federais são condicionadas a (a) constituição de fundos próprios estaduais e municipais; (b) criação de conselhos, com a participação de entidades públicas e privadas, sendo que ¼ de representantes dos movimentos populares; (c) assinatura de termos de adesão; e (e) contrapartidas financeiras.

O Plano Nacional de Habitação (PLANHAB) é uma das ferramentas do SNHIS, que traça estratégias de curto e longo prazo e uma das suas principais ações é o Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), criado em 2009 pelo governo federal como parte do PAC. O PLANHAB foi elaborado a partir de consulta à sociedade e aos estados e municípios por meio da Conferência Nacional das Cidades. O processo de consulta ocorreu durante mais de dois anos, mobilizando vários atores na sociedade e no governo. O Plano apresenta uma estratégia em quatro eixos estruturadores da política habitacional: modelo de financiamento e subsídio; política urbana e fundiária; arranjos institucionais e cadeia produtiva da construção civil.

O SNH está subdividido em dois sistemas: o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS) e o Sistema Nacional de Habitação de Mercado. O que os diferencia são as fontes de recursos e as formas e condições de financiamento. Os subsídios se direcionam para o SNHIS e, dentro deste, para as faixas de demanda que mais necessitam moradia. O segundo é voltado para a produção de unidades prontas (Loureiro et al., 2015LOUREIRO, Maria Rita et al. Legitimidade e efetividade em arranjos institucionais de políticas públicas: o Programa Minha Casa Minha Vida. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, n. 49, 2015, p. 1531-1554.). Seus principais objetivos foram responder à crise internacional de 2008 através da dinamização da indústria da construção civil e da geração de empregos. Estabelecendo um patamar de subsídio direto, proporcional à renda das famílias, o PMCMV busca impactar a economia através dos efeitos multiplicadores gerados pela indústria da construção.

Além dos subsídios, busca também aumentar o volume de crédito para aquisição e produção de moradias, ao mesmo tempo em que reduz os juros, com a criação do Fundo Garantidor da Habitação, que aporta recursos para pagamento das prestações em caso de inadimplência por desemprego e outras eventualidades. A elaboração do PMCMV distanciou-se da proposta inicial do SNHIS, que permitia o repasse de recursos a fundo perdido para estados e municípios, sendo estes os principais executores das políticas. Com o PMCMV, contudo, e diferentemente do SNHIS e dos recursos do FNHIS, o modelo passou a ter o objetivo de dar mais respostas aos problemas macroeconômicos do que aos habitacionais. Além do mais, o modelo do PMCMV não conta com mecanismos de participação social ou com a adoção de critérios de redistribuição, sendo a alocação de seus recursos prerrogativa exclusiva da Casa Civil e não do Ministério das Cidades.

O desenho adotado para o PMCMV, ancorado na participação do setor privado, entrou em choque com os princípios do SNHIS e tornou os estados em articuladores e não executores do Programa. Contrariando também as propostas iniciais, pautadas no papel estratégico do setor público, o PMCMV ignorou, em larga medida, as premissas e os debates acumulados em torno do Plano Nacional de Habitação de Interesse Social (Cardoso et al., 2011CARDOSO, Adauto L. et al. Habitação de interesse social: política ou mercado? Reflexos sobre a construção do espaço metropolitano. Anais ENANPUR, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, 2011.), que vinham sendo discutidos desde 2007.

Também diferentemente da proposta inicial, os principais formuladores do PMCMV não foram os movimentos sociais voltados para a habitação, nem a burocracia do SNHIS, mas sim os empresários. Estes já haviam criado expectativas de investimento na área, com a aquisição de estoques de terreno, abertura de capitais etc. No entanto, foram incorporadas algumas demandas populares. Mesmo que o SNHIS tenha sido subsumido pelo PMCMV, as negociações permitiram que demandas como a introdução da faixa de renda de zero a três SMs (que representa mais de 80% do déficit habitacional do país) fossem, em parte, contempladas (Loureiro et al., 2014). 16 16 Existem relatos de que o PMCMV foi inspirado na experiência chilena e apoiado pelo empresariado da construção civil.

Se o Executivo federal foi o ator central na formulação do PMCMV e o setor privado na sua execução, o Congresso também participou, incluindo os pequenos municípios. O desenho inicial da política formulada pelo Executivo contemplava apenas os municípios de grande e médio porte, onde se concentra o maior déficit habitacional do país. No entanto, durante a tramitação da Medida Provisória que criou o programa, houve pressão dos parlamentares para que se reservasse parte dos recursos para os municípios menores. Com essa decisão, foi garantida uma reserva de até R$ 1 bilhão como subvenção econômica para a extensão do PMCMV a municípios com população de até 50 mil habitantes, o que corresponde a 5.037 municípios ou a 90,5% dos municípios brasileiros.

Foram firmados 2.721 convênios entre o Ministério das Cidades e os estados. O SNHIS representa 22,23% dos convênios assinados, mas absorve apenas 4,78% dos recursos conveniados e 3,13% dos recursos liberados ao longo da série histórica analisada. Adicionalmente, o volume de recursos oferecido pelos estados como contrapartida praticamente igualou o volume de recursos liberados pelo SNHIS. O valor das contrapartidas correspondeu a cerca de 85% dos valores efetivamente liberados.

O SNHIS atingiu um pico no volume de recursos conveniados em 2008, com diversos estados sendo contemplados com convênios, mas absorveu apenas 13% dos recursos liberados pelo Ministério das Cidades ao longo da série histórica. Durante todo o período em que o SNHIS conveniou com estados, ocorreram cortes nos recursos como, por exemplo, em 2008, quando o governo federal liberou apenas 55% dos valores conveniados.

A maior liberação de recursos para os estados ocorreu em 2007-2008, com forte declínio a partir de 2009, com a criação do PMCMV. Em 2006, quatro estados firmaram convênios com o SNHIS. O que obteve maior volume de recursos foi o Amazonas. Em 2007, o Ministério das Cidades assinou convênios com outros quatro estados, Piauí em 1º lugar. Em 2008, um número significativo de estados firmou convenio, com destaque para Rio de Janeiro e Pernambuco, que também aparece com destaque em 2009. Em 2010 destacam-se o Acre e, novamente, o Rio de Janeiro e, em 2011, Pernambuco reaparece com destaque. Nesse caso, apesar da maioria dos estados com maior volume de recursos sejam mais pobres, os dados não são suficientes para testar as H1 e 2 da pesquisa.

A análise dos valores efetivamente liberados indica que, ao longo do período, alguns estados não receberam os recursos conveniados, como a Bahia em 2011, enquanto outros sofreram cortes: Amazonas em 2006; Piauí em 2007; Amapá, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo em 2008; Pernambuco, Rio de Janeiro e Roraima em 2009; Acre, Alagoas, Bahia, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo em 2010. Isso pode significar que, ao menos nesse SNPN, o governo federal não cumpriu seus compromissos, apontando para a possível confirmação da H3, mas dessa vez do lado do governo federal.

Os dados sobre a contrapartida dos estados indicam que diversos convênios firmados demandaram alta contrapartida, o que poderia explicar, em parte, a baixa adesão dos estados. Em 2008, quando o SNHIS ampliou sua abrangência, alcançando diversos estados, verificaram-se contrapartidas da ordem de 177%, em Minas Gerais, 123,8%, em São Paulo e 97,6%, no Amazonas.

Em relação ao valor conveniado, liberado e o valor total das contrapartidas dos governos politicamente alinhados e não alinhados ao Governo Federal, os dados mostram que o Governo Federal priorizou os estados governados pelos partidos que compõem sua base de sustentação, ao contrário do que se verificou nos demais SNPNs, confirmando a H4.

A análise do SNHIS mostra um Sistema que nasceu de compromissos eleitorais com movimentos sociais, mas que foi subsumido por outro quando as circunstâncias mudaram. Isso traz lições para uma das questões que dizem respeito à formulação de políticas públicas: se a adoção de uma política é resultado de uma janela de oportunidade que se abre na agenda governamental, não existem garantias de que a política sobreviverá. A despeito do desvio de rota da política de habitação de interesse social, os instrumentos normativos, as regras e a estrutura organizacional continuaram mantidos na estrutura dos governos federal e estadual, talvez à espera de nova janela de oportunidade. Esse sistema é o único em que a H4 é confirmada.

SISTEMA NACIONAL DE TURISMO (STN)

O STN foi instituído durante o Governo Lula e é formado por entidades e órgãos públicos ligados ao setor turístico, integrando as iniciativas oficiais com as do setor privado. Diferentemente dos demais SNPNs, o SNT não incorpora a participação das esferas subnacionais para o cumprimento dos seus objetivos. Isso não significa, todavia, que esses não tenham sido contemplados com os recursos do Novo Fundo Geral de Turismo (FUNGETUR). Da mesma forma, e também diferentemente dos demais SNPNs, não são exigidos das esferas subnacionais instrumentos (planos, fundos, contrapartidas, termo de adesão etc.) para o acesso aos recursos.

O FUNGETUR foi criado em 1971, no regime militar, alterado em 1975 e ratificado em 1991, já no regime democrático. O Fundo tem por objeto o financiamento, o apoio ou a participação financeira em planos, projetos, ações e empreendimentos reconhecidos pelo Ministério do Turismo como de interesse turístico, os quais deverão estar abrangidos nos objetivos da Política Nacional de Turismo (PNT). O Ministério poderá delegar competência para o exercício de atividades e atribuições específicas ao turismo a órgãos e entidades da administração pública, inclusive das demais esferas federadas, em especial das funções relativas ao cadastramento, classificação e fiscalização dos prestadores de serviços turísticos, assim como a aplicação de penalidades e arrecadação de receitas.

O Ministério, criado em 2003, ganha relevância no que se refere a convênios firmados com os estados a partir de 2006, atingindo altos patamares em 2009, 2010 e 2013. No período, foram assinados 1.519 convênios com os estados. No caso do SNT não foi possível isolar os órgãos e secretarias que fazem parte do Sistema, tendo sido incluídos todos os convênios firmados com os estados pelo Ministério.

O estado mais beneficiado foi a Bahia, que recebeu cerca de R$ 285 milhões. Fora do Nordeste, destaca-se o Mato Grosso do Sul, que recebeu cerca de R$ 190 milhões entre 2003 e 2014. Diante desses dados, o SNT parece ser o único em que a hipótese de concentração dos recursos dos SNPNs nos estados com menor arrecadação de recursos próprios se sustenta (H1). A análise dos valores efetivamente liberados, contudo, indica que, ao longo do período, sobretudo a partir de 2007, diversos convênios sofreram cortes, assim como a maioria dos SNPNs. As contrapartidas representaram quase 50% do valor global liberado. A análise da contrapartida indica que diversos convênios firmados demandaram alta contrapartida e a análise da relação entre recursos conveniados e despesas com investimentos sugere que para alguns estados, como Sergipe, Alagoas e Piauí, o volume de recursos conveniado representa importante parcela dos investimentos desses estados no setor turismo.

Os valores liberados como percentual da despesa estadual correspondem a um baixo percentual das despesas de investimento realizadas pelas unidades da federação, com a grande maioria dos estados conveniando valores inferiores a 2% de suas despesas com investimentos. Em alguns anos, no entanto, alguns estados receberam recursos relativamente volumosos, quando comparado com sua capacidade de investir, como o Piauí em 2004, 2006 e 2007, Alagoas em 2002, 2005 e 2009, Ceará em 2007 e 2008, Pernambuco em 2007 e Sergipe em 2009 e 2010. Em relação à H4, os dados não mostram prioridade aos governadores alinhados, não confirmando a hipótese.

A síntese do sistema de turismo é a de que, entre os SNPNs analisados, é o único de conteúdo mais macroeconômico, ao direcionar maiores recursos para regiões onde a atividade turística busca ser uma forma de fortalecer a arrecadação dos estados, confirmando a H1.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho mostrou que os sistemas nacionais de políticas normatizados são mais voltados para os municípios do que para os estados devido ao volume de recursos que a estes são disponibilizados e que, paradoxalmente, alguns ministérios que integram os sistemas transferem mais recursos para os estados fora dos sistemas nacionais, com exceção da segurança pública. Isso aponta para a baixa institucionalização dos Sistemas. Mostrou também que os sistemas não foram objeto de avaliação/monitoramento sistemático, a despeito de sua relativa longevidade e dificuldades na implementação.

Do ponto de vista do volume de recursos por período de governo, as transferências de todos os ministérios, no agregado, foram maiores nos mandatos do Presidente FHC do que nos demais presidentes. No entanto, a maioria dos sistemas normatizados foi criada nos governos do PT. A partir de 2008 e particularmente no governo Dilma, as transferências declinaram vis-à-vis os períodos anteriores quando se considera todos os sistemas analisados, mostrando a permeabilidade de sistemas baseados em transferências voluntárias a crises endógenas.

O trabalho testou quatro hipóteses. A primeira – estados com maior participação da arrecadação de recursos próprios na sua receita total tendem a não aderir às regras dos sistemas nacionais – só foi comprovada no caso do Ministério do Turismo, mas não no Sistema Nacional de Turismo por não ter sido possível isolar os convênios específicos do Sistema. Os dados mostram que o Sistema dirigiu mais recursos para os estados do Nordeste, mais frágeis financeiramente, mas que têm no turismo uma das suas principais atividades para geração de receita, contribuindo, assim, para a relativa diminuição das desigualdades regionais, marca de federação brasileira.

A segunda hipótese – rival da hipótese 1 – propõe que a liberação de recursos federais dos sistemas nacionais para os estados é condicionada por critérios técnicos e financeiros, aí incluídos capacidade de contrapartida, de elaboração de projetos e de gestão, foi comprovada de forma robusta no Sistema de Segurança, mas também de forma menos robusta nos demais sistemas. Foi constatado que um importante fator que incentiva a adesão/cooperação dos estados é a capacidade de contrapartida, frequentemente alta em alguns sistemas analisados, o que faz com que os estados com maior capacidade de recursos próprios e, portanto, mais capacidades, tenham mais chances de terem seus projetos aprovados. Em momentos de contração de recursos, estados que continuaram conveniando com o governo federal frequentemente ofereceram altas contrapartidas. Em outros casos, como no sistema penitenciário, estados que se destacaram nos valores conveniados em geral arcaram com maiores contrapartidas. O sistema da cultura também confirma a H2.

A hipótese três, baseada nas teorias institucionalistas e de políticas públicas, sobre o desenho do sistema como incentivador ou não da adesão/cooperação dos estados e da importância das regras, está presente na maioria dos Sistemas. Altas contrapartidas, não acatamento das regras, exigências que requerem capacidade técnica, como elaboração de planos e pessoal nas equipes estaduais que alimentem, por exemplo, os dados da segurança pública, e imprevisibilidade na liberação de recursos em alguns sistemas são indicações de que requerem mudanças no seu desenho para que suas finalidades sejam cumpridas. No caso da segurança pública, único objeto de análise independente, a despeito de ser o mais regulado e com maior previsibilidade da liberação de recursos, seus resultados, no que se refere ao seu objetivo de montar e coordenar um sistema de informações, foram aquém dos esperados na percepção de seus analistas, também apontando que regras nem sempre são suficientes para a implementação da política.

Ainda na dimensão relativa ao desenho da política e dado o papel crucial da coordenação nas federações cooperativas, os dados apontam para a baixa capacidade de coordenação do governo federal. O desenho não foi, portanto, capaz de contornar os condicionantes de toda ordem que influenciam a implementação de políticas.

A quarta hipótese – o governo federal tende a priorizar a alocação de recursos dos sistemas nacionais aos estados governados pelos partidos que compõem sua base de sustentação – foi confirmada apenas no Sistema de Habitação. Mesmo ocorrendo nos demais sistemas e durante alguns governos, não foi identificada preferência político-partidária na maioria dos sistemas nem no período analisado. Nesse sentido, o desenho dos sistemas contribuiu para contornar as preferências político-partidárias anteriormente existentes. Regras mais claras, participação social via conselhos ou conferências, previsibilidade de recebimento de recursos em alguns sistemas tornaram mais racional a redistribuição de recursos para as esferas subnacionais baseado em critérios técnicos, principalmente capacidade (técnica e financeira) dos estados.

Do ponto de vista comparado, o Sistema que se mostrou efetivamente institucionalizado foi o da segurança, no qual todos os estados receberam recursos e no qual a maior parte dos valores conveniados foi liberada, o que o torna previsível do ponto de vista dos recursos. No entanto, um dos principais objetivos do sistema, a construção de um banco de dados nacional, não foi alcançado. O Sistema de Habitação, que funcionou no seu início, não chegou a se consolidar, assim como o da cultura. No caso da habitação, o Sistema, apesar de ter alocado recursos aos estados logo após sua criação, teve quedas bruscas na transferência de recursos a partir da criação do Programa Minha Casa Minha Vida, que se tornou seu concorrente.

Os dados e as análises acima contribuem para a literatura sobre o funcionamento do federalismo brasileiro após a criação dos sistemas nacionais de políticas públicas normatizados e para o melhor entendimento dos mecanismos que caracterizam uma federação cooperativa. Como explicado acima, esses sistemas são regulados e parcialmente financiados pelo governo federal, mas implementados pelos estados. Uma das suas características principais é a adesão voluntária das esferas subnacionais. Ao analisar como o federalismo brasileiro funciona na prática e não do ponto de vista normativo, o trabalho mostra as estratégias construídas pelo Executivo federal para minimizar a concentração de recursos na esfera federal de governo e para pôr em prática o federalismo cooperativo introduzido em 1988. Essa estratégia é regida mais por critérios técnicos do que redistributivos e/ou partidários e é objeto de regras e procedimentos que, em princípio, devem ser seguidos pelos estados. Mostra também que em algumas políticas, tais como segurança pública e construção de presídios, embora não listadas como competências concorrentes, a aderência dos estados aos sistemas é maior do que nos demais.

Ao escolherem retomar o caminho de uma federação centralizada do ponto de vista da distribuição dos recursos tributários, que caracterizou a maior parte dos regimes políticos do país desde a República, o Congresso e o Executivo federal aprovaram várias legislações infraconstitucionais que diferiam das medidas da Constituição de 1988, recentralizando recursos tributários, mas também os redistribuindo para as esferas subnacionais. A legislação subsequente à promulgação da Constituição de 1988 também deu substância ao papel regulador da União de normatizar, em uma federação mais cooperativa do que dual, as competências concorrentes, como é o caso, por exemplo, dos sistemas nacionais de políticas normatizados.

Decisões políticas têm consequências para além dos seus objetivos. Se, por um lado, os sistemas nacionais de políticas públicas no contexto do federalismo brasileiro redistribuem, ao menos parcialmente e sob o comando da União, a concentração de recursos na esfera federal ocorrida pós-1988, por outro, esses sistemas afetam a autonomia decisória das esferas subnacionais, tornando-a mais limitada vis-à-vis a constituição original e os períodos democráticos de 1946 e 1988. Mas mais do que isso, esses sistemas têm condicionantes que nem sempre podem ser cumpridos pelos estados, tais como contrapartidas e capacidade técnica.

Como demonstrado em trabalhos anteriores, a capacidade orçamentária dos estados brasileiros, principalmente a de realizar investimentos, vem sendo reduzida ao longo dos últimos 20 anos. Sem recorrer a empréstimos e/ou a recursos de fundos federais, os estados em geral têm escassas possibilidades de prover políticas de segurança pública, construção de presídios, habitação de interesse social, cultura e turismo, ou seja, as políticas aqui analisadas. Os Sistemas parecem, então, ter sido instituídos para suprir essa escassez dos estados. No entanto, seus resultados são ambíguos. Por um lado, sem os recursos federais, os estados não realizariam tais atividades. Por outro, os investimentos realizados via os sistemas nacionais de políticas públicas oneram os estados no curto prazo (montagem de burocracias e contrapartidas) e no médio prazo (manutenção dos equipamentos).

Do ponto de vista da literatura sobre políticas públicas, o trabalho contribui para o melhor entendimento das janelas de oportunidade que se abrem em determinado momento histórico, permitindo a adoção ou a mudança de rota de determinadas políticas públicas. Esse foi, por exemplo, o caso dos sistemas de segurança pública e de habitação de interesse social. O trabalho também mostrou que políticas públicas em federações mais centralizadas e que requerem, portanto, consentimento e cooperação dos entes federados, são o centro das questões federativas em federações mais cooperativas do que duais, como é o caso do Brasil, com impactos tanto sobre o tipo de política quanto sobre que esfera participa ou não das políticas.

Já em relação às teorias institucionalistas, a pesquisa mostrou que regras sozinhas não são suficientes para o funcionamento dos Sistemas. A ausência de métodos de avaliação técnico-científica sistemática da implementação e dos resultados das políticas e a inexistência de critérios de avaliação não permitiram a revisão das regras que não funcionaram e/ou a criação de incentivos aos estados para seu cumprimento e ao governo federal para exercer a coordenação dos Sistemas.

Por fim, este trabalho buscou abrir uma agenda de pesquisa que avance na compreensão teórica e empírica do federalismo e das políticas públicas para além das políticas que aqui denominei de constitucionalizadas e para além das esferas de governo federal e municipal, que são as mais pesquisadas sobre esses temas.

Gráfico 1
Valor Conveniado com Governos Estaduais (em R$ corrigidos pelo IGP-DI-Dez/2014), excluído o Ministério da Fazenda – 1996-2014

Gráfico 3
Ministério da Cultura – Valor Conveniado com Governos Estaduais (em R$ corrigidos pelo IGP-DI-Dez/2014) – 1996-2014

Gráfico 4
Ministério da Cidades - Valor Liberado com Governos Estaduais (em R$ corrigidos pelo IGP-DI-Dez/2014) – 1996-2014

Gráfico 5
– Ministério do Turismo – Valor Conveniado com Governos Estaduais (em R$ corrigidos pelo IGP-DI-Dez/2014) – 1996-2014

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Flavio Fontanelli a valiosa assistência na coleta e interpretação dos dados desta pesquisa, financiada pela Bolsa de Produtividade em Pesquisa do CNPq no. 302757/2018-0 e pela EBAPE/FGV como parte do projeto Centralização, Orçamento e Federação, coordenado por Fernando Rezende e Armando Cunha. Agradeço também aos pareceristas anônimos pelos excelentes comentários.

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  • 2
    É preciso destacar que federações não são estáticas e se adaptam às circunstâncias políticas e econômico-sociais, variando no tempo, no espaço e por política. A federação norte-americana, por exemplo, embora não tenha sofrido mudança constitucional nesse tema desde sua promulgação, não é hoje tão dual, dadas a expansão do governo federal e as várias formas de relacionamento com os governos estaduais. Para uma excelente discussão sobre federalismo dual e cooperativo, relações intergovernamentais e centralização/descentralização nas federações democráticas em perspectiva comparada, ver Dardanelli e Kincaid (2023). Para o caso brasileiro, ver Abrucio et al. (2020)ABRUCIO, Fernando Luiz. et al. Combating covid-19 under Bolsonaro’s federalism: a case of intergovernmental incoordination. Rio de Janeiro: Revista de Administração Pública, v. 54 n, 4, p. 663-76, 2020.; Arretche (2012ARRETCHE, Marta. Democracia, federalismo e centralização no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2012.; 2009), Gomes (2009)GOMES, Sandra. Políticas nacionais e implementação subnacional: uma revisão da descentralização pós-Fundef. Dados, Rio de Janeiro, v. 52, n. 3, p. 659-690, 2009., Machado e Palotti (2015)MACHADO, J. A.; PALOTTI, P. Entre cooperação e centralização: federalismo e políticas sociais no Brasil pós-1988. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 30, n. 88, p. 61-82, 2015., (Souza (2019SOUZA, Celina. Coordenação, uniformidade e autonomia na formulação de políticas públicas: experiências federativas no cenário internacional e nacional. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 35, p.1-13. 2019.; 2001) e Vazquez (2014)VAZQUEZ, D. Mecanismos institucionais de regulação federal e seus resultados nas políticas de educação e saúde. Dados, Rio de Janeiro, v. 57, n. 4, p. 969-1005, 2014..
  • 3
  • 4
    Por limitação de espaço, os procedimentos metodológicos e o banco de dados podem ser solicitados à autora.
  • 5
    A base do Siconv disponível on-line tem início em 2008. Como a maior parte dos sistemas nacionais foi instituída anteriormente, a base disponibilizada pela CGU é a única que cobre todo o período abrangido pela pesquisa.
  • 6
    Como se sabe, na maioria dos países federais, a União tem capacidade para regular, através de normas gerais, as competências definidas como concorrentes. Sobre as razões que levaram os constituintes a ampliar o rol das competências concorrentes, ver Souza (1997; 2001).
  • 7
    Sobre a tipologia das federações em geral e da brasileira em particular, ver, entre outros, Souza (1997; 2001).
  • 8
    Os sistemas de assistência social e segurança alimentar e nutricional são voltados para os municípios. O de saneamento não é objeto de transferências via convênios, mas restrito à montagem de um sistema de informações, que inclui água, esgoto e resíduos sólidos. O Sistema Nacional de Resíduos Sólidos foi objeto de levantamento de dados neste trabalho, mas decidiu-se não o incluir porque a parte do sistema administrada pelo Ministério do Meio Ambiente só celebrou dois convênios com os estados e a administrada pelo Ministério das Cidades, embora tenha celebrado cerca de 60 convênios no período, não permite distinguir os voltados para os resíduos sólidos dos voltados para os recursos hídricos.
  • 9
    Em 2003, outro Plano foi divulgado, baseado em diagnósticos elaborados por especialistas e coordenado pelo Instituto da Cidadania.
  • 10
    Dado que a responsabilidade constitucional da segurança pública é do estado, o SUSP teria o papel de apoiá-lo por meio da organização e coordenação de um sistema de informações, o que, apenas indiretamente, poderia contribuir para a diminuição da violência.
  • 11
  • 12
  • 13
    O SNC foi debatido por Silva e Abreu (2011), sua performance nos municípios, por Fontanelli (2021) e a trajetória da política cultural, por Souza (2017)SOUZA, Giane M. A cultura como direito constitucional: contribuição para um debate teórico metodológico. Caderno Cultura e Sociedade, Chapecó, n. 46, p. 9-20, jun. 2017..
  • 14
  • 15
    Sobre o papel de Minas Gerais no sistema de habitação, ver Dutra (2018)DUTRA, Walkiria Z. A vez do governo estadual nas estratégias de coordenação em políticas públicas: o caso de Minas Gerais nas áreas de Habitação de Interesse Social e Segurança Pública. 2018. 280p. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018..
  • 16
    Existem relatos de que o PMCMV foi inspirado na experiência chilena e apoiado pelo empresariado da construção civil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    06 Abr 2023
  • Aceito
    04 Out 2023
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